Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0173/16
Data do Acordão:07/13/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
LIQUIDAÇÃO ADICIONAL
VALOR PATRIMONIAL TRIBUTÁRIO
IMPUGNAÇÃO
Sumário:I - Embora não seja possível invocar, na impugnação deduzida contra o acto de liquidação de IMT, vícios inerentes ao acto de avaliação e fixação do valor patrimonial tributário do imóvel transmitido, tal não impede que nela seja invocada e decidida a questão de saber se a administração tributária podia ter atendido - para efeitos de liquidação adicional deste imposto - a um valor patrimonial tributário que resultou de uma avaliação posterior à transmissão, efectuada na sequência da apresentação de declaração mod. 1 para efeitos de IMI, realizada numa altura em que o prédio já tinha sofrido profundas alterações e grandes melhoramentos concretizados após a transmissão, e na qual se atendeu apenas ao estado em que o prédio se encontrava no momento da avaliação.
II - Tal liquidação de IMT pode ser sindicada com base nessa eventual ilegalidade, porquanto o que verdadeiramente está em causa é a questão jurídica da produção de efeitos, em sede de outros impostos que não o IMI, das avaliações efectuadas no âmbito da avaliação imposta pelo Dec. Lei nº 287/2003, de 12.11, e traduz-se em saber se pode atender-se, para efeitos de liquidação adicional de IMT, a um valor patrimonial fixado numa avaliação posterior à transmissão e que, tendo sido realizada para efeitos de IMI, atendeu a uma realidade que não existia à data da transmissão.
Nº Convencional:JSTA00069805
Nº do Documento:SA2201607130173
Data de Entrada:02/18/2016
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF MIRANDELA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART134.
CIMI03 ART77 N1 ART130 N4 .
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença, proferida pelo TAF de Mirandela, que julgou procedente a impugnação judicial que A………….. deduziu contra os actos de liquidação adicional de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Prédios (IMT) referentes a três prédios urbanos que adquiriu no ano de 2007, no valor respectivo de € 1.302,03, de € 2.070,03 e de € 3.984,76.

Rematou as alegações do recurso com as seguintes conclusões:

1. Por via da douta sentença recorrida, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela decidiu anular as liquidações adicionais correctivas de IMT, relativas ao ano de 2007, por ter considerado que estas padeciam de ilegalidade consubstanciada na circunstância de o procedimento avaliativo que fixou os valores patrimoniais dos prédios, melhor identificados nos autos, ter tido por base uma realidade material substancialmente diversa daquela que se verificava ao tempo da aquisição dos mesmos pelo Impugnante.

2. No nosso ordenamento jurídico os actos de fixação de valores patrimoniais assumem a natureza de actos destacáveis para efeitos de impugnação contenciosa (artigo 134º do CPPT);

3. Assim, os vícios de que tais actos eventualmente padeçam apenas poderão ser arguidos, e conhecidos, em sede de impugnação desses actos de avaliação, e já não na impugnação do subsequente acto tributário de liquidação que com base naqueles venha a ser praticado;

4. Assim é porquanto a atribuição do cariz destacável aos sobreditos actos tem por fim, precisamente, a autonomização dos vícios deste para efeitos de impugnação contenciosa;

5. A avaliação para efeitos de IMI reporta-se à data do pedido de inscrição ou actualização do prédio na matriz (cf. artigo 37º, nº 4, do Código do IMI);

6. O Impugnante, notificado do resultado da avaliação - efectuada nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 27º do Decreto-Lei nº 287/2003, de 12 de novembro - na sequência da [1ª] aquisição de imóveis na vigência do IMI e da apresentação da competente declaração modelo 1 de IMI para inscrição e actualização do prédio na matriz — conformou-se com dito resultado, uma vez que não requereu, como era sua prerrogativa ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 76º do Código do IMI, a realização de uma segunda avaliação;

7. Em consequência da inacção revelada pelo sujeito passivo, consolidaram-se na ordem jurídica os valores patrimoniais apurados no âmbito do referido procedimento de avaliação;

8. Na sequência da notificação das liquidações impugnadas, o sujeito passivo apresentou reclamação graciosa e deduziu recurso hierárquico dos referidos actos, sendo ambos indeferidos;

9. Inconformado, o Impugnante apresentou a presente impugnação judicial em que reitera a invocação de idêntica causa de pedir, isto é, que a avaliação teve por base uma realidade diversa da que se verificava ao tempo da transmissão, com isso sustentando o pedido de anulação das liquidações adicionais de IMT;

