Sentença de Julgado de Paz
Processo: 106/2018-CRS
Relator: ELISA FLORES
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRA CONTRATUAL
Data da sentença: 08/31/2018
Julgado de Paz de : CARREGAL DO SAL
Decisão Texto Integral:

SENTENÇA
RELATÓRIO
A, propôs contra B, Companhia de Seguros SA, a presente ação declarativa, enquadrada na alínea h) do nº 1 do art. 9.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, pedindo que a demandada seja condenada a pagar-lhe as importâncias de € 2 664,12, referente à reparação do veículo de matricula 00-00-00, € 64,00 relativo à certidão do acidente e € 2 732,52 correspondente ao dano de privação do veículo, tudo no valor global de € 5 460,64 (cinco mil quatrocentos e sessenta euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento, bem como as custas por a elas ter dado causa.
Para o efeito, alegou os factos constantes do requerimento inicial de fls. 4 a 11 e juntou vinte e nove documentos, que aqui se dão por reproduzidos.
A demandada contestou por impugnação nos termos constantes de fls. 69 a 82 dos autos.
Juntou cinco documentos, que também se dão por reproduzidos.
O litígio não foi submetido a Mediação.
Na Audiência de Julgamento ambas as partes apresentaram prova testemunhal.
Fixo o valor da ação em € 5 460,64 (cinco mil quatrocentos e sessenta euros e sessenta e quatro cêntimos).
O artigo 60º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, na sua alínea c), prescreve que do conteúdo da sentença proferida pelo juiz de paz faça parte uma sucinta fundamentação.
Assim:
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Consideram-se provados, com interesse para os presentes efeitos, os seguintes factos:
1.º- No dia 02 de Janeiro de 2018, pelas 18h05mm, circulava o demandante ao volante da sua viatura, marca K, de matrícula 00-00-00, ligeiro de passageiros, pela via denominada, Rua F, G, também designada Estrada Nacional 000, no sentido Centro - G em direção a H;
2.º- Por sua vez, o veículo ligeiro de passageiros de marca I, modelo ---, com a matrícula 11-11-11, propriedade de C- Sociedade Unipessoal, Lda., e, na ocasião conduzido por D, seguia na Rua E, pretendendo o seu condutor aceder à Rua F no entroncamento das vias;
3.º- A Rua F é uma das vias estruturantes de G, atravessando a povoação e permitindo a ligação do trânsito que se desloca no sentido H para J ou para L;
4.º- Esta Rua, via principal onde entronca a Rua do M, entre outras ruas, tem um perfil em reta, com o pavimento empedrado numa largura de 6,20 metros, sendo ladeada por passeios pavimentados;
5.º- O trânsito processa-se em ambas nos dois sentidos de circulação, estreitando a faixa de rodagem na parte ascendente da Rua do M, próximo do cruzamento;
6.º- O limite de velocidade em ambas as ruas é de 50 km/h;
7.º- No acesso à intersecção das vias não existe qualquer sinalização de cedência de passagem (quer BI - cedência de passagem, quer B2 - paragem obrigatória no cruzamento ou entroncamento);
8.º- A Rua do M é uma via com uma subida íngreme no sentido ascendente, para quem acede à Rua F, com 5 metros de largura, pavimento betuminoso e ladeada por moradias;
9.º- Atendendo a estes factos e, sobretudo à referida inclinação, a visibilidade de quem circula na Rua do M para a Rua F, é naturalmente pouca;
10.º- Mas a situação de má visibilidade é agravada pelo facto de no acesso da Rua do M à Rua F existir à esquerda daquela Rua um muro encimado com sebe de arbustos;
11.º- Tendo sido instalado no passeio de frente, já nesta Rua, um espelho parabólico, convexo, para minimizar a situação;
12.º- Quando o demandante circulava na Rua F, no entroncamento composto pela intersecção desta com a Rua do M, surgiu desta Rua, pela direita, o referido veículo 11-11-11 que embateu na lateral direita da sua viatura de matrícula 00-00-00, do puxador da porta do passageiro para a parte de trás;
13.º- Anoitecia e estava a chover;
14.º- Apesar disto e das condições da via, e uma vez que pretendia introduzir-se no entroncamento, o condutor do veículo 11-11-11 circulava de forma imprudente, imprimindo ao seu veículo uma velocidade excessiva;
