Parecer do Conselho Consultivo da PGR |
Nº Convencional: | PGRP00000771 |
Parecer: | P000481995 |
Nº do Documento: | PPA19950418004800 |
Descritores: | CÓDIGO DA ESTRADA REGULAMENTO INFRACÇÃO RODOVIÁRIA CONTRAVENÇÃO CONTRAORDENAÇÃO VEÍCULO AUTOMóVEL MATRÍCULA NORMA INCOMPLETA INTERPRETAÇÃO DA LEI APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO PREÂMBULO DA LEI LEI INTERPRETATIVA |
Livro: | 00 |
Pedido: | 07/24/1995 |
Data de Distribuição: | 09/19/1995 |
Relator: | LUCAS COELHO |
Sessões: | 01 |
Data da Votação: | 04/18/1996 |
Tipo de Votação: | UNANIMIDADE |
Sigla do Departamento 1: | MAI |
Entidades do Departamento 1: | SE DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA |
Posição 1: | HOMOLOGADO |
Data da Posição 1: | 05/24/1996 |
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Privacidade: | [01] |
Data do Jornal Oficial: | 23-08-1997 |
Nº do Jornal Oficial: | 194 |
Nº da Página do Jornal Oficial: | 10382 |
Indicação 2: | ASSESSOR: TERESA ALMEIDA |
Área Temática: | DIR CRIM * DIR ESTRAD * DIR ORDN SOC. |
Ref. Pareceres: | P000821987 P000821988 P000731987 P001091988 P001211988 P000401990 P000221995 |
Legislação: | DL 40955 DE 1957/02/90 ART1 ART2 ART4 ART5 ART6 ART7 ART8 ART10.; DL 114/94 DE 1994/05/03 ART1 ART2 ART3 ART6 ART7 ART8.; CE94 ART21 ART135 ART139 ART140.; DL 199/95 DE 1995/07/31.; DL 433/82 DE 1982/10/27 ART17 N1. |
Direito Comunitário: | ![]() |
Direito Internacional: | ![]() |
Direito Estrangeiro: | ![]() |
Jurisprudência: | ![]() |
Documentos Internacionais: | ![]() |
Ref. Complementar: | ![]() |
Conclusões: | 1- Nos termos dos preceitos conjugados dos artigos 6, n2, 7, do Decreto-Lei n 114/94, de 3 de Maio, que aprovou o Código da Estrada, o Decreto-Lei n 40995, de 9 de Fevereiro de 1957, deve ser considerado como o regulamento do Código previsto no n 4 do seu artigo 121; 2- As infracções originalmente previstas no Decreto-Lei n 40955 como contravenções devem, consequentemente, ser qualificadas como contra-ordenações a partir de 1 de Outubro de 1994, data da entrada em vigor do Código, por força do artigo 135 deste diploma; 3- O artigo 1, n1 A, do decreto-Lei n 199/95, de 31 de Julho , na medida em que qualificou as mesmas infracções como contra- -ordenações, tem natureza interpretativa. |
Texto Integral: | Senhor Secretário de Estado da Administração Interna, Excelência: I 1. O Exmº Senhor Auditor Jurídico do Ministério da Administração Interna propôs a Vossa Excelência a audição deste corpo consultivo acerca de problemática equacionada em Informação nº 465-G/95, de 11 de Julho de 1995, que se transcreve na parte útil: "Assunto: Divergências sobre a qualificação jurídica das infracções previstas no Decreto-Lei nº 40 995, de 9 de Fevereiro de 1957". 1. Na sequência da remessa ao Tribunal Judicial da Comarca de Faro, do "auto de transgressão" nº 26 944-OG, levantado em 31 de Outubro de 1994, pela Guarda Nacional Republicana, com fundamento no facto de o cidadão (...) circular com o veículo 11 097-Chapa de Trânsito, na via pública, sem que se fizesse acompanhar do "verbete de Despacho", assim violando o disposto na alínea a) do artigo 4º do Decreto-Lei nº 40 995, de 9 de Fevereiro de 1957, o Meritíssimo Juiz daquela Comarca, por douto despacho de 9 de Janeiro de 1995, declarou-se incompetente, em razão da matéria, para conhecer daquela infracção, por entender, em síntese, que a mesma deixou de ser qualificável como contravenção e passou a ser considerada como contra-ordenação, desde a data da entrada em vigor do novo Código da Estrada. Por isso, foi determinado que o referido processo de transgressão fosse remetido à apreciação do Senhor Director-Geral de Viação, nos termos do Despacho nº 7/94 (Diário da República, II Série, de 23 de Setembro de 1994). "2. Recebido o processo na Direcção-Geral de Viação, foi emitido um parecer jurídico, no qual se sustenta o entendimento oposto, com o fundamento de que a disposição infringida, do citado Decreto-Lei nº 40 995, deve ser considerada como "norma complementar ao Código da Estrada", não abrangida por este, e não como "norma regulamentar do Código da Estrada", sendo por isso inaplicável, ao caso em apreço, o artigo 135º do Código da Estrada. Assim, na ausência de alteração legislativa expressa, da qualificação das infracções previstas no citado Decreto-Lei nº 40 955, estas devem continuar a ser consideradas como contravenções. "3. A hierarquia da Direcção-Geral de Viação, embora concordando com o parecer emitido pelos serviços técnicos, refere que a divergência detectada no caso concreto em apreço não é isolada, alerta para as dificuldades resultantes da falta de uniformidade de entendimento e sugere que, sobre o assunto, seja solicitado parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República." 