Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00000635
Parecer: P000011994
Nº do Documento: PPA19940324000100
Descritores: ACESSO A ACTIVIDADE ECONÓMICA
SECTOR PRIVADO
ENTIDADE PRIVADA
TRATAMENTO DE LIXO
SANEAMENTO BÁSICO
RESIDUO SÓLIDO
AUTARQUIA LOCAL
SISTEMA MULTIMUNICIPAL
ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS
LIPOR
SISTEMA MUNICIPAL
ACTO ADMINISTRATIVO
CONTRATO ADMINISTRATIVO
ANULABILIDADE
NULIDADE
INEXISTÊNCIA JURÍDICA
OBJECTO LEGALMENTE IMPOSSÍVEL
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
CONCURSO PÚBLICO
CONCESSÃO ADMINISTRATIVA
EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS
CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS
FORNECIMENTO
ADJUDICAÇÃO
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
VALIDAÇÃO LEGISLATIVA
VALOR DOS PARECERES DO CONSELHO CONSULTIVO
TRIBUNAL
TUTELA ADMINISTRATIVA
Livro: 00
Pedido: 01/24/1994
Data de Distribuição: 01/25/1994
Relator: GARCIA MARQUES
Sessões: 01
Data da Votação: 03/24/1994
Tipo de Votação: UNANIMIDADE
Sigla do Departamento 1: MARN
Entidades do Departamento 1: MIN DO AMBIENTE E RECURSOS NATURAIS
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 04/05/1994
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: DR 940621
Nº do Jornal Oficial: 141
Nº da Página do Jornal Oficial: 6077
Indicação 2: ASSESSOR: MEIRIM
Área Temática:DIR ADM / DIR CIV * TEORIA GERAL / DIR ECON.
Ref. Pareceres:P002391977
P000121987
P000831988
P000071990
P000131993
P000621993
Legislação:CONST76 ART85 N2 ART243 N1 ART266 N2.; CCIV66 ART12. LPTA85 ART28 N1 C. LAL84 ART88.; CADM36 ART49 N3 ART51 N26 ART59 ART164 N3.; CPADM91 ART30 N3 ART133 ART134 ART135 ART136 ART137 ART139 ART141 ART178 N2 C. DL 379/93 DE 1993/11/05 ART1 ART2 ART6 ART7 ART8 ART9 ART10 ART14 ART15 ART17 ART18. LOMP86 ART34 A ART40 N1.; L 46/77 DE 1977/07/08 ART4 N1 B D N2 ART7 ART8.; DL 339/91 DE 1991/09/10.; DL 449/88 DE 1988/12/10.; L 58/93 DE 1993/08/06 ART2.; DL 99/84 DE 1984/03/29. DL 412/89 DE 1989/11/29 ART1 ART2 ART3 ART7 ART11. DL 390/82 DE 1982/09/17 ART1 ART2 ART10.; DL 235/86 DE 1986/08/18 ART1.; DL 413/91 DE 1991/10/19. DL 372/93 DE 1993/10/29.
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1 - A LIPOR - Serviço Intermunicipalizado de Tratamento de Lixos da Região do Porto - é uma associação de municípios, constituída pelos municípios de Espinho, Gondomar, Maia, Porto e Valongo, com a posterior admissão de Matosinhos e Vila do Conde, tendo como objecto o tratamento e aproveitamento final dos lixos entregues pelos municípios associados, gerindo, mantendo e desenvolvendo as necessárias instalações e serviços privativos;
2 - Por anúncio publicado no "Diário da República", III Série, n 247, de 26 de Outubro de 1992, a LIPOR lançou um concurso público de concepção, construção, financiamento e exploração, pelo período de 15 anos, de uma estação de tratamento de resíduos sólidos pelo processo de incineração, ao qual eram admitidas empresas nacionais, agrupamentos de empresas nacionais, empresas estrangeiras agrupamentos de empresas estrangeiras e agrupamentos de empresas nacionais e estrangeiras;
3 - A essa data o acesso à actividade económica do saneamento básico era vedado a empresas privadas e a outas entidades da mesma natureza - artigo 4, n 1 alínea b), da Lei n 46/77, de 8 de Julho na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n 339/91, de 10 de Setembro;
4 - O Decreto-Lei n 372/93, de 29 de Outubro, publicado no uso de autorização legislativa concedida pela Lei n 58/93, de 6 de Agosto, veio permitir o acesso de capitais privados, em regime de concessão, às actividades de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos;
5 - A consagração do regime legal da gestão e exploração de sistemas que tenham por objecto as actividades indicadas na conclusão anterior foi feita através do Decreto-Lei n 379/93, de 5 de Novembro;
6 - O sistema de tratamento de resíduos sólidos que é objecto do concurso público referido na conclusão 2 configura-se como um "sistema municipal" sendo gerido por uma associação de municípios e não exigindo um investimento predominante por parte do Estado - artigos 4, n 2, da Lei n 46/77, na redacção dada pelo Decreto-Lei n 372/93, e 1, n 3, do Decreto-Lei n 379/93;
7 - Atento o disposto nas conclusões 3 e 4, os actos administrativos praticados com vista à abertura e ao desenvolvimento do concurso público violaram o princípio da legalidade, por virtude da impossibilidade jurídica do respectivo objecto, do que resultou a invalidade dos mesmos, com a consequente nulidade do concurso - cfr. artigo 133, ns 1 e 2, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aprovado pelo Decreto-Lei n 442/91, de 15 de Novembro;
8 - Os actos viciados podem ser, todavia, objecto de "validação" por força de lei posterior, dotada de efeitos retroactivos;
9 - Atento o disposto no artigo 18, n 1, do Decreto-Lei n 379/93, "as situações actualmente existentes" devem ser "reajustadas" ao regime estabelecido no referido diploma, no prazo máximo de 180 dias, a contar da respectiva entrada em vigor;
10- Na expressão "situações actualmente existentes" devem considerar-se incluídos: a) os processos em curso, correspondentes a concursos abertos em que ainda há adjudicação; b) os processos em que, tendo já havido adjudicação, ainda não foi outorgado o contrato de concessão; c) os processos em que o referido contrato de concessão já foi outorgado;
11- Constituindo os Decretos-Leis ns 372/93 e 379/93 um conjunto normativo coerente, unitário e telelógicamente indissociável, o escopo de produção de efeitos retroactivos que ressalta do citado n 1 do artigo 18 do Decreto-Lei n 379/93 serve à interpretação do regime de aplicação no tempo do Decreto-Lei n 372/93, iluminando-a de acordo com a sua intencionalidade;
12- Resulta das conclusões 9 a 11 que, não obstante a concalidação do concurso a que se fez referência na conclusão 8, o acto de adjudicação praticado em 4 de Janeiro do corrente ano, deveria ter sido precedido do "reajustamento" imposto por lei;
13- Não o tendo sido, a adjudicação em referência, desconforme às normas imperativas do Decreto-Lei n 379/93, é ilegal, sendo o respectivo acto contenciosamente anulável, nos termos da lei - artigos 135 e 136, n 2, do CPA, e 28 da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais (LPTA), aprovada pelo Decreto-Lei n 267/85, de 16 de Julho;
14- Se vier a ser celebrado contrato de concessão, em contradição com o disposto em normas imperativas do Decreto-Lei n 379/93, o mesmo será nulo - artigo 17 do referido diploma legal;
15- Sendo a tutela administrativa sobre as autarquias locais uma tutela de mera legalidade, e inexistindo na lei a previsão de mecanismos específicos de reacção, nomeadamente através da via do recurso tutelar, poderá o Governo, directamente, ou através do governador civil do distrito, participar ao magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo de Círculo, o vício que afecta a adjudicação efectuada com vista à interposição do competente recurso contencioso - artigos 5, ns 1 e 2, e 7, alínea c), da Lei n 87/89, de 9 de Setembro, 136, n 2, do CPA, e 28, n 1, alínea c) da LPTA;
16- O reajustamento a realizar não obriga ao recomeço do processo, mas impõe o reexame dos elementos normativos que lhe serviram de base, mormente do programa do concurso e do caderno de encargos,
à luz da disciplina do Decreto-Lei n 379/93, com vista à conformação material do procedimento com as disposições de natureza imperativa enformadoras do novo regime, implicando ainda a prática dos procedimentos consequentes.

Texto Integral:
Senhora Ministra do Ambiente e Recursos Naturais,
Excelência:


1.

Em carta datada de 21 de Janeiro findo, dirigida a
Sua Excelência o Procurador-Geral da República, escreve Vossa Excelência o seguinte:
"O programa do concurso e o caderno de encargos de concepção, construção e exploração da Estação de Tratamento de Resíduos Sólidos LIPOR II (Serviço Intermunicipalizado de Tratamento de Lixos da Região do Porto) foram elaborados numa altura em que a actividade cuja adjudicação a entidade privada previa era vedada pela alínea b) do nº 1 do artigo
4º da lei da Delimitação de Sectores - Lei nº 46/77, de 8 de Julho - com a redacção dada pelo artigo único do Decreto-Lei nº 339/91, de 10 de Setembro.
"Podem, nesta medida, surgir dúvidas quanto à legalidade de um eventual acto de adjudicação praticado pela LIPOR no mencionado concurso. Com efeito, importa questionar a validade de um acto cujo conteúdo, não sendo hoje ilegal, consubstancia a decisão de um procedimento iniciado por entidade que não tinha atribuições na matéria.
"Nestes termos, e considerando a alínea f) do artigo 202º da Constituição (1), solicita-se a V. Exª, ao abrigo do disposto no artigo 34º da Lei nº 47/86, de 15 de Outubro (2), com pedido de urgência, que se submeta a questão a parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, colocando-se, mais concretamente, os seguintes problemas: a) É ou não inválido um eventual acto de adjudicação e subsequente contrato de concessão que venha a ser praticado e celebrado pela LIPOR
II em execução e decisão do concurso mencionado?; b) Caso sejam considerados os mencionados actos inválidos, solicita-se a opinião sobre a consequência da invalidade: serão os actos referidos actos nulos ou anuláveis? c) Igualmente se solicita, caso os mencionados actos sejam considerados inválidos, se indique o procedimento a seguir pelo Estado; d) Solicita-se ainda, tendo em consideração a documentação respeitante ao Concurso Público de Concepção, Construção e Exploração da Estação de Tratamento de Resíduos Sólidos LIPOR II, que se anexa, parecer sobre a legalidade do Programa do Concurso e do Caderno de Encargos bem como da eventual adjudicação e subsequente celebração do contrato em cuja formação se inseriu o mencionado concurso público".
Cumpre, pois, emitir parecer, tendo presente a urgência imprimida à consulta.

2.

2.1. Em anexo ao pedido de parecer, foram recebidos os seguintes documentos: a) Anúncio do concurso público de concepção, construção e exploração da estação de tratamento de resíduos sólidos - LIPOR II, cuja publicação, da iniciativa da LIPOR, consta do "Diário da República", III Série, nº 247, de 26 de Outubro de 1992; b) Volume I, relativo à nota descritiva; c) Volume II, relativo ao Anúncio e programa de concurso; d) Volume III, tomo I, referente ao caderno de encargos.

