Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003111
Parecer: P000202010
Nº do Documento: PPA14042011002000
Descritores: CERTIFICADOS DE AFORRO
TRANSMISSÃO
HERDEIRO
PRESCRIÇÃO
Livro: 00
Numero Oficio: 3895
Data Oficio: 06/15/2010
Pedido: 06/16/2010
Data de Distribuição: 01/20/2011
Relator: MANUEL MATOS
Sessões: 01
Data da Votação: 04/14/2011
Tipo de Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Sigla do Departamento 1: MFAPÚBLICA
Entidades do Departamento 1: SECRETÁRIO DE ESTADO DO TESOURO E FINANÇAS
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 06/26/2012
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 26-09-2012
Nº do Jornal Oficial: 187
Nº da Página do Jornal Oficial: 32424
Indicação 2: ASSESSOR: ISABEL CAPELA
Área Temática:DIR CIVIL
Legislação:DL 172-B/86 DE 1986/06/30 ART7; PORT 73-A/2008 DE 2008/01/23; PORT 230-A/2009 DE 2009/02/27; DL 47/2008 DE 2008/03/13 ART5 N2; DL 43453 DE 1960/12/30 ART14; PORT 18912 DE 1961/12/27; DL 45642 DE 1964/04/07; DL 122/2002 DE 2002/05/04 ART10 N1 ALB), ART7, ART9-A; DL 160/96 DE 1996/09/04 ART5 N1 ALF); L 7/98 DE 1998/02/03 ART4; CC ART298, ART304 N1, ART306 N1, ART321 N1, ART2059; DL 384/2007 DE 2007/11/19 ART6, ART9 N1
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:AC STJ DE 2005/11/08; AC TRL DE 2006/12/14; AC TRL DE 2005/05/05; AC TC 541/2004
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Texto Integral:




Senhor Secretário de Estado do Tesouro e Finanças,
Excelência:





I

Por ter sido suscitada a «necessidade de clarificar o enquadramento aplicável à sucessão na titularidade dos certificados de aforro, regulada pelo Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho», dignou-se Vossa Excelência solicitar a este Conselho Consultivo parecer sobre a matéria[1], interessando, em concreto, examinar a seguinte questão:

«Deve o prazo de prescrição consagrado no artigo 7.º do Decreto-
-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho, ser contado a partir:


i da morte do titular dos certificados de aforro;
ii do conhecimento da morte do referido titular, por a partir dessa data poder conhecer a existência de certificados de aforro; ou
iii do momento em que os respectivos herdeiros têm conhecimento da existência dos certificados de aforro?».

Acompanha o pedido um parecer onde, sucintamente, se examina a questão do momento a partir do qual se deve iniciar a contagem do prazo de prescrição consagrado no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86.

Aí se refere que «[d]ecorre do n.º 1 do artigo 7.º – com base no elemento literal da interpretação – que o facto que despoleta a contagem do prazo de prescrição é a morte do titular dos certificados de aforro, e que esse prazo é de cinco anos após a morte do titular», dando-se conta, no entanto, que esse entendimento «não tem prevalecido na jurisprudência, que considera que o cômputo do prazo apenas deve ter início a partir do momento em que o sucessível conhece a existência de relações jurídicas patrimoniais constitutivas da herança aberta por morte, ou seja, a partir do momento em que tem conhecimento da existência dos certificados de aforro», e não da data da morte do de cujus.

«Todavia – afirma-se ali ainda – as decisões jurisprudenciais [[2]] não consideraram a existência do Registo Central de Certificados de Aforro, criado através do Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de Março», diploma que «veio introduzir a possibilidade de informação sobre a existência de certificados de aforro e sobre a identificação do respectivo titular».

«Ora – lê-se no dito parecer – tendo em conta a existência de um mecanismo de registo que propicia aos herdeiros a possibilidade de obtenção de informações acerca da eventual existência de certificados de aforro de que o de cujus fosse titular, questiona-se se a solução jurisprudencial acima enunciada deverá prevalecer, nomeadamente tendo em conta a necessidade de fixar uma data objectivamente controlável para o início da contagem do prazo de prescrição».

Perante a questão enunciada, cumpre emitir parecer.


II

1. Os certificados de aforro são um instrumento financeiro criado pelo artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 43453, de 30 de Dezembro de 1960, constituindo, nos termos deste preceito, «títulos da dívida pública nominativos e amortizáveis (…) destinados a conceder uma aplicação remuneradora aos pequenos capitais».

Este produto de aforro foi regulado inicialmente pelo Decreto n.º 43454, de 30 de Dezembro de 1960[3], e posteriormente revisto pelo Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho.

O actual regime jurídico dos certificados de aforro consta do Decreto-Lei n.º 122/2002, de 4 de Maio.

Os certificados de aforro têm vindo a ser emitidos por séries, tendo a série, denominada «série B», sido autorizada pelo Decreto-Lei n.º 172-B/86, cuja subscrição foi fechada pela Portaria n.º 73-A/2008, de 23 de Janeiro. Este diploma, editado ao abrigo do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 122/2002, procedeu à criação de uma nova série, denominada «série C», com as características constantes de ficha técnica anexa à Portaria[4].

O Decreto-Lei n.º 122/2002, de 4 de Maio[5], encerra, como já se disse, o actual regime jurídico dos certificados de aforro (artigo 1.º), sem prejuízo da aplicação dos anteriores diplomas quanto à normação específica das séries de certificados ao abrigo dos quais elas foram emitidas.

A noção e características essenciais destes instrumentos financeiros, que constituem uma das formas que pode assumir a dívida pública directa do Estado[6], consta do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 122/2002, disposição que interessa conhecer:
«Artigo 2.º
Noção
1 – Os certificados de aforro são valores escriturais nominativos, reembolsáveis, representativos de dívida da República Portuguesa, denominados em moeda com curso legal em Portugal e destinados à captação da poupança familiar.
2 – Os certificados de aforro só podem ser subscritos a favor de pessoas singulares.
3 – Os certificados de aforro só são transmissíveis por morte do titular.»

O preceito mantém a noção e as características essenciais que já constavam dos diplomas que o precederam – Decreto n.º 43454 e Decreto-Lei n.º 172-B/86.

Estamos perante títulos nominativos, amortizáveis, só transmissíveis por morte e «assentados»[7] apenas a favor de pessoas singulares, inscritos, conforme dispõe o artigo 3.º, n.º 1, em contas abertas junto do Instituto de Gestão do Crédito Público (IGCP)[8] ou junto de instituições financeiras devidamente autorizadas por esta entidade, em nome dos respectivos titulares. A subscrição, datas de subscrição, saldos e demais elementos reveladores da situação jurídica dos certificados de aforro são comprovados por extractos de conta e de registo, emitidos pelo IGCP (artigo 3.º, n.º 2).

Na caracterização proposta por SOUSA FRANCO, os certificados de aforro constituem uma das formas tradicionais de empréstimos públicos, apresentando-se como «títulos vencíveis a médio prazo, destinados em princípio à captação de pequenas poupanças e fortemente pessoalizados»[9].

