Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5961/22.6T8SNT.L1-4
Relator: PAULA SANTOS
Descritores: DESPEDIMENTO
DECLARAÇÃO NEGOCIAL
EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS DE LIMPEZA
CESSAÇÃO DO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I–O despedimento pressupõe a existência de uma declaração de vontade da entidade empregadora nos termos da qual comunica ao trabalhador que o contrato cessa para o futuro.

II–Não configura um despedimento a carta enviada pela empregadora à trabalhadora em que, embora refira que a conduta desta configura justa causa de despedimento”, não é clara quanto à vontade e intenção de a afastar rescindindo o respetivo contrato, sendo o seu comportamento posterior contrário à expressão de uma vontade de pôr fim ao contrato.

III–Atenta contra a boa fé a conduta da trabalhadora de se pretender fazer valer de uma apresentação no seu antigo local de trabalho, após 3 meses de ausência sem que seja conhecida a respectiva causa, para efeitos de justificar a existência de um despedimento ilícito, sabedora de que a cliente da sua entidade patronal havia resolvido o contrato de prestação de serviços que as vinculava e havia recusado a prestação de trabalho das suas colegas.


(Sumário da autoria da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa


I–Relatório


AA instaurou a presente acção declarativa de condenação, a seguir a forma de processo comum, contra Mediterranean Shipping Company (Portugal) Agentes de Navegação, S.A., adiante MSC, e BB, Unipessoal, Lda., pedindo que seja:
- a MSC condenada na sua integração ou, em sua substituição, no pagamento da indemnização prevista no artigo 391º do Código do Trabalho, bem como dos demais valores devidos pela execução e/ou cessação do contrato, no total de 2.117,76€, e ainda no pagamento das remunerações que se vierem a vencer até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento.

Caso assim não se entenda, seja:
- a Reidison condenada na sua reintegração ou, em sua substituição, no pagamento à Autora do valor da indemnização e demais valores devidos pela execução e/ou cessação do contrato de trabalho, no total de 2.117,76€, acrescido do valor de 997,52€ referente a vencimentos em atraso, e ainda no pagamento das remunerações que se vierem a vencer até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento.

