Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01276/12
Data do Acordão:06/18/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
NULIDADE DE CITAÇÃO
ILEGITIMIDADE
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
CONVOLAÇÃO
Sumário:I - A nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos do disposto no art. 204º do CPPT.
II - A nulidade por falta de requisitos essenciais do título executivo (falta que, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal – art. al. b) do nº 1 do art. 165º do CPPT) não constitui fundamento de oposição, não sendo enquadrável na al. i) do nº 1 do art. 204º deste mesmo Código.
III - A ilegitimidade da pessoa citada, por não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, a possuidora do bem que a originou, constituindo embora fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT, só pode verificar-se em relação aos tributos incidentes sobre o uso ou fruição dos bens. O que não acontece quando se executa dívida resultante de coima por infracção tributária.
IV - Ocorrendo erro na forma de processo, deve ordenar-se a convolação para a forma processual adequada, tendo em conta o efeito jurídico pretendido e os fundamentos de facto e de direito alegados.
Nº Convencional:JSTA00068307
Nº do Documento:SA22013061801276
Data de Entrada:11/20/2012
Recorrente:A............, LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART165 N1 B ART204 N1 I N2 B ART276 ART98 N4.
RGIT01 ART80.
RGCO ART59.
LGT98 ART97 N3
CPC96 ART199.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0187/2011 DE 2011/05/25.; AC STAPLENO PROC0803/04 DE 2007/02/28.; AC STAPLENO PROC0364/08 DE 2008/12/17.; AC STAPLENO PROC0923/08 DE 2010/02/24.; AC STA PROC0408/08 DE 2008/10/01.; AC STA PROC0812/09 DE 2009/11/25.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIII PAG144-145.
Aditamento:
Texto Integral: RELATÓRIO
1.1. A…………, Lda., com os demais sinais dos autos, recorre da decisão que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, rejeitou liminarmente a oposição à execução fiscal nº 3522201101177648 contra si instaurada no Serviço de Finanças de Oeiras – 3 para cobrança de taxas, coimas e custas liquidadas pelo Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, IP (INIR).

1.2. A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
I. A Meritíssima Juiz a quo proferiu a Douta sentença através da qual rejeitou liminarmente a oposição à execução fiscal, por força do preceituado na alínea b) do nº 1 do artigo 209º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (adiante apenas designado por CPPT).
II. Tal rejeição está intrinsecamente relacionada com a análise e decisão tomada no âmbito de duas questões, as quais delimitam o presente recurso, a saber:
c) A nulidade da citação, pois a descrição da dívida é ininteligível;
d) A ilegitimidade, uma vez que cedeu a sua posição no contrato de locação financeira relativa ao veículo com a matrícula ………….
III. Para a primeira das questões [acima identifica em 1.a)], considerou a Mmª Juiz a quo que “a nulidade da citação deve ser arguida no processo a que respeita, ou seja, no processo de execução fiscal”.
IV. Que dessa “arguição resultará necessariamente uma decisão do órgão de execução fiscal, da qual, sendo desfavorável, poderá o interessado deduzir reclamação a que aludem os artigos 276º e seguintes do CPPT”.
V. Concluindo que “o fundamento da petição apresentada não é de oposição à execução fiscal, nos termos delineados no artigo 204º, nº 1, do CPPT, e que deveria ter sido apresentado requerimento de arguição de nulidade junto do processo executivo”.
VI. Quanto à segunda questão [acima identificada em 1.b)], decidiu a Mmª Juiz a quo que “de acordo com a factualidade alegada, deveria a oponente ter utilizado outro meio processual para fazer valer a sua pretensão, recorrendo da decisão de aplicação de coima nos termos do 80º do RGIT ou tratando-se de infracção às normas estradais poderia a oponente ter recorrido judicialmente, nos termos do art. 59º do RGCO” (...)
VII. (...) “não pode agora em sede de oposição questionar a autoria do acto lícito, uma vez que a instauração da execução tem por base uma decisão definitiva proferida em processo de aplicação de coima”.
VIII. Ora, considera a Recorrente que a Mmª. Juiz a quo, ao decidir como decidiu, violou o artigo 204º, nº 1, alíneas b) e i), artigo 35º, nº 2, artigos 163º, 164º, todos do CPPT, indo assim o presente recurso delimitado às questões apreciadas pela Mmª Juiz e que conduziram à decisão de rejeitar liminarmente a oposição à execução.