2. Do regime jurídico destes instrumentos de dívida constante do citado Decreto-Lei n.º 122/2002, tem interesse conhecer as normas relativas aos prazos e condições de juro, e aos reembolsos, contidas nos artigos 5.º e 6.º.
«Artigo 5.º
Prazos e condições de juro
1 – As séries de certificados de aforro poderão ter prazos de reembolso até 20 anos.
2 – Os certificados de aforro poderão vencer juros a taxa de juro fixa ou a taxa de juro indexada ou ainda ser emitidos a desconto («cupão zero»).
3 – A periodicidade de vencimento dos juros poderá ser trimestral, semestral ou anual.
4 – Os juros vencidos dos certificados de aforro poderão ser objecto de liquidação no respectivo vencimento ou capitalizados e liquidados na data de reembolso do capital.
Artigo 6.º
Reembolso
1 – A amortização dos certificados de aforro no vencimento é feita pelo valor nominal adicionado, quando for caso disso, dos juros capitalizados.
2 – Na criação de uma série poderá ser definida a possibilidade de os certificados de aforro dessa série serem reembolsados antes da data de vencimento («resgate antecipado»), sendo estabelecidas as condições em que tal será efectuado.»

No exercício do acompanhamento das operações de dívida pública directa e da execução de todo processamento dos certificados de aforro, atribuição que lhe está conferida pelo artigo 5.º, n.º 1, alínea f), dos seus Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 160/96, de 4 de Setembro, o IGCP, em conformidade com o disposto no artigo 10.º, n.º 1, alínea b), do citado Decreto-Lei n.º 122/2002, estabelecerá por instruções, a publicar na 2.ª série do Diário da República, os procedimentos relativos à transmissão de certificados de aforro por morte do seu titular.

E, nos termos do n.º 3 do mesmo preceito[10], «o IGCP deve organizar os procedimentos adequados a controlar a titularidade dos certificados de aforro e os prazos de prescrição da transmissão da totalidade das unidades que os constituem, ou do respectivo reembolso em caso de morte do titular, nos termos da lei», disposição que é também aplicável aos certificados de aforro das séries A e B, por força do que expressamente se dispõe no artigo 11.º, n.º 2.

3. Os diplomas que regem sobre as três séries de certificados de aforro que, sucessivamente, foram emitidas, consagram normas quanto à transmissão desses títulos a favor dos herdeiros do respectivo subscritor e, bem assim, quanto à sua prescrição, no caso de não se requerer a sua transmissão em determinado prazo.

Embora na consulta se referencie o regime consagrado no Decreto-
-Lei n.º 172-B/86, relativo à série B dos certificados de aforro, entende-se conveniente convocar o regime que, a propósito desta questão, está previsto para as restantes séries, condensado no Decreto n.º 43454 (série A) e no Decreto-Lei n.º 122/2002.


3.1. Os artigos 18.º e 19.º do Decreto n.º 43454, dispunham, na sua redacção originária, que:

«Art. 18.º No caso de falecimento do titular de um certificado de aforro, poderá requerer-se, dentro do prazo de cinco anos, a transmissão deste a favor de um dos herdeiros ou a respectiva amortização pelo valor que o certificado tiver à data em que a mesma se efectuar.
§ único. Em qualquer caso será pago pelo herdeiro ou herdeiros o imposto sobre as sucessões e doações da importância de 5 por cento sobre o valor do certificado à data do falecimento.

Art. 19.º Findo o prazo de cinco anos a que se refere o artigo anterior, consideram-se prescritos a favor do Fundo de regularização da dívida pública os valores representados nos respectivos certificados, sendo, no entanto, aplicáveis ao caso as demais disposições em vigor relativas à prescrição.»

O Decreto-Lei n.º 122/2002 alterou estes preceitos, conferindo-lhes a seguinte redacção:
«Artigo 18.º
No caso de falecimento do titular de um certificado de aforro, poderá requerer-se, dentro do prazo de 10 anos, a transmissão deste a favor dos herdeiros ou a respectiva amortização pelo valor que o certificado tiver à data em que a mesma se efectuar.
Artigo 19.º
Findo o prazo de 10 anos a que se refere o artigo anterior, consideram-se prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública os valores representados nos respectivos certificados, sendo, no entanto, aplicáveis ao caso as demais disposições em vigor relativas à prescrição.»

Por fim, o transcrito artigo 18.º foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de Março, apresentando, actualmente, a seguinte redacção:
«Artigo 18.º
Por morte do titular de um certificado de aforro, podem os herdeiros requerer, dentro do prazo de 10 anos:

a) A transmissão da totalidade das unidades que o constituem; ou
b) O respectivo reembolso, pelo valor que o certificado tenha à data em que o reembolso seja autorizado.»

3.2. No regime jurídico condensado no Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho, as normas relativas à transmissão (hereditária) e prescrição dos certificados de aforro constam do artigo 7.º que, na sua versão originária, dispunha:

«Art. 7.º – Por morte do titular de um certificado de aforro, poderão os herdeiros requerer, dentro do prazo de cinco anos, a transmissão da totalidade das unidades que o constituem, efectivada pela emissão de novos certificados, que manterão a data da emissão dos que lhes deram origem, ou o respectivo reembolso, pelo valor que o certificado tiver à data em que o reembolso for autorizado.
2 – Findo o prazo a que se refere o número anterior, consideram-se prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública os valores de reembolso dos respectivos certificados, sendo, no entanto, aplicáveis as demais disposições em vigor relativas à prescrição.»

O Decreto-Lei n.º 122/2002 alterou o n.º 1 desta disposição, procedendo à alteração do prazo, de cinco para dez anos, para os herdeiros do titular de um certificado de aforro requererem a transmissão da totalidade das unidades que o constituem, ou o seu reembolso.

O artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 172-B/86 passou, assim, a ter a seguinte redacção:
«Artigo 7.º
1 – Por morte do titular de um certificado de aforro, poderão os herdeiros requerer, dentro do prazo de 10 anos, a transmissão da totalidade das unidades que o constituem, efectivada pela emissão de novos certificados, que manterão a data da emissão dos que lhes deram origem, ou o respectivo reembolso, pelo valor que o certificado tiver à data em que o reembolso for autorizado.

2 – …………………………………………………………………….....»

Por fim, o Decreto-Lei n.º 47/2008 veio conferir nova redacção ao n.º 1 deste preceito, nos mesmos termos da que foi dada ao artigo 18.º do Decreto n.º 43454, acima transcrito.

A redacção actual do artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 172-B/86 é, pois, a seguinte:
«Artigo 7.º
1 – Por morte do titular de um certificado de aforro, podem os herdeiros requerer, dentro do prazo de 10 anos:

a) A transmissão da totalidade das unidades que o constituem; ou
b) O respectivo reembolso, pelo valor que o certificado tenha à data em que o reembolso seja autorizado.

2 – ………………………………………………………………………..».

3.3. No regime jurídico dos certificados de aforro aprovado pelo Decreto-Lei 122/2002, de 4 de Maio, a norma que prevê a prescrição dos juros e do capital de empréstimos de dívida pública, natureza que aqueles títulos assumem, consta do artigo 7.º que manda aplicar-lhes as disposições gerais constantes da Lei n.º 7/98, de 3 de Fevereiro.

A norma da Lei n.º 7/98[11] que rege sobre a prescrição dos créditos correspondentes aos juros e ao capital mutuado no âmbito da emissão da dividia pública directa do Estado, aplicável por via da remissão operada pelo citado artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 122/2002, consta do artigo 14.º, com o seguinte teor:


«Artigo 14.º
Prescrição da dívida pública
1 – Os créditos correspondentes a juros e a rendas perpétuas prescrevem no prazo de cinco anos contados da data do respectivo vencimento.
2 – Os créditos correspondentes ao capital mutuado e a rendas vitalícias prescrevem, considerando-se abandonados a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, no prazo de 10 anos contados da data do respectivo vencimento ou do primeiro vencimento de juros ou rendas posterior ao dos últimos juros cobrados ou rendas recebidas, consoante a data que primeiro ocorrer.
3 – Aos prazos previstos nos números anteriores são aplicáveis as regras quanto à suspensão ou interrupção da prescrição previstas na lei civil.»