15.º- Não conseguindo imobilizar o veículo de modo a evitar o embate;
16.º- Com o embate perdeu o controlo do veículo, 00-00-00, tendo guinado o volante para a direita, vindo a imobiliza-lo já em cima do passeio da Rua F;
17º- De acordo com os croquis, o provável local do embate foi a 4 metros da esquina do passeio direito da Rua F, onde se inicia desse lado o entroncamento;
18.º- Por sua vez o demandante estava convencido que tinha prioridade e não tinha parado ou abrandado a velocidade no início do entroncamento;
19.º- Este convencimento foi-lhe posteriormente confirmado, por escrito, pela própria Câmara Municipal de G e pela Junta de Freguesia de G, conforme documentos juntos ao processo, desconhecendo-se porque não foi colocado nenhum sinal de cedência de passagem ou paragem obrigatória na Rua do M, como acontece nas restantes ruas paralelas que também entroncam na Rua F;
20.º- Em resultado da colisão, o veículo 11-11-11 ficou com a frente danificada;
21.º- E o veículo do demandante com os danos descritos na Fatura SF11800568, de 08/03/2018, referente ao n.2 de obra/ordem nº 11800174, de receção 11/01/2018 da empresa N, S.A;
22.º- Tendo pago à referida oficina pela reparação o montante de € 2 664,12 (dois mil seiscentos e sessenta e quatro euros e doze cêntimos);
23.º- Após o acidente compareceu no local uma brigada da Guarda Nacional Republicana do Posto Territorial de G, que lavrou o Auto de ocorrência tendo recolhido os depoimentos dos condutores dos veículos intervenientes no acidente de viação, e ainda elaborado relatório fotográfico dos danos nos veículos e posição final dos mesmos, bem como os croquis juntos aos autos, que não estão à escala;
24.º- Ambos os condutores preencheram Declaração Amigável de Acidente Automóvel e os segurados participaram oportunamente às respetivas seguradoras;
25.º- A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo 11-11-11, dentro dos limites fixados nas condições gerais e particulares da Apólice n.º 0000/10001777 000, foi transferida para a demandada, mediante um contrato de seguro;
26.º- Na sequência da participação de sinistro, a demandada diligenciou pelas peritagens e averiguações necessárias, tendentes a averiguar as circunstâncias em que ocorreu o sinistro e os danos decorrentes do mesmo;
27.º- Tendo vindo a declinar responsabilidade pelo mesmo por entender que foi causado única e exclusivamente pela ação do demandante;
28.º- E em resposta o demandante comunicado à demandada que não aceitava a decisão de não assunção de responsabilidade, por entender que o condutor do veículo segurado na mesma é que foi o único culpado no acidente;
29.º- Em consequência do acidente, a viatura ficou impossibilitada de circular pelos seus meios, pelo que desde a data do acidente que o demandante deixou de poder utilizá-la ao seu serviço como vinha sucedendo;
30.º- Como a demandada não assumiu a responsabilidade e o demandante terá tido disponibilidade financeira para mandar proceder à reparação apenas no decorrer do mês de março de 2018, esteve a mesma na oficina imobilizada até à finalização da reparação;
31.º- Data em que o demandante levantou o veículo e procedeu ao pagamento da reparação;
32.º- O demandante e a mulher trabalham por turnos, em horários não compatíveis, necessitando do veículo diariamente para se deslocar para o trabalho;
33.º- Pelo que o demandante necessita diariamente do veículo para levar a filha menor á escola e levar o filho menor a casa dos avós;
34.º- Por não ter a disponibilidade do veículo, nem possibilidade económica para adquirir ou alugar uma outra viatura para substituição do veículo sinistrado, o demandante teve de recorrer a ajuda de familiares e amigos para fazer a sua vida diária;
35º- O que lhe acarretou problemas e incómodos;
36.º- A demandada tomou a sua posição definitiva sobre a responsabilidade do sinistro em 22 de janeiro de 2018, ou seja 20 dias depois da sua ocorrência;
37.º- Para instruir os presentes autos o demandante despendeu numa certidão da participação do acidente de viação elaborada pela Guarda Nacional Republicana a importância de € 64,00 (sessenta e quatro euros).