2.2. Posteriormente, e na sequência de complementar solicitação, veio a ser recebida, do Gabinete de Vossa Excelência, diversa documentação, justificando-se destacar os pareceres jurídicos da autoria do Doutor Marcelo Rebelo de Sousa e do Dr. José Miguel Júdice, duas Recomendações de Sua Excelência o Provedor de Justiça, dirigidas ao Conselho de Administração da LIPOR e a resposta dada pela LIPOR à primeira das referidas Recomendações (3).

2.3. Entretanto, Sua Excelência o Provedor de Justiça dignou-se enviar exemplares das primeira e segunda Recomendações, já mencionadas, bem como da resposta da LIPOR, acompanhada por um (primeiro) parecer do Dr. Mário Esteves de Oliveira, justamente suscitado pela primeira recomendação do Senhor Provedor de Justiça (4).

2.4. Por sua vez, a LIPOR, conhecedora do pedido de parecer formulado, remeteu, por ofício de 31 de Janeiro findo, um "dossier" composto por variada documentação sobre a génese e desenvolvimento do concurso público em referência (5).
Mais tarde, mediante carta endereçada ao Senhor Conselheiro Procurador-Geral da República, em 11 de Fevereiro findo, a LIPOR expõe e refere o seguinte:
"1º - As dúvidas que se suscitaram ao membro do Governo com atribuições em matéria de Ambiente, sobre diversos aspectos de legalidade do concurso em epígrafe, levaram-no a solicitar o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria- Geral da República.
2º - Tanto quanto é do conhecimento da LIPOR, tais dúvidas prendem-se sobretudo com a eventual ilegalidade do referido concurso (e da respectiva adjudicação) face ao regime legal da delimitação de sectores e ao recente Decreto-Lei nº 379/93, de 5 de Novembro.
3º - Questão que a LIPOR confessa não ter encarado em fase de adjudicação com o máximo dos cuidados, não só porque, face às objecções suscitadas na audiência dada aos concorrentes, se impunha cuidar mais doutras questões por eles suscitadas, como também porque o próprio Governo, com sistemático acompanhamento, intervenções e promoções ao longo de todo o processo do concurso, nunca lhe levantou a mais pequena questão a este propósito.
4º - A admissão de que a LIPOR não encarou a questão com o máximo cuidado não significa, obviamente, que não a tenha encarado ou que acompanhe o Governo quanto à pertinência das dúvidas agora suscitadas. Significa apenas que naquele momento que procedeu (sic) à adjudicação, só se sentiu a necessidade de habilitar a sua deliberação com um estudo técnico-jurídico especializado em relação às principais objecções e dúvidas que então se suscitavam, pelo que, ao solicitá-lo, definiu como seu objecto apenas a questão da compatibilidade e conformidade da adjudicação e do contrato a determinada proposta e concorrente.
5º - Quando mais recentemente - antes mesmo de pôr o caso à consideração desse Conselho Consultivo
- o Governo chamou a atenção da LIPOR para essas dúvidas, resolveu este Conselho de Administração solicitar um estudo aprofundado delas, para verificar em que medida é que a deliberação tomada era ou não compatível com os referidos regimes legais de delimitação de sectores.
6º - Concluído e apresentado que foi esse estudo, o Conselho de Administração da LIPOR estaria na disposição de tomar posição sobre esta questão - eventualmente com ratificação da deliberação anterior -, se não fosse o facto de, entretanto, ter sido pedida a intervenção da Procuradoria- Geral da República, cujo parecer se resolveu, então, aguardar.
7º - De qualquer modo, constituindo o conteúdo desse estudo o actual parâmetro do Conselho de Administração da LIPOR sobre a questão e correspondendo o seu objecto às dúvidas agora suscitadas pelo Governo, vem requerer a V. Exª a sua junção ao processo que corre perante o Conselho Consultivo, pelo manifesto interesse (para-judicial, digamos assim) que o parecer a emitir tem em relação a interesses fundamentais desta Associação de Municípios e muito provavelmente à própria sobrevivência do processo LIPOR II.
8º - De resto, se as dúvidas do Governo, quanto a esta questão, tivessem sido postas em tempo oportuno, nunca a LIPOR teria deliberado sobre ela sem se munir dum estudo técnico específico.
Dispondo-se agora deste, julgou-se legítimo apresentá-lo à apreciação do Conselho Consultivo, que tem nas suas mãos a decisão de uma tão delicada questão de interesse das Autarquias Locais envolvidas.
9º - Quererá V. Exª atendendo à "angustiante" situação em que se encontra esta Associação de Municípios, tomar em conta o que nele se diz em favor da legalidade de deliberação tomada"? (6)
O estudo mencionado no texto reproduzido corresponde a um segundo parecer da autoria do Dr. Mário Esteves de Oliveira.
2.5. Resulta, assim, com suficiente clareza, dos termos da consulta que esta instância consultiva não é chamada a tomar posição sobre questões jurídicas suscitadas pelas propostas apresentadas pelos concorrentes, cujo conteúdo, aliás, se desconhece, razão por que a análise a que se procederá terá como exclusivo objecto as questões concretamente submetidas à nossa consideração.(7)


3.

3.1.Às associações de municípios reportam-se hoje, genericamente, os Decretos-Leis nºs 99/84, de 29 de Março, e 412/89, de 29 de Novembro, diploma que revogou o Decreto-Lei nº 266/81, de 15 de Setembro (artigo 22º).
São pessoas colectivas de direito público, criadas por dois ou mais municípios para a realização de interesses específicos comuns (artigo 1º do Decreto-Lei nº 412/89).
O seu fim é a realização de quaisquer interesses compreendidos nas atribuições dos municípios, salvo os que, pela sua natureza ou disposição da lei, devam ser por estes individualmente prosseguidos (artigo 2º do Decreto-Lei nº 412/89).
Às câmaras municipais dos municípios interessados compete promover as diligências necessárias à constituição da associação bem como deliberar sobre a aprovação dos estatutos e a participação do município, dependendo a eficácia daquela deliberação da aprovação da assembleia municipal (artigo 3º, nºs 1 e 2, do Decreto-
Lei nº 412/89).
As associações de municípios constituem-se por escritura pública, outorgada pelos presidentes das respectivas câmaras municipais, e a constituição é comunicada ao Ministério do Planeamento e Administração do Território para efeito de registo (artigo 3º, nºs 3 e
4, do Decreto-Lei nº 412/89).
Os órgãos das associações de municípios são a assembleia intermunicipal e o conselho de administração (artigo 5º do Decreto-Lei nº 412/89).
A assembleia intermunicipal - órgão deliberativo da associação de municípios - é constituída pelos presidentes e por vereadores de cada uma das câmaras dos municípios associados (artigo 6º, nº 1, do Decreto-Lei nº 412/89).
O conselho de administração - órgão executivo da associação de municípios - é composto por representantes dos municípios associados, eleitos pela assembleia intermunicipal de entre os seus membros (artigo 7º, nº 1, do Decreto-Lei nº 412/89).
As associações de municípios estão sujeitas à tutela legalmente prevista para os municípios (artigo
11º, do Decreto-Lei nº 412/89 (8).

3.2. O Decreto-Lei nº 390/82, de 17 de Setembro, que revogou os artigos 359º a 362º do Código Administrativo (artigo 17º), regula a execução de trabalhos de construção, reconstrução, restauro, reparação, conservação e adaptação de bens imóveis a cargo das autarquias locais, o fornecimento de bens e serviços à administração regional e local e a concessão de exclusivos, obras e serviços públicos por parte dos órgãos autárquicos (artigo 1º, nº 1).
O disposto neste diploma é aplicável igualmente às associações de municípios (artigo 1º, nº 2).
O diploma está dividido em cinco capítulos relativos ao objecto, empreitadas e administração directa, fornecimentos, concessões e disposições gerais, respectivamente.
No capítulo II, relativo às empreitadas e administração directa, disciplina-se o concurso público, o concurso limitado, o ajuste directo, a forma do contrato e a administração directa (artigos 2º a 6º, respectivamente).
No capítulo II, relativo aos fornecimentos, prescreveu-se sobre o concurso público, o concurso limitado e ajuste directo e a forma do contrato (artigos
7º, 8º e 9º, respectivamente).
No capítulo IV, que versa sobre as concessões, estabelece-se sobre o concurso público, o prazo de concessão e direito de resgate, transmissão da concessão, direito de fiscalização e forma do contrato (artigos 10º,
11º, 12º, 13º e 14º, respectivamente) (9).
No capítulo V, que se refere às disposições gerais, dipõe-se, além do mais, sobre a legislação subsidiária, visto do Tribunal de Contas, revogação e início da vigência (artigo 15º, 16º, 17º e 18º, respectivamente).
Saliente-se, neste ponto, a exigência de concurso público para a adjudicação da concessão de exclusivos, obras e serviços públicos por parte das autarquias locais e associações de municípios, depois de autorizada pela assembleia deliberativa (artigo 10º).
Do mesmo modo, quanto a empreitadas, e a fornecimentos, sublinhe-se a atribuição à assembleia deliberativa de competência para fixar, genericamente e sob proposta do executivo, o valor acima do qual as obras e os fornecimentos deverão obrigatoriamente ser feitos mediante concurso público (artigo 2º, nºs 1 a 3).
Embora não expressamente mencionado nos documentos normativos do concurso público em apreço, objecto da consulta, é manifesto que o regime do Decreto-Lei nº 390/82 é pertinente relativamente ao mesmo, cabendo na expressão "restante legislação aplicável" a que se faz referência, verbi gratia, no ponto 15. do programa do concurso e na cláusula 34. do caderno de encargos.

3.3- O Decreto-Lei nº 235/86, de 18 de Agosto, nominalmente mencionado nas referidas disposições do programa e do caderno de encargos procedeu à alteração do regime jurídico das empreitadas e fornecimento de obras públicas (10), revogando o Decreto-Lei nº 48871, de 19 de Fevereiro de 1969 (artigo 285º), cujo regime, em algumas das suas disposições, se tornara desactualizado (11) (12).
O âmbito da respectiva aplicação consistia nas empreitadas destinadas à realização de trabalhos de construção, reconstrução, restauro, reparação, conservação ou adaptação de bens imóveis, que, no território nacional, corram total ou parcialmente por conta do Estado, de associação pública ou de instituto público (artigo 1º, nº 1), aplicando-se as suas normas às autarquias locais "em tudo quanto não se encontrar previsto em legislação especial" (artigo 1º, nº 2).
Prescreve o nº 3 do referido artigo 1º que "a aplicação deste diploma às empresas públicas, bem como a empresas de economia mista ou concessionárias do Estado ou de outras entidades públicas, depende de portaria do ministro competente".