4. Como se vê das disposições legais que se transcreveram e da evolução verificada, a nota que, antes de mais, se deve registar tem que ver com a alteração dos prazos para, sob pena de prescrição, os herdeiros do titular de certificados de aforro requererem a transmissão da totalidade das suas unidades ou o respectivo reembolso.

A prescrição dos títulos, no regime jurídico aprovado pelo Decreto n.º 43454 e pelo Decreto-Lei n.º 172-B/86, nas suas versões originárias, verificava-se no prazo de cinco anos, tendo passado para dez anos na sequência das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 122/2002.

Sobre a dilatação deste prazo, o preâmbulo do diploma limita-se a referir que se «introduz uma alteração ao regime actual no que se refere à prescrição dos [certificados de aforro das séries A e B] em caso de morte do titular, alargando-se o prazo para a habilitação de herdeiros de 5 para 10 anos».

Muito embora se não aponte o motivo da alteração, crê-se que o legislador reconheceu a exiguidade daquele prazo inicial. Como se lê em Recomendação do Provedor de Justiça, oportunamente dirigida ao IGCP[12], esse prazo era considerado «demasiado curto, incompatível, tantas vezes, com o conhecimento e regularização de situações sucessórias», questão que «foi entretanto resolvida com a publicação do Decreto-Lei n.º 122/2002, de 4 de Maio, que alargou de 5 para 10 anos o prazo para a habilitação de herdeiros do titular de certificados de aforro».

Refira-se, a propósito, que aquele primitivo prazo também não se harmonizava com o prazo estabelecido no direito sucessório para a aceitação da herança, fixado em dez anos no artigo 2059.º do Código Civil, sendo certo que os certificados de aforro configuram indiscutivelmente direitos patrimoniais transmissíveis por morte do seu titular.

Esta discrepância foi observada no acórdão n.º 541/2004 do Tribunal Constitucional[13], proferido em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade. A inconstitucionalidade então invocada fundou-se, precisamente, na circunstância de o regime geral sucessório prever um prazo em que se extingue o direito do sucessor para a aceitação da herança mais amplo do que o regime especial quanto ao prazo fixado no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86 (versão inicial).

Como se lê no acórdão, «os certificados de aforro conferem direitos patrimoniais aos respectivos titulares, consubstanciando a aplicação de “poupança(s) das famílias” integrados no quadro de emissão e gestão da dívida pública, mas não evidenciam, por esse facto, qualquer especificidade relativamente aos demais bens que constituem o património dos sujeitos no que se refere (…) à transmissão de tais bens por morte do respectivo titular. Assim, não se divisa nenhuma razão, decorrente da natureza dos certificados de aforro, que legitime o diferente tratamento relativamente ao prazo geral de caducidade do direito de aceitar a herança». Consequentemente, porque «não se apreende qualquer fundamento claro e relevante no plano da constitucionalidade para o tratamento diferenciado da transmissão de certificados de aforro relativamente à dos demais bens que constituem a herança», julgou-se inconstitucional a norma daquele artigo 7.º, «por violação dos artigos 13.º e 62.º, articuladamente, da Constituição»[14].

5. Outra nota que se deve apontar reside no facto de o actual regime jurídico dos certificados de aforro não reproduzir as normas relativas à prescrição do direito à transmissão ou reembolso desses títulos contidas no artigo 18.º do Decreto n.º 43454 e no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86.

A prescrição dos créditos, e consequente abandono a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, correspondentes ao capital mutuado, titulado por certificados de aforro, passa a reger-se pelo específico regime contido no artigo 14.º da Lei n.º 7/98, acima reproduzido, preceito aplicável por força da remissão feita no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 122/2002.

Agora, os créditos titulados por certificados de aforro da série C prescrevem no prazo de dez anos contados da data do respectivo vencimento ou do primeiro vencimento de juros posterior ao dos últimos juros cobrados, consoante a data que primeiro ocorrer.

Quanto aos certificados de aforro das séries A e B, aplicam-se as regras da prescrição enunciadas nas disposições citadas do Decreto n.º 43454 e no Decreto-Lei n.º 172-B/86, não fazendo sentido a aplicação aos mesmos do regime contemplado no Decreto-Lei n.º 122/2002 para os novos certificados, na medida em que eles estão sujeitos a um prazo de reembolso que poderá chegar aos 20 anos, enquanto os certificados das séries A e B não estão sujeitos a prazos de vencimento obrigatório[15].

III

1. Na economia do parecer, adquire especial relevo o registo central de certificados de aforro cuja finalidade é a de possibilitar a obtenção de informação sobre a existência de certificados de aforro e identificação dos seus titulares.

Este registo central, com a natureza de registo electrónico, foi criado pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, como aditamento do artigo 9.º-A ao Decreto-Lei n.º 122/2002.

Dispõe este preceito o seguinte:
«Artigo 9.º-A
Registo central de certificados de aforro
1 – É criado o registo central de certificados de aforro, com a natureza de registo electrónico, que tem por finalidade possibilitar a obtenção de informação sobre a existência de certificados de aforro e sobre a identificação do respectivo titular.
2 – O IGCP é a entidade responsável pela criação, manutenção e actualização do registo central.
3 – A definição dos elementos que devem constar do registo central bem como o tratamento a dar aos dados pessoais recolhidos são aprovados por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, com observância do disposto na Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro.
4 – Sem prejuízo do direito de acesso pelo titular do certificado de aforro, o acesso por terceiro ao registo central só pode efectuar-se através de pedido devidamente fundamentado e documentado, em caso de morte ou de declaração de morte presumida do referido titular, comprovada mediante apresentação da correspondente certidão de óbito.
5 – A informação sobre o titular só pode ser dada ao próprio, aos respectivos herdeiros, de acordo com o disposto no número anterior, ou aos seus representantes legais tratando-se de menores ou de outras pessoas incapazes nos termos da lei.
6 – Os serviços e entidades que celebrem actos de partilha ou de adjudicação de bens adquiridos por sucessão devem aceder, por meios informáticos e nos termos que venham a ser regulamentados por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, ao registo central de certificados de aforro, devendo fazer menção do resultado da referida consulta no acto público celebrado.»

O artigo 5.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 47/2008 estabelece que, «[p]ara efeitos de criação do registo central, deve o Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público, I. P., organizar os procedimentos tendentes a instruir o registo com a informação completa sobre os certificados de aforro subscritos, nomeadamente através de realização dos actos necessários à obtenção dos elementos em falta.»

Visa-se, pois, criar, manter e actualizar um sistema que permita o conhecimento da existência de certificados de aforro, de quaisquer séries, e da identificação do respectivo titular.

A informação sobre a existência dos certificados, saldos e outros dados da conta aforro pode, naturalmente, ser obtida pela pessoa deles titular ou por terceiro desde que apresente declaração do titular conferindo-lhe tais poderes.

Prevê-se ainda que a informação sobre a existência de certificados possa ser requerida pelos herdeiros, em caso de morte ou de declaração de morte presumida do seu titular, ou pelos seus representantes legais tratando-se de menores ou de incapazes.

O registo central, criado pelo citado diploma e gerido pelo IGCP, permitirá, como já se disse, que, em qualquer circunstância, os interessados a ele acedam e obtenham o conhecimento do saldo das suas contas e que os herdeiros de pessoa falecida possam saber se ela era subscritora destes títulos e dos respectivos saldos.

Trata-se de um instrumento particularmente útil para os sucessores do aforrador que, por vezes e por motivos vários, desconhecem as aplicações financeiras que ele tenha efectuado, ignorando, nomeadamente, que tenha investido em certificados de aforro[16].