Motivação dos factos provados:
A factualidade dada como provada resultou da conjugação dos factos admitidos por acordo, dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, e os que o foram e que vieram a ser confirmados pela restante prova, das declarações do demandante e da prova testemunhal tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 655º do Código de Processo Civil e no artigo 396º do Código Civil (doravante designado simplesmente C.Civ).
O demandante manteve a versão constante do requerimento inicial e da Declaração Amigável.
E apresentou as seguintes testemunhas: O, Mediador de Seguros, que disse trabalhar para a Companhia de Seguros do demandante, “P” e foi quem lhe “fez” o seguro, recebeu a Participação deste acidente e o fez seguir para a Companhia; Q, residente na Rua do F há 52 anos, e R, esposa da demandante e que era a outra ocupante do seu veículo aquando do acidente.
Todos demonstraram ter conhecimento dos factos que vieram testemunhar e revelaram isenção.
Os dois primeiros foram relevantes para a descrição das vias e artérias circundantes, estando convencidos ambos que a Rua F, tinha prioridade, e disseram que ninguém para na F para dar passagem aos que vêm da Rua do M, sendo que esta última, depôs também que na altura do acidente já anoitecia, estava um pouco de nevoeiro e chuva miudinha e que se encontrava com uma amiga na varanda da sua casa, que dista uns 100m do entroncamento, quando lhes chamou à atenção o barulho de um carro, que olharam para baixo e viram que era um carro branco (que veio a saber ser o veículo segurado pela demandada) que circulava na Rua, de baixo para cima, com muita velocidade e a que se seguiu logo o embate (de que ouviram o estrondo); Que não se lembra de ter acontecido outro acidente no local;
A terceira, única testemunha do acidente, apesar do seu depoimento ter de ser valorado com reserva, por ser casada com o demandante e ter interesse direto na causa, foi credível quanto à dinâmica do acidente. Disse que vinham devagar porque estava nevoeiro e tempo chuvoso, em velocidade constante, e que lhes apareceu do nada o outro veículo, que não estava parado nem o viram a aproximar-se. Só sentiu o embate em cheio; Confirmou ainda que o seu veículo esteve parado do dia do acidente até ao dia da finalização da reparação e em que efetuaram o pagamento.
Quanto à única testemunha apresentada pela demandada, S, Guarda da Guarda Nacional Republicana, do Posto de G, disse que não presenciou o acidente, mas foi quem elaborou o Auto de Participação, tomou as declarações dos condutores e elaborou os croquis dos autos. Depôs que chegou pouco depois do acidente e que o veículo segurado pela demandada bateu de frente mas não consegue precisar se mais ou menos de esquina e se ia virar ou não e que deve ter sido arrastado para o passeio: Disse ainda que quem vem da F, não consegue visualizar a Rua do M, através do espelho.
Prestou um depoimento isento e credível.
Mais foram tidos em conta, nos termos das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 5º do CPC, factos instrumentais e factos que complementam ou concretizam os que as partes alegaram e resultaram da instrução e discussão da causa e relativamente aos quais todos tiveram a possibilidade de se pronunciar.
Factos não provados e respetiva motivação:
Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes, com interesse para a decisão da causa, por falta de mobilidade probatória.

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
A primeira questão a decidir é a de saber qual dos condutores é responsável pelos danos decorrentes do acidente de viação dos autos e em que medida.