2. O Exmº Auditor considera, a finalizar, que o parecer do Conselho Consultivo, enquanto não for encarada uma clarificação da situação por via legislativa, constitui o meio de ultrapassar divergências de entendimento como as que se verificam no caso em apreço, atento o disposto no artigo 10º, nº 2, alínea h), última parte, e no artigo 39º, nº 1, da Lei Orgânica do Ministério Público. Dignou-se Vossa Excelência concordar, pelo que cumpre emitir o solicitado parecer. II 1. O Decreto-Lei nº 40 995, de 9 de Fevereiro de 1957, veio permitir - lê-se no sumário respectivo do "Diário do Governo" - "que os veículos automóveis novos apresentados a despacho nas alfândegas do continente sejam despachados e saiam das referidas alfândegas com dispensa da matrícula exigida pelo Código da Estrada". Ponderou-se, no breve preâmbulo, que a medida fora adoptada mercê de representação, pelo Grémio dos Importadores, Agentes e Vendedores de Automóveis e Acessórios do Sul, de que a exigência de matrícula, como condição do despacho alfandegário do veículo, "conduz à sua desvalorização sempre que há demora na venda, uma vez que os compradores preferem os de matrícula mais recente". Nestes termos, estatuiu-se, em quanto ao presente parecer directamente concerne: "Artigo 1º Os veículos automóveis novos que forem apresentados a despacho nas alfândegas do continente por importadores, agentes e vendedores de automóveis e acessórios podem ser despachados e sair das referidas alfândegas com dispensa da matrícula exigida pelo Código da Estrada. § único. Em relação aos veículos a despachar nestas condições, os importadores inutilizarão nos verbetes a que se refere o nº 1 do artigo 44º do Código da Estrada (1) a parte final respeitante às direcções de viação, apondo os dizeres "Veículo não matriculado". "Art. 2º - 1 - Os veículos automóveis despachados e saídos das alfândegas serão obrigatoriamente matriculados, nos termos do artigo 41º do Código da Estrada (2), no prazo de 360 dias, contado da data do despacho alfandegário. 2 - O prazo referido no número anterior pode ser prorrogado por mais 180 dias, em casos excepcionais (...) (...)"(3). (...) (...) "Art. 4º Durante o prazo fixado no artigo 2º os veículos só poderão transitar com as chapas de trânsito referidas no artigo seguinte das alfândegas para os locais de armazenagem, venda ou preparação para venda ou entre estes locais, devendo os respectivos condutores trazer os seguintes documentos: a) Verbete de despacho a que se refere o nº 1 do artigo 44º do Código da Estrada, que substituirá, para todos os efeitos, o livrete referido no artigo 42º do mesmo código (4); b) Uma guia, passada pelo importador ou respectivo agente concessionário, da qual constem os indispensáveis elementos de identificação do veículo, o itinerário e o objectivo da deslocação. "Art. 5º As chapas de trânsito serão atribuídas pelos grémios (...) aos respectivos importadores (...), sendo-lhes aplicável o disposto no nº 1 do artigo 34º do Código da Estrada e no nº 1 do artigo 36º e no artigo 37º do regulamento do mesmo código. § único. Estas chapas terão a configuração e as dimensões mínimas constantes do quadro anexo (...) (5). "Art. 6º Nos veículos automóveis que transitem nos termos do artigo 4º só poderá viajar o condutor, que será o representante ou empregado do importador ou agente (...). "Art. 7º Os veículos que transitem com chapa de trânsito deverão satisfazer a todos os requisitos exigidos pelo Código da Estrada e seu regulamento (...). "Art. 8º A saída das alfândegas de veículos automóveis e reboques será feita com dispensa da inspecção a que se refere o nº 3 do artigo 44º do Código da Estrada, mas os importadores responderão perante os compradores (...). (...) "Art. 10º Serão punidos: 1º Com multa de 5.000$ e apreensão do veículo, nos termos do artigo 43º do Código da Estrada: A contravenção do artigo 2º; O trânsito de veículos não matriculados para fins diferentes dos mencionados no artigo 4º. 2º Com multa de 500$: O trânsito sem chapa a que se refere o artigo 5º; A falta dos documentos a que se referem as alíneas a) e b) do artigo 4º; A contravenção do artigo 6º. 3º Com multa de 200$, a contravenção do disposto no artigo 3º. § único. Os veículos apreendidos nos termos do nº 1 deste artigo só poderão ser restituídos depois de terem sido matriculados (6). "Art. 11º (...) (...)" 2. A Direcção-Geral de Viação pretende que o diploma transcrito não se encontra abrangido no artigo 135º do actual Código da Estrada. O estudo desenvolvido conduziu-nos, porém, a uma conclusão diferente, cuja boa compreensão aconselha, por isso, se conheça, desde já, o citado normativo: "Artigo 135º Legislação aplicável 1 As infracções às disposições deste Código e seus regulamentos têm a natureza de contra- ordenações, salvo se constituírem crimes, sendo então puníveis e processadas nos termos gerais das leis penais. 