Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:044/08
Data do Acordão:04/16/2008
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:MIRANDA DE PACHECO
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL
DISPENSA DE COIMA
PREJUÍZO PARA A FAZENDA NACIONAL
Sumário:I – A exigência cumulativa feita na alínea a), n.º 1 do artigo 32.º do RGIT de que a prática da contra-ordenação fiscal não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária reporta-se a situações em que não chegou a produzir-se prejuízo antes de ocorrer a regularização da falta.
II – Tal não será o caso da declaração periódica do IVA ser entregue sem que seja acompanhada do respectivo meio de pagamento.
Nº Convencional:JSTA00064935
Nº do Documento:SA220080416044
Data de Entrada:01/15/2008
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF BRAGA PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - CONTRA ORDENAÇÃO.
Legislação Nacional:RGIT01 ART32 N1.
CIVA84 ART26 N1 ART40.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC26414 DE 2001/11/07.; AC STA PROC26216 DE 2002/02/06.; AC STA PROC25939 DE 2002/02/14.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA E OUTRO REGIME GERAL DAS INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS ANOTADO 2ED PAG280.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1- A…, com os sinais nos autos, vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga a fls. 68 e seguintes, que, concedendo parcial provimento ao recurso interposto do despacho do Director de Finanças de Braga, fixou a coima a pagar em €2892,82 por não ter entregue nos Cofres do Estado, no prazo legal, o IVA relativo ao mês de Julho de 2005, formulando as seguintes conclusões:
1. O Tribunal a quo ao decidir pela aplicação do nº 2 do art.º 32º do RGIT e consequente atenuação especial da coima violou normativo legal, designadamente o artº 32 nº 1 do RGIT.
2. Os factos considerados como provados são de natureza a integrar plena e cabalmente os requisitos fácticos exigidos para aplicação do art.º 32° nº 1 do RGIT.
3. Aliás, o Tribunal entregou-se a um exercício de aplicação dos factos ao direito, do qual resultou o preenchimento dos requisitos do nº 1 do referido preceito legal.
4. Não resulta qualquer circunstancialismo evidenciado na decisão que permita afastar a aplicação daquele normativo,
5. Pelo que não assiste razão alguma para preterir a aplicação daquele normativo que preconiza a dispensa total da coima, aplicando antes, pese embora sem qualquer sustentáculo o nº 2 do art.º 32º.
2- A recorrida Fazenda Pública não contra-alegou.
3- O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos:
«Recorrente: A…
Objecto do recurso: sentença que concedeu provimento parcial a recurso interposto de decisão de aplicação de coima pela autoridade administrativa no montante € 6.990,79
FUNDAMENTAÇÃO
No caso sub judicio, contrariamente ao entendimento preconizado pela recorrente, estava vedada ao tribunal a dispensa de aplicação de coima, por inverificação de um dos requisitos cumulativos que permitem a aplicação da medida (prática de infracção que não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária art. 32° n° 1 al. RGIT)
“(...) a exigência cumulativa de que a prática da infracção não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária não terá em vista referenciar os casos em que a regularização veio a ocorrer, com pagamento integral da quantia em dívida, mas sim, reportar-se às situações em que não chegou a produzir-se prejuízo, antes de ocorrer a regularizarão. Ter-se-ão em vista, assim, primacialmente, contra-ordenações não directamente conexionadas com o pagamento de prestação tributária (…)” (Jorge Lopes de Sousa RGIT anotado 2ª edição 2003 p. 280).
Em sentido consonante tem-se pronunciado o STA em jurisprudência consolidada, a propósito da aplicação de norma com redacção idêntica, constante do art. 116° al. a) LGT (acórdãos STA — Secção de Contencioso Tributário 14.02.2002 processo n°25939; 6.02.2002 processo n° 26216)
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento. A sentença impugnada deve ser confirmada.»
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
4- A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto:
- Em 01.10.2005 foi levantado o auto de notícia contra a arguida imputando-se-lhe, no essencial à prática de infracção pela falta de entrega nos Cofres do Estado, do imposto respeitante Julho de 2005 a qual tinha por data limite de cumprimento da obrigação em 31.08.2005.