Alegou, para tanto, que iniciou funções nas instalações da MSC, sitas em Alcântara, em 02.05.2016, ao serviço da empresa Climex – Controlo Ambiente, S.A.; naquele local de trabalho e no âmbito do mesmo contrato de trabalho, trabalhou, por último, para a Reidison; ao serviço desta auferia de vencimento base o valor ilíquido de 249,38€ para 15h de trabalho semanais; no dia 17.03.2021 compareceu ao serviço no seu local de trabalho e horário habitual para efectuar a sua limpeza, juntamente com as suas colegas; foram, no entanto, impedidas de entrar pela MSC, com fundamento na rescisão com justa causa do contrato de prestação de serviços com a sua entidade patronal; mais informou a MSC ter tomado a decisão de não contratar outros serviços de limpeza, uma vez que todos os seus trabalhadores se encontravam e iriam continuar a exercer funções em regime de teletrabalho; à luz do artigo 285º do Código do Trabalho (tal como da cláusula 15ª da CCT), a MSC deveria ter assegurado o posto de trabalho da Autora; ao não fazê-lo, despediu-a sem justa causa e sem o cumprimento dos procedimentos legais, o que é manifestamente ilícito nos termos do artigo 381º alínea c) do Código do Trabalho; esta Ré é também responsável pelo pagamento à Autora das remunerações que a mesma deixou de auferir desde Março de 2021, descontadas as previstas na alínea b) do nº 2 do artigo 390º, cujo valor ascendia à quantia de 249,38€, e pela reintegração da Autora ou sua indemnização; será ainda responsável por pagar à Autora os seguintes valores: a)-22 dias úteis de férias vencidos em 01.01.2021, no valor de 249,38€; b)-o correspondente subsídio de férias, no valor de 249,38€; c)-proporcionais de férias referentes ao tempo de trabalho do ano de 2021, no valor de 57,54€; d) o correspondente subsídio de férias, no valor de 57,54€; e)- proporcionais de subsídio de Natal, referentes ao tempo de trabalho do ano de 2021, no valor de 57,54€; caso se entenda que a MSC não é responsável por assegurar os contratos de trabalho dos trabalhadores, ainda assim será sempre necessário assegurar os direitos da Autora, pois esta não pode ficar prejudicada com as vicissitudes decorrentes das concessões dos locais de trabalho onde presta serviço, responsabilizando-se a outra Ré; nos termos do artigo 285º do Código do Trabalho o transmitente responde solidariamente pelas obrigações vencidas até à data da transmissão, pelo que, seja a MSC ou a Reidison responsabilizadas pela integração da trabalhadora, a Reidison será sempre responsável por pagar à Autora os vencimentos em falta.
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Foi realizada audiência de partes, não sendo possível a sua conciliação.
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Citada, a MSC defendeu-se por excepção, invocando a prescrição, alegando que a resolução que fez do contrato de prestação de serviços (à empresa Joliklin, Serviços e Franchising`s, Lda., já que nada contratou com a Reidison), produziu efeitos no dia 10.03.2021; logo, ainda que se entendesse que a Autora tinha algum direito sobre si, o mesmo já teria prescrito, atendendo à data em que a alegada transferência do contrato de trabalho teria ocorrido (10.03.2021) e a data de entrada da acção (01.04.2022); e defendeu-se também por impugnação, alegando que tem por objecto social o exercício da actividade de agente de navegação pelo que não está vinculada ao CCT indicado pela Autora (514º, n.º 1, do Código do Trabalho); em qualquer caso, não se verifica a alegada transmissão de estabelecimento.
Terminou a contestação pedindo que:a)-a excepção de prescrição seja julgada procedente e, consequentemente, seja absolvida do pedido;b)-sem prescindir, seja a acção julgada totalmente improcedente na parte que se refere a si e, consequentemente, seja absolvida do pedido;c)-caso assim não se entenda, seja considerada a indemnização em substituição da integração, considerando-se solidária a responsabilidade das Rés pelo pagamento das quantias peticionadas;d)- às remunerações que a Autora alegadamente deixou de auferir desde Março de 2021 até ao trânsito em julgado da decisão, devem ser deduzidas as previstas nas alíneas a), b) e c) do nº 2 do artigo 390º.
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Citada, a Ré Reidison defendeu-se por excepção, invocando a sua ilegitimidade (mais propriamente por excepção peremptória de abandono do trabalho), uma vez que alega que a Autora, por sua iniciativa, deixou de trabalhar para si desde 16.12.2020, abandonando o local de trabalho, sem que tenha dado quaisquer explicações ou justificações; nesse sentido, enviou carta registada com aviso de recepção, no dia 03.02.2021, denunciando o contrato por abandono de trabalho; caso assim não se venha a entender, será parte ilegítima no presente processo, uma vez que a MSC rescindiu o contrato consigo e, por via disso, conforme o consagrado na clausula 15ª do CCT aplicável ao sector, o próprio utilizador ou o novo prestador de serviços estão obrigados a ficar com todos os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviços.
Terminou concluindo pela procedência da excepção de ilegitimidade, com as legais consequências, e a sua absolvição da instância, e de todos os pedidos contra si formulados.
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Foi dispensada a realização de audiência prévia.
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Foi dispensada a fixação do objecto do litígio e da base instrutória.
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Em 13.01.2023, foi proferido despacho saneador, que conheceu da validade e regularidade da instância, julgou improcedente a excepção de ilegitimidade e relegou o conhecimento da excepção de prescrição para a sentença.
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Foi realizado julgamento com observância do legal formalismo.
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A sentença julgou a acção parcialmente procedente e, por isso, decide-se:
