Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0447/13
Data do Acordão:05/08/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO DA LIQUIDAÇÃO
Sumário:A declaração de deserção da instância em anterior impugnação judicial de acto de liquidação, não obsta a que o contribuinte apresente um pedido de revisão dessa liquidação, ao abrigo do disposto no art. 78º da LGT e que, no seguimento de indeferimento expresso desse pedido de revisão, apresente impugnação deste acto de indeferimento, a tal não obstando igualmente o disposto nos arts. 289º do CPC e 332º do CCivil, já que a impugnação deduzida do indeferimento do pedido de revisão não se reconduz a nova acção apresentada no seguimento da absolvição da instância por força da mencionada deserção.
Nº Convencional:JSTA00068243
Nº do Documento:SA2201305080447
Data de Entrada:03/19/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:LGT ART78
CPPT99 ART95 N1 N2 D ART97
CPC ART289
CC ART332
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC551/12 DE 2012/11/28
Referência a Doutrina:DIOGO LEITE DE CAMPOS E OUTROS - LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA E COMENTADA 4ED PAG704 E SEGS
JORGE LOPES DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO VOLI 6ED PAG416-417
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A…………….., S.A., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, na impugnação judicial deduzida contra o despacho de indeferimento do pedido de revisão das liquidações de IRC relativas aos anos de 1999 e 2000, no montante de € 1.103.468,64, absolveu a Fazenda Pública, com fundamento na verificação da excepção de caducidade do direito de impugnar.

1.2. A recorrente termina as alegações concluindo da forma seguinte:
A – O facto de (por lapso do anterior mandatário da Recorrente, numa primeira impugnação) ter ocorrido uma deserção da instância que levou à extinção do processo sem apreciação do mérito da causa, não preclude o direito da Recorrente remediar esse lapso, apresentando um pedido de revisão de actos tributários (ao abrigo do art. 78º da LGT).
B – Nestes autos não interessa saber se se aplica o prazo de 30 dias (do art. 289º do CPC) ou o prazo de 2 meses (do art. 332º do C.Civil) para a propositura de uma segunda acção, quando a primeira haja findado por absolvição de instância. Mas foi essa a questão apreciada pela sentença recorrida.
C – O que está em causa é saber se a AT tem ou não o dever de apreciar um pedido de revisão de um acto tributário, quando ele seja formulado depois de decorrido o prazo de impugnação judicial desse mesmo acto; se esse dever cessa pelo facto de ter sido anteriormente apresentada uma impugnação, que haja findado sem uma decisão de mérito; e, em caso negativo, se pode impugnar-se judicialmente a decisão de indeferimento daquele pedido de revisão.
Respondendo a estas questões, a Recorrente considera que:
D – O artigo 78º da LGT impõe à AT o dever de revogar actos ilegais, não condicionando tal dever à circunstância de ter, ou não, decorrido o prazo de impugnação judicial, ou de o contribuinte ter instaurado (ou não) essa impugnação judicial.
E – É certo que, quando o contribuinte opte pela impugnação judicial, a AT está obrigada a respeitar o que o tribunal vier a decidir (devido à força obrigatória decorrente do caso julgado). Contudo, neste caso, a primeira impugnação não gerou caso julgado material, pois não chegou a haver decisão de mérito, devido à inusitada deserção da instância.
F – Por isso, o facto de ter transcorrido o prazo de reclamação graciosa e de impugnação judicial do acto de liquidação, não impede o contribuinte de pedir a revisão oficiosa e impugnar contenciosamente o acto de indeferimento desta.
G – Face ao exposto, não existia qualquer obstáculo a que a AT apreciasse o pedido de revisão oficiosa formulado pela Recorrente, nem havia impedimento a que o tribunal recorrido julgasse o mérito desta segunda impugnação, pois o mesmo não foi, até à data, objecto de qualquer decisão judicial.
H – Além disso, a Recorrente não merece ser penalizada – e privada do acesso à justiça – devido à conduta ineficiente do seu mandatário anterior. A Justiça deve fazer-se apesar das deficiências dos seus servidores...
I – Não existe qualquer obstáculo de direito positivo que impeça que esta segunda impugnação seja julgada, na medida em que visa reagir contra uma indevida recusa da AT em rever actos tributários ilegais, violando, ela sim, o disposto no art. 78º da LGT.
J – Pelo contrário, o art. 97º/1/d) do CPPT admite que se impugnem os actos administrativos em matéria tributaria que comportem a apreciação da legalidade do acto de liquidação, prevendo o nº 2 do mesmo preceito a impugnabilidade dos actos que não comportem tal apreciação.