2. Com o mesmo objectivo, tem interesse referir a criação, pelo Decreto-Lei n.º 384/2007, de 19 de Novembro, do registo central de contratos de seguro de vida, de acidentes pessoais e de operações de capitalização cuja finalidade é a de possibilitar a obtenção de informação sobre a sua existência e sobre a identificação do respectivo segurado ou subscritor, bem como da identificação do segurador e do beneficiário (artigo 6.º).

Nos termos do artigo 9.º, n.º 1, desse diploma, qualquer interessado pode obter informação constante desse registo «quanto à existência de contrato de seguro ou de operação de capitalização em que seja segurado ou subscritor uma pessoa determinada, sobre o segurador com o qual foi contratado e se o próprio consta como presumível beneficiário do seguro ou da operação de capitalização»[17] [18].

3. Com a instituição do registo central de certificados de aforro, desapareceram as dificuldades que se deparavam aos herdeiros do autor da herança quanto à eventual existência de certificados de aforro por este subscritos. Muito embora se considere que, na maior parte das vezes, aqueles herdeiros são conhecedores da situação patrimonial do de cujus e das aplicações financeiras que tenha efectuado, a verdade é que pode acontecer que, por motivos vários, não disponham desse conhecimento. Nesta situação, no regime anterior à instituição do registo central de certificados de aforro, podia suceder que, pelo decurso do prazo de cinco anos, inicialmente, ou de dez anos, posteriormente fixado, os herdeiros do aforrador viessem a ser surpreendidos com a invocação da prescrição e consequente abandono a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública de certificados de aforro por não terem atempadamente, por ignorância, requerido a sua transmissão ou reembolso.

Presentemente, aberta qualquer herança, os herdeiros do seu autor têm, pois, legitimidade para acederem ao registo central de certificados de aforro, requerendo informação sobre se existem títulos em nome do falecido e respectivas unidades e montantes[19].

IV

1. O artigo 298.º do Código Civil distingue três institutos que pretendem dar concretização à relevância do tempo nas situações jurídicas: a prescrição, a caducidade e o não uso.

Perante a questão colocada na consulta, a nossa atenção deverá recair sobre a matéria relativa à prescrição, à qual se vão dedicar as considerações subsequentes.

Diz o artigo 304.º, n.º 1, do Código Civil que, «[c]ompletada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito».

Constituindo uma figura que radica num facto jurídico involuntário – o decurso do tempo –, o fundamento específico da prescrição negativa ou extintiva de direitos reside na negligência do titular em os exercitar durante o período de tempo indicado na lei, negligência que, segundo MANUEL DE ANDRADE, «faz presumir ter ele querido renunciar ao direito ou pelo menos o torna (o titular) indigno de protecção jurídica (dormientibus non succurrit ius)»[20].

Outras razões se costumam invocar para justificação da prescrição. Assim, o autor que agora se acompanha invoca as seguintes:

«1) Uma consideração de certeza ou segurança jurídica, a qual exige que as situações de facto que se constituíram e prolongaram por muito tempo, sobre a base delas se criando expectativas e se organizando planos de vida, se mantenham, não podendo ser atacadas por anti-jurídicas.
2) Proteger os obrigados, especialmente os devedores, contra as dificuldades de prova a que estariam expostos no caso de o credor vir exigir o que já haja, porventura, recebido (…).
3) Exercer uma pressão ou estímulo educativo sobre os titulares dos direitos no sentido de não descurarem o seu exercício ou efectivação, quando não queiram abdicar deles»[21].

Para ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, os fundamentos da prescrição podem ser atinentes ao devedor ou constituírem fundamentos de ordem geral.

«Quanto a fundamentos atinentes ao devedor, a prescrição visa, essencialmente, relevá-lo de prova», pois, «à medida que o tempo passe, o devedor irá ter uma crescente dificuldade em fazer prova do pagamento que tenha efectuado»[22].

Servindo a prescrição ainda «escopos de ordem geral, atinentes à paz jurídica e à segurança», este autor assume que «a prescrição visa, no essencial, tutelar o interesse do devedor»[23].

Certo é que a ideia comum que preside a este instituto, que a doutrina tem posto em evidência, é a de uma inércia do titular do direito, prolongada por certo período de tempo, de alguém que, podendo actuar, se abstém de o fazer, justificando-se que se ponha termo a situações de indeterminação, evitando-se instabilidade jurídica

Como refere CARLOS MOTA PINTO, a prescrição extintiva, «possam embora não lhe ser totalmente estranhas razões de justiça, é um instituto endereçado fundamentalmente à realização de objectivos de conveniência ou oportunidade»[24].

Embora a prescrição, prossegue este autor, «vise desde logo satisfazer a necessidade social de segurança jurídica e certeza dos direitos, e, assim, proteger o interesse do sujeito passivo, essa protecção é dispensada atendendo também ao desinteresse, à inércia negligente do titular do direito em exercitá-lo. Há, portanto, uma inércia do titular do direito, que se conjuga com o interesse objectivo numa adaptação da situação de direito à situação de facto»[25].

2. O início do prazo da prescrição é, como assinala ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, «um factor estruturante do próprio instituto: dele, depende, depois, todo o desenvolvimento subsequente»[26], constituindo a questão axial nesta consulta.

Neste domínio, podem distinguir-se dois grandes sistemas: o sistema objectivo, em que o prazo começa a correr assim que o direito possa ser exercido e independentemente do conhecimento que, disso, tenha ou possa ter o respectivo credor; e o sistema subjectivo, em que tal início só se dá quando o credor tenha conhecimento dos elementos essenciais relativos ao seu direito. Segundo o mesmo autor, que se acompanha neste passo, o sistema objectivo, que dá primazia à segurança, é tradicional, sendo compatível com prazos longos; o subjectivo joga com prazos curtos[27].

O artigo 306.º, n.º 1 – 1.ª parte, do Código Civil, dispõe que «o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido», inserindo-se, portanto, no sistema objectivo, na medida em que é dispensado qualquer conhecimento por parte do credor[28].

Este critério tem carácter supletivo, cedendo perante outras soluções consagradas na lei quanto ao início do prazo prescricional. A este propósito, cumpre referir que a lei portuguesa já consagra um sistema subjectivo em algumas situações de prescrição, como acontece no enriquecimento sem causa e na responsabilidade civil – artigos 482.º e 498.º, n.º 1, do Código Civil, em que se prevê uma prescrição de três anos cujo início depende do conhecimento que o credor tenha dos seus direitos.

O artigo 306.º do Código Civil contém a regra central quanto ao início do curso da prescrição: ela só se conta depois de o direito puder ser exercido.

Efectivamente, como considera ADRIANO VAZ SERRA, «uma vez que a prescrição se funda na inércia do titular do direito, deve ela, logicamente, começar no momento em que o direito pode ser exercido»[29].

«Parece, realmente – prossegue o mesmo autor – que o princípio deve ser que o início da prescrição não é impedido pela ignorância do titular sobre a existência do direito e sobre a sua titularidade. Embora não haja então negligência do titular, ou possa não a haver, sempre há inércia da sua parte e a parte contrária não deve ficar à mercê da ignorância do titular, a qual, de resto, pode prolongar-se por muito tempo: não pode então dizer-se que a prescrição se funda numa presunção de renúncia ao direito, mas, como se viu, a razão de ser da prescrição não é só essa, intervindo também outras considerações e, entre elas, a da vantagem da segurança jurídica.
Mas isto não significa que a lei deva sempre manter-se neste princípio, e não deva, para os casos em que isso se mostre especialmente razoável (e que são sobretudo casos de prescrição de curto prazo), fixar, para início da prescrição, o momento em que o titular se acha em situação de facto que lhe permita exercer o seu direito»[30].

