Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003357
Parecer: P000042016
Nº do Documento: PPA2906201700400
Descritores: CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA SOBRE O SETOR ENERGÉTICO (CESE)
SUJEITO PASSIVO
RECEITA
CUSTO PARA A MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL (CMEC)
AJUSTAMENTO ANUAL
FUNDO PARA A SUSTENTABILIDADE SISTÉMICA DO SETOR ENERGÉTICO
LIBERALIZAÇÃO DO SETOR ELÉTRICO
CONTRATO DE AQUISIÇÃO DE ENERGIA (CAE)
CESSAÇÃO ANTECIPADA
ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS
USO GLOBAL DO SISTEMA (UGS)
TARIFA
Livro: 00
Numero Oficio: 607
Data Oficio: 02/12/2016
Pedido: 02/15/2016
Data de Distribuição: 02/18/2016
Relator: MANUELA FLORES
Sessões: 01
Data da Votação: 06/29/2017
Tipo de Votação: UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Sigla do Departamento 1: SEE
Entidades do Departamento 1: SECRETÁRIO DE ESTADO DE ENERGIA
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 11/24/2017
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 02-03-2018
Nº do Jornal Oficial: 44
Nº da Página do Jornal Oficial: 6671
Indicação 2: ASSESSORA: ISABEL CAPELA
Notas:tem complementar n.º 24/17

Área Temática:DIR ADM*ADM PÚBL/ DIR CONST/ DIR CIV
Ref. Pareceres:PP000662005
P001262005Parecer: P001262005
P000042010Parecer: P000042010
P000392012Parecer: P000392012
Legislação:L83-C/2013 DE 31/12 ART228; PORT 157-B/2015 DE 28/05; DL55/2014 DE 09/04; D12559 DE 20/10/1926; L2002 DE 26/12/1944; DL43335 DE 19/11/1960; DL205-G/75 DE 19/04; DL502/76 DE 30/06; L46/77 DE 08/07; DL344-B/82 DE 01/09; DL449/88 DE 10/12; DL7/91 DE 08/01; DL99/91 DE 02/03; DL182/95 DE 27/06; DL183/95 DE 27/06; DL 184/95 DE 27/06; DL185/95 DE 27/06; DL186/95 DE 27/06; DL187/95 DE 27/06; DL188/95 DE 27/06; DL189/95 DE 27/06; DL85/20002 DE 06/04; DL189/88 DE 27/05; RAR32-A/2004 DE 20/04; DL198/2003 DE 02/09; DL153/2004 DE 30/06; DL240/2004 DE 27/12; DL29/2006 DE 15/02; DL215-A/2012 DE 08/10; REG561/2014 DE 22/12; REG551/2014 DE 15/12; RCM63/2003 DE 28/04; DL185/2003 DE 20/08; L52/2004 DE 29/10; CONST76 ART165 N1 I); DL18/2008 DE 29/01 ART50 N5 ART60 N2 ART96 N2 N5 N6 ART132 N6 ART189 N6 ART226 N5 ART280 ART282; CCIV66 ART236 ART237 ART238 ART239
Direito Comunitário:DIR 96/92/CE PE CONS DE 01/12/1996
DIR 2003/54/CE PE CONS DE 25/06/2003
DIR 2001/80/CE PE CONS DE 23/10/2001
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:PPL141/IX

Conclusões: 1.ª – A contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE) foi criada pelo regime aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83–C/2013, de 31 de dezembro – Orçamento do Estado para 2014 –, visando financiar mecanismos que promovam a sustentabilidade sistémica do setor energético (cfr. n.º 2 do artigo 1.º daquele regime);

2.ª – Entre os sujeitos passivos da CESE, incluem-se os titulares de licenças de exploração de centros eletroprodutores, com exceção dos localizados nas Regiões Autónomas dos Açores ou da Madeira (cfr. alínea a) do artigo 2.º do regime da CESE), e que não estejam isentos nos termos do artigo 4.º do regime da CESE;

3.ª – As importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de contribuição extraordinária sobre o setor energético não são suscetíveis de repercussão, conforme estatuído no n.º 1 do artigo 5.º do regime da CESE, «direta ou indiretamente, nas tarifas de uso das redes de transporte, de distribuição ou de outros ativos regulados de energia elétrica e de gás natural, previstas nos regulamentos tarifários dos respetivos setores, não devendo a contribuição ser considerada, designadamente, para efeitos de determinação do respetivo custo de capital»;

4.ª – A receita obtida com a CESE é consignada ao Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético (FSSSE) que foi criado pelo Decreto-Lei n.º 55/2014, de 9 de abril;

5.ª – E, no que concerne à redução da dívida tarifária, o montante da CESE que lhe é alocado é deduzido aos custos de interesse económico geral (CIEG) a repercutir em cada ano na tarifa de uso global do sistema aplicável aos clientes finais e comercializadores, em conformidade com o definido por despacho do membro do governo responsável pela área da energia (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014);

6.ª – O aprofundamento da liberalização do setor elétrico em 1995 fez-se com a publicação de um conjunto de diplomas que introduziram importantes alterações na atividade de produção, transporte e distribuição de energia elétrica;

7.ª – Neste domínio, o Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho, que estabeleceu as bases da organização do Sistema Elétrico Nacional (SEN), prevê no artigo 15.º os contratos de aquisição de energia (CAE), que se caraterizam por serem contratos de longo prazo através dos quais os produtores vinculados ao serviço público da energia se comprometiam a abastecer, em exclusivo, a entidade concessionária da rede nacional de transporte (RNT), vendendo-lhe toda a energia produzida no respetivo centro electroprodutor;

8.ª – De entre as orientações de política energética aprovadas pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003, foi adotada a necessidade de liberalizar o mercado com eficiência, através, designadamente, da concretização do mercado ibérico de eletricidade (MIBEL) e da promoção da concorrência no setor da eletricidade, constituindo a extinção dos CAE uma das medidas para a existência de um verdadeiro mercado de eletricidade;

9.ª – O Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de agosto, que estabeleceu disposições aplicáveis à cessação dos contratos de aquisição de energia elétrica celebrados entre a entidade concessionária da RNT e os produtores vinculados, prevê nos n.os 2 e 3 do artigo 13.º que essa cessação implica a adoção de medidas indemnizatórias, tendo em vista o ressarcimento dos direitos dos produtores através de um mecanismo destinado a manter o equilíbrio contratual subjacente, designado por custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), que deverão garantir a compensação dos investimentos realizados e a cobertura dos compromissos assumidos nos CAE que não sejam garantidos pelas receitas expectáveis em regime de mercado;

10.ª – E o Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, em execução do disposto no n.º 4 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 185/2003, e editado no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 52/2004, de 29 de outubro, contempla as disposições aplicáveis à cessação antecipada dos CAE, estabelecendo no n.º 2 do artigo 2.º que a cessação antecipada dos CAE determina a atribuição a um dos seus titulares (produtor ou entidade concessionária da RNT) do direito ao recebimento de compensações pela cessação antecipada de tais contratos, as quais têm o intuito de garantir a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados pelos contratos anteriores, que não estejam devidamente garantidos através das receitas esperadas em regime de mercado;

11.ª – As regras aplicáveis à determinação do montante dos CMEC e dos respetivos ajustamentos são enunciadas no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, estabelecendo-se no n.º 5 que os montantes dos CMEC são suscetíveis de ajustamentos anuais e de um ajustamento final;

12.ª – Os ajustamentos anuais devem ser efetuados nos termos do n.º 6 do referido artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, com base nos critérios constantes dos artigos 4.º a 6.º do Anexo I e nas condições enunciadas no artigo 11.º (n.os 1 a 11), todos daquele diploma;

13.ª – No caso de os ajustamentos anuais conduzirem à determinação de montantes devidos aos produtores – ajustamentos positivos, o respetivo valor será repercutido nas tarifas pela totalidade dos consumidores de energia elétrica no território nacional, constituindo encargos respeitantes ao uso global do sistema a incorporar como componentes permanentes da tarifa de uso global do sistema (n.º 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 240/2004);

14.ª – E no caso de os ajustamentos anuais conferirem à entidade concessionária da RNT o direito a compensações – ajustamentos negativos, os respetivos montantes pagos por cada produtor devem ser repercutidos para posterior redução da tarifa UGS, de forma a garantir uma repartição equitativa entre todos os consumidores do sistema elétrico (n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 240/2004);

15.ª – O Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, que, num novo quadro, estabelece os princípios gerais relativos à organização e funcionamento do sistema elétrico nacional, no n.º 3 do artigo 61.º, atinente aos princípios aplicáveis ao cálculo e à fixação das tarifas, inclui nos custos de interesse económico geral, entre outros, a diferença entre os encargos totais com a aquisição e a receita proveniente da venda da energia elétrica adquirida ao abrigo dos CAE em vigor e os encargos com os CMEC;

16.ª – A tarifa de Uso Global do Sistema (UGS), a aplicar às entregas dos operadores das redes de distribuição, deve proporcionar os proveitos a recuperar pelos operadores das redes de distribuição, relativos à compra e venda de energia elétrica do agente comercial, à gestão global do sistema, ao diferencial de custo com a aquisição de energia elétrica a produtores em regime especial, aos custos para a manutenção do equilíbrio contratual e aos défices tarifários, entre outros (cfr. n.º 2 do artigo 65.º do Regulamento Tarifário – Regulamento n.º 551/2014);

17.ª – E a UGS é composta por duas parcelas: a parcela I permite recuperar os custos de gestão do sistema e a parcela II permite recuperar os custos decorrentes de medidas de política energética, ambiental ou de interesse económico geral e os custos para a manutenção do equilíbrio contratual dos produtores com CAE (cfr. n.º 1 do artigo 66.º também do Regulamento Tarifário);

18.ª – No âmbito dos CAE, há que considerar o complexo quadro legal e contratual, impondo-se, portanto, atentar nos próprios contratos e, no caso de cessação antecipada, nos respetivos acordos de cessação;

19.ª – De acordo com o estipulado na Cláusula 21 dos CAE (“Alterações nas circunstâncias”), é considerada uma alteração relevante a introdução, imposição, cobrança, tributação ou qualquer alteração de imposto relevante, que à data da assinatura do contrato não existisse ou não afetasse o produtor;

20.ª – Ora, a CESE, tal como de descreveu, trata-se de uma contribuição financeira, não podendo ser considerada imposto;

21.ª – Destarte, a CESE não é suscetível de dar azo à aplicação da cláusula 21 dos CAE sobre alteração das circunstâncias;

22.ª – De todo o modo, independentemente da natureza da CESE (contribuição ou imposto), conforme estabelecido pelo legislador, e já referido na 3.ª conclusão, as importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título da CESE não são repercutíveis;

23.ª – E, de acordo com o disposto no citado n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014, no que concerne à redução da dívida tarifária, o montante da CESE alocada ao FSSSE é deduzido aos custos de interesse económico geral, não devendo, pois, nunca agravar, mas sim beneficiar os consumidores;

24.ª – Trata-se de uma opção clara do legislador, refletida em normas imperativas – os referidos n.º 1 do artigo 5.º do regime da CESE e n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014 –, já que os consumidores não são sujeitos passivos da CESE e se as respetivas importâncias viessem a ser adicionadas à UGS seriam a final os consumidores a suportá-las;

25.ª – As importâncias suportadas a título da CESE também não permitem o ajustamento do encargo fixo devido ao produtor responsável pelo centro eletroprodutor previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º do Anexo I do Decreto-Lei n.º 240/2004;

26.ª – Assim, as importâncias a título da CESE suportadas pelos centros eletroprodutores partes de contratos de aquisição de energia – CAE –, em vigor, não são suscetíveis de permitir a aplicação das respetivas cláusulas sobre alteração das circunstâncias, nem, de todo o modo, de adicionamento à tarifa de Uso Global do Sistema;

27.ª – Também, a CESE não é suscetível de repercussão nos ajustamentos anuais aos montantes dos CMEC, nos termos do n.º 6 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, com base nos critérios constantes dos artigos 4.º a 6.º do Anexo I e nas condições enunciadas no artigo 11.º, todos daquele diploma.



Texto Integral:

Senhor Secretário de Estado da Energia,
Excelência:




I


Solicitou Vossa Excelência a emissão de parecer deste Conselho Consultivo sobre a repercussão nos ajustamentos anuais aos CMEC das importâncias suportadas pelos sujeitos passivos da Contribuição Extraordinária sobre o Setor Elétrico (CESE).

E, no pedido de parecer, são elaboradas as seguintes questões:

«I – As importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de CESE por referência às centrais com CAE ainda em vigor, são, ou não, suscetíveis de dar azo à aplicação das respetivas cláusulas sobre alteração das circunstâncias e à consequente repercussão dos custos inerentes na entidade concessionária da RNT na referida tarifa UGS;

II – As importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de CESE por referência às centrais a que seja aplicável o regime de CMEC, identificadas no anexo 11[[1]] do Decreto-Lei n.º 240/2004, são, ou não, suscetíveis de repercussão nos ajustamentos anuais aos mesmos, a efetuar ao abrigo do disposto no artigo 11.º do referido diploma com repercussão na tarifa UGS.»

Cumpre, pois, emitir o parecer.

II


Com vista a uma melhor compreensão da problemática sob consulta, reproduz-se também de seguida a exposição que sustenta o pedido de parecer.

« A Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, alterada pela Lei n.º 33/2015, de 27 de abril, criou a contribuição extraordinária para o setor energético (CESE) cuja aplicação foi prorrogada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro (artigo 237.º).

O seu artigo 5.º n.º 1 estabelece que as importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de CESE “(…) não são repercutíveis, direta ou indiretamente, nas tarifas de uso das redes de transporte, de distribuição ou de outros ativos regulados de energia elétrica e de gás natural, previstas nos regulamentos tarifários dos respetivos setores, não devendo a contribuição ser considerada, designadamente, para efeitos de determinação do respetivo custo de capital “(redação dada pela Lei n.º 33/2015, de 27 de abril).

O Regulamento n.º 551/2014[2] da ERSE, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 241, de 15 de dezembro, da ERSE, que aprova o regulamento tarifário do setor elétrico, prevê no seu artigo 18.º as seguintes tarifas: a) Tarifas de Acesso às Redes; b) Tarifa Social de Acesso às Redes; c) Tarifas Transitórias de Venda a Clientes Finais dos Comercializadores de Último Recurso; d) Tarifa Social de Venda a Clientes Finais dos Comercializadores de Último Recurso; e) Tarifas de Venda a Clientes Finais da Região Autónoma dos Açores; f) Tarifas de Venda a Clientes Finais da Região Autónoma da Madeira; g) Tarifa de Energia; h) Tarifas de Uso Global do Sistema (UGS); i) Tarifas de Uso da Rede de Transporte; j) Tarifa de Venda do Operador da Rede de Transporte; k) Tarifas de Uso da Rede de Distribuição; l) Tarifas de Comercialização.

O artigo 65.º, n.º 2, e o artigo 66.º do citado Regulamento Tarifário do Setor Elétrico estabelecem o objeto da tarifa de UGS e a sua estrutura definindo que deve incorporar, entre outros, os valores relativos aos sobrecustos dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE), aos custos de manutenção do equilíbrio contratual e aos défices tarifários.

O regime de alteração das circunstâncias dos CAE encontra-se previsto no respetivo Anexo 11, o qual contemplava precisamente a repercussão no comprador da energia elétrica – ou seja, na entidade concessionária da RNT – das alterações de custos supervenientes resultantes de alterações fiscais e modificações legislativas, as quais constituíam uma alteração das circunstâncias suscetíveis de imediata repercussão no pagamento devido ao produtor.

A cláusula 21 dos CAE, em conjugação com os respetivos Anexos 11 e 13, prevê o direito do produtor à transferência dos custos com a nova tributação incidente sobre o produtor ou a sua atividade.

Por seu turno, o Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro[3], alterado pelos Decretos-Leis n.º 199/2007, de 18 de maio, n.º 264/2007, de 24 de julho, e n.º 32/2013, de 26 de fevereiro, contempla as disposições aplicáveis à cessação antecipada dos CAE, estabelecendo no seu artigo 2.º, n.º 2, que a cessação antecipada dos CAE determina a atribuição a um dos seus titulares (produtor ou entidade concessionária da RNT) do direito ao recebimento de compensações pela cessação antecipada de tais contratos as quais têm o intuito de garantir a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados pelos contratos anteriores, que não estejam devidamente garantidos através das receitas esperadas em regime de mercado e define o mecanismo de cálculo dos ajustamentos anuais ao valor inicial dos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC), que são repercutidos pela totalidade dos consumidores de energia elétrica no território nacional, como componente da tarifa UGS (cfr. artigos 65.º e 66.º do citado Regulamento Tarifário do Setor Elétrico).

Nos termos do disposto no artigo 17.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 215-A/2012, de 8 de outubro, constituem centros eletroprodutores em regime ordinário, para além dos centros eletroprodutores beneficiários de CMEC, os centros eletroprodutores que ainda disponham de CAE válidos e eficazes.

A produção de energia elétrica em regime ordinário (PRO), incluindo os centros eletroprodutores beneficiários de CMEC e aqueles que ainda disponham de CAE válidos e eficazes, é uma atividade que se processa em regime de livre concorrência, de acordo com o disposto no artigo 4.º, n.º 4, e artigo 15.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 29/2006 de 15 de fevereiro, alterado republicado pelo Decreto-Lei n.º 215-A/2012, de 8 de outubro.

De acordo com o artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 240/2004, os montantes correspondentes ao valor dos CMEC "(…) são repercutidos sobre a totalidade dos consumidores de energia elétrica no território nacional, constituindo encargos respeitantes ao uso global do sistema a incorporar como componentes permanentes da tarifa UGS”.

Os artigos 3.º e 11.º do Decreto-Lei n.º 240/2004 preveem a existência de um mecanismo de revisibilidade dos CMEC através da possibilidade de ajustamentos anuais e de um ajustamento final, por forma a assegurar a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados pelos CAE, nos termos notificados aprovados pela Comissão Europeia, bem como as disposições sobre o procedimento a adotar no âmbito da revisibilidade das compensações. Através do mecanismo em causa, são avaliados anualmente os montantes a pagar ou a receber pelos produtores ao abrigo do regime de CMEC de modo a que o equilíbrio contratual dos CAE seja mantido, sendo que tal avaliação tem por base os dados fornecidos pelos próprios produtores, pela entidade concessionária da RNT e pelas entidades que desenvolvam a atividade de distribuição de energia, a comparação de todos os custos e proveitos do centro eletroprodutor cujo ajustamento deve ser determinado com todos os custos e proveitos, em igual período, de outros centros eletroprodutores de tecnologia equivalente na propriedade ou posse do mesmo produtor e outros dados ou elementos que, no decurso do procedimento, sejam recolhidos.

Em particular, o artigo 4.º do anexo I ao Decreto-Lei n.º 240/2004 contém o elenco dos elementos que devem ser considerados na determinação do valor anual da revisibilidade do montante inicial dos CMEC, contando-se entre tais elementos o encargo fixo verificado no ano a que o cálculo respeita, o qual correspondia no âmbito dos CAE ao encargo de potência, ou seja, ao encargo correspondente a custos fixos de produção. A alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º do anexo I do citado diploma prevê que o cálculo desse encargo fixo (designado sob a expressão EFkmi) seja “(…) ajustado conforme o clausulado e anexos do CAE relativamente ao cumprimento de disposições legais nele definidas”.»

III


Face ao objeto da consulta, impõe-se, antes do mais, uma referência à mencionada contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE).

O regime que criou a CESE foi aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro – Orçamento do Estado para 2014[4].

De acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 1.º daquele regime, a CESE «tem por objetivo financiar mecanismos que promovam a sustentabilidade sistémica do setor energético, através da constituição de um fundo que visa contribuir para a redução da divída tarifária e para o financiamento de políticas sociais e ambientais do setor energético».

Aliás, mais recentemente, pode ler-se no preâmbulo da Portaria n.º 157-B/2015, de 28 de maio, que definiu os parâmetros e valores para apuramento da taxa de desconto a aplicar na contribuição extraordinária sobre o setor energético tendo em conta a duração dos contratos, as quantidades contratadas e o preço estimado do gás natural:

«O setor da energia é um importante vetor da economia portuguesa e um pilar fundamental para o crescimento e para o desenvolvimento sustentável do país. Sem prejuízo da implementação, pelo Governo, de medidas sectoriais de política energética, com vista à garantia da sustentabilidade do setor energético, a deterioração das condições socioeconómicas aliada ao aumento dos preços da energia, como fatores de perda de competitividade e de aumento da incapacidade de pagamento das despesas de energia que se reflete na dificuldade de cobrança das entidades que operam neste setor, exigiram que fosse pedida a participação das mesmas, de forma mais intensa e num quadro de solidariedade e equidade, no esforço necessário para assegurar a redução da dívida tarifária e a minimização dos encargos financeiros do Sistema Elétrico Nacional, nomeadamente os decorrentes de custos de interesse económico geral».

As incidências subjetiva e objetiva da CESE encontram-se estabelecidas, respetivamente, nos artigos 2.º[5] e 3.º[6] do regime atinente.
As isenções da contribuição extraordinária sobre o setor energético estão previstas no artigo 4.º, nos seguintes termos:

«Artigo 4.º

Isenções
É isenta da contribuição extraordinária sobre o setor energético:

a) A produção de eletricidade por intermédio de centros eletroprodutores que utilizem fontes de energia renováveis, nos termos definidos na alínea ff) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 23/2009, de 20 de janeiro, com exceção dos aproveitamentos hidroelétricos com capacidade instalada igual ou superior a 20 MW e com exceção da cogeração de fonte renovável;
b) A produção de eletricidade por intermédio de centros eletroprodutores de cogeração com uma potência elétrica instalada inferior a 20MW;
c) A produção de eletricidade por intermédio de centros eletroprodutores de cogeração que estejam abrangidos pelo novo regime remuneratório previsto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 23/2010, de 25 de março, alterado pela Lei n.º 19/2010, de 23 de agosto, exceto se for um centro eletroprodutor com uma potência instalada superior a 100 MW;
d) A produção de eletricidade por intermédio de centros eletroprodutores com licenças ou direitos contratuais atribuídos na sequência de concurso público, desde que os respetivos produtores não se encontrem em incumprimento das obrigações resultantes da adjudicação no âmbito de tais procedimentos;
e) A produção de eletricidade por intermédio de unidades de pequena produção a partir de recursos renováveis;
f) A produção de eletricidade e calor por intermédio de unidades de microcogeração;
g) A produção de eletricidade destinada ao autoconsumo;
h) A utilização de fontes de energia renováveis nos termos definidos na alínea ff) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 23/2009, de 20 de janeiro, para a produção de energia, com exceção da eletricidade;
i) A operação de redes de distribuição de energia elétrica exclusivamente em baixa tensão por pequenos distribuidores vinculados;
j) Os ativos respeitante a terrenos que integram o domínio público hídrico nos termos dos contratos de concessão de domínio público hídrico a que se referem os artigos 6.º do Decreto-Lei n.º 198/2003, de 2 de setembro, e 2.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 153/2004, de 30 de junho;
k) A produção e a comercialização de biocombustíveis e biolíquidos, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 6/2012, de 17 de janeiro, e 224/012, de 16 de outubro;
l) A atividade de venda a retalho de eletricidade, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 104/2010, de 29 de setembro, 78/2011, de 20 de junho, 75/2012, de 26 de março, 112/2012, de 23 de maio, e 215-A/2012, de 8 de outubro;
m) A atividade de venda a retalho de gás natural, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 140/2006, de 26 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 65/2008, de 9 de abril, 66/2010, de 11 de junho, e 231/2012, de 26 de outubro;
n) A atividade de venda a retalho de produtos de petróleo, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 31/2006, de 15 de fevereiro;
o) Os sujeitos passivos cujo valor total do balanço, em 31 de dezembro de 2014, seja inferior a (euro) 1 500 000.»

E conforme estatuído no n.º 1 do artigo 5.º, com a epígrafe “Não repercussão”, «[a]s importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de contribuição extraordinária sobre o setor energético não são repercutíveis, direta ou indiretamente, nas tarifas de uso das redes de transporte, de distribuição ou de outros ativos regulados de energia elétrica e de gás natural, previstas nos regulamentos tarifários dos respetivos setores, não devendo a contribuição ser considerada, designadamente, para efeitos de determinação do respetivo custo de capital».

Refira-se ainda que a receita obtida com a contribuição extraordinária sobre o setor energético é consignada ao Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético (FSSSE), com o objetivo de estabelecer mecanismos que contribuam para a sustentabilidade sistémica do setor energético, designadamente através da contribuição para a redução da dívida e ou pressão tarifárias e do financiamento de políticas do setor energético de cariz social e ambiental, de medidas relacionadas com a eficiência energética, de medidas de apoio às empresas e da minimização dos encargos financeiros para o Sistema Elétrico Nacional decorrentes de custos de interesse económico geral (CIEG), designadamente resultantes dos sobrecustos com a convergência tarifária com as regiões autónomas dos Açores e da Madeira, e para o SNGN (cfr. n.º 1 do artigo 11.º[7]).