K – Interpretar em sentido contrário os artigos 78º da LGT e 97º do CPPT é manifestamente incompatível com regras e princípios constitucionais, como o princípio da Justiça e do Estado de Direito, do acesso à justiça, da igualdade e da legalidade, que a AT tem de observar na globalidade da sua actividade (artigos 2º, 20º e 266º/2 da CRP e 55º LGT).
L – A douta sentença recorrida fez, assim, errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 78º da LGT e 97º do CPPT.
Revogando-a, pois, e substituindo-a por douto acórdão que determine a baixa do processo à primeira instância, para apreciação dos fundamentos da impugnação e da legalidade dos actos tributários impugnados, far-se-á Justiça.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer no sentido da procedência do recurso, nos termos seguintes:
«1. A…………….., Lda. vem interpor recurso da decisão proferida que julgou verificada a excepção de caducidade do direito de impugnar com base no disposto nos arts. 298º nº 3 do C.P.C., e 332º e 327º do C. Civil, disposições que aplicou, de acordo com o entendimento sobre a aplicação de tais normas tida por jurisprudência do S.T.J. que cita, em termos de, tendo-se frustrado em anterior impugnação de acto tributário decisão sobre o mérito por causa imputável à impugnante, não ser possível deduzir nova impugnação para além de 2 meses sobre a data em que na primeira se formou decisão caso julgado quanto à decisão proferida, de absolvição da instância.
2. Emitindo parecer sobre se outra decisão é de proferir com base no previsto nos arts. 55º, 78º da LGT, 97º do C.P.P.T., 2º, 20º e 266º nº 2 da C.R.P.:
No art. 55º da L.G.T. encontram-se expressos os princípios por que se tem de reger a administração tributária, nomeadamente, o de justiça que também se encontra consagrada nos art. 266º nº 2 da C.R.P..
E com base nos mesmos tem sido entendido não poder ser afastada pela lei ordinária solução que resulte consagrada na lei tributária.
Ora, o pedido de revisão oficiosa de actos tributários no art. 78º nº 1 da L.G.T. no prazo de 4 anos após a liquidação ou a todo o tempo enquanto o tributo não tiver sido pago, com o fundamento em erro dos serviços, o qual pode ser de facto ou de direito, e ser suscitado a pedido do contribuinte.
Aliás, a anulação das liquidações encontra-se também prevista no que respeita ao I.R.C., como é o caso, no art. 103º do respectivo Código, salvo no caso de montante diminuto e de ter já decorrido o prazo para a revisão oficiosa.
Por outro lado, o acto de indeferimento do pedido de revisão tem sido entendido como um acto lesivo, relativamente ao qual é de reconhecer autonomamente direito de impugnação ou de recurso, nos termos do art. 95º nºs. 1 e 2 al. d) da L.G.T. e 97º do C.P.P.T..
Acresce que foi decidido recentemente, embora em caso em que não tinha sido apresentada impugnação ou recurso da reclamação, que não é de recusar a referida possibilidade de revisão, com o argumento de poder, pelo menos, visar-se um fundamento diferente daquele com que se decidiu, acabando por se admitir a impugnação do acto proferido quanto à decisão proferida em revisão – nesse sentido se pronunciou o acórdão do S.T.A. de 28-11-2012, proferido no proc. 0551/12.
Crê-se que por maioria de razão assim é de entender no presente caso ao que não obsta o decidido na anterior impugnação, em que não chegou a conhecer do pedido.
Assim, o que foi decidido na anterior reclamação em recurso hierárquico, a 30-6-05, mantém um “carácter meramente provisório, até que esteja esgotado o prazo em que é permitida a revisão”, como defende o exm.º cons. Jorge Lopes de Sousa, em C.P.P.T., An. e Com., 2011, Áreas ed., vol. I, p. 417.
3. Concluindo, parece não ser de obstar a que se reconheça a impugnabilidade do acto que indeferiu o pedido de revisão, formulado em prazo em que é ainda possível a revisão, e sendo que o anteriormente decidido quanto ao pedido tem um carácter necessariamente provisório.