3.3.1. Excluído do objecto da consulta o problema da apreciação da conformidade das propostas, que, aliás, se desconhecem na sua literalidade, com os documentos do concurso, e tendo presente a natureza jurídica dos problemas colocados à consideração deste corpo consultivo, a demandarem busca de solução em diferente campo de análise, não se justifica detalhar a reflexão sobre o regime do diploma em apreço.
Até porque a sua referenciação expressa nos dispositivos dos elementos que servem de base ao concurso
(13) não é de molde a induzir a uma qualificação do contrato a formar em função da matéria que constitui o objecto do diploma.
O contrário representaria excessivo e indesculpável simplismo. Não é a circunstância de se remeter a resolução do que estiver "omisso" nos documentos do concurso para a disciplina do Decreto-Lei nº 235/86, de
18 de Agosto, que, só por si, habilitaria a qualificar o contrato em cuja formação o referido concurso público se situa, como um contrato administrativo de empreitada de obras públicas.
A subsunção do contrato em formação a uma (ou mais) espécie(s) legalmente tipificadas, a ser possível, pressuporá, antes de mais, a análise acerca da natureza e especialidade, eventualmente "exorbitante", do clausulado nos documentos normativos do concurso, a apreciação dos objectivos visados pela entidade adjudicante, e das componentes, entre si teleologicamente articuladas, que constituem o objecto do concurso :concepção, construção, financiamento e exploração, pelo período de 15 anos, de uma Estação de Tratamento de Resíduos Sólidos.
Jamais tal qualificação poderia ser feita em função do conteúdo de um diploma, mencionado a par da "restante legislação aplicável", para disciplina do que estiver omisso no caderno de encargos.
Integram o Capítulo II, sobre a "formação do contrato", algumas disposições que inspiraram a elaboração dos "documentos do concurso", incidindo na respectiva análise e na eventual desconformidade entre o seu conteúdo e algumas cláusulas da proposta do concorrente preferido, os fundamentos da primeira Recomendação de Sua Excelência o Provedor de Justiça no sentido de que "o Conselho de Administração da LIPOR não proceda à adjudicação da empreitada de concepção, construção e exploração da estação [...] LIPOR II, permitindo derrogações e incumprimentos do caderno de encargos e do processo de concurso em geral, em clara violação das disposições legais citados ..." (14).

4.

4.1. Por escritura de 12 de Novembro de 1982 os municípios de Espinho, Gondomar, Maia, Porto e Valongo constituiram entre si uma associação de municípios, a qual ficou, desde logo, habilitada a aceitar a admissão de outros - artigo 1º, nºs 1 e 2, dos Estatutos (bem como os demais preceitos que, neste ponto, serão indicados sem menção da fonte) (15).
A Associação viria a tornar público que, por deliberações do conselho administrativo tomadas nas reuniões de 17 de Setembro e 12 de Outubro de 1984, e ratificadas pela assembleia intermunicipal na sua reunião de 17 de Maio de 1985, foram admitidos os municípios de Matosinhos e Vila do Conde - cfr. Aviso de 14 de Novembro de 1985, publicado no "Diário da República", III Série, nº 279, de 4 de Dezembro desse ano.
A Associação, que adoptou a designação de Serviço Intermunicipalizado de Tratamento de Lixos da Região do Porto, com a sigla LIPOR (artigo 3º), tem como objecto o tratamento e aproveitamento final dos lixos entregues pelos municípios associados, gerindo, mantendo e desenvolvendo as necessárias instalações e serviços privativos (artigo 2º, nº 1) (16).
O exercício da actividade associativa é desenvolvido na área dos municípios associados e efectuado por sua conta e risco, sob a forma industrial, como serviço intermunicipalizado (artigo 2º, nº 2), podendo implementar, por si ou associadamente, actividades de natureza energética e outras decorrentes do seu objecto (nº 3).
O património da associação é constituído pela actual estação de tratamento de lixos situada em Ermesinde e pelos bens e direitos para ela transferidos pelos municípios associados ou por ela adquiridos a qualquer título (artigo 8º, nº 1).
Os órgãos da associação são a assembleia intermunicipal e o conselho administrativo (artigo 9º).
Os respectivos membros são designados de entre os elementos integrantes das câmaras dos municípios associados, sendo tal qualidade indissociável da qualidade de membro da câmara municipal que a cada um designou para o efeito (artigo 10º, nº 1).
As deliberações dos órgãos da associação são, em regra, tomadas por votação representativa de cada município e à pluralidade dos votos dos municípios presentes (artigo 12º, nº 1), cabendo um voto a cada município (nº 6) (17).
O conselho administrativo é o órgão executivo da associação e é composto por um elemento de cada um dos municípios associados, eleito pela assembleia intermunicipal de entre os seus membros (18), resultando dessa eleição a designação do respectivo presidente (artigo 20º).
No âmbito da sua competência insere-se a prossecução dos fins da associação (alínea b) do artigo
21º) e a prática de todos os demais actos necessários à realização do objecto da associação, com excepção dos que, pela sua própria natureza, devem ser exercidos directamente pelos órgãos dos municípios [alínea q)].
Das deliberações do conselho administrativo há sempre recurso hierárquico para a assembleia intermunicipal, sem prejuízo do recurso contencioso que se possa interpor, nos termos ordinários (artigo 25º, nº
1).
Compete, além do mais, ao presidente do conselho administrativo convocar as reuniões ordinárias e extraordinárias do órgão e dirigir os trabalhos, promover a execução das deliberações do conselho e coordenar a sua actividade, submeter as contas da associação a julgamento do Tribunal de Contas (19) e exercer os demais poderes que lhe sejam conferidos pelos órgãos da associação [artigo
22º, alíneas a), b), e) e g)].
Para além disso, pode praticar quaisquer actos da competência do conselho administrativo sempre que o exijam circunstâncias excepcionais e não seja possível reuni-lo extraordinariamente, ficando, nesse caso, os actos praticados sujeitos a subsequente ratificação na reunião imediata do conselho (artigo 23º).
A orientação técnica e a direcção administrativa do serviço poderão ser confiadas pelo conselho administrativo, em tudo o que não seja da sua exclusiva competência, a um director-delegado (artigo 28º, nº 1).
Constituem receitas da associação: a) As comparticipações regimentais ou voluntárias de cada município; b) Os proventos resultantes da prestação de serviços aos municípios associados ou outros e da venda de produtos fabricados; c) O rendimento dos bens próprios e o produto da sua alienação ou da constituição de direitos sobre eles; d) As dotações, subsídios ou comparticipações provenientes de quaisquer origens, nomeadamente de entidades internacionais; e)

.....................................................................................................; f) O produto de empréstimos contraídos junto de entidades autorizadas à concessão de crédito; g) Quaisquer outros rendimentos permitidos por lei (20).
As contribuições e participações dos municípios associados serão diferenciadas segundo a proporção a aprovar pela assembleia intermunicipal, a qual deverá ter em conta, em relação a cada município, pelo menos, o volume dos lixos entregues e valores dos activos dos municípios na associação (artigo 34º, nº 1).
De facto, um dos deveres dos municípios associados consiste na obrigação de entregar à associação a totalidade dos lixos domiciliários recolhidos nos concelhos respectivos e efectuar a liquidação mensal dos encargos de tratamento (artigo 7º, nº 3). A falta de cumprimento da referida entrega de lixos não deixa de obrigar o respectivo município ao pagamento dos encargos de tratamento correspondentes aos quantitativos que normalmente entregaria (artigo 34º, nº 4).

4.2. Constitui objecto do concurso que está na origem do presente parecer a concepção, construção, financiamento e exploração, pelo período de 15 anos, de uma estação de tratamento de resíduos sólidos pelo processo de incineração (21) com recuperação de energia que absorva não só os resíduos excedentários relativamente à capacidade da instalação de compostagem a funcionar em Ermesinde (22), mas igualmente os refugos de tratamento originados nesta.
Os resíduos sólidos produzidos nos sete municípios da LIPOR são actualmente canalizados para três pólos de tratamento:
- o Centro de Exploração de Ermesinde . cfr. nota (22);
- o Aterro de Matosinhos;
- o Aterro de Vila do Conde;
A situação existente é de manifesta carência quanto ao tratamento dos quantitativos actualmente produzidos (23). Por outro lado, os aterros que funcionam em Matosinhos e Vila do Conde laboram em condições de exploração deficientes, pretendendo-se que sejam postos fora de serviço quando da entrada em funcionamento da nova instalação de incineração.
Daí que bem se compreenda a necessidade sentida de perspectivar uma solução adequada a médio/longo prazo que tenha em conta a própria evolução dos resíduos produzidos (24).
O sistema de tratamento previsto para o conjunto dos sete municípios assenta na existência de dois pólos de tratamento industrial, um já em funcionamento, em Ermesinde, e outro a construir, objecto do concurso em apreço, complementados por um novo aterro sanitário de apoio, sendo os actuais aterros postos fora de serviço.
Entre aquelas três instalações deverá ser garantida a indispensável interligação e interdependência, designadamente a nível dos fluxos de resíduos e refugos dos processos. Partindo dos cenários de evolução quantitativa e qualitativa discriminados em quadros anexos à nota descritiva, entendeu dever tomar-se como referência da capacidade da instalação de incineração, no arranque, o valor de 400 000 toneladas/ano.
O adjudicatário será o responsável pela condução e manutenção totais da instalação através de pessoal seu, por um período de quinze anos, pelo que, além das actividades inerentes ao respectivo funcionamento, deverá desenvolver as necessárias ao escoamento da energia produzida e dos subprodutos gerados no processo.
Pretende-se também, com o concurso, garantir, mediante propostas viáveis dos concorrentes, o financiamento integral do empreendimento, de modo que a retribuição dos investimentos seja repercutida ao longo do período de exploração e por tonelada de resíduos tratados (25). Admite-se, no entanto, a eventualidade de comparticipação de fundos comunitários, ou outros, no investimento a realizar, situação em que se solicitará ao adjudicatário a redução, no preço proposto, dos valores correspondentes aos montantes comparticipados.

4.3. Do programa de concurso constam diversas regras procedimentais sobre as seguintes matérias: consulta do processo; apresentação de reclamações ou dúvidas acerca das peças patenteadas; entrega das propostas (26); acto público do concurso (27); qualificação dos concorrentes e modalidade jurídica de associação de empresas (28); forma da proposta de preço (29); programa de trabalhos; documentos que instruem a proposta; modo de apresentação das propostas e dos demais documentos; esclarecimentos a prestar pelos concorrentes; apreciação das propostas (30); esclarecimentos a prestar pelos concorrentes; apreciação das propostas; minuta de contrato, notificação, adjudicação e caução; outros encargos (31); e legislação aplicável (32).
Como Anexos ao programa de concurso figuram o modelo da proposta de preço (Anexo PC1), as disposições relativas à elaboração do estudo técnico da solução proposta (Anexo PC2), as disposições relativas à elaboração do estudo preliminar de impacte ambiental (Anexo PC3) e as disposições relativas à elaboração do estudo económico-financeiro (Anexo PC4).

4.4. Vejamos agora, na medida em que possam ter interesse para os fins da consulta, as previsões mais relevantes do caderno de encargos (CE).
A apreciação das respectivas cláusulas permite evidenciar alguns elementos impressivos, susceptíveis de apontarem para uma qualificação da natureza juspublicística do contrato a celebrar. Propende-se, com efeito, como melhor se explicará oportunamente, para a caracterização do contrato visado como um contrato administrativo (33). A questão de precisar se se estará perante um contrato de natureza unitária (de concessão de serviço público) ou mista (de empreitada de obra pública e de concessão de serviço público) representa temática sobre a qual não é indispensável tomar compromisso.
Confere-se, com efeito, à LIPOR, no clausulado daquele documento do concurso público, uma posição privilegiada ou supra-ordenada, traduzida em poderes e direitos face ao adjudicatário, que são normalmente estranhos às relações jurídico-privadas. É, designadamente, o que se passa, adiante-se desde já, com a faculdade que lhe assiste de proceder à rescisão unilateral do contrato por simples conveniência do dono da obra e subsequente remissão para o processo de tomada de posse administrativa (cfr. cláusula 27ª, nºs 3 e 4), com a aplicação de multas e sanções e respectivo processo de cobrança (cláusulas 74ª e 85ª) ou com a possibilidade de impor alterações ao projecto de exploração (cláusula 79ª).