O Fundo para a Sustentabilidade Sistemática do Setor Energético foi criado pelo Decreto-Lei n.º 55/2014, de 9 de abril, em cujo preâmbulo se afirma:

«Tendo em consideração a atual conjuntura económica e financeira do País, considera-se que o setor energético também deve participar, numa ótica de repartição justa e equitativa de sacrifícios, no esforço de consolidação das contas públicas que tem sido exigido à sociedade portuguesa. Esta participação, contudo não deve pôr em causa este importante vetor da economia portuguesa e pilar fundamental para o crescimento e desenvolvimento sustentável do país.
Assim, no âmbito dos compromissos assumidos no Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica celebrado, em maio de 2011, entre o Estado Português, o Fundo Monetário Internacional, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu, o artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2014, veio criar a contribuição extraordinária sobre o setor energético, com o objetivo de financiar mecanismos que promovam a sustentabilidade sistémica do setor energético, designadamente através do financiamento de políticas do setor energético de cariz social e ambiental, de medidas relacionadas com a eficiência energética. Esta contribuição visa igualmente contribuir para a redução da dívida tarifária do Sistema Elétrico Nacional (SEN), designadamente, através da minimização dos encargos decorrentes de custos de interesse económico geral (CIEG), indo ao encontro dos princípios de apoio e proteção do consumidor de eletricidade decorrentes do Terceiro Pacote da Energia da União Europeia consubstanciado nas Diretivas n.º 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, e n.º 2009/73/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009».

O FSSSE tem a natureza de património autónomo, sem personalidade jurídica e com autonomia administrativa e financeira (cfr. n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 55/2014).


IV


1. A abordagem da questão sob consulta exige, porém, o enquadramento legislativo do setor da energia elétrica, bem como a sua evolução ao longo das últimas décadas, não esquecendo o estatuto jurídico das respetivas entidades operadoras.


1.1. A evolução verificada no setor elétrico foi naturalmente marcada pelo posicionamento do Estado[8]. Assim, a este propósito num breve panorama, ainda durante a segunda metade do século XIX, o Estado liberal viu-se confrontado com novas exigências no âmbito das grandes atividades económicas emergentes, como a produção e distribuição de eletricidade, assumindo, na Europa[9], a titularidade das novas tarefas, que viriam a ser classificadas como tarefas de serviço público, e lançando mão da figura da concessão. Assistiu-se, pois, a uma relativa publicização das novas atividades económicas.

Mas foi com o advento do século XX e sobretudo após a 2.ª Guerra Mundial que o Estado viria a assumir uma intervenção direta nas atividades económicas e sociais.


1.2. É, porém, a partir do fim da primeira metade do século XX que se dá uma profunda transformação do Estado, juntando-se aos fins tradicionais, fins sociais e económicos. Esta nova forma de Estado, que se designou por Estado Social, não é apenas titular das tarefas, mas passou também a prestador direto dos serviços. Assim, no que agora nos importa, coube-lhe assegurar o desenvolvimento das grandes fontes de energia (eletricidade, carvão).

Como referem Pedro Gonçalves e Licínio Lopes Martins[10], «[e]sta orientação viria a ser concretizada, nos diversos países europeus, através de programas de nacionalização dos setores básicos da economia, dando lugar à criação do setor empresarial público. o ato de nacionalização operava a transferência para o setor público de atividades e de empresas privadas».

Generalizou-se, pois, a prática de atribuir ao Estado a responsabilidade de gerir os serviços públicos, quer através da administração direta, quer através de entidades públicas criadas para o efeito, sobretudo, das empresas públicas.

E a intervenção do Estado na economia não parou de crescer até à década de 80, originando um setor público económico (que com o setor público social, integrava um imenso setor público), correspondendo-lhe os serviços públicos económicos (produção e distribuição de água, de energia elétrica ou de gás, transporte coletivo terrestre, marítimo ou fluvial e aéreo, telecomunicações, correios, saneamento básico). Era o designado Estado de serviço público.


1.3. Porém, nas décadas seguintes, deram-se profundas alterações com a liberalização dos grandes serviços públicos. Tal deveu-se, por um lado, às crises do Estado social, destacando-se os gastos com o setor público, e, por outro lado, às exigências decorrentes da integração na Comunidade Europeia, face ao princípio da livre concorrência e de todos os seus corolários[11].

Assim, assiste-se a uma verdadeira privatização de atividades públicas, deslocando-se certas tarefas do Estado para o setor privado. Esta privatização, no caso português, foi assumida na revisão Constitucional de 1997, que desconstitucionalizou a obrigatoriedade da existência de setores básicos fechados à iniciativa privada, deixando para o legislador ordinário o papel de regular o acesso da iniciativa privada a determinadas atividades económicas[12].

Perante esta transformação do Estado e uma vez que as necessidades básicas anteriormente satisfeitas pelos serviços públicos se mantêm, surge agora a exigência de uma regulação pública. Temos, pois, um novo modelo de Estado, o Estado regulador, ou até, cada vez mais, uma Europa reguladora[13].

A presença do Estado, a quem cabe a responsabilidade de regulação, há de traduzir-se na definição da disciplina que rege a atuação dos agentes de mercado, a supervisão e fiscalização do seu cumprimento e a garantia da realização de certos fins sociais, cabendo-lhe, entre outras coisas, assegurar o acesso de todos os cidadãos a certos serviços essenciais – Serviço universal.


2. Atentemos, agora, em sintonia com o que vimos de dizer, no normativo mais relevante do setor elétrico[14].


2.1. O Decreto n.º 12559, de 20 de outubro de 1926 – Lei dos Aproveitamentos Hidráulicos –, que aprovou as bases aplicáveis à produção, transporte e distribuição da energia elétrica, continha a definição de Rede Elétrica Nacional (“conjunto de linhas de transporte de energia no País que seja objeto de comércio em espécie”) e dispunha que as linhas que a integravam eram, para efeitos de construção e exploração, de utilidade pública e de interesse nacional, e que seriam objeto de concessão.

Mais tarde, a Lei n.º 2002, de 26 de dezembro de 1944, aprovou as Bases da Eletrificação do país, que só vieram a ser desenvolvidas pelo Decreto-Lei n.º 43335, de 19 de novembro de 1960. Aquela Lei regulou, autonomamente, a “rede elétrica nacional” (que passou a abranger o conjunto de instalações de serviço público destinadas à produção, transporte e distribuição de energia elétrica) e o “transporte e grande distribuição”. Em qualquer das áreas ficou patente o importante papel que passou a caber ao Estado, que participaria ou apoiaria os produtores, prestaria auxílios à instalação das centrais ou procederia mesma à instalação das centrais de interesse público, auxiliaria no estabelecimento das linhas de transporte e grande distribuição; a interligação das linhas deveria subordinar-se ao planeamento estatal.


2.2. A estrutura organizativa do setor elétrico nacional – que assentava quanto ao regime de exercício das atividades de produção, distribuição e transporte de energia elétrica na outorga de concessões a cidadãos nacionais ou a empresas com maioria de capital nacional e sediadas em Portugal – foi modificada com a nacionalização, com eficácia a partir de 15 de abril de 1975, das principais empresas que exploravam aquelas atividades, operada pelo Decreto-Lei n.º 205-G/75, de 16 de abril, e pela concomitante previsão da criação de uma empresa pública, a EDP, à qual seria atribuído «em regime de exclusivo e por tempo indeterminado o exercício de serviço público de produção, transporte e distribuição de energia elétrica em todo o território nacional».

A EDP (Eletricidade de Portugal – Empresa Pública) foi criada pelo Decreto-Lei n.º 502/76, de 30 de junho, emergindo como “única entidade jurídica” resultante da reestruturação das empresas nacionalizadas.

Pessoa coletiva do direito público, dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, a EDP tinha por objeto principal «o estabelecimento e a exploração do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia elétrica no território do continente, para promover e satisfazer as exigências de desenvolvimento social e económico de toda a população» (artigo 2.º, n.º1).

O monopólio do Estado no setor reforçou-se através da proibição de acesso da iniciativa privada às atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público assumida pela Lei de Delimitação de Setores (Lei n.º 46/77, de 8 de julho).


2.3.1. Porém, na década de 80, anunciou-se o fim do monopólio do Estado, associado ao processo de adesão à Comunidade Económica Europeia, refletindo-se, inicialmente, apenas no setor da pequena produção de energia elétrica, na aceitação do autoprodutor[15], e na distribuição da energia elétrica em baixa tensão[16]. O Decreto-Lei n.º 449/88, de 10 de dezembro – que alterou a Lei n.º 46/77 (Lei de Delimitação de setores) – veio, ainda, permitir o acesso das entidades privadas às atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público.

E pelo Decreto-Lei n.º 7/91, de 8 de janeiro, a EDP foi transformada em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, prevendo-se a possibilidade de cisão e constituição de novas sociedades anónimas cujo capital social seria por si integralmente subscrito ou realizado (artigo 8.º, n.º 1).

Consagrado já o princípio da “liberdade de acesso”, o Decreto-Lei n.º 99/91, de 2 de março, veio regular as atividades específicas do setor e instituir os princípios gerais do regime enquadrador do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, salvaguardando, contudo, «um quadro misto em que se estimula a iniciativa privada e se mantém ainda uma zona nuclear, em regime de concessão de serviço público, bastante para garantir a segurança do abastecimento do país»[17].

O modelo então criado compreendia o SEP (Sistema Elétrico de Abastecimento Público) e o SEI (Sistema Elétrico lndependente). O SEP era constituído pela Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica (RNT), explorada em regime de concessão de serviço público, e por entidades contratualmente vinculadas ao sistema, que se comprometiam a abastecê-lo ou a ser por ele abastecidas, e que exerciam a atividade de produção e distribuição mediante atribuição de licenças vinculadas; o SEI compreendia o exercício de atividades fora do sistema, para uso próprio ou de terceiros, em regime de concorrência, e mediante licenças não vinculadas. Cabia à entidade concessionária da RNT a gestão global do SEP considerando-se tal concessão atribuída à EDP até à regulamentação da matéria por diploma próprio.


2.3.2. O aprofundamento da liberalização do setor fez-se com um conjunto de sete diplomas, publicados em 1995 – os Decretos-Leis n.os 182/95 a 188/95, todos de 27 de julho[18] – que introduziram importantes alterações na atividade de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, antecipando assim as orientações traçadas pela Diretiva n.º 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 1 de dezembro de 1996[19], que estabeleceu regras comuns para o mercado interno da eletricidade.

Particular evidência merece o Decreto-Lei n.º 182/95, que estabeleceu as bases da organização do Sistema Elétrico Nacional (SEN), e os princípios que regiam as atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica. Foi mantida a matriz delineada pelo Decreto-Lei n.º 99/91, designadamente o desdobramento do SEN no SEP e no SEl: o primeiro, associado à prestação de um serviço público, integrava a concessionária da RNT (explorada em regime de serviço público através de contrato de concessão, considerando-se a mesma atribuída à REN–Rede Elétrica Nacional, SA) e os titulares de licenças vinculadas de produção e distribuição; o SEI passou a compreender o Sistema Elétrico Não Vinculado (SENV), a produção de energia elétrica a partir de energias renováveis (com exceção da energia hidráulica), e a produção de energia elétrica em instalações de cogeração, bem como, a partir das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 85/2002, de 6 de abril, a produção de energia elétrica em aproveitamentos hidroelétricos instalada até 10MW.

Este novo enquadramento inscreve-se, pois, num movimento mais vasto de que a Diretiva n.º 96/92/CE constitui corolário no plano comunitário, e que tem como objetivo essencial a criação de um mercado concorrencial da eletricidade. Nessa medida, considerou-se que só a criação de um mercado interno do setor elétrico permitiria «racionalizar a produção, o transporte e a distribuição da eletricidade, reforçando simultaneamente a segurança de abastecimento e a competitividade da economia europeia e a proteção do ambiente»[20].

No sentido crescente da liberalização, o Decreto-Lei n.º 85/2002, de 6 de abril, que alterou o Decreto-Lei n.º 182/95, sujeitou os aproveitamentos hidroelétricos ate 10MW no regime previsto no Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, e integrou no SENV determinados aproveitamentos hidroelétricos da potência instalada superior a 10MW.


2.3.3. À Diretiva n.º 96/92/CE veio a suceder a Diretiva n.º 2003/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2003[21], que visa concretizar plenamente o mercado interno no setor da eletricidade, aprofundando o percurso já trilhado pela anterior Diretiva. Em todas as disposições comunitárias está presente o propósito de consolidar o modelo concorrencial, sem prejuízo do cumprimento dos requisitos de serviço público[22].

Entretanto, a Resolução da Assembleia da República n.º 32-A/2004, de 20 de abril, aprovou o acordo para a criação de um mercado de eletricidade comum a Portugal e Espanha (Mercado lbérico da Energia Elétrica – MIBEL), como «marco de um processo de integração dos sistemas elétricos de ambos os países», os quais se comprometeram a desenvolver legislação interna que permitisse o funcionamento de um mercado único em que todos os participantes tivessem igualdade de direitos e de obrigações.

Foi, assim, editada nova legislação – Decretos-Leis n.os 198/2003, de 2 de setembro, 153/2004, de 30 de junho, e 240/2004[23], de 27 de dezembro – que, aprofundando a tendência liberalizadora e concorrencial, visou a redução do SEP.


2.3.4. Finalmente, reconhecendo que as alterações legislativas ocorridas em 2003 e em 2004 assumiram um caráter meramente transitório, foi publicado o Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, que estabelece os princípios gerais relativos à organização e funcionamento do sistema elétrico nacional, bem como ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade, transpondo para a ordem jurídica interna os princípios da Diretiva n.º 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, que estabeleceu regras comuns para o mercado interno da eletricidade.

Este «novo quadro estabelece um sistema elétrico integrado, em que as atividades de produção e comercialização são exercidas em regime de livre concorrência, mediante a atribuição de licenças, e as atividades de transporte e distribuição são exercidas mediante a atribuição de concessões de serviço público. Estas atividades são exercidas tendo em conta a racionalidade dos meios a utilizar e a proteção do ambiente, nomeadamente através da eficiência energética e da promoção das energias renováveis e sem prejuízo das obrigações de serviço público»[24].

Consequentemente, «[a] atividade de transporte da eletricidade é exercida mediante a exploração da rede nacional de transporte, a que corresponde uma única concessão exercida em exclusivo e em regime de serviço público»[25].

E «[a] distribuição de eletricidade processa-se através da exploração da rede nacional de distribuição, que corresponde a rede em média e alta tensões, e da exploração das redes de distribuição em baixa tensão. A rede nacional de distribuição é explorada mediante uma única concessão do Estado, exercida em exclusivo e em regime de serviço público, convertendo-se a atual licença vinculada de distribuição de eletricidade em média e alta tensões em contrato de concessão, no respeito das garantias do equilíbrio de exploração da atual entidade licenciada. As redes de distribuição em baixa tensão continuam a ser exploradas mediante concessões municipais, sem prejuízo de os municípios continuarem a poder explorar diretamente as respetivas redes»[26].

Quanto à «atividade de comercialização de eletricidade é livre, ficando, contudo, sujeita a atribuição de licença pela entidade administrativa competente, definindo-se, claramente, o elenco dos direitos e dos deveres na perspetiva de um exercício transparente da atividade». E os «consumidores, destinatários dos serviços de eletricidade, podem, nas condições do mercado, escolher livremente o seu comercializador, não sendo uma mudança onerada do ponto de vista contratual»[27].

E «[n]o âmbito da proteção dos consumidores, define-se um serviço universal caracterizado pela garantia do fornecimento em condições de qualidade e continuidade de serviço e de proteção quanto a tarifas e preços e de acesso a informação em termos simples e compreensíveis»[28].

O Decreto-Lei n.º 29/2006 sofreu várias modificações[29], interessando destacar as introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 215-A/2012, que procedeu a uma revisão, em conformidade com o anunciado no seu preâmbulo:

«Na sequência da celebração, em maio de 2011, do Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica («Memorando de Entendimento»), entre o Estado Português, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia, foi estabelecido como objetivo a conclusão da liberalização dos setores da eletricidade e do gás, designadamente através da completa transposição das diretivas que integram o Terceiro Pacote Energético. Adicionalmente, foi assumido o compromisso de adotar medidas que permitam garantir a sustentabilidade do sistema elétrico nacional.
Neste contexto, o Decreto-Lei n.° 75/2012, de 26 de março, veio estabelecer o regime de extinção das tarifas reguladas de venda de eletricidade a clientes finais com consumos em baixa tensão normal (BTN). E, na sequência da diminuição da posição acionista do Estado na sociedade proprietária das sociedades concessionárias das redes de transporte de eletricidade e gás natural, bem como das infraestruturas de armazenamento e terminal de gás natural liquefeito, foi publicado o Decreto-Lei n.° 112/2012, de 23 de maio, que alterou os limites de participação no capital social das referidas sociedades concessionárias.
Importa ora proceder a uma revisão global do Decreto-Lei n.° 29/2006, de 15 de fevereiro, enquanto diploma estruturante da organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional (SEN), que assegure, de forma completa, integral e harmonizada, a transposição da Diretiva n.° 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, atualizando aquele diploma em consideração das vicissitudes entretanto ocorridas no panorama energético nacional.
Subjacentes a esta revisão estão também os objetivos definidos no Programa do XIX Governo Constitucional, no ponto concernente ao «Mercado de Energia e Política Energética: Uma Nova Política Energética», e nas Grandes Opções do Plano para 2012-2015, aprovadas pela Lei n.° 64-A/2011, de 30 de dezembro, no quadro da 5.ª Opção «O desafio do futuro – medidas setoriais prioritárias», no sentido da promoção da competitividade, da transparência dos preços, do bom funcionamento e da efetiva liberalização dos mercados da eletricidade e do gás natural.
Assim, no que respeita à produção de eletricidade, alteram-se os conceitos de produção em regime ordinário e produção em regime especial, deixando esta última de se distinguir da primeira apenas pela sujeição a regimes especiais no âmbito de políticas de incentivo, na medida em que a produção em regime especial passa também a contemplar a produção de eletricidade em regime remuneratório de mercado.
Quanto ao transporte de eletricidade, e em face dos desafios colocados pelo processo de reprivatização do capital social de empresas no setor energético, importa clarificar e reforçar as exigências impostas em matéria de independência e separação jurídica e patrimonial do operador da Rede Nacional de Transporte de eletricidade (RNT). Para o efeito, para além da revisão do procedimento de certificação e reapreciação da certificação, prevê-se o procedimento de certificação relativamente a países terceiros e da respetiva reapreciação, bem como modelos alternativos ao modelo de separação jurídica e patrimonial do operador da RNT, previstos na Diretiva n.° 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, de modo a assegurar a liberdade da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) na conclusão e decisão dos referidos procedimentos.
Para além disso, estabelecem-se mecanismos que permitem ao Estado acompanhar e supervisionar as atividades da operadora da RNT não diretamente relacionadas com o transporte de eletricidade ou com a gestão técnica do sistema, com vista a que tais atividades sejam exercidas de forma independente e em harmonia com o interesse público.
Os requisitos em matéria de separação jurídica do operador da rede de distribuição foram igualmente objeto de revisão, com o objetivo de assegurar, por essa via, a independência do referido operador face aos interesses de comercialização e produção, eliminando o risco de discriminação no acesso às redes e impedindo a troca de informações de natureza confidencial.
No que toca à comercialização, prevê-se, em articulação com as alterações realizadas ao conceito de produção em regime especial, que o comercializador de último recurso mantenha a obrigação de adquirir a eletricidade produzida em regime especial apenas enquanto esta beneficiar de tarifa ou outra remuneração garantida. A referida obrigação de aquisição cessa a partir do momento em que a eletricidade produzida pelos referidos centros eletroprodutores passe a ser remunerada a preços de mercado.
Não obstante, com vista a assegurar a aquisição de toda a energia produzida em regime especial, cria-se a figura do agregador facilitador de mercado, ao qual será atribuída, mediante licença, a obrigação de aquisição da referida energia aos produtores que o pretendam.
Por último, estabelecem-se regras que preveem uma repercussão favorável nas tarifas reguladas de práticas de consumo de eletricidade orientado para uma maior eficiência energética.»

As alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 215-A/2012 refletem assim, de algum modo, os compromissos assumidos no “Memorando de Entendimento”.

No que concerne à organização, o sistema elétrico nacional (SEN) é entendido como o conjunto de princípios, organizações, agentes e instalações elétricas relacionados com as atividades abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 29/2006 (cfr. artigos 3.º, alínea jj), e 10.º[30]).

O artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 29/2006 enuncia o objetivo e princípios gerais das atividades abrangidas pelo diploma, estabelecendo:
«Artigo 4.º

Objetivo e princípios gerais

1 – O exercício das atividades abrangidas pelo presente decreto-lei tem como objetivo fundamental contribuir para o desenvolvimento e para a coesão económica e social, assegurando, nomeadamente, a oferta de eletricidade em termos adequados às necessidades dos consumidores, quer qualitativa quer quantitativamente.
2 – O exercício das atividades abrangidas pelo presente decreto-lei deve obedecer a princípios de racionalidade e eficiência dos meios a utilizar, contribuindo para a progressiva melhoria da competitividade e eficiência do SEN, no quadro da realização do mercado interno de energia, tendo em conta a utilização racional dos recursos, a sua preservação, a manutenção do equilíbrio ambiental e a proteção dos consumidores.
3 – O exercício das atividades previstas no presente decreto-lei processa-se com observância dos princípios da concorrência, sem prejuízo do cumprimento das obrigações de serviço público.
4 – O exercício das atividades de produção e de comercialização de eletricidade processa-se em regime de livre concorrência.
5 – O exercício das atividades de transporte e de distribuição de eletricidade processa-se em regime de concessão de serviço público, em exclusivo, nos termos definidos em diploma específico.
6 – (Revogado)
7 – Nos termos do presente decreto-lei, são assegurados a todos os interessados os seguintes direitos:
a) Liberdade de acesso ou de candidatura ao exercício das atividades;
b) Não discriminação;
c) Igualdade de tratamento e de oportunidades;
d) Imparcialidade nas decisões;
e) Transparência e objetividade das regras e decisões;
f) Acesso à informação e salvaguarda da confidencialidade da informação comercial considerada sensível;
g) Liberdade de escolha do comercializador de eletricidade;
h) Direito de reclamação e ao seu tratamento eficiente.»

E, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 5.º, atinente a obrigações de serviço público, foi instituída obrigação de serviço público a proteção dos consumidores, designadamente quanto a tarifas e preços.

À proteção dos consumidores dedica-se, logo de seguida, o artigo 6.º[31], dedicando-se, ainda, aos consumidores o capítulo III.

Atentando agora na organização, a Rede Elétrica de Serviço Público (RESP) é o conjunto das instalações de serviço público destinadas ao transporte e distribuição de eletricidade que integram a Rede Nacional de Transporte de Eletricidade (RNT), a Rede Nacional de Distribuição de Eletricidade em Média e Alta Tensão (RND) e as redes de distribuição de eletricidade em baixa tensão (cfr. artigos 3.º, alíneas gg), hh) e ii) e 11.º) e que são consideradas, para todos os efeitos, de utilidade pública (artigo 12.º).

De acordo com o disposto no artigo 13.º, o serviço elétrico nacional (SEN) integra o exercício das seguintes atividades: produção de eletricidade; transporte de eletricidade; distribuição de eletricidade; comercialização de eletricidade; operação de mercados organizados de eletricidade; operação logística de mudança de comercializador de eletricidade; e outras atividades relacionadas com a prestação de serviços no âmbito do mercado integrado no SEN.

O exercício da atividade de produção de eletricidade é livre, ficando sujeito à obtenção de licença ou, nos casos previstos em legislação complementar, à realização de comunicação prévia junto das entidades administrativas competentes (artigo 15.º).

A produção de eletricidade, de acordo com o disposto no artigo 16.º, pode ser efetuada em regime ordinário ou em regime especial.

Considera-se produção de eletricidade em regime ordinário a atividade de produção que não esteja abrangida por um regime jurídico especial (cfr. n.º 1 do artigo 17.º).

E, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 17.º, incluem-se no regime ordinário:

a) Os centros eletroprodutores relativamente aos quais ainda produzam efeitos contratos de aquisição de energia celebrados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 183/95, de 27 de julho;

b) Os centros eletroprodutores que beneficiem da compensação pecuniária correspondente aos custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), prevista no Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro;

c) Os centros eletroprodutores que beneficiem de incentivos à garantia de potência pelos mesmos disponibilizada ao SEN, nos termos previstos em legislação complementar.

A atividade de transporte de eletricidade, que integra a gestão global do sistema, é exercida em regime de concessão de serviço público, em exclusivo, mediante a exploração da RNT (cfr. n.º 1 do artigo 21.º).

Relativamente à atividade de distribuição de eletricidade, nos termos do n.º 1 do artigo 31.º, é exercida em regime de concessão de serviço público, em exclusivo, mediante a exploração da RND e das redes de BT.

As concessionárias das redes de distribuição relacionam-se comercialmente com os utilizadores das respetivas instalações, tendo direito a receber pela utilização destas e pela prestação dos serviços inerentes uma retribuição por aplicação de tarifas reguladas definidas no Regulamento Tarifário (artigo 40.º).

O exercício da atividade de comercialização de eletricidade é livre, ficando sujeito a registo prévio (cfr. n.º 1 do artigo 42.º) e o exercício da atividade de comercialização de último recurso[32] e do facilitador de mercado está sujeito a licença (cfr. n.º 2 do artigo 42.º).

E, de acordo com o disposto no artigo 43.º, a atividade de comercialização de eletricidade é separada juridicamente das restantes atividades.

Os comercializadores de eletricidade relacionam-se comercialmente com os operadores das redes às quais estão ligadas as instalações dos seus clientes, assumindo a responsabilidade pelo pagamento das tarifas de uso das redes e outros serviços, bem como pela prestação das garantias contratuais legalmente estabelecidas (artigo 44.º, n.º 2) e o relacionamento comercial com os clientes decorre da celebração de um contrato de compra e venda de eletricidade, que deve observar as disposições estabelecidas no Regulamento de Relações Comerciais (artigo 44.º, n.º 3).

