Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0715/08
Data do Acordão:08/20/2008
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:MIRANDA DE PACHECO
Descritores:SIGILO BANCÁRIO
SIGILO PROFISSIONAL
DERROGAÇÃO
Sumário:Ainda que verificados os pressupostos da derrogação administrativa do sigilo bancário prevista no artigo 63.°-B da LGT, uma vez deduzida oposição por parte do contribuinte no acesso às suas contas bancárias com fundamento em sigilo profissional, a administração tributária só poderá aceder a tal informação após autorização judicial concedida no termos do n.° 5 do artigo 61° da LGT.
Nº Convencional:JSTA00065160
Nº do Documento:SA2200808200715
Data de Entrada:08/04/2008
Recorrente:DIRGER DOS IMPOSTOS
Recorrido 1:A...
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF LOULÉ PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - SIGILO BANCÁRIO.
Legislação Nacional:LGT98 ART63 ART63-B.
L 30-G/2000 DE 2000/12/29.
CPA91 ART135.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC1862/03 DE 2004/12/15.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1- O Director-Geral dos Impostos vem recorrer da sentença do Tribunal Fiscal e Administrativo de Loulé, a fls. 233 e seguintes, que concedeu provimento ao recurso interposto do despacho pelo mesmo proferido em 01/04/08, nos termos do qual foi autorizado que funcionários da Inspecção Tributária, devidamente credenciados, acedessem directamente a todas as contas e documentos bancários existentes nas instituições bancárias, em sociedades financeiras ou instituições de crédito portuguesas, relativamente às contas de seja titular o ora recorrido A… contribuinte n.° …, no referente aos anos de 2.004, 2005 e 2006, tendo formulado as seguintes conclusões:
1 -A decisão do Director-Geral dos Impostos que autorizou a derrogação de sigilo bancário teve por base legal, com referência ao ano de 2004, a alínea a) do n°2 do artigo 63°-B da LGT, com a redacção em vigor ao tempo, e, com referência aos anos de 2005 e 2006, a alínea b) do n°1 e alínea a) do n°3 do mesmo normativo.
2 -Foi decidida nesses termos porque estavam preenchidos os pressupostos legais para a derrogação do sigilo bancário previstos nesses normativos.
3-Isso, nomeadamente, porque existiam indícios fundados da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável que impunham o recurso a métodos indirectos: como sejam a omissão na contabilidade das contas bancárias utilizadas na actividade e a existência de custos registados na contabilidade do sujeito passivo e relacionados com serviços prestados por colaboradores e por si próprio, em relação aos quais não foi emitida facturação ao cliente.
4 -E, ainda, porque se verificava o pressuposto legal para aplicação do procedimento regulado no normativo citado que se traduz na recusa, pelo contribuinte, da autorização para a consulta dos documentos bancários solicitada.
5-O procedimento aplicável (e aplicado) no caso em apreço era esse procedimento de derrogação do sigilo bancário, nos termos em que o mesmo é regulado no artigo 63.°-B da LGT e já não, contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, o procedimento previsto no n°5 do artigo 63° da LGT.
6 - Salvo o devido respeito, que é muito, o entendimento expresso na sentença recorrida corresponde a um erro de julgamento em matéria de direito, resultante de uma incorrecta interpretação e aplicação daquele n°5 do artigo 63° da LGT, bem como do n°2 e da alínea b) do n°4 da mesma disposição legal, em conjugação com o artigo 63°-B do mesmo diploma.
7-É verdade que se o contribuinte está sujeito a um dever de colaboração com a Administração Tributária na concretização das diligências previstas no n°1 do artigo 63° da LGT, tal dever cessa nas circunstâncias previstas no n°4 do mesmo artigo;
8- Porém, o legislador ressalvou, expressamente, dos casos aí indicados como susceptíveis de legitimarem a falta de colaboração pelo contribuinte, os casos de derrogação do dever de sigilo bancário pela administração tributária legalmente admitidos, ou seja, os casos que são expressamente referidos na “lei” que especialmente regula a matéria, nomeadamente números 1 a 3 do artigo 63°-B da LGT.
9 - Dado que tais casos se verificavam na situação sub judice, não se impunha aí seguir o procedimento de autorização judicial previsto no n°5 do artigo 63° da LGT
10 - A desnecessidade de autorização judicial resulta, também, dos termos do n°2 do artigo 63° da LGT, pois que este, se determina que o acesso à informação protegida pelo sigilo profissional, bancário ou qualquer outro dever de sigilo legalmente regulado depende de autorização judicial, excepciona, expressamente, desse regime os casos em que a lei admite a derrogação do dever de sigilo bancário pela administração tributária sem dependência daquela autorização, onde estão abrangidos os casos previstos nos números 1 a 3 do artigo 63°-B da LGT.
11 - A inaplicabilidade à situação em apreço do procedimento de autorização judicial previsto no n°5 do artigo 63° da LGT, decorre, ainda, dos termos do n°6 do artigo 63° da LGT, que estabelece como a Administração deve instruir os pedidos de elementos às instituições financeiras nos casos de “acesso directo” aos elementos bancários.
12- Além do referido, importa considerar que o bem fundado da decisão da Administração e do procedimento por esta adoptado, decorre do facto de ser manifesta a falta de sustentação da questão do segredo profissional levantada pelo contribuinte, pois que o solicitado pela administração fiscal se limitava à consulta dos extractos bancários e dos documentos que os suportam, os quais não são susceptíveis de revelar qualquer informação sigilosa relativamente ao negócio do cliente, podendo, apenas, revelar o nome do cliente (nome do cliente que é um elemento que consta, designadamente, dos recibos emitidos pelos advogados pelos serviços que prestam e a que a inspecção tributária tem, necessariamente, acesso legal).
13-Assim, a questão do pedido de levantamento do segredo profissional dos advogados no caso não se punha, pois que os documentos pretendidos, não referenciando o assunto tratado pelo advogado, não identificavam a substância do serviço prestado.
14-No caso sub judice apenas estava em causa o acesso a documentos que permitissem fiscalizar os honorários recebidos e as despesas realizadas pelo ora A. no desempenho da respectiva actividade.
15-Pelo que se confirma estar o despacho do Director-Geral dos Impostos que determinou a derrogação do sigilo bancário de acordo com a legalidade vigente.
16 - Ao entender ser necessária a autorização judicial prevista no n°5 do artigo 63° da LGT, a douta sentença apresenta-se desconforme com os acima mencionados n°2, n°4- alínea b) e n°5 desse artigo 63°, bem como com o artigo 63°-B do mesmo diploma.
17 - E não se apresentando conforme à legalidade vigente, a sentença recorrida é ilegal e, em consequência, não merece ser confirmada.