4.4.1. O CE organiza-se em duas grandes partes: as cláusulas gerais e as cláusulas especiais, distribuindo- se estas, por sua vez, pelas (cláusulas) relativas à concepção-construção e pelas relativas à exploração.
No âmbito das cláusulas gerais incluem-se as relativas às disposições por que se devem reger os trabalhos (34), aos regulamentos e outros documentos normativos, às regras de interpretação dos documentos, ao esclarecimento de dúvidas nessa interpretação, ao objecto do contrato (35), ao modo de retribuição ao adjudicatário (36), aos descontos e à mora no pagamento (37), à revisão dos preços, aos prazos de execução, à fiscalização e controlo (38), ao pessoal, aos seguros, à rescisão do contrato (39), às notificações, aos litígios (arbitragem) e a outras disposições gerais, incluindo a disciplina dos casos omissos (40).
No que diz respeito às cláusulas especiais salientam-se as cláusulas correspondentes às "multas por violação dos prazos contratuais" (cláusula 74º), incluída nas cláusulas relativas à concepção/construção, e às "sanções" (cláusula 85ª), esta já inserida na parte referente à exploração, Trata-se de disposições que, a par de algumas já indicadas, e de outras que se poderiam referir, como, por exemplo, as relativas aos descontos do valor do depósito de garantia [cláusula 86º (3)], ou a constante, a propósito de aprovações pelo dono da obra, da cláusula 46(3), denunciam a titularidade, por este, de poderes e direitos que (mesmo que não sejam exclusivos), são característicos das relações contratuais jurídico- administrativas, maxime, no que concerne ao contrato de concessão de serviço público.

5.

O presente pedido de parecer compreende três grandes blocos de questões, a imporem a adequada indagação e reflexão jurídicas.
- Por um lado, importa analisar o regime de aplicação das normas sobre o acesso à actividade económica por parte de entidades privadas ou da mesma natureza - temática normalmente conhecida como respeitante à "delimitação de sectores" - à realidade que, por simplificação, passaremos a designar como LIPORII;
- Por outro, haverá que cuidar das vicissitudes do concurso público tendo em vista o objectivo de determinar se a aplicação do programa do concurso e do caderno de encargos, cujas grandes linhas passámos em revista, é juridicamente legítima perante o quadro legal de que depende o exercício da actividade de exploração e gestão dos sistemas (municipais e intermunicipais) de recolha e tratamento de resíduos sólidos;
- Enfim, e como corolário, tornar-se-á conveniente confrontar a conformidade ou desconformidade legal do programa do concurso e do caderno de encargos da LIPOR II com a legislação entretanto publicada, mormente com o Decreto-Lei nº 379/93, de 5 de Novembro, tendo como escopo apurar as consequências daí resultantes para a sanidade ou invalidade do acto de adjudicação e/ou da outorga de contrato que viesse a ter lugar.

5.1. Enumerando as atribuições das câmaras municipais em matéria de salubridade pública (41), prescrevia o artigo 49º, nº 3, do Código Administrativo que pertence às câmaras deliberar "sobre a remoção, despejo e tratamento de lixos, detritos e imundícies domésticas". Por sua vez, o nº 4 do artigo 59º declara o carácter obrigatório do exercício desta atribuição (42).
Entretanto, nos termos do artigo 51º, nº 26, também do CA, competia às câmaras, para o desempenho das suas atribuições, "conceder a exploração de serviços e resgatar a concessão, quando o julgue conveniente, nos termos do respectivo contrato, o qual terá sempre por base um caderno de encargos aprovado pelo Governo" (43).
Previa-se, subsequentemente, no artigo 164º, nº 3, que era permitido às câmaras, com a aprovação dos respectivos conselhos municipais e do Governo, explorar, sob forma industrial, por sua conta e risco, serviços públicos de interesse local que tivessem por objecto "o aproveitamento, depuração e transformação das águas de esgoto, lixos, detritos e imundícies".


5.2. Na sequência da injunção constante do nº 2 do artigo 85º da Constituição da República, na sua versão originária, segundo o qual "a lei definirá os sectores básicos nos quais é vedada a actividade às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza" (44), viria a ser publicada a Lei nº 46/77, de 8 de Julho (45).
Atento o disposto na alínea d) do nº 1 do artigo
4º, foi vedado a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza o acesso à actividade económica de saneamento básico.
Por sua vez, o artigo 8º, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 406/83, de 19 de Novembro, prescreve que "a proibição do acesso da iniciativa privada às actividades referidas nos artigos 4º e 5º abrange a exclusão da apropriação por entidades privadas dos bens de produção e meios afectos às actividades aí consideradas, bem como das respectivas exploração e gestão...".
Acrescente-se que no conceito de "saneamento básico" se tem considerado pacificamente estar abrangida a recolha e tratamento de resíduos sólidos, ou seja, do lixo.
Entretanto, concedida pela Lei nº 110/88, de 29 de Setembro, autorização ao Governo para alterar a redacção do artigo 4º (e do artigo 5º) da Lei nº 46/77, no sentido de abrir a entidades privadas e a outras entidades da mesma natureza o exercício de actividades económicas até então vedadas (cfr. artigos 1º, nºs 1 e 2), veio o "saneamento básico" a constar da alínea b) do referido artigo 4º, na redacção que ao mesmo foi dada pelo Decreto-Lei nº 449/88, de 10 de Dezembro, publicado no uso da citada autorização legislativa (46).
Refira-se, por fim, que, nos termos do artigo 7º da Lei nº 46/77, "a exploração dos recursos do subsolo e dos outros recursos naturais que, nos termos constitucionais, são pertencentes ao Estado, será sempre sujeita ao regime de concessão ou outro que não envolva a transmissão de propriedade dos recursos a explorar, mesmo quando a referida exploração seja realizada por empresas do sector público ou de economia mista" (47).

5.2.1. Será, porventura, útil, à guiza de comentário apendicular, conceder alguma atenção à estrutura de Lei nº 46/77, ainda antes de se proceder à análise das importantes alterações introduzidas ao regime jurídico da propriedade dos meios de produção, na sequência da autorização legislativa concedida pela Lei nº 58/93, de 6 de Agosto.
O esquema da lei é influenciado por um espírito de preservação da situação pré-constitucional, decorrente do período das nacionalizações de 1974/76. Assim: a) Garante a irreversibilidade das nacionalizações efectuadas, reproduzindo os preceitos constitucionais respectivos (cotejem-se o artigo 2º, nºs 1 e 3, da Lei, com o artigo 83º, nºs 1 e 2, da Constituição de 76); b) Garante o respeito pelas situações subtraídas à nacionalização, tendo especialmente em vista os capitais estrangeiros - cfr. artigo 8º, parte final.
Como observa Ferreira de Almeida "esse espírito "conservador" de nada alterar em relação à extensão do sector público, nem para menos nem para mais, influencia toda a sinuosa lógica da lei".
O núcleo do diploma consiste, como se viu, na concretização do disposto no artigo 85º, nº 3, do texto fundamental, ou seja, no elenco das actividades às quais, em diversos graus, não têm livre acesso as "empresas privadas e entidades da mesma natureza".
Nesse campo, podemos, acompanhando Carlos Ferreira de Almeida, distinguir as seguintes situações: a) Reserva absoluta a favor do sector público das actividades que se encontravam elencadas nos artigos 3º, nº 1, 4º, nº 1 (48), e na alínea f) do nº 1 do artigo 5º da Lei, na sua versão originária.
Entre tais actividades situa-se, como se viu, o saneamento básico (alínea d) do nº 1 do artigo 4º). b) Reserva de controlo: abrange as actividades nas quais expressamente se admitem, além das empresas cuja totalidade do capital seja pública, também empresas de economia mista, com posição maioritária do Estado, nos termos do nº 2 do artigo 5º, com referência ao nº 1, alíneas a) a e) (49). c) Reserva eventual: deixa-se ao Governo, nos termos do artigo 6º, a iniciativa de estabelecer uma reserva absoluta nas indústrias de tabacos e dos fósforos. d) Regime de autorização: em algumas áreas económicas, sem que exista proibição de exercício por entidades privadas, concedem-se ao Governo poderes mais ou menos discricionários de autorização - cfr., a título de exemplo, o nº 3 do artigo 4º, a propósito dos transportes marítimos. e) Regime de concessão: dos já referidos recursos do subsolo e de outros recursos naturais (artigo 7º), podendo as empresas beneficiárias da concessão ser empresas públicas, mas sendo, na maioria, empresas privadas.
Para além dessa situação, a Lei nº 46/77 prevê, no artigo 9º, um (diferente) regime de concessão ("exploração e gestão") a entidades privadas (50).

5.3. No sentido de habilitar o Governo a alterar a Lei nº 46/77, foi apresentada a Proposta de Lei nº 64/V (51), em cuja exposição de motivos se pode ler que se pretende consagrar um regime jurídico que distinga entre sistemas de gestão e exploração multimunicipais e municipais, permitindo, no primeiro caso, a constituição de empresas concessionárias de capital misto e, no segundo, de empresas concessionárias de capital totalmente privado.
Desenvolvendo estes conceitos básicos, afirmou Vossa Excelência na Assembleia da República, na reunião plenária de 2 de Julho de 1993, por ocasião da discussão da referida iniciativa legislativa, que o regime vertido na Proposta de Lei distingue entre sistemas multimunicipais e municipais, entendendo-se como multimunicipais os que sirvam pelo menos dois municípios e exijam um investimento predominante a efectuar pelo Estado em função de razões de interesse nacional. A gestão e exploração dos sistemas multimunicipais pode ser directamente efectuada pelo Estado ou concessionada a entidade pública de natureza empresarial ou a empresa que resulte da associação de entidades públicas, em posição obrigatoriamente maioritária, com entidades privadas.
"A gestão e exploração dos sistemas municipais pode ser directamente efectuada pelos respectivos municípios ou atribuída, mediante contrato de concessão, a entidade pública ou privada" (52).
Submetida à votação, foi a Proposta de Lei aprovada com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes (53).