2. As contra-ordenações são puníveis e processadas nos termos da respectiva lei geral, com as adaptações constantes deste Código." A disposição transcrita coloca, efectivamente, o intérprete perante um critério de definição das infracções que constituem contra-ordenações: as previstas no Código da Estrada e seus regulamentos. Daí que, à face do preceito, importa saber se o Decreto-Lei nº 40995 merece ou não alguma destas qualificações. Veremos que as violações às prescrições desse diploma, posteriores a 1 de Outubro de 1994, são realmente infracções a um regulamento do Código da Estrada, ou, quando assim se não entendesse, infracções ao próprio Código, revestindo, por conseguinte, a natureza de contra-ordenações nos termos do artigo 135º. 3. Mediante o Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio, foi aprovado, para entrar em vigor em 1 de Outubro de 1994, um novo Código da Estrada, revogando-se o então vigente, aprovado originalmente pelo Decreto-Lei nº 39672, de 20 de Maio de 1954. 3.1. Transcrevam-se, dos oito artigos que compõem o articulado daquele diploma, os preceitos com interesse directo na consulta: "Artigo 1º É aprovado o Código da Estrada, cujo texto se publica em anexo ao presente Decreto-Lei e dele é parte integrante. "Art. 2º É revogado o Código da Estrada aprovado pelo Decreto-Lei nº 39672, de 20 de Maio de 1954, bem como a respectiva legislação complementar que se encontre em oposição às disposições do Código ora aprovado. "Art. 3º Consideram-se efectuadas para as correspondentes disposições do Código da Estrada ora aprovado as remissões, constantes de lei ou de regulamento, para o Código da Estrada aprovado pelo Decreto-Lei nº39672, de 20 de Maio de 1954. (...) (...) "Art. 6º - 1 - (...) 2 - Os regulamentos previstos nos artigos 28º, 55º, 121º, nºs. 3 e 4, 123º a 127º e 130º do Código da Estrada são aprovados por decreto regulamentar. 3 - (...) 4 - (...) 5 - (...) "Art. 7º Até que entrem em vigor as normas regulamentares necessárias para execução do Código da Estrada ora aprovado serão aplicáveis as disposições vigentes, na medida em que não contrariem o que nele se dispõe. "Art. 8º Os artigos 1º a 3º do presente diploma entrarão em vigor no dia 1 de Outubro de 1994". 3.2. O artigo 7º dispõe, portanto, que, até à entrada em vigor das normas regulamentares necessárias à execução do Código, são aplicáveis as disposições vigentes na medida em que não contrariem o disposto no Código. Entre aquelas "normas regulamentares" contam-se as previstas nos diversos normativos citados no artigo 6º, com relevo para o artigo 121º, nº 4, respeitante à matrícula de veículos: "Artigo 121º Obrigatoriedade de matrícula 1. Os veículos automóveis, reboques e ciclomotores, em condições de serem utilizados, estão sujeitos a matrícula de onde constem as características que permitam identificá-los, sem prejuízo do disposto no nº 3. 2. Exceptuam-se do disposto no número anterior os reboques cujo peso bruto (...). 3. Os casos em que os veículos e os reboques podem ser dispensados de matrícula são objecto de regulamento (7). 4. Os veículos e os reboques que devam ser apresentados a despacho nas alfândegas pelas entidades que se dediquem à sua importação, montagem ou fabrico podem delas sair com dispensa de matrícula, nas condições a estabelecer em regulamento. 5. (...) 6. (...)" 3.3. O regulamento previsto no nº 4 do artigo 121º refere-se, pois, às condições em que "os veículos e os reboques que devam ser apresentados a despacho nas alfândegas pelas entidades que se dediquem à sua importação (...) podem delas sair com dispensa de matrícula". Matéria que constitui, como vimos, o conteúdo normativo do Decreto-Lei nº 40 995, de 9 de Fevereiro de 1957. Nos termos do artigo 7º do diploma de introdução ao novo Código da Estrada, esse Decreto-Lei conserva, pois, a sua aplicabilidade na medida em que não contrarie o que nele se dispõe. Ora, não se vê que exista essa contrariedade, designadamente no tocante aos artigos 1º, 4º e 10º, nº 2, do Decreto-Lei nº 40995, que estão no cerne da consulta, sem prejuízo, quanto a este último normativo, do que adiante vai dito acerca da natureza da infracção. 4. A disciplina do Decreto-Lei nº 40995 foi, pois, acolhida pelo novo Código da Estrada. 4.1. Os artigos 6º, nº 2, e 7º do respectivo diploma preambular atribuíram efectivamente ao citado Decreto-Lei, ainda que a título transitório, na estrutura do nº 4 do artigo 121º do Código, a mesma função conferida por este normativo ao regulamento nele previsto. O Decreto-Lei nº 40 995 deve, pois, nesta óptica, ser considerado como regulamento do novo Código da Estrada, à semelhança do que sucedeu com outros diplomas ligados mais ou menos estreitamente ao Código precedente, com relevo para o Regulamento do Código da Estrada aprovado pelo Decreto nº 39987, de 22 de Dezembro de 1954 (8). Tal a qualificação que nos inclinamos a atribuir àquele diploma. 