IX. Da nulidade da citação, em consequência da violação do direito de defesa da aqui Recorrente.
O artigo 35º, nº 2 do CPPT estatui que a citação é o acto destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada.
X. Atento o facto da citação em questão ser emitida pelo Serviço de Finanças, estamos perante um documento que contem diminuta informação, que no caso concreto, apenas refere números e imprecisas palavras como sendo “imposto”, “INIR – Coimas”, “INIR – Custas” e “INIR – Taxas”.
XI. Como é bom de ver, a escassa informação não permite que a Executada, aqui Recorrente, possa exercer cabalmente a sua defesa, o que não se entende, isto porque, de acordo com o artigo 164º do CPPT, poderia o Serviço de Finanças juntar ao título executivo, se o entender necessário, uma nota que conste o resumo da situação que serviu de base à instauração do processo.
XII. De acordo com os argumentos aduzidos em sede de oposição, bem como a documentação que se encontra nos autos, facilmente se verificaria que o Serviço de Finanças não juntou o título executivo à citação.
XIII. O que o artigo 164º do CPPT refere é a prorrogativa conferida ao Serviço de Finanças de, caso quisesse, poderia ter juntado ao título executivo uma nota que resumisse a situação que serviu de base à instauração do processo executivo. É esta a faculdade conferida é a de adicionar alguma explicação, e não, a faculdade de querer ou não juntar o título executivo.
XIV. Não obstante o que antecede, ainda se dirá que à Recorrente nem sequer foi conferida a possibilidade de verificar se o título executivo continha ou não os requisitos essenciais elencados no artigo 163º do CPPT.
XV. Não tendo observado o título executivo, não pôde a Executada, aqui Recorrente, analisar o seu conteúdo, e no limite, pronunciar-se sobre o mesmo, se razões para isso existissem.
XVI. O mesmo equivale a dizer que, se o Serviço de Finanças não instruiu o processo executivo como estaria obrigado, a aqui Recorrente não pôde exercer a sua defesa, vendo assim vedado o seu direito ao contraditório, violando os mais elementos direitos, inclusivamente, consagrados constitucionalmente.
XVII. Discorda a Recorrente com os fundamentos utilizados na sentença recorrida, no que à nulidade da decisão concerne. Na verdade, atento o facto de a oposição à execução conter mais do que um argumento, até por uma questão de economia processual se entende que todos os motivos devessem ser invocados na mesma peça processual.
XVIII. Analisando os argumentos carreados até agora, mais considera a Recorrente que este fundamento encontra acolhimento no artigo 204º, nº 1, alínea i) do CPPT, motivo pelo qual, a oposição à execução, não deveria ter sido rejeitada liminarmente.
XIX. Caso os fundamentos da oposição à execução tivessem sido apreciados e não se tivesse inferido apenas de parte dos subtítulos, esta questão não estaria a ser discutida, pois a Mmª. Juiz a quo poderia ter decidido no sentido de à Executada ser dado conhecimento do título executivo que deveria, obrigatoriamente, (ter) acompanhado a citação enviada pelo Serviço de Finanças.
XX. Não pode o contribuinte, parte mais fraca da relação estabelecida com a máquina fiscal, sucumbir sem sequer se defender. E a Autoridade Tributária ao agir como agiu, castrou os mais elementares meios de defesa da Recorrente, impedindo-a de exercer o seu direito ao contraditório.
XXI. Atento o exposto, e pelos motivos supra indicados, entende a Recorrente que a sua oposição, deveria ter sido admitida, não se concordando com os fundamentos de recusa liminar da mesma.
XXII. Da rejeição liminar da oposição à execução, relativamente ao fundamento Ilegitimidade.
Conforme indicado em 3., a Mmª Juiz a quo rejeitou liminarmente a oposição à execução proposta pela Recorrente, por considerar que o argumento – Ilegitimidade – não tinha cabimento no processo.
XXIII. Também como referido, não concorda a Recorrente com tais fundamentos, considerando mesmo que ao decidir como decidiu, a Mmª Juiz violou o disposto no artigo 204º, nº 1, alínea b) do CPPT, senão vejamos.
XXIV. A Recorrente considera que é parte ilegítima por não ser a devedora originária, nem ter qualquer relação com os factos que presumivelmente deram origem ao processo executivo (a esse propósito veja-se o anteriormente dito porquanto, o Serviço de Finanças não juntou o título executivo à citação).