- Absolver a Mediterranean Shipping Company (Portugal) – Agentes de Navegação, S.A., do pedido;
- Condenar a BB, Unipessoal, Lda., a pagar à A., a senhora AA, a quantia global de 498,76€, indo no mais absolvida.
Não se condenam as Partes por litigância de má-fé.
As custas da acção são assim repartidas entre o A. (e que assume inteiramente as custas da acção quanto à MSC) e a Reidison, na proporção de 83,99% e 16,01%, por cada um, sem prejuízo do regime de isenção de que aquele beneficia.”
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Inconformada, a Autora interpôs recurso, concluindo nas suas alegações que “51º
Por Sentença de 8 de Maio de 2022, o Tribunal de 1ª instância julgou a ação apenas parcialmente procedente quanto ao pedido formulado contra a segunda R., BB, Unipessoal, Lda..
52º
Entendeu o Douto Tribunal, “… a. não assentou a sua causa de pedir na consequência daquele não preenchimento.”, mas sim, em causa diversa: “ao não assegurar posto de trabalho à A. está a obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho, o que consubstancia um despedimento ilícito.”
53º
Ora, a Autora, ora Recorrente, discorda da Douta Decisão proferida  pelo Tribunal de 1ª Instância.
54º
A A. fundamentou o seu pedido, no facto de, tendo comparecido no local de trabalho no dia 17/03/2021, ter sido a mesma impedida de exercer funções pelos funcionários do cliente.
55º
Foi a R. Reidison que alegou que a A. havia abandonado o local de trabalho e que nessa sequência denunciou o contrato de trabalho por carta de 03/02/2021.
56º
Ora, a reforma do processo civil atribuiu ao Tribunal uma posição mais activa, por forma a aproximar-se da verdade material em prol de uma composição mais equitativa do litígio.
57º
Esta faculdade atribuída ao Tribunal, tem especial importância no Direito do Trabalho, uma vez que o trabalhador se apresenta sempre como a parte mais desprotegida.
58º
Neste sentido, entende a Recorrente, que embora o pedido formulado pela mesma para a condenação da R. Reidison não seja a não verificação da figura do abandono do trabalho nos termos previstos no artigo 403º do Código de Trabalho, tal circunstância não impede que o Tribunal faça uma avaliação global de toda a prova da instrução e da mesma retire a verdade material que leve à justa composição do litígio entre as partes.
60º
Por outro lado, entendeu ainda o Douto Tribunal que era sobre a A. que impendia a obrigação de se apresentar ao serviço em Alcântara e que não ficou demonstrado que a mesma o tenha feito, nem que, de alguma forma, a segunda R. tenha obstado à prestação efectiva de trabalho.
61º
Também aqui, a Recorrente discorda da posição assumida na Douta decisão quando entende que o facto de a A. ter comparecido no local de trabalho no dia 17/03/2021, não pode ser considerado como apresentação ao serviço para retoma do trabalho, sob pena de violação do princípio da boa fé.
62º
Ora, é certo que, à A., ora Recorrente cumpria apresentar-se ao serviço.
63º
No entanto, não é menos verdade, que nos termos do artigo 106º, nº 1 e 3 do Código do Trabalho e da cláusula 10ª nº 2, do CCT aplicável à relação laboral entre a Recorrente e a Recorrida, a entidade patronal deve informar por escrito o trabalhador sobre os aspectos relevantes do contrato de trabalho, como é o caso dos aspectos relacionados com o local de trabalho.
64º
E o mesmo se diga quando se verifica uma alteração dos elementos objecto de informação nos termos do artigo e 109º do Código do Trabalho e da cláusula 10ª nº 2, do CCT aplicável: a entidade empregadora deverá comunicá-la ao trabalhador por escrito, logo que possível e sempre nos trinta dias subsequentes à data da sua produção de efeitos.
65º
No entanto, apesar de ter conhecimento da cessação do contrato de prestação de serviços com a primeira R. Mediterranean Shipping Company, que impedia que a Recorrida Reidison continuasse a prestar serviços naquele local, a mesma não prestou à A, ora Recorrente, qualquer informação nesse sentido.
66º
Como bem concluiu o Tribunal a quo, não se verificou a cessação do contrato de trabalho da Recorrente por abandono, por falta de preenchimento dos referidos pressupostos. 
67º
A Recorrente comunicou à Recorrida em 11/03/2021, a sua vontade de retomar o trabalho (conforme facto provado nº 24) e compareceu para trabalhar no dia 17/03/2021, no seu local e horário de trabalho habitual, juntamente com as restantes colegas de trabalho.
68º
Todas as trabalhadoras foram impedidas de exercer funções no cliente MSC.
69º
Após essa data e já com conhecimento que a R. MCS não iria aceitar as trabalhadoras da Recorrida Reidison como suas trabalhadoras, esta nunca indicou até à data outro local de trabalho à Recorrente.
70º
À relação laboral entre a Recorrente e a Recorrida Reidison é aplicável a cláusula 15ª do CCT para as empresas de limpeza actualmente em vigor.
71º
Nos termos desta cláusula, a perda de um local de trabalho por parte de uma entidade patronal não integra o conceito de caducidade nem de justa causa de despedimento.
72º
Esta disposição tem que ser interpretada de forma que a Recorrente não seja prejudicada.
73º
Assim cumpria à Recorrida Reidison assegurar o contrato de trabalho da Recorrente.
74º
Pelo que, perante a cessação do contrato de prestação de serviços com o cliente MSC, deveria a Recorrida Reidison ter indicado à Recorrente novo posto de trabalho, o que não aconteceu.
75º
Assim, entende a Recorrente que ao não assegurar novo posto de trabalho, a Recorrida Reidison está a obstar injustificadamente à prestação efetiva de trabalho, o que consubstancia um despedimento ilícito.
76º
Atento exposto, dúvidas não restam que a Recorrida procedeu ao despedimento ilícito da Recorrente.
77º
Assim, entende a Recorrente que o Douto Tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação da lei, violando as seguintes normas jurídicas:
- artigo 106º, nº 1 e 3, alínea b) e 109º nº 1 do Código do Trabalho
- cláusula 10ª nº 2 e 3 e 15ª nº 1do CCT publicado no BTE nº 2 de 15/01/2020
- artigo 129º, alínea b) do Código do Trabalho