4.2. Vejamos, porém, as coisas noutra metodologia, para o caso de se ter como duvidosa esta construção. Sabe-se que "as proposições singulares da lei não quedam isoladas umas ao lado das outras, antes constituem muitas vezes normas incompletas que apenas nas suas conexões revelam a norma completa" (9) aplicável ao caso. A actividade de classificação categorial das normas incompletas (unvollständige Rechtssätze) pondera, em primeiro lugar, que algumas delas "visam apenas precisar melhor a previsão, um elemento da previsão ou a consequência jurídica de uma norma completa" (10). É o caso das "normas explicativas, interpretativas ou aclaratórias" (11) (erläuternde Rechtssätze), compreendendo, por sua vez, duas espécies: a das normas que "precisam um conceito ou tipo usado noutras normas", nomeadamente como elemento da sua previsão - chamemos- lhes "normas definidoras ou delimitadoras" (12) (umschreibende Rechtssätze); e a das "normas que, na perspectiva de distintas conformações factuais, especificam ou preenchem o conteúdo de uma expressão de natureza geral", normalmente em esclarecimento da consequência jurídica - "normas complementadoras" (13) (ausfÿllende Rechtssätze). Ao lado das "normas explicativas ou aclaratórias" distinguem--se, em segundo lugar, as denominadas "normas restritivas" (einschränkende Rechtssätze), que "limitam uma norma jurídica formulada em termos amplos, exceptuando da sua aplicação determinado grupo de casos". Finalmente, a categoria das "normas remissivas" (verweisende Rechtssätze), que "remetem para outra norma, com respeito a um elemento da previsão ou à consequência jurídica" (14). Trata-se, naturalmente, de categorias típicas, as quais, nem pretendem esgotar todas as variantes de normas incompletas que a técnica legislativa pode oferecer à análise metodológica, nem tão-pouco se assumem como espaços fechados, adversos a formas de inter-relacionação e combinação diversificadas. Por outro lado, as normas deste género, configurando-se como proposições completas do ponto de vista linguístico, não são completas no plano normativo. A sua posição no seio do ordenamento é, porém, a de verdadeiras normas jurídicas - se bem que incompletas. E isto significa que "participam do sentido de validade da lei", que são "partes de determinações de validade" (Geltungsanordnungen), em lugar de se reduzirem a meras "proposições declarativas" ou enunciativas (Aussagesätze). Só que, "apenas em conexão com outras normas jurídicas recebem a força constitutiva e fundamentadora de efeitos jurídicos" (15). Ora, o nº 4 do artigo 121º do Código da Estrada é na realidade uma norma incompleta neste sentido, sem que interesse decisivamente catalogá-la numa das categorias tipificadas. Provavelmente cabe na classe das normas remissivas, mas o que mais importa é atrair a atenção para a sua incompletude no concernente às "condições de dispensa de matrícula", a qual se diria tocar, quer o âmbito da previsão, quer o domínio dos efeitos jurídicos. Assim o confirma o articulado do Decreto-Lei nº 40995, mediante cuja recepção no seio do nº 4 do artigo 121º do novo Código, por conjugação dos artigos 6º, nº 2, e 7º do respectivo diploma preambular, se completou normativamente aquele preceito. Observe-se, na verdade, quanto às disposições daquele Decreto-Lei directamente implicadas na consulta, que, se o artigo 1º e mesmo o artigo 4º respeitam fundamentalmente ao campo da previsão, já as disposições sancionatórias do artigo 10º se diriam antes coligadas à estrutura das consequências jurídicas. A perspectiva que se vem desenvolvendo apontaria, pois, no sentido de que o Decreto-Lei nº 40995 passou, a partir de 1 de Outubro de 1994, a integrar o novo Código da Estrada. 4.3. Em suma. Desde essa data, deve o mesmo Decreto-Lei ser considerado como regulamento do Código da Estrada. Quando, no entanto, esta qualificação se não perfilhasse, o Decreto-Lei nº 40995 conceber-se-ia, subsidiariamente, como complexo normativo integrador do Código, sendo a opção por aquela ou esta das construções indiferente, como já se compreendeu, para os objectivos do presente parecer. Por qualquer delas se explica, em termos dogmaticamente correctos, a solução da sobrevigência do Decreto-Lei nº 40995, imputada ao artigo 7º do Decreto-Lei nº 114/94, desiderato teorético que não seria, ao invés, atingido a excluirem-se ambas as qualificações. Se, aliás, o Decreto-Lei nº 40995 não fosse configurável como regulamento do novo Código da Estrada, nem, subsidiariamente, neste se pudesse considerar integrado, então seria um diploma avulso, vigente meramente por não ter sido revogado, e quedando estranho ao sistema, não obstante os casos da vida em abstracto nele contemplados serem daqueles mesmos que se acolhem à sombra tutelar do nº 4 do artigo 121º do Código. Ora, não nos inclinamos a preferir essa conceptualização, conflituante com uma tão estreita teleologia. III 1. A interrogação endereçada ao Conselho Consultivo tem a ver com a qualificação das infracções previstas no Decreto-Lei nº 40995, de 9 de Fevereiro de 1957, após a entrada em vigor do novo Código da Estrada, questão emergente de divergências de entendimento ilustradas proximamente pelo conflito negativo de jurisdição entre o tribunal judicial da comarca de Faro e a Direcção-Geral de Viação, relatado pelo Exmº Senhor Auditor Jurídico. Enquanto naquele tribunal se enquadraram as aludidas infracções na categoria das contra-ordenações, propendeu a Direcção-Geral para a tese de que mantêm a natureza de contravenções. Aduziu-se neste sentido que a disposição infringida, nomeadamente - o artigo 4º, alínea a), do Decreto-Lei nº 40995 -, deve ser considerada "norma complementar" do Código da Estrada, não abrangida por este, em vez de sua "norma regulamentar", sendo-lhe por isso inaplicável o artigo 135º do mesmo Código. 