Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0729/19.0BELSB
Data do Acordão:02/06/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES
CONFIDENCIALIDADE
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão do TCA confirmativo da sentença do TAF que intimara um instituto público a prestar informações sobre o «quantum» despendido pelo Estado com a aquisição de dois medicamentos, se as instâncias credivelmente explicaram que a cláusula de confidencialidade contratualmente prevista a respeito do preço deveria ceder perante o direito dos cidadãos à informação respectiva.
Nº Convencional:JSTA000P25558
Nº do Documento:SA1202002060729/19
Data de Entrada:01/20/2020
Recorrente:ACSS - ADMINISTRAÇÃO CENTRAL DO SISTEMA DE SAÚDE
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA SAÚDE E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
A Administração Central do Sistema de Saúde, IP (ACSS) interpôs esta revista do acórdão do TCA Sul confirmativo da sentença do TAC de Lisboa que condenara a recorrente a prestar à requerente A………., jornalista identificada no processo, a informação que esta lhe solicitara, no prazo de dez dias.

A ACSS pugna por uma melhor aplicação do direito.

A recorrida contra-alegou, defendendo a inadmissibilidade da revista.

Cumpre decidir.

Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA's não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150°, n.º 1, do CPTA).

«In hoc casu», a Administração recusou-se a informar a ora recorrida, que é jornalista, sobre o montante pecuniário despendido pelo Estado na aquisição de dois medicamentos para o tratamento de doentes com hepatite C.

A CADA dera razão à jornalista peticionante. E as instâncias seguiram o mesmo entendimento – pelo que o instituto aqui recorrente foi judicialmente intimado a prestar à recorrida tal informação, no prazo de dez dias («vide» a Lei n.º 26/2016, de 22/8).

Na sua revista, o recorrente insurge-se contra o aresto «sub specie»; e a fundamental objecção que lhe opõe prende-se com o facto do contrato de fornecimento dos fármacos integrar um acordo de confidencialidade – incidente sobre o preço – que salvaguarda um «segredo comercial» e cuja ofensa pelo Estado traz o risco do fornecedor retirar os medicamentos do mercado nacional.

Assim, o recorrente parece invocar um conflito de deveres – legais e contratuais – e ainda um risco prático.

Mas o acórdão recorrido pronunciou-se sobre o primeiro desses pontos em termos que, «primo conspectu», parecem exactos. Com efeito, e desde logo, é difícil que uma cláusula de confidencialidade quanto a preços configure um genuíno «segredo comercial»; depois, não seria aceitável que um acordo do género se sobrepusesse às leis gerais da República em sede da informação a prestar aos cidadãos e contribuintes – sob pena de assim se munir a Administração com um meio expedito para tornar opaco o que deve ser cristalino.

Quanto ao mencionado perigo ou risco, convém notar que ele não transparece seguramente da matéria de facto coligida nos autos.

Portanto, e em geral, as instâncias solucionaram o caso de forma unânime – e convergente com a posição da CADA – usando, ademais, um discurso coerente e plausível.

Por outro lado, o tipo de temática colocada nos autos – conexa com a prestação de informações – carece, em princípio, de complexidade e relevância justificativas da intervenção do Supremo. E essa ideia é transponível para o presente caso.

Deste modo, não se justifica que aqui subvertamos a regra da excepcionalidade das revistas.

Nestes termos, acordam em não admitir a revista.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 6 de Fevereiro de 2020. – Madeira dos Santos (relator) – Teresa de Sousa – Carlos Carvalho.