2- O recorrido A… contra alegou nos termos que constam de fls. 271 e seguintes, concluindo do seguinte modo:
A) A douta sentença recorrida andou bem relativamente à matéria que considerou provada e fez boa aplicação da lei;
B) O despacho recorrido pronunciava-se pela autorização para aceder a todas as contas e documentos bancários de que o sujeito passivo era titular em instituições bancárias ou outras similares;
C) Foi este despacho que foi objecto da douta sentença recorrida que se pronunciou pela procedência do recurso com fundamento na aplicação do n° 5 do artigo 63° da Lei Geral Tributária por se ter verificado a legítima oposição do sujeito passivo fundada no dever de sigilo profissional, nos termos da alínea b) do n° 4 do mesmo artigo;
D) E é inquestionável face à prova produzida nos autos que o aqui recorrido opôs-se ao acesso à informação e documentos bancários com fundamento no seu dever de sigilo profissional.
E) Pronunciando-se pela procedência do pedido com fundamento no disposto no artigo 63° da LGT que por si só bastava para a anulação do despacho recorrido, a douta sentença recorrida não se pronunciou sobre as restantes matérias alegadas no recurso judicial.
F) No restante, o alegado pelo Senhor Director-Geral dos Impostos não respeita à matéria passível do objecto do recurso jurisdicional ou, por outro lado, tratam-se de alegações de factos novos que não constam do despacho recorrido, nem das alegações produzidas em sede de recurso judicial, nem tão pouco da douta sentença recorrida;
G) De resto, mesmo na hipótese de vir a ser revogada a douta sentença recorrida quanto à matéria em que se pronuncia, sempre teria que ser repetido o julgamento em primeira instância para decidir da restante matéria de facto e de direito alegada em sede de recurso judicial, já que é esta a sede própria para decidir de tal matéria e não em sede de recurso jurisdicional como parece querer-se fazer no presente recurso;
H) Por outro lado, não é legítimo dizer-se, como se faz no recurso interposto, que a matéria a que a Administração Tributária pretendia ter acesso não contém informação sigilosa, já que cabe ao visado, no caso em apreço, um advogado, avaliar se tal informação está ou não sujeita ao dever de sigilo profissional e se, em caso afirmativo, deve o não deixar cair tal dever de sigilo, pois, para além do compromisso que o advogado tem para com os seus clientes, a violação do dever de sigilo profissional é sancionada disciplinarmente pelo Estatuto da Ordem dos Advogados como falta grave.
I) A sujeição a uma apreciação judicial nesta matéria, como preceitua o n° 5 do artigo 63° da LGT, é que decidirá se a oposição fundada no dever de sigilo profissional é ou não legítima (e, consequentemente, pelo acesso ou não à informação bancária) e, caso não o seja, a Administração Tributária, para além de ter o acesso à informação bancária, tem ao seu dispor o procedimento sancionatório que ao caso couber, nos termos do n° 2 do artigo 59° do RCPIT, como, aliás, de consignou na douta sentença recorrida;
J) Nas alegações promovidas pelo Exmo. Senhor Director-Geral dos Impostos, entende-se que o n° 5 do artigo 63° da LGT não é aplicável ao caso em apreço já que, quer o n° 2, quer a alínea b) do n°4 do mesmo artigo, ressalvam os casos em que à Administração Tributária é legalmente admitida a derrogação do dever de sigilo bancário;
K) Ora, tal entendimento implicaria que o artigo 63° nunca seria aplicável nos casos de acesso à informação bancária previstos no artigo 63°-B da LGT, ainda que ocorresse oposição legítima com fundamento no dever se sigilo profissional, o que, salvo melhor opinião, não parece estar na letra nem no espírito da lei;
L) Com efeito, o n° 2 e a alínea b) do n° 4 do artigo 63° da LGT referem-se a informações ou documentos abrangidos pelo dever de sigilo profissional, dever de sigilo bancário e outros deveres de sigilo legalmente regulados, sendo que o dever de sigilo bancário apenas obriga a instituições bancárias e outras de natureza similar, pelo que quando aqueles normativos ressalvam os casos em que é legalmente admitida a derrogação do sigilo bancário estarão certamente a visar o correspondente dever de sigilo bancário;
M) E o aqui recorrido apenas está obrigado ao dever de sigilo profissional e foi neste dever que fundou a sua não colaboração com a Administração Tributária;
N) Ora, quando o legislador, nos citados normativos, ressalva os casos em que a derrogação do dever de sigilo bancário é legalmente admitida, não está certamente a referir-se ao artigo 63°-B, cuja epígrafe é “Acesso a informações e documentos bancários”, até porque ambos os artigos, 63° e 63°-B, têm redacções introduzidas pela Lei n° 55-B/2004 e, a pretender-se tal remissão, esta teria sido efectuada de forma directa, de molde a excluir da aplicação do artigo 63° os casos a que se refere o artigo 63°-B;
O) A entender-se de outra forma, sempre que se tratasse de um caso de acesso a informação bancária nos termos do artigo 63°-B, o visado nunca poderia opor-se com base no seu dever de sigilo profissional nos termos da alínea b) do n° 4 do artigo 63° e nunca tal situação cairia na alçada da apreciação e autorização judicial a que se refere o n° 5 do mesmo artigo;
P) Ora, salvo melhor opinião, não é isso que resulta da letra da lei, uma vez que a prevalência do dever de sigilo profissional ou da necessidade de acesso à informação bancária deverá ser judicialmente avaliada, ponderadas as razões invocadas pelas partes;
Q) Nas suas alegações de recurso jurisdicional, a Administração Tributária pretende que o acesso a informações e documentos bancários previsto no artigo 63°-B, ainda que exista oposição fundada no dever de sigilo profissional, fique absolutamente excluído de qualquer apreciação judicial, o que implicaria a inaplicabilidade a estes casos do disposto no artigo 63°, sendo certo que, salvo melhor opinião, em lado algum se vislumbra donde se possa tirar tal conclusão jurídica.
R) Pelo que bem andou a douta sentença recorrida quando deu provimento ao recurso judicial deduzido, pronunciando-se pela anulação do despacho do Exmo. Senhor Director-Geral dos Impostos.
3-O Ex.mo Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento do recurso.
4- Sem vistos dos Ex.mos Adjuntos, cumpre decidir em conferencia.
5- A sentença fixou a seguinte matéria de facto:
A) - Em 21/01/2008, tem em vista a derrogação do dever de sigilo bancário, a Administração Fiscal elaborou a seguinte informação (fls. 92 a 97 do processo administrativo apenso):
«INFORMAÇÃO
1. Derrogação do dever de sigilo bancário, ao abrigo da alínea a) do n.° 2 (Redacção do Decreto-Lei 320-A/2002, de 30 de Dezembro), ano de 2004, e alínea b) do n.° 1 e alínea a) do n.° 3 (Redacção dada pela Lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro), ano de 2005, todos do artigo 83°-B e da Lei Geral Tributária.