2. Recorde-se o teor da disposição: Artigo 135º Legislação aplicável 1. As infracções às disposições deste Código e seus regulamentos têm a natureza de contra- ordenações, salvo se constituírem crimes, sendo então puníveis e processadas nos termos gerais das leis penais. 2. As contra-ordenações são puníveis e processadas nos termos da respectiva lei geral, com as adaptações constantes deste Código". 2.1. Observou-se ultimamente, em parecer deste Conselho Consultivo, à luz do preceito, que o "princípio é hoje o de que as infracções ao Código da Estrada e seus regulamentos têm a natureza de contra-ordenações, salvo se constituírem crimes" (16). Precisando a ideia, escreve-se, em recente anotação ao mesmo normativo (17): "Segundo o nº 1 do presente artigo as infracções ao Código da Estrada e seus regulamentos só podem ter duas naturezas. "Em primeiro lugar, podem ter natureza penal. É assim quando constituam crime. Nesta hipótese, é- lhes aplicável uma pena de prisão e/ou multa e, eventualmente, medidas de segurança criminais. "Em segundo lugar, as infracções ao presente Código e seus regulamentos têm - é esta a regra - natureza de contra-orde-nação, pertencendo ao denominado direito de mera ordenação social, sendo puníveis com coima e, eventualmente, medidas de segurança (inibição de conduzir, por exemplo) administrativas. "Isto significa que desapareceu do domínio do direito rodoviário, ou, como se queira, direito da circulação terrestre, enquanto regulado por este Código e seus regulamentos, a figura da contravenção ou transgressão, que tinha natureza penal." Cumpria assim o legislador do Código da Estrada "a injunção político-criminal de que em 1982 se fez eco: "nem mais uma contravenção no futuro" (18). Flui do anteriormente exposto que o Decreto-Lei nº 40995 deve ser considerado regulamento do novo Código da Estrada, ou, subsidiariamente, parte integrante deste Código. Em qualquer das hipóteses, as infracções nele previstas passaram, a partir de 1 de Outubro de 1994, a revestir a natureza de contra-ordenações, por força, precisamente, do citado artigo 135º. 2.2 Restaria o problema da punição nos casos concretos, da alçada da autoridade dotada de competência sancionatória. Embora o tema esteja à margem do objecto da consulta, sempre se observará que a mutação operada na natureza dos ilícitos tem como corolário lógico a sua punibilidade com coimas de valor correspondente às multas previstas. Escreve-se, em sintonia, a este propósito (19): "O nº 1 deste artigo converte em contra- ordenações as contravenções que se encontrem ainda previstas nos regulamentos para que remete este Código. Em tais disposições regulamentares, onde porventura se lê "multa" deve passar a ler- se "coima". "Nem isto é nada de especial. "Na verdade, a própria Constituição não fala em contravenções, mas só em crimes e ilícitos de mera ordenação social. E "ao referir o ilícito de mera ordenação social, omitindo toda a referência à figura das contravenções (que era tradicional no direito português até ao Código Penal de 1982), a Constituição deixa entender claramente que ela desapareceu como tipo sancionatório autónomo, pelo que as contravenções que subsistirem (ou que forem ex novo criadas) têm de ser tratadas de acordo com a natureza que no caso tiverem (criminal ou de mera ordenação social)" (20). Em alternativa, ponderar-se-ia a aplicação dos artigos 139º e 140º do Código da Estrada (21), em conjugação com o artigo 17º, nº 1, do Decreto-Lei nº 433/82, de 23 de Setembro (22), aplicável subsidiariamente por força do nº 2 do artigo 135º do Código. Sem esquecer, ademais, a incidência própria das coimas estabelecidas no Decreto-Lei nº 199/95, de 31 de Julho, entretanto publicado. 3. Conheçam-se, aliás, na íntegra as disposições deste diploma: "Artigo 1º - 1 - Têm a natureza de contra- ordenações, salvo se constituírem crimes, as infracções até agora qualificadas como contravenções e tipificadas nos seguintes diplomas legais: a) Decreto-Lei nº 40995, de 9 de Fevereiro de 1957; b) Decreto-Lei nº 45229, de 9 de Outubro de 1963; c) Decreto-Lei nº 47107, de 19 de Julho de 1966; d) Decreto-Lei nº 49020, de 23 de Maio de 1969; e) Decreto-Lei nº 6/82, de 12 de Janeiro; f) Decreto Regulamentar nº 65/83, de 12 de Julho; g) Decreto Regulamentar nº 33/88, de 12 de Setembro h) Portaria nº 20393, de 26 de Fevereiro de 1964. 