Só se verificará a obrigação de indemnizar se na situação se reunirem os pressupostos cumulativos da responsabilidade civil previstos no nº 1 do artigo 483º do Código Civil - prática de um ato ilícito, a imputação do facto ao agente em termos de culpa, a ocorrência de danos e um nexo de causalidade entre o facto e os danos imputáveis ao mesmo (cf. ainda artigo 563º do C. Civ.).
Com efeito, não são da responsabilidade do agente todos os danos emergentes do facto ilícito, mas apenas aqueles que causou, ou seja, que são consequência normal e adequada do facto em causa.
Ora da factualidade assente, e da dinâmica do acidente apurada, resulta que este se deu no entroncamento de interseção de duas vias que não têm quaisquer sinais de cedência de passagem ou paragem obrigatória e com características muito diferentes, tendo o veículo segurado pela demandada embatido pela direita no veículo do demandante.
Este, que circulava em velocidade moderada, pensando ter prioridade não parou ou abrandou à entrada do entroncamento, de modo a ceder a passagem a eventuais viaturas que se lhe apresentassem pela direita, violando o dever geral de cuidado e as regras constantes do n.º 1 do artigo 29º, nº 1 do artigo 30.º, bem como nº 2 do artigo 11º, todos do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei nº 114/94, de 03 de maio, com as sucessivas alterações.
De facto, ao contrário do que entendia o demandante e entendem as entidades públicas que subscreveram as declarações que juntou, e como bem refere a demandada, “…já não se encontra em vigor a regra do Código da Estrada de 1954 que impunha como critério de prioridade nos cruzamentos e entroncamentos a classificação e hierarquia das estradas, de modo a que o veículo que seguisse na via mais importante tinha prioridade relativamente ao que seguisse noutra de categoria inferior” .
Por sua vez o condutor do outro veículo, embora não tendo resultado provada a velocidade exata a que seguia, verificou-se ser a mesma excessiva para as condições de visibilidade da via e meteorológicas, bem como para a situação da Rua que iria intercetar (rua principal e com muito trânsito), agindo de modo imprudente, e não conseguindo parar no espaço livre e visível à sua frente evitando o embate.
Ao proceder como procedeu, entende-se não ter tomado as precauções que seriam exigíveis a um condutor diligente, violando o dever de prudência que lhe competia e desrespeitando os princípios gerais do Código da Estrada, ínsitos no nº 2 do artigo 11º, e no nº 1 do artigo 24º que refere o seguinte: “O condutor deve regular a velocidade de modo que, atendendo às características e estado da via e do veículo, [….] às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente”.
E este é que embateu no veículo do demandante mas a adequação da conduta deve referir-se a todo o processo causal e não só ao resultado. Resultado este, que poderá verificar-se em consequência também, ou necessária, da atuação do próprio lesado ou de terceiro.
Na situação dos autos, entendemos que os danos ocasionados no veículo do demandante embora tenham sido provocados objetivamente pelo veículo que embateu (causa operante), o embate poderia nunca ter ocorrido nem produzir danos no veículo se o do demandante tivesse parado ou abrandado para lhe ceder a passagem, como devia.
E esta causalidade hipotética de factos já decorridos, ou que decorrem simultaneamente, favorece a sua eficácia causal.
Pelo que, apesar de ambos tenham violado regras do Código da Estrada, não é possível afirmar, que uma das infrações era suficiente para provocar o resultado se o outro desse cumprimento integral às normas do Código da Estrada e tivesse uma condução prudente e segura.
Ambos cometeram infrações que geraram perigo de acidente, contribuindo para os danos.
Todavia, a circunstância de se verificar este concurso de causas no facto negligente que operou os danos, deve ser ponderada pelo Tribunal, como uma circunstância concreta do caso (cf. artigos 562º e 566º do C. Civ.).
Na situação dos autos e atento o exposto, atuado ambos os condutores da forma descrita, violando voluntária e conscientemente normas do Código da Estrada a cujo cumprimento estavam obrigados e ainda o dever geral de prudência que se impõe aos condutores nas vias públicas, entende-se haver concorrência de culpas, que se gradua em 50% para cada um dos condutores.