78º
Atento o exposto, deve ser proferida nova decisão no seguinte sentido:
- a reconhecer que a Recorrente se apresentou no seu local de trabalho habitual em 17/03/2021, tendo sido impedida de aí exercer as suas funções pelo cliente;
- a reconhecer que desde o dia 17/03/2021 e até à presente data, a Recorrida nunca indicou à Recorrente o local de trabalho onde devia comparecer para trabalhar;
- a reconhecer que não sendo aplicável à R. MSC o CCT publicado no BTE nº 2 de 15/01/2020, era a Recorrente responsável por assegurar novo posto de trabalho da Recorrida;
- a reconhecer que, não o tendo feito obstou à prestação de trabalho pela recorrente e como tal procedeu ao seu despedimento ilícito, com as legais consequências;
- a condenar a Recorrida no pagamento da indemnização prevista no artigo 391º do Código do Trabalho, bem como, dos demais valores devidos pela execução e/ou cessação do contrato de trabalho peticionados e ainda pelas remunerações vencidas e vincendas até ao trânsito em julgado da sentença que declarar a ilicitude do despedimento da Recorrente.
Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, alterando-se a decisão recorrida em conformidade com o alegado.
Assim se fazendo Justiça!”
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Exmo Procurador-Geral Adjunto, junto deste Tribunal da Relação, emitiu parecer nos seguintes termos
“(…) O não comunicar à A. qual o seu novo posto de trabalho, não impedia a A. (era aliás seu dever) de se apresentar na sede da Recorrida (e isto não se confunde com o apresentar-se em local, que há muito sabia não ser já o seu posto de trabalho) para retomar o seu posto de trabalho – só assim interrompia o seu absentismo e, caso lhe fosse recusada essa retoma, então sim, estar-se-ia perante despedimento ilícito.
Não merece a sentença qualquer censura.
A sentença recorrida não violou qualquer norma jurídica, mormente as assinaladas pela Recorrente.
Deve improceder o recurso e confirmar-se a decisão recorrida.”
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Os autos foram aos vistos às Exmas Desembargadoras Adjuntas.
Cumpre apreciar e decidir
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II–Objecto
Considerando as conclusões de recurso apresentadas, que delimitam o seu objecto, cumpre decidir se a Ré Reidison incumpriu os deveres de informação a que aludem os artigos 106º e 109º do CT – possibilidade do seu conhecimento – e se ocorreu o despedimento da Autora pela Ré Reidison, e respectivas consequências legais.
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III–Fundamentação de Facto