A expressão «quando o direito puder ser exercido», contida no citado artigo 306.º, n.º 1, do Código Civil, deve ser interpretada no sentido de a prescrição se iniciar quando o direito estiver em condições (objectivas) de o titular poder exercitá-lo, portanto, desde que seja possível exigir do devedor o cumprimento da obrigação. O critério consagrado é, pois, o da exigibilidade da obrigação[31]».

Decorre do próprio fundamento da prescrição que o seu início só possa ter lugar quando o direito está em condições de ser exercitado pelo seu titular. Com efeito, como salienta MANUEL DE ANDRADE, «não pode dizer-se que haja negligência da parte do titular dum direito em exercitá-lo enquanto ele o não pode fazer valer por causas objectivas, isto é, inerentes à condição do mesmo direito»[32].

3. Caracterizada a figura da prescrição extintiva e apontada a regra geral quanto ao início do seu curso, e sua razão de ser, cumpre agora tentar aplicar as considerações expostas à questão objecto da consulta.

Referenciando-se o regime dos certificados de aforro constante do Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho, convém recordar que, nos termos do seu artigo 7.º, n.º 1, na sua actual redacção[33], por morte do titular de um certificado de aforro, poderão os herdeiros requerer, dentro do prazo de dez anos, a transmissão da totalidade das unidades que o constituem ou o respectivo reembolso, pelo valor que o certificado tenha à data em que o reembolso seja autorizado.

E dispõe o n.º 2 do mesmo preceito que, findo esse prazo, consideram-se prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública os valores de reembolso dos respectivos certificados, sendo, no entanto, aplicáveis as demais disposições em vigor relativas à prescrição.

A questão está em saber quando se deverá iniciar o prazo da prescrição desses valores: a partir da morte do titular dos certificados? A partir do conhecimento da morte desse titular? A partir do conhecimento pelos herdeiros do aforrador da existência dos certificados de aforro?

Como já se referiu e se dá conta na informação jurídica anexa ao pedido de consulta, esta questão foi debatida nos tribunais superiores, pelo menos em dois casos.

Num deles, o Tribunal da Relação de Lisboa concluiu que «o direito dos herdeiros do aforrista de requererem a transmissão dos certificados de aforro integradores da herança daquele pode ser exercido, como decorre da lei, a partir da morte do mesmo aforrista. Isto porque o direito se constitui com o facto do decesso do aforrista, podendo a partir desse momento ser exercido»[34].

O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão proferido no recurso interposto dessa decisão[35], considerou que, sendo fundamento específico da prescrição a negligência do titular do direito em exercitá-lo, ela não existe enquanto o titular o não pode fazer valer por causas objectivas. Ou seja, no caso, a transmissão dos certificados de aforro ou a sua amortização pressupõem «conhecerem os herdeiros a existência da subscrição de certificados de aforro pelo de cujus. Só assim, tomam conhecimento que, pela sua morte, ficam titulares daqueles direitos conferidos pelo artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 172-B/86»[36].

Interessa referir que estas decisões foram proferidas em situações às quais se aplicava a versão originária do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º172-B/86, ou seja, em situações abrangidas pelo prazo de prescrição de cinco anos, prazo que, por relativamente curto, deve implicar que o seu início coincida com a data do conhecimento do direito pelo respectivo titular.

Actualmente, os herdeiros do titular de certificados de aforro dispõem do prazo de dez anos para requererem a transmissão dos títulos a seu favor ou, o respectivo reembolso, estando, assim, ultrapassada a exiguidade que se reconhecia ao prazo primitivo (cinco anos) para a prescrição se verificar.

Por outro lado, interessa muito especialmente sublinhar a criação do registo central de certificados de aforro, operada pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de Março, com o aditamento do artigo 9.º-A ao Decreto-Lei n.º 122/2002, que, recorde-se, tem por expressa finalidade possibilitar a obtenção de informação sobre a existência de certificados de aforro e sobre a identificação do respectivo titular (n.º 1).

De acordo com o disposto nos n.os 4 e 5 do citado artigo 9.º-A, os herdeiros têm legitimidade para requerer ao IGCP, entidade responsável pela gestão daquele registo central, informações acerca das contas do titular de certificados de aforro falecido, as quais serão prestadas mediante comprovação do respectivo óbito[37].

Com a instituição do registo central de certificados de aforro, parece-nos manifestamente inviável a alegação do desconhecimento, pelos herdeiros, da existência de certificados de que era titular o de cujus. A lei faculta-lhes, presentemente, um meio muito simples e eficaz para a obtenção de tal informação, a qual, para mais, pode ser obtida num prazo mais que razoável, de dez anos. Só por manifesto desinteresse ou negligência permanecerão os herdeiros do aforrista na ignorância desta parte do acervo da sua herança.

Consideramos, portanto, que o prazo de dez anos, previsto no artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 172-B/86, para os herdeiros de titular de certificados de aforro requererem a transmissão da totalidade das unidades que os constituem ou o respectivo reembolso, sob pena de prescrição e consequente abandono a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, deve contar-se a partir do falecimento do titular[38].

Sendo os certificados de aforro transmissíveis unicamente por morte do seu subscritor, é esse o evento que vai permitir o desencadeamento dos mecanismos agora legalmente previstos, tendentes à obtenção das informações quanto à existência daqueles títulos e respectivos saldos e à sua transmissão sucessória. A partir dessa data, os interessados – herdeiros – podem, querendo, exercer o direito que lhes é conferido à informação e, eventualmente, à transmissão dos certificados ou ao reembolso do seu valor.

Trata-se, a nosso ver, de um entendimento que se apoia no artigo 306.º, n.º 1 – 1.ª parte, do Código Civil, e no sistema objectivo aí adoptado que, como já se disse, dispensa qualquer conhecimento por parte do titular do direito.

A eventual injustiça que este sistema possa comportar é, como salienta ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, «temperada pelas regras atinentes à suspensão da prescrição»[39].

A este propósito, se o titular demonstrar que esteve impedido de ter o conhecimento do facto gerador do seu direito (a morte do de cujus), deve entender-se que esteve impedido de o exercer, podendo verificar-se, portanto, o fundamento de suspensão previsto no artigo 321.º, n.º 1, do Código Civil[40].

V

Em face do exposto, formula-se a seguinte conclusão:


– O prazo de dez anos, estabelecido no artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho, para os herdeiros do titular de certificados de aforro requererem a transmissão da totalidade das unidades que os constituem ou o respectivo reembolso, sob pena de prescrição a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, prevista no n.º 2 da mesma disposição, deve contar-se a partir da data do falecimento do titular aforrador, em conformidade com a regra acolhida no artigo 306.º, n.º 1 – 1.ª parte, do Código Civil.


ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 14 DE ABRIL DE 2011.

Fernando José Matos Pinto Monteiro – Manuel Pereira Augusto de Matos (Relator) – Fernando Bento – António Leones Dantas – Maria Manuela Flores Ferreira – José David Pimentel Marcos – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita (com voto de vencido em anexo) – Maria de Fátima da Graça Carvalho.

(Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita)
Votei vencido pelas razões que se passam a enunciar:

I. A consulta centra-se na problemática do início de contagem do prazo de dez anos, previsto no n.º 1 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho (na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 47/2008 de 13 de Março):
«Por morte do titular de um certificado de aforro, podem os herdeiros requerer, dentro do prazo de 10 anos:
«a) A transmissão da totalidade das unidades que o constituem; ou
«b) O respectivo reembolso, pelo valor que o certificado tenha à data em que o reembolso seja autorizado.»
Importa, de qualquer modo, ter presente que a questão jurídica apreciada não se relaciona com a estatuição do n.º 1 do art. 7.º, do Decreto-Lei n.º 47/2008 de 13 de Março (opção pelos herdeiros de uma de duas alternativas de concretização da transmissão sucessória), mas com a extinção do direito dos herdeiros a um bem da herança consagrada no n.º 2 do mesmo artigo: «Findo o prazo a que se refere o número anterior, consideram-se prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública os valores de reembolso dos respectivos certificados».
Pelo que, em síntese, o parecer preconizou a seguinte interpretação: Não tendo os herdeiros requerido no prazo de dez anos contado desde a data da morte do aforrador a transmissão da totalidade das unidades que constituem um certificado de aforro ou o reembolso dos valores dos respectivos certificados, estes consideram-se prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública.

II. A economia do presente voto de vencido vai cingir-se à problemática da extinção de direitos preconizada na interpretação defendida no parecer que, embora estribado na sua vertente conclusiva na disposição do art. 306.º, n.º 1, primeira parte, do Código Civil, é precedido por uma estrutura argumentativa em larga medida sustentada em duas alterações normativas:
- A modificação do prazo da versão originária do n.º 1 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho pelo art. 12.º do Decreto-Lei n.º 122/2002 de 4 de Maio, de cinco para dez anos;
- «A criação do registo central de certificados de aforro, operada pelo Decreto-Lei n.º 47/2008 de 13 de Março, com o aditamento do artigo 9.º-A ao Decreto-Lei n.º 122/2002, que, recorde-se, tem por expressa finalidade possibilitar a obtenção de informação sobre a existência de certificados de aforro e sobre a identificação do respectivo titular (n.º 1)».

Da última alteração legislativa, extrai-se uma enfática asserção gnoseológica: «Com a instituição do registo central de certificados de aforro, parece-nos manifestamente inviável a alegação do desconhecimento, pelos herdeiros, da existência de certificados de que era titular o de cujus». Acrescentando-se mais à frente: «Só por manifesto desinteresse ou negligência permanecerão os herdeiros do aforrista na ignorância desta parte do acervo da herança da sua herança».
Em certa medida, parece estabelecer-se uma presunção de negligência dos herdeiros por via do sobrelevado novo elemento fáctico a possibilidade de informação proporcionada aos herdeiros pelo registo central de certificados de aforro. Em sentido diverso, parece-me que a alegada negligência carecia de explicitação da pressuposta base normativa do dever de cuidado dos herdeiros que seria indevidamente omitido no caso de desconhecimento da subscrição, isto é uma pauta de conduta no sentido de que ocorrendo um óbito os herdeiros devem diligenciar por consultar o registo central de certificados de aforro. Acresce que tal ideia de ordem geral exigia uma fundamentação epistemológica (eventualmente por referência ao homem médio) que, na falta de estabelecimento de um dever legal de acção, não podia prescindir de considerandos de ordem empírica.
Sublinhe-se ainda que, na medida em que se estabelece como dies ad quo do prazo de prescrição extintiva de direitos a um bem da herança o evento morte, está a estabelecer-se também um dever dos herdeiros conhecerem o óbito do titular dos certificados de aforro, independentemente do título de vocação sucessória (lei, testamento ou contrato).
Ao nível jurídico-normativo importa ainda ter presente uma outra alteração consagrada no diploma de 2008 relativa ao «dever de as entidades ou os serviços consultarem o registo sempre que celebrem actos de adjudicação ou partilha de bens adquiridos por sucessão, devendo fazer menção do resultado da consulta realizada no acto público celebrado». Parece-nos que tratando-se neste caso de um inequívoco dever jurídico de informação dos herdeiros, da responsabilidade de agentes com funções públicas, o respectivo desrespeito não pode deixar de implicar consequências jurídicas, especialmente se se associa ao não exercício da simples faculdade de consulta pelos herdeiros do registo uma base argumentativa para extinção de direitos a bens da herança.
Acresce que, como se vai destacar à frente, no direito sucessório português o evento morte não se confunde com conhecimento da morte, nem com a informação por parte de herdeiros do respectivo chamamento à herança.

No que concerne à ampliação do prazo decorrente do art. 12.º do Decreto-Lei n.º 122/2002 de 4 de Maio, o facto de um prazo se ter alargado não implica, por si, que se altere o respectivo termo inicial.

Em síntese, as duas alterações normativas (directa e indirecta) do regime do art. 7.º, n.ºs 1 e 2 Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho não compreendem nenhum razão que sustente, na nossa perspectiva, uma interpretação actualista no sentido de que, ao invés do que sucederia antes, com esses diplomas o dies ad quo do prazo de 10 anos extintivo do direito dos herdeiros ao reembolso dos certificados do de cujus deveria passar a ser a data do óbito, e não o conhecimento pelos herdeiros da existência dos certificados de aforro.

III. Afastado o imperativo de uma interpretação actualista, não se pode prescindir de um diálogo com a jurisprudência anterior a 2008, em que se concluiu que o termo inicial do prazo para a extinção de direitos consagrada no n.º 2 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86, de 30 de Junho dependia do conhecimento do óbito e da existência dos certificados de aforro.
Importando recordar nesta sede o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 2005[41]:
«Reportando-nos directamente à situação de facto colocada nesta acção – os direitos que o nº 1 reconhece (à emissão de novos certificados ou ao seu levantamento) eram exercitáveis desde a morte do subscritor dos certificados de aforro.
«Logo à partida, pressupõe isto conhecerem os herdeiros a existência da subscrição de certificados de aforro pelo de cujus. Só assim, tomam conhecimento que, pela sua morte, ficam titulares daqueles direitos conferidos pelo art. 7.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 172- B/86».
Linha interpretativa retomada pelo acórdão da Relação de Lisboa de 14 de Dezembro de 2006[42]: «se a morte e a subscrição dos certificados de aforro forem conhecidos, deixam de ser inócuos, porquanto facultam aos herdeiros o conhecimento de um direito da sua titularidade».

IV. Dimensão argumentativa em que, na nossa leitura, não se pode prescindir de atender ao acórdão do Tribunal Constitucional n.º 541/2004.
Como se destacou nesse aresto, com particular interesse para a questão objecto de consulta, «os certificados de aforro conferem direitos patrimoniais aos respectivos titulares, consubstanciando a aplicação de “poupança(s) das famílias” integrados no quadro de emissão e gestão da dívida pública, mas não evidenciam, por esse facto, qualquer especificidade relativamente aos demais bens que constituem o património dos sujeitos no que se refere ao aspecto do regime agora em questão, isto é, à transmissão de tais bens por morte do respectivo titular. Assim, não se divisa nenhuma razão, decorrente da natureza dos certificados de aforro, que legitime o diferente tratamento relativamente ao prazo geral de caducidade do direito de aceitar a herança».
Sendo inequívoca, noutro passo, a ratio decidendi do acórdão n.º 541/2004: «não se apreende qualquer fundamento claro e relevante no plano da constitucionalidade para o tratamento diferenciado da transmissão de certificados de aforro relativamente à dos demais bens que constituem a herança».
Aliás, o juízo conclusivo do acórdão tem uma abrangência que coloca em causa a própria admissibilidade de um prazo especial de prescrição extintiva dos direitos dos herdeiros ao reembolso de certificados de aforro titulados pelo de cujus: «Em face do que se deixa dito, conclui-se que a norma do artigo 7º do Decreto-Lei nº 172-B/86, de 30 de Junho, na parte em que consagra um prazo de prescrição do direito a requerer a transmissão dos certificados de aforro por morte do aforrista, viola o disposto no artigo 13º, articulado com o artigo 62º, ambos da Constituição.»