No âmbito da acção de recolha de informação com vista a comprovar a situação tributária em sede de IVA e de IRS, dos anos de 2004, 2005 e 2006, do sujeito passivo A…, NIF …, com domicilio fiscal na Rua de … n.° … … Faro, verificou-se que:
• Nos anos de 2004, 2005 e 2006 exerce a actividade de advogado, encontrando-se enquadrado em IVA no Regime normal com periodicidade trimestral e em IRS tem enquadramento no Regime da contabilidade organizada, por opção, a que se refere a alínea b) do n.° 1 do artigo 28.0 do CIRS.
• Da actividade de advogado, verificaram-se algumas omissões nos resultados declarados, conforme se demonstrará mais adiante.
• Nos anos de 2004, 2005 e 2006, de acordo com o sistema informático desta Direcção de Finanças - Visão do contribuinte -, verificou-se que é também gerente / administrador de várias sociedades, tais como:
…, NIPC: …
…, NIPC: …
…, NIPC: …
…, NIPC: …
…, NIPC: …
…, NIPC: …
B…, NIPC: …
…, NIPC: …
..., NIPC: …
…, NTPC…
…., NIPC: …
Ao longo dos anos de 2004, 2005 e 2006, no exercício da sua actividade de advogado, o sujeito passivo emitiu recibos modelo 8 (recibos verdes) referentes a serviços prestados a alguns dos seus clientes e também a algumas das sociedades descritas no ponto anterior de que é gerente/administrador ou seja, às sociedades B… e ….
Algumas destas empresas respeitam a três grandes grupos económicos ligados ao Golfe que investiram em propriedades dos Concelhos de Vila Real de Santo António, Tavira e São Brás de Alportel.
Os serviços prestados envolvem quer a compra de terrenos, negociação e aprovação de projectos de construção e estudos de impacto ambiental, cujo desenvolvimento tem levado vários anos e esteve sujeito a vários condicionantes.
Relativamente aos campos de golfe de Vila Real de Santo António (…), os mesmos já se encontram em comercialização, têm uma área de 400 hectares e envolve um investimento superior a 600 milhões de euros, tendo o sujeito passivo acompanhado este investimento desde a fase de arranque, participando actualmente na comercialização (incluindo a participação nas escrituras de venda).
II. Factos relevantes
11.1. Actividade exercida
Este contribuinte exerce a actividade de advogado, emitindo recibos verdes às sociedades de que é administrador ou gerente, conforme referido no capítulo 1 e a outros contribuintes em particular.
11.2. Rendimentos declarados
11.2.1. Este sujeito passivo declara como rendimentos, em 2004 o valor de € 208.544,22, em 2005 o valor de €1 66.021, 71 e em 2006 o valor de € 129.572,31, respeitante a prestação de serviços da actividade de advogado, pelas quais emitiu um recibo modelo 6 (recibo verde).
Porém, tendo em conta os custos da actividade, o resultado líquido obtido na sua actividade de advogado apresenta o valor de € 89.578,51 para o ano de 2004, o valor de € 18.44,31 para o ano de 2005 e o valor negativo de € 22.601,11 para o ano de 2006, havendo apenas lugar a IRS a pagar no ano de 2005 no valor de €4.839,65.
11.2.2. Tendo a DGCI, nas suas bases de dados, rácios relativos a valores declarados por todos os contribuintes declarantes, recorremos a essa base de dados para verificar que o sujeito passivo apresenta rentabilidades fiscais de 34,72%, 20,97% e - 2,26%, respectivamente aos anos de 2004, 2005 e 2006, rácios estes inferiores à media nacional dos valores declarados pelos contribuintes que exercem a mesma actividade, CAE: 6010.
11.3. Documentos bancários não revelados na contabilidade
O sujeito passivo possui contabilidade organizada, mas não existe na contabilidade quaisquer documentos bancários (extractos de conta corrente dos Bancos e outros documentos) que comprovem os recebimentos e os pagamentos, nem foi efectuada a reconciliação bancária.
O contribuinte foi notificado em 2007/11/08, por carta registada, para exibir no gabinete de contabilidade, os documentos bancários relacionados com a sua actividade. Em resposta informou-nos que os mesmos se encontram em seu poder e que teriam que ser consultados no seu escritório de advogados e na sua presença, sugerindo que a Administração Fiscal lhe desse conhecimento das omissões detectadas para que o contribuinte as relacionasse com os movimentos financeiros.
11.4. Serviços prestados por colaboradores
Nos anos de 2004, 2005 e 2006, o sujeito passivo possui alguns colaboradores a trabalhar para si na sua actividade de advogado, emitindo estes ao sujeito passivo em análise, recibos verdes pelos serviços prestados, bem como notas de despesas dos serviços prestados a clientes do Dr. A…, que para os quais não foi emitido qualquer recibo, como se demonstra no capítulo III,
III. Apreciação dos factos
III.1. Perante a necessidade de averiguar a veracidade dos valores declarados pelo sujeito passivo, procedeu-se à recolha de informação com algumas entidades, tais como cartórios notariais, tribunais judiciais e conservatórias do registo predial, bem como a consulta no sistema informático Visão do contribuinte - relação com outros “, tendo-se concluído a existência de serviços prestados a alguns clientes que, pelos quais não foi emitido qualquer recibo modelo 6 (recibo verde) e, obviamente, não foram declarados à Administração Fiscal.
Entre muitas das omissões, salienta-se os serviços prestados por um dos colaboradores do Dr. A… — Dr. … referidos no ponto 11.4, em relação aos quais não se emitiu recibo, como se comprova pelo anexo 1 (cópia de uma notificação efectuada a esse colaborador e a respectiva resposta), onde o mesmo veio a afirmar que todos os serviços prestados por si, nos anos de 2004, 2005 e 2006, respeitante à lista de clientes que se juntou em anexo à referida notificação, foram serviços efectuados a pedido do Dr. A… e constantes nas respectivas notas de despesas apresentadas ao mesmo.
Consultado o anexo 1, constatou-se que a maioria dos serviços prestados não declarados se referem ao ano de 2004, conforme se pode comprovar pelas notas de despesas do referido colaborador constantes na contabilidade em contas de custos.
111.2. Recolhidos elementos junto da contabilidade de algumas empresas nos anos de 2004, 2005 e 2006, em que o contribuinte é gerente e anteriormente referidas, nomeadamente na empresa … e a empresa B…, foi possível verificar, através da análise das Actas daquelas empresas e outros documentos contabilísticos, que o contribuinte faz parte do Conselho de gerência das mesmas mas que não aufere qualquer remuneração fixa de trabalho dependente, apenas emite recibos verdes àquela, não discriminando nestes qual o tipo de serviço prestado, data da sua realização ou empresa do grupo a que respeita, bem como se estes se referem a honorários ou a notas de despesas (na empresa B… encontram-se registadas notas de despesas que não fazem parte da contabilidade do contribuinte).