A ser de entender assim, como melhor parece, o recurso é de proceder, sendo de substituir a sentença recorrida por outra que determine o prosseguimento dos autos, se a tal nada mais obstar.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
a) Tendo a Administração Tributária (AT) procedido a uma acção inspectiva interna aos exercícios de 1999 e 2000, da agora impugnante, “A……………….., Lda.”, foram efectuadas correcções à matéria colectável do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) daqueles exercícios de acordo com o ínsito no quadro que faz folhas 4 do PA e que aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais;
b) Na sequência das correcções efectuadas, a AT liquidou, à impugnante, Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, referente aos exercícios de 1999 e 2000, no valor de 1.692.761,67 euros e 901.145,33 euros, respectivamente;
c) A agora impugnante apresentou reclamação graciosa das liquidações efectuadas dos exercícios referidos supra;
d) A impugnante deduziu recurso hierárquico, do indeferimento expresso das reclamações graciosas interpostas;
e) Por despacho de 30.06.2005, notificado à agora impugnante em 15.09.2005, foi o recurso hierárquico indeferido;
f) Do indeferimento do recurso hierárquico, referido na alínea anterior, foi deduzida impugnação judicial que correu termos sob o nº 1342/05.4BEBRG;
g) Como fundamento da impugnação judicial nº 1342/05.4BEBRG foi alegado a existência de erro nos pressupostos de facto e de direito;
h) Dada a falta de impulso processual, por banda da agora impugnante, a impugnação judicial nº 1342/05.4BEBRG foi julgada deserta em 18.11.2009, tendo-se absolvido da instância a Fazenda Pública;
i) Em 22.04.2010, a agora impugnante, requereu a revisão oficiosa dos actos de liquidação de IRC dos exercícios de 1999 e 2000, apresentando como fundamentação a invocada na impugnação nº 1342/05.4BEBRG;
j) Por despacho do Senhor Director Geral dos Impostos, de 26.07.2010, foi indeferido o pedido formulado na alínea i), dado não estarem verificados os pressupostos legalmente estabelecidos na alínea 78º a Lei Geral Tributária (LGT), para que o procedimento de revisão dos actos tributários por iniciativa da AT fosse instaurado;
k) A presente impugnação foi deduzida em 12.08.2010, tendo sido apresentados como fundamentos a existência de erro de facto e de direito, que já haviam sustentado a impugnação com o nº 1342/05.4BEPRT;

3.1. Enunciando como questão a decidir a de saber se é possível a dedução de impugnação judicial, após ter ocorrido «uma extinção da instância, por deserção, com absolvição de instância, de uma outra impugnação judicial onde as partes, o objecto e a maioria dos fundamentos da causa de pedir e o pedido eram idênticos», a sentença veio a concluir pela intempestividade da presente impugnação (excepção de caducidade do direito de impugnar e consequente absolvição da Fazenda Pública do pedido).
Para tanto considerou o seguinte:
- Esta impugnação foi deduzida como reacção ao indeferimento de um pedido de revisão oficiosa dos actos de liquidação de IRC dos anos de 1999 e 2000, sendo que os fundamentos aqui apresentados são idênticos aos de uma outra impugnação judicial – 1342/05.4BEBRG – deduzida contra o indeferimento do recurso hierárquico, que por sua vez tinha sido interposto do indeferimento das reclamações graciosas apresentadas das liquidações de IRC dos mesmos exercícios de 1999 e 2000.
- E saber se juridicamente existe a possibilidade de ser apreciada, de novo, a ilegalidade das liquidações de IRC efectuadas, depende da análise dos efeitos, sobre os presentes autos, da deserção da instância operada naquele processo nº 1342/05.4BEBRG e não menos importante, da absolvição da instância da Fazenda Pública, ali decretada, sendo que o caso julgado que se forma sobre a decisão judicial que declare quer a deserção, quer a absolvição da instância, terá que ser, nos termos do art. 672º do CPC, um caso julgado formal.
- Ora, atentando no disposto no nº 2 do art. 289º do CPC (alcance e efeitos da absolvição da instância) há que chamar à colação o disposto nos arts. 332º e 327º do CCivil (caducidade do direito de propor certa acção em juízo e absolvição da instância por motivo processual não imputável ao réu) é de concluir que (i) os efeitos civis derivados da propositura da acção e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível se a nova acção for intentada ou o réu for citado para ela dentro de 30 dias, a contar do transito em julgado da sentença de absolvição da instância, a menos que a lei civil disponha de forma diferente quanto à prescrição e caducidade (art. 289º, n° 2, do CPC) e (ii) da conjugação das arts. 289°, n° 2, do CPC, 332°, nº 1, e 327º, n° 3, ambos do CC, resulta que, no que à prescrição e caducidade diz respeito, os efeitos civis da propositura da acção mantêm-se nos dois meses seguintes à absolvição da instância, desde que essa absolvição por motivo processual não seja imputável ao titular do direito.
- E no caso vertente, resulta que é à impugnante que tem de ser imputada a causa para a frustração da obtenção de uma decisão de mérito, na 1ª impugnação deduzida, conforme resultou da al. h), da matéria de facto dada como provada, pelo que quanto à possibilidade de dedução de outra impugnação, após outra anterior deduzida onde as partes e o objecto foram as mesmas e onde existiu apenas uma decisão de forma, é de concluir pela inexistência de tal possibilidade.