10. Contrariamente ao entendimento abraçado na douta sentença recorrida, tal alegação não configura um vício endógeno dos actos de liquidação (praticados a jusante do procedimento de avaliação), mas sim [eventuais], ilegalidades que afectariam a validade do acto de fixação dos valores patrimoniais;

11. E porque, como vimos de dizer, tais actos detém no nosso ordenamento jurídico a natureza de actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, o seu conhecimento deverá ocorrer, em sede de impugnação do resultado da segunda avaliação (cf. nº 1 do artigo 77º do Código do IMI), o que naturalmente pressuporia que o sujeito passivo tivesse requerido a abertura do aludido procedimento, o que, como resulta dos autos, não aconteceu;

12. Contrariamente, então, ao decidido pelo Tribunal a quo, a pretensão do Impugnante não colide de todo em todo com a validade das liquidações adicionais impugnadas, mas apenas com a do procedimento avaliativo do qual resultou a fixação do valor patrimonial dos imóveis;

13. E se assim é, não sendo possível invocar, na impugnação da liquidação de IMT, vícios do precedente acto de avaliação, face à consolidação dos respectivos efeitos na ordem jurídica, não poderia o Mmº Juiz a quo ter conhecido e valorado tal matéria, uma vez que a mesma se encontrava consolidada na ordem jurídica e, consequentemente, subtraída ao seu conhecimento e juízo valorativo na presente instância impugnatória;

14. Pelo que a decisão recorrida, que declarou anuladas as liquidações impugnadas, não se deverá manter na ordem jurídica, por violação das disposições conjugadas dos artigos 37º, 76º e 77º todos do código do IMI, artigo 134º, nº 1, do CPPT, e artigo 277, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 287/2003, de 12 de novembro.».



1.2. A Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto junto do STA emitiu douto parecer no sentido de que deveria ser dado provimento ao recurso, por entender, em suma, que assiste razão à recorrente.


1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir em conferência.


2. Na sentença recorrida julgaram-se como provados os seguintes factos:

1. Em 12.01.2007 B………….. e mulher, na qualidade de primeiro outorgante, e o impugnante, na qualidade de segundo outorgante, celebraram escritura de compra e venda, na qual aqueles declararam vender pelo valor global de € 40.000,00, tendo este declarado comprar, três fracções autónomas correspondentes às inscrições matriciais 1212 (com valor patrimonial tributário de € 40.615,95), 1215 (com valor patrimonial tributário de € 61.244,64) e 1423 (com o valor patrimonial tributário de € 30.378,73) - Fls. 185 e ss. dos autos;

2. À data das transmissões referidas supra, todas as fracções estavam em bruto, com tijolos e massas à vista, com o chão em terra batida, incluindo no logradouro, sem quaisquer divisórias interiores, com excepção do escritório, que também estava em bruto – Fotografias juntas no doc. 1 junto com a p.i.; Depoimento das testemunhas C…………., D…………, E……….. e F…………;

3. Não existia saneamento básico e a fossa enchia com muita facilidade e frequência – Fotografias juntas no doc. 1 junto com a p.i.; Depoimento das testemunhas D……….., E……….. e F……………;

4. O prédio em causa está situado numa via estreita e sem saída, onde não é possível fazer manobras de inversão de marcha e inserido numa zona escondida de uma área de habitação social onde apenas residem famílias com fracas condições económicas – Fotografias juntas no doc. 1 junto com a p.i.; Depoimento das testemunhas C…………., D…………, E……….. e F……………..;

5. O impugnante procedeu ao pagamento de IMT com base no valor patrimonial que os prédios tinham na altura, com referência ao montante de € 132.239,32 – Doc. 1 junto com a p.i.;

6. Em 23.01.2007 foram apresentadas em nome do impugnante três declarações modelo 1 de IMI para avaliação dos prédios referidos supra – Fls. 195, 202 e 209 dos autos;

7. A 20.06.2007 a Administração Tributária procedeu à avaliação dos prédios tendo apurado o seguinte valor patrimonial tributário:

Relativamente ao prédio inscrito no número 1423: - 50.410,00€.
Relativamente ao prédio inscrito no número 1212: - 73 060,00€.
Relativamente ao prédio inscrito no número 1215: - 101.920,00€

8. O impugnante foi notificado da avaliação efetuada, por carta registada com a/r, tendo assinado os respetivos a/r’s a 4.07.2007;

9. O impugnante foi notificado da liquidação adicional resultante de avaliação relativa ao prédio urbano U-001423-A, efectuada a 2.09.2007 e com data limite de pagamento a 30.04.2008, no valor de 1.302,03€ - Doc. 1 junto com a p.i.;