2 - As contra-ordenações referidas no número anterior são puníveis com coimas cujos limites mínimos e máximos serão iguais aos correspondentes limites para as multas até agora previstas naqueles diplomas, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 3 - Quando, nos diplomas referidos no nº 1, se determinar um montante fixo para as infracções neles previstas, considera-se que as coimas correspondentes a essas contra-ordenações têm como limite mínimo o montante referido e como limite máximo o quíntuplo desse valor. 4 - É aplicável a estas contra-ordenações o regime legal previsto para o processamento e punição das infracções ao Código da Estrada. "Art. 2º. Aos montantes das coimas cobradas por infracções à legislação a que se refere o artigo anterior é aplicável o regime previsto no Decreto- Lei nº 138/89, de 28 de Abril. "Art. 3º O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação." 3.1. O artigo 1º, nº 1, alínea a) qualifica como contra-ordenações as infracções tipificadas no Decreto-Lei nº 40995, harmonizando-se com a tese, perfilhada nas páginas antecedentes, que defendia já a mesma qualificação desde a entrada em vigor do novo Código da Estrada. O normativo não assume, assim, objectivamente considerado, carácter inovatório, mas natureza declarativa ou interpretativa, tendo vindo "consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da LA com que os interessados podiam e deviam contar", solução que, perante "a incerteza" ou "o sentido jurídico controvertido" das regras jurídicas aplicáveis, "os tribunais podiam ter adoptado" (23). Numa certa leitura, a breve nota preambular pode, porventura, induzir impressão diversa: "O Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio, teve em vista uma actualização das regras jurídicas aplicáveis ao trânsito nas vias públicas, que se encontravam previstas no anterior Código da Estrada, em legislação complementar e ainda em legislação avulsa. "Sendo certo que o regime sancionatório do Código da Estrada foi radicalmente alterado, passando de contravencional a contra-ordenacional, tal alteração não se aplica ainda à globalidade da legislação que se encontra em vigor ao abrigo do Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio. "Assim: "Nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 201º da Constituição, o Governo decreta (...)". Na medida em que o excerto é susceptível de ser entendido como manifestação subjectiva da intenção de inovar na qualificação, cremos que essa vontade do "legislador histórico" plasmada no preâmbulo não poderia sobrepor-se à interpretação que considera objectivamente declarativa a norma em causa. Como já se escreveu, o preâmbulo não é senão "um intróito do diploma legal", o "frontispício do articulado", "um texto destinado ao conhecimento do grande público (porque será objecto de publicação - fazendo um corpo único com o articulado - no Diário da República), contendo o "resumo sintético das principais disposições normativas que integram o diploma" e possuindo, por isso, "não só o papel didáctico de permitir uma ideia abreviada de qual é o conteúdo do articulado, mas também assinalável relevância interpretativa acerca do diploma em causa" (24). Mas, não mais do que isso. As "afirmações formalmente incluídas pelo legislador" num preâmbulo estão longe de possuir "carácter vinculativo directo". Podem servir de "auxílio precioso para a interpretação de um texto", mas "não têm o mesmo valor do texto". "Em si, não têm o sentido de determinação, que é o próprio de uma fonte de direito, mas o de esclarecimento" e, por isso, "se houver contradição é o que está no articulado (...) que prevalece" (25). O que tudo concordará com a ideia geral, cara ao pensamento objectivista, de que ao detentor do poder legislativo assiste "um real 'espírito objectivo'", limitando-se aquele a "outorgar-lhe consciência, iniciativa, virtualidade de actuação". "As leis seriam, então, 'objectivações' daquele espírito objectivo", em lugar de emanações dos "pontos de vista pessoais" dos seus autores, que não encontrariam fundamento numa "compreeensão de legitimidade democrática". De facto, prevalece nas "democracias representativas" a "ideia regulativa" de que os órgãos legislativos se devem "conformar, no plano da legitimidade, com as representações de justiça dominantes na sociedade, emprestando-lhes concretização legal". Um "elemento de democracia directa", que se diria aconselhar a interpretação das leis tal como o legislador devia pensá-las "enquanto representante das concepções prevalecentes na sociedade", e legitimando o intérprete ao exercício de uma correspondente "aferição de legitimidade representativa" (26). 