Sobre a atividade de comercialização de último recurso, dispõe o artigo 46.º o seguinte:
«Artigo 46.º

Exercício da atividade de comercialização de último recurso
1 – Considera-se comercializador de último recurso o comercializador que estiver sujeito a obrigações de serviço público universal, nos termos previstos na presente subsecção.
2 – A prestação de serviço público universal, implica o fornecimento de eletricidade para satisfação das necessidades dos clientes de eletricidade com fornecimentos ou entregas em BTN, nos termos da legislação aplicável, nomeadamente a relativa à proteção do consumidor.
3 – As obrigações de serviço público universal respeitam ao fornecimento de eletricidade aos clientes finais com potências contratadas iguais ou inferiores a 41,4 kVA enquanto forem aplicáveis as tarifas reguladas ou as tarifas transitórias legalmente previstas e, após a extinção destas, ao fornecimento de eletricidade para satisfação das necessidades dos clientes finais economicamente vulneráveis.
4 – O comercializador de último recurso é ainda responsável por fornecer eletricidade aos clientes cujo comercializador em regime de mercado tenha ficado impedido de exercer a atividade, bem como assegurar o fornecimento de eletricidade em locais onde não exista oferta dos comercializadores de eletricidade em regime de mercado, nos termos a definir em legislação complementar.»

No âmbito do sistema tarifário, o artigo 61.º do Decreto-Lei n.º 29/2006 elenca os princípios aplicáveis ao cálculo e à fixação de tarifas:
«Artigo 61.º

Princípios aplicáveis ao cálculo e à fixação das tarifas

1 – O cálculo e a fixação das tarifas reguladas aplicáveis às diversas atividades, considerando como tal as tarifas de uso das redes, de uso global do sistema e comercialização de último recurso, obedecem aos seguintes princípios:

a) Igualdade de tratamento e de oportunidades;
b) Uniformidade tarifária, de modo que o sistema tarifário se aplique universalmente a todos os clientes, promovendo-se a convergência dos sistemas elétricos do continente e das Regiões Autónomas;
c) Transparência na formulação e fixação das tarifas;
d) Inexistência de subsidiações cruzadas entre atividades e entre clientes, através da adequação das tarifas aos custos e da adoção do princípio da aditividade tarifária;
e) Transmissão dos sinais económicos adequados a uma utilização eficiente das redes e demais instalações do SEN;
f) Proteção dos clientes face à evolução das tarifas, assegurando, simultaneamente, o equilíbrio económico e financeiro às atividades exercidas em regime de serviço público em condições de gestão eficiente;
g) Criação de incentivos ao desempenho eficiente das atividades reguladas das empresas
h) Contibuição para a promoção da eficiência energética e da qualidade ambiental.

2 – O membro do Governo responsável pela área da energia define, mediante portaria, ouvida a ERSE, os critérios para a repercussão diferenciada dos custos decorrentes de medidas de política energética, de sustentabilidade ou de interesse económico geral nas tarifas reguladas previstas no número anterior, os quais devem estabelecer a repartição dos referidos custos, entre os diferentes níveis de tensão e tipos de fornecimento e, seguidamente, a sua afetação aos consumidores dentro de cada nível de tensão e do tipo de fornecimento, tendo em conta a potência contratada, o perfil tarifério, bem como os consumos verificados em cada período horário e sazonal, de forma a incentivar a modulação e uma maior eficiência energética do consumo.
3 – Para os efeitos do número anterior, incluem-se nos custos de interesse económico geral os montantes dos incentivos à garantia de potência, os sobrecustos da produção de eletricidade em regime especial, a diferença entre os encargos totais com a aquisição e a receita proveniente da venda da energia elétrica adquirida ao abrigo dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE) em vigor, os encargos com os custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), os custos com a remuneração dos terrenos do domínio público hídrico, com planos de promoção da eficiência no consumo, os montantes respeitantes à sustentabilidade dos mercados, os sobreproveitos decorrentes da extinção das tarifas reguladas e os sobrecustos com a convergência tarifária com as Regiões Autónomas, bem como outros previstos no Regulamento Tarifário a repercurtir na tarifa de Uso Global do Sistema.
4 – O cálculo e a fixação das tarifas e preços regulados são da competência da ERSE, entrando em vigor após a sua publicação nos termos previstos no Regulamento Tarifário.
5 – A fixação das demais tarifas e preços de venda a clientes finais não abrangidos pelo n.º 1 do presente artigo são da responsabilidade dos comercializadores de mercado, devendo na sua fixação ter em conta os princípios estabelecidos no n.º 1 naquilo que não for incompatível com a sua natureza de comercializador de mercado.»

E as regras e as metodologias para o cálculo e fixação das tarifas reguladas previstas no n.º 1 do artigo 61.º, bem como a estrutura tarifária, são segundo o n.º 1 do artigo 62.º, estabelecidas no Regulamento Tarifário.

No desenvolvimento dos princípios gerais relativos à organização e ao funcionamento do sistema elétrico nacional, o Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto[33], veio regulamentar o regime jurídico aplicável ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade.

E, logo, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 172/2006, frisa-se que, «[d]ada a sua natureza, os comercializadores de último recurso ficam sujeitos a obrigações especiais, considerando o serviço universal a prestar e a defesa dos consumidores».

Nos termos do n.º 8 do artigo 53.º, «[o] comercializador de último recurso está sujeito à regulação da ERSE, nos termos do Regulamento de Relações Comerciais, do Regulamento da Qualidade de Serviço, do Regulamento Tarifário, do Regulamento de Acesso às Redes e às Interligações e da demais regulamentação aplicável».

A ERSE fixa, no princípio de cada ano, os custos estimados para a aquisição de eletricidade a aplicar na definição das tarifas do comercializador de último recurso (n.º 4 do artigo 55.º).

E o Regulamento Tarifário estabelece os critérios e os métodos para a formulação de tarifas, designadamente as de acesso às redes e às interligações e aos serviços de sistema, bem como as tarifas de venda de eletricidade do comercializador de último recurso, segundo os princípios definidos no Decreto-Lei n.º 29/2006 (cfr. n.º 1 do artigo 66.º).

Assim, afigura-se, ainda, pertinente lançar um olhar pelo normativo relativo a tarifas e preços, o que se fará de seguida.


V


No setor elétrico, a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) aprovou, em 2014, novo Regulamento Tarifário – Regulamento n.º 551/2014[34] – e bem assim novo Regulamento de Relações Comerciais – Regulamento de Relações Comerciais – Regulamento n.º 561/2014[35].


1. O Regulamento Tarifário (novo), como se retira do respetivo preâmbulo, resultou da necessidade de promover uma revisão regulamentar tendo em conta a liberalização dos mercados de energia, bem como o seu contínuo aprofundamento e integração, e o novo enquadramento normativo em vigor.

E, de acordo com o definido no seu artigo 1.º, o Regulamento Tarifário «estabelece as disposições aplicáveis aos critérios e métodos para a formulação de tarifas e preços de energia elétrica a prestar pelas entidades por ele abrangidas, à definição das tarifas reguladas e respetiva estrutura, ao processo de cálculo e determinação das tarifas, à determinação dos proveitos permitidos, aos procedimentos a adotar para a fixação das tarifas, sua alteração e publicitação, bem como, às obrigações das entidades do setor elétrico, nomeadamente, em matéria de prestação de informação».

Entre as tarifas abrangidas pelo Regulamento estão justamente as tarifas a aplicar nos fornecimentos dos comercializadores de último recurso aos clientes finais [cfr. artigo 2º, n.º 1, alínea a), iii)].

O elenco das tarifas definidas no Regulamento é apresentado no artigo 18.º:
«Artigo 18.º

Definição das Tarifas

O presente Regulamento define as seguintes tarifas:

a) Tarifas de Acesso às Redes.
b) Tarifa Social de Acesso às Redes.
c) Tarifas transitórias de Venda a Clientes Finais dos Comercializadores de Último Recurso.
d) Tarifa Social de Venda a Clientes Finais dos Comercializadores de Último Recurso.
e) Tarifas de Venda a Clientes Finais da RAA.
f) Tarifas de Venda a Clientes Finais da RAM.
g) Tarifa de Energia.
h) Tarifas de Uso Global do Sistema.
i) Tarifas de Uso da Rede de Transporte:
i) Tarifa de Uso da Rede de Transporte a aplicar aos produtores.
ii) Tarifa de Uso da Rede de Transporte em MAT.
iii) Tarifa de Uso da Rede de Transporte em AT.
j) Tarifa de Venda do Operador da Rede de Transporte.
k) Tarifas de Uso da Rede de Distribuição:
i) Tarifa de Uso da Rede de Distribuição em AT.
ii) Tarifa de Uso da Rede de Distribuição em MT.
iii) Tarifa de Uso da Rede de Distribuição em BT.
l) Tarifas de Comercialização:
i) Tarifa de Comercialização em AT e MT.
ii) Tarifa de Comercialização em BTE.
iii) Tarifa de Comercialização em BTN.»

E, no que respeita a tarifas e proveitos, o artigo 20.º estabelece:
«Artigo 20.º

Tarifas e proveitos

1 – As tarifas previstas no presente capítulo nos termos do Quadro 1 e do Quadro 2 são estabelecidas por forma a proporcionarem os proveitos definidos no Capítulo IV.
2 – A tarifa de Uso Global do Sistema a aplicar pelo operador da rede de transporte ao operador da rede de distribuição em MT e AT deve proporcionar os proveitos permitidos da atividade de Compra e Venda de Energia Elétrica do Agente Comercial e da atividade de Gestão Global do Sistema do operador da rede de transporte.
3 – A tarifa de Uso da Rede de Transporte a aplicar pelo operador da rede de transporte aos produtores em regime ordinário e aos produtores em regime especial pela entrada na RNT e na RND deve proporcionar uma parcela dos proveitos permitidos da atividade de Transporte de Energia Elétrica.
4 – As tarifas de Uso da Rede de Transporte em MAT e de Uso da Rede de Transporte em AT a aplicar pelo operador da rede de transporte ao operador da rede de distribuição em MT e AT devem proporcionar a restante parcela dos proveitos permitidos da atividade de Transporte de Energia Elétrica.
5 – As tarifas de Uso da Rede de Distribuição em AT, de Uso da Rede de Distribuição em MT e de Uso da Rede de Distribuição em BT a aplicar às entregas dos operadores das redes de distribuição devem proporcionar os proveitos permitidos da atividade de Distribuição de Energia Elétrica.
6 – As tarifas de Uso da Rede de Distribuição são aplicadas às entregas do nível de tensão em que é efetuada a entrega e dos níveis de tensão inferiores.
7 – As tarifas de Comercialização em AT e MT, de Comercialização em BTE e de Comercialização em BTN a aplicar pelos comercializadores de último recurso aos fornecimentos a clientes devem proporcionar os proveitos a recuperar na atividade de Comercialização.
8 – A tarifa de Uso Global do Sistema a aplicar às entregas dos operadores das redes de distribuição deve proporcionar os proveitos a recuperar pelos operadores das redes de distribuição relativos à gestão global do sistema, à compra e venda de energia elétrica do agente comercial, ao diferencial de custo com a aquisição de energia elétrica a produtores em regime especial, aos custos para a manutenção do equilíbrio contratual e aos défices tarifários, entre outros.
9 – As tarifas de Uso da Rede de Transporte em MAT e de Uso da Rede de Transporte em AT a aplicar às entregas dos operadores das redes de distribuição devem proporcionar os proveitos a recuperar pelos operadores das redes de distribuição relativos ao transporte de energia elétrica.
10 – Os proveitos a recuperar pelos operadores das redes de distribuição definidos nos n.os 8 – e 9 – coincidem com os proveitos permitidos da atividade de Compra e Venda do Acesso à Rede de Transporte.
11 – A tarifa de Energia, a aplicar pelos comercializadores de último recurso aos forencimentos a clientes, deve recuperar os custos com a função de Compra e Venda de Energia Elétrica para fornecimento dos clientes.
12 – Os comercializadores de último recurso aplicam aos fornecimentos a clientes as tarifas referidas nos n.os 5 –,8 – e 9 –, que lhes permitem recuperar os proveitos permitidos da atividade de Compra e Venda do Acesso às Redes de Transporte e Distribuição.
13 – As tarifas transitórias de Venda a Clientes Finais aplicam-se aos clientes dos comercializadores de último recurso e resultam da adição das tarifas referidas nos n.os 5 –, 7 –, 8 –, 9 – e 11 –, acrescidas de um fator de atualização, nos termos do Artigo 21.º.
14 – As tarifas de Acesso às Redes aplicam-se às entregas dos operadores das redes de distribuição e resultam da adição das tarifas referidas nos n.os 5 –, 8 – e 9 –, nos termos do Artigo 22.º.
15 – Os preços das tarifas estabelecidas no presente Regulamento são definidos anualmente.
16 – As tarifas transitórias de Venda a Clientes Finais, referidas no n.º 13 -, podem ser revistas nos termos da legislação aplicável».

Relativamente à tarifa de Uso Global do Sistema, a aplicar às entregas dos operadores das redes de distribuição, deve proporcionar os proveitos a recuperar pelos operadores das redes de distribuição, relativos à Compra e Venda de Energia Elétrica do agente comercial, à Gestão Global do Sistema, ao diferencial de custo com a aquisição de energia elétrica a produtores em regime especial, aos custos para a manutenção do equilíbrio contratual e aos défices tarifários, entre outros (cfr. n.º 2 do artigo 65.º).

E a tarifa de Uso Global do Sistema é composta por duas parcelas: A parcela I permite recuperar os custos de gestão do sistema; A parcela II permite recuperar os custos decorrentes de medidas de política energética, ambiental ou de interesse económico geral e os custos para a manutenção do equilíbrio contratual dos produtores com CAE (cfr. n.º 1 do artigo 66.º).


2. Por sua vez, o Regulamento de Relações Comerciais tem por objeto estabelecer as disposições relativas às relações comerciais entre os vários sujeitos intervenientes no Sistema Elétrico Nacional, bem como as condições comerciais para ligação às redes públicas (cfr. n.º 1 do artigo 1.º).

Sobre a atividade de gestão global do sistema, dispõe o artigo 34.º:
«Artigo 34.º

Gestão Global do Sistema

1 – A atividade de Gestão Global do Sistema deve assegurar, nomeadamente:

a) A coordenação sistémica das infraestruturas que constituem o SEN por forma a assegurar o seu funcionamento integrado e harmonizado e a segurança e a continuidade de abastecimento de energia elétrica.
b) A gestão dos serviços de sistema através da operacionalização de um mercado de serviços de sistema e a contratação de serviços de sistema mediante aprovação prévia da ERSE.
c) A gestão do mecanismo de garantia de potência, nos termos dispostos na legislação em vigor.
d) A gestão do mecanismo de comunicação de contratação bilateral, nos termos do Capítulo VIII.
e) As liquidações financeiras associadas às transações efetuadas no âmbito desta atividade, incluindo a liquidação dos desvios.
f) A receção da informação dos agentes de mercado que sejam membros de mercados organizados ou que se tenham constituído como contraentes em contratos bilaterais, relativamente aos factos suscetíveis de influenciar o regular funcionamento do mercado ou a formação dos preços, nos termos previstos no Capítulo VIII do presente regulamento.

2 – As atribuições referidas na alínea a) do número anterior incluem:

a) A coordenação do funcionamento da rede de transporte, inclindo a gestão das interligações em MAT e dos pontos de entrega de energia elétrica ao operador da rede de distribuição em MT e AT e a clientes ligados diretamente à rede de transporte, observando os níveis de segurança e de qualidade de serviço estabelecidos.
b) A verificação técnica da operação do sistema elétrico, tendo em conta os programas de produção e de consumo dos vários agentes de mercado.
c) A coordenação das indisponibilidades da rede de transporte e dos centros electroprodutores.
d) A gestão das interligações, nomeadamente a determinação da capacidade disponível para fins comerciais e resolução de congestionamentos, nos termos do disposto no RARI.
e) Disponibilização de previsões de consumo aos agentes de mercado, nos termos estabelecidos no Artigo 35.º.

3 – As atribuições referidas na alínea b) do n.º 1 incluem:

a) A identificação das necessidades de serviços de sistema, nos termos previstos no Regulamento de Operação das Redes.
b) A operacionalização de um mercado de serviços de sistema para a regulação secundária, reserva de regulação e resolução de restrições técnicas.
c) A gestão de contratos de fornecimento de serviços de sistema que tenham sido contratados bilateralmente com agentes de mercado, de acordo com regras objetivas, transparentes e não discriminatórias que promovam a eficiência económica.

4 – O exercício da atividade de Gestão Global do Sistema obedece ao disposto no presente regulamento, no Regulamento de Operação das Redes e no Manual de Procedimentos da Gestão Global do Sistema.»

E no que concerne a tarifas a aplicar pelos comercializadores de último recurso, o artigo 123.º estabelece:
«Artigo 123.º

Tarifas a aplicar pelos comercializadores de último recurso

1 – Aos fornecimentos dos comercializadores de último recurso aos seus clientes em BTN são aplicadas as tarifas de Venda a Clientes Finais, estabelecidas nos termos do RT.
2 – As tarifas aplicáveis aos clientes em BTN são compostas pelos preços relativos a:

a) Potência contratada.
b) Energia ativa.

3 – Os preços das tarifas de Venda a Clientes Finais resultam da soma dos preços das tarifas aplicadas a seguir indicadas:

a) Tarifa de Energia.
b) Tarifa de Uso Global do Sistema.
c) Tarifa de Uso da Rede de Transporte.
d) Tarifas de Uso da Rede de Distribuição.
e) Tarifa de Comercialização.»


VI


Na economia do presente parecer, interessa abordar os contratos de aquisição de energia[36].


1. Os contratos de aquisição de energia (CAE) enquadram-se no modelo de organização do Sistema Elétrico Nacional (SEN) regulado pelo Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho – atrás citado e revogado pelo Decreto-Lei n.º 29/2006 já analisado –, e inserem-se coerentemente no regime de vinculação então instituído.

Esse diploma, que estabeleceu as bases da organização do Sistema Elétrico Nacional ( SEN ), consagrou um modelo de organização do SEN caracterizado pela coexistência de um sistema elétrico de serviço público (SEP) e de um sistema elétrico independente ( SEI ) – artigo 3.º.

De acordo com o disposto no seu artigo 7.º, o objetivo do SEP era o de «assegurar em todo o território continental a satisfação das necessidades dos consumidores de energia elétrica, em regime de serviço público», compreendendo a Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica ( RNT ), explorada em regime de concessão de serviço público, e o conjunto de instalações de produção e redes de distribuição, explorado mediante um regime de licença vinculada (artigo 8.º).

As entidades que constituíam o SEP encontravam-se enumeradas no artigo 9.º[37]: (a) os titulares de licenças vinculadas de produção; (b) a entidade concessionária da RNT ; (c) os titulares de licenças vinculadas de distribuição.

Conforme definição contida no artigo 4.º, alínea d), do mesmo diploma, a licença vinculada era a «licença mediante a qual o titular assume o compromisso de alimentar o SEP ou ser por ele alimentado, dentro das regras de funcionamento daquele Sistema»[38].

Nos termos do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 182/95, os produtores vinculados eram «as entidades titulares de licenças vinculadas de produção de energia elétrica», regulando o artigo 14.º o processo de consulta para o estabelecimento e exploração de novos centros electroprodutores.

Em conformidade com o disposto no n.º 8 deste preceito[39], «[a] integração de cada novo centro electroprodutor no SEP concretiza-se mediante a celebração de um novo contrato de vinculação entre a entidade concessionária da RNT e a entidade selecionada para o estabelecer e explorar…».

Para efeitos do diploma em análise, o contrato de vinculação é definido como o «contrato de longo prazo mediante o qual, dentro das regras de funcionamento do SEP, um produtor assume o compromisso de entregar ao SEP toda a energia elétrica por si produzida ou um distribuidor assume o compromisso de proceder à distribuição, dentro do âmbito do SEP, da energia elétrica que recebe deste» – artigo 4.º alínea c).


2. Os traços essenciais dos CAE estão definidos no artigo 15.º deste diploma, preceito cujo teor interessa conhecer:
«Artigo 15.º

Relacionamento comercial dos produtores vinculados
1 – Os produtores vinculados relacionam-se comercialmente com a entidade concessionária da RNT através dos contratos de vinculação referidos no artigo anterior.
2 – A cada centro electroprodutor corresponde um contrato de vinculação.
3 – Os contratos de vinculação têm uma duração não inferior a 15 anos, exceto em casos devidamente justificados.
4 – Através dos contratos de vinculação, os produtores vinculados comprometem-se a abastecer o SEP, em exclusivo, nos termos da legislação aplicável.
5 – A remuneração da energia elétrica entregue ao SEP resulta da aplicação de um sistema misto baseado em preços de natureza essencialmente fixa e em preços variáveis, refletindo, respetivamente, encargos de potência e encargos variáveis de produção de energia.»

Como se retira do preceito reproduzido, os CAE caracterizam-se por serem contratos de longo prazo através dos quais os produtores vinculados ao serviço público da energia se comprometiam a abastecer, em exclusivo, a entidade concessionária da rede nacional de transporte, vendendo-lhe toda a energia produzida no centro electroprodutor[40].

No âmbito destes contratos, estabelece-se uma relação entre a entidade concessionária da rede nacional de transporte de energia elétrica ( RNT ), concessão atribuída, como já ficou dito, à REN – Rede Elétrica Nacional, S.A., como compradora, e cada produtor vinculado de energia, como vendedor, nos termos da qual este se compromete a vender àquela entidade a capacidade total da instalação produtora de acordo com as condições técnicas e comerciais ajustadas.

Nesses contratos são reconhecidos tanto os proveitos expectáveis dos produtores como as compensações a que as partes têm direito em caso de incumprimento, alteração ou rescisão por motivos que não lhes sejam imputáveis[41].

De acordo com o disposto no n.º 5 do preceito acima transcrito, os CAE remuneram os custos ou encargos fixos (encargos de potência) dos centros electroprodutores que englobam o investimento inicial, bem como as despesas com as operações de manutenção, permitindo ainda recuperar os custos ou encargos variáveis de produção de energia elétrica pelo empreendimento (custos dos serviços de sistema)[42].

Os CAE , vinculações de longo prazo, baseiam-se, pois, nas condições previamente acordadas entre as partes e não nas condições decorrentes de um mercado livre e concorrencial.


3. De entre as orientações de política energética aprovadas pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003[43], foi adotada a necessidade de liberalizar o mercado com eficiência, através, designadamente, da concretização do mercado ibérico de eletricidade (MIBEL) e da promoção da concorrência e da abertura dos setores de eletricidade e gás natural.

A extinção dos contratos de aquisição de eletricidade ( CAE ) é uma das medidas que aí se apresenta como «imprescindível para que exista um verdadeiro mercado de eletricidade». Como ali se refere, «[é] necessário que haja colocação de energia nesse mercado [de eletricidade]. Desta forma, a REN deixará o seu “estatuto” de comprador quase único da eletricidade produzida, para que as empresas de produção a possam colocar no mercado».

De um modelo em que a produção de energia elétrica assentava na existência de contratos de aquisição de longo prazo ( CAE ), firmados entre cada centro electroprodutor e um comprador único que assegurava o aprovisionamento de energia para fornecimento à generalidade dos consumidores finais, passou-se à liberalização, quer ao nível da escolha de fornecedor, quer por via da abertura da atividade de produção à concorrência[44].

Houve necessidade de se se criar um «mecanismo que, tendo presente o respeito por condições contratualmente estabelecidas e que não poderiam ser ignoradas, permite efetuar a cessação dos CAE mantendo o equilíbrio contratual subjacente a esses contratos»[45].

Na mencionada Resolução faz-se notar, todavia, que «esses contratos entre os produtores vinculados e a REN oferecem garantias aos agentes da produção que deverão ser acautelados no mecanismo de recuperação de custos de transição para a concorrência» a definir, salvaguardando-se «a neutralidade económica para as partes contratantes dos CAE , sem introduzir vícios à livre formação de preços no mercado».

Efetivamente, se, em termos gerais, a transição para um sistema de concorrência é benéfica, desde logo, para os consumidores e para os agentes económicos que podem passar a atuar em setores anteriormente vedados, o mesmo não sucede relativamente às empresas que atuavam nos setores vedados e que não sofriam, por isso, qualquer concorrência. E que tiveram de passar a atuar em mecanismos de oferta em mercados organizados.

Essa transição para sistemas concorrenciais ocasiona geralmente, como assinala Nuno de Oliveira Garcia, os designados Competition Transaction Charge, expressão que pode ser traduzida como “Custos de Transição para a Concorrência” que são os que «decorrem da necessidade de assegurar às empresas que atuam em determinado setor o direito à recuperação dos investimentos realizados, que se encontravam devidamente acautelados no modelo monopolista»[46].

No âmbito da liberalização do setor elétrico, os custos de transição para a concorrência, podendo encontrar também fundamento no princípio da proteção da confiança legítima, decorrem, essencialmente, da «necessidade de permitir às empresas do setor que utilizem meios necessários à recuperação de investimentos realizados cuja amortização era expectável segundo as regras em vigor num determinado período, as quais, porém, vieram a ser alteradas posteriormente pelo legislador»[47].


4. A orientação política consignada na mencionada Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003 foi consagrada no Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de agosto[48], que veio a estabelecer disposições aplicáveis à cessação dos contratos de aquisição de energia elétrica celebrados entre a entidade concessionária da RNT e os produtores vinculados, dispondo o seu artigo 13.º que:
«Artigo 13.º

Custos para a manutenção do equilíbrio contratual
1 – Os contratos de aquisição de energia ( CAE ) elétrica celebrados entre a entidade concessionária da RNT e os produtores vinculados são objeto de cessação.
2 – A cessação dos contratos vinculados a que se refere o número anterior implica a adoção de medidas indemnizatórias, tendo em vista o ressarcimento dos direitos dos produtores através de um mecanismo destinado a manter o equilíbrio contratual subjacente, designado por custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC).
3 – Os CMEC deverão garantir a compensação dos investimentos realizados e a cobertura dos compromissos nos CAE que não sejam garantidos pelas receitas expectáveis em regime de mercado.
4 – As condições da cessação e os critérios de valorização dos CMEC, incluindo as formas de pagamento, os ajustamentos a aplicar e a sua repercussão nas tarifas, bem como os efeitos de falta de pagamento aos produtores abrangidos, são objeto de diploma específico.»