Sendo verdade, como se refere no parecer, que «o Tribunal Constitucional não se pronunciou quanto à questão do início do prazo de prescrição», no acórdão n.º 541/2004 considerou-se infundada a discrepância, atentos os respectivos efeitos, entre o prazo de extinção do direito dos herdeiros ao reembolso dos certificados de aforro titulados pelo falecido e o direito do herdeiro aceitar a herança. Aspecto com particular importância na medida em que a interpretação preconizada no parecer implica dois prazos distintos, dada a diferença dos respectivos termos iniciais, o evento morte no caso da extinção de direitos prevista no n.º 2 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86 e o conhecimento do chamamento à herança no caso da extinção do direito de aceitar a herança previsto no art. 2059.º, n.º 1, do Código Civil.
Ilustrando, o início da contagem do prazo de 10 anos para extinção do direito de reembolso dos valores dos certificados do parecer a partir da data do óbito implicaria, nomeadamente, que o prazo da prescrição extintiva do direito dos herdeiros reclamarem os seus certificados de aforro pudesse prescrever antes de sequer se iniciar a contagem do prazo para se aceitar a herança.

V. Concluindo:
Afigura-se essencial, antes do mais, o recorte metodológico da questão objecto da consulta, a qual se reporta a um problema de sucessão por morte, em que esta funciona como causa do efeito translativo. No caso, a sucessão reporta-se à transmissão dos direitos relativos a certificados de aforro, numa expressão paradigmática da autonomia do direito das sucessões no Código Civil de 1966, nas palavras de Inocêncio Galvão Teles: «o indivíduo morre e põe-se o problema da sua projecção além túmulo através do destino a dar ao seu património e até a alguns dos seus direitos e obrigações pessoais que lhe sobrevivem»[43].
Enquadramento no direito sucessório revelado no própria exposição de motivos do Decreto-Lei n.º 122/2002, segundo a qual se introduziu «uma alteração ao regime no que se refere à prescrição dos [certificados de aforro das séries A e B] em caso de morte do titular, alargando-se o prazo para a habilitação de herdeiros de 5 para 10 anos».
Regula-se desta forma o fenómeno sucessório relativo ao reembolso dos certificados de aforro titulados pelo falecido, isto é, nas palavras de Carlos Alberto Mota Pinto, uma parcela da «transmissão das relações jurídicas patrimoniais para outra pessoa por força da morte do seu titular»[44].

A tese de uma prescrição extintiva especial do direito ao reembolso dos certificados de aforro cujo prazo se iniciaria com o evento morte, afigura-se-nos incompatível com uma interpretação em conformidade constitucional da prescrição extintiva desse direito, além de desligada de uma interpretação teleológico-sistemática de uma prescrição extintiva especial de direitos à transmissão sucessória (dimensões devidamente recortadas, respectivamente, no acórdão n.º 541/2004 do Tribunal Constitucional e no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 2005).

Importa ainda sublinhar que a tese do início da contagem do prazo a partir do evento morte deixa na sombra o imperativo de intervir «na fundamentação» da prescrição extintiva «uma ponderação de justiça»[45]. Com efeito, não se logra identificar um direito do Estado merecedor de tutela que seria posto em causa pela solução preconizada neste voto de vencido (no sentido de a prescrição extintiva depender do conhecimento pelos herdeiros da existência dos certificados de aforro como bem da herança).
Não se devendo obnubilar, quanto a este segmento, que:
1. O Estado tem mecanismos gerais para reagir contra a passividade dos herdeiros (cf. nomeadamente arts. 2046.º e ss., do Código Civil);
2. O Estado pode assegurar a prova do conhecimento pelos herdeiros da titularidade pelo falecido de certificados de aforro, atento o disposto no art. 5.º, n.º 6, do Decreto-Lei n.º 47/2008 de 13 de Março, «os serviços e entidades que celebrem actos de partilha ou de adjudicação de bens adquiridos por sucessão devem aceder, por meios informáticos e nos termos que venham a ser regulamentados por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, ao registo central de certificados de aforro, devendo fazer menção do resultado da referida consulta no acto público celebrado».

As pautas axiológicas sinteticamente enunciadas levam-nos a concluir que o prazo de extinção dos direitos dos herdeiros ao reembolso de certificados de aforro séries A e B titulados pelo de cujus, por omissão de interpelação do Fundo de Regularização da Dívida Pública, só se inicia com o conhecimento pelos herdeiros do seu chamamento à herança e da existência desse bem da herança.