10. O impugnante foi também notificado da liquidação adicional resultante de avaliação relativa ao prédio urbano U-001215-A, efectuada a 02.09.2007, com data limite de pagamento a 31.01.2008, no valor de 768,00€ - Doc. 1 junto com a p.i.;

11. O impugnante foi ainda notificado da liquidação adicional resultante de avaliação relativa ao prédio urbano U-001212-A, efectuada a 02.09.2007, com data limite de pagamento a 31.01.2008, no valor de 3.984,76,00€ - Doc. 1 junto com a p.i.;

12. O impugnante apresentou reclamação graciosa;

13. A reclamação graciosa foi indeferida com o seguinte fundamento:

14. «A reclamação tem por base o exagero do VT atribuído ao imóvel. O SP foi notificado nos termos do art. 76º do CIMI, para no prazo de 30 dias requerer uma 2ª avaliação caso não concordasse com o mesmo, o que não fez. A reclamação do IMT não é o meio próprio para questionar o VT atribuído ao prédio. Só poderá reclamar do VT decorridos 3 anos (nº 4 art. 130º CMI)».

15. O impugnante apresentou recurso hierárquico;

16. Foi negado provimento ao recurso com base no fundamento de que não tendo o impugnante, apesar de notificado, pedido 2ª avaliação, o valor patrimonial dos prédios se tornou definitivo, não podendo agora o impugnante colocar em causa esse valor em sede de impugnação da liquidação do IMT;

17. Os prédios referidos em 1) foram objecto de profundas alterações e grandes melhoramentos entre a data das aquisições e o momento da avaliação;

18. Na data em que ocorreram as avaliações referidas em 3) quem foi proceder à avaliação deparou-se com um contexto completamente diferente daquele que se verificava à data em que ocorreram as transmissões;

19. Nessa data existiam instalações apresentáveis, com tectos falsos, paredes com azulejos, o chão pavimentado, uma casa de banho de qualidade, um escritório bem equipado.


3. A questão a decidir no presente recurso jurisdicional, cujo objecto e âmbito se encontra delimitado pelas conclusões da alegação de recurso, consiste unicamente em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento em matéria de direito ao ter julgado improcedente a questão, suscitada pela Fazenda Pública na sua contestação, relativa à inimpugnabilidade dos actos de liquidação impugnados (IMT) face à ausência de oportuna impugnação do valor patrimonial tributário fixado na avaliação que aos prédios foi realizada na sequência da 1ª aquisição na vigência do IMI (aquisição essa efectuada pelo impugnante) e da apresentação da competente declaração modelo 1 de IMI.

Com efeito, pese embora a Fazenda Pública tenha invocado a impossibilidade de o sujeito passivo discutir neste processo de impugnação – que tem por objecto liquidações de IMT referentes a prédios que adquiriu em Janeiro de 2007 – o valor patrimonial tributário que posteriormente foi fixado aos prédios em avaliação efectuada para efeitos de IMI, com o argumento de que os actos de fixação de valores patrimoniais assumem a natureza de actos destacáveis para efeitos de impugnação contenciosa, em conformidade com o disposto no art. 134º do CPPT, não podendo os vícios de que tais actos eventualmente padeçam ser arguidos na impugnação deduzida contra os actos de liquidação, o certo é que tal questão foi julgada improcedente na sentença com a seguinte e essencial motivação:

«É certo que, uma vez consolidado o ato de fixação do valor patrimonial tributário esse valor patrimonial tributário se estabiliza durante 3 anos (artigo 130º nº 4 do CIMI). Assim, o contribuinte que não tenha reagido ao ato de fixação do valor patrimonial tributário, não poderá invocar a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade do ato de fixação do valor patrimonial tributário
Analisado o pedido e a causa de pedir formulados pelo impugnante, afigura-se ser de improceder a questão prévia em apreço.
Na verdade, o impugnante não vem invocar a ilegalidade do ato de fixação do valor patrimonial tributário, mas o facto de as liquidações terem tido por base uma avaliação que foi efetuada já depois de uma profunda alteração aos imóveis.
É suficiente analisar os artigos 8º e segs. da p.i. para perceber que embora aparentemente a impugnação, numa primeira análise, pareça dirigir-se contra os atos de fixação do valor patrimonial tributário, o que está verdadeiramente em causa é uma ilegalidade própria das liquidações, as quais, no entender do impugnante, não poderiam ter tido por base atos de fixação de valor patrimonial de imóveis após uma profunda alteração dos mesmos.
Assim, improcede a questão prévia em causa.».