- A recorrente deu entrada da declaração periódica de IVA relativa ao referido período em Julho de 2005, autoliquidando imposto pela importância de 28.928,18 €.
- A arguida foi notificada dos factos que lhe eram imputados e para apresentar a sua defesa.
- Por despacho de 02.02.2006 do Director de Serviços de Finanças de Braga foi fixada a coima de 6.990.79 € por não ter entregue o IVA de Julho de 2005 no valor de 28.928,18 €.
- A arguida procedeu ao pagamento do IVA em falta em 28.11.2005 acrescidos dos respectivos encargos legais.
- A arguida tem dificuldades financeiras provocadas pela falta de pagamento atempado dos seus clientes e não retirou benefício económico da infracção.
- A arguida foi notificada da decisão em 22.02.2006 tendo interposto o presente recurso.
- Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos constante dos autos
5- A recorrente defende, em suma, na sua alegação de recurso que, por estarem preenchidos os “requisitos fácticos para aplicação do artigo 32.º, n.º 1 do RGIT, razão alguma existiria para preterir a aplicação desse normativo e daí que a coima em que foi condenada não lhe deveria ter sido aplicada.
Estabelece o n.º 1 do artigo 32.º do RGIT:
Para além dos casos especialmente previstos na lei, pode não ser aplicada coima, desde que se verifiquem cumulativamente as seguintes circunstâncias:
a)a prática da infracção não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária;
b)estar regularizada a falta cometida;
c)a falta revelar um diminuto grau de culpa.
Não estando em causa as circunstâncias previstas nas alíneas b) e c), a questão decisiva a conhecer no recurso prende-se com a verificação no caso em apreço da prevista na alínea a).
Vejamos.
A este propósito escrevem Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos (Regime Geral das Infracções Tributárias, anotado, 2.º edição, pag. 280:
“Sendo assim, a exigência cumulativa de que a prática da infracção não ocasiona prejuízo efectivo à receita tributária não terá em vista referenciar os casos em que a regularização veio a ocorrer, com o pagamento integral da quantia em dívida, mas sim reportar-se às situações em que não chegou a produzir-se prejuízo antes de ocorrer a regularização.
Ter-se-ão em vista, assim, primacialmente, contra-ordenações que não estão directamente conexionadas com o pagamento da prestação tributária, de que são exemplo os casos de violação do segredo fiscal por negligência (artigo 115.º), falta ou atraso na apresentação de declarações que não tenham por fim permitir à administração tributária determinar, avaliar ou comprovar a matéria colectável ou a falta de exibição de dísticos (artigo 117.º), a falta de apresentação de livros de escrituração, antes da respectiva utilização (artigo 122.º) e a falta de nomeação de representantes (artigo 124.º).”
Analisando a situação “sub judicio”, decorre do probatório que a recorrente não entregou nos Cofres do Estado o imposto do IVA respeitante a Julho de 2.005, o qual tinha como data limite de cumprimento da obrigação 31-08-05, sendo certo que o pagamento em falta apenas veio a acontecer em 28-11-05.
Significa isto que a recorrente não fez acompanhar a declaração periódica do IVA do necessário meio de pagamento, violando o disposto nos artigos 26.º, n.º1 e 40.º do CIVA e ocasionando com a sua omissão prejuízo ao Estado, razão pela qual lhe foram exigidos juros de mora (fls 24).
Neste condicionalismo, importa concluir que não se mostra verificada a aludida circunstância prevista na alínea a), do artigo 32.º do RGIT (a prática da infracção não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária) e daí que bem se tenha andado no tribunal “a quo” ao aplicar uma coima à infracção cometida, embora especialmente atenuada à luz do n.º 2 do mesmo normativo-cfr, acórdãos de 7-11-01, 6-02-02 e 14-02-02, nos recursos nºs 26.414, 26.216 e 25.939, respectivamente.
Termos em que se acorda negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/6.
Lisboa, 16 de Abril de 2008. – Miranda de Pacheco (relator) – Jorge de Sousa – Jorge Lino.