XXV. Concretizando, a Recorrente, em 15/02/2007 celebrou com o Deutche Bank, S.A. um contrato de locação financeira relativamente a um veículo automóvel com a matrícula ………….
XXVI. O referido contrato de locação financeira foi alvo de uma cessão da posição contratual, tendo figurado como locatária entre o período de 15/02/2007 e 15/02/2013 a sociedade comercial com a firma B…………, Lda.
XXVII. Ainda no ano de 2008 (28/11/2008) a Recorrente respondeu a uma carta remetida pela Via Verde de Portugal – Gestão de Sistemas Electrónicos de Cobrança, S.A., informando que já não tinha nenhum contrato que a relacionasse com o veículo em questão, assim como já não detinha a posse ou a condução efectiva do mesmo.
XXVIII. Não podia a Recorrente deixar de invocar a sua ilegitimidade nos presentes autos, pois sempre foi essa a sua defesa, a qual se encontra devidamente documentada. Tendo sido com surpresa que verificou, que este seu argumento faleceu com a decisão recorrida, ao considerar que não poderia, nesta fase processual, questionar a autoria do acto que subjaz ao processo executivo.
XXIX. Na verdade, é a própria alínea b) do nº 1 do artigo 204º do CPPT que permite que se fundamente a oposição à execução fiscal na ilegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor ou, sendo o que nele figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida.
XXX. Estamos perante uma situação de ilegitimidade passiva pois, mesmo que admitamos que a Recorrente figura no título executivo, a mesma não era a possuidora dos bens (veículo automóvel) que originaram a dívida exequenda.
XXXI. Ao decidir como se decidiu, foi a Recorrente sujeita a uma tremenda injustiça, desde logo por o processo executivo ter sido mal instruído e consequentemente alvo de uma citação deficiente. A acresce, a Recorrente foi ainda confrontada com a ausência de análise dos seus argumentos, os quais provam que não tem qualquer responsabilidade sobre a dívida exequenda
XXXII. Em face do que vem sido dito, e em reposição da justiça, está a Recorrente em crer que as questões alvo do presente recurso só serão sanadas com a revogação da sentença recorrida, ordenando-se a baixa do recurso para a primeira instância de molde a que as questões suscitadas na oposição à execução sejam apreciadas.
Termina pedindo a procedência do recurso e que, em consequência, seja ordenado que os presentes autos baixem à primeira instância de molde a que as questões suscitadas pela recorrente em sede de oposição à execução fiscal sejam apreciadas.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes, além do mais:
«A recorrente acima identificada vem sindicar a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, exarada a fls.188/191, em 28 de Junho de 2012.
A decisão recorrida rejeitou liminarmente a petição de oposição judicial, no entendimento de que as alegadas nulidade da citação e ilegitimidade por não ser a autora das contra-ordenações que determinaram as coimas exequendas não constituem fundamento de oposição à execução.
A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 209/215, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684º/3 e 685º-A/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.
A Fazenda Pública não contra-alegou.
Como muito bem refere a decisão recorrida os argumentos que a recorrente esgrime na PI conduzem à nulidade da citação e à impugnação da autoria e, consequente, responsabilidade pelo pagamento das coimas exequendas.
Ora, a nulidade da citação não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos do estatuído no artigo 204º do CPPT e deve ser arguida perante o órgão de execução fiscal (OEF) e não perante o Tribunal Fiscal. ((1) Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, volume III, páginas 144/145. Acórdão do STA, de 25 de Maio de 2011, proferido no recurso n.º 187/2011, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt.)
Efectivamente, o processo de oposição tem por escopo a extinção ou suspensão da execução fiscal, o que tem como consequência que na oposição apenas sejam aceites fundamentos que conduzam a esses objectivos, o que não é o caso da nulidade de citação que, a verificar-se justificaria a anulação dos actos subsequentes do processo.
Também, a nulidade por falta de requisitos essenciais do título executivo, que a recorrente nas suas conclusões dá entender que poderia ter acontecido, não constitui fundamento de oposição. ((2) Acórdão da SCT do STA, de 19 de Novembro de Novembro de 2008-P. 0430708, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt)
No que concerne à alegada ilegitimidade, pelo facto do veículo que esteve na génese das contra-ordenações/coimas não estar já ao seu serviço, na data das ocorrências, e, consequente irresponsabilidade pela autoria das contra-ordenações e pagamento das coimas, parece evidente que não pode ser discutida em sede de oposição fiscal.