5. O Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro[49], em execução do disposto no artigo 13.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 185/2003, e editado no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 52/2004, de 29 de outubro, contempla as disposições aplicáveis à cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia ( CAE ) celebrados ao abrigo do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 182/95 entre a entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica ( RNT ) e as entidades titulares de licenças vinculadas de produção de energia elétrica que abastecem o Sistema Elétrico de Serviço Público (SEP) – produtores.

O diploma é constituído por quatro capítulos com as seguintes epígrafes:

– Capítulo I – Custos para a manutenção do equilíbrio contratual (artigos 1.º a 8.º);
– Capítulo II – Procedimento para a cessação antecipada dos CAE (artigos 9.º e 10.º);
– Capítulo III – Mecanismos de revisibilidade (artigos 11.º a 13.º);
– Capítulo IV – Disposições finais (artigos 14.º a 17.º).

Como se prevê no n.º 2 do seu artigo 1.º, o diploma «procede à atribuição, a um dos contraentes dos CAE , do direito a uma compensação em virtude da cessação antecipada destes contratos, à definição da metodologia de determinação do respetivo montante, das formas e momento do seu pagamento, dos efeitos de eventuais faltas de pagamento, da sua repercussão nas tarifas elétricas e ao estabelecimento das regras especiais aplicáveis à possível titularização dos direitos respeitantes ao seu recebimento».

O artigo 2.º deste Decreto-Lei n.º 240/2004 determina a cessação antecipada dos CAE celebrados entre as entidades acima referidas, prevendo no seu n.º 2 a atribuição do direito a uma compensação, designada por custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), nos seguintes termos:
«Artigo 2.º

Cessação dos CAE e atribuição do direito a compensação
1 – Os CAE celebrados entre a entidade concessionária da RNT e os produtores são objeto de cessação antecipada nos termos previstos no presente diploma, a qual apenas produz efeitos após a verificação das circunstâncias previstas nos n.os 2 e 3 do artigo 9.º, no n.º 4 do artigo 10.º e no artigo 14.º, e em conformidade com os termos e condições previstos no respetivo acordo de cessação que venha a ser celebrado nos termos estabelecidos nos artigos 9.º e 10.º
2 – A cessação de cada CAE confere a um dos seus contraentes, entidade concessionária da RNT ou produtor, o direito a receber, a partir da data da respetiva cessação antecipada, uma compensação pecuniária, designada por custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), destinada a garantir a manutenção do equilíbrio contratual entre as partes contraentes, subjacente ao respetivo CAE , e a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados por esse contrato que não sejam adequadamente assegurados através das receitas expectáveis em regime de mercado.
……………………………………………………………………………………………………………...»

A cessação antecipada dos CAE determina a atribuição a um dos seus titulares (produtor ou entidade concessionária da RNT ) do direito ao recebimento de compensações pela cessação antecipada de tais contratos as quais têm o intuito de garantir a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados pelos contratos anteriores, que não estejam devidamente garantidos através das receitas esperadas em regime de mercado.

Como se explicita na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 141/IX[50], a introdução de um novo modelo de funcionamento do setor elétrico, liberalizado e concorrencial, implicando a extinção da relação comercial exclusiva dos centros electroprodutores com a entidade concessionária da RNT , determinou a criação de medidas compensatórias, visando «o ressarcimento dos direitos de um dos contraentes dos CAE , através de compensações (…) que assegurem a apropriada equivalência económica relativamente à posição de cada parte no CAE ».

Na apresentação da proposta de lei já referenciada, o Secretário de Estado do Desenvolvimento Económico enunciou os aspetos essenciais do funcionamento dos CMEC em termos que agora se reproduzem, com vista à melhor compreensão do sistema instituído. Afirmou-se então:

«Ao extinguir os CAE os produtores deixarão de receber o valor implícito no contrato que inclui, por exemplo, custos fixos e variáveis de operação e manutenção, os custos de investimento ou pagamentos por disponibilidade da central. Mas ao operar em regime de mercado, os produtores recebem receitas provenientes da venda de energia.
Assim, a compensação a atribuir aos produtores é tão somente a diferença entre a garantia de valor que estes teriam com os CAE e as receitas obtidas em mercado. Se o valor recuperado em mercado for inferior ao valor implícito no CAE , a compensação ou Custo de Manutenção do Equilíbrio contratual – CMEC, a pagar aos produtores será positiva e deverá ser levada à tarifa de usos globais do sistema para pagamento por todos os consumidores. Ou seja, as compensações são apenas no montante do valor do CAE que os produtores não conseguem recuperar através do mercado, repondo o equilíbrio contratual.
Naturalmente, se os produtores obtiverem no mercado receitas acima do valor do CAE terão de devolver esse adicional ao sistema, repercutindo-se numa redução das tarifas de todos os consumidores».

O procedimento para a cessação antecipada dos CAE está regulado no artigo 9.º deste diploma. De acordo com o disposto no seu n.º 1, a entidade concessionária da RNT e os produtores celebram um acordo de cessação para cada centro electroprodutor térmico ou para cada conjunto de centros electroprodutores pertencentes à mesma unidade de produção hídrica, conforme aplicável.

Nos termos do n.º 2, os acordos de cessação antecipada dos CAE ficam sujeitos a aprovação por despacho do membro do Governo responsável pela área de energia, a publicar no Diário da República, mediante requerimento a apresentar pelas respetivas partes.

O artigo 10.º, n.º 1, elenca os elementos que os acordos de cessação antecipada dos CAE devem conter:

a) A concretização dos direitos e os deveres que para as partes resultam do presente diploma;

b) O montante das compensações devidas à entidade concessionária da RNT ou ao produtor, calculado nos termos previstos no presente diploma, bem como os parâmetros utilizados no respetivo cálculo;

c) O montante máximo de compensações devidas pela cessação antecipada de cada CAE , de acordo com o disposto no artigo 13.º;

d) As condições dos ajustamentos anuais e do ajustamento final dos montantes das compensações constantes dos n.os 6 e 7 do artigo 3.º e do artigo 11.º;

e) Os termos e condições de pagamento das compensações nos termos definidos no presente diploma, bem como a previsão que o direito conferido aos produtores, nos termos do n.º 1 do artigo 5.º, possa ser cedido para efeitos de titularização;

f) A sujeição a arbitragem dos litígios que se suscitem entre as partes do acordo de cessação em relação à interpretação ou execução do disposto no presente diploma.

O artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004 trata, pois, da determinação do montante das compensações devidas a cada centro electroprodutor ou à entidade concessionária da RNT pela cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia (CMEC) e dos respetivos ajustamentos, dispondo que:
«Artigo 3.º

Determinação do montante dos CMEC e dos respetivos ajustamentos
1 – O montante bruto da compensação determinado para cada centro electroprodutor pela cessação antecipada do respetivo CAE corresponde à diferença entre o valor do CAE , calculado à data da sua cessação antecipada de acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º, e as receitas expectáveis em regime de mercado, deduzidas dos correspondentes encargos variáveis de exploração, uns e outros reportados àquela mesma data.
2 – O montante compensatório afeto a cada centro electroprodutor deve ser calculado de acordo com os n.os 1 e 2 do artigo 1.º do anexo I do presente diploma, do qual faz parte integrante, tendo em consideração a especificidade do respetivo CAE e dos meios de produção envolvidos.
3 – O cálculo efetuado nos termos dos números anteriores pode conduzir à determinação de montantes devidos aos produtores, sendo estes, em tal caso, designados por CMEC positivos, ou à determinação de montantes devidos pelos produtores à entidade concessionária da RNT , caso em que são designados por CMEC negativos.
4 – O montante global bruto dos CMEC respeitantes ao conjunto dos CAE afetos a cada produtor é calculado nos termos do n.º 4 do artigo 1.º do anexo I do presente diploma, havendo sempre lugar à realização de compensação entre os montantes dos CMEC positivos e negativos determinados em relação a cada CAE , na data da respetiva cessação antecipada.
5 – Os montantes dos CMEC, determinados nos termos do presente diploma, são suscetíveis de ajustamentos anuais e de um ajustamento final, de forma a assegurar a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados pelos CAE .
6 – Os ajustamentos anuais aos montantes dos CMEC são efetuados nos termos previstos nos n.os 1 a 11 do artigo 11.º, com observância das seguintes regras:

a) Os ajustamentos devem respeitar a formulação constante dos artigos 4.º a 6.º do anexo I do presente diploma;
b) Para efeitos da alínea anterior, a produção de energia elétrica a considerar deve ser determinada com base no modelo VALORÁGUA, de acordo com o anexo IV do presente diploma, do qual faz parte integrante;
c) Os ajustamentos podem conduzir à determinação de montantes devidos aos produtores, sendo estes, em tal caso, designados por ajustamentos positivos, ou à determinação de montantes devidos pelo produtor à entidade concessionária da RNT , caso em que são designados por ajustamentos negativos;
d) Os ajustamentos são efetuados durante um prazo correspondente ao período de atividade de cada centro electroprodutor previsto no respetivo CAE ou ao período de atividade decorrido até à data de desclassificação antecipada do centro electroprodutor nos termos da alínea seguinte, consoante a situação que ocorra em primeiro lugar e tendo como limite um período de 10 anos após a data de cessação antecipada do CAE ;
e) A desclassificação antecipada do centro electroprodutor referida na alínea anterior carece de autorização prévia da DGGE, ouvida a ERSE e a entidade concessionária da RNT .

7 – Quando, nos termos do CAE aplicável, o termo do período de atividade do centro electroprodutor nele estabelecido ultrapasse um período correspondente aos 10 anos posteriores à cessação antecipada desse contrato, sendo esse intervalo temporal adiante designado «período II», o montante dos CMEC remanescentes é objeto de um ajustamento final sem efeitos retroativos, com observância das seguintes regras:

a) O valor do ajustamento final é determinado em função da diferença verificada entre o montante da compensação relativa ao período II, calculado à data da cessação antecipada do respetivo CAE , e o valor da compensação relativa ao mesmo período, calculado no final do 10.º ano subsequente à data da cessação desse contrato;
b) Para efeitos da alínea anterior, o valor da compensação calculado no final do 10.º ano deve ser determinado mediante a utilização da metodologia de cálculo prevista na alínea seguinte;
c) O cálculo do valor do ajustamento final é efetuado nos termos do n.º 12 do artigo 11.º, com base na formulação constante dos artigos 7.º e 8.º do anexo I do presente diploma, aplicando-se também, com as devidas adaptações, o regime previsto nas alíneas b) e c) do número anterior.»


6. A regra básica aplicável na determinação do montante dos CMEC está enunciada no n.º 1 do preceito transcrito. O montante bruto da compensação determinado para cada centro electroprodutor pela cessação antecipada do respetivo CAE corresponde à diferença entre o valor do CAE , calculado à data da sua cessação antecipada de acordo com as disposições nele prescritas e tendo em consideração um conjunto de parâmetros tipificados na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º do mesmo diploma, e as receitas expectáveis em regime de mercado, deduzidas dos correspondentes encargos variáveis de exploração, uns e outros reportados àquela mesma data, ou seja, à data da cessação antecipada do CAE .

Os parâmetros a considerar são, para todos os centros electroprodutores, os que se contemplam nas subalíneas i) e ii) da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º do seguinte teor:
«Artigo 4.º

Parâmetros e metodologia de cálculo dos CMEC
1 – Os parâmetros de base a utilizar no cálculo dos CMEC devidos às partes contraentes dos CAE pela cessação antecipada destes contratos, no âmbito das disposições estabelecidas no artigo 3.º e do procedimento previsto no artigo 9.º, são definidos, para cada centro electroprodutor, nos termos seguintes:

a) Valor do CAE , reportado à data prevista para a sua cessação antecipada, calculado de acordo com as disposições nele prescritas, que tem em consideração o seguinte:

i) Para todos os centros electroprodutores, o valor do CAE inclui a amortização e remuneração implícita ou explícita no CAE do ativo líquido inicial e do investimento adicional, conforme definidos no respetivo contrato, devidamente autorizados e contabilizados;

ii) Para todos os centros electroprodutores, o valor do CAE inclui ainda os encargos fixos de exploração, nomeadamente os encargos fixos de operação e manutenção correntes e a remuneração do stock de combustível e outros que se encontrem explicitamente definidos no CAE ».

A subalínea seguinte reporta-se ao caso específico dos centros electroprodutores do Pego e de Sines. O valor do CAE respetivo deve ainda incluir a remuneração e amortização dos investimentos, devidamente autorizados pela DGGE, ouvida a ERSE, relativos ao cumprimento dos limites de emissão respeitantes às grandes instalações de combustão estabelecidos na Diretiva n.º 2001/80/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro.

A avaliação que servirá de cálculo dos CMEC reporta-se, como resulta das normas transcritas, a um momento temporal determinado: data da cessação antecipada de cada CAE . Será com referência a essa data que se determina o valor dos contratos, o montante das receitas expectáveis e o valor dos encargos variáveis de exploração.

Interessa sublinhar que, de acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º, o valor do CAE deverá ser calculado tendo em atenção as respetivas disposições contratuais, aquilo que aí ficou convencionado.

Do cálculo do montante dos CMEC podem resultar valores compensatórios a favor dos produtores ou montantes devidos por estes à entidade concessionária da RNT . Na primeira situação, estaremos perante CMEC positivos. No segundo caso, estaremos perante CMEC negativos. (artigo 3.º, n.º 3).


7. Os parâmetros previstos para a determinação dos montantes dos CMEC são aqueles que, como já se disse, vigoram na data da cessação antecipada do CAE . Tais parâmetros são, todavia, projetados para o futuro, o que introduz no seu apuramento um importante elemento de imprevisibilidade, quer no que respeita às receitas expectáveis, quer no que respeita aos encargos variáveis futuros, quer ainda no que diz respeito ao próprio valor dos CAE , decorrentes, nomeadamente, da eventual alteração das condições de exploração dos centros electroprodutores que foram consideradas à data da cessação.

Daí que se preveja no artigo 3.º, n.º 5, um mecanismo de revisibilidade das compensações, estabelecendo-se no artigo 11.º as condições em que ele se processa.

Assim, de acordo com o citado artigo 3.º, n.º 5, os CMEC são suscetíveis de ajustamentos anuais e de um ajustamento final, por forma a assegurar a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados pelos CAE .

Os ajustamentos anuais são efetuados durante o prazo correspondente ao período de atividade de cada centro electroprodutor previsto no respetivo CAE , com o limite de dez anos após a data da cessação antecipada do CAE .

Os valores dos ajustamentos são efetuados com observância das regras definidas no n.º 6 do artigo 3.º e com base nos critérios constantes dos artigos 4.º a 6.º do anexo I[51].

Tal como sucede com o cálculo do montante bruto da compensação determinado para cada centro electroprodutor pela cessação antecipada do CAE , também os ajustamentos anuais podem conduzir à determinação de montantes devidos aos produtores – ajustamentos positivos –, ou à determinação de montantes devidos pelo produtor à entidade concessionária da RNT – ajustamentos negativos.

Por sua vez, o ajustamento final opera quando o termo do período de atividade do centro electroprodutor com CAE ultrapasse um período correspondente aos dez anos posteriores à cessação antecipada desse contrato e o seu valor é determinado com base nos parâmetros e critérios enunciados no n.º 7 do artigo 3.º[52].

O artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 240/2004 regula o mecanismo de repercussão dos CMEC nas tarifas.

Após se reconhecer ao produtor o direito a receber o montante correspondente ao valor dos CMEC positivos e dos ajustamentos anuais e do ajustamento final positivos, bem como o montante correspondente ao valor dos outros encargos identificados nos n.os 4 e 5 do mesmo preceito, o n.º 2 estabelece que esses montantes são repercutidos pela totalidade dos consumidores de energia elétrica no território nacional, constituindo encargos respeitantes ao uso global do sistema a incorporar como componentes permanentes da tarifa UGS .

No caso de a cessação dos CAE relativos a um produtor conferir à entidade concessionária da RNT o direito a compensações correspondentes a CMEC negativos ou a ajustamentos anuais ou ajustamento final negativos, os respetivos montantes pagos por cada produtor devem ser repercutidos para posterior redução da tarifa UGS , de forma a garantir uma repartição equitativa entre todos os consumidores do sistema elétrico (n.º 3).


8. Como se referiu, a produção de energia elétrica em Portugal assentou na existência de contratos de aquisição de energia de longo prazo ( CAE ), celebrados, numa relação de exclusividade, entre cada centro electroprodutor e a entidade concessionária da RNT . A liberalização verificada no setor elétrico, quer pela via da escolha do comercializador, quer pela abertura da atividade da produção de energia à concorrência, ditou a reformulação do respetivo modelo de organização.

O mecanismo criado pelo Decreto-Lei n.º 240/2004, cujos aspetos essenciais se descreveram, veio permitir a cessação dos contratos de aquisição de energia ( CAE ) que, respeitando as condições contratualmente estabelecidas, pretende manter o equilíbrio contratual subjacente a tais contratos.

Refira-se que as centrais electroprodutoras que, mantendo o regime de produtores vinculados de energia, optaram por não cessar o CAE respetivo continuam a ser remuneradas através das regras contratualmente estabelecidas[53].

Numa formulação sintética, dir-se-á que a mecânica de atuação dos custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) permite a participação das centrais anteriormente detentoras de CAE nas diversas modalidades de contratação de energia elétrica[54].

«Dessa participação em mercado é gerada uma receita correspondente que pode estar acima ou abaixo da receita que seria obtida pela aplicação dos CAE . Os CMEC ajustam os diferenciais de receita que se venham a apurar, central a central, nos seguintes termos simplificados:

– Receita de mercado inferior à do CAE : Se a receita da central com a participação em mercado for inferior à que obteria pela aplicação do CAE respetivo, a revisibilidade atua no sentido de cobrir a diferença entre o valor obtido em mercado e o que seria decorrente da aplicação do modelo de contrato a longo prazo. Este valor é um encargo do sistema, sendo perequado por todos os consumidores de energia, através da tarifa de uso global do sistema.

– Receita de mercado superior à do CAE : Se a receita da central com a participação em mercado for superior à que obteria pela aplicação do CAE respetivo, a revisibilidade atua no sentido de retirar a diferença entre o valor obtido em mercado e o que seria decorrente da aplicação do modelo de contrato de longo prazo, aplicando-o como um valor a deduzir aos encargos do sistema elétrico, através da tarifa de uso global do sistema»[55].

Como se faz notar no estudo que se acompanha, «os custos resultantes da aplicação dos CMEC são distribuídos por todos os consumidores de energia».

Convirá ainda reter que «a existência de CMEC ou CAE corresponde à existência de um modelo de maior previsibilidade (e, por isso, menor risco) para os agentes»[56]. Com a aplicação destes mecanismos, os electroprodutores beneficiam de uma evidente vantagem pois têm asseguradas condições de operação até ao final do longo prazo contratual com um risco praticamente inexistente de cessação da atividade.

A este propósito, Susana Tavares da Silva, depois de lembrar que os custos da transição para a concorrência ou de manutenção do equilíbrio contratual são repercutidos na tarifa, sendo, em última instância, suportados pelos consumidores finais, refere que o reconhecimento destes custos «tem sido apontado pela doutrina como um fator de desequilíbrio e de atraso na implementação de um mercado no setor, pois não só é responsável pela não descida das tarifas, como ainda coloca as empresas que a eles têm direito numa posição de superioridade face a novos operadores»[57].

Também a Comissão Europeia ao pronunciar-se sobre o projeto de cessação antecipada dos contratos de longo prazo no setor da eletricidade ( CAE ) e de atribuição de compensações relativamente a essa cessação, e ao analisar em que grau esta medida inclui auxílios estatais, na aceção do n.º 1 do artigo 87.º do Tratado CE, examinou a questão de saber se tais compensações concedem uma vantagem aos respetivos beneficiários.

A Comissão considerou que a justificação apresentada – no sentido de que «tais compensações consistem apenas numa justa indemnização pelo facto de o Estado proceder à cessação antecipada dos CAE , que são contratos entre duas partes privadas, o que não poderá ser considerado uma vantagem» – não se aplica a este caso específico, «dado que os contratos iniciais, que serão objeto de cessação, já concedem uma vantagem aos produtores vinculados».

Na sequência, entendeu a Comissão que:

«Na verdade, os CAE eximem os produtores vinculados de todos os riscos associados aos investimentos cobertos pelos contratos: dispõem da garantia de reembolso de todos os seus custos e de venda de um montante fixo de eletricidade a um preço garantido e durante um período determinado e muito longo. Este fator de segurança contra todos os riscos, num mercado aliás muito cíclico, é proporcionado sem qualquer contrapartida. Constitui uma clara vantagem para os produtores que celebraram os CAE . Por conseguinte, a cessação dos CAE e a concessão de compensações a esse título constitui apenas um modo de alterar a forma como era concedida a vantagem anterior e não um modo de compensar uma desvantagem. De facto, após a cessação dos CAE , aqueles produtores receberão uma compensação que lhes permitirá, não obstante a abertura do mercado, manter o seu volume de vendas (deste modo limitando os riscos em que de outro modo incorreriam) ainda que os centros produtores em questão se venham a revelar intrinsecamente menos eficientes que outros centros produtores que possam ser construídos no futuro por novos concorrentes potenciais»[58].


9. Retomando o Decreto-Lei n.º 240/2004 cumpre, ainda, convocar o citado artigo 11.º que, integrado no capítulo relativo aos mecanismos de revisibilidade das compensações, enuncia as respetivas condições e procedimento a adotar. Dispõe este preceito que:
«Artigo 11.º

Condições de revisibilidade das compensações
1 – Os montantes das compensações devidas às partes contraentes dos CAE pela sua cessação antecipada são ajustados nos termos dos números seguintes.
2 – Compete à DGGE, ouvida a ERSE, com base nos dados fornecidos pela entidade concessionária da RNT , pelas entidades que desenvolvam a atividade de distribuição de energia e pelos produtores, determinar, no prazo máximo de 45 dias após o termo de cada ano civil, os ajustamentos anuais aos montantes das compensações pela cessação antecipada dos CAE em conformidade com o artigo 4.º do anexo I.
3 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a DGGE deve comparar todos os custos e proveitos do centro electroprodutor cujo ajustamento deve ser determinado com todos os custos e proveitos, em igual período, de outros centros electroprodutores de tecnologia equivalente na propriedade ou posse do mesmo produtor.
4 – Para efeitos do número anterior, devem ser considerados como termo de comparação todos os centros electroprodutores a operar em regime de mercado e cujo licenciamento seja anterior à data de entrada em vigor do presente diploma, excetuando-se para o efeito os centros electroprodutores hídricos, de produção em regime especial ou quaisquer outras unidades de produção de energia renovável.
5 – Caso o resultado da comparação prevista no n.º 3 do presente artigo a DGGE apure uma diferença positiva que não seja devidamente justificada pelo produtor, o valor do ajustamento do montante de compensações deve ser deduzido da totalidade da diferença entre os proveitos e custos totais afetos ao centro electroprodutor tomado como referência.
6 – O produtor deve prestar toda a informação solicitada pela DGGE para os efeitos previstos no presente artigo, no prazo de 10 dias após a receção de pedido escrito de informação apresentado pela DGGE.
7 – Imediatamente após a sua determinação, devem os ajustamentos referidos nos números anteriores ser enviados ao membro do Governo responsável pela área de energia para homologação no prazo máximo de 15 dias.
8 – Quando os cálculos a que respeita o n.º 2 do presente artigo conduzirem a um ajustamento positivo, a DGGE, imediatamente após a homologação pelo membro do Governo responsável pela área de energia, deve comunicar os respetivos resultados à ERSE, para efeitos de repercussão do valor correspondente ao encargo relativo ao pagamento daquele ajustamento na parcela de acerto, no prazo máximo de 90 dias após o termo de cada ano civil e durante o período de 12 meses seguinte.
9 – A homologação prevista no n.º 7 do presente artigo considera-se tacitamente deferida após o decurso do prazo de 15 dias para a respetiva emissão.
10 – Quando os cálculos a que respeita o n.º 2 do presente artigo conduzirem a um ajustamento negativo, o produtor respetivo deve proceder, no prazo máximo de 90 dias úteis após a homologação pelo membro do Governo responsável pela área de energia, ao pagamento, nos termos do n.º 9 do artigo 6.º, à entidade concessionária da RNT do montante do ajustamento, de forma que a ERSE efetue a respetiva reversão na tarifa UGS , durante um período que se inicia no 7.º mês do ano subsequente ao ano a que se refere o ajustamento.
11 – A repercussão dos ajustamentos referidos no número anterior na tarifa UGS não deve, contudo, permitir a qualquer das entidades da cadeia de cobrança da tarifa UGS , incluindo o consumidor final, proceder à compensação entre dívidas respeitantes à tarifa UGS e ao montante do ajustamento anual negativo.
12 – O regime previsto nos números anteriores aplica-se, com as devidas adaptações, ao mecanismo de ajustamento final dos montantes das compensações devidas aos produtores estabelecido no n.º 7 do artigo 3.º, com as seguintes exceções:

a) O montante do ajustamento final é determinado em conformidade com o artigo 7.º do anexo I;
b) O ajustamento final é único nos termos do n.º 7 do artigo 3.º;
c) O ajustamento final positivo é repercutido na parcela de acerto durante um período diferenciado por produtor, vigente desde o 90.º dia posterior ao termo do 10.º ano subsequente à data da cessação antecipada do CAE até à data de cessação prevista no CAE com o prazo mais longo de entre os contratos celebrados pelo produtor, sem prejuízo do disposto no n.º 9 do artigo 5.º»

O artigo 11.º que se deixa transcrito estabelece disposições sobre o procedimento a adotar no âmbito da revisibilidade das compensações, visando o apuramento dos ajustamentos anuais (positivos ou negativos) aos montantes das compensações pela cessação antecipada dos CAE que devam ter lugar.