3.2. Os nºs 2 e 3 do artigo 1º referem-se, por seu turno, às coimas com que são punidas as contra- ordenações. O nº 2 afigura-se assumir o mesmo carácter declarativo de uma interpretação já anteriormente viável, mas já no nº 3 sobressai, ao invés, a natureza inovatória das molduras abstractas cominadas, inovação expressivamente objectivada nos respectivos limites máximos. Diga-se apenas, a finalizar, que se trata de tópicos não negligenciáveis na transposição da lei para os casos concretos, tarefa essa, todavia, cuja prossecução transcenderia os limites da problemática colocada ao Conselho Consultivo. IV Do exposto se conclui: 1. Nos termos dos preceitos conjugados dos arts. 6º, nº 2, e 7º, do Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio, que aprovou o Código da Estrada, o Decreto-Lei nº 40995, de 9 de Fevereiro de 1957, deve ser considerado como o regulamento do Código previsto no nº 4 do seu artigo 121º; 2. As infracções originalmente previstas no Decreto-Lei nº 40995 como contravenções devem, consequentemente, ser qualificadas como contra- ordenações a partir de 1 de Outubro de 1994, data da entrada em vigor do Código, por força do artigo 135º deste diploma; 3. O artigo 1º, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 199/95, de 31 de Julho, na medida em que qualificou as mesmas infracções como contra- -ordenações, tem natureza interpretativa. 1) Do seguinte teor: "1. A matrícula dos veículos automóveis será feita a requerimento dos respectivos proprietários nas direcções de viação. Se os veículos forem de fabrico nacional, o requerimento será acompanhado do certificado de origem e garantia passado pelo construtor. Tratando-se de veículos importados, juntar-se-á o verbete de despacho do modelo a fixar em regulamento, no qual se indicarão as principais características do veículo, o número de ordem do bilhete de despacho e a respectiva casa de despacho. Poderão ser sujeitos a matrícula provisória os veículos automóveis a importar temporariamente, nos termos da respectiva legislação. Poderão também ser matriculados provisoriamente, por tempo não superior a cento e oitenta dias, os veículos automóveis construídos em Portugal e destinados à exportação definitiva". 2) Reproduza-se, a título de elucidação, o texto respectivo: "Artigo 41º Obrigatoriedade de matrícula 1. Todos os veículos automóveis, reboques, veículos de tracção animal e velocípedes em condições de serem utilizados estão sujeitos a matrícula, donde constem as características que os permitam identificar. Exceptuam-se: a) Os veículos pertencentes ao equipamento das forças armadas ou militarizadas; b) Os reboques cujo peso bruto não exceda 300Kg. A contravenção do disposto neste número será punida com a multa de (...) (...), conforme se trate, respectivamente, de veículos automóveis (...) (...)". 2. Quando um veículo se inutilizar o seu proprietário deverá requerer, no prazo de trinta dias, o cancelamento da respectiva matrícula". 3) Redacção do artigo 7º do Decreto-Lei nº 240/89, de 26 de Julho. 4) Atenta a extensão do artigo 42º, transcreve-se apenas o seu nº 1, no qual se define a configuração do "livrete": "Por cada veículo matriculado será passado pelas direcções de viação ou pelas câmaras municipais, consoante os casos, um certificado de matrícula (livrete) de modelo a fixar em regulamento, o qual deve acompanhar o veículo, sempre que este transite nas vias públicas". 5) No tocante às chapas de trânsito dos veículos em causa, cfr., porém, a Portaria nº 20393, de 26 de Fevereiro de 1964, maxime o seu nº 1, § 2º. 6) Os quantitativos das multas indicados nos nºs. 1º, 2º e 3º passaram, por força do artigo 8º do Decreto-Lei nº 240/89, de 26 de Julho, para 225.000$00, 22.500$00 e 9.000$00, respectivamente. 7) Este regulamento já foi publicado. Trata-se do Decreto-Regulamentar nº 64/94, de 4 de Novembro, sem relevo imediato no âmbito do presente parecer. 8) JOSÉ DA COSTA PIMENTA, Código da Estrada Anotado e Legislação Complementar, Coimbra, nas anotações ao Regulamento, págs. 425 e segs., com exemplos inclusivamente de revogações tácitas por incompatibilidade com o novo Código (v.g., artºs 28º, 36º, 38º, págs. 479, 490 e 491, respectivamente). Acerca do fenómeno de "sobrevigência" de regulamentos, revogada a lei regulamentada, e sua fundamentação doutrinária, veja-se o parecer do Conselho Consultivo nº 68/91, de 20 de Maio de 1993, inédito (ponto III, 6.). 9) KARL LARENZ, Methodenlehre der Rechtswissenschaft (Studienausgabe), 5ª edição alemã, Springer-Verlag, Berlin, Heidelberg, New York, Tokyo, 1983, pág. 140 - cfr. a tradução portuguesa daquela edição, por JOSÉ LAMEGO/ANA DE FREITAS, Metodologia da Ciência do Direito, 2ª edição, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1989, pág. 310. 10) LARENZ, op. cit., págs. 137 e segs., que por instantes se acompanha. 11) "Aclaratórias" é o termo preferido na tradução citada supra, nota 9. 12) Na mesma tradução usa-se a expressão "delimitadoras". 13) Terminologia da tradução citada. 