Após tal decisão de improcedência da questão prévia suscitada, o Mmº Juiz passou ao conhecimento de mérito da acção, tendo julgado procedente a impugnação e anulado as liquidações por ter julgado que assistia razão os impugnante, na medida em que para efeitos de IMT se deve tomar em consideração o «valor patrimonial tributário do imóvel no estado em que se encontrava na data do acto ou facto translativo, e não na data em que encontrava no momento em que é realizada a avaliação, pois «o momento relevante para efeitos da constituição e determinação da obrigação tributária em sede de IMT é o momento da transmissão», e, contudo, dos factos provados resulta que «a avaliação não se reporta à realidade dos imóveis aquando do momento de aquisição, momento em que se constitui a obrigação tributária de IMT, mas a uma realidade substancialmente diferente. Assim, os atos de liquidação impugnados não podem manter-se. // Repare-se que o facto de o impugnante não ter solicitado 2ª avaliação não obsta à procedência da ação. O impugnante foi notificado de uma avaliação que se reportava a 20.06.2007 concordou com a mesma, por entender que essa era a realidade dos imóveis à data. Porém a Administração Tributaria tomou em consideração uma avaliação realizada sobre uma realidade substantivamente diversa e liquidou adicionalmente IMT como se os imóveis transmitidos se encontrassem a 12.01.2007 no mesmo estado em que se encontravam a 20.06.2007.»

A Fazenda Pública, ora recorrente, limita-se a atacar o julgado no que toca à decidida questão prévia, relativa à inimpugnabilidade dos actos de liquidação de IMT face à ausência de oportuna impugnação do acto de fixação valor patrimonial tributário dos imóveis, não refutando minimamente o julgado no que toca à apreciação e decisão da questão de mérito.

Na sua óptica, e contrariamente ao entendimento acolhido na sentença, a ilegalidade invocada pelo impugnante constitui uma ilegalidade do acto de fixação do valor patrimonial dos prédios transacionados, e porque esse tipo de acto «detém no nosso ordenamento jurídico a natureza de actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, o seu conhecimento deverá ocorrer, em sede de impugnação do resultado da segunda avaliação (cf. nº 1 do artigo 77º do Código do IMI), o que naturalmente pressuporia que o sujeito passivo tivesse requerido a abertura do aludido procedimento, o que, como resulta dos autos, não aconteceu». Razão por que advoga que, contrariamente ao decidido, «a pretensão do Impugnante não colide de todo em todo com a validade das liquidações adicionais impugnadas, mas apenas com a do procedimento avaliativo do qual resultou a fixação do valor patrimonial dos imóveis» e «não sendo possível invocar, na impugnação da liquidação de IMT, vícios do precedente acto de avaliação, face à consolidação dos respectivos efeitos na ordem jurídica, não poderia o Mmº Juiz a quo ter conhecido e valorado tal matéria, uma vez que a mesma se encontrava consolidada na ordem jurídica e, consequentemente, subtraída ao seu conhecimento e juízo valorativo na presente instância impugnatória».

Consideramos, todavia, que não lhe assiste razão e que bem andou o Mmº Juiz do tribunal a quo ao interpretar a causa de pedir gizada na p.i. nos termos em que o fez.

A ilegalidade que o impugnante invoca resulta, essencialmente, do facto de a administração tributária ter atendido, para efeitos de liquidação adicional de IMT (imposto cuja função é tributar a riqueza mobilizada pelo adquirente), ao valor patrimonial tributário fixado numa avaliação realizada muito depois da transmissão dos prédios adquiridos e numa altura em que estes já tinham sofrido profundas alterações e grandes melhoramentos. Na óptica do impugnante, e que, aliás, obteve acolhimento pelo julgador, tais liquidações adicionais de IMT podem ser sindicadas com base na sua eventual ilegalidade por se terem alicerçado num valor patrimonial tributário fixado em avaliação que se deteve sobre uma realidade substancialmente diferente daquela que existia à data da transmissão (momento em que se constitui a obrigação tributária de IMT).

Não está, assim, em discussão, a avaliação em si, realizada em Junho de 2007 na sequência da apresentação de declaração modelo 1 para efeitos de IMI e que incidiu sobre a estrutura física dos prédios nesse momento (avaliação com a qual o proprietário pode até concordar para efeitos de IMI, tendo em conta as condições do prédio nessa data), nem está em discussão o valor patrimonial tributário que dela resultou, mas, antes, a questão de saber se, para efeitos de liquidação de outro imposto (IMT) se pode atender, como se atendeu, ao valor patrimonial fixado na avaliação efectuada na sequência de apresentação de declaração mod. 1 de IMI e que não considerou o estado em que se encontravam os prédios à data da sua transmissão onerosa.

