Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0108/21.9BALSB
Data do Acordão:11/24/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
DECISÃO
FUNDAMENTO
TRÂNSITO EM JULGADO
Sumário:I - Um dos requisitos substanciais de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no art. 25.º do RJAT é o trânsito em julgado da decisão invocada pelo recorrente como fundamento, como resulta do disposto nos arts. 140.º, n.º 3 e 152.º do CPTA e 688.º, n.º 2, do CPC.
II - Não discutindo o recorrente os fundamentos em que assentou a rejeição do recurso pelo relator – i.e., a conclusão referida em I e que a decisão arbitral invocada como fundamento do recurso não transitou em julgado –, não pode proceder a reclamação que interpôs desse despacho para a conferência.
III - A alegada recusa do tribunal arbitral em certificar o trânsito em julgado das respectivas decisões não serve para que se permita ao recorrente, após o despacho que rejeitou o recurso, “substituir” a decisão invocada como fundamento.
Nº Convencional:JSTA000P28582
Nº do Documento:SAP202111240108/21
Data de Entrada:09/07/2021
Recorrente:A…………, LDA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Processo n.º 108/21.9BALSB
Recurso por oposição de acórdãos
Recorrente: “ A……………, Lda.”
Recorrida: AT - Autoridade Tributária e Aduaneira

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro e na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro ( Aplicável às decisões proferidas após 1 de Outubro de 2019, nos termos dos arts. 1.º, alínea m), 17.º e 26.º, n.º 1, da referida Lei.), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) em 17 de Junho de 2021, no processo n.º 504/2018-T, invocando oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com anterior decisão do CAAD, proferida em 26 de Abril de 2021, no processo n.º 372/2020-T.

1.2 Porque com o requerimento de interposição de recurso, a Recorrente não apresentou cópia da decisão invocada como fundamento, foi notificada pelo relator neste Supremo Tribunal Administrativo para apresentá-la, bem como comprovar o trânsito em julgado da decisão.
Em resposta a essa notificação, a Recorrente apresentou diversos documentos. Após consulta dos mesmos, bem como do Sistema Informático dos Tribunais Administrativos e Fiscais (SITAF), o Conselheiro relator proferiu despacho de não admissão do recurso por falta de trânsito em julgado da decisão invocada como fundamento. Isto porque, como ficou dito nesse despacho, «o recurso para uniformização de jurisprudência, entre outros requisitos de admissibilidade, exige o trânsito em julgado da decisão invocada pelo recorrente como fundamento, como resulta do disposto nos arts. 140.º, n.º 3 e 152.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 688.º, n.º 2, do Código de Processo Civil».

1.3 Notificada dessa decisão, vem a Recorrente dela apresentar reclamação para a conferência – reproduzindo os termos de requerimento anteriormente dirigido ao Relator, que ora se tem por prejudicado –, nos seguintes termos:

«1. No passado dia 4 de Outubro de 2021 a Recorrente apresentou requerimento dirigido ao Venerando Juiz Relator, que ainda não teve resposta.

2. Assim, à cautela e com a devida vénia, sendo esta Reclamação (para a conferência) a última oportunidade de a Recorrente ver apreciada o seu recurso, não poderia esta deixar de a apresentar aos autos.

Ora,

3. Concordando integralmente com o douto despacho em causa,

É, porém, imperativo expor o seguinte,

4. Existem cerca de 30 decisões arbitrais que poderiam fundamentar o presente recurso de uniformização de jurisprudência (pois o tema mediático – da cobrança isenta de IVA dos serviços de nutrição em ginásios – tem vindo a ser debatido e vencido, sucessivamente, pelos ginásios junto do CAAD contra a AT, com elevadíssima semelhança factual e igual enquadramento normativo entre todos aqueles processos e entre aqueles e o presente processo).