5.4. Viria, assim, a ser editada a Lei nº 58/93, de 6 de Agosto, que concedeu autorização ao Governo para alterar o artigo 4º da Lei nº 46/77, com a redacção que lhe fora dada pelo artigo único do Decreto-Lei nº 339/91, de 10 de Setembro (artigo 1º). Nos termos do disposto no artigo 2º, tal autorização tem os seguintes sentido e extensão:
"a) Substituir na Lei nº 46/77, de 8 de Julho, a referência a actividade de saneamento básico pela referência à actividade de recolha, tratamento e rejeição de efluentes, através de redes fixas, e de recolha e tratamento de resíduos sólidos; b) Permitir o acesso de empresas que resultem da associação de entidades do sector público, designadamente autarquias locais, em posição obrigatoriamente maioritária no capital social da nova sociedade, com outras entidades privadas, em regime de concessão a outorgar pelo Estado, às actividades de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes, em ambos os casos através de redes fixas, e de recolha e tratamento de resíduos sólidos, no caso de sistemas que sirvam pelo menos dois municípios e exijam um investimento predominante a efectuar pelo Estado em função de razão de interesse nacional; c) Permitir o acesso de empresas privadas, em regime de concessão a outorgar pelo Estado, às actividades de captação, tratamento e distribuição de
água para o consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes, em ambos os casos através de redes fixas, e de recolha e tratamento de resíduos sólidos, no caso dos sistemas municipais" (sublinhado agora).

5.5. Veio, pois, a ser publicado o Decreto-Lei nº 372/93, de cuja nota preambular se extractam os seguintes trechos:
"A necessidade de promover uma verdadeira indústria de água e do tratamento de resíduos sólidos pressupõe a definição de uma estratégia rigorosa que acautele os interesses nacionais, possibilite o aumento do grau de empresarialização no sector, incluindo capitais privados, e permita a aceleração do ritmo de investimento.
"Esta estratégia é, na sua globalidade, peça fundamental para garantir estabilidade temporal às políticas de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, recolha, tratamento e rejeição de efluentes, e recolha e tratamento de resíduos sólidos.
"Faz assim sentido que seja aberta a possibilidade de participação de capitais privados, embora sob a forma de concessão, a empresas intervenientes nestes sectores".
Nos termos do artigo único, foi dada a seguinte redacção ao artigo 4º da Lei nº 46/77:
"1- É vedado a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza o acesso às seguintes actividades económicas: a) Captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, recolha tratamento e rejeição de efluentes, em ambos os casos através de redes fixas, e recolha e tratamento de resíduos sólidos, no caso de sistemas multimunicipais; b) Captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, recolha, tratamento e rejeição de efluentes, em ambos os casos através de redes fixas, e recolha e tratamento de resíduos sólidos, no caso de sistemas municipais, salvo quando concessionadas; c)
................................................................................................d)................................................................................................ e)...............................................
..................................................... f) ...............................................

"2 - Para o efeito do disposto nas alíneas a) e b) do número anterior, consideram-se, respectivamente, sistemas multimunicipais os que sirvam pelo menos dois municípios e exijam um investimento predominante a efectuar pelo Estado em função de razões de interesse nacional, e sistemas municipais todos os demais, bem como os sistemas geridos através de associações de municípios.
"3 - As actividades referidas na alínea a) do nº 1 e que se mantêm vedadas a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza podem ser exercidas, em regime de concessão, a outorgar pelo Estado, por empresas que resultem da associação de entidades do sector público, designadamente autarquias locais, em posição obrigatoriamente maioritária no capital social da nova sociedade, com outras entidades privadas.
"4 - As actividades de telecomunicação referidas na alínea d) do nº 1 e que se mantêm vedadas a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza podem ser exercidas por empresas que resultem da associação de entidades do sector público, em posição obrigatoriamente maioritária no capital social da nova sociedade, com outras entidades" (sublinhado agora).
Ou seja, a 3 de Novembro de 1993, com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 372/93 (54), passou a ser admitido entre nós o exercício da actividade de tratamento de lixo por entidades privadas (sistemas municipais), ou, no caso dos sistemas multimunicipais, por entidades mistas, em que os particulares participassem minoritariamente.
A caracterização do sistema de tratamento de resíduos sólidos LIPOR II como sistema municipal decorre sem margem para dúvidas da aplicação do regime legal, tratando-se, de resto, de questão pacificamente aceite.
Trata-se, com efeito, de um sistema gerido através de uma associação de municípios, que não exige um investimento predominante por parte do Estado.

5.6. Uma vez alterada a lei de delimitação de sectores, no sentido de permitir o acesso de capitais privados às mencionadas actividades, ficaram reunidas as condições para se consagrar o regime legal da gestão e exploração de sistemas que as tenham por objecto.
5.6.1. Foi, assim, publicado o Decreto-Lei nº 379/93, de 5 de Novembro que, conforme o seu relatório preambular, "distingue entre sistemas multimunicipais e municipais, considerando os primeiros como os sistemas em "alta" (a montante da distribuição de água ou a jusante da colecta de esgotos e sistemas de tratamento de resíduos sólidos), de importância estratégica, que abranjam a área de pelo menos dois municípios e exijam um investimento predominante do Estado, e os segundos todos os restantes, independentemente de a sua gestão poder ser municipal ou intermunicipal". Mais se diz no relatório do diploma que "a gestão e exploração dos sistemas municipais é regulamentada neste decreto-lei, podendo ser directamente efectuada pelos respectivos municípios ou atribuída, mediante contrato de concessão, a entidade pública ou privada de natureza empresarial".

5.6.2. O diploma distribui-se por três capítulos:
Capítulo I, "Disposições gerais" (artigos 1º e 2º);
Capítulo II, "Sistemas multimunicipais" (artigos 3º a 5º) e Capítulo III, "Sistemas municipais" (artigos 6º a 18º), este subdividido em duas secções - "Disposições gerais" (artigos 6º a 17º) e "Disposições transitórias e finais" (artigo 18º).
Acompanhemos as disposições mais importantes do diploma.
Definido no nº 1 do artigo 1º o respectivo objecto como constituindo "o regime de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais e municipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos", os nºs 2 e 3 procedem à definição, nos termos já enunciados, dos conceitos de "sistemas intermunicipais" (nº 2) e de "sistemas municipais" (nº 3).
Discriminam-se, no nº 1 do artigo 2º, os princípios fundamentais do regime de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais e municipais, que são os seguintes: princípio de prossecução do interesse público; princípio do carácter integrado dos sistemas; princípio da eficiência; e princípio da prevalência da gestão empresarial.

5.6.3. Passando sobre os normativos que integram o Capítulo II, debrucemo-nos sobre alguns dos preceitos mais relevantes, relativos aos "sistemas municipais".
Como princípio geral, resultante do que já se deixou consignado, estabelece o artigo 6º que a exploração e gestão dos sistemas municipais pode ser directamente efectuada pelos respectivos municípios e associações de municípios ou atribuída, em regime de concessão, a entidade pública ou privada de natureza empresarial, bem como a associação de utilizadores (artigo 6º).
No tocante à propriedade dos bens afectos à concessão, prescreve o artigo 7º os dois seguintes princípios: a) enquanto durar a concessão, a propriedade dos bens integrados nos sistemas municipais e a ela afectos pertence à concessionária; b) no termo da concessão, reverterá para os respectivos municípios (55).
Manifestamente, o regime constante do artigo 7º, no que se refere à titularidade pelo concessionário da propriedade dos bens afectos à concessão, enquanto esta durar, deve ser articulado com o disposto no nº 3 do artigo 9º segundo o qual "a concessão pode abranger a utilização de obras e equipamentos instalados pelo município ou municípios concedentes", caso em que a cláusula da propriedade da concessionária parece não dever funcionar (56).

5.6.4. Prevenindo acerca do "prazo da concessão", o artigo 8º prevê que a mesma é atribuída pelos prazos mínimo e máximo de 5 a 50 anos, respectivamente.
A respeito do "objecto da concessão" enumera-se, na alínea c) do nº 1 do artigo 9º, a exploração e a gestão dos serviços públicos municipais de recolha e tratamento de resíduos sólidos, prevendo-se, na alínea d), que o contrato da concessão tenha por objecto a exploração e a gestão conjunta dos serviços previstos nas alíneas a) (águas), b) (esgotos) e c) (lixos).
Precisando o alcance do objecto da concessão, o nº 2 prescreve que a exploração e a gestão dos serviços referidos abrangem a construção, extensão, reparação, renovação, manutenção de obras e equipamentos, e respectiva melhoria.
No que se refere à "formação do contrato", inscreve- se no nº 1 do artigo 10º o princípio de que o contrato de concessão é precedido de concurso público. Princípio que apenas encontra excepção quando a concessionária seja uma associação de utilizadores reconhecida como de utilidade pública.
No nº 2 do referido artigo 10º enumeram-se os dados ou elementos que devem figurar no programa do concurso.
Refiram-se, a título de exemplo, atenta a controvérsia que a matéria suscitou no âmbito do procedimento administrativo do concurso público da LIPOR II os seguintes dados: "a menção de que as propostas não admitem variantes (alínea g); "as entidades cujo parecer deve ser ouvido pela comissão de avaliação, se for caso disso" (alínea l); o critério de adjudicação, enumerando os factores relevantes por ordem decrescente de importância, entre os quais constem, necessariamente, o montante e o regime de retribuição a pagar ao município ou municípios concedentes, o regime tarifário, a qualidade do serviço e a segurança da sua prestação" (alínea o) (57).
Os artigos 11º a 13º prescrevem, respectivamente, sobre o "conteúdo do contrato", os "poderes do concedente" e a "concessionária", em termos que não se justifica reproduzir. Refira-se apenas a consagração de cláusulas no contrato de concessão e a previsão de poderes do concedente, reveladores da posição de supra-ordenação, característica dos contratos administrativos, que já identificáramos no caderno de encargos de concurso LIPOR II.
Atente-se, a título de exemplo, nas alíneas d) (poderes de modificação unilateral e de aplicação de sanções pelo concedente), e) (regime de sequestro e de rescisão do contrato) e p) (sanções pecuniárias a aplicar), do nº 2 do artigo 11º, bem como nos diferentes números do artigo 12º.

5.6.5. Os artigos 14º e 15º ocupam-se, respectivamente, da retribuição a pagar pela concessionária à concedente e das taxas a cobrar pela concessionária aos respectivos utentes (58).
Poder-se-ia pretender extrair do artigo 15º um argumento em favor da tese da essencialidade da remuneração da concessionária através das "taxas a cobrar aos utentes", de onde se poderia retirar um fundamento para negar ao contrato em cuja formação se inscreve o concurso público em apreço a caracterização como contrato administrativo de concessão de serviços públicos (artigo 178º, nº 2, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo) (59). Não parece que assim se deva raciocinar, sendo que, para além das concessões englobando serviços de prestação individual (casos da distribuição de água, ou da recolha do lixo doméstico), também há concessões em que a prestação é feita directamente ao(s) próprio(s) município(s) concedente(s), obviamente, no interesse dos respectivos munícipes. Caso em que não há utentes particulares a pagarem taxas em função da utilidade doméstica que retiram do serviço prestado, sendo o pagamento da concessionária feito justamente pela remuneração dos serviços prestados aos municípios concedentes. São, com efeito, os municípios, enquanto utentes do serviço, que pagarão à concessionária um certo preço por tonelada de lixo tratado - vide o modelo da proposta de preço, que constitui o Anexo PCI ao Programa de Concurso, com referência ao ponto 7.1. do referido documento.
Como escreve Mário Esteves de Oliveira, "o facto de os utentes do serviço não serem aqui, como acontece nos serviços de abastecimento ou fornecimento domiciliário, os próprios munícipes - mas sim as respectivas autarquias que se encarregam da recolha e do destino final do lixo que eles "fazem" - não atrasa nem adianta nada em relação a essa proposição: o pagamento é feito em função duma determinada taxa ou preço cobrado ao(s) utente(s), não em "forfait" ou por qualquer factor diverso daquele" (60).
Aliás, a doutrina jusadministrativa francesa tem vindo a entender que o contrato de concessão de serviço público, apesar de ter começado por integrar na sua definição o elemento da remuneração do concessionário através de taxas a cobrar dos utentes, acabou, na sequência da evolução registada, por ver alterado o seu tradicional quadro conceptual, em termos que permitem concluir que o pagamento de taxas ou prestações pelos utentes deixou de constituir a forma exclusiva de remuneração do concessionário. Como prova do que se afirma, basta atentar nos apoios financeiros que o concessionário pode receber do concedente, podendo ainda acrescentar-se outros recursos, não provenientes nem do concedente nem dos utentes.