No fundo, o que está em discussão é a questão jurídica da produção de efeitos, em sede de outros impostos que não o IMI, das avaliações de prédios efectuadas no âmbito da avaliação imposta pelo Dec. Lei nº 287/2003, de 12.11, e que se traduz em saber se pode ou não atender-se, para efeitos de liquidação adicional de IMT, ao valor patrimonial fixado em avaliação posterior à transmissão, efectuada na sequência da apresentação de declaração mod. 1 de IMI, nas situações, como a dos autos, em que o prédio sofreu profundas alterações e grandes melhoramentos entre a data da transmissão e o momento da avaliação.

Independentemente da viabilidade de êxito ou procedência desta questão jurídica, não podemos deixar de concluir que ela pode ser invocada e deve ser apreciada e decidida na impugnação deduzida contra o acto de liquidação de IMT.

Neste contexto, e visto que a recorrente não atacou, neste recurso, o decidido quanto ao mérito da impugnação, isto é, quanto à julgada verificação da referida ilegalidade, vedado está ao STA apreciar a bondade do julgado nessa parte.

Termos em que, sem necessidade de mais considerações, não pode obter provimento o recurso.


4. Pelo exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 13 de Julho de 2016. - Dulce Manuel Neto (relatora por vencimento) – Ascensão LopesAna Paula Lobo, vencida segundo voto que anexo.



RECURSO JURISDICIONAL.
DECISÃO RECORRIDA – Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela
.17 de junho de 2015


VOTO de VENCIDA

Não acompanho a decisão que logrou vencimento, pelas seguintes razões:
A sentença recorrida identificou como questão a decidir: saber se as liquidações de IMT são ilegais porque se baseiam numa realidade distinta daquela que existia à data da transmissão, vindo a concluir pela sua ilegalidade uma vez que ficou amplamente provado que os imóveis adquiridos à data da transmissão tinham condições substancialmente diversas e de inferior valor de mercado que aquele de que dispunham à data da avaliação.
Tomou conhecimento do objecto da impugnação não obstante haver sido suscitada a questão de inimpugnabilidade dos actos de liquidação dada a ausência de impugnação do valor patrimonial tributário fixado na avaliação, aderindo à posição do impugnante de que nem todas as questões suscitadas na p.i. ficavam prejudicadas em resultado da questão prévia suscitada.
Porém as questões apreciadas pela sentença recorrida reportam-se única e exclusivamente à verificação da desconformidade entre o valor atingido na avaliação face a um imóvel terminado e dotado de infraestruturas e o valor que os mesmos bens teriam no momento em que o impugnante os adquiriu quando se apresentavam num estado de utilização rudimentar que antecederam a realização das concretas obras indicadas na matéria de facto, estas, face à legislação que regula a avaliação de prédios urbanos para determinação do valor patrimonial tributário, de todo insusceptíveis de introduzir, por si só, qualquer alteração no resultado da avaliação do imóvel, tivesse ela tido lugar no momento em que o contribuinte adquiriu os imóveis, ou posteriormente.
Como claramente refere o Magistrado do Ministério Público no seu parecer o Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis foi calculado, nas liquidações adicionais tendo em conta o valor tributário resultante da avaliação de que foram objecto os imóveis posteriormente à sua transmissão, a primeira ocorrida na vigência do CIMI, nos termos do disposto no art. 15.º, n.º 1 do DL 287/2003, de 12 de Novembro.
O impugnante notificado do resultado da avaliação não requereu segunda avaliação nem deduziu impugnação, sendo certo que entende que o valor fixado enferma de erro sobre os pressupostos de facto, deixando assim que se consolidasse na ordem jurídica, pelo período de três anos o VPT.
Dada a desconformidade entre o valor patrimonial tributário anterior e o que resultou da avaliação, a Administração Tributária procedeu a liquidação adicional do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis em falta, que neste momento é insindicável em sede de impugnação judicial do acto de liquidação com os fundamentos invocados nesta impugnação, exclusivamente atinente a erro sobre os pressupostos de facto do acto avaliativo.
Entendo, pois, que a sentença recorrida, que assim não concluiu enferma de manifesto erro de julgamento, a determinar a sua revogação.

(Processado e revisto pela relatora
com recurso a meios informáticos (art.° 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi art° 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).


Lisboa, 13 de Julho de 2016.
Ana Paula Lobo.