Junta-se em Anexo 2 cópia de um Auto de Declarações elaborado em 2008/01/16 onde o Dr. A… veio a esclarecer que os recibos emitidos contemplam honorários e despesas efectuadas por conta, admitindo ter recebido uma avença mensal de f 1.500,00 pelos serviços prestados sem quaisquer contratos escritos.
Verificou-se também, e a título de exemplo, que em 2008, o sujeito passivo apresenta à sociedade “B…” despesas muito elevadas relativamente aos valores de honorários efectivamente cobrados naquele ano, conforme extracto de conta-corrente que se encontra na contabilidade da referida sociedade, situação esta que não é normal nesta actividade e que indicia honorários por declarar.
Algumas das sociedades de que é gerente / administrador, o domicílio fiscal das mesmas coincide com o domicílio fiscal do sujeito passivo (localização do seu escritório de advogados) ou seja, na Rua de … n.° … em Faro, indicando que utiliza aquelas instalações para tratar de assuntos relacionados com as referidas sociedades, tendo sido possível verificar, que, relativamente à sociedade B…, o sujeito passivo nas notas de despesas que emite à mesma inclui, entre outras, despesas de uma renda cobrada àquela pela utilização do seu escritório.
Há que referir ainda que, a consulta aos livros de Actas de algumas daquelas sociedades supra referidas (B…, … e outras) foi efectuada no escritório do advogado em causa por os mesmos se encontrarem disponíveis naquele local.
Verificou-se também que, relativamente a algumas das referidas sociedades, têm como accionistas, entre outras, empresas off-shores, verificou-se que o Dr. A…, para além de ser gerente das sociedades referidas rio capítulo 1, é também um dos representantes da sociedade off-shore “…”, NIF: …, a qual é accionista das sociedades “B…” e “…”, conforme cópia de procuração que se junta em Anexo 3, onde se pode observar que todas as decisões destas sociedades que desenvolveram o projecto … referido no ponto 1 tiveram intervenção do Dr. A….
IV. Conclusões / Propostas
Trata-se de um contribuinte que, para além de prestar serviços a vários clientes em particular, está também envolvido nas actividades das várias sociedades atrás referidas, tendo vindo ao longo dos anos a intervir no desenvolvimento de projectos para as mesmas, mas que, relativamente a algumas delas, nomeadamente “…”, “…” e “… “, ainda não emitiu qualquer recibo.
Os valores de honorários declarados relativamente às empresas “B… e … “não nos se afigura estar de acordo com a realidade do negócio, uma vez que o negócio contempla, não só actos de administração (vide anexo 3 ) como prestação de serviços pontuais e despesas associadas que não se encontram discriminados directamente nos recibos contabilizados.
A falta de emissão de recibos relativo aos clientes referidos no Anexo 1 dos anos de 2004 a 2006, constitui omissões contabilísticas não declaradas e de impossível quantificação directa. Os factos anteriormente referidos constituem indícios da falta de veracidade do declarado nos anos de 2004, 2005 e 2006, que impossibilitam a comprovação e quantificação directa e exacta do rendimento tributável e implicam o recurso a uma avaliação indirecta para determinação daquele rendimento por insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, conforme está previsto na alínea b) do artigo 87° e na alínea a) do artigo 88° da Lei Geral Tributária
O contribuinte em causa recusou a autorização para se solicitar ao Banco de Portugal o acesso a todas as suas contas bancárias, ou seja, o contribuinte foi notificado, por via postal, em 2007/12/13, com o prazo de dez dias para conceder a referida autorização e em 2007/12/26 respondeu à notificação nada se pronunciando sobre o que se pretendia. Em anexo 4 junta-se cópia da notificação e da resposta do contribuinte.
Perante o exposto, consideram-se reunidos, para os anos de 2004, 2005 e 2006, os pressupostos mencionados no artigo 63°-B da Lei Geral Tributária.
Mais, o acesso a documentos bancários torna-se premente no apuramento da realidade da situação tributária deste sujeito passivo.
Assim sendo, na procura da verdade material e face à recusa do contribuinte, proponho que seja solicitado, junto de Sua Exa. o Sr. Director Geral dos Impostos:
• Para o ano de 2004, a derrogação do dever de sigilo bancário, nos termos da alinea a) do n. ° 2 do artigo 63. °-B da Lei Geral Tributária (Redacção dada pela Lei 30-G de 2000 de 29/12/2000).
• Para os anos de 2005 e 2006, a derrogação do dever de sigilo bancário, nos termos da alínea b) do n. ° 1 do artigo 63-B da Lei Geral Tributária (Redacção dada pela Lei 55B de 2004 de 30/12/2004)
Direcção de Finanças de Faro, 21 de Janeiro de 2008.»
B) - Em 21/01/2008, sobre a antecedente informação recaiu o seguinte parecer (fls. 89 do processo administrativo apenso):
«Concordo. Proponho que se remeta a presente informação, para o Senhor Director-Geral dos Impostos a fim de se pronunciar sobre o projecto de decisão de acesso a a informações bancárias nos termos do n.° 4 do art. 63. °-B da Lei Geral Tributária.
À consideração superior. »
C) - Sobre o parecer a que se refere a alínea anterior recaiu o seguinte despacho (fls. 89 do processo administrativo apenso):
«Concordo com os fundamentos expressos na presente informação e respectivo parecer, pelo que mando se proceda à remessa do presente processo ao Ex.mo Sr. Director-Geral dos Impostos, para os devidos efeitos. 2008/01/22»
D) - Em 30/01/2008, foi proferido o projecto de decisão, tendo em vista o acesso directo a todas as contas e documentos bancários, de que o recorrente seja titular (processo administrativo apenso).
E) - No exercício do direito de audição o Recorrente apresentou, em 22/02/2004, o requerimento que consta do processo administrativo apenso a fls. 47 e sgs., que aqui se dá por inteiramente reproduzido.
F) - A Administração Fiscal, na informação de 12/03/2008, procedeu à apreciação do requerimento apresentado pelo Recorrente no exercício do direito de audição, nos seguintes termos (fls. 16 a 23 do processo administrativo apenso):
V Direito de audição - fundamentação
O sujeito passivo veio a exercer o direito de audição sobre o projecto de decisão relativo à derrogação do sigilo bancário com respeito aos anos de 2004, 2005 e 2006, nos termos do artigo 60° da Lei Geral Tributária.
Depois de lido e analisado o referido direito de audição, informa-se o seguinte:
A) Do projecto de decisão
1. O sujeito passivo vem alegar neste capítulo que a decisão não se encontra devidamente fundamentada por, não indicar expressamente os motivos concretos que a justificam, isto é, por não estar fundamentada com as razões de facto e de direito que a motivaram.