- E assim, a presente impugnação é por demais intempestiva, dado a decisão de forma proferida na 1ª impugnação interposta – 1342/05.4BEBRG – ter sido proferida e ter transitado em julgado em 2009 e a presente impugnação ter sido deduzida apenas em 12/8/2010, ou seja, o prazo de caducidade de dedução para a apresentação da 2ª impugnação havia já decorrido, entretanto, de acordo com as normas e entendimento acima descrito.

3.2. Do assim decidido discorda a recorrente, alegando, como se viu, que o facto de ter ocorrido uma deserção da instância que levou à extinção do processo sem apreciação do mérito da causa, não preclude o direito de ela, recorrente, apresentar um pedido de revisão de actos tributários, ao abrigo do art. 78º da LGT, não se aplicando, portanto, nem o prazo de 30 dias referido no art. 289º do CPC, nem o prazo de 2 meses referido no art. 332º do CCivil, para a propositura de uma segunda acção, quando a primeira haja findado por absolvição de instância.
E acrescendo que, no caso vertente, a primeira impugnação nem sequer gerou caso julgado material, pois não chegou a haver decisão de mérito, devido à inusitada deserção da instância e, por isso, o facto de ter transcorrido o prazo de reclamação graciosa e de impugnação judicial do acto de liquidação, não impede o contribuinte de pedir a revisão oficiosa e impugnar contenciosamente o acto de indeferimento desta.
Esta é, portanto, a questão a decidir.
Vejamos.

4. Nos termos do disposto no nº 1 do art. 78º da LGT «A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.»
Sobre esta disposição legal ponderam Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (Lei Geral Tributária, Anotada e comentada, 4ª ed., 2012, ed. Encontro de Escrita, anotações 3 e 4 ao art. 78º, pp. 704 e ss.) que, podendo a revisão ser efectuada por iniciativa do contribuinte ou por iniciativa da AT e prevendo-se nos diversos códigos situações de revisão dos actos tributários a favor do contribuinte, com e sem fundamento em erro imputável aos serviços, bem como situações de restituição de tributos independentemente de anulação do acto tributário no que se refere ao IRC, a anulação das liquidações encontra-se também prevista no art. 103º do CIRC, salvo caso de montante diminuto e de ter já decorrido o prazo para a revisão oficiosa. E é também de salientar que «o dever de a Administração concretizar a revisão de actos tributários, a favor do contribuinte, quando detectar uma situação desse tipo por sua iniciativa ou do contribuinte, existe em relação a todos os tributos, pois os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, que a administração tributária tem de observar na globalidade da sua actividade (art. 266º, nº 2, da CRP e 55° da LGT), impõem que sejam oficiosamente corrigidos todos os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação de tributo em montante superior ao que seria devido à face da lei», havendo, portanto, «um reconhecimento no âmbito do direito tributário do dever de revogar de actos ilegais».
Mas este dever «sofre limitações, justificadas por necessidades de segurança jurídica, designadamente quando as receitas liquidadas foram arrecadadas, o que justifica que sejam estabelecidas limitações temporais», sendo que «a revisão do acto tributário tanto antes da vigência do CPT, como durante a sua vigência, como depois da LGT, constitui um meio administrativo de correcção de erros de actos de liquidação de tributos, que é admitido como complemento dos meios de impugnação administrativa e contenciosa desses actos, a deduzir nos prazos normais respectivos, que tem em vista possibilitar sanar injustiças de tributação tanto a favor do contribuinte como a favor da administração» e que, «Essencialmente, o regime do art. 78°, quando o pedido de revisão é formulado para além dos prazos de impugnação administrativa e contenciosa, reconduz-se a um meio de restituição do indevidamente pago, com revogação e cessação para o futuro dos efeitos do acto de liquidação, e não a um meio anulatório, com efeito de destruição retroactiva dos efeitos do acto.
A esta luz, o meio procedimental de revisão do acto tributário não pode ser considerado como um meio excepcional para reagir contra as consequências de um acto de liquidação, mas sim como um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação).
Trata-se de um regime reforçadamente garantístico, quando comparado com o regime de impugnação de actos administrativos, mas esse reforço encontra explicação na natureza fortemente agressiva da esfera jurídica dos particulares que têm os actos de liquidação de tributos.»
Por outro lado, o acto de indeferimento do pedido de revisão tem sido entendido como um acto lesivo, relativamente ao qual é de reconhecer autonomamente direito de impugnação ou de recurso, nos termos do art. 95º nºs. 1 e 2 al. d) da LGT e 97º do CPPT.