A–Matéria de Facto Provada

São os seguintes os factos considerados provados pela primeira instância
1.A MSC é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de agente de navegação.
2.A Reidison dedica-se, por sua vez, à prestação de serviços de limpeza.
3.A Autora está filiada no STAD com o nº de sócia 100526.
4.A Autora iniciou funções para a empresa Climex – Controlo Ambiente, S.A., como trabalhadora de limpeza e «na modalidade de contrato termo certo», desde 02.05.2016.
5.Em 02.11.2016 foi colocada, pela Climex, a trabalhar nas instalações da MSC sitas em Alcântara, em substituição de uma sua colega, e até ao final desse ano.
6.Depois foi, ainda pela Climex, deslocalizada para o Restelo e mais tarde voltou às instalações da MSC de Alcântara, em data não concretamente apurada, mas necessariamente anterior ao ano de 2020.
7.Naquele local de trabalho e no âmbito do mesmo contrato de trabalho, a Autora exerceu funções sucessivamente ao serviço de outras empresas e finalmente da Reidison.
8.O seu horário era das 06h00-09h00 de segunda a sexta-feira, no total de 15 horas semanais.
9.Ao serviço da Reidison, a Autora auferia, em 2020, de retribuição-base o valor ilíquido de 238,12€.
10.Em 28.2.2018, a MSC celebrou com a Joliklin, Serviços e Franchising`s, Lda., que usa a marca Jani-King, um contrato de prestação de serviços de limpeza das suas instalações sitas em Alcântara, com início em 1.3.2018, conforme doc. Junto aos autos e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
11.Resulta do contrato que os serviços podiam ser prestados por um franchisado da empresa Joliklin.
12.Depois de assinar esse contrato, foi apresentado à MSC o senhor BB e transmitido que este era um franchisado da empresa Joliklin, mas nunca foi identificada qualquer empresa.
13.Quem facturava os serviços de limpeza à 1ª Ré era a empresa Joliklin.
14.Por carta datada de 9.3.2021 e recebida pela empresa Joliklin em 10.3.2021, a MSC comunicou-lhe «a resolução do contrato com justa causa do contrato de prestação de serviços» e que «o acesso às nossas instalações será anulado na data em que a resolução do contrato produz efeitos, que corresponde à data da recepção da presente carta por V. Ex.ª», cujo conteúdo se dá por inteiro reproduzido.
15.A Autora deixou de ir trabalhar desde 15.12.2020, inclusive.
16.A Autora contraiu nessa altura Covid-19, tendo estado de baixa de 14 a 24.12.2020.
17.O supervisor da Reidison, o senhor CC, soube então da situação de doença da Autora, tendo-a substituído no serviço a 21.12.2020.
18.A meados de Janeiro de 2021, o supervisor foi contactado por um familiar da Autora informando-o que esta estava mal de saúde, tendo-lhe aquele pedido o envio do pertinente comprovativo de doença.
19.Em 02.2.2021, a MSC questionou o senhor BB: «gostaríamos de saber o estado de saúde da AA, sabem se está melhor?».
20.A Reidison enviou à Autora em 03.02.2021, carta registada com aviso de recepção sob o assunto «presunção de denúncia de contrato por abandono do trabalho», onde disse: «na qualidade de entidade patronal de V. Ex.ª e tendo presente que não comparece no seu local de trabalho desde 16.12.2020 até ao dia de hoje, 02.02.2021, não tendo apresentado qualquer justificação legalmente prevista para a ausência reiterada, vimos informar V. Ex.ª que presumimos com tal conduta o seu abandono do posto de trabalho e que, por isso, o contrato de trabalho caducou uma vez que nos termos do nº 2 do artigo 403º do CT presume-se abandono do trabalho a ausência do trabalhador ao serviço durante, pelo menos, 10 dias úteis seguidos. Informamos igualmente que esta conduta configura justa causa de despedimento, de acordo com o disposto no artigo 351º, nº 1, alínea g), Código do Trabalho, com as legais consequências aí previstas».
21.A Autora recebeu esta missiva.
22.Em 23.2.2021, a MSC questionou o senhor BB: «tem a ver com a trabalhadora que estava ausente, têm previsão para quanto regressa? Não se recolheu a biometria da pessoa que a substituiu, porque pensámos ser menos tempo, pelo que aguardamos essa informação».
23.Em resposta ainda nesse dia, o senhor BB informou: «em relação à senhora AA, ainda não recebi a justificação da ausência, já encaminhei carta para a mesma, porém ainda sem resposta, penso que seja melhor cadastrarmos o novo colaborador caso não tenhamos respostas até ao final de Fevereiro».
24.Em 11.03.2021 a Autora enviou à Reidison uma mensagem dizendo: «Boa tarde Sr.  BB eu preciso falar consigo desde daquele dia eu tentei ligar duas vezes o Sr. Atendeu que era para explicar o que aconteceu não tive oportunidade de falar consigo por isso estou-lhe a pedir se consegue me ligar para falar e se pode deixar as coisas do passado para trás e me deixar voltar a trabalhar».
25.As senhoras DD e EE compareceram nas referidas instalações e no horário habitual a 15 e 16 de Março de 2021, tendo acedido ao seu interior por erro dos serviços de IT da MSC.
26.Porém, logo naquele dia 15 foram abordadas pela trabalhadora da MSC, a senhora FF, e informadas que já ali não deveriam estar pela  cessação do contrato de prestação de serviços.
27.Ainda nesse dia a MSC respondeu por e-mail à Reidison: «não entendemos a surpresa com o telefonema que terão recebido das v/ trabalhadoras, uma vez que vos foi comunicado, por carta registada com AR, que em consequência da resolução com justa causa do contrato de prestação de serviços celebrado coma v/empresa, o acesso às instalações da MSC seria cancelado…a MSC não tem de ficar com as trabalhadoras».
28.Apenas no dia 17.03.2021, a Autora voltou a comparecer nas instalações da MSC e no horário habitual, juntamente com as suas duas colegas.
29.No entanto, ao tentarem aceder ao interior das instalações da MSC através do controlo de acesso biométrico da impressão digital, a Autora e as suas colegas já não conseguiram entrar.
30. Em virtude do ocorrido, a senhora DD contactou de imediato com o supervisor da Ré Reidison, que lhe disse para solicitar a intervenção da Polícia, o que fez.
31.A senhora FF repetiu que a empresa MSC tinha resolvido com justa causa o contrato de prestação de serviços celebrado com a empresa Joliklin, sendo essa a razão da não permissão do acesso às instalações.
32. A Autora requereu a ajuda do STAD, que, no dia 29.03.2021, dirigiu à Ré Reidison uma comunicação escrita afirmando: «as nossas associadas… trabalhadoras ao V. serviço no cliente Mediterranean Shipping Company (Portugal)…com o horário das 06h às 09h, de 2ª a 6ª feira, informaram…que desde o dia 16 de Março estão sem exercer funções porque o cliente as impediu de trabalhar, informando-as que o contrato de prestação de serviços de limpeza celebrado entre eles e a V empresa cessou. Facto que foi atestado por testemunhas, bem como pela própria PSP, a qual lavrou o respectivo auto de notícia. Razão pela qual poderemos dizer que poderemos estar perante despedimentos sem justa causa. Face ao exposto, solicitamos a V Exas que nos informem sobre esta situação no prazo máximo de 8 dias a contar da recepção do presente e- mail, sob pena de termos de seguir a via judicial».
33.Esta missiva foi enviada em 30.03.2021 e por aquela recebida.
34.O STAD enviou também uma comunicação à MSC, datada de 09.04.2021, onde afirmou: «As nossas associadas… informaram este sindicato que essa empresa rescindiu os serviços de prestação de limpeza com a sua entidade patronal…com efeitos a partir de 16.03.2021. Mais informaram-nos que apresentaram-se nesse local de trabalho durante os horários de trabalho para exercerem funções inerentes às suas categorias profissionais – trabalhadoras de limpeza, tendo no entanto sido impedidas de o fazer. Razão pela qual poderemos dizer que poderemos estar perante despedimentos sem justa causa, em relação ao qual essa empresa enquanto cliente também é responsável. Face ao exposto, solicitamos a V Exas que nos informem sobre esta situação no prazo máximo de 8 dias a contar da recepção do presente e-mail, sob pena de termos de seguir a via judicial».
35.Esta missiva foi enviada em 12.04.2021.
36.Em resposta à comunicação do STAD, a ilustre mandatária da MSC informou que «efectivamente por carta datada de 09.03.2021…resolveu com justa causa o contrato de prestação de serviços celebrado com a empresa Joliklin, Serviços e Franchising`s, Lda., entidade patronal das V/ associadas…A n/ constituinte tem por objecto social o exercício da actividade de agente de navegação…não está vinculada ao CTT celebrado entre a APFS e o STAD…na medida em que não se dedica a nenhuma das actividades a que se refere a cláusula 1ª do CTT e que são  repetidas no artigo 1º da Portaria de Extensão…foi igualmente transmitido à empresa Joliklin…tomou a decisão de não contratar qualquer empresa de limpeza, uma vez que todos os trabalhadores se encontram a exercer as suas funções em regime de teletrabalho há já vários meses e assim permanecerão pelo menos até ao final do corrente ano», missiva que se dá por inteiro reproduzida.
37.A Reidison enviou às senhoras DD e EE uma carta datada de 29.03.2021, sob o assunto «perda de cliente – passagem do contrato de trabalho para nova entidade», onde disse: «vimos por este meio informar que o nosso contrato de prestação de serviços, celebrado a 01.03.2018 com a [MSC] irá cessar em 31.03.2021 por iniciativa exclusiva do Cliente. Assim, e por força do disposto no artigo 15º da CTT (BTE nº 2, de 15.01.2020) e Portaria de Extensão (Portaria nº 72/2020, de 16.03) aplicável a este sector, o seu vínculo enquanto trabalhadora da nossa empresa cessa nessa data, o que iremos comunicar à Segurança Social. Pelo que, e em respeito ao princípio da ocupação efectiva que o trabalhador tem devidamente consagrado na lei, o seu contrato de trabalho passará para a entidade que assume a prestação de limpeza nas instalações sitas…, seja o próprio utilizador (Cliente) seja outro prestador de serviços. Assim, V. Ex.ª deverá apresentar-se para cumprir a sua função nos dias e horas habituais e no local de trabalho onde exerce a sua prestação laboral».
38.A MSC não admitiu qualquer trabalhador da empresa Reidison.
39.Todo o material necessário para o exercício das suas funções era fornecido, primeiro pela Climex, depois pela Safira e por fim pela Reidison, sendo o supervisor também dos quadros destas empresas.
40.A acção foi proposta em 01.04.2022 e a MSC citada em 22.04.2022.
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B–Matéria de Facto Não Provada