Segundo André de Laubadère e outros, "on ne peut plus définir la concession par la seule rémunération sous forme de redevances".
E acrescenta: "...la perception de redevances permet effectivement de reconnaître une concession; mais la concession n'est pas enfermée dans la perception de redevances" (61).
Segundo os referidos autores, a concessão de serviço público é definida classicamente como a convenção pela qual uma pessoa colectiva de direito público (o concedente) encarrega uma empresa privada (a concessionária) de fazer funcionar o serviço público por sua conta e risco, pagando-se através de taxas cobradas aos utentes.
Ou seja, o acento tónico era tradicionalmente colocado sobre três elementos: o recurso pela Administração a um co-contratante privado, a atribuição a este da responsabilidade do serviço público com as consequentes responsabilidades económicas e financeiras e a remuneração pelos utentes (62).
Todavia, a evolução verificada afectou, de um modo ou de outro, os referidos vectores constantes do conceito tradicional de concessão de serviço público.
Limitando-nos a um apontamento no âmbito da evolução do regime de concessão, há que reconhecer, acompanhando os citados autores franceses, que também a responsabilidade do concessionário foi, por vezes, afectada. Em certas concessões, com efeito, o concessionário deixou de exercer um papel próprio, assegurando a exploração por sua conta e risco, e passou a intervir como um intermediário da entidade concedente que aí desempenha, em contrapartida, um papel directo, assumindo a responsabilidade do serviço.
O concessionário aproxima-se, então, do mandatário, agindo por conta da Administração. O conceito de concessão sofre profunda alteração, deixando de corresponder à atribuição à outra parte da obrigação de assegurar um serviço, muito em especial quando o desaparecimento do papel próprio do concessionário é acompanhado pela diminuição, ou, até, pela supressão da sua responsabilidade financeira.
Isto porque os concedentes têm sido progressivamente conduzidos a prestar importante auxílio económico, quer para o financiamento dos investimentos realizados, quer para suportar encargos durante a fase da exploração. Desaparece, assim, a álea financeira que parecia tradicionalmente inerente à concessão, dando lugar a uma solidariedade financeira entre concedente e concessionário.
Fundamentalmente, a concessão tem por objecto confiar o serviço público ao concessionário, a fim de que este assegure a respectiva exploração retirando a sua remuneração. Assim, o elo de ligação entre "exploração" e "remuneração" é essencial, visto que a remuneração do concessionário é retirada da exploração (63).

5.6.6. Passando sobre o artigo 16º, relativo ao "Pessoal", detenhamo-nos no disposto pelos artigos 17º e 18º, normativos que se revestem de particular importância no contexto do parecer. O artigo 17º, subordinado à epígrafe "Nulidade", estabelece que "são nulos os contratos de concessão que contrariem o disposto no presente diploma".
Prescreve, por sua vez, o artigo 18º, sob a epígrafe "Situações existentes", o seguinte:
"1 - As situações actualmente existentes relativas aos serviços municipais mencionados no presente diploma devem ser reajustadas ao regime agora estabelecido, no prazo máximo de 180 dias, a contar da data da entrada em vigor do presente diploma.
2 - No prazo referido no número anterior devem os municípios abrir concurso público para a celebração de contrato de concessão, quando as situações actualmente existentes não tenham sido precedidas de concurso público" (64).
Ou seja, podem retirar-se do disposto nestes artigos as seguintes ilações: a) nulidade dos contratos de concessão que venham a ser celebrados com violação das disposições imperativas constantes do diploma
- artigo 17º; b) necessidade de reajustamento ao regime agora estabelecido, no prazo máximo indicado no nº 1 do artigo 18º, das situações existentes à data da entrada em vigor do diploma ("situações actualmente existentes", no dizer expresso do citado preceito); c) necessidade de abertura de concurso público para a celebração de contrato de concessão, no prazo indicado no referido nº 1, quando as "situações existentes" não tenham sido precedidas de concurso público - nº 2 do artigo 18º.
Justificam-se alguns desenvolvimentos complementares.

5.6.6.1. Assim, nem toda e qualquer contradição com o disposto no diploma deverá (poderá) fulminar de nulidade os contratos de concessão em que a mesma ocorra. Ou seja, o artigo 17º deverá ser objecto de uma interpretação restritiva.
Há, com efeito, um "catálogo" de situações hipotizáveis de contradição das cláusulas contratuais com o conteúdo do Decreto-Lei nº 379/93, subsumíveis à estatuição penalizadora do artigo 17º. Pense-se no caso de o contrato dar a particulares mais do que a exploração ou a gestão de serviço, como se prevê no artigo 6º, ou fazê-lo fora do regime jurídico da concessão; ou na hipótese de se convencionar a não reversibilidade dos bens afectos à concessão, em violação do disposto no artigo 7º; ou de se fixar para a concessão um prazo superior a 50 anos (artigo 8º); ou de se admitir a transmissibilidade da concessão (artigo
12º, nº 7); ou de se prescreverem taxas excepcionais (artigo 15º, nº 2). Ocorrendo uma ou mais violações semelhantes, operaria, sem dúvida, a nulidade prevista no artigo 17º.
Mas há, em contrapartida, um certo número de disposições legais que não têm natureza vinculativa, pelo que o seu não acatamento não implicará, por certo, a nulidade do contrato de concessão.
E isso pode acontecer quer porque a disposição se apresenta como simples alternativa possível para o tratamento normativo de certa questão (é o caso dos artigos 9º, nº 3, 10º, nº 2, alínea l), 14º, nº 1, 15º, nº 1), quer porque tais dispositivos visam apenas regular situações determinadas, se as mesmas se suscitarem nas concessões a contratar (65).
Exemplos deste segundo tipo de situações podem dar-se, como já se referiu, a propósito do regime previsto no artigo 7º acerca da titularidade da propriedade dos bens afectos à concessão, enquanto esta durar; acerca da retribuição pelo concessionário ao concedente, cuja existência pode não se justificar (66); ou a respeito da extensão dos deveres ou tarefas de exploração dos concessionários por forma a abranger as obras e equipamentos nos termos do nº 2 do artigo 9º (67).
Por outro lado, deverá entender-se que os contratos de concessão a que se refere o artigo 17º são os que venham a ser celebrados após a entrada em vigor do diploma. É o que parece resultar dos princípios gerais sobre aplicação da lei do tempo, como melhor ressaltará a propósito da interpretação do artigo 18º, nº 1.

6.

6.1. Até à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 372/93 era, como se viu, vedado a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza o acesso à actividade económica no sector do saneamento básico.
Ou seja, quando foi aberto o concurso público LIPOR II estava vedado às entidades que a ele podiam concorrer o acesso à actividade que constituía o objecto desse concurso. Até aqui, nada de novo, relativamente aos próprios termos da consulta.
Com efeito, é a própria consulta que reconhece que "o programa do concurso e o caderno de encargos de concepção, construção e exploração da estação de Tratamento de Resíduos Sólidos LIPOR II (Serviço Intermunicipalizado de Tratamento de Lixos da Região do
Porto) foram elaborados numa altura em que a actividade cuja adjudicação a entidade previa era vedada pela alínea h) do nº 1 do artigo 4º da Lei de Delimitação de Sectores - Lei nº 46/77, de 8 de Julho - com a redacção dada pelo artigo único do Decreto-Lei nº 339/91, de 10 de Setembro".
A resposta à primeira (e nuclear) questão, que consiste em saber "se é ou não inválido um eventual acto de adjudicação e subsequente contrato de concessão que venha a ser praticado e celebrado pela LIPOR II em decisão e execução do concurso mencionado", aconselha abordagem cruzada da temática respeitante às relações entre o princípio da legalidade e o concurso público na formação do contrato administrativo.

6.1.1. Justificar-se-á, no entanto, como ponto prévio, atentar ainda na questão relativa à caracterização jurídica do contrato em cuja formação se insere o concurso público que nos ocupa.
Podem, no essencial, defender-se três teses (desdobráveis em variantes, todavia, desprovidas de interesse para a economia deste parecer): a) a que aponta para a natureza privatística de todo o contrato (compreendendo uma prestação de serviços, quanto às componentes "concepção",
"financiamento" e "exploração" e uma empreitada, no concernente à parcela "construção"); b) a que defende estar-se perante um contrato misto de empreitada de obra pública (artigo 178º, nº 2, alínea a), do CPA), nessa medida, administrativo, e de prestação de serviços, de natureza jurídico-privada podendo, eventualmente, a componente "exploração" ser qualificada como concessão de serviço público; c) a que propugna a qualificação administrativa de todo o contrato, podendo, neste caso, o mesmo ser caracterizado como unitário, na veste de concessão de serviços públicos [artigo 178º, nº 2, alínea c)], embora com especialidades atípicas, ou como composto, integrando, além daquela, uma empreitada de obras públicas.
Como já se disse, entende-se dever qualificar o contrato a formar como contrato admimistrativo(68). E, não se revelando, embora, necessário assumir um compromisso quanto à caracterização precisa do(s) no(mina)men juris mais adaptado(s) à complexa realidade abrangida, propende-se para a sua percepção como figura contratual unitariamente configurada. Justificar-se-ão, não obstante, algumas considerações adicionais.

6.1.2. As cláusulas já enunciadas dos documentos do concurso público, bem como os objectivos visados com o contrato em cuja formação ele se insere, parecem excluir a natureza jusprivatística do mesmo. A hipótese de se divisar, dentro de uma estrutura complexa do contrato, uma empreitada de obra parece excluída pela própria natureza desta, a qual consiste na realização da obra e na sua entrega, com a contrapartida de um preço (69). O que não acontece no presente caso, na medida em que o adjudicatário continuará na posse da estação de tratamento construída, sendo sua obrigação contratual fazê-la funcionar, explorando-a por sua conta e risco e sob responsabilidade própria, e remunerando-se pela venda ou prestação das utilidades produzidas aos municípios adjudicantes.
Como sustenta Esteves de Oliveira, "claro que, no contrato em apreço, há concepção e há construção de uma obra: como a há em qualquer concessão que exija a instalação do respectivo estabelecimento, sem que por isso fique prejudicada a unidade da figura e se tenha de falar de um contrato misto".
Também deverá recusar-se a configuração das parcelas "concepção", "financiamento" e "exploração" da estação como constituindo um contrato privado de prestação de serviços.
Resultam do caderno de encargos dados claros que apontam no sentido de que o regime da exploração no caso em apreço não se pode confundir com aquele tipo contratual. Assim, a LIPOR não responderá pelos prejuízos que o adjudicatário tenha por causa da realização da prestação, como aconteceria se se tratasse de uma verdadeira prestação de serviço (70).