5. No entanto, para evitar o indeferimento liminar com base na não indicação de apenas um “acórdão”-fundamento específico (como tem vindo a ser jurisprudência pacífica do Supremo),

6. A Recorrente seleccionou o processo arbitral tributário n.º 372/2020-T, por parecer aquele que mais se aproximava (em termos factuais e jurídicos) da situação do processo recorrido. No entanto, qualquer uma daquelas cerca de 30 decisões arbitrais permitiriam o seu uso para efeitos deste recurso.

Acontece, também, que

7. A Recorrente, ao consultar qualquer uma dessas cerca de 30 decisões arbitrais, na base de dados pública do CAAD, não tem como descobrir se os mesmos já transitaram em julgado, sendo obrigado a requerer a certidão de cada processo para o determinar (e mesmo assim, como abaixo se escreve, tal não será suficiente).

8. Ademais, aquando do pedido da certidão do processo n.º 372/2020-T pela Recorrente, o CAAD pediu para visualizar e analisar o despacho deste douto tribunal, de 13 de Setembro de 2021 (referência SITAF n.º 002608394).

9. A Recorrente assim fez e remeteu àquela entidade o despacho deste douto tribunal, reforçando, por escrito, que este Supremo pedia “cópia da decisão arbitral e documento do CAAD a comprovar o respectivo trânsito em julgado” – conforme email que se junta como documento n.º 1.

10. Apesar da indicação do despacho e desta referência expressa, da parte do CAAD não indicaram que o processo não havia transitado em julgado e enviaram a documentação e certidão já junta aos autos.

11. Até esse momento a Recorrente também não sabia que o processo ainda não havia transitado em julgado, e incorreu em erro, ao ler a certidão, pois, sendo verdade que o ponto 5 da certidão refere ter sido comunicado ao CAAD uma impugnação judicial (que se verifica ter sido iniciada pela AT a 26 de Maio de 2021),

12. Não é menos verdade que o ponto 6, da mesma certidão, indica que a 9 de Junho de 2021 foi notificado à Requerida (AT) o arquivamento do processo,

13. Com a nota de que para a Recorrente não existe meio de descobrir o n.º do processo criado com a apresentação da impugnação judicial, pela AT, junto do TCA Sul (aliás, pela consulta da base de dados pública do CAAD não tem, sequer, como saber qual o nome do sujeito passivo do processo arbitral 372/2020-T).

14. Ora, não poderia a Recorrente saber, de antemão, se essa impugnação judicial havia prosseguido, ou se havia sido indeferida liminarmente e tal pudesse ter levado ao arquivamento referido, de 9 de Junho de 2021, pelo CAAD…

15. Mais indicou o CAAD que não emite certidão de decisões arbitrais transitadas em julgado, mas apenas certidão que relate o sucedido no processo e se já se alcançou a fase da apresentação e pagamento das custas de parte, como se este fosse um “ponto final” do processo – o que não corresponde necessariamente à verdade, pois a aqui Recorrente tem outro processo no CAAD que, após vencimento por aquela e pagamento das custas de parte pela AT, veio esta entidade apresentar impugnação judicial para o TCA Sul.

Consequentemente,

16. Está a Recorrente numa situação em que não tem meios para verificar quais daquelas cerca de 30 decisões arbitrais já transitaram em julgado, antes de as escolher como “acórdão”-fundamento,

17. Nem tem como saber, ao certo, se as decisões impugnadas judicialmente pela AT, tal como indicado nas certidões do CAAD, significam que os processos continuam a decorrer termos, ou se tais impugnações judiciais foram já decididas ou indeferidas e arquivadas.

18. Apesar de a Recorrente não estar a colocar, minimamente, em causa o proferido no despacho de não admissão do recurso (que foi doutamente decidido),

19. Existe, ainda assim, uma causa desculpabilizante do sucedido.

Nestes termos, e nos demais de Direito, requer-se, mui respeitosamente, a V. Venerandas Exas que tenham estes factos em consideração e permitam à Recorrente seleccionar outra decisão arbitral que seja utilizável como “acórdão”-fundamento no presente recurso, incorrendo a Recorrente nos custos necessários (pagando as certidões dos quase 30 processos ao CAAD, até que consiga certificar-se de que encontrou uma decisão arbitral efectivamente transitada em julgado)».