[1] Pedido formulado pelo ofício n.º 3895, de 15 de Junho de 2010 (Procº: 017.016/10). O parecer foi distribuído em 6 de Julho de 2010, tendo sido redistribuído em 20 de Janeiro de 2011, em virtude da cessação de funções do primitivo Relator.
[2] Citam-se os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de Novembro de 2005, e do Tribunal da Relação de Lisboa, de 14 de Dezembro de 2006.
[3] Alterado pela Portaria n.º 18912, de 27 de Dezembro de 1961, pelo Decreto-Lei n.º 45642, de 7 de Abril de 1964, e pelos Decretos-Leis n.os 122/20002, de 4 de Maio, e 47/2008, de 13 de Março.
[4] Alterada pela Portaria n.º 230-A/2009, de 27 de Fevereiro.
[5] Este diploma foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de Março.
[6] Cfr. artigo 11.º da Lei n.º 7/98, de 3 de Fevereiro, que regula o regime geral de emissão e gestão da dívida pública directa do Estado.
[7] Termo usado no artigo 10.º do Decreto n.º 43454 e no artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 172-B/86.
[8] Os estatutos do IGCP foram aprovados pelo Decreto-Lei n.º 160/96, de 4 de Setembro. Esta entidade passou, com o Decreto-Lei n.º 273/2007, de 30 de Julho, a designar-se por Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público, I.P., mantendo, no entanto, a anterior sigla – IGCP.
[9] Finanças Públicas e Direito Financeiro, volume II, 4.ª edição – 9.ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 2002, p. 99. Sobre estes instrumentos financeiros, v. também EDUARDO PAZ FERREIRA, Da Dívida Pública e das Garantias dos Credores do Estado, Colecção Teses, Almedina, Coimbra, 1995, pp. 254 e segs., e ANTÓNIO GOMES MACHADO, Dicionário Jurídico da Administração Pública, Atlântida Editora, Coimbra, 1965, entrada «Aforro», pp. 275-276. Podem recolher-se ainda outros elementos sobre estes instrumentos financeiro na página na Internet do Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público, em http://www.igcp.pt. Na jurisprudência, para além dos acórdãos que adiante se citarão, proferidos sobre a questão do início do prazo da prescrição do direito à sua transmissão por morte do respectivo titular, v. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Abril de 2002, do Tribunal da Relação de Lisboa de 20 de Fevereiro de 2003, e do Tribunal da Relação do Porto de 7 de Fevereiro de 2011, nos quais se tecem algumas considerações sobre a natureza e características dos certificados de aforro.
[10] Aditado pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de Março.
[11] Como já se referiu, esta Lei regula o regime geral da emissão e gestão da dívida pública directa do Estado.
[12] Recomendação n.º 8/A/2002, de 16 de Setembro de 2002, consultável na página do Provedor de Justiça na Internet, em http://www.provedor-jus.pt.
[13] De 15 de Julho de 2004, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos.
[14] Refira-se que o Tribunal Constitucional não se pronunciou quanto à questão do início do prazo da prescrição.
[15] Daí que se mantenham vivos os certificados das séries A e B enquanto não forem objecto de resgate ou amortização.
[16] No caso apreciado no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Maio de 2005, os herdeiros do subscritor dos certificados de aforro descobriram casualmente os títulos «metidos entre as páginas da Bíblia que pertenceu ao aforrista», quando procediam a limpezas na casa de família que ficara abandonada, cerca de onze anos após o óbito daquele.
[17] Esta informação «está disponível durante a vigência do contrato de seguro ou da operação de capitalização e até um prazo de 10 anos após a data do seu termo, ou da morte do segurado ou do subscritor, ou da declaração de morte presumida destes, consoante a que ocorra posteriormente» (n.º 4 do mesmo preceito).
[18] Prosseguindo objectivos similares, pode mencionar-se o serviço disponibilizado pelo Banco de Portugal de difusão pelo sistema bancário nacional dos pedidos de localização de activos financeiros em caso de morte dos respectivos titulares. Como se lê na Carta-Circular n.º 5/2008/DET, de 16 de Janeiro de 2008, daquela instituição, «[r]econhecendo que a obtenção de informação sobre a existência de activos, designadamente saldos de contas bancárias e de outras aplicações financeiras é uma tarefa que se reveste, não raro, de alguma dificuldade, designadamente quando desenvolvida no âmbito da sucessão “mortis causa”, o Banco de Portugal vai proceder à difusão pelo sistema bancário de pedidos de informação que lhe sejam apresentados por particulares, tendentes à identificação de contas bancárias e/ou de outros activos financeiros relativamente a titulares falecidos». A legitimidade para recorrer a este serviço é conferida unicamente ao cabeça-de-casal. Este serviço prestado pelo Banco pretende facilitar a obtenção de informação sobre a existência de saldos de contas bancárias e de outras aplicações financeiras. A tramitação a que a operacionalização deste serviço deve obedecer consta da dita Carta-Circular, disponível no portal do cliente bancário do Banco de Portugal, no endereço: http://www.bportugal.pt.
[19] Interessa dar conta de que, ainda antes da criação do registo central de certificados de aforro e do procedimento de acesso às informações previsto no Decreto-Lei n.º 47/2008, o IGCP já havia instituído, para efeitos de transmissão da titularidade ou amortização de certificados de aforro, um procedimento visando a obtenção de informações acerca das contas do titular falecido, conferindo legitimidade unicamente aos seus herdeiros ou respectivos mandatários (v. Instrução do IGCP n.º 3/2004 (2.ª série), de 20 de Setembro de 2004, publicada no Diário da República, 2.ª série, de 30 de Setembro de 2004, disponível também na página do IGCP na internet).
[20] Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, 4.ª reimpressão, Livraria Almedina, Coimbra, 1974, pp. 445-463.
[21] MANUEL DE ANDRADE, ob. cit., p. 446.
[22] Tratado de Direito Civil Português, I – Parte Geral, Tomo IV, Almedina, 2005, p. 160.
[23] Ob. cit., p. 161.
[24] Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição por ANTÓNIO PINTO MONTEIRO e PAULO MOTA PINTO, Coimbra Editora, 2005, p. 375.
[25] Ob. cit., p. 376. Sobre este tema, v. ADRIANO VAZ SERRA, Prescrição Extintiva e Caducidade, Separata do Boletim do Ministério da Justiça, Lisboa, 1961, pp. 32 e segs., MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 10.ª edição reelaborada, Almedina, 2006, pp. 1119-1129. LUÍS A. CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, II, 3.ª edição, revista e actualizada, Universidade Católica Editora, 2001, pp. 647-660, JOSÉ VASQUES, Contrato de Seguro, Coimbra Editora, 1999, p. 365, e ANA FILIPA MORAIS ANTUNES, Prescrição e Caducidade, Coimbra Editora, 2008, pp. 14-22.
[26] Ob. cit., p. 166.
[27] Acompanha-se ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ob. cit., p. 166.
[28] A opção pela regra do esquema objectivo inserir-se-á também na tradição portuguesa desde o Código de Seabra, cujo artigo 536.º dispunha que «o tempo desta prescrição [da prescrição negativa] conta-se desde o momento em que a obrigação se tornou exigível, salvo se outra data for especialmente assinada na lei ao começo do prazo». No direito comparado, sublinhe-se a opção pelo sistema objectivo, contida no artigo 2935 do Códice Civile Italiano – «a prescrição começa a correr a partir do dia em que o direito pode ser exercido». Em Espanha, o prazo da prescrição, «quando não haja disposição especial que determine outra coisa», conta-se também desde o dia em que o direito puder ser exercido (v. artigo 1969 do Código Civil). O sistema francês consagra, como ponto de partida da prescrição, «o dia em que o titular do direito tem o conhecimento ou poderia ter o conhecimento dos factos que lhe permitam exercê-lo» (artigo 2224 do Code Civil). Já o prazo ordinário da prescrição é de 20 anos a contar do nascimento do direito. No sistema alemão, após a reforma do Bürgerliches Gesetzbuch (BGB), de 2001, a prescrição ordinária (3 anos) passou a iniciar-se com o surgimento da obrigação em jogo e pelo conhecimento, por parte do credor, das circunstâncias originadoras da obrigação visada, salvo desconhecimento gravemente negligente (§ 199/1). Como lembra ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO (ob. cit., pp. 141-147), abandonou-se o sistema anterior, objectivo, em que o início da prescrição ordinária (cujo prazo era, então, de 30 anos) dependia da simples existência da obrigação, numa regra temperada pela exigência da possibilidade do seu exercício. Quanto aos prazos não ordinários da prescrição, esta inicia-se com o surgimento da pretensão (§ 200 do BGB).
[29] Ob. cit., p. 190.
[30] Ob. cit., p. 198. Estas considerações, embora escritas no domínio da vigência do Código Civil de 1867, mantêm-se actuais.
[31] ANA FILIPA MORAIS ANTUNES, ob. cit., p. 63.
[32] Ob. cit., p. 449. V. LUÍS A. CARVALHO FERNANDES, ob. cit. p. 655.
[33] Conferida pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de Março.
[34] Acórdão de 5 de Maio de 2005, disponível, como os demais a seguir indicados, nas Bases Jurídico-Documentais do ITIJ (www://dgsi.pt). No mesmo sentido, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de Dezembro de 2002, e do Supremo Tribunal de Justiça 30 de Setembro de 2003, citados e parcialmente transcritos no acórdão n.º 541/04 do Tribunal Constitucional, já referido (v. nota 13).
[35] Acórdão de 8 de Novembro de 2005.
[36] No mesmo sentido, v. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de Dezembro de 2006, proferido na sequência do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de Junho de 2002, onde se aponta também para a data do conhecimento da existência dos certificados de aforro pelos herdeiros do seu titular.
[37] V. procedimentos definidos no n.º 10 da Instrução do IGCP n.º 3/2004 (2.ª série), já citada.
[38] Tem sido este o entendimento seguido pelo IGCP, conforme informação disponível na sua página da Internet, relativa ao procedimento de habilitação de herdeiros de titular de certificados de aforro (www.igcp.pt/gca).
[39] Ob. cit., p. 166.
[40] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ob. cit., p. 166, nota 485.
[41] Proc. n.º 05A3169, in www.dgsi.pt.
[42] Proc. n.º 8477/2006-8, in www.dgsi.pt.
[43] Direito das sucessões – Noções Fundamentais, Centro de Estudos de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1973, 266.
[44] Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, p. 168.
[45] Cf. Carlos Mota Pinto, op. cit., p. 375.