A primeira instância considerou não provados os seguintes factos
A.Em resposta, a Reidison enviou ao STAD cópia da carta que enviou às trabalhadoras.
B.No dia 17.03.2021, a senhora DD «foi informada pelo mesmo [gerente da Reidison] que já tinha conhecimento dos factos e por lapso se esqueceu de informar o supervisor para redireccionar as mesmas para outros serviços».
C.A função exercida pela Autora inexiste na MSC.
D.A Autora abandonou o referido local de trabalho sem que tenha dado quaisquer explicações ou justificações.
E.A Reidison recebeu o atestado médico em 16.
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IV–Apreciação do Recurso

O que está em causa no presente recurso é a responsabilidade da Ré, Reidison, perante o contrato de trabalho firmado com a Autora, tendo transitado em julgado a decisão proferida em relação à Ré, MSC, que a absolveu dos pedidos formulados.
A Autora alega, nos artigos 39º e seguintes da p.i., que, caso se entenda que a Ré MSC não é responsável por assegurar o contrato de trabalho, será sempre necessário assegurar o direito da Autora pois a trabalhadora não pode ficar prejudicada com as vicissitudes decorrentes das concessões dos locais de trabalho onde presta serviço”, o que decorre, alega, do disposto na cláusula 15ª nº1 do CCT aplicável (BTE nº2 de 2020). Assim, defende que, perante a cessação do contrato de prestação de serviços com o cliente, deveria a Ré Reidison ter-lhe indicado novo posto de trabalho, o que não aconteceu. Desta forma, ao não lhe assegurar posto de trabalho, também a Ré, Reidison, está a obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho, o que consubstancia um despedimento ilícito, donde conclui que se mantém integrada nos quadros desta Ré, no mesmo horário, com todas as legais consequências (artigos 42º e 43º da p.i.).
A Ré Reidison defendeu-se por excepção, invocando abandono do trabalho por parte da Autora.
Esta excepção foi julgada improcedente, não foi impugnada e transitou em julgado.