1.4 A Fazenda Pública não respondeu.

1.5 Cumpre apreciar e decidir em conferência do Pleno desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, como o impõem os n.ºs 2 e 3 do art. 692.º do Código de Processo Civil (CPC), subsidiariamente aplicável.


* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

Com interesse para a decisão a proferir, há que atentar nas seguintes circunstâncias processuais:

a) para notificação à ora Recorrente da decisão proferida em 17 de Junho de 2021 no processo com o n.º 504/2018-T – que julgou improcedente o pedido da Recorrente de declaração da ilegalidade das liquidações oficiosas de IVA referentes aos períodos de 201406T a 201512T e o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios–, o CAAD remeteu-lhe carta naquele mesmo dia;

b) por requerimento apresentado neste Supremo Tribunal em 6 de Setembro de 2021, a ora Recorrente veio deduzir recurso daquela decisão arbitral, ao abrigo do disposto no art. 25.º do RJAT, invocando contradição com a decisão proferida pelo CAAD em 26 de Abril de 2021 no processo com o n.º 372/2020-T;

c) porque com esse requerimento, a Recorrente não juntou cópia da decisão invocada como fundamento, foi ordenada pelo relator neste Supremo Tribunal Administrativo, mediante despacho proferido em 10 de Setembro de 2021, a sua notificação para apresentá-la e comprovar o trânsito em julgado da decisão;

d) em resposta a essa notificação, a Recorrente, em 24 de Setembro de 2021, apresentou diversos documentos;

e) em 29 de Setembro de 2021, o relator neste Supremo Tribunal Administrativo, proferiu despacho do seguinte teor:

«1. O presente recurso vem interposto para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) em 17 de Junho de 2021, no processo n.º 504/2018-T, invocando oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com anterior decisão do CAAD, proferida em 26 de Abril de 2021, no processo n.º 372/2020-T.
Porque com o requerimento de interposição de recurso, a Recorrente não apresentou cópia da decisão invocada como fundamento, foi notificada pelo relator neste Supremo Tribunal Administrativo para fazer essa apresentação e comprovar o trânsito em julgado da decisão.
Em resposta a essa notificação, a Recorrente apresentou, sem mais, os documentos que antecedem.

2. Compulsados esses documentos, verifico que os mesmos não só não comprovam o trânsito em julgado da decisão fundamento como, pelo contrário, permitem concluir, em conjugação com a consulta do SITAF, que essa decisão não transitou (1)(1 Deles consta que foi deduzida impugnação judicial dessa decisão para o Tribunal Central Administrativo Sul e a consulta do SITAF revela que essa impugnação judicial ainda não foi decidida). Aliás, não posso deixar de registar que a Recorrente omite qualquer referência ao trânsito em julgado, ou não, dessa decisão, antes pondo a cargo deste Supremo Tribunal Administrativo a tarefa de consultar a vasta documentação apresentada em ordem a tentar descortinar os elementos que permitam aferir da verificação do mesmo.
Ora, o recurso para uniformização de jurisprudência, entre outros requisitos de admissibilidade, exige o trânsito em julgado da decisão invocada pelo recorrente como fundamento, como resulta do disposto nos arts. 140.º, n.º 3 e 152.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 688.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
Assim, por falta de um dos requisitos substanciais de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência – qual seja o trânsito em julgado da decisão apresentada como fundamento (2) (2 Como ficou dito no recente acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Setembro de 2021, proferido no processo com o n.º 55/21.4BALSB, «nesta espécie de recurso jurisdicional, constitui conditio sine qua non de admissão, a conferência e assunção, de que, no momento da respectiva interposição, se mostrava transitada, passada, em julgado, a decisão fundamento») –, o recurso não pode ser admitido.

3. Em face do exposto, não admito o recurso.

Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça no mínimo»;

d) a Recorrente reclamou desse despacho para a conferência, nos termos referidos em 1.3.