Porém, o n.° 4 do art.° 63. °-B da Lei Geral Tributária vem referir que as decisões da Administração Tributaria relativas ao acesso a informações de documentos bancários são da competência do Director Geral dos Impostos. Do enviado ao sujeito passivo consta o projecto de decisão do Sr. Director Geral dos Impostos que se encontra acompanhado de parecer e despachos concordantes relativos à informação da fiscalização, onde se encontram relatadas as situações de facto e de direito respeitantes ao pedido de acesso às contas bancárias do sujeito passivo, pelo que se conclui que foi respeitado o disposto no n.° 4 do diploma supra citado, bem como o n.º 1 do art.º 72° do mesmo diploma,
2. Do ponto 150 ao ponto 18°, o sujeito passivo alega que a informação dos serviços não faz referência ao disposto no n.° 3 do art ° 63-B da LGT que refere “.. a impossibilidade de comprovação da matéria tributária nos termos do art.° 88° da LGT, referência esta que já constava na redacção em vigor até 31/12/2004 na alínea a) do n.° 2 do art°63.°-B.
Temos a informar ainda que a forma de emissão dos recibos (falta de referência da natureza e data dos serviços prestados) e a existência de omissões são factos que se verificaram em todos os anos em análise, sendo aplicável a tributação indirecta nos termos do art° 88° da LGT.
A informação da Inspecção teve o cuidado de separar o ano de 2004 dos anos de 2005 e 2006 no que se refere à prova dos factos concretamente identificados indiciadores da falta de veracidade do declarado, uma vez que a redacção em 2004 não contemplava o disposto na actual redacção da alínea b) do n.° 1 do art.° 63. °-B da LGT, razão pela qual se procurou dar mais ênfase à fundamentação da falta de veracidade do declarado nesse ano. E claro que esta situação conduz à impossibilidade de quantificação da matéria colectável a que se refere o n.° 3 do art.° 63. °-B da LGT, conforme mencionado na nossa informação no capítulo IV 1° parágrafo da folha n° 7, Embora a informação não invoque directamente esta disposição legal no capítulo IV, todo o conteúdo da informação fundamenta o descrito no n.° 3 do art.° 63. °-B da LGT. Consideramos assim, que quer a informação quer o projecto de decisão não são contraditórios como foi alegado no ponto 23° do direito de audição e a legislação invocada é suficiente para o pedido de derrogação do sigilo bancário.
B) Da fundamentação de facto
Do ponto 24° ao ponto 137° o sujeito passivo alega que não há uma expressa menção dos motivos concretos e que o constante da informação da inspecção não passa de meras suposições ou presunções. Veio a alegar também que apenas emitiu recibos aquando dos recebimentos.
1. Os factos referidos na informação da inspecção são factos concretos, ou seja:
• Existência de custos na contabilidade do sujeito passivo relacionados com a prestação de serviços de colaboradores, entre outros, em relação aos quais não foi emitido facturação ao cliente.
• Relativamente às empresas das quais o sujeito passivo se assume como sócio e emite recibos, estes não discriminam nem a data efectiva nem a natureza do serviço prestado. Os valores facturados encontram-se desproporcionados face às tarefas praticadas e nível de despesas debitado.
Não se compreende assim o alegado pelo contribuinte relativamente à falta de motivos concretos.
2. Nos pontos 31° a 35º o sujeito passivo indicia que só há obrigação de facturação aquando do recebimento e que a Administração Fiscal não conseguiu provar a existência do mesmo. A contabilidade organizada obriga a que seja respeitada a especialização dos exercícios que leva a que caso em determinado ano se contabilize custos dever-se-ia contabilizar os respectivos proveitos independentemente do recebimento ou não. Se houvesse certezas de todos os recebimentos efectuados não se justificaria solicitar a derrogação do sigilo bancário.
O não registo contabilístico dos movimentos financeiros relativos às contas bancárias da actividade comercial, impossibilita verificar se todos os recebimentos foram facturados e a data em que estes ocorreram.
Nos pontos 36° a 54° refere que os serviços prestados para as empresas identificadas no ponto 36° se resumem unicamente aos recibos emitidos, desvalorizando a gerência efectiva e representação jurídica que vem exercendo desde a sua implementação, uma vez que o sujeito passivo assina cheques das empresas e disponibiliza o seu escritório para a celebração de reuniões e sendo utilizado este como sede da maioria das empresas. Os recibos emitidos não discriminam directamente se as remunerações auferidas se referem a actos de gerência, avença mensal ou a prestações de serviços de advocacia de carácter pontual.
Das diligências efectuadas na empresa B…, verificou-se que os recibos emitidos encontram-se na sua quase totalidade suportados por notas de despesas relativas essencialmente a deslocações, comunicações e rendas, ou seja, sendo a parte restante justificada pelo sujeito passivo como respeitante a uma avença mensal de €1500,00, de onde se conclui que não houve remuneração relativamente aos actos de gerência e serviços jurídicos de carácter pontual.
4.Relativamente aos pontos 55° a 65°, verifica-se pela consulta do sistema informático da DGCI que o contribuinte é gerente das referidas empresas, e que independentemente de se encontrarem ou não em actividade, todo o acompanhamento destas empresas passa por si. E normal neste tipo de sociedades delegarem um responsável que trate de diligências periódicas (declarações fiscais e pagamentos de impostos) ou pontuais (aberturas de contas bancárias, diligências junto de autarquias e outras entidades oficiais), parte das quais o contribuinte confirma nos anos objecto de inspecção.
No ponto 62° o contribuinte veio a alegar que todos os serviços prestados às referidas sociedades são prestados directamente pelos TOC’s e pagos a estes pelas empresas. Relativamente à empresa …verificou-se junto do TOC que o pagamento ao mesmo é feito directamente pelo sujeito passivo, assim como os restantes pagamentos de despesas desta empresa, conforme se pode verificar pela existência de conta-corrente credora onde se resumem esses movimentos.
Relativamente às empresas …, …e …, contrariamente ao referido no ponto 62°, verificou-se que existe uma relação directa entre o sujeito passivo e o TOC destas empresas, uma vez que se verificou que os pagamentos dos serviços contabilísticos foram efectuados através de contas bancárias destas cujos cheques foram passados pelo contribuinte, indiciando que poderá ser responsável por outras operações relacionados com as empresas.
5. Do ponto 66° ao ponto 77° o contribuinte vem alegar que relativamente a estas empresas não praticou os actos constantes da procuração em anos anteriores, por esta ser de Maio de 2007. Porém, as referidas sociedades foram constituídas em anos anteriores sendo o contribuinte gerente destas conforme se comprova pela assinatura das actas das referidas sociedades e na qualidade de gerente veio assumir muitos dos actos referidos na procuração.
6. O valor da avença de € 1500,00 não se encontra descrito em nenhum dos recibos emitidos pelo contribuinte. Se à totalidade dos recibos emitidos em cada um dos anos expurgarmos os montantes de despesas descritas nas notas de honorários (registadas na B…), o referido diferencial nem sempre corresponde ao valor da avença mensal de € 1500,00.