Sublinhe-se também que no Anexo I do Decreto-Lei n.º 240/2004, que trata da “Metodologia de cálculo aplicável à cessação antecipada dos CAE”, em conformidade com o estabelecido no n.º 2 do artigo 11.º acima reproduzido, define-se o cálculo do montante de revisibilidade anual afeto à compensação devida pela cessação antecipada dos CAE no artigo 4.º, sendo que os elementos que integram a expressão do cálculo constante do n.º 1 são como se refere no n.º 2 daquele artigo 4.º:

«2 – Na expressão do número anterior:

a) m representa o mês dentro de cada ano;
b) h representa o posto horário de cada mês;
c) EFkmi representa o encargo fixo devido ao produtor responsável pelo centro electroprodutor k, referente ao mês m do ano i, tal como definido na alínea e) do n.º 2 do artigo 1.º do presente anexo, convertido a preços correntes do final do ano i pelos índices previstos no CAE e ajustado conforme o clausulado e anexos do CAE relativamente ao cumprimento de disposições legais neles definidas;
d) Kmkmi representa o coeficiente de disponibilidade verificado no centro electroprodutor k no mês m do ano i de acordo com a definição do respetivo CAE; nos casos de força maior previstos no CAE, o coeficiente de disponibilidade a considerar deve ser igual ao Kpkmi conforme definido na alínea seguinte;
e) Kpkmi representa o coeficiente de disponibilidade previsto para o centro electroprodutor k no mês m do ano i de acordo com a definição prevista no respetivo CAE e ajustado, em termos e condições a definir no acordo de cessação, de modo a ter em conta o efeito das variações no encargo fixo decorrentes da definição constante da alínea c) do presente artigo;
f) VTkimh representa a produção estimada, em megavátios por hora, do centro electroprodutor k para o posto horário h do mês m do ano i, correspondente à melhor expectativa face à evolução estrutural de mercado, tendo em conta a disponibilidade garantida no respetivo CAE conforme definido na alínea f) do n.º 2 do artigo 1.º do presente anexo;
g) PTmh representa o preço de mercado, incluindo o pagamento de garantia de potência e serviços de sistema, em euros/megavátios por hora, no posto horário h do mês m, que se admitiu que o centro electroprodutor k auferiria quando operado em mercado, conforme definido na alínea g) do n.º 2 do artigo 1.º do presente anexo;
h) VTki representa a produção estimada, em megavátios por hora, do centro electroprodutor k no ano i, correspondente à melhor expectativa face à evolução estrutural de mercado, tendo em conta a disponibilidade garantida no respetivo CAE conforme definido na alínea h) do n.º 2 do artigo 1.º do presente anexo;
i) EVTki representa o encargo variável, em euros/megavátios por hora, do centro electroprodutor k do ano i, conforme definido na alínea i) do n.º 2 do artigo 1.º do presente anexo;
j) VVkimh representa a produção do centro electroprodutor k no posto horário h do mês m do ano i, determinada nas condições definidas no anexo IV para a situação real de hidraulicidade e com base na informação disponível no período em causa;
l) PVimh representa o preço médio de mercado, excluindo o pagamento de garantia de potência e serviços de sistema, no posto horário h do mês m do ano i;
m) VVkim representa a produção do centro electroprodutor k no mês m do ano i, determinada nas condições definidas no anexo IV para a situação real de hidraulicidade e com base na informação disponível no período em causa;
n) EVVkim representa o encargo variável, em euros/megavátios por hora, verificado para o centro de electroprodutor k no mês m do ano i, determinando com base nas disposições estabelecidas no respetivo CAE no que respeita aos preços internacionais Cost Insurance and Freight (CIF) dos combustíveis e custos de transporte até ao centro electroprodutor definidos no anexo V, aos custos variáveis de O & M (operação e manutenção) previstos no CAE, e outros encargos variáveis reconhecidos à data da revisibilidade nos mesmos termos do respetivo clausulado e anexos, uns e outros reportados ao mês m do ano i;
o) GPki representa a receita de garantia de potência recebida pelo centro electroprodutor k no ano i;
p) SSki representa a receita de serviços de sistema recebidos pelo centro electroprodutor k no ano i;
q) Ii representa o índice IPC (continente) sem habitação de final de junho do ano i;
r) Iref representa o índice IPC (continente) sem habitação à data de cessação antecipada do CAE.»


10. Na presente consulta, há que considerar o complexo quadro legal e contratual dos CAE, pelo que se impõe também uma referência aos próprios contratos e aos acordos de cessação.


10.1. Compulsado, no caso, o Contrato de Aquisição de Energia celebrado, em 26 de setembro de 1996, entre a REN – Rede Elétrica Nacional, S.A. (Concessionária da RNT – Rede Nacional de Transporte), como comprador, e a CPPE – Companhia Portuguesa de Produção de Eletricidade, S.A., como produtor[59], deve convocar-se a Cláusula 21, com a epígrafe “Alterações nas Circunstâncias”, merecendo particular atenção o ponto1.

Assim, dispõe a Cláusula 21:

«21. ALTERAÇÕES NAS CIRCUNSTÂNCIAS

21.1. Alterações Relevantes

21.1.1. Se depois da assinatura deste Contrato, o Produtor:

(a) ficar obrigado a pagar ou ficar sujeito a Impostos Relevantes que à data da assinatura deste Contrato não existissem ou não afetassem o Produtor; ou

(b) sofrer um aumento nos custos,

em qualquer dos casos, devido:

(i) à introdução, imposição, cobrança ou tributação de qualquer Imposto Relevante e/ou aumento da taxa à qual qualquer Imposto Relevante é tributado; e/ou

(ii) a qualquer alteração na legislação ou na prática, pública e corrente, de qualquer autoridade fiscal, relacionada em qualquer dos casos com Impostos Relevantes; e/ou

(iii) a qualquer outra alteração na base de tributação de qualquer Imposto Relevante que seja adversa para os interesses financeiros do Produtor; ou

21.1.2. Se depois da assinatura deste Contrato o Produtor:

(a) deixar de ser obrigado a pagar ou fique isento de qualquer Imposto Relevante; ou

(b) vier a beneficiar de uma redução dos custos,

em qualquer dos casos devido:

(i) a um Imposto Relevante que deixe de ser considerado ou tributado; e/ou

(ii) a uma diminuição na taxa de tributação de um Imposto Relevante; e/ou

(iii) a uma alteração da legislação ou na prática, pública e corrente, de qualquer autoridade fiscal, relacionada em qualquer dos casos com Impostos Relevantes; e/ou

(iv) a qualquer outra alteração favorável na forma de tributação de qualquer Imposto Relevante,

e desde que (no caso das cláusulas 21.1.1 e 21.1.2 acima) tais alterações produzam Efeitos Materiais, de acordo com os critérios definidos para efeitos desta cláusula no Anexo II, então as cláusulas 21.2 a 21.5 devem produzir efeitos.

Para os objetivos desta cláusula e do Anexo 11 qualquer situação que caiba nas cláusulas 21.1.1 e 21.1.2 acima mencionadas é uma Alteração Fiscal Relevante (expressão que inclui os efeitos financeiros de tais alterações sobre o Produtor).

21.2. Notificação das Alterações

Cada parte deve notificar prontamente a outra por escrito, informando-a detalhadamente sobre a ocorrência ou existência de qualquer das circunstâncias referidas na cláusula 21.1 de que tenha conhecimento, ou depois de isso lhe ter sido solicitado por escrito pela outra parte.

21.3. Isenções e Transferência de Custos

21.3.1. Para os objetivos desta cláusula 21 assume-se que à data de Início do Contrato o Produtor está isento do pagamento dos seguintes impostos, contribuições e taxas;

(a) Imposto sobre Produtos Petrolíferos (Dcc. Lei 291-A/9I);

(b) Contribuição Autárquica;

(c) Taxa de utilização da água de refrigeração da Central.

21.3.2. Se o Produtor vier a ficar sujeito ao pagamento de qualquer dos impostos contribuições e taxas mencionados na cláusula 21.3.1, o seu efeito será incluído no cálculo do Encargo de Potência ou no Encargo de Energia, conforme os casos.

21.4. Correções ao Contrato

Se o Produtor (no caso das cláusulas 21.1.1 e 21.3) ou a RNT (no caso da cláusula 21.1.2) através de notificação à outra parte assim o decidirem, o cálculo do Encargo de Potência e/ou do Encargo de Energia, deve ser corrigido de acordo com os procedimentos e princípios relevantes definidos no parágrafo 10 do Anexo 11, assegurando, tanto quanto possível, que o Produtor fica na mesma situação financeira em que estaria se não tivesse ocorrido nenhuma Alteração Fiscal Relevante, segundo este Contrato.

21.5. Disposições Adicionais

21.5.1. Na aplicação da cláusula 21.4 pode ser acordado ou determinado que, por efeito de uma Alteração Fiscal Relevante as correções ao Contrato possam ser feitas numa base anual.

21.5.2. Na medida em que o impacto financeiro de uma Alteração Fiscal Relevante sobre o Produtor, ou seus Associados, dependa da forma como os impostos são aplicados sobre as atividades de outros Associados, Subsidiárias ou “Holdings”, o Produtor deverá esforçar-se para assegurar de forma razoável que os acordos sobre distribuição de impostos entre os seus Associados ou Subsidiárias ou “Holdings’, conforme os casos, sejam justos para a RNT (tendo em atenção esta cláusula 21).

21.5.3. As partes concordam e devem cooperar para assegurar que, como alternativa à troca direta da informação necessária para a implementação ou verificação da implementação adequada desta cláusula 21, tal informação (ou um certificado em relação com ou para as consequências daí em diante relevantes) pode ser trocada entre os respetivos auditores, sujeita à definição de limites de utilização ou divulgação pelo auditor recetor, equivalentes aos requeridos quando da receção de informação confidencial por terceiros, segundo a cláusula 28 deste Contrato.

21.5.4. Na medida em que uma Alteração Fiscal Relevante possa ser evitada ou o seu efeito mitigado por uma Alteração nas Práticas de Operação ou por uma Modificação, de acordo com o Anexo 11, as partes acordam que a RNT pode propor que essa alteração seja considerada uma Modificação, para os efeitos do Anexo 11, devendo então esta cláusula 21 ser aplicada em conformidade.

21.5.5. O Produtor deve desenvolver todas as ações possíveis no âmbito da sua competência, na medida do razoável, para minimizar qualquer acréscimo do Encargo de Potência ou do Encargo de Energia, como resultado da aplicação das cláusulas 21.3 ou 21.4.»

O regime de alterações de circunstâncias estabelecidas pelas partes consta do Anexo 11 do CAE, que a seguir, dada a sua extensão, se reproduz apenas parcialmente (pontos 1 e 2).
«ANEXO 11
ALTERAÇÕES NAS CIRCUNSTÂNCIAS

1. DEFINIÇÕES

1.1. Para os objetivos deste Anexo e a não ser que o contexto o exija de modo diferente, as seguintes expressões devem ter o seguinte significado:

“Quantia Mínima de Aplicabilidade”

No primeiro Ano de Exploração

(a) para os objetivos do parágrafo 1.3, é igual a um sexto do valor médio estimado para EFm tal como determinado no Parágrafo 2 do Anexo 1, nos doze meses imediatamente anteriores à Alteração de Custos aplicável ou à Alteração Fiscal Relevante, conforme os casos; e

(b) para os objetivos do parágrafo 4.5, é o valor médio estimado para EFm tal como determinado no Parágrafo 2 do Anexo 1, nos doze meses completos imediatamente anteriores à relevante Alteração de Legislação;

e em cada Ano de Exploração subsequente:

a quantia relativa ao Ano de Exploração anterior, ajustada através do “Índice de Preços no Consumidor, total com exclusão da habitação no continente”, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística no Boletim Mensal de Estatísticas, verificada no período dos últimos doze meses que termina em fim de setembro do Ano de Operação anterior.

“Alteração nos Custos”

(a) qualquer acréscimo ou decréscimo nos custas do Produtor, sejam de capital, sejam de perda de receitas, incluindo os da descontaminação do Sítio antes da Data de Fim do Contrato, relacionados com:

(i) a operação e manutenção da qualquer Grupo ou da Central; ou

(ii) as obrigações do Produtor, definidas neste Contrato; ou

(b) qualquer alteração no rendimento de um Grupo; ou

(c) qualquer acréscimo ou decréscimo nas receitas provenientes da produção de energia elétrica na Central,

na medida em que tal variação resulte de uma Alteração Relevante de Legislação;

“Alteração de Legislação”

após a Data de Início de Contrato:

(a) a promulgação de uma nova lei ou Diretiva, por uma Autoridade Competente; ou

(b) a modificação de uma lei ou Diretiva já existente, por uma Autoridade Competente; ou

(c) o início da produção de efeitos práticos de uma lei ou Diretiva já existente, de uma Autoridade Competente; ou

(d) a entrada em vigor de novos padrões legais operacionais desde que estabelecidas a partir da Data de Início do Contrato; ou

(e) a alteração na interpretação de uma lei obrigando ambas as partes;

(f) qualquer adenda, correção ou substituição no Anexo 6;

(g) o cumprimento de qualquer lei ou Diretiva que, até 5 dias antes da Data de Início de Exploração, não era obrigatório, ou qualquer alteração ao modo ou grau de cumprimento que era exigido;

(h) o exercício, pela RNT, pela Entidade Planeamento ou qualquer outra Autoridade Competente, de algum direito regulamentar conduzindo à retirada de serviço ou a restrição no funcionamento dos Grupos ou da Central, de acordo com as cláusulas 23 ou 24.

“Alteração nas Práticas de Operação”

uma alteração nas políticas ou práticas adotadas pelo Produtor em ligação com a produção de energia elétrica na Central (incluindo uma alteração na qualidade do combustível utilizado), que não envolva nenhuma Modificação.

“Modificação”

uma ampliação, modificação, alteração, substituição ou renovação da Instalação ou do equipamento constituinte de um Grupo ou de qualquer outra instalação, equipamento ou meios usados pelo Produtor, tendo em vista a, ou incidindo na, produção de energia elétrica na Central;

“Modificação Regulamentar”

uma Modificação requerida para, ou de forma a, atingir os padrões de funcionamento decorrentes de uma Alteração Relevante de Legislação (na ausência da qual não seria necessária);

“Modificação do Produtor”

uma Modificação Regulamentar em relação à qual o Produtor apresente propostas, de acordo com o parágrafo 4 deste Anexo;

“Modificação da RNT”

uma Modificação em relação à qual a RNT apresenta propostas, de acordo com o parágrafo 5 deste Anexo;

1.2 Para os objetivos deste Contrato, Alteração Relevante de Legislação significa qualquer Alteração de Legislação sujeita às seguintes restrições:

(a) a modificação das condições de qualquer licença, consentimento ou autorização necessária para a posse ou operação da Central, só será considerada Alteração Relevante de Legislação desde que seja efetuada apenas como resultado do objetivo da implementação de uma Alteração de Legislação;

(b) uma Alteração de Legislação que faça a correção, modificação, aditamento ou revogação de qualquer lei ou Diretiva de uma Autoridade Competente ou qualquer disposição daí decorrente só será considerada Alteração Relevante de Legislação para os fins estabelecidos no presente Anexo se desse facto não resultar a anulação do objetivo ou de alguns dos principais objetivos dessa Alteração na Legislação; e

(c) não será considerada Alteração Relevante de Legislação qualquer outra Alteração de Legislação que especifique (em conformidade ou não com os termos deste Contrato) que essa Alteração de Legislação não poderá ser considerada uma Alteração Relevante de Legislação, para fins definidos neste Anexo; e

(d) não será considerada Alteração Relevante de Legislação uma Alteração de Legislação relacionada com Impostos Relevantes.

1.3 Para os efeitos da Cláusula 21.1 e deste Anexo, uma Alteração nos Custos ou uma Alteração Fiscal Relevante produz Efeitos Materiais se, isolada ou em conjunto com outras Alterações nos Custos ou com outras Alterações Fiscais Relevantes que não tenham sido tomadas em consideração para os fins previstos na Cláusula 21.3 ou neste Anexo, excedam a Quantia Mínima de Aplicabilidade, líquida de quaisquer reduções nos custos ou acréscimos nos lucros que o Produtor seja capaz de obter ou atingir, sujeito às disposições deste Contrato.

As Alterações nos Custos ou Alterações Fiscais Relevantes que surjam periodicamente ou continuamente num período de tempo indefinido devem ser avaliadas para determinar se produzem Efeitos Materiais, tomando como referência um terço do valor atual líquido esperado do montante associado a tal alteração, por aplicação das taxas de atualização que as partes possam acordar, e na ausência de acordo, como determinado no Procedimento de Resolução de Diferendos.

A pedido escrito da RNT, o Produtor deve informá-la sobre o valor de qualquer Alteração de Custos ou Alteração Fiscal Relevante, especificadas pela RNT, logo que esse valor esteja razoavelmente definido desde que esta disposição não prejudique os direitos das partes, de acordo com a Cláusula 21 ou com o parágrafo 9.2 deste Anexo.

1.4 Para evitar dúvidas, os direitos do Produtor, de acordo com este parágrafo 1 não devem ser prejudicados ou afetados pelo facto de qualquer Alteração de Legislação ser conhecida ou proposta à data de entrada em vigor deste Contrato, mas ainda sem efeitos práticos efetivos, incluindo mas não se limitando à, ou à imposição ao Produtor de qualquer obrigação existente ou não à data de entrada em vigor do Contrato para instalar ou adaptar qualquer equipamento destinado a limitar, reduzir ou evitar emissões.

1.5 Para evitar dúvidas, para os efeitos deste Anexo, uma Alteração de Legislação e uma Alteração Relevante de Legislação incluem qualquer compromisso obrigatório para adaptar equipamento destinado a reduzir, restringir ou eliminar emissões.

2. PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS PARA ALTERAÇÕES DE CIRCUNSTÂNCIAS

Este parágrafo diz respeito à aplicação das disposições relacionadas com:

(a) uma Alteração Fiscal Relevante, tal como definido na cláusula 21; ou

(b) uma Alteração Relevante de Legislação dando origem a uma Modificação do Produtor; ou

(c) com uma Modificação da RNT, ou Modificação do Produtor em lugar dela, segundo o parágrafo 5.6; ou

(d) uma Alteração de Custos; ou

(e) uma Alteração Relevante de Emissões

cada uma das quais constituirá uma Alteração de Circunstâncias.

2.2 Sempre que uma das partes invoque Alteração de Circunstâncias, deve, logo que possível, fornecer à outra parte a informação escrita que esta requeira de forma razoável para avaliar a natureza das circunstâncias em questão e os seus efeitos sobre a primeira das partes. Sem prejuízo de quaisquer notificações específicas requeridas por este Contrato, toda a informação enviada está sujeita a restrições de confidencialidade.

2.3 As partes deverão procurar chegar a acordo sobre as correções necessárias à Alteração de Circunstâncias, dentro do prazo de 3 meses contados a partir da data em que cada parte notifica a outra por escrito sobre a necessidade de efetuar correções, segundo as disposições relevantes deste Contrato.

Concluído este prazo, cada parte pode requerer, através de notificação à outra parte, que o assunto seja remetido aos Procedimentos de Resolução de Diferendos para deliberação, segundo o parágrafo 2.5.

2.4 Sem prejuízo do disposto na cláusula 30 e no Anexo 9, qualquer recurso, segundo este Anexo 11, aos Procedimentos de Resolução de Diferendos deve ser dirigido à Comissão Técnica ou à Comissão Financeira, conforme o caso, cuja decisão, unânime ou por maioria, deve ser final e deve obrigar ambas as partes.

2.5 Se um assunto for remetido aos Procedimentos de Resolução de Diferendos para deliberação, ao abrigo do parágrafo 2.3, tal deliberação deve estabelecer qual das propostas de correções reflete mais de perto quer o espírito e conteúdo do Contrato tal como ele é à data, quer a natureza das circunstâncias em questão, não podendo a Comissão, segundo os Procedimentos de Resolução de Diferendos, propor ou selecionar qualquer proposta que não tenha sido submetida por qualquer das partes.

2.6 Após a notificação das correções deliberadas pela Comissão em concordância com o parágrafo 2.5, este Contrato deve ser considerado como tendo sido emendado, com exceção da realização de ajustes ao Encargo de Potência e/ou Encargo de Energia resultantes de tais emendas, ou de uma Alteração Fiscal Relevante ou uma Alteração de Custos, cuja data de entrada em vigor deverá ser estabelecida de acordo com o parágrafo 2.7.

2.7 Quaisquer correções ao Encargo de Potência e/ou ao Encargo de Energia relacionadas com uma Alteração de Circunstâncias serão refletidas na primeira fatura emitida segundo este Contrato, depois de o montante das correções estar calculado, e em todas as faturas subsequentes.

No caso de uma Alteração Fiscal Relevante de acordo com a Cláusula 21, ou de uma Alteração de Custos de acordo com o parágrafo 8 deste Anexo, a primeira fatura deve também refletir os direitos da parte relevante às correções, com efeitos a partir da data em que o Produtor foi pela primeira vez afetado pela Alteração de Circunstâncias aplicável, juntamente com um montante igual aos juros, calculados à Taxa de Juro de Referência, desde a data em que o Produtor foi afetado pela primeira vez até à data em que o pagamento é feito.

2.8 Quando ocorrer uma Alteração Relevante de Legislação, se as correções a este Contrato incluindo quaisquer correções ao Encargo de Potência não tiverem sido acordadas dentro de um prazo de 7 meses a partir da data em que cada uma das partes notifica a outra por escrito sobre a necessidade de acordar correções segundo as disposições relevantes deste Contrato, a RNT deve efetuar um pagamento mensal ao Produtor por conta do Encargo de Potência, calculado tomando como referência a média dos pagamentos desse encargo no período de 12 meses anterior à data em que a Alteração Relevante de Legislação se tornou efetiva, devendo a correção final acordada para o Encargo de Potência ter em conta esses pagamentos.»

O Anexo 11 contempla, pois, o impacte das alterações fiscais relevantes e bem assim das alterações relevantes de legislação.


10.2. Pelo Acordo celebrado em 27 de janeiro de 2005, a REN e a CPPE, dando cumprimento às disposições do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de agosto, e dos artigos 2.º, n.º 1, 9.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, «regulam determinados termos e condições específicas relativos à cessação antecipada do Contrato de Aquisição de Energia celebrado em 26 de setembro de 1996, referentes ao Centro Eletroprodutor» (cfr. claúsula 1.ª).

Sobre a compensação devida pela cessação antecipada do Contrato, a cláusula 4.ª daquele Acordo estipulava:

« Cláusula 4.ª
(Compensação devida pela cessação antecipada do Contrato)

1. Nos termos do número 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, a cessação antecipada do Contrato confere ao Produtor ou à Entidade Concessionária da RNT, consoante aplicável, o direito a receber, a partir do momento previsto no número 2 da Cláusula 2.ª, uma compensação pecuniária, designada por CMEC.
2. O cálculo do montante bruto dos CMEC devidos ao Produtor ou à Entidade Concessionária da RNT, consoante aplicável, na data em que venha a verificar-se a cessação antecipada do Contrato deve ser realizado, de acordo com o disposto nos números 1 e 2 do artigo 3.º e nos números 1 e 2 do artigo 1.º do anexo I do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, com base na metodologia e nos parâmetros definidos no artigo 4.º do mesmo diploma, conforme explicitado no Anexo IV, utilizando como referência o 5.º (quinto) dia útil anterior à apresentação de requerimento a solicitar a aprovação prevista no n.º 3 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro.
3. Para o efeito de proceder à determinação do montante global bruto dos CMEC devidos pela cessação antecipada do Contrato e dos demais CAE celebrados pelas Partes, os montantes dos CMEC positivos e dos CMEC negativos calculados em relação a cada CAE, são automaticamente compensados nos termos do número 4 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro.
4. Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, as Partes reconhecem, desde já, que, com base na metodologia e nos parâmetros referidos no número 2 anterior e utilizando a taxa de 3,78%, correspondente à taxa de rendimento de mercado da dívida pública portuguesa (ou seja, a taxa de rendimento de mercado das Obrigações do Tesouro) com um período de maturidade até julho de 2014, no valor de 3,53%, do 5.º (quinto) dia útil anterior à data do presente Acordo acrescida de 0,25 pontos percentuais:
a) O montante bruto dos CMEC relativos à cessação antecipada do Contrato, calculado, na presente data, para o Centro Electroprodutor, corresponde a um montante, devido ao Produtor, de 32.585 (trinta e dois mil quinhentos e oitenta e cinco) milhares de euros;
b) O montante global bruto dos CMEC devidos ao produtor pela cessação antecipada dos CAE celebrados pelas Partes, calculado na presente data, após compensação dos montantes dos CMEC positivos e dos CMEC negativos determinados em relação a cada CAE, é de 3.356.139 (três milhões trezentos e cinquenta e seis mil e trinta nove) milhares de euros.»