6.1.3. Também não procede, para contrariar a qualificação que se perfilha, o argumento segundo o qual não há, em direito administrativo, um contrato nominado que abranja as componentes "financiamento" e "exploração".
Importa ter presente, antes do mais, que tais componentes mais não são do que parcelas de um conjunto, que engloba também a "concepção" e a "construção", todas entre si teleologicamente articuladas com vista à obtenção do resultado que se pretende contratualmente prosseguir.
Por outro lado, a vertente "exploração" é aquela que mais tipicamente corresponde à essência da concessão (71).
As quatro componentes do pretendido contrato LIPOR II, consideradas no seu conjunto, correspondem, aliás, àquelas por que se desdobra, com normalidade, um contrato de concessão de serviço público que inclua, entre as obrigações do concessionário, a de construir e montar o estabelecimento da concessão.
Ou seja, conceber as instalações, assegurar o financiamento da respectiva construção, realizá-la e explorar o estabelecimento montado, recebendo o preço em função da quantidade de utilidades prestadas, corresponde ao que, num contrato de concessão de serviço público, se pede à respectiva concessionária.

6.2. Dissemos, no entanto, que não é indispensável assumir um compromisso acerca da natureza jurídica do contrato em formação.
Com efeito, mais importante do que proceder à sua qualificação, é reconhecer, o que é indiscutido, que o respectivo objecto era, à data da prática do acto administrativo de abertura do concurso público (indispensável para a sua formação), ilegal, atento o facto, detalhadamente exposto, de se reportar a uma actividade que estava vedada à iniciativa privada.
Duas são, em tese geral, as soluções que podem ser apresentadas relativamente à configuração da forma e dos efeitos de tal ilegalidade.
A) Segundo uma, poder-se-á ser levado a concluir que todo o concurso estaria inquinado, desde o momento da sua abertura, por manifesta invalidade, pelo que todos os actos que nele, ou como seu resultado, foram ou viessem a ser praticados, ficariam também irremediavelmente afectados.
B) Segundo outra, poder-se-ia, diversamente, falar em inexistência de vício, ou em sanação do vício existente.
Vejamos, começando pela segunda alternativa, os argumentos que se poderão esgrimir em justificação das aludidas soluções.

6.2.1. Segundo uma possível construção, dir-se-á que o que a Lei nº 46/77, na sua anterior versão, vedava às empresas privadas e similares era o acesso à actividade económica na área do saneamento básico.
Assim sendo, essa Lei só seria violada quando alguma dessas empresas acedesse efectivamente a tal actividade. O que corresponderia a concluir que, no caso em apreço, só ocorreria violação da lei de delimitação de sectores com a outorga do contrato de concessão, ou, quando muito, com a adjudicação, posto que esta confere um direito à concessão. Nunca antes (72).
Deste modo, haveria que concluir que a abertura do concurso, só por si, não teria violado a Lei nº 46/77, na formulação que apresentava até à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 372/93, de 29 de Outubro. E, aquando da adjudicação (já efectuada) ou da celebração do contrato (a efectuar), já estava (ou estaria) em vigor o referido diploma, com o qual aqueles actos se conformam (73).
Como responder então ao argumento (favorável à tese da invalidade de todo o concurso) segundo o qual, no momento da respectiva abertura, o mesmo teria como objecto uma concessão contrária à lei, na medida em que foi aberto a entidades que, em tal data, não poderiam exercer a actividade em referência?
Replica-se, na Recomendação do Senhor Provedor de Justiça, que o concurso não foi aberto para uma concessão a outorgar nesse mesmo dia, mas sim num futuro mais ou menos próximo. E acrescenta-se que "nada obsta, na lei, a que se abra um concurso tendo em vista uma situação legal, ainda não existente, mas que se prevê vir a existir - um concurso sob condição, digamos assim. E se essa condição se vier a verificar dentro do prazo de validade do concurso, não se vê qualquer razão para o considerar inválido".
Prosseguindo, pode ler-se ainda o seguinte:
"No caso em apreço, a condição do concurso era a possibilidade legal de empresas privadas e similares acederem ao exercício da actividade económica no sector do saneamento básico. Essa condição verificou-se com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 372/93, ainda antes da própria adjudicação da Empreitada".
Motivo por que Sua Excelência o Provedor de Justiça remata com a afirmação de que não descortina aqui qualquer invalidade (74).

6.2.2. Esbocemos agora os traços fundamentais da construção que aponta para a sanação legal superveniente dos actos praticados no concurso aberto a particulares em sector vedado, à data da respectiva abertura (75).
Dir-se-á que o princípio da sanação dos vícios do procedimento pela superveniência, antes da decisão, de lei que os "cubra" é um princípio com consagração expressa em algumas normas do direito administrativo procedimental (76).
Poder-se-á pois, retoricamente, formular a seguinte interrogação: Que sentido fará invalidar uma decisão tomada na sequência de um procedimento que não preenchia os requisitos da lei se, à data da respectiva decisão, essa lei já foi revogada?
A única exigência neste domínio é que, segundo Esteves de Oliveira, a alteração legislativa que sana a ilegalidade existente no procedimento tenha lugar antes de ser tomada a respectiva decisão (77).
De acordo com esta orientação, em matéria de legalidade procedimental, o que releva acima de tudo é a regra de que a consistência jurídica da decisão é função das leis vigentes ao tempo em que a mesma foi tomada. Nem interessaria, segundo os seus defensores, distinguir, a tal propósito, entre casos de invalidade absoluta e relativa, para guardar apenas para estes a possibilidade de sanação por lei nova (78).
Rematar-se-ia, assim, com a afirmação de que "nada impede que, na expectativa de uma alteração legislativa em determinada matéria, as autoridades administrativas competentes abram os procedimentos tendentes a que, entrada essa alteração em vigor, se possam aproveitar o mais celeremente possível os seus efeitos" (79).
Respeitando o compromisso de não emissão de posição, neste momento, quanto à bondade das teses alternativas em confronto, parece, todavia, necessário sublinhar o que se apresenta como que um "convolar" da tese da sanação do vício para a da inexistência de vício, quando se afirma que "não há nenhuma ilegalidade no facto de o concurso sub judice ter sido aberto a particulares numa altura em que a actividade que constituía o seu objecto lhes estava legalmente vedada em absoluto" (80).
Permita-se que, num parêntesis, se faça uma referência ao acompanhamento pelo Governo do desenvolvimento do processo de concurso em apreço.
Trata-se de uma constatação irrefutável face à história do concurso. Tal pode ser comprovado pela observação dos momentos fundamentais enunciados supra, na nota (5).
Com efeito, o presente processo de concurso permite admitir que os intervenientes actuaram no convencimento, ou no pressuposto, de que a situação contratual emergente, nascendo, embora, nas condições expostas, pudesse, porventura, mais tarde, ser objecto de validação, com a sanação da primitiva ilegalidade (81).

6.2.3. Pode, todavia, pelo contrário, mediante diversa construção jurídica, defender-se o entendimento de que a abertura de um concurso público sem a publicação prévia das normas que fixam o seu objecto, estabelecendo, antes do mais, a sua conformidade legal, torna ilegal todo o processo do concurso, desde a sua abertura, o que determinaria a nulidade (absoluta) do mesmo, bem como dos actos que, como consequência dele, viessem a ser praticados.
Autores há que, inclusivamente, sustentam que a situação de que se cura afectaria a própria existência jurídica do contrato que, por essa via, se viesse a formar.
Em estudo relativamente recente, embora anterior ao CPA, é essa a tese desenvolvida por Fausto de Quadros (82).
Partindo da premissa (83), de que a regra geral relativa à formação do contrato administrativo é a de que a mesma se processa através do concurso público, desde logo, por ser o meio que oferece maiores garantias de seriedade, isenção, melhor satisfação do interesse público e melhor gestão dos dinheiros públicos, bem como do respeito pela livre e sã concorrência, o autor analisa o princípio da legalidade nos concursos públicos, tendo especialmente em vista o estudo da situação que se traduz em um concurso público ser aberto sem, à data, estarem em vigor as normas legais que autorizem ou (e) definam o respectivo objecto, bem como o regime jurídico do contrato de concessão para o qual o concurso foi aberto, designadamente as regras que hão-de presidir à outorga da concessão.
Desenvolvendo o tema, escreve, a propósito, Fausto de Quadros, que todo e qualquer comportamento da Administração - não apenas a actividade unilateral, traduzida na aprovação de regulamentos e na prática de actos administrativos, como também a actividade bilateral, que se materializa na celebração de contratos administrativos - deve estar previsto e ser permitido por lei anterior (84), sob pena de se afectar a sua própria existência jurídica.

Socorramo-nos do próprio discurso do autor:
"Portanto, se à data da abertura do concurso não estiver publicado o diploma que autorize a Administração a abrir o concurso, que defina com pormenor o objecto e os fins da concessão, que contenha as regras que disciplinem os trâmites do processo do concurso e, inclusive, os requisitos da outorga no respectivo contrato, todo o processo do concurso é ilegal, desde a própria abertura do concurso, inclusive, o que, nos termos gerais de Direito, afecta a validade - mais: a própria existência jurídica - do contrato que por essa via se formou".
Ou seja, para Fausto de Quadros (escrevendo em 1987), a violação do princípio da legalidade no processo de concurso - como processo de formação do contrato administrativo - teria como sanção a inexistência jurídica de todo o concurso, "estendendo- se, portanto, ao acto administrativo de adjudicação e ao próprio contrato" (85).
Explicitando o seu pensamento, escreve o seguinte:
"Parece não restarem dúvidas de que este desrespeito pelo princípio da legalidade, ou seja, a abertura do concurso sem que este esteja à data previsto e permitido por lei, se traduz no mais grave vício de que ele pode enfermar e, portanto, inquina todo o processo de formação do contrato, incluindo o acto de adjudicação e o contrato propriamente dito, de inexistência jurídica" (86) (87).
Mais entendia o citado autor que o disposto no artigo 88º do Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março (Lei das Autarquias Locais), sobre "deliberações nulas", e que então valia como princípio geral do Direito Administrativo português (88), confortava a sua construção, na medida em que, entre os casos de nulidade taxativamente ali elencados, se encontravam contempladas deliberações que "não obstante previstas e permitidas por lei anterior, não respeitaram algum ou alguns dos elementos essenciais que deveriam reunir.
Por exemplo, não revestirem a "forma legal" (al. e)).
Ora, se é assim, compreende-se que seja fulminado com a sanção mais grave da inexistência jurídica o acto ou o contrato que nem sequer se encontravam previstos, autorizados e disciplinados por lei anterior" (89).
O autor reconhece, porém, que "mesmo que não se aceite a distinção entre a nulidade e a inexistência jurídica quanto aos contratos administrativos [...] e, portanto, que se sustente que, na hipótese que analisámos, o processo de concurso e, com ele, o acto de adjudicação e o contrato não estão feridos de inexistência mas apenas de nulidade, esta poderia, na mesma, ser invocada a todo o tempo perante os tribunais, nos termos gerais da teoria da invalidade do acto jurídico" (90).