De facto, essa questão só poderia ser discutida no âmbito do respectivo processo de contra-ordenação, podendo a recorrente interpor recurso judicial da decisão de aplicação de coima (artigos 80º do RGIT e 59º do RGCO), e nunca em sede de oposição à execução fiscal.
A sentença recorrida não merece, pois, qualquer censura.
Termos em que deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se a decisão recorrida na ordem jurídica.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. O despacho recorrido é do seguinte teor:
«A…………, Lda., com os demais sinais dos autos, deduziu oposição à execução fiscal nº 3522201101177648, que contra si corre termos no Serviço de Finanças de Oeiras – 3, tendo por objecto a cobrança coerciva de dívidas provenientes de taxas, coimas e custas, no montante de € 1.470,34 aplicadas pelo Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, IP (INIR).
Alega, em síntese:
- a nulidade da citação, pois a descrição da natureza da dívida é ininteligível;
- a ilegitimidade, uma vez que cedeu a sua posição no contrato de locação financeira relativa ao veículo com a matrícula ………….
Cumpre proferir despacho liminar.
Da nulidade da citação
A oposição à execução fiscal funciona como contestação à pretensão do exequente e respeita aos fundamentos supervenientes que podem tornar ilegítima ou injusta a execução, devido a falta de correspondência com a situação material subjacente no momento em que se adoptam as providências executivas, tendo por efeito paralisar a eficácia do acto tributário corporizado no processo executivo (cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 04/06/2008, processo nº 179/08, disponível em www.dgsi.pt).
Sendo certo que, os fundamentos da execução fiscal são os taxativamente indicados nas várias alíneas do nº 1 do artigo 204º do CPPT, a nulidade de citação invocada não consta do elenco daquele artigo.
A nulidade de citação deve ser arguida no processo a que respeita, ou seja no processo de execução fiscal.
Desta arguição resultará necessariamente uma decisão do órgão de execução fiscal, da qual, sendo desfavorável, poderá o interessado deduzir a reclamação a que aludem os artigos 276º e seguintes do CPPT.
Temos, pois, que o fundamento da petição apresentada não é de oposição à execução fiscal, nos termos delineados no artigo 204º, nº 1, do CPPT, e que deveria ter sido apresentado requerimento de arguição de nulidade junto do processo executivo.
Da ilegitimidade
Entende a oponente que é parte ilegítima na execução, não podendo ser responsabilizada pelo pagamento da dívida em execução uma vez que não era a oponente a utilizadora do veículo que passou nas portagens sem efectuar o respectivo pagamento. Está pois em causa saber quem efectivamente praticou a infracção que determinou a instauração da execução fiscal.
Da argumentação expendida pela oponente, ressalta que o que a oponente pretende é sindicar judicialmente as decisões do INIR que lhe aplicaram as coima em processo de contra-ordenação.
De acordo com a factualidade alegada, deveria a oponente ter utilizado outro meio processual para fazer valer a sua pretensão, recorrendo da decisão de aplicação de coima nos termos do artigo 80º do RGIT ou tratando-se de infracção às normas estradais poderia a ora oponente ter recorrido judicialmente, nos termos do art. 59º do RGCO.
Tendo a ora oponente sido notificada pelo INIR das decisões condenatórias proferidas e não tendo delas recorrido (Cfr. informação a fls. 172), não pode agora em sede de oposição questionar a autoria do acto ilícito, uma vez que a instauração da execução tem por base uma decisão definitiva proferida em processo de aplicação de coima.
Atenta a previsão contida na alínea b) do nº 1 do artigo 209º do CPPT, forçoso é de concluir pelo indeferimento liminar da Oposição que originou os presentes autos.
Decisão
Termos em que, atento o supra exposto, se rejeita liminarmente a presente oposição à execução fiscal, por força do preceituado na alínea b) do nº1 do artigo 209º do CPPT.
Custas a cargo da Oponente.»

3.1. Como resulta do despacho recorrido, acima transcrito, a presente oposição foi liminarmente rejeitada por se ter entendido que os fundamentos de oposição invocados (nulidade da citação e ilegitimidade por não ser a oponente a autora das contra-ordenações que determinaram as coimas exequendas) não constituem fundamento admissível de oposição à execução.