De referir que é entendimento jurisprudencial que, ficando provado que houve incumprimento dos condutores de leis ou regulamentos, se presume a culpa na produção dos danos decorrentes do acidente, dispensando a concreta comprovação da mesma (cf. nomeadamente o Acórdão do STJ de 10/03/98, in www.dgsi.pt.).
E, verificando-se na situação dos autos os pressupostos cumulativos da responsabilidade civil extracontratual, prevista no artigo 483º do Código Civil, cabe à demandada, por via do contrato de seguro, o ressarcimento de 50% dos danos provocados ao demandante, decorrentes do acidente [cf. ainda os seguintes artigos do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de agosto: 4.º, n.º 1; 11.º, n.º 1, alínea a) e 64.º, n.º 1, alínea a)].
Quanto ao pedido relativo ao custo da reparação do veículo 00-00-00:
A este título o demandante peticiona o valor que pagou à oficina, € 2 664,12 (dois mil seiscentos e sessenta e quatro euros e doze cêntimos), e a demandada questiona pelo facto de não coincidir com o que na sua peritagem foi considerado necessário para a reparação, € 2 655,62 (dois mil seiscentos e cinquenta e cinco euros e sessenta e dois cêntimos).
Ora, a diferença é despicienda, €8,50, que poderá resultar do valor de alguma peça que entretanto tenha aumentado, pelo que se condena considerando o valor peticionado.
Pelo que vai a mesma condenada no pagamento ao demandante de metade da referida quantia (50%): ou seja, na importância de € 1 332,06 (mil trezentos e trinta e dois euros e seis cêntimos).
Quanto à privação do uso pela imobilização do veículo sinistrado:
Vem o demandante peticionar a este título a importância de € 2 732,52 que corresponde a 66 dias de imobilização, ao valor diário de €41,40, com IVA, que alega ser correspondente ao valor locativo de veículo de características idênticas, e conforme orçamento da T que junta aos autos, desde a data do acidente até à finalização da reparação e pagamento.
Por se encontrar privado do uso do seu veículo para efeitos da peritagem e reparação tem o demandante, efetivamente, direito a uma compensação por danos patrimoniais, como solicitado, quer pelo facto de, como proprietário dele não poder livremente dispor, com o conteúdo definido no artigo 1305º do Código Civil, quer pelas despesas que teve em consequência da imobilização.
Esta compensação poderá assumir a forma de indemnização em dinheiro ou cedência de viatura de aluguer.
Durante a imobilização do veículo não foi fornecida viatura de substituição, pelo que a compensação terá de ser efetuada em dinheiro, através do pagamento de uma quantia diária.
O demandante não fez prova de despesas realizadas em consequência da imobilização do veículo, mas sendo também entendimento jurisprudencial que esta imobilização, só por si, é um dano indemnizável, tal não impede que o tribunal fixe uma indemnização, com recurso à equidade, ou seja, a compensação que, no prudente arbítrio do julgador, seja a mais justa para o caso, tomando-se como ponto de referência o valor locativo de veículo com as mesmas características e de acordo com as regras indemnizatórias do Código Civil (cf. artigo 566º, nº 2 do C. Civ e Acórdão nº 083236 do STA, de 8/06/1993, in www.dgsi.pt).
Mas, quanto ao valor locativo de veículo semelhante, o valor diário peticionado parece-nos excessivo, tendo em conta o exposto, a idade do veículo do demandante (19 anos) e os padrões indemnizatórios geralmente adotados na jurisprudência, pelo que, recorrendo à equidade (cf. nº 3 do supracitado artigo 566º do C. Civ), se entende adequado o valor diário de € 20,00 (vinte euros).
Quanto ao período a considerar para estes efeitos será o da efetiva imobilização do veículo, sem atribuição de veículo de substituição, mas apenas durante o período em que não teve acesso ao seu veículo por facto que não lhe é imputável.