Contrariamente ao referido no ponto 74° não se pode confundir pagamentos por conta, quer de aquisições ou impostos, com débitos de despesas de rendas, deslocações e estadias, comunicações, fotocópias, entre outros, que constam nas notas de honorários, débitos estes em relação aos quais não é possível estabelecer uma relação directa com os custos contabilizados na contabilidade do contribuinte.
Não se poderá assim aceitar a justificação referida pelo contribuinte.
7. Nos pontos 78° e 80° confirmamos que os rácios da rentabilidade fiscal apresentados pelo contribuinte são inferiores à média dos restantes contribuintes que exercem a mesma actividade profissional. Claro que os referidos rácios não incluem outros rendimentos para além da actividade profissional de advogado.
8. Nos pontos 83° a 99°, contrariamente ao argumentado pelo contribuinte, os documentos contabilísticos relativos a informações financeiras, não foram objecto de contabilização, existindo apenas uma conta caixa e uma conta da classe capital do POC onde se encontram reflectidos os pagamentos e os recebimentos. Foi solicitado a algumas entidades prestadoras de serviços relativo a despesas registadas na contabilidade o comprovativo financeiro, de onde se concluiu que, para pagamento das referidas despesas, o contribuinte utilizou contas bancárias na sua actividade, de onde se conclui que pelo menos estas contas deveriam estar registadas na contabilidade e ter sido objecto de reconciliação bancária.
Para além do contribuinte não ter comunicado à contabilidade a existência daquelas contas bancárias, notificámo-lo para, no escritório de contabilidade, facultar todas as contas relativas à sua actividade profissional cujos movimentos financeiros estivessem directamente relacionados com os custos e proveitos contabilizados. O contribuinte informou-nos que tal consulta deveria ser feita no seu escritório. Os inspectores deslocaram-se ao seu escritório e o contribuinte tinha na sua posse extractos de contas bancárias que não conseguimos identificar uma vez que nunca nos foi entregue qualquer documento nem nos foi comunicado quais os números daquelas contas bancárias.
Posteriormente, foi efectuada uma nova notificação ao contribuinte, para o mesmo apresentar, não só as contas anteriormente referidas, como todas as suas contas bancárias. O contribuinte alegou que não poderia disponibilizar directamente as contas bancárias porque existiriam movimentos nas mesmas que estariam cobertas pelo sigilo profissional, necessitando assim de um prazo de 30 dias até que obtivesse uma resposta da Ordem dos Advogados para conceder a referida autorização, prazo este que já decorreu.
Porém, nesta fase, o solicitado pela Administração Fiscal limitava-se apenas à consulta dos extractos bancários e os documentos que os suportam, os quais não revelam qualquer informação sigilosa relativamente ao negócio do cliente, podendo apenas revelar o nome do cliente. A questão do sigilo profissional já foi objecto de estudo pelos nossos serviços conforme informação n.° 107 de 7/8/2007 proveniente da DSPCIT (Direcção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspecção tributária).
9. Nos pontos 100º ao 137°, o contribuinte vem afirmar que não existem omissões contabilísticas e que não há razão para a aplicação de métodos indirectos por todas as situações serem directamente quantificáveis.
9.1. Os seus colaboradores são advogados que, para além de prestarem serviços a este relativos a processos de clientes do Dr. A…, também prestam serviços a outros clientes, não havendo qualquer nível de dependência entre os colaboradores e o contribuinte, nem como compensação de utilização do escritório, debitando ao Dr. A… quer as notas das despesas quer os recibos de honorários, conforme documentos registados na contabilidade. As notas de despesas dos colaboradores identificam directamente os clientes a que os serviços foram prestados e como tal deveriam ter sido devidamente facturados pelo contribuinte ao referido cliente por se entender o descrito nessas notas como verdadeiro.
9.2. A identificação dos clientes referida na listagem, referem-se a diligências efectuadas pelos colaboradores junto de algumas entidades. Não se demonstrou ainda o comprovativo do recebimento quer, porque muitos deles serem clientes estrangeiros que são directamente representados pelo contribuinte e que não se encontram em Portugal, quer por se entender que na contabilidade do contribuinte, a prova do recebimento se deveria efectuar pela análise das contas bancárias do mesmo.
9.3. O sujeito passivo vem justificar parte significativa dos clientes da listagem, por entender que se tratam de clientes pró-bono (serviços sem cobrança), relativamente a oferta de serviços a pessoas com quem mantém um bom relacionamento pessoal. Referimos que estas pessoas são na sua maioria estrangeiros, algumas das quais são sociedades off-shores em relação às quais o contribuinte vem prestando pontualmente alguns serviços. Não se compreende que estes serviços não se enquadrem no âmbito de uma actividade profissional uma vez que os custos que lhes estão subjacentes constam na sua contabilidade. O artigo 40 do Código do IVA dispõe que todas as prestações de serviços são tributadas em sede de IVA, independentemente de serem cobradas ou não.
Se assim não fosse, o contribuinte encontrar-se-ia impossibilitado de poder deduzir o IVA de custos indirectos associados a estes serviços.
Nos pontos 119° e 120º, o próprio contribuinte assume a prestação de serviços e a representação fiscal dessas pessoas.
9.4. Relativamente ao cliente …. efectuamos diligências junto do mesmo, onde se concluiu que foram prestados e pagos serviços no ano de 2006, cujo recibo apenas foi emitido no ano de 2007, de onde se conclui que a realidade patrimonial do contribuinte nos referidos anos poderá não ser correcta por não ter sido respeitado o princípio da especialização dos exercícios.
Este caso concreto demonstra que se tratou de uma situação em que o serviço foi prestado e pago em ano anterior ao da emissão do recibo, que poderá indiciar a existência de outros recebimentos de difícil confirmação que ainda não tenham sido facturados.
C) DO DIREITO
1. Todas as situações anteriormente comentadas evidenciam a falta da veracidade do declarado (redacção à data a partir de 31/12/2004 da alínea b) do n.° 1 do art. ° 63.°-B da LGT) e assentam em factos concretos de prestações de serviços efectivamente efectuadas e que não foi emitido o respectivo recibo, contrariamente ao referenciado pelo contribuinte nos pontos n.° 139° ao 142° da sua informação.
2. Conforme se encontra descrito na informação prestada pelos serviços, encontra-se devidamente demonstrada a impossibilidade de quantificação da matéria tributável, decorrente da falta de identificação da natureza e da data dos serviços prestados na facturação e ausência de registo dos meios financeiros que inviabiliza o controlo financeiro e o seu relacionamento com a facturação emitida. A impossibilidade de quantificação directa e exacta da matéria tributável anteriormente fundamentada, encontra-se referida no art.° 88° da LGT e é um dos motivos para aplicação da derrogação do sigilo bancário, conforme alínea a) do n.° 2 do art.° 63-8 da LGT da redacção em vigor no ano de 2004, bem como na actual redacção da alínea a) do n°3 do mesmo artigo.