A recorrente discorda do decidido continuando a sustentar que:
1) Quanto à alegada «nulidade da citação» (Conclusões IX a XXI), atendendo a que a PI da oposição contém mais do que um argumento, é de entender, até por uma questão de economia processual, que todos os motivos devessem ser invocados na mesma peça processual. E além disso, este fundamento encontra acolhimento na al. i) do nº 1 do art. 204º do CPPT, motivo pelo qual, a oposição à execução, não deveria ter sido rejeitada liminarmente, sendo que, caso os fundamentos da oposição à execução tivessem sido apreciados a Mmª. Juiz a quo poderia ter decidido no sentido de à Executada ser dado conhecimento do título executivo que deveria, obrigatoriamente, ter acompanhado a citação enviada pelo Serviço de Finanças.
2) Quanto ao fundamento ilegitimidade (Conclusões XXII a XXXI), considera que é parte ilegítima por não ser a devedora originária, nem ter qualquer relação com os factos que presumivelmente deram origem ao processo executivo, pois que:
- Em 15/2/2007 celebrou com o Deutche Bank, S.A. um contrato de locação financeira relativamente a um veículo automóvel com a matrícula …………;
- O referido contrato de locação financeira foi alvo de uma cessão da posição contratual, tendo figurado como locatária entre o período de 15/2/2007 e 15/2/2013 a sociedade comercial com a firma B…………, Lda.
- Ainda no ano de 2008 (28/11/2008) respondeu a uma carta remetida pela Via Verde de Portugal – Gestão de Sistemas Electrónicos de Cobrança, S.A., informando que já não tinha nenhum contrato que a relacionasse com o veículo em questão, assim como já não detinha a posse ou a condução efectiva do mesmo.
- Não podia deixar de invocar a sua ilegitimidade nos presentes autos, sendo a própria al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT que permite que se fundamente a oposição à execução fiscal nessa ilegitimidade pois que, mesmo que admitamos que a recorrente figura no título executivo, a mesma não era a possuidora dos bens (veículo automóvel) que originaram a dívida exequenda.
Vejamos:

3.2. Da nulidade da citação
Como se vê da Petição Inicial, a recorrente alega ali que «rejeita … todo o conteúdo constante na citação remetida, por violar o direito ao exercício do contraditório quando, nem sumariamente, descreve os factos a que dizem respeito», que «rejeita … todo o conteúdo constante na citação remetida por a descrição da natureza da dívida ser ininteligível, em face de ausência de qualquer referência concreta à origem da coima», pelo que «deverá a citação … ser declarada nula, por violar o direito de exercício do contraditório da executada bem como, por se encontrar em falta um dos requisitos essenciais do título executivo, conforme al. b) do nº 1 do artigo 165º do Código de Processo e Procedimento Tributário».
Ora, como bem concluiu o despacho recorrido, a arguida nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos do disposto no art. 204º do CPPT, não estando abrangido, designadamente, na al. i) do nº 1 deste normativo e, como nulidade, sempre deveria ser invocada perante o órgão da execução fiscal, sendo eventual decisão desfavorável susceptível de reclamação para o tribunal tributário [nºs. 1 e 2 do art. 198º do CPC e art. 276º do CPPT); cfr., igualmente, o acórdão desta Secção do STA, de 25/5/2011, rec. nº 187/2011, bem como os acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 28/2/2007, rec. nº 803/04; de 17/12/2008, rec. nº 364/08; e de 24/2/2010, rec. nº 923/08 (No mesmo sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª ed., 2011, vol. III, anotação 13 ao art. 165º, pp. 144/145.)].
E, assim, não podendo tal alegação de nulidade da citação constituir fundamento de oposição (pois que o objecto desta é, essencialmente, a extinção ou, em certos casos, a suspensão da execução, e a nulidade da citação não conduz a esses objectivos já que, a verificar-se, justificaria apenas a anulação dos actos subsequentes do processo) não pode o recurso proceder nesta parte.
Nas Conclusões XII a XVI e XIX a recorrente dá a entender que também pretendeu alegar a nulidade por falta de requisitos essenciais do título executivo.
Porém, como é jurisprudência actualmente dominante, a nulidade por falta de requisitos essenciais do título executivo (falta que, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal – art. al. b) do nº 1 do art. 165º do CPPT) também não constitui fundamento de oposição, não sendo enquadrável na al. i) do nº 1 do art. 204º do mesmo CPPT (cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, de 19/11/2008, rec. nº 0430/08 e de 6/5/2009, rec. nº 0632/08).