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Vem a Recorrente pedir que recaia acórdão sobre o despacho do Relator que decidiu pela não admissão do recurso por o recurso para uniformização de jurisprudência, entre outros requisitos de admissibilidade, exigir o trânsito em julgado da decisão invocada pelo recorrente como fundamento, como resulta do disposto nos arts. 140.º, n.º 3 e 152.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) e 688.º, n.º 2, do CPC, requisito que, no caso, não se mostra respeitado.
A Recorrente começa por manifestar expressamente a sua integral concordância com o despacho reclamado (cf. arts. 3.º e 18.º do seu requerimento). Ou seja, a Recorrente não põe em causa que seja requisito do recurso para uniformização de jurisprudência o trânsito em julgado da decisão invocada como fundamento nem que a decisão arbitral por ela apresentada para fundamentar o recurso não transitou em julgado.
Pede, no entanto, que lhe seja concedida a possibilidade de «seleccionar outra decisão arbitral que seja utilizável como “acórdão”-fundamento» em ordem à apreciação do recurso, o que implicaria que o despacho sob reclamação fosse revogado. Para tanto, em síntese, alega que o CAAD não emite certidões de trânsito em julgado das respectivas decisões, nem indica os nomes dos intervenientes nos processos que correm ou correram termos por esse tribunal arbitral – o que também impede a indagação junto dos tribunais tributários estaduais sobre o destino das impugnações judiciais ou recursos interpostos daquelas decisões –, motivo por que não tem a Recorrente como saber se aquelas decisões transitaram, ou não, em julgado. Assim, apesar de haver cerca de 30 decisões arbitrais sobre a questão que ora pretende ver reapreciada, a Recorrente não tem como saber se e quais delas transitaram em julgado e, consequentemente, qual escolher como fundamento para efeitos de recurso para uniformização de jurisprudência, o que deve ser visto como «causa desculpabilizante do sucedido».
Termina a reclamação pedindo que se lhe permita «seleccionar outra decisão arbitral que seja utilizável como “acórdão”-fundamento no presente recurso, incorrendo a Recorrente nos custos necessários (pagando as certidões dos quase 30 processos ao CAAD, até que consiga certificar-se de que encontrou uma decisão arbitral efectivamente transitada em julgado)».
Vejamos, pois, se as alegadas dificuldades invocadas no requerimento sub judice podem determinar a revogação pela conferência do despacho do relator e a sua substituição por despacho que conceda à Recorrente a possibilidade de apresentar outra decisão arbitral como fundamento do recurso.

2.2.2 DA RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA

2.2.2.1 Antes do mais, não enfermando o despacho reclamado de ilegalidade alguma – como o reconhece expressamente a Recorrente – não encontramos motivo para a sua revogação, substituição ou alteração. Vejamos:
Pela própria natureza e definição, a figura jurídica de reclamação prevista no n.º 2 do art. 692.º do CPC, aplicável ex vi do art. 281.º do CPPT, constitui uma prerrogativa legal, de impugnação de algum dos actos decisórios enunciados no n.º 1 daquele art. 692.º, posta à disposição do recorrente que por ela se considere prejudicado, com vista à sua revogação, modificação ou substituição com base em violação da lei.
Ora, a Recorrente não assacou à decisão reclamada violação de lei alguma; pelo contrário, até manifestou a sua concordância com a mesma, o que basta para que a reclamação não possa ser julgada procedente.