Direcção de Finanças de Faro, em 12 de Março de 2008»
G)- Em 21/01/2008, sobre a antecedente informação recaiu o seguinte parecer (fls. 10 do processo administrativo apenso):
«Concordo. O sujeito passivo exerceu o direito de audição sobre o projecto de decisão, que se encontra comentado no capítulo V, da informação.
Sou de opinião que não foram apresentados factos novos que não contrariem o referido relativo à falta de veracidade do declarado, bem como da impossibilidade de comprovação e quantificação directa da matéria tributável, sendo de manter o pedido de derrogação do sigilo bancário, ao abrigo da alínea a) do n.° 2 do art.° 63. °-B, da Lei Geral Tributária (redacção da Lei 306/2000) em vigor até ao ano de 2004 e alínea b) do n.° 1 e a) do n.° 3, desse diploma.
Proponho se remeta a presente informação para o Senhor Director-Geral dos Impostos, para que se pronuncie sobre a audição prévia do Contribuinte, que se anexa. Faro, 2008/03/12»
H) - Sobre o parecer a que se refere a alínea anterior recaiu o seguinte despacho (fls. 10 do processo administrativo apenso):
«Concordo. Remeta-se ao Gabinete do Ex.mo Sr. Director-Geral dos Impostos. 2008.03.13»
I) - Em 01/04/08, foi proferida a decisão ora sob recurso do seguinte teor (fls. 7 do processo administrativo apenso):
«1. Nos termos e com os fundamentos constantes da presente Informação e da Informação dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Faro que suportou o projecto de decisão, bem como com os pareceres concordantes na mesma exarados, verificando-se os condicionalismos previstos na alínea a) do n.° 2 do artigo 63°-B da Lei Geral Tributária, na redacção ao tempo dos factos, com referência ao ano de 2004, e na alínea b) do n.° 1 do citado normativo (redacção da Lei n 55-B/2004, de 30-12), com referência aos anos de 2005 e 2006, e tendo ponderado, em sede de direito de audição, o alegado pelo contribuinte A…, com o NIF …, ao abrigo da competência que me é atribuída pelo n.° 4 e nos termos do n.° 5 do referido normativo, autorizo que funcionários da Inspecção Tributária, devidamente credenciados, possam aceder directamente a todas as contas e documentos bancários existentes nas instituições bancárias, em sociedades financeiras ou instituições de crédito portuguesas, relativamente ás contas de que seja titular.
2. Devolva-se o processo à Direcção de Finanças de Faro para efeitos do prosseguimento procedimento de levantamento do segredo bancário,
Em 08.04.0 1
O Director-Geral»
J) - O Recorrente foi notificado do despacho a que se refere a alínea anterior, por carta registada com aviso de recepção, em 10 de Abril de 2008, cfr. fls. 2 a 5 do processo administrativo apenso.
L) - A petição inicial do presente recurso foi apresentada em 21/04/2008, cfr. fls. 3 dos presentes autos.
6- A sentença sob recurso, com fundamento em omissão de formalidade legalmente prescrita, concedeu provimento ao recurso interposto do despacho do Director-Geral dos Impostos, datado de 01/04/08, nos termos do qual foi autorizado o acesso a funcionários da Inspecção Tributária a contas e documentos bancários existentes em instituições bancárias, em sociedades financeiras ou instituições de crédito portuguesas, tituladas pelo ora recorrido e referentes aos anos de 2.004, 2.005 e 2.006.
Para tanto, ponderou-se na decisão que tendo o ora recorrido se oposto às diligências de inspecção justificando a recusa com fundamento em segredo profissional (ponto 8 da informação a que se refere a alínea f) do probatório), as diligências em causa só poderiam ser realizadas mediante autorização concedida pelo tribunal da comarca competente com base em pedido fundamentado da administração tributária, consoante dispõe o n.° 5 do artigo 63.° da LGT, o que não fora respeitado.
Inconformado com essa decisão, o recorrente Director-Geral dos Impostos vem, em suma, defender na sua alegação de recurso que o procedimento previsto no n.° 5 do artigo 63.° da LGT não era aplicável na situação em apreço, uma vez que verificados os respectivos pressupostos legais a derrogação do sigilo bancário não dependeria de autorização judicial nas situações previstas nos números 1 e 3 do artigo 63 .°-B da LGT, salientado ainda que, para além disso, no caso não se punha a questão do pedido de levantamento do segredo profissional dos advogados, pois que os documentos pretendidos, “não referenciando o assunto tratado pelo advogado, não identificavam a substância do serviço prestado” (conclusão 13.°).
Delineadas que se encontram as posições em confronto, comecemos por convocar os preceitos legais que conferem o enquadramento normativo da questão jurídica que importa apreciar e decidir.
Dispõem os n.° 2,4 e 5 do artigo 63.° da LGT:
“2 - O acesso à informação protegida pelo sigilo profissional, bancário ou qualquer outro dever de sigilo legalmente regulado depende de autorização judicial, nos termos da legislação aplicável, excepto nos casos em que a lei admite a derrogação do dever de sigilo bancário pela administração tributária sem dependência daquela autorização.
…………………………………………………………………………
4 - A falta de cooperação na realização das diligências previstas no n.° 1 só será legítima quando as mesmas impliquem:
a) O acesso à habitação do contribuinte;
b) A consulta de elementos abrangidos pelo segredo profissional, bancário ou qualquer outro dever de sigilo legalmente regulado, salvos os casos de consentimento do titular ou de derrogação do dever de sigilo bancário pela administração tributária legalmente admitidos; (1)
c) O acesso a factos da vida íntima dos cidadãos;
d) A violação dos direitos de personalidade e outros direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, nos termos e limites previstos na Constituição e na lei.
5 - Em caso de oposição do contribuinte com fundamento nalgumas circunstâncias referidas no número anterior, a diligência só poderá ser realizada mediante autorização concedida pelo tribunal da comarca competente com base em pedido fundamentado da administração tributária.”
Por sua parte, sob a epígrafe “Acesso a informações e documentos bancários”, o artigo 63.°-B da LGT estabelece nas alíneas b) do n.° 1 e a) do n.° 3 o seguinte:
“1 - A administração tributária tem o poder de aceder a todas as informações ou documentos bancários sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos:
……………………………………………………………
b) Quando existam factos concretamente identificados indiciadores da falta de veracidade do declarado.
V o n.°7.
…………………………………………………………….
3 - A administração tributária tem, ainda, o poder de aceder a todos os documentos bancários, excepto às informações prestadas para justificar o recurso ao crédito, nas situações de recusa de exibição daqueles documentos ou de autorização para a sua consulta:
a) Quando se verificar a impossibilidade de comprovação e qualificação directa e exacta da matéria tributável, nos termos do artigo 88.°, e, em geral, quando estejam verificados os pressupostos para o recurso a uma avaliação indirecta;”.