Bem decidiu, portanto, o despacho recorrido, ao julgar que, quanto a esta matéria, o fundamento da petição apresentada não se subsume a fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos delineados no nº 1 do art. 204º do CPPT e que deveria ter sido apresentado requerimento de arguição de nulidade junto do processo executivo.

3.3. Da ilegitimidade
A recorrente alega, ainda, que o despacho recorrido enferma de erro de julgamento quanto ao não recebimento da oposição por referência ao alegado fundamento ilegitimidade da oponente pelo facto do veículo que esteve na génese das contra-ordenações/coimas não estar já ao seu serviço na data das ocorrências (por a oponente ter cedido a sua posição no contrato de locação financeira relativa ao veículo com a matrícula …………) e pela consequente irresponsabilidade pela autoria das contra-ordenações e pagamento das coimas.
Carece, porém, de razão legal.
Esta invocada ilegitimidade (da pessoa citada, por não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, a possuidora do bem que a originou) constituindo embora fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT, só pode verificar-se em relação aos tributos incidentes sobre o uso ou fruição dos bens.
O que não acontece com as coimas ora em execução.
Por um lado, as taxas de portagem não são originadas pela propriedade ou pela posse do veículo (em termos de ser essa posse que faz determinar o sujeito passivo daquela relação jurídica tributária, não obstante este, porventura, já não ser o proprietário ou o possuidor do veículo). A obrigação tributária nasce por via da utilização da via rodoviária (e não pela posse daquele veículo em especial). Por outro lado, a dívida exequenda reporta-se, não apenas às ditas taxas, mas, também às próprias coimas em que a oponente veio a ser condenada nos respectivos processos de contra-ordenação.
Ora, como salienta o MP, a exigibilidade destas quantias, rectius, os fundamentos da condenação no processo de contra-ordenação fiscal, só poderiam ser discutidos no âmbito do respectivo processo de contra-ordenação, podendo a recorrente interpor recurso judicial da decisão de aplicação de coima (arts. 80º do RGIT e 59º do RGCO), e nunca em sede de oposição à execução fiscal (cfr., entre outros, os acs. desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 1/10/2008, rec. nº 408/08 e de 25/11/2009, rec. nº 0812/09).
Em suma, a invocada ilegitimidade da oponente também não é subsumível ao fundamento de oposição constante da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT.

4. Mas, assim sendo e dado que, apesar de ter sido também alegado este fundamento «ilegitimidade», não pode, em rigor, sequer considerar-se que tenha sido invocado fundamento próprio do processo de oposição, então também não se vislumbra que haja obstáculo a que se ordene a convolação da Petição Inicial da oposição em requerimento, dirigido à execução fiscal, para arguição de nulidade da citação e nulidade por falta de requisitos essenciais do título executivo, sendo que o pedido formulado pela oponente é, nessa parte, precisamente, o de «ser a citação declarada nula sem qualquer efeito».
Na verdade, só não seria de convolar a petição de oposição em requerimento de arguição de nulidade, a apreciar no processo de execução fiscal, se para além da dita arguição de nulidade se invocasse um fundamento típico de oposição à execução fiscal.
Ocorre, portanto, erro na forma de processo, nos termos do disposto no nº 1 do art. 199º do CPC, uma vez que a autora indica para a acção uma forma processual inadequada ao critério legal, ou seja, lançou mão de uma forma de processo distinta da legalmente prevista para fazer valer a sua pretensão. Mas, porque os efeitos jurídicos pretendidos - nulidade do acto de citação e nulidade do processo de execução fiscal por falta de requisitos do título executivo - e os fundamentos de facto e de direito de que a recorrente os faz derivar se mostram adequados, não à forma processual eleita, mas a outra prevista na lei adjectiva, é de convolar a petição para este último meio processual (arts. 97º, nº 3 da LGT e 98º nº 4 do CPPT) utilizando-a como requerimento a juntar à execução fiscal, para aquele efeito.

DECISÃO
Nestes termos e com esta fundamentação, acorda-se em, dando provimento ao recurso, revogar o despacho de indeferimento liminar recorrido, convolando-se a petição inicial da oposição em requerimento dirigido ao OEF, de arguição de nulidade do acto de citação e nulidade do processo de execução fiscal por falta de requisitos do título executivo.
Sem custas.
Lisboa, 18 de Junho de 2013. - Casimiro Gonçalves (relator) - Francisco Rothes - Fernanda Maçãs.