É a seguinte a fundamentação da primeira instância, relativamente a esta Ré: Vejamos agora a posição da Reidison.
(…)
Diz a R. que o contrato de trabalho com a A. findou pelo seu abandono do trabalho (artigo 403º). Defendeu-se, assim, por excepção peremptória.
(…)
Ora no caso, se é certa a ausência da A. desde 15.12.2020, inclusive, já a Reidison não logrou provar que dela não recebeu informação sobre o motivo da ausência. O que vale por dizer que não está preenchida aquela presunção, com o que terá de improceder a excepção, nessa exacta medida.
Note-se, porém, que daí não resulta a procedência da acção na exacta medida em que a A. não assentou a sua causa de pedir na consequência daquele não preenchimento.
Antes, fundou a causa do seu pedido em coisa diversa: «ao assegurar posto de trabalho à A. está a obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho, o que consubstancia um despedimento ilícito» (artigo 42º) pelos dos factos de 17.03.2021. É que, como foi dito pelo STJ em 23.04.2008 (07S3905): «o uso do poder de condenação extra vel ultra petitum, consagrado no artigo 74.º do CPT não permite ao tribunal, ainda que esteja em causa a aplicação de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, alterar ou substituir os factos jurídicos invocados como fundamento do pedido, de modo a apreciar e decidir um pedido com fundamento numa causa de pedir que não foi submetida à sua decisão».
Porém, esta conclusão não arruma inteiramente a questão. É que a mera ausência do trabalhador pode ser usada como impugnação motivada da petição (artigo 571º, nº 2, do Código de Processo Civil), sem tradução como causa de cessação do contrato, que pode permanecer até eventualmente suspenso, na impugnação do despedimento – O abandono do Trabalho, cit., p.151.
Precisamente, apesar de tudo a Reidison provou que a A. esteve ausente do serviço desde 15.12.2020, aparecendo apenas fugazmente (apenas para “marcar posição”, se nos permitem o plebeísmo) a 17.03.2021. Ora, era sobre a A., como trabalhadora, que impendia a obrigação de se apresentar ao serviço em Alcântara (era sobre si que recaia o dever de assiduidade, conforme resulta da alínea b) do nº 1 do artigo 128º), sendo certo não estar demonstrada qualquer atitude ou comportamento da Reidison a tal obstativa (pelo contrário, no que resulta do provado em 20, mesmo após o envio da carta de abandono esta R. ainda aguardava por notícias da A.).
Por isso, caso a A. permanecesse doente e por isso impossibilitada de prestar o seu serviço em data posterior a 25.12.2020 (o que não resultou comprovado da instrução dos autos), o contrato ficaria suspenso ao fim de um mês (artigo 296º, nº 1), devendo apresentar-se ao empregador para retomar a actividade no dia imediato à cessação do impedimento (artigo 297º). Com tal não se confunde, por respeito ao princípio da boa-fé, como já se deu a perceber, o seu aparecimento a 17.03 apenas pelo que se passara nos dois dias anteriores (e que não pode deixar de ter sabido pelas suas colegas).
Caso não, as suas faltas injustificadas foram-se acumulando pelo menos desde essa data (artigos 249º e 254º, nº 1 e 2), e violado o dever de assiduidade (artigo 256º). Não tendo a R. lançado mão do procedimento disciplinar, o contrato de trabalho mantém-se, ainda que nas exactas condições do artigo 256º, nº 1.
Em qualquer das hipóteses, a Reidison não obstou à prestação efectiva de trabalho, logo não despediu a A., com o que improcede o correspondente pedido.

Ou seja, a sentença recorrida afastou a existência de uma situação de abandono do trabalho por parte da Autora, e o que ali se diz é que, apesar de não se provar esse abandono, o certo é que a Autora esteve ausente do trabalho entre 15-12-2020 e 16-03-2021, comparecendo apenas no dia 17-03-2021. Desconhece-se o porquê dessa ausência, mas a comparência a 17-03 não pode considerar-se como uma verdadeira apresentação ao serviço, por violação do principio da boa-fé, não podendo ser retiradas consequências jurídicas de tal acto.