Da análise e cotejo dos normativos citados decorre, em nosso entender, um regime diferenciado quando o acesso à informação pretendida pela administração tributária esteja protegida pelo sigilo profissional ou qualquer outro dever de sigilo e quando apenas esteja em causa o sigilo bancário.
No primeiro caso a derrogação do sigilo por via judicial é obrigatória, mas já no caso da derrogação do sigilo bancário o recurso a essa via é facultativa, uma vez reunidos os pressupostos legais previstos no artigo 63.°-B da LGT que tem em vista apenas a derrogação desse sigilo bancário por forma a permitir o acesso da administração tributária a informações e documentos bancários.
Na verdade, ao invés do que defende o recorrente, a excepção ou ressalva consagradas nos n.°s 2 e 4, alínea b) do artigo 63.° da LGT quanto à desnecessidade de autorização judicial para a derrogação do sigilo apenas se reporta ao caso específico do sigilo bancário, como resulta, aliás, da sua própria literalidade, aí se não englobando o sigilo profissional ou outro dever de sigilo.
Certo é ainda que até às alterações introduzidas à LGT pela Lei n.° 30-G/2000, de 29 de Dezembro, a autorização judicial constituía o único procedimento legalmente prescrito para a derrogação, designadamente, dos sigilos bancário e profissional, sendo que essas alterações se limitaram a permitir a derrogação administrativa no caso excepcional do sigilo bancário, uma vez reunidos os pressupostos constantes do artigo 63-B da LGT, continuando o regime regra a ser o da derrogação judicial - cfr. Casalta Nabais in “Fiscalidade”, n.° 10, a fls. 21.
E bem se compreende que assim seja, nomeadamente no que tange ao segredo profissional dos advogados (artigo 81.°, n.° 4 do Estatuto da Ordem dos Advogados), como acontece na situação “sub judice”, em que na ponderação dos interesses envolvidos reveste uma especial importância e relevo a preservação da relação de confiança dos cidadãos na classe profissional dos advogados tendo em vista “o interesse da justiça na sua mais lata acepção”-cfr. Acórdão de 15/012/2004, rec. n.° 1862/03 (secção administrativa).
Ora, tendo o ora recorrido alegado que não poderia disponibilizar as contas bancárias porque nas mesmas existiriam movimentos cobertos pelo sigilo profissional, não se revelaria admissível que a administração tributária, não especialmente vocacionada para a ponderação do complexo de valores e direitos envolvidos e arrancando duma análise necessariamente perfunctória, tivesse a possibilidade de derrogar administrativamente a protecção conferida por esse dever de sigilo sem prévia sindicância judicial.
Daí que, como reforça o disposto no n.° 5 do referido artigo 63.° da LGT, a oposição do contribuinte no acesso à informação pretendida, no caso exercendo a profissão de advogado, com fundamento em sigilo profissional exija para a sua derrogação um escrutínio judicial e não meramente administrativo, a concretizar pela via do recurso ao “tribunal da comarca competente com base em pedido fundamentado da administração tributária”.
Neste contexto, apresentam-se de todo irrelevantes as considerações vertidas pelo recorrente na conclusão 12.° quanto à pretensa falta de sustentação da questão do segredo profissional que fora levantado pelo recorrido, posto que tal juízo apenas em sede judicial deverá ter lugar.
Como assim, não sendo confundíveis e não se sobrepondo a protecção conferida pelo sigilo bancário à do sigilo profissional, este não deverá ficar indefeso no caso de uma eventual verificação dos pressupostos legais previstos no artigo 63.°-B da LGT e daí que uma vez deduzida oposição por parte do ora recorrido no acesso às suas contas bancárias com fundamento no sigilo profissional à administração tributária se impunha o recurso ao procedimento de autorização judicial previsto no n.° 5 do artigo 63.° da LGT.
Ocorre, deste modo, uma preterição de uma formalidade legalmente prescrita, o que constitui causa determinante da anulabilidade do acto recorrido (artigo 135.° do CPA), como bem se entendeu na sentença recorrida.
Termos em que se acorda negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/8.
Lisboa, 20 de Agosto de 2008. - Miranda de Pacheco (relator) - Madeira dos Santos - Costa Reis (vencido conforme declaração junta)
VOTO DE VENCIDO
Está em causa neste recurso a bondade da decisão do Sr. Director Geral dos Impostos que, nos termos do art.° 63.° - B da LGT, autorizou que a Administração Tributária acedesse directamente aos documentos bancários do ora Recorrido, a qual foi motivada pela recusa deste em exibir os documentos necessários à fiscalização da sua actividade profissional ou em autorizar a sua consulta por forma a poder-se calcular a sua matéria tributável em sede de IRS.
Nos termos do citado normativo a Administração Tributária tem o direito de aceder directamente a informações e documentos bancários quando tal seja indispensável para fixar a matéria colectável do contribuinte e este se encontre sujeito a contabilidade organizada e se recuse a fornecer essas informações e a autorizar a consulta daqueles documentos [seu n.° 1, a)], sendo que a correspondente decisão de autorização deve ser devidamente fundamentada e é susceptível de recurso judicial (seus n.°s 2 e 3).
Deste modo, a recusa do ora Recorrido em autorizar aquela consulta só poderia ser sufragada se a mesma se fundasse na falta de fundamentação da decisão autorizativa ou se, a coberto da consulta de documentação bancária, se pretendesse violar o segredo profissional.
Ora, in casu, manifestamente, não se está perante nenhuma dessas razões de oposição.
Com efeito, e desde logo, é absolutamente evidente que a decisão do Sr. Director Geral dos Impostos ora em causa foi fundamentada de forma exaustiva e rigorosa e que dela resulta, claramente, que se verificavam, os pressupostos legais - quer os subjectivos, relativos ao ora Recorrido, quer os substanciais, relativos à situação objectiva ora em causa - que consentiam a prolação daquela decisão.
Como também é manifestamente evidente que a pretensão da Administração não abrangia a devassa do segredo profissional visto que o que se visava esclarecer respeitava unicamente ao montante dos rendimentos obtidos pelo contribuinte na sua actividade profissional nos anos 2004, 2005 e 2006 e não às relações estabelecidas entre este e os seus clientes. Ou seja, não estava em causa as relações sigilosas estabelecidas entre o profissional liberal e o cliente mas apenas e tão só o valor económico cobrado pelo Recorrido aos seus clientes.
Daí que nenhuma ilegalidade tivesse sido cometida pelo Sr. Director Geral dos Impostos ao proferir o despacho sob censura pelo que entendo que o recurso merecia provimento e a sentença recorrida deveria ser revogada.
Lisboa, 20 Agosto 2008.
Costa Reis