E, nos termos do n.º 4 da Claúsula 17.ª, com a epígrafe “Acordo integral, alterações e cessação”, «[a]tento o longo período de vigência do presente Acordo, no caso de se verificarem as condições previstas na Cláusula 2.ª[[60]], as Partes reconhecem que podem vir a verificar-se circunstâncias não previstas nesta data suscetíveis de assumir uma influência significativa no cálculo dos ajustamentos anuais e final ao montante dos CMEC que devem ser consideradas pelas Partes, mediante a introdução, por mero acordo das Partes e sem necessidade de aprovação ou outras formalidades adicionais, dos necessários ajustamentos à execução do presente Acordo.»

Por sua vez, de acordo com o disposto na alínea b) do n.º 9 daquela Cláusula, o acordo cessa os seus efeitos «[n]o caso de – com fundamento na entrada em vigor, entre a presente data e a data de cessação antecipada dos CAE celebrados pelas Partes, de alguma alteração ao regime jurídico constante do atual Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, com as retificações introduzidas pela Declaração de Retificação n.º 1-A/2005, de 17 de janeiro, que modifique, de forma negativa, os direitos atribuídos ao Produtor ou aos seus eventuais cessionários – o Produtor revogar unilateralmente o presente Acordo, sem necessidade de aprovação ou outras formalidades adicionais, no prazo de 30 (trinta) dias após a entrada vigor da disposição legal relevante».

A Adenda celebrada em 15 de junho de 2007 «concretiza, dando cumprimento ao disposto no número 2 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, e do número 3 da Cláusula 3.ª do Acordo, determinados parâmetros de cálculo e o próprio montante da compensação devida pela cessação antecipada do Contrato, a atualização do Anexo IV do Acordo em virtude das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 199/2007, de 18 de maio, ao Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, o modo de cálculo do montante máximo das compensações devidas pela cessação antecipada dos CAE celebrados pelas Partes, bem como determinados aspetos respeitantes às licenças de emissão de CO2, e à sua relevância no contexto da revisibilidade daquelas compensações» (cfr. cláusula 1.ª).

No ANEXO B daquela Adenda, relativo à ”Metodologia e Parâmetros do Cálculo do Ajustamento Anual do Montante dos CMEC”, sobre a revisão do valor do contrato, estabelece-se no ponto 2.1. que o cálculo do ajustamento anual deverá refletir eventuais alterações dos encargos fixos e dos outros encargos explicitamente definidos no Contrato.

E no ANEXO C, atinente à “Metodologia e Pârametros de cálculo do Ajustamento Final do Montante dos CMEC”, estabelece-se no ponto 2 sobre a revisão do valor do contrato:

«2. Revisão do Valor do Contrato

2.1. O índice Kpk que representa o coeficiente de disponibilidade previsto para o centro electroprodutor k será ajustado de modo a traduzir eventuais alterações no valor do Encargo Fixo desse centro electroprodutor, em resultado de situações que estariam a coberto do clausulado do CAE. Como exemplo deste tipo de situações pode-se referir:

a) Alteração no valor das rendas dos centros electroprodutores;

b) Investimentos extraordinários associados a ações de grandes reparações de barragens, essencialmente relacionadas com aspetos de segurança, que não foram incluídos no valor inicial dos CMEC por serem difíceis de prever;

c) Introdução e implementação do pagamento de taxas de utilização de água ou outras previstas na nova lei quadro da água em elaboração;

d) Alteração da legislação que implique aumento de custos de exploração, ou realização de investimentos nomeadamente para diminuição do impacte ambiental do empreendimento de acordo com o previsto na cláusula 27 do CAE e que faz parte do Anexo I dos Acordos de Cessação.

2.2. Os valores anuais, a preços correntes, do encargo fixo considerados no ajustamento final, serão calculados aplicando os índices de preços previstos no Contrato conhecidos à data do ajustamento final e considerando que esses índices têm implícita uma taxa de inflação anual correspondente à media dos últimos 5 anos disponíveis à data da realização do cálculo do ajustamento final.

2.3. Os investimentos extraordinários que foram considerados durante o período de revisibilidade deverão ser também incluídos no cálculo do encargo fixo para efeitos do ajustamento final. Além destes custos deverão igualmente ser considerados todos os custos suportados pelo Produtor que não foram incluídos no cálculo do valor inicial dos CMEC, por ser impossível a sua previsão, mas que pela sua natureza estavam abrangidos pelo clausulado do Contrato e como tal foram incluídos na revisibilidade anual dos CMEC.

2.4. Os municípios cuja circunscricão seja abrangida pela zona de influência dos centros electroptodutores, têm diteito ao recebimento de uma renda anual a pagar pelo Produtor. Essa renda, cujo montante é definido de acordo com o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, foi considerada e incluída no valor dos encargos fixos anuais de operação e manutenção a suportar pela Entidade Concessionária da RNT no âmbito do Contrato e consequentemente no valor inicial dos CMEC e também deverá ser considerada no seu ajustamento final.

2.5. O coeficiente km, que representa o coeficiente de disponibilidade de cada centro electroprodutor, será calculado a partir da média dos coeficientes de disponibilidade, de acordo com a definição do respetivo CAE, verificados nos últimos 10 anos históricos disponíveis à data da realização do cálculo do ajustamento final.

2.6. No cálculo do valor inicial dos CMEC foram incorporados outros encargos explicitamente previstos nos Contratos que incluíam os direitos de superfície pagos pelos terrenos do centro electroprodutor de Sines e os arranques dos respetivos grupos. Para efeitos do ajustamento final serão considerados os direitos de superfície em vigor à data do cálculo, ajustados com uma inflação correspondente à média dos últimos 5 anos. O cálculo dos custos de arranque será efetuado considerando o mesmo número de arranques previsto no cálculo do valor inicial dos CMEC, mas com o preço do fuelóleo correspondente à média dos últimos 5 anos para os quais foi efetuada a revisibilidade e considerando a inflação média dos últimos 5 anos.

2.7. Deverá ser também considerada a taxa que é paga à EGREP (Entidade Gestora de Reserva de Produtos Petrolíferos) por cada tonelada de fuelóleo importado e que, apesar de estar ao abrigo do clausulado contrato, não foi considerada no cálculo do valor inicial do CMEC devendo no entanto ser considerada no ajustamento final. O valor desta taxa é fixado anualmente pela entidade competente. No cálculo do ajustamento final a quantidade de fuelóleo considerada deverá ser a média dos consumos de fuelóleo em Sines, verificados nos últimos 10 anos históricos disponíveis à data da realização do cálculo. O valor da taxa a considerar será a última fixada pela EGREP. A conversão para preços correntes será efetuada através da aplicação da taxa de inflação anual média dos últimos 5 anos.

2.8. Deverão ser calculadas novas rendas de acordo com o estabelecido na Portaria n.º 481/2007, de 19 de abril, tendo em atenção possíveis alterações nomeadamente no que se refere às taxas de remuneração do ativo líquido. Em relação ao Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), o valor da responsabilidade do Produtor será recalculado de acordo com os critérios vigentes na altura e considerado para efeitos de ajustamento final.».


VII


Aqui chegados, não será discipiendo atentar na natureza da CESE.

Já se fez referência ao regime da contribuição extraordinária sobre o setor energético[61], tendo-se salientado que a sua criação teve como objetivo financiar mecanismos que promovam a sustentabilidade sistémica do setor energético, designadamente através do financiamento de políticas do setor energético de cariz social e ambiental e da redução tarifária do Sistema Elétrico Nacional (SEN)[62].

Como se disse, a receita obtida com a CESE é consignada ao Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético (FSSSE).

Os objetivos do FSSSE estão definidos no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2014:
«Artigo 2.°
Objetivos

O FSSSE visa contribuir para a promoção do equilíbrio e sustentabilidade sistémica do setor energético e da política energética nacional, designadamente através:

a) Do financiamento de políticas do setor energético de cariz social e ambiental, relacionadas com medidas de eficiência energética;
b) Da redução da dívida tarifária do Sistema Elétrico Nacional (SEN), mediante a receita obtida com a contribuição extraordinária sobre o setor energético prevista no artigo 228.° da Lei n.° 83-C/2013, de 31 de dezembro.»

Sobre as receitas do FSSSE dispõe o artigo 3.º daquele diploma:
«Artigo 3.º
Receitas

1 – Constituem receitas do FSSSE:

a) O produto da contribuição extraordinária sobre o setor energético prevista no artigo 228.° da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro;
b) As dotações que lhe sejam afetas por lei;
c) Os rendimentos provenientes de aplicações financeiras de capitais disponíveis;
d) O produto de doações, heranças, legados ou qualquer outra contribuição;
e) Quaisquer outras receitas que lhe sejam atribuídas por lei ou por negócio jurídico.

2 – Os saldos que vierem a ser apurados no fim do ano económico transitam para o ano seguinte.
3 – É vedado ao FSSSE contrair empréstimos sob qualquer forma bem como efetuar aplicações em que o capital investido não seja totalmente garantido.
4 – O disposto no número anterior não prejudica a aplicação dos mecanismos de redução de dívida tarifária previstos no artigo 5.°
5 – Os montantes arrecadados pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) em cada mês, a título de contribuição extraordinária sobre o setor energético, são transferidos para o FSSSE até ao último dia útil do mês seguinte.»

E sobre as despesas estatui o artigo 4.º:
«Artigo 4.°
Despesas

1 – Constituem despesas do FSSSE as que resultem de encargos decorrentes da aplicação do presente decreto-lei, designadamente:

a) Encargos necessários ou decorrentes da realização dos seus objetivos, conforme definidos no artigo 2.°;
b) Encargos de liquidação e cobrança da contribuição extraordinária sobre o setor energético incorridos pela AT, correspondentes a uma percentagem de 3 % da receita referida na alínea a) do n.° 1 do artigo anterior.

2 – As verbas do FSSSE devem ser alocadas de acordo com a seguinte ordem de prioridade:

a) Cobertura de encargos decorrentes da realização do objetivo definido na alínea a) do artigo 2.º no montante correspondente a dois terços da receita referida na alinea a) do n.º 1 do artigo anterior, até ao limite máximo de EUR 100 000 000,00;
b) Cobertura de encargos decorrentes da realização do objetivo definido na alínea b) do artigo 2.° no montante remanescente.

3 – O montante referido na alínea a) do número anterior inclui o montante referido na alínea b) do n.º 1.»

No que concerne à redução da dívida tarifária, o montante que lhe é alocado é deduzido aos custos de interesse económico geral (CIEG) a repercutir em cada ano na tarifa de uso global do sistema aplicável aos clientes finais e comercializadores, em conformidade com o definido por despacho do membro do governo responsável pela área da energia (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.º).

À CESE foi atribuída pelo legislador a designação de contribuição, mas interessará agora proceder à sua caraterização de acordo com o atinente regime jurídico.

Há aqui que considerar as figuras afins, desde logo, o imposto e bem assim a taxa.

Como refere José Casalta Nabais[63], «[e]ntre nós a figura dos tributos tem sido objeto de uma divisão dicotómica, bipartida ou binária, que os distribui por tributos unilaterais ou impostos e tributos bilaterais ou taxas, ou de uma divisão tripartida ou ternária, que distingue entre impostos, taxas e contribuições ou tributos especiais.»

Segundo aquele Autor, para se poder dizer que se está perante uma taxa, há, em rigor, que proceder a dois testes: o da bilateralidade e o da proporcionalidade (proporcionalidade entre o tributo e a respetiva contraprestação específica)[64].

O critério da unilateralidade/bilateralidade para caracterizar um tributo, respetivamente, como imposto ou como taxa tem sido tradicional na doutrina e bem assim na jurisprudência do Tribunal Constitucional e com expressão na Lei Geral Tributária (LGT).

Com efeito, o n.º 1 do artigo 4.º da LGT estabelece que «[o]s impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património».

E, de acordo com o n.º 2 daquele artigo 4.º «[a]s taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares».

Mais problemática, conforme salientam Jónatas E. M. Machado/Paulo Nogueira da Costa[65], é o critério para distinguir as contribuições financeiras das outras categorias de tributos – impostos e taxas.

A referência às contribuições financeiras foi introduzida na Constituição da República Portuguesa – artigo 165.º, n.º 1, da alínea i) – pela 4.ª revisão constitucional (Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro).

Também a LGT menciona, no n.º 2 do artigo 3.º[66], entre os tributos, as «demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas».

E do n.º 3 daquele artigo parece resultar a equiparação das contribuições financeiras às taxas[67].

Já, nos termos do n.º 3 do artigo 4.º da LGT, «[a]s contribuições especiais que assentam na obtenção pelo sujeito passivo de benefícios ou aumentos de valor dos seus bens em resultado de obras públicas ou da criação ou ampliação de serviços públicos ou no especial desgaste de bens públicos ocasionados pelo exercício de uma atividade são consideradas impostos».

Explicita José Casalta Nabais que «na divisão tripartida dos tributos, encontramos no nosso sistema tributário atual dois tipos de contribuições entre a figura dos impostos e a figura das taxas: as clássicas contribuições especiais e as demais contribuições financeiras. Contribuições que têm de comum, podemos adiantar já, não se reportarem seja a normais detentores de capacidade contributiva como nos impostos, nem a destinatários de específicas contraprestações como nas taxas, mas antes a grupos de pessoas ligados seja por uma particular manifestação de capacidade contributiva decorrente do exercício de uma atividade administrativa (nas contribuições especiais), seja pela partilha de uma específica contraprestação de natureza grupal (nas demais contribuições financeiras)»[68].

Relativamente às contribuições financeiras, salientam Jónatas E. M. Machado/Paulo Nogueira da Costa que constitui uma particularidade o facto de estas pressuporem contraprestações que beneficiam, de um modo indireto ou reflexo, os sujeitos pertencentes a determinado grupo[69].

Sobre a distinção entre contribuições financeiras e taxas, o Tribunal Constitucional no Acordão n.º 539/2015, de 20 de outubro de 2015, proferido no Processo n.º 27/2015[70], respeitante à taxa de segurança alimentar mais, considerou que «[a]s contribuições distinguem-se especialmente das taxas porque não se dirigem à compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que apenas presumivelmente são provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica. Preenchem esse requisito as situações em que a prestação poderá beneficiar potencialmente um grupo homogéneo ou um conjunto diferenciável de destinatários e aquelas em que a responsabilidade pelo financiamento de uma tarefa administrativa é imputável a um determinado grupo que mantém alguma proximidade com as finalidades que através dessa atividade se pretendem atingir»[71].

Ainda, segundo José Casalta Nabais, «[a] respeito da divisão dicotómica ou tripartida dos tributos, é de sublinhar que o critério para a distinção entre os tipos de tributos se reporta exclusivamente à estrutura da relação tributária, ao tipo de relação que se estabelece entre os respetivos sujeito ativo e o sujeito passivo, e não à titularidade ativa dessa relação, como o sugere a frequentemente utilizada expressão “tributos parafiscais”, nem a finalidade do tributo como, por vezes, vai subentendido na expressão “tributos extrafiscais”»[72].

Ora, considerando o breve excurso que se vem de fazer, temos que, no caso vertente, a CESE é atribuída ao FSSSE, que, como vimos, tem a natureza de património autónomo[73], mas, com efeito, mais do que atender àquela consignação, importa atentar na estrutura da relação respetiva.

Daí que se nos afigure que a CESE, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica, no sentido acima referido, se trata de uma contribuição financeira.

A CESE é uma contrapartida para o financiamento da eficiência energética e da redução da dívida do SEN, exigida pelo modelo do Estado regulador.


VIII


Antes de se ensaiar a resposta às questões colocadas, importa, ainda, recordar alguns aspetos da interpretação dos contratos.

Ora, face ao enquadramento legal acima descrito[74], afigura-se-nos ser de considerar os contratos de aquisição de energia, e bem assim os acordos de cessação, contratos administrativos[75], à luz do Código do Procedimento Administrativo (CPA) de 1991, vigente à data da sua celebração, mais dever-se-á acrescentar, tal decorreria também, pese embora as modificações normativas, do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro[76].

Dada a semelhança estrutural entre o contrato administrativo e o contrato de direito privado, poderia parecer evidente a aplicação das regras de interpretação vigentes para este.

Porém, como notam Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado de Matos, «essa solução seria apressada e conduziria a resultados indesejáveis, por não atender à necessária funcionalização da atividade administrativa à prossecução do interesse público […] e à procedimentalização da atividade contratual administrativa […], que contrastam com a autodeterminação de fins que preside ao exercício da autonomia privada e com o caráter desprocedimentalizado da contratação interprivada»[77].

O CPA (1991), todavia, não continha normas que dispusessem sobre a interpretação do contrato administrativo, como, aliás, acontece, hoje, com o CCP.

Mas convocando aqui, justamente, o CCP, dado o seu caráter tendencialmente omnicompreensivo ao nível do regime jurídico dos contratos administrativos[78], o seu artigo 280.º, que define o direito aplicável aos contratos administrativos, estatui no n.º3:

«3 – Em tudo quanto não estiver regulado no presente Código ou em lei especial e não for suficientemente disciplinado por aplicação dos princípios gerais de direito administrativo, são subsidiariamente aplicáveis às relações contratuais jurídicas administrativas, com as necessárias adaptações, as restantes normas de direito administrativo e, na falta destas, o direito civil.»

Assim, as regras da interpretação dos contratos administrativos devem deduzir-se a partir do sistema de direito administrativo, conforme escrevem aqueles Autores, que acrescentam:

«Tendo em conta que, ao contrário do ato administrativo, o contrato administrativo não resulta de qualquer autotutela declarativa da administração, a sua interpretação deve ser orientada por uma finalidade predominantemente objetiva: assim, deve entender-se que o sentido das declarações negociais é não o que as partes lhe quiseram dar, mas aquele que lhes seria atribuído por uma pessoa normal; contudo, o sentido subjetivo deve prevalecer sempre que a vontade real de uma das partes seja pela outra conhecida (neste sentido, também o art. 236.°, 2 CC, aplicável ex vi do art. 280.°, 3, parte final, CCP)»[79].

A propósito da interpretação do negócio jurídico privado (hoje, entre nós, artigos 236.° a 239.° do Código Civil), têm surgido conceções opostas, dando origem a dois grupos doutrinários: o das posições subjetivistas e o das posições objetivistas[80].

Segundo Mota Pinto[81] «[d]e entre as doutrinas objetivistas merece referência, por ser a melhor das suas variantes, a chamada teoria da impressão do destinatário; a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria; considera-se o real declaratário nas condições concretas em que se encontra e tomam-se em conta os elementos que ele conheceu efetivamente, mais os que uma pessoa razoável, quer dizer, normalmente esclarecida, zelosa e sagaz, teria conhecido, e figura-se que ele raciocinou sobre essas circunstâncias como o teria feito um declaratário razoável».

E, mais à frente, explicitava aquele Autor:

«O Código Civil define o tipo de sentido negocial decisivo para a interpretação nos termos daquela posição objetivista: «a declaração vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante» (art. 236.º, n.° 1). Releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer.
A prevalência do sentido correspondente à impressão do destinatário é, todavia, objeto, na lei, de uma limitação, em conformidade com o ponto de vista de Larenz e, entre nós, de Ferrer Correia: para que tal sentido possa relevar torna-se necessário que seja possível a sua imputação ao declarante, isto é, que este pudesse razoavelmente contar com ele (art. 236.º, n.° 1, in fine)».

Um exemplo de desvio da doutrina no sentido dum maior objetivismo é, aliás, o dos negócios solenes ou formais, como é o caso em apreço.

Nos negócios solenes ou formais, «o sentido objetivo correspondente à impressão do destinatário, isto é, o sentido correspondente à doutrina geral, não pode valer se não tiver um mínimo de correspondência, embora imperfeita, no texto do respetivo documento (art.º 238.°, n.° 1)»[82].

E, reconhecendo-se «autonomia à formação de contratos pela subscrição de um mesmo texto escrito, exigido por lei (v.g. escritura pública) ou adotado livremente pelas partes», conforme refere Carlos Ferreira de Almeida, «[u]ma análise rigorosa impõe […] que se continuem a observar as regras do artigo 236.º, ainda que adotados à unicidade textual e frequentemente circunscritas pelos limites do artigo 238.°, aplicáveis aos negócios jurídicos ditos formais»[83].

Assim, «[c]ada uma das declarações deve ser interpretada em separado. Apesar de o texto a interpretar ser o mesmo e serem tendencialmente idênticas as circunstâncias que antecedem e acompanham a sua redação, a diferença de autoria exige que, em relação a cada uma delas, se considere o ponto de vista de cada um dos declaratários, de modo a respeitar a regra básica adotada no Código Civil»[84].

Haverá, porém, que incluir «um segundo momento lógico para verificação do consenso, resultado de um processo hermenêutico que consiste na comparação entre os sentidos juridicamente relevantes de cada uma das declarações contratuais e na averiguação acerca da sua concordância»[85].

Tratando-se, no caso, de um negócio jurídico formal, apesar da maior relevância atribuída ao texto, haverá, de todo o modo, que considerar outros elementos interpretativos.

A este respeito, no domínio do CCP, escrevem Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado de Matos[86]:

«Os meios de interpretação do contrato administrativo são os argumentos gerais de interpretação jurídica […], com algumas particularidades. Assim, os argumentos linguísticos têm a importância que em geral decorre do facto de os enunciados linguísticos através dos quais foi exteriorizado o contrato constituírem o ponto de partida e o limite da interpretação. Os argumentos genéticos assumem, nos contratos administrativos, um relevo inclusivamente superior àquele que têm na interpretação do ato administrativo […]: como, no momento da adjudicação, o conteúdo do contrato administrativo já está total ou quase totalmente fixado, a interpretação dos contratos administrativos coenvolve necessariamente a interpretação dos atos jurídicos praticados na fase pré-contratual; assim, para o apuramento do seu sentido concorre decisivamente o teor de atos procedimentais como o anúncio de abertura do procedimento pré-contratual, o programa do procedimento e/ou os convites à apresentação de propostas, o caderno de encargos, a memória descritiva e a solução escolhida, os termos de referência, os esclarecimentos prestados pela administração sobre as peças do procedimento, as propostas apresentadas e os esclarecimentos que sobre elas prestem os concorrentes, as atas da fase de negociação, os relatórios preliminar e final elaborados pelo júri do procedimento e, em particular, o sentido provável da adjudicação sujeito a audiência dos interessados, o próprio ato de adjudicação e, eventualmente, outros atos posteriores, como atos administrativos de aclaração e o ato de aprovação da minuta do contrato (cada um destes atos carece, por sua vez, de interpretação). As normas que estabelecem relações de prevalência e subordinação entre estes atos pré-contratuais (arts. 50.°, 5, 60.°, 2, 96.°, 2, 5, 6, 132.°, 6, 189°. 6, 226.°, 5 CCP) devem ser tidas em conta para efeitos de interpretação. Nos argumentos sistemáticos extrínsecos é de destacar, como decorrência do art. 282.° CCP, a necessidade de se presumir que o conteúdo contratual reflete um equilíbrio financeiro entre as partes. Os comportamentos das partes posteriores ao contrato, designadamente no seu cumprimento e execução, podem também iluminar retrospectivamente o sentido das disposições contratuais».


IX


É chegado o momento da resposta às questões colocadas, sendo a 1.ª questão, recorde-se, a seguinte:

«I – As importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de CESE por referência às centrais com CAE ainda em vigor, são, ou não, suscetíveis de dar azo à aplicação das respetivas cláusulas sobre alteração das circunstâncias e à consequente repercussão dos custos inerentes na entidade concessionária da RNT na referida tarifa UGS.»

A questão reporta-se, pois, aos CAE em vigor.

Ora, nos termos do n.º 1 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 172/2006, «[a]té que o processo de extinção dos contratos de aquisição de energia (CAE) esteja concluído, os centros eletroprodutores, relativamente aos quais os contratos vinculados ainda se mantenham a produzir efeitos, continuam a operar de acordo com o estabelecido no respetivo contrato e com o disposto no Decreto-Lei n.º 183/95, de 27 de julho, na redação que lhe foi dada pelos Decretos-Leis n.os 56/97, de 14 de março, e 198/2000, de 24 de agosto».

Assim, conforme já se assinalou[87], impõe-se considerar o complexo quadro legal e contratual dos CAE.

E, no plano contratual, relevam aqui, em especial, a cláusula 21 e o Anexo 11, daqueles contratos, acima reproduzidos.

A Cláusula 21 contém, como vimos, a disciplina das alterações fiscais relevantes – “qualquer imposto relevante”.

Por sua vez, o Anexo 11 contém o regime da alteração de circunstâncias, incluindo alterações fiscais e modificações legislativas relevantes, bem como acréscimos de custos decorrentes de alterações relevantes de legislação.

Da análise do estipulado no Anexo 11, e considerando o teor da Cláusula 21, a eventual aplicação da alteração de circunstâncias na situação em análise apenas se poderia basear em alterações fiscais relevantes.

Porém, as alterações fiscais relevantes são as como tal definidas naquela cláusula, ou seja, as atinentes a qualquer imposto relevante.

Ora, face ao supra exposto[88], entendemos que a CESE não pode ser considerada imposto.

Assim, atento o elemento literal do estabelecido contratualmente, mas relevando aqui também o enquadramento legal dos CAE, entende-se outrossim que a CESE não pode fundar uma alteração de circunstâncias nos termos da cláusula 21 e do Anexo 11 dos CAE.

É certo que importa considerar a cascata tarifária do setor elétrico, em conformidade com o normativo acima apresentado, e que como se sublinhou a tarifa de Uso Global do Sistema (UGS) deve proporcionar os proveitos a recuperar pelos operadores das redes de distribuição, relativos à compra e venda de energia elétrica do agente comercial, à gestão global do sistema, ao diferencial de custo com a aquisição de energia elétrica a produtores em regime especial, aos custos para a manutenção do equilíbrio contratual e aos défices tarifários entre outros (cfr. n.º 2 do artigo 65.º do Regulamento Tarifário)[89].