14) Acerca das normas remissivas e das ficções legais como remissões vejam-se os pareceres deste Conselho nº 92/87, de 11 de Fevereiro de 1988, "Diário da República", II Série, nº 218, de 20 de Abril de 1988, nº 82/88, de 13 de Julho de 1988, inédito, nº 73/87, de 11 de Maio de 1989, "Diário" citado, nº 18, de 8 de Agosto de 1989, nº 109/88, de 2 de Julho de 1989, inédito, nº 121/88, de 10 de Maio de 1990, "Diário", nº 205, de 5 de Setembro de 1990, nº 40/90, de 7 de Novembro de 1991, "Diário", nº 168, de 23 de Julho de 1992, e a doutrina neles citada (OLIVEIRA ASCENSÃO, LARENZ, ZIPPELIUS). 15) LARENZ, op. cit., pág 37. 16) Extracto, sublinhado agora, do parecer nº 22/95, de 22 Junho de 1995, emitido a pedido de Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado da Administração Interna e pendente de homologação (ponto 3.3.). 17) COSTA PIMENTA, op. cit., págs. 343 e seguinte. 18) ANABELA MIRANDA RODRIGUES, O direito de mera ordenação social na circulação rodoviária, opúsculo inédito com 22 páginas, sem data, pág. 2. 19) COSTA PIMENTA, op. cit., pág. 344. 20) O autor que estamos a acompanhar acaba de citar GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra, 1993, pág. 673, acrescentando que esta doutrina foi acolhida no acórdão do Tribunal Constitucional nº 308/94, de 24 de Março, publicado no "Diário da República", II Série, de 29 de Agosto de 1994, págs. 8883 e seguintes. É, todavia, duvidoso o verdadeiro alcance que aqueles constitucionalistas pretenderam imprimir à ideia, assim veiculada em anotação à alínea d) do artigo 168º da Constituição - reserva relativa parlamentar na definição do regime geral de punição das infracções disciplinares bem como dos actos ilícitos de mera ordenação social e do respectivo processo -, de que "as contravenções que subsistirem (ou que forem ex novo criadas) têm de ser tratadas de acordo com a natureza que no caso tiverem (criminal ou de mera ordenação social)". Mas já não há dúvida de que o citado acórdão do Tribunal Constitucional deu aplicação àquela tese, embora dentro dos limites que interessavam ao caso sub iudicio: saber se determinadas normas regulamentares editadas pelo Governo e corporizando uma contravenção eram organicamente inconstitucionais. Considerou-se, apelando para a tese aludida, que o tratamento a conferir à contravenção "há-de ser o correspondente às contra-ordenações, para as quais a Constituição não exige a prévia definição do tipo e da punição concreta em lei parlamentar". 21) Que se reproduzem: "Artigo 139º Classificação das contra-ordenações 1. As contra-ordenações previstas neste Código e nos seus regulamentos classificam-se em leves, graves e muito graves. 2. São contra-ordenações leves as que não forem classificadas como graves ou muito graves". O artigo 148º contém o elenco das contra-ordenações graves, enquanto a enumeração das muito graves consta do artigo 149º, anotando-se que nenhuma delas se refere a factos punidos pelo Decreto-Lei nº 40995. "Artigo 140º Coima 1. Salvo disposição legal em contrário, a coima aplicável tem os seguintes limites máximos: a) Para as contra-ordenações leves: 50 000$00; b) Para as contra-ordenações graves: 100 000$00; c) Para as contra-ordenações muito graves: 200 000$00. 2. Para as contra-ordenações previstas em regulamentos não podem estabelecer-se sanções com limites superiores aos estabelecidos no presente Código. 3. As coimas aplicadas (...) não estão sujeitas a qualquer adicional (...)." 22) Dispõe, por seu turno, o artigo 17º, nº 1 da lei geral das contra-ordenações, na redacção, por último, do Decreto-Lei nº 244/95, de 14 de Setembro: "Artigo 17º Montante das coimas 1- Se o contrário não resultar da lei, o montante mínimo da coima aplicável às pessoas singulares é de 750$00 e o máximo de 750 000$00. 2- (...) 3- (...) 4- (...)". Nesta segunda alternativa equacionada no texto, a infracção ao Decreto-Lei nº 40995 que originou o conflito entre o tribunal de Faro e a Direcção-Geral de Viação, a título exemplificativo, seria, pois, uma contra-ordenação leve, nos termos do artigo 139º, nº 2, punível com coima no mínimo de 750$00 (artigo 17º, nº 1), e no máximo de 50 000$00 (artigo 140º, nº 1, alínea a)). 23) BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador (2ª Reimpressão), Coimbra, 1987, págs. 246 e segs., citado no parecer nº 82/88, de 13 de Julho de 1988, inédito, além de outra doutrina sobre o tema, para que se remete. 24) ANTÓNIO VITORINO, Preâmbulo e Nota Justificativa, "A Feitura das Leis", vol. II, Comunicação apresentada no Curso organizado pelo Instituto Nacional de Administração no âmbito do Departamento de Administração Pública, sob coordenação de JORGE MIRANDA/MARCELO REBELO DE SOUSA com a colaboração de MARTA TAVARES DE ALMEIDA, 1ª edição, INA, Oeiras, 1986, págs. 125 e 129. 25) OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito. Introdução e Teoria Geral - Uma Perspectiva Luso--Brasileira, 6ª edição revista, Coimbra, 1991, págs. 379 e seg.; no sentido desta última proposição, também ANTÓNIO VITORINO, op. cit., pág. 129. 26) Parafraseámos REINHOLD ZIPPELIUS, Juristische Methodenlehre, 4. Auf., Verlag C.H. Beck, Mÿnchen, 1985, pág. 21. |