Ora, se «é de concluir que, o facto de ter transcorrido o prazo de reclamação graciosa e de impugnação judicial do acto de liquidação, não impede o contribuinte de pedir a revisão oficiosa e impugnar contenciosamente o acto de indeferimento desta» (Leite Campos et al., ibidem.) também, como refere o MP, tem vindo a entender-se que não é de recusar a possibilidade de revisão, com o argumento de poder, pelo menos, visar-se um fundamento diferente daquele com que se decidiu, acabando por se admitir a impugnação do acto proferido quanto à decisão proferida em revisão. (( ) Cfr., neste sentido, o acórdão desta Secção do STA, de 28/11/2012, proc. nº 0551/12.)
E no caso dos autos, por maioria de razão se há-de fazer apelo a tal entendimento, já que na anterior impugnação não chegou a conhecer-se do pedido e sendo que, o que foi decidido na anterior reclamação em recurso hierárquico, a 30/6/05, mantém, como salienta o sr. Cons. Jorge Lopes de Sousa, um «carácter meramente provisório, até que esteja esgotado o prazo em que é permitida a revisão» isto é, «até ao esgotamento do maior dos prazos de revisão previstos no art. 78º da LGT que for aplicável». (Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, vol. I, 6ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2011, p. 416 e 417, nota 7b) ao art. 44º.)
Porém, a sentença recorrida alheia-se totalmente quer do disposto no art. 78º da LGT, quer da circunstância de ser a decisão (indeferimento) do pedido de revisão que origina a presente impugnação.
Ora, conforme consta da al. j) do Probatório e dos autos também se constata (cfr. fls. 39 e ss. e 140 a 158 do PA anexo) tendo o pedido de revisão sido apresentado com base em que não estando pagos os impostos a que respeitam as liquidações o pedido de revisão está em tempo (cfr. o respectivo requerimento a fls. 39 e ss. do PA) e tendo tal pedido sido indeferido por despacho do sr. Director-Geral dos Impostos, de 26/7/2010, com fundamento em que não estarem verificados os pressupostos legalmente estabelecidos no nº 1 do art. 78º da LGT ou seja (i) a requerente não provou, nem no âmbito do procedimento de inspecção em sede do qual foram efectuadas as correcções aos resultados fiscais que originaram as liquidações colocadas em crise, nem em sede dos procedimentos subsequentes - reclamação graciosa e recurso hierárquico – que os custos em análise se apresentam indispensáveis para a obtenção dos proveitos sujeitos a tributação em sede de IRC ou para a manutenção da fonte produtora e (ii) também não se verifica a existência de qualquer erro imputável aos serviços nem as liquidações impugnadas padecem de quaisquer ilegalidades, não se vê que haja de apelar-se, como se pretendeu na sentença recorrida, às disposições dos arts. 289º do CPC e 332º do CCivil (como se disse, a sentença recorrida alheia-se totalmente quer do disposto no art. 78º da LGT, quer da circunstância de ser a decisão (indeferimento) do pedido de revisão que origina a presente impugnação; sendo precisamente em face deste circunstancialismo que temos por inaplicável a douta jurisprudência em que a sentença se respalda, tanto mais que, no caso, na primeira impugnação deduzida - 1342/05.4BEBRG – a deserção da respectiva instância implicou que nela não se apreciasse o mérito da impugnação.
Em suma, o facto de ter sido declarada a deserção da instância em anterior impugnação judicial de acto de liquidação, não obsta a que o contribuinte apresente um pedido de revisão dessa liquidação, ao abrigo do disposto no art. 78º da LGT e que, no seguimento de indeferimento expresso desse pedido de revisão, apresente impugnação deste acto de indeferimento, a tal não obstando igualmente o disposto nos arts. 289º do CPC e 332º do CCivil, já que a impugnação deduzida do indeferimento do pedido de revisão não se reconduz a nova acção apresentada no seguimento da absolvição da instância por força da mencionada deserção.
E, assim sendo, a sentença recorrida, ao julgar procedente a questão prévia da caducidade do direito à impugnação, enferma do erro de julgamento que a recorrente lhe imputa, por errada interpretação do disposto nos arts. 78º da LGT e 97º do CPPT, carecendo de ser revogada.

DECISÃO
Nestes termos acorda-se em, dando provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos à 1ª instância para prosseguimento dos autos com apreciação dos fundamentos da impugnação, se a tanto nada mais obstar.
Sem custas.
Lisboa, 8 de Maio de 2013. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco Rothes – Fernanda Maçãs.