Em sede de recurso, a Autora alega que se apresentou ao serviço no seu local de trabalho, em 17-03-2021, que a MSC, cliente da Ré Reidison, não admitiu a sua prestação de trabalho, e que, se é certo que lhe incumbia apresentar-se ao serviço, também é certo que a Reidison não deu cumprimento ao dever de informação a que aludem os artigos 107º e 109º do CT e cláusula 10ª nº2 do CCT, nomeadamente quanto aos aspectos relevantes relacionados com o local de trabalho, tal como não lhe deu a conhecer a cessação da prestação de serviços com a MSC, e que tal impedia que a Autora continuasse a prestar trabalho naquele local. E não lhe assegurou novo local de trabalho, obstando injustificadamente à prestação efectiva de trabalho, o que se traduz num despedimento ilícito.
O que dizer?
A Autora funda a sua pretensão na existência de um despedimento por parte da Ré Reidison, por esta não lhe ter indicado qualquer local de trabalho, após a sua apresentação a 17-03-2021, e por ter sido impedida de prestar o seu trabalho para a MSC no local habitual.
Como se sabe, uma das modalidades de cessação do contrato de trabalho é o despedimento.
Esta forma de resolução do contrato de trabalho pressupõe a existência de uma declaração de vontade da entidade empregadora nos termos da qual se comunica ao trabalhador que o contrato cessa para o futuro …[1]. Se não resultar provada uma declaração de vontade de rescindir o contrato, não podemos falar em despedimento[2]
Trata-se de uma declaração receptícia, o que significa que, para se tornar eficaz, tem de ser levada ao conhecimento do destinatário (art 224º nº 1 do C.Civil), e ainda constitutiva, pois põe termo ao contrato de trabalho, sem necessidade de recurso ao tribunal.
É também de uma declaração vinculada, não só por força do regime geral da resolução dos contratos (cfr. art. 432º nº1 do C.Civil), como por força do princípio constitucional da segurança no emprego (art. 53º da CRP), pelo que tem de se basear sempre num motivo. Sem fundamento, o despedimento é ilícito.
O ónus da prova dos factos de onde se poderia concluir pela existência de uma declaração de vontade da Ré no sentido de rescindir o contrato por despedimento, incumbia à Autora, dado tratar-se de facto constitutivo do seu direito (art. 342º nº1 do C.Civil). A Autora não logrou tal prova. De facto, na carta enviada à Autora a 03-02-2021, a Ré afirma que, em face da ausência injustificada daquela ocorreu abandono do trabalho, o que, já vimos, foi afastado pela primeira instância. E acrescenta que a conduta da Autora configura justa causa de despedimento. No entanto, em 23-02-2021, a MSC questionou a Reidison sobre a ausência da Autora e se havia previsão do seu regresso, sendo a resposta de que nada sabiam sobre as razões da ausência da trabalhadora, mas que seria melhor aguardarem até ao final de Fevereiro para cadastrarem um novo colaborador para o lugar dela. E em 11-03-2021, a Autora manifestou junto da Ré vontade de voltar a trabalhar, desconhecendo-se a resposta da Ré.
Ou seja, nem a carta datada de 03-02-2021 é clara quanto à vontade de afastar a Autora, rescindindo o respetivo contrato, parecendo antes uma chamada de atenção para o seu comportamento, nem a atitude posterior da Ré aponta nesse sentido. Aliás, a Ré tão pouco enviou à Autora comunicação semelhante à referida no ponto 37 dos factos, que remeteu às trabalhadoras DD e EE, em que claramente refere que o vínculo dessas trabalhadoras com a Ré cessou.
Nada resulta dos factos provados que nos permita concluir que a Ré Reidison negou à Autora qualquer colocação em qualquer local de trabalho ou obstaculizou a sua prestação de trabalho.
Não ocorreu, portanto, qualquer despedimento da Autora por parte da Ré Redison. Isto significa que o contrato de trabalho permanecia em vigor à data de 17-03-2021, desconhecendo-se futuras vicissitudes.
Tal como a 1ª instância, consideramos que a apresentação da Autora no dia 17-03-2021 não tem qualquer significado jurídico, pois a mesma não podia deixar de saber, dado que acompanhou as duas outras colegas cuja prestação de trabalho havia sido rejeitada nos dias 15 e 16 de Março, que a Reidison já não prestava trabalho para a MSC, e que a sua prestação de trabalho iria ser rejeitada. Assim, atenta contra a boa fé a conduta da Autora de se pretender fazer valer dessa apresentação no seu antigo local de trabalho, após 3 meses de ausência sem que seja conhecida a respectiva causa, para efeitos de justificar a existência de um despedimento ilícito. Ante o teor dos factos 29 e 31, a Autora deveria ter-se apresentado na sede da Ré Reidison pedindo para que a questão fosse resolvida, sendo-lhe indicado novo posto de trabalho.
Quanto à violação pela Ré dos invocados deveres de informação, desde logo dizer que essa é uma questão nova que não foi trazida à discussão na primeira instância, não sendo versada nos articulados, pelo que não pode este tribunal dela tomar conhecimento, já que extravasa o objecto do processo tal como configurado pela própria Autora.
O tribunal de recurso apenas pode substituir-se ao tribunal recorrido nos casos expressamente previstos. É o que resulta do disposto nos art. 608º nº 2, in fine, e 665º nº 2, ambos do CPC, e constitui doutrina e jurisprudência dominantes.

De facto, como afirma António Abrantes Geraldes, A natureza do recurso como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objecto, decorrente do facto de, em regra, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas.
Os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e o processo contenha todos os elementos imprescindíveis».[3] Também a jurisprudência vem decidindo nesse sentido. Assim, entre outros, vide Acórdão do STJ de 21-03-2012[4], nos termos do qual a função do recurso no quadro institucional que nos rege é a de remédio para correcção de erros in judicando ou in procedendo, em que tenha incorrido a instância recorrida, processo de reapreciação pelo tribunal superior de questões já decididas e não de resolução de questões novas, ainda não suscitadas no decurso do processo. E o Acórdão desta Relação de 11-09-2012[5], “III-Os recursos destinam-se a permitir a reapreciação de decisões tomadas com base no acervo dos factos alegados pelas partes e não a alegar factos novos nem a suscitar questões novas.
IV-As questões não colocadas pelas partes em momento processualmente adequado só podem ser apreciadas em fase de recurso na exacta medida em que delas o Tribunal possa ainda conhecer oficiosamente.
Conclui-se, assim, pela improcedência do recurso.
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V–Decisão

Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar improcedente o recurso interposto por AA, mantendo integralmente a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Apelante.
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Lisboa,21-02-2024



(Paula de Jesus Jorge dos Santos)
(1ª adjuntaMaria Luzia Carvalho)
(2ª adjuntaAlda Martins)


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[1]Sic Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 5º edição, pág. 1043.
[2]Cfr. Ac. STJ de 07-07-1993 – Proc 003666.
[3]Cfr Recursos em Processo Civil, Novo Regime, Almedina, 2ª edição, pág. 94 e Recursos no Processo do Trabalho – Novo Regime, 2010, pág. 65.
[4]Proc 130/10.0JAFAR.F1.S1, 3º Secção, disponível in www.dgsi.pt
[5]Proc 4336/07.1TVLSB.L2-1, disponível in www.dgsi.pt.