2.2.2.2 Vejamos, no entanto, a alegação da Recorrente.
O recurso para uniformização de jurisprudência – dissemo-lo já – tem como um dos seus requisitos de admissibilidade o trânsito em julgado da decisão invocada pelo recorrente como fundamento, pois só a definitividade desta decisão assegura a existência da contradição que o recurso visa dirimir. Deve, pois, o recorrente, no requerimento de interposição do recurso, indicar o acórdão fundamento, assegurando-se previamente de que o mesmo transitou em julgado.
Verificando-se, como sucedeu no caso, que esse acórdão não transitou em julgado, o que determinou a rejeição do recurso, não é admissível a sua ulterior substituição por outro, como já decidiu este Supremo Tribunal, no recente acórdão do Pleno, proferido em 22 de Setembro de 2021, no processo 55/21.4BALSB ( Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/b5369742e85486cb80258759007bf96c.). Aí ficou dito:
«Quanto à requerida substituição da decisão arbitral fundamento […], é inviável, por uma dupla ordem de razões. Primeiro, a concessão de tal faculdade, do ponto de vista da paridade processual (Imposta, genericamente, pelo art. 4.º do CPC.), traduzir-se-ia na assunção de um tratamento mais favorável (de favor) à rte, destinado, apenas, a corrigir o erro que cometeu da indicação de uma decisão fundamento transitada em julgado, quando, aparentemente, existia, pelo menos, uma outra com a mesma virtualidade (oposição com a decisão, aqui, recorrida) e que cumpria o requisito, imprescindível, do trânsito (da definitividade). Segundo, permitir a pedida substituição, nesta fase do devir processual, implicaria, reflexamente, uma clara violação do disposto no art. 152.º n.º 2 do CPTA («A petição de recurso é acompanhada de alegação na qual se identifiquem, de forma precisa e circunstanciada, os aspectos de identidade que determinam a contradição alegada e a infracção imputada ao acórdão recorrido.») (e 690.º n.º 1 do CPC), pelo que, não podemos dar azo ao cometimento de uma, manifesta, ilegalidade (Não se olvide que, na actualidade, com o requerimento de recurso tem, obrigatoriamente, de ser contida ou junta a alegação do recorrente, sob pena de imediata rejeição (ou seja, sem lugar a qualquer convite ao aperfeiçoamento/correcção) – arts. 637.º n.º 2, parte inicial, e 641.º n.º 2 al. b) do CPC.).
Por fim, julgamos que, tudo, o entendido, neste aresto, não encerra qualquer violação do art. 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) […], pois, o acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva tem de concretizar-se, além do mais, no respeito, por parte dos interessados/requerentes, pela lei ordinária (infraconstitucional), que, neste caso, exige o trânsito em julgado da decisão que serve de fundamento (segundo indicação da estrita responsabilidade do recorrente)».
Salvo o devido respeito, a alegada recusa do CAAD em certificar o trânsito em julgado das respectivas decisões não tem a virtualidade de permitir que a Recorrente, após o despacho que rejeitou o recurso com fundamento na falta de trânsito em julgado da decisão invocada como fundamento, venha “substituir” esta decisão.
As consequências dessa recusa, a ter-se verificado, só poderão ser invocadas no âmbito das relações entre a ora Recorrente e o CAAD, não cabendo a este Supremo Tribunal, nesta sede, dirimir eventual conflito dela resultante.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Um dos requisitos substanciais de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no art. 25.º do RJAT é o trânsito em julgado da decisão invocada pelo recorrente como fundamento, como resulta do disposto nos arts. 140.º, n.º 3 e 152.º do CPTA e 688.º, n.º 2, do CPC.

II - Não discutindo o recorrente os fundamentos em que assentou a rejeição do recurso pelo relator – i.e., a conclusão referida em I e que a decisão arbitral invocada como fundamento do recurso não transitou em julgado –, não pode proceder a reclamação que interpôs desse despacho para a conferência.

III - A alegada recusa do tribunal arbitral em certificar o trânsito em julgado das respectivas decisões não serve para que se permita ao recorrente, após o despacho que rejeitou o recurso, “substituir” a decisão invocada como fundamento.


* * *

3. DECISÃO

Pelo exposto, acordamos em indeferir a reclamação e manter o despacho reclamado.

Custas pelo Reclamante, que decaiu na sua pretensão, fixando-se a taxa de justiça em uma UC (cf. arts. 527.º, 529.º, 530.º, 539.º, do CPC, art. 7.º, n.º 4, do RCP e Tabela II ao mesmo anexa).

Comunique-se ao CAAD.

Lisboa, 24 de Novembro de 2021. - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes ( relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Pedro Nuno Pinto Vergueiro - Anabela Ferreira Alves e Russo.