Mas, de todo o modo, para além da CESE não implicar uma alteração de circunstâncias tal como estabelecido contratualmente, de acordo com o estatuído no n.º 1 do artigo 5.º do regime da CESE, acima reproduzido[90], as importâncias suportadas a título da contribuição extraordinária não são repercutíveis.

A CESE é, como se referiu, uma contrapartida para o financiamento da eficiência energética e da redução da dívida do SEN.

E, considerando o estabelecido quanto à sua incidência subjetiva e objetiva[91], também não resulta a repercussão da CESE pelos consumidores.

Aliás, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014, no que concerne à redução da dívida tarifária, o montante da CESE alocada ao FSSSE é deduzido aos custos de interesse económico geral a repercurtir em cada ano na tarifa de uso global do sistema aplicável aos clientes finais e comercializadores[92].

A CESE é, pois, deduzida, na parte referida, aos CIEG, não devendo agravar, mas sim beneficiar os consumidores, tal como é logo anunciado no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 55/2014, quando se afirma que a CESE «visa igualmente contribuir para a redução da dívida tarifária do Sistema Elétrico Nacional (SEN), designadamente, através da minimização dos encargos decorrentes de custos de interesse económico geral (CIEG), indo ao encontro dos princípios de apoio e proteção do consumidor de eletricidade decorrentes do Terceiro Pacote da Energia da União Europeia»[93].

Trata-se de uma opção clara do legislador, refletida em normas imperativas – os referidos n.º 1 do artigo 5.º do regime da CESE e n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014.

Assim, independentemente da natureza da CESE (contribuição ou imposto), os respetivos custos suportados pelos sujeitos passivos não são suscetíveis de repercussão.

E não será despiciendo referir, convocando o Parecer n.º 35/2009[94], que no domínio da determinação das tarifas do setor elétrico, a autoridade administrativa reguladora – a ERSE – está obrigada a atuar em conformidade com o princípio da legalidade, consagrado no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e concretizado no artigo 3.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo.

Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo, em vigor[95], «[o]s órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes forem conferidos e em conformidade com os respetivos fins»[96].

A subordinação jurídica traduzida pelo princípio da legalidade significa assim que a atuação da administração não pode contrariar o direito vigente – preferência de lei – exigindo-se ainda que tenha fundamento numa norma jurídica – precedência de lei[97].

Ora, no caso, os custos decorrentes da CESE constituem encargos para os centros eletroprodutores abrangidos. Porém, o legislador não contemplou a possibilidade de repercussão desses custos na tarifa de uso global do sistema (UGS) e consequentemente nos consumidores.


X


A 2.ª questão colocada na presente consulta era a seguinte:

«II – As importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de CESE por referência às centrais a que seja aplicável o regime de CMEC, identificadas no anexo [II] do Decreto-Lei n.º 240/2004, são, ou não, suscetíveis de repercussão nos ajustamentos anuais aos mesmos, a efetuar ao abrigo do disposto no artigo 11.º do referido diploma com repercussão na tarifa UGS.»

Os custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), como vimos, são repercutidos na tarifa de Uso Global do Sistema (cfr. n.º 3 do artigo 61.º do Decreto-Lei n.º 29/2006[98] e n.os 2 e 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 240/2004[99]).

No caso dos CMEC positivos, os montantes são repercutidos pela totalidade dos consumidores de energia elétrica, constituindo encargos respeitantes ao uso global do sistema a incorporar como componentes permanentes da tarifa UGS.

No caso dos CMEC negativos, os respetivos montantes pagos por cada produtor devem ser repercutidos para posterior redução da tarifa UGS, de forma a garantir uma repartição equitativa entre todos os consumidores do sistema elétrico.

E no que concerne à revisibilidade dos CMEC, o n.º 2, acima reproduzido, do artigo 4.º do Anexo I do Decreto-Lei n.º 240/2004 prevê na alínea c) que o encargo fixo devido ao produtor responsável pelo centro eletroprodutor é «ajustado conforme o clausulado e anexos do CAE relativamente ao cumprimento de disposições legais neles definidas».

Ajustamento que nos pode remeter para o regime de alterações das circunstâncias dos CAE.

Todavia, face ao que se vem de dizer a propósito da 1.ª questão sob consulta, entende-se também aqui que a CESE não permite aplicar aquele regime.

Assim, não é possível fundar um ajustamento anual aos montantes dos CMEC, nos termos do n.º 6 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, com base nos critérios constantes dos artigos 4.º a 6.º do Anexo I e nas condições enunciadas no artigo 11.º, todos daquele diploma, em virtude do pagamento da CESE.

E, consequentemente, não há lugar ao mecanismo de repercussão dos CMEC nas tarifas, nos termos do artigo 5.º daquele Decreto-Lei n.º 240/2004.

Por outro lado, não será demais sublinhar que neste preceito se refere expressamente a repercussão dos CMEC e dos seus ajustamentos nas tarifas e que, ao invés, o legislador estatuiu que as importâncias suportadas a título de contribuição extraordinária sobre o setor energético não são repercutíveis conforme se assinalou.

Também não será demais frisar que são os produtores de energia elétrica, bem como todos os outros sujeitos elencados no artigo 2.º do regime da CESE, e não isentos nos termos do artigo 4.º, os sujeitos passivos da CESE, e não obviamente os consumidores, o que afinal se verificaria se as importâncias relativas à CESE viessem a ser consideradas na UGS, adicionando-se-lhe.

Aliás, não será, ainda, despiciendo recordar o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 240/2004, onde a dado passo se afirma que «[a] solução legal consagrada no presente diploma visa possibilitar que o processo de cessação antecipada dos CAE e a atribuição das correspondentes compensações seja favorável para os consumidores,…».

Todavia, como já se referiu os CMEC têm sido apontados como um fator de desequilíbrio no setor elétrico e a Comissão Europeia considerou que tais compensações não são uma vantagem, dado que os contratos iniciais já concediam uma vantagem aos produtores vinculados[100].

Daí que, porventura, relativamente a estes tinha particular significado a considerada exigência da participação das entidades que operam no setor da energia, de uma forma mais intensa e num quadro de solidariedade e equidade[101], mediante a contribuição extraordinária sobre o setor energético.

Em suma, considerando o respetivo enquadramento legal e os acordos de cessação antecipada dos CAE, as importâncias devidas pelos sujeitos passivos da contribuição extraordinária sobre o setor energético, ao abrigo do artigo 2.º, alínea a), do regime da CESE, não são repercutíveis pelos centros eletroprodutores nos ajustamentos anuais aos CMEC.


XI


Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª – A contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE) foi criada pelo regime aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83–C/2013, de 31 de dezembro – Orçamento do Estado para 2014 –, visando financiar mecanismos que promovam a sustentabilidade sistémica do setor energético (cfr. n.º 2 do artigo 1.º daquele regime);

2.ª – Entre os sujeitos passivos da CESE, incluem-se os titulares de licenças de exploração de centros eletroprodutores, com exceção dos localizados nas Regiões Autónomas dos Açores ou da Madeira (cfr. alínea a) do artigo 2.º do regime da CESE), e que não estejam isentos nos termos do artigo 4.º do regime da CESE;

3.ª – As importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título de contribuição extraordinária sobre o setor energético não são suscetíveis de repercussão, conforme estatuído no n.º 1 do artigo 5.º do regime da CESE, «direta ou indiretamente, nas tarifas de uso das redes de transporte, de distribuição ou de outros ativos regulados de energia elétrica e de gás natural, previstas nos regulamentos tarifários dos respetivos setores, não devendo a contribuição ser considerada, designadamente, para efeitos de determinação do respetivo custo de capital»;

4.ª – A receita obtida com a CESE é consignada ao Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético (FSSSE) que foi criado pelo Decreto-Lei n.º 55/2014, de 9 de abril;

5.ª – E, no que concerne à redução da dívida tarifária, o montante da CESE que lhe é alocado é deduzido aos custos de interesse económico geral (CIEG) a repercutir em cada ano na tarifa de uso global do sistema aplicável aos clientes finais e comercializadores, em conformidade com o definido por despacho do membro do governo responsável pela área da energia (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014);

6.ª – O aprofundamento da liberalização do setor elétrico em 1995 fez-se com a publicação de um conjunto de diplomas que introduziram importantes alterações na atividade de produção, transporte e distribuição de energia elétrica;

7.ª – Neste domínio, o Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho, que estabeleceu as bases da organização do Sistema Elétrico Nacional (SEN), prevê no artigo 15.º os contratos de aquisição de energia (CAE), que se caraterizam por serem contratos de longo prazo através dos quais os produtores vinculados ao serviço público da energia se comprometiam a abastecer, em exclusivo, a entidade concessionária da rede nacional de transporte (RNT), vendendo-lhe toda a energia produzida no respetivo centro electroprodutor;

8.ª – De entre as orientações de política energética aprovadas pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003, foi adotada a necessidade de liberalizar o mercado com eficiência, através, designadamente, da concretização do mercado ibérico de eletricidade (MIBEL) e da promoção da concorrência no setor da eletricidade, constituindo a extinção dos CAE uma das medidas para a existência de um verdadeiro mercado de eletricidade;

9.ª – O Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de agosto, que estabeleceu disposições aplicáveis à cessação dos contratos de aquisição de energia elétrica celebrados entre a entidade concessionária da RNT e os produtores vinculados, prevê nos n.os 2 e 3 do artigo 13.º que essa cessação implica a adoção de medidas indemnizatórias, tendo em vista o ressarcimento dos direitos dos produtores através de um mecanismo destinado a manter o equilíbrio contratual subjacente, designado por custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), que deverão garantir a compensação dos investimentos realizados e a cobertura dos compromissos assumidos nos CAE que não sejam garantidos pelas receitas expectáveis em regime de mercado;

10.ª – E o Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, em execução do disposto no n.º 4 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 185/2003, e editado no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 52/2004, de 29 de outubro, contempla as disposições aplicáveis à cessação antecipada dos CAE, estabelecendo no n.º 2 do artigo 2.º que a cessação antecipada dos CAE determina a atribuição a um dos seus titulares (produtor ou entidade concessionária da RNT) do direito ao recebimento de compensações pela cessação antecipada de tais contratos, as quais têm o intuito de garantir a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados pelos contratos anteriores, que não estejam devidamente garantidos através das receitas esperadas em regime de mercado;

11.ª – As regras aplicáveis à determinação do montante dos CMEC e dos respetivos ajustamentos são enunciadas no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, estabelecendo-se no n.º 5 que os montantes dos CMEC são suscetíveis de ajustamentos anuais e de um ajustamento final;

12.ª – Os ajustamentos anuais devem ser efetuados nos termos do n.º 6 do referido artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, com base nos critérios constantes dos artigos 4.º a 6.º do Anexo I e nas condições enunciadas no artigo 11.º (n.os 1 a 11), todos daquele diploma;

13.ª – No caso de os ajustamentos anuais conduzirem à determinação de montantes devidos aos produtores – ajustamentos positivos, o respetivo valor será repercutido nas tarifas pela totalidade dos consumidores de energia elétrica no território nacional, constituindo encargos respeitantes ao uso global do sistema a incorporar como componentes permanentes da tarifa de uso global do sistema (n.º 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 240/2004);

14.ª – E no caso de os ajustamentos anuais conferirem à entidade concessionária da RNT o direito a compensações – ajustamentos negativos, os respetivos montantes pagos por cada produtor devem ser repercutidos para posterior redução da tarifa UGS, de forma a garantir uma repartição equitativa entre todos os consumidores do sistema elétrico (n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 240/2004);

15.ª – O Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, que, num novo quadro, estabelece os princípios gerais relativos à organização e funcionamento do sistema elétrico nacional, no n.º 3 do artigo 61.º, atinente aos princípios aplicáveis ao cálculo e à fixação das tarifas, inclui nos custos de interesse económico geral, entre outros, a diferença entre os encargos totais com a aquisição e a receita proveniente da venda da energia elétrica adquirida ao abrigo dos CAE em vigor e os encargos com os CMEC;

16.ª – A tarifa de Uso Global do Sistema (UGS), a aplicar às entregas dos operadores das redes de distribuição, deve proporcionar os proveitos a recuperar pelos operadores das redes de distribuição, relativos à compra e venda de energia elétrica do agente comercial, à gestão global do sistema, ao diferencial de custo com a aquisição de energia elétrica a produtores em regime especial, aos custos para a manutenção do equilíbrio contratual e aos défices tarifários, entre outros (cfr. n.º 2 do artigo 65.º do Regulamento Tarifário – Regulamento n.º 551/2014);

17.ª – E a UGS é composta por duas parcelas: a parcela I permite recuperar os custos de gestão do sistema e a parcela II permite recuperar os custos decorrentes de medidas de política energética, ambiental ou de interesse económico geral e os custos para a manutenção do equilíbrio contratual dos produtores com CAE (cfr. n.º 1 do artigo 66.º também do Regulamento Tarifário);

18.ª – No âmbito dos CAE, há que considerar o complexo quadro legal e contratual, impondo-se, portanto, atentar nos próprios contratos e, no caso de cessação antecipada, nos respetivos acordos de cessação;

19.ª – De acordo com o estipulado na Cláusula 21 dos CAE (“Alterações nas circunstâncias”), é considerada uma alteração relevante a introdução, imposição, cobrança, tributação ou qualquer alteração de imposto relevante, que à data da assinatura do contrato não existisse ou não afetasse o produtor;

20.ª – Ora, a CESE, tal como de descreveu, trata-se de uma contribuição financeira, não podendo ser considerada imposto;

21.ª – Destarte, a CESE não é suscetível de dar azo à aplicação da cláusula 21 dos CAE sobre alteração das circunstâncias;

22.ª – De todo o modo, independentemente da natureza da CESE (contribuição ou imposto), conforme estabelecido pelo legislador, e já referido na 3.ª conclusão, as importâncias suportadas pelos sujeitos passivos a título da CESE não são repercutíveis;

23.ª – E, de acordo com o disposto no citado n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014, no que concerne à redução da dívida tarifária, o montante da CESE alocada ao FSSSE é deduzido aos custos de interesse económico geral, não devendo, pois, nunca agravar, mas sim beneficiar os consumidores;

24.ª – Trata-se de uma opção clara do legislador, refletida em normas imperativas – os referidos n.º 1 do artigo 5.º do regime da CESE e n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014 –, já que os consumidores não são sujeitos passivos da CESE e se as respetivas importâncias viessem a ser adicionadas à UGS seriam a final os consumidores a suportá-las;

25.ª – As importâncias suportadas a título da CESE também não permitem o ajustamento do encargo fixo devido ao produtor responsável pelo centro eletroprodutor previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º do Anexo I do Decreto-Lei n.º 240/2004;

26.ª – Assim, as importâncias a título da CESE suportadas pelos centros eletroprodutores partes de contratos de aquisição de energia – CAE –, em vigor, não são suscetíveis de permitir a aplicação das respetivas cláusulas sobre alteração das circunstâncias, nem, de todo o modo, de adicionamento à tarifa de Uso Global do Sistema;

27.ª – Também, a CESE não é suscetível de repercussão nos ajustamentos anuais aos montantes dos CMEC, nos termos do n.º 6 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, com base nos critérios constantes dos artigos 4.º a 6.º do Anexo I e nas condições enunciadas no artigo 11.º, todos daquele diploma.


ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 29 DE JUNHO DE 2017.

Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha – Maria Manuela Flores Ferreira (Relatora) – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita – Com declaração de voto em anexo) – Eduardo André Folque da Costa Ferreira – João Eduardo Cura Mariano Esteves – Vinício Augusto Pereira Ribeiro – Maria Isabel Fernandes da Costa – Maria de Fátima da Graça Carvalho – Fernando Bento .


(Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita)
declaração de voto
Voto o parecer concordando com a resposta às perguntas colocadas no sentido da força imperativa do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014 não ser afetada por quaisquer contratos celebrados com produtores de energia, devendo os custos inerentes à contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE) ser integralmente suportados pelos produtores de energia sem qualquer repercussão na entidade concessionária da RNT ou terceiros, nomeadamente, por via das tarifas de uso global do sistema.
Entende-se, contudo, que deve ser sublinhado que a pretensão dos produtores de energia elétrica transferirem custos da CESE para terceiros, ao abrigo dos contratos de aquisição e energia (CAE) nunca poderia merecer tutela jurídica por razões de fundo independentes da qualificação da CESE — sem embargo da evolução recente das taxonomias de tributos e respetivo reflexo na CESE, em particular a sua qualificação como contribuição financeira, num contexto de reconceptualização de algumas categorias de tributos[102].
Pretendendo o legislador estabelecer de forma imperativa os efeitos financeiros de um novo tributo e sua incidência em determinados agentes económicos, como sucedeu de forma inequívoca com o n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 55/2014, a sua operatividade não poderia ser condicionada ou restringida por contratos anteriores celebrados com entidades públicas, ainda que o tributo fosse qualificado como imposto. Cláusulas contratuais como a cláusula 21 dos CAE transcrita no parecer, na medida em que constituam prescrições com o sentido de obstar ou condicionar (ainda que de forma indireta) efeitos da atividade legislativa democrática superveniente, em particular quanto ao que se apresente como «alteração fiscal relevante» impedindo, por exemplo, «efeitos financeiros de tais alterações sobre» agentes económicos outorgantes do contrato afiguram-se nulas e insuscetíveis de constranger o exercício do poder legislativo em matéria fiscal (que compreende a decisão sobre o impacto financeiro subjetivo do tributo).
Sem necessidade de desenvolvimentos incompatíveis com a economia da presente declaração de voto permitimo-nos apenas sublinhar que mutatis mutandis subsistem válidas as coordenadas e reflexão subjacentes às conclusões 10.ª, 12.ª e 15.ª do parecer n.º 4/2012, de 19-4-2012[103]:
«10- Uma eventual pretensão de definir ou condicionar os termos do exercício do poder legislativo por via de um negócio jurídico bilateral […] não pode merecer tutela jurídica.
«12- Caso tivesse existido um negócio jurídico ou um contrato promessa nesses termos, o mesmo teria de se considerar nulo e insuscetível de produzir efeitos em face do disposto nos artigos 294.º e 286.º do Código Civil.
«15- Mesmo o órgão constitucional com poder para, numa determinada legislatura, aprovar a legislação sobre o modelo de privatização não a podia negociar com interessados privados fora dos quadros estabelecidos no decreto-lei que regula a reprivatização da TAP, garantindo sem cobertura nesse diploma uma percentagem de participação no capital social no processo de reprivatização que vinculasse para futuro o Estado, pois o exercício do poder legislativo em matéria reservada não pode ser determinado por negócios com privados celebrados com esse desiderato.»
Seguindo a mesma matriz interpretativa[104], afiguram-se contrárias à ordem pública cláusulas com natureza sinalagmática em que entidades públicas, fora do processo legislativo vinculado para emanação de normas de natureza fiscal e sem respeito dos respetivos quadros procedimentais e de competências, pretendessem imunizar certos agentes económicos (em particular ao nível da tributação dos respetivos rendimentos económicos advenientes do contrato) contra efeitos do futuro exercício de poderes de soberania fiscal do Estado no quadro estabelecido pela Constituição — questão distinta, embora conexa, são os limites estabelecidos legislativamente a alterações normativas, seu impacto e relevo jurídico, em face das reservas de competência sobre a matéria, e os próprios fins constitucionais dos impostos.
Recorde-se que, nos termos do artigo 103.º, n.º 1, da Constituição, «o sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza». Prescevendo-se no número 2 desse artigo 103.º que «os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes». Desta forma, a repartição subjetiva dos rendimentos e da riqueza determinada por normas fiscais não pode ser alterada por cláusulas contratuais prévias ao juízo dos órgãos de soberania com poder legislativo, concretizado na emanação da concreta lei fiscal — ainda que essa repercussão fosse empreendida por via indireta, através da modificação automática dos contratos redirecionando, com base nessa fonte contratual, efeitos financeiros de novo tributo para pessoas distintas do sujeito passivo do imposto.
Vincular, por via contratual, o poder legislativo do Estado em matéria fiscal (que compreende, como é óbvio, estabelecer «efeitos financeiros» sobre determinados sujeitos passivos de imposto) viola regras constitucionais imperativas sobre o exercício do poder legislativo fiscal, bem como o princípio do Estado de direito democrático (incluindo a alternância democrática dos órgãos de soberania titulares dos poderes executivo e legislativo).
Em face do exposto, ainda que se qualificassem as prescrições legislativas com impacto financeiro nos produtores de energia como novos impostos, a força imperativa dessas «alterações fiscais relevantes» teria de operar por força da lei respetiva, que estabelecendo os «efeitos financeiros de tais alterações sobre» os produtores de energia, implicaria que esses efeitos nunca poderiam ser afastados por força de claúsulas contratuais anteriores que estabelecessem que a sua repercussão incidisse em terceiros — nomeadamente, o Estado, entidade concessionária de setor público, ou consumidores de determinado serviço essencial. Tal repercussão em terceiros distintos da norma legal sobre o imposto que determina a respetiva incidência, por via de cláusulas contratuais prévias à «alteração fiscal», determinaria a nulidade dessas cláusulas, em face do disposto nos artigos 294.º e 286.º do Código Civil ou do artigo 284.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos (consoante o diploma aplicável), nomeadamente se estabelecidas em contratos de aquisição de energia celebrados entre a REN – Rede Elétrica Nacional, S.A. (Concessionária da RNT – Rede Nacional de Transporte) e produtores de energia.








[1] Deve pretender referir-se o Anexo II.
[2] Revoga o anterior Regulamento Tarifário, aprovado pelo Regulamento n.º 496/2011, de 19 de agosto (alterado pela Diretiva n.º 6/2011, de 22 de agosto e pela Diretiva n.º 1/2014, de 3 de janeiro) – publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 159, de 19 de agosto de 2011.
[3] Editado no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 52/2004, de 29 de outubro.
[4] E alterado pelas Leis n.os 82-B/2014, de 31 de dezembro, 33/2015, de 27 de abril, 159-C/2015, de 30 de dezembro, e 42/2016, de 28 de dezembro.
[5] Cuja redação atual é a seguinte:
«Artigo 2.º

Incidência Subjetiva

São sujeitos passivos da contribuição extraordinária sobre o setor energético as pessoas singulares ou coletivas que integram o setor energético nacional, com domicílio fiscal ou com sede, direção efetiva ou estabelecimento estável em território português, que, em 1 de janeiro de 2015, se encontrem numa das seguintes situações:

a) Sejam titulares de licenças de exploração de centros eletroprodutores, com exceção dos localizados nas Regiões Autónomas dos Açores ou da Madeira;
b) Sejam titulares, no caso de centros eletroprodutores licenciados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, de licença de reprodução e tenham sido considerados em condições de ser autorizada a entrada em exploração, conforme relatório de vistoria elaborado nos termos do n.º 5 do artigo 21.º do referido decreto-lei, com exceção dos localizados nas Regiões Autónomas dos Açores ou da Madeira;
c) Sejam concessionárias das atividades de transporte ou de distribuição de eletricidade, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 104/2010, de 29 de setembro, 78/2011, de 20 de junho, 75/2012, de 26 de março, 112/2012, de 23 de maio, e 215-A/2012, de 8 de outubro;
d) Sejam concessionárias das atividades de transporte, de distribuição ou de armazenamento subterrâneo de gás natural, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 140/2006, de 26 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 65/2008, de 9 de abril, 66/2010, de 11 de junho, e 231/2012, de 26 de outubro;
e) Sejam titulares de licenças de distribuição local de gás natural, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 140/2006, de 26 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 65/2008, de 9 de abril, 66/2010, de 11 de junho, e 231/2012, de 26 de outubro;
f) Sejam operadores de refinação de petróleo bruto e de tratamento de produtos de petróleo, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 31/2006, de 15 de fevereiro;
g) Sejam operadores de armazenamento de petróleo bruto e de produtos de petróleo, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 31/2006, de 15 de fevereiro;
h) Sejam operadores de transporte de petróleo bruto e de produtos de petróleo, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 31/2006, de 15 de fevereiro;
i) Sejam operadores de distribuição de produtos de petróleo, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 31/2006, de 15 de fevereiro;
j) Sejam comercializadores grossistas de gás natural, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 140/2006, de 26 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 65/2008, de 9 de abril, 66/2010, de 11 de junho, e 231/2012, de 26 de outubro;
k) Sejam comercializadores grossistas de petróleo bruto e de produtos de petróleo, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 31/2006, de 15 de fevereiro;
l) Sejam comercializadores grossistas de eletricidade, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 104/2010, de 29 de setembro, 78/2011, de 20 de junho, 75/2012, de 26 de março, 112/2012, de 23 de maio, e 215-A/2012, de 8 de outubro;
m) Seja comercializador do Sistema Nacional de Gás Natural (SNGN), nos termos definidos no artigo 39.º-A do Decreto-Lei n.º 140/2006, de 26 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 65/2008, de 9 de abril, 66/2010, de 11 de junho, e 231/2012, de 26 de outubro.»
[6] Cuja redação atual é a seguinte:
«Artigo 3.º

Incidência Objetiva
1 – A contribuição extraordinária sobre o setor energético incide sobre o valor dos elementos do ativo dos sujeitos passivos que respeitem, cumulativamente, a:

a) Ativos fixos tangíveis;
b) Ativos intangíveis, com exceção dos elementos da propriedade industrial;e
c) Ativos financeiros afetos a concessões ou a atividades licenciadas nos termos do artigo anterior.