Ora, se é certo que o veículo não podia circular também é certo que o demandante só o mandou reparar em março, por alegadas dificuldades económicas, o que não poderá ser imputado à demandada que não detinha a direção efetiva da reparação do veículo e que tinha comunicado a sua decisão definitiva em tempo razoável.
Assim, não poderá ser responsabilizada pelo período que mediou entre a comunicação da sua decisão definitiva e aquele em que o veículo esteve em reparação. Nestes termos:
A demandada demorou 20 dias na gestão do processo e comunicou ao demandante a sua decisão definitiva em 25/01/2018 (22/01/2018 é a data da carta a comunicar ao demandante, a que deverá acrescer três dias do correio para a sua receção), o que perfaz 23 dias.
Por outro lado, o demandante refere que só o mandou reparar em março, pelo que tendo sido finalizada a reparação em 08/03/2018 e desconhecendo-se o dia de início, considera-se como sendo o dia 1 de março - uma semana para a reparação é razoável, pelo que são mais 8 dias.
Totalizando, assim, 31 dias de imobilização do veículo da responsabilidade da demandada.
Nestes termos, tem o demandante direito a ser ressarcido em 50% do valor resultante de 31 dias de paralisação do veículo, à razão de 20,00 diários, ou seja, €310,00 (trezentos e dez euros) – [(20*31)/2).
Relativamente ao demais peticionado:
O demandante peticiona ainda que a demandada seja condenada a pagar-lhe o custo que suportou para instruir os presentes autos numa certidão da participação de acidente de viação elaborada pela Guarda Nacional Republicana, na importância de € 64,00 (sessenta e quatro euros).
A demandada alega que é um pagamento que não possui nexo causal direto com o sinistro, sendo que este documento apenas visou instruir o presente processo e que a demandada procedeu ao pagamento do mesmo documento para instrução do seu processo interno.
De facto, não se trata de um dano resultante do acidente mas de um encargo com o processo (para prova) e não poderá merecer provimento, porquanto não tem enquadramento como custas de parte, previstas no nº 2 do artigo 533º do Código de Processo Civil (CPC), por não serem nem estas normas aplicáveis aos Julgados de Paz, que têm regulamentação própria quanto a custas, a Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, que refere expressamente que as custas correspondem a uma taxa única de €70,00 por cada processo e não prevê que deste valor possa ser retirada qualquer quantia para pagamento de tais despesas.
Mais peticiona o demandante a condenação da demandada em juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Efetivamente, e de acordo com o disposto nos artigos 804º e 806º do mesmo Código, verificando-se um retardamento da prestação, por causa imputável ao devedor constitui-se este em mora e, consequentemente, na obrigação de reparar os danos causados.
Tratando-se de obrigações pecuniárias, a indemnização corresponderá aos juros a contar do dia da constituição em mora.
Na situação dos autos, e atento o disposto no nº 3 do artigo 805º do C. Civ., o devedor fica constituído em mora desde a data de citação, que ocorreu em 04/07/2018 até efetivo e integral pagamento.
Pelo exposto, e em conclusão, tem o demandante direito à indemnização global de € 1 642,06 (mil seiscentos e quarenta e dois euros e seis cêntimos), que corresponde a 50% do valor do que pagou pela reparação do veículo (€2 664,12) e da indemnização pela privação do uso (€ 620,00), acrescida dos referidos juros de mora.

Decisão:
Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência:
- Condeno a demandada, B – Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao demandante, A, a importância de 1 642,06 (mil seiscentos e quarenta e dois euros e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 04 de julho de 2018 até efetivo e integral pagamento;
- Absolvo-a do demais peticionado.
Custas na proporção do decaimento, que se fixam em 30% para a demandada e 70% para o demandante (cf. artigo 8º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro e artigo 527º, nº 2 do Código de Processo Civil, aplicável aos Julgados de Paz por força do disposto no artigo 63º da Lei nº 78/2001, de 13 de julho).
Registe e notifique.
Carregal do Sal, 31 de agosto de 2018
A Juíza de Paz, (Elisa Flores)