2 – No caso previsto na alínea m) do artigo anterior, a contribuição extraordinária sobre o setor energético incide ainda, para além dos elementos previstos no número anterior, sobre o valor económico equivalente dos contratos de aprovisionamento de longo prazo em regime de take-or-pay, previstos no artigo 39.º-A do Decreto-Lei n.º 140/2006, de 26 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 65/2008, de 9 de abril, 66/2010, de 11 de junho, e 231/2012, de 26 de outubro.
3 – A contribuição extraordinária sobre o setor energético incide ainda sobre o excedente apurado para o valor económico equivalente dos contratos a que se refere o número anterior, tendo em conta a informação sobre o real valor desses contratos.
4 – No caso das atividades reguladas, a contribuição extraordinária sobre o setor energético incide sobre o valor dos ativos regulados aceites pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) na determinação dos proveitos permitidos recuperados pelas tarifas do ano seguinte, caso este seja superior ao valor dos ativos referidos no n.º 1.
5 – Para efeitos do n.º 1, entende-se por,”valor dos elementos do ativo” os ativos líquidos reconhecidos na contabilidade dos sujeitos passivos, com referência a 1 de janeiro de 2015, ou no 1.º dia do exercício económico, caso ocorra em data posterior.
6 – O valor económico equivalente dos contratos previstos no n.º 2 é determinado por aplicação da fórmula prevista no anexo I a este regime, que dele faz parte integrante, cujos parâmetros e valores são definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área da energia, ouvidas a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) e a ERSE, no prazo de 60 dias após a entrada em vigor da presente lei, os quais devem ter em conta a informação disponível, designadamente a relativa à duração dos contratos, às quantidades contratadas e às regras de cálculo do preço do gás previstas nos contratos.
7 – Nas situações previstas no n.º 3, o excedente do valor económico equivalente dos contratos corresponde à diferença positiva entre o valor económico equivalente apurado com a informação sobre o real valor desses contratos, designadamente a relativa à sua duração, às quantidades contratadas e às regras de cálculo do preço do gás previstas nos contratos, aplicando-se ao excedente a metodologia prevista no anexo I a este regime, considerando como ano base de valor unitário para efeitos do parâmetro k o ano de 2017 e o valor económico equivalente inicialmente apurado, ao qual é aplicável a Portaria n.º 157-B/2015, de 28 de maio.
8 – O valor do excedente ao valor económico equivalente é apurado fazendo-se uso de parâmetros e valores que são definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área da energia, ouvidas a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) e a ERSE, no prazo de 60 dias após a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2017.
9 – Nos casos em que a obrigação prevista no n.º 8 do artigo 7.º não é cumprida de forma atempada, impedindo a ponderação da informação ali mencionada para efeitos de elaboração e aprovação da portaria referida no número anterior, o pagamento da contribuição extraordinária sobre o setor energético passa a ter natureza de pagamento por conta da contribuição extraordinária sobre o setor energético definitiva, procedendo-se à cobrança do valor remanescente ou ao reembolso do excesso pago, consoante o caso, após análise dos mencionados documentos e informações necessárias à aplicação da contribuição extraordinária.
10 – Nos casos em que a obrigação prevista no n.º 7 do artigo 7.º não é cumprida de forma atempada, impedindo a ponderação da informação ali mencionada para efeitos de elaboração e aprovação da portaria referida no número anterior, o pagamento da contribuição extraordinária sobre o setor energético passa a ter natureza de pagamento por conta da contribuição extraordinária sobre o setor energético definitiva, procedendo-se à cobrança do valor remanescente ou ao reembolso do excesso pago, consoante o caso, após análise dos mencionados documentos e informações necessárias à aplicação da contribuição extraordinária.
11 – A liquidação, a cobrança e o pagamento da contribuição extraordinária sobre o setor energético cobrada ao abrigo deste artigo segue, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 7.º e 8.º
12 – Para efeitos do disposto no n.º 4, entende-se por “valor dos ativos regulados” o valor reconhecido pela ERSE para efeitos de apuramento dos proveitos permitidos, com referência a 1 de janeiro de 2015.
13 – Para efeitos do disposto n.º 3, entende-se por “valor dos ativos regulados” o valor reconhecido pela ERSE para efeitos de apuramento dos proveitos permitidos, com referência a 1 de janeiro de 2015.»

[7] Redação dada pela Lei n.º 33/2015.
[8] Pedro Gonçalves e Licínio Lopes Martins, “Os serviços Públicos Económicos e a Concessão no Estado Regulador”, in Estudos de Regulação Pública – I, Coimbra Editora, 2004, págs. 173 e ss., que se seguirá de perto.
[9] Ao invés do que aconteceu nos Estados Unidos da América, onde se instuituíram os “monopólios privados regulados”, no setor das public utilities.
[10] Ibidem, pág. 178.
[11] Que implicou não apenas o desmantelamento de certos monopólios públicos, como também a eliminação de condicionamentos administrativos de vária ordem.
[12] Vide Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho.
[13] Vide Maria João Estorninho, “Concessão de serviços públicos – que futuro?, in Direito e Justiça, volume especial, 2005, pág. 22.
[14] Vide, deste Conselho Consultivo, nomeadamente os Pareceres n.os 66/2005, de 30 de junho de 2005, publicado no Diário da República, II Série, n.º 167, de 31 de agosto de 2005, e 126/2005 de 11 de maio de 2006, publicado no Diário da República, II Série, n.º 51, de 13 de março de 2007.
[15] Decreto-Lei n.º 20/81, de 28 janeiro, e Lei n.º 21/82, de 28 de julho.
[16] O Decreto-Lei n.º 344-B/82, de 1 de setembro, devolveu aos municípios o direito de distribuição de energia elétrica de baixa tensão.
[17] Cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 99/91.
[18] Os Decreto-Leis n.os 182/95, 183/95, 184/95, 185/95 e 186/95 foram alterados pelo Decreto-Lei n.º 56/97, de 14 de março, que também revogou o Decreto-Lei n.º 188/95. O Decreto-Lei n.º 182/95 foi ainda alterado pelos Decreto-leis n.os 24/99, de 28 de janeiro, 198/2000, de 24 de agosto, 69/2000, de 25 de março, 85/2002, de 6 de abril; e, mais recentemente, aquele diploma legal foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro. O Decreto-Lei n.º 187/95 foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 44/97, de 20 de fevereiro. O Decreto-Lei n.º 183/95 sofreu alterações sucessivas pelos Decretos-Leis n.os 198/2000 e 153/2004, de 30 de julho.
[19] JO n.º 27, de 30 de janeiro de 1997.
[20] Dos considerandos preambulares da referida Diretiva.
[21] No JO n.º 176, de 15 de julho de 2003. Essa Diretiva foi entretanto alterada pelas Diretivas n.os 2004/85/CE, do Conselho , de 28 de junho de 2004, e 2008/3/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de janeiro de 2008, apenas quanto à aplicação de certas disposições à Estónia (JO n.º 236, de 7 de julho de 2004, e JO n.º 17, de 22 de janeiro de 2008, respetivamente).
[22] Cfr. considerandos preambulares da citada Diretiva.
[23] Retificado pela Declaração de Retificação n.º 1-A/2005, de 17 de janeiro, e alterado pelos Decretos-Leis n.os 199/2007, de 18 de maio, 264/2007, de 24 de julho, e 32/2013, de 26 de fevereiro.
[24] Cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006.
[25] Cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006.
[26] Cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006.
[27] Cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006.
[28] Cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006.
[29] O diploma foi alterado pelos decretos-Leis n.os 104/2010, de 29 de setembro, 78/2011, de 20 de junho, que o republicou, 75/2012, de 26 de março, 112/2012, de 23 de maio, 215-A/2012, de 8 de outubro, que o republicou, e 178/2015, de 27 de agosto, e pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro.
[30] Na redação atual do diploma, que é a que se seguirá.
[31] O artigo 6.º (versão atual) dispõe:
«Artigo 6.º
Proteção dos consumidores

1 – (revogado)
2 – No exercício das atividades abrangidas pelo presente decreto-lei, é assegurada a proteção dos consumidores, nomeadamente quanto à prestação do serviço, ao exercício do direito de informação, à qualidade da prestação do serviço, às tarifas e preços, à repressão de cláusulas abusivas e à resolução de litígios, de acordo com o previsto na Lei nº 23/96, de 26 de julho, alteradas pelas Leis n.os 12/2008, de 26 de fevereiro, 24/2008, de 2 de junho, 6/2011, de 10 de março, e 44/2011, de 22 de junho.
3 – Para os efeitos do disposto no número anterior, são adotados os seguintes mecanismos:

a) Disponibilização de uma plataforma centralizada que preste aos consumidores de energia toda a informação necessária ao exercício dos seus direitos, a indicação da legislação em vigor e os meios de resolução de litígios disponíveis;
b) O tratamento eficiente das reclamações através da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), e a resolução extrajudicial de litígios, nos termos previstos na lei, nomeadamente na Lei nº 23/96, de 26 de julho e nos Estatutos da ERSE, aprovados pelo Decreto-Lei nº 97/2002, de 12 de abril, alterado pelos Decretos-Leis n.os 200/2002, de 25 de setembro, e 212/2012, de 25 de setembro.

4 – É assegurada proteção ao cliente final economicamente vulnerável, através da adoção de medidas de salvaguarda destinadas a satisfazer as suas necessidades de consumo, designadamente em matéria de preços e de proibição de cortes de ligação.
5 – As associações de consumidores têm o direito de ser consultadas na definição do enquadramento jurídico das atividades previstas no presente decreto-lei.
6 – (Revogado)»
[32] Por comercializador de último recurso entende-se a entidade titular de licenças de comercialização de energia elétrica sujeita a obrigações de serviço universal (cfr. alínea k) do artigo 3.º).
[33] Alterado pelos Decretos-Leis n.os 237-B/2006, de 18 de dezembro, 199/2007, de 18 de maio, 226-A/2007, de 31 de maio, 264/2007, de 24 de julho, 23/2009, de 20 de janeiro, 104/2010, de 29 de setembro, e 215-B/2012, de 8 de outubro, que o republica, pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, e pelo Decreto-Lei n.º 38/2017, de 31 de março.
[34] Publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 241, de 15 de dezembro de 2014, e que revogou o Regulamento Tarifário aprovado pelo Regulamento n.º 496/2011, de 19 de agosto, e alterado pela Diretiva n.º 6/2011, de 22 de agosto, e pela Diretiva n.º 1/2014, de 3 de janeiro.
[35] Publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 246, de 22 de dezembro de 2014, e que revogou o Regulamento de Relações Comerciais aprovado pelo Regulamento n.º 496/2011, de 19 de agosto, e alterado pelos Regulamentos n.os 468/2012, de 12 de novembro, e 489/2013, de 31 de dezembro.
[36] Esta temática foi já tratada no Parecer n.º 39/2012, de 21 de março de 2013, deste Conselho Consultivo, publicado no Diário da República, II Série, n.º 87, de 7 de maio de 2013, que iremos seguir.
[37] Redação do Decreto-Lei n.º 56/97, de 14 de março.
[38] Licença não vinculada era a «licença mediante a qual o titular não assume o compromisso de alimentar o SEP, explorando a atividade para satisfação de necessidades próprias ou de terceiros, através de contratos comerciais não regulados» – artigo 4.º, alínea e).
[39] Redação do Decreto-Lei n.º 56/97.
[40] Sobre esta figura, vide PEDRO GONÇALVES, Regulação, Eletricidade e Telecomunicações, – Estudos de Direito Administrativo da Regulação, Coimbra Editora, 2008, pág. 86.
[41] Acompanhou-se a nota preambular do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro.
[42] Vide o elenco dos encargos apresentado pela ERSE no documento consultável em http://www.erse.pt/, “Análise do Decreto-Lei n.º 240/2004”, março 2005, págs. 3-4. Como aí se refere, o encargo fixo inclui as seguintes parcelas, indexadas a diferentes índices de preços: (a) a remuneração, a uma taxa pré-estabelecida, do ativo líquido e do investimento adicional; (b) as amortizações mensais do ativo e do investimento adicional; (c) os valores pré-estabelecidos dos custos mensais de operação e manutenção; (d) a remuneração do stock de combustível das centrais termoelétricas. Quanto aos custos variáveis, eles «estão diretamente relacionados com a produção de eletricidade», tendo a tecnologia que seja empregue por cada centro na produção de energia elétrica influência nos seus custos variáveis.
[43] Publicada no Diário da República, I série-B, de 28 de abril de 2003.
[44] Acompanhou-se o estudo, realizado pelo Conselho de Reguladores do MIBEL, “Descrição do funcionamento do MIBEL” – novembro de 2009, disponível em http://www.cmvm.pt., pág. 81.
[45] “Descrição do funcionamento do MIBEL”, cit., pág. 81.
[46] “Preços, tributos e entidades reguladoras independentes”, Ciência e Técnica Fiscal, n.º 418, Julho-Dezembro de 2006, pág. 131.
[47] Nuno Oliveira Garcia, ob. e loc. cits. Sobre este tópico, v. Pedro Gonçalves, Regulação, Eletricidade e Comunicações, cit., págs. 85-86.
[48] Este diploma foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, sem prejuízo da vigência transitória do seu artigo 13.º
[49] Retificado e republicado pela Declaração de Retificação n.º 1-A/2005, de 17 de janeiro de 2005, e alterado pelos Decretos-Leis n.os 199/2007, de 18 de maio, 264/2007, de 27 de julho, e 32/2013, de 26 de fevereiro.
[50] Proposta que esteve na base da Lei n.º 52/2004, de 29 de outubro (autorização legislativa), publicada no Diário da Assembleia da República, II série A, n.º 6, de 2 de outubro de 2004. A discussão na generalidade encontra-se documentada no Diário da Assembleia da República, I série, n.º 10, de 8 de outubro de 2004.
[51] Referindo-se o artigo 4.º ao cálculo do montante de revisibilidade anual afeto à compensação devida pela cessação antecipada dos CAE, o artigo 5.º à forma de acerto de contas relativo à revisibilidade anual das compensações devidas pela cessação antecipada dos CAE, e o artigo 6.º ao cálculo do valor mensal da parcela de acerto da tarifa UGS.
[52] Ao cálculo do valor do ajustamento final refere-se o artigo 7.º do anexo I.
[53] Cessaram os CAE relativos às centrais pertencentes à EDP Produção, mantendo-se em vigor os contratos de aquisição de energia celebrados com a Tejo Energia (Central do Pego) e com a Turbogás (Central da Tapada do Outeiro).
[54] Mercado a prazo, mercado spot e mercado bilateral.
[55] Citou-se o estudo realizado pelo Conselho de Reguladores do MIBEL, “Descrição do funcionamento do MIBEL”, sobre a “Aplicação do mecanismo dos CMEC em Portugal”, págs. 81-82.
[56] Estudo citado, pág. 83.
[57] “MIBEL: o início do embuste”, RevCEDOUA, cit., pág. 41 (nota 32).
[58] A Comissão considerou que a medida em causa (CMEC) é compatível com a derrogação prevista no n.º 3, alínea c) do artigo 87.º do Tratado CE, tendo decidido não levantar objeções relativamente à mesma. A decisão da Comissão, adotada em 22 de setembro de 2004, encontra-se referenciada no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 250, de 8 de outubro de 2005, juntamente com outras decisões sobre a «Autorização de auxílios concedidos pelos Estados no âmbito das disposições dosa artigos 87.º e 88.º do Tratado CE a respeito dos quais a Comissão não levanta objeções. O texto da decisão está disponível em http://europa.eu.int/comm/secretariat_general/sgb/state_aids/.
[59] Contrato, cujo exemplar nos foi remetido em 31 de maio de 2017, via e-mail, e que corresponderá aos CAE celebrados.
[60] A cláusula 2.ª referente à entrada em vigor do Acordo tinha a seguinte redação:
CLÁUSULA 2.ª
(Condições suspensivas e entrada em vigor do Acordo)
1. A produção de efeitos do presente Acordo fica subordinada, nos termos estabelecidos no número 2 seguinte, à verificação cumulativa, até 27 de janeiro de 2008, das seguintes condições:
a) Atribuição ao produtor de licença de produção de energia elétrica para o Centro Electroprodutor, conforme previsto no artigo 14.° do Decreto-Lei n.° 240/2004, de 27 de dezembro;
b) Celebração de um Acordo de Acesso e Operação das Redes para entrega de energia à rede a que se encontre ligado o Centro Electroprodutor;
c) Entrada em vigor da regulamentação necessária para a concretização e plena execução das disposições legais constantes do Decreto-Lei n.° 240/2004, de 27 de dezembro, em termos coincidentes com o regime previsto nessas disposições legais, de forma a manter inalterados os direitos, obrigações e interesses tutelados do Produtor, dos seus cessionários e da Entidade Concessioiária da RNT previstos naquele diploma;
d) Entrada em vigor da portaria do Ministro responsável pela área da energia que defina a taxa nominal referenciada ao custo médio de capital do Produtor, em termos coincidentes com o efetivo custo médio de capital do Produtor, ao abrigo do disposto na subalínea i) da alínea b) do número 4 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.° 240/2004, de 27 de dezembro;
e) Entrada em vigor da portaria do Ministro responsável pela área da energia que estabeleça o coeficiente de ajustamento da produção de energia elétrica, nos termos previstos no número 4 do anexo IV do Decreto-Lei n.° 240/2004, de 27 de dezembro, em termos coincidentes com a opinião das Partes constante do Anexo IV ao presente Acordo;
f) Aprovação do presente Acordo por despacho do Ministro responsável pela área da energia e respetiva publicação em Diáio da República, conforme previsto no número 2 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro;
g) Celebração da Adenda ao presente Acordo prevista no número 3 da CIáusula 3.ª e no número 2 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro;
h) Entrada em vigor do despacho do Ministro responsável pela área da energia que aprove a Adenda ao presente Acordo indicada na alínea anterior, nos termos do disposto no número 3 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro;
i) Entrada em funcionamento do mercado organizado a que alude o número 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de agosto, em condições que assegurem ao Produtor a venda de energia elétrica produzida, incluindo mediante contratação à vista, conforme previsto no número 4 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro;
j) Entrada em vigor do despacho do Ministro responsável pela área da energia previsto na alínea a) do número 2 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.° 240/2004, de 27 de dezembro, que aprove, previamente à cessação antecipada do Contrato, a proposta apresentada pelo Produtor quanto ao valor estimado dos encargos referidos na subalínea (ii), alínea b, do número 4 do artigo 5.º daquele diploma.
2. Não obstante a assinatura do presente Acordo, o Contrato permanece plenamente em vigor nos seus respetivos termos, apenas ocorrendo a sua cessação antecipada por força do disposto no número 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, após a verificação cumulativa quer das condições previstas no número anterior, dentro do prazo aí previsto, quer das condi;ões previstas no número 1 da cláusula 1.ª de cada um dos demais Acordos de Cessação celebrados, na presente data, pelas Partes, dentro do prazo previsto em cada uma dessas cláusulas, com a receção pela Entidade Concessionária da RNT de comunicação do Produtor na qual se informe que todas as aludidas condições se encontram tempestivamente verificadas.
3. A cessação antecipada do Contrato nos termos indicados no número anterior tem por efeito a extinção de todos os direitos e obrigações decorrentes do Contrato para a Entidade Concessionária da RNT e para o Produtor, e a atribuição ao Produtor e à Entidade Concessionária da RNT dos direitos previstos no aludido diploma, nos termos regulados no presente Acordo.
4. Sem prejuízo do disposto nos números 2 e 3 anteriores, a cessação antecipada do Contrato por força do disposto no número 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, não afeta os direitos e obrigações das Partes decorrentes de eventuais acertos de faturação relativos a eventos anteriores à cessação antecipada do Contrato.
5. Em derrogação do disposto no número 2 anterior, as Cláusulas 1.ª a 4.ª, 9.ª, 10.ª e 17.ª a 25.ª entram imediatamente em vigor na data da assinatura do presente Acordo, cessando, contudo, os seus efeitos no caso de não verificação quer de qualquer das condições referidas no número 1 da presente Cláusula, no prazo aí indicado, quer de qualquer das condições referidas no número 1 da Cláusula 2.ª de cada um dos demais Acordos de Cessação celebrados, na presente data, pelas Partes, dentro do prazo nele previsto, nada podendo as Partes reciprocamente exigir-se a qualquer título.»
[61] Cfr. supra parte III.
[62] Vide artigos 1.º, n.º 2, e 11.º do regime da CESE e o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 55/2014, que criou o FSSSE.
[63] Direito Fiscal, Almedina, 2013, 7.ª edição, págs. 45/46.
[64] Cfr. ob. cit., pág. 46.
[65] Ver Manual de Direito Fiscal, Almedina, 2016, pág. 24.
[66] A redação, na íntegra, do artigo 3.º é a seguinte:
«Artigo 3.°
Classificação dos tributos

1 – Os tributos podem ser:
a) Fiscais e parafiscais;
b) Estaduais, regionais e locais.
2 – Os tributos compreendem os impostos, incluindo os aduaneiros e especiais, e outras espécies tributárias criadas por lei, designadamente as taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas.
3 – O regime geral das taxas e das contribuições financeiras referidas no número anterior consta de lei especial.»

[67] Ver, neste sentido, Casalta Nabais, ob. cit., pág. 50; e Jónatas E. M. Machado/Paulo Nogueira da Costa, ob. cit., pág. 24.
[68] Ob. cit., pág. 51.
[69] Ver ob. cit., pág. 25.
[70] Porém, Jónatas E. M. Machado/Paulo Nogueira da Costa consideram problemática a inversão metodológica refletida naquele acórdão, por entenderem que foi conferido relevo decisivo ao critério da consignação de receitas, no caso ao Fundo Sanitário de Segurança Alimentar Mais, em detrimento do critério da unilateralidade vs. bilateralidade (cfr. ob. cit., págs. 25 e ss.).
[71] Ver, a este propósito, também Sérgio Vasques, Manual de Direito Fiscal, Almedina, 2011, págs. 221 e ss.; e bem assim Suzana Tavares da Silva, As taxas e a Coerência do Sistema Tributário, Coimbra Editora, 2.ª edição, setembro 2013, págs. 82 e ss., em especial pág. 89, onde salienta que «[o] requisito da bilateralidade nas “contribuições” é […] menos exigente do que nas taxas, pois admite-se que a contraprestação seja potencial e futura e beneficie um grupo homogéneo ou um conjunto diferenciável de destinatários».
[72] Ob. cit., págs. 56/57
[73] Ver supra parte III.
[74] Cfr. partes IV e VI.
[75] Sobre a natureza administrativa dos contratos, com referência à evolução normativa, veja-se, por exemplo, o Parecer 4/2010, de 4 de maio de 2010, publicado no Diário da República, II Série, n.º 129, de 7 de julho de 2011.
[76] Retificado pela Declaração de Retificação n.º 18-A/2008, publicada no Diário da República, I Série, n.º 62, de 28 de março, e alterado pela Lei n.º 59/2008, de 9 de novembro, pelos Decretos-Leis n.os 223/2009, de 11 de setembro, e 278/2009, de 2 de outubro, que o republicou, pela Lei n.º 3/2010, de 27 de abril, pelo Decreto-Lei n.º 131/2010, de 14 de dezembro, pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, e pelos Decretos-Leis n.os 149/2012, de 12 de julho, 214-G/2015, de 2 de outubro.
[77] Contratos Públicos, reimpressão da 2.ª edição, julho de 2010, Dom Quixote, pág. 132.
[78] Vide Parecer n.º 14/2012, de 1 de junho de 2012, publicado no Diário da República, II Série, n.º 178, de 13 de setembro de 2012.
[79] Ibidem.
[80] Para mais desenvolvimento, Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Cível, 4.ª edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, págs. 443 e ss.
[81] Ob. cit. na nota de rodapé antecedente.
[82] Mota Pinto, ob. cit., págs. 448 e 449.
Vide também, Carlos Ferreira de Almeida, “Interpretação do Contrato”, in O Direito, Ano 124.º, 1992, IV, pág. 644, a propósito, justamente, da interpretação de declarações contratuais conjuntas.
[83] Ibidem.
[84] Ibidem.
[85] Carlos Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 648.
[86] Ob. cit., págs. 132/133.
[87] Ver parte VI, ponto 10.
[88] Vide parte VII.
[89] Ver supra parte V, ponto 1.
[90] Ver parte III.
[91] Cfr. artigos 2.º, 3.º e 4.º do respetivo regime (referido na parte III do presente parecer).
[92] Ver parte VII.
[93] Cfr. supra parte III.
[94] De 15 de abril de 2009 (inédito), também citado no Parecer n.º 39/2012.
[95] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro.
[96] Formulação que, aliás, não diverge substancialmente da norma correspondente do CPA de 1991.
[97] Ver, a propósito, por todos, Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado de Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo I, Dom Quixote, 2.ª edição, novembro de 2006, pág. 157.
[98] Ver supra parte IV, ponto 2.3.4.
[99] Ver supra parte VI, ponto 7.
[100] Ver supra parte VI, ponto 8.
[101] Cfr. preâmbulo da Portaria n.º 157–B/2016 (ver parte III).
[102] Cujo aprofundamento nesta sede é inviável e impertinente, atentas, nomeadamente, as condicionantes de tempo de vista, estudo e deliberação de pareceres do Conselho Consultivo por parte dos membros que não são relatores
[103] Publicado no Diário da República II.ª Série, de 30-4-2013 (também acessível na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf).
[104] Nesse parecer foi destacado que o texto objeto de análise «não podia visar a prescrição de qualquer elemento normativo, excluído pela matéria (reserva de lei e relativa a poderes dispositivos relativos à reprivatização da TAP)» acrescentando-se que «um decreto-lei que admitisse que no processo de reprivatização da TAP pudesse ser estabelecida por ato infralegal do Governo uma percentagem do capital social reservada aos pilotos da TAP seria inconstitucional».