6.2.3.1. Exorbita dos termos da consulta a análise de uma questão, de certo modo conexa, que consistiria na análise da problemática relativa à adjudicação sob condição de negociações posteriores com o adjudicatário, com vista a que este viesse a modificar a sua proposta.
Dir-se-á apenas que se estaria perante uma prática que contraria a própria natureza e a função do acto de adjudicação no processo de formação do contrato, posto que a adjudicação consiste num acto definitivo que põe termo ao processo do concurso, como processo de formação do contrato administrativo.
Contém, portanto, uma decisão definitiva sobre a escolha do co-contratante e sobre o próprio conteúdo do contrato a formar, que, assim, ficam fixados - cfr., verbi gratia, o artigo 98º, nº 1, do Decreto-Lei nº 235/86. Ora, isto seria infringido com as negociações posteriores à adjudicação, sempre que elas incidissem sobre aspectos substanciais ou essenciais do contrato, como sejam os preços, os prazos de cumprimento, ou as "prestações financeiras", principais ou acessórias" (91).

7.

7.1. Estão reunidos elementos bastantes para se tomarem as opções juridicamente recomendáveis, em face das questões por que a consulta se desdobra.
Reproduzam-se as duas primeiras, entre si estreitamente relacionadas:
"a) É ou não inválido um eventual acto de adjudicação e subsequente contrato de concessão que venha a ser praticado e celebrado pela LIPOR
II em decisão e execução do concurso mencionado?; b) Caso sejam considerados os mencionados actos inválidos, solicita-se a opinião sobre a consequência da invalidade: serão os actos referidos actos nulos ou anuláveis"?
Tendo, todavia, presente a anterioridade temporal e causal do concurso público lançado com vista à decisão de adjudicação e à formação do contrato, necessário se torna começar por ponderar, na sequência das considerações já produzidas no capítulo anterior, acerca da legalidade do referido concurso e dos elementos normativos que lhe servirem de base - o programa de concurso e o caderno de encargos. Assim se dará um começo de resposta à quarta questão da consulta, na parte não consumida pela solução que vier a ser encontrada para as primeira e segunda perguntas.
Apreciar-se-á na parte final a questão enunciada sob a alínea c) da carta reproduzida supra, no ponto 1.

7.2. Dito isto, e começando, pois, pela análise da questão da legalidade do concurso público, deixemos, desde já, consignada a nossa posição relativamente à tese que defende a inexistência de qualquer vício na abertura do concurso como resultado da ilegalidade do seu objecto,
à data da respectiva abertura - cfr. supra, ponto 6.2.1.
Invocar a "décalage" temporal entre a data de abertura do concurso e os momentos em que a adjudicação ou a outorga do contrato viriam a ter lugar, mediante a construção da tese do "contrato sob condição", é, salvo o devido respeito, artificioso e tecnicamente inadequado. A adopção do referido entendimento representaria violação do princípio da legalidade na abertura e no procedimento do concurso público, condição indispensável para a formação de certos contratos administrativos.
O contrário permitiria que ficasse aberto o caminho a procedimentos censuráveis, posto que quedaria sem sanção a prática de actos administrativos cujo objecto, a essa data, não tinha base legal, caracterizando-se como tendo objecto juridicamente impossível.
Resulta do que se expôs que o acto de abertura do concurso público que, por facilidade, temos designado como "LIPOR II", bem como o subsequente procedimento desse concurso, incluindo os elementos normativos que lhe serviram de base, foram atingidos pelo vício resultante da ilegalidade do objecto do concurso, pela impossibilidade legal do seu objecto.
Quais sejam as consequências jurídicas dessa ilegalidade no âmbito do próprio concurso (e dos referidos documentos), bem como quais as subsequentes projecções no acto de adjudicação e no contrato de concessão que venha a ser celebrado são as questões sobre que vamos passar a debruçar-nos.


8.

8.1. Princípio tradicional do Estado de direito é o da subordinação da administração à lei (artigo 266º, nº 2, da Constituição da República).
Tecnicamente, o princípio da legalidade analisa-se em duas dimensões fundamentais: a) princípio da legalidade negativa da administração, expressa através do princípio da prevalência da lei; b) princípio da legalidade positiva da administração, traduzido no princípio da precedência de lei.
De acordo com o primeiro destes princípios, os actos da administração, inclusive os normativos, devem conformar-se com as leis, sob pena de ilegalidade.
O segundo princípio significa, em geral, que a Administração só pode actuar com base na lei ou mediante autorização da lei.
O princípio da legalidade, conexionado com os demais, também assinalados no nº 2 do artigo 266º (igualdade, proporcionalidade, justiça e imparcialidade), aponta para um princípio de âmbito mais abrangente, o princípio da juridicidade da administração (pois todo o direito serve de fundamento e é pressuposto da actividade da Administração), o que representa um consequente acréscimo de limites internos aos poderes discricionários da Administração (92).

8.2. Em Direito Administrativo há, como já se disse, tradicionalmente, duas sanções para a ilegalidade: a inexistência e a invalidade, revestindo esta última as modalidades da nulidade (ou nulidade absoluta) e da anulabilidade (ou nulidade relativa).
Dentro da Secção III, sob a epígrafe "Da invalidade do acto administrativo", da Parte IV ("Da actividade administrativa") do CPA (93), referem-se os "actos nulos" (artigo 133º), o "regime de nulidade" (artigo 134º), os "actos anuláveis" (artigo 135º), o "regime da anulabilidade" (artigo 136º) e a "ratificação, reforma e conversão" dos actos administrativos (artigo 137º).
De entre as duas formas de invalidade, a anulabilidade constitui a regra, só excepcionalmente ocorrendo a nulidade. Isso mesmo resulta do disposto no artigo 135º segundo o qual "são anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção" (sublinhado agora). Como explicam Freitas do Amaral e outros, o regime impõe-se por razões de segurança e certeza jurídicas. Caso constituisse a regra, o regime da nulidade, por demasiado violento, manteria a pairar sobre os actos suspeitos de invalidade o perigo de, a qualquer momento, virem a ser considerados sem efeito. Isto sem prejuízo da constatação segundo a qual" o número de casos de nulidade determinados em lei especial tem vindo a aumentar nos últimos anos" (94).

8.3. A nulidade não deve ser confundida com a inexistência. Como forma de invalidade que é, a nulidade pressupõe a existência de um acto, mas no qual os requisitos de validade foram preteridos de modo tão grave e evidente que a lei expressamente comina essa sanção.
O nº 1 do artigo 133º do CPA prescreve que "são nulos os actos a que falta qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade".
Quando se verifique a omissão de qualquer dos elementos essenciais, mas ainda seja possível reconhecer qual o tipo legal em que o acto se insere, este será nulo. Quando não seja de todo possível reconhecer qual o tipo legal de acto, isto é, quando a ausência dos elementos essenciais atinja um grau tal que, havendo uma aparência de acto, não seja possível reconduzi-lo a um tipo legal, estaremos perante um caso de inexistência do acto - categoria expressamente reconhecida pelo CPA (cfr. artigos 137º, nº 1, e 139º, nº 1, alínea a)) (95).

O regime jurídico da inexistência difere do da nulidade: por exemplo, aos actos inexistentes não é aplicável o disposto no artigo 134º, nº 3 (96).

8.3.1. Refira-se, a propósito, que parte da doutrina nega autonomia dogmática à figura da inexistência, confundindo-a com a da nulidade (97).
Segundo outros autores, embora fosse lícito invocar tal figura, ela seria destituída de interesse prático, uma vez que o seu regime jurídico não seria diferente do aplicável à nulidade.
Todavia, a larga maioria da doutrina nacional não perfilha tal entendimento, reconhecendo, pelo contrário, autonomia teórica e relevância prática, no âmbito do direito administrativo, à figura da inexistência (98).
Como já ponderava Marcello Caetano, "quando tão grosseiramente se queira fazer passar por acto administrativo um facto ou factos onde não se encontra nada que corresponda ao conceito respectivo, claro está que a própria inexistência jurídica do acto resulta da própria natureza desses factos", não sendo sequer necessário "lei que o diga" (99).
Há, todavia, entre os autores que enfileiram nesta corrente dominante, algumas "nuances" na fixação dos elementos distintivos dos conceitos de "inexistência" e "nulidade".
A posição predominante era representada por autores, como Sérvulo Correia, para quem a falta de alguns dos elementos essenciais do acto gera a inexistência (100).
Também Esteves de Oliveira sustenta que não há acto administrativo sempre que falte um dos elementos da sua própria noção ou quando seja violado um requisito que a lei considere necessário para que a conduta do órgão administrativo se diga querida (101). E acrescenta:
"O acto administrativo é, portanto, inexistente quando praticado sob reserva mental ou coacção absoluta; quando seja emanado dos membros dum órgão colegial que não se reuniram, que se reuniram mas sem o quorum legal ou que, em reunião sem o quorum, tomaram a deliberação sem a maioria simples dos votos dos presentes... Ao regime da inexistência do acto administrativo ficam sujeitas também as condutas e operações materiais levadas a cabo por agentes da Administração sem a precedência (quando ela seja exigida) dum acto jurídico definidor da situação do particular em cujo património ou liberdade se produzem os referidos efeitos materiais" (102).

8.3.2. No artigo 200º, nº 1, do Projecto do Código de Processo Administrativo Gracioso, publicado em 1981, prescrevia-se que eram "nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais do acto administrativo ou a que a lei atribua expressamente esta forma de invalidade", formulação praticamente coincidente com a do transcrito nº 1 do artigo 133º do CPA.
Pretendia-se, claramente, escrevem os comentadores do CPA supra referenciados (Santos Botelho, Pires Esteves e Cândido Pinho) passar a considerar como nulos actos que até aí a doutrina maioritariamente considerava inexistentes. Tal posição foi, desde logo, criticada por autores como Sérvulo Correia e Esteves de Oliveira. O primeiro salientou ter sido pouco feliz a redacção do nº 1 do artigo 200º do projecto, já que em rigor "a falta de elementos essenciais não gera a nulidade, mas sim a inexistência, figura que vem reconhecida no artigo 202º do mesmo texto" (loc. cit., pág. 358, nota (1)).
Esteves de Oliveira, por seu turno, comentando o citado preceito do artigo 200º do Projecto, escreveu que, nos termos do mesmo, alguns dos actos referidos no texto (cfr. ponto 8.3.1., in fine) passarão a ser considerados
- "erroneamente, segundo o nosso ponto de vista" - como nulos e não como inexistentes (103).

8.3.3. O que interessa à definição de inexistência é que não haja identificação mínima do acto considerado, por carência de um ou vários pressupostos ou elementos do acto.
A inexistência não se prende, portanto, com a ausência de certo ou certos pressupostos ou elementos do acto, mas só com a ausência que impede a identificação mínima do acto. Ou seja, na identificação reside o critério determinante da inexistência de um acto.
Pelo contrário, no caso da nulidade existe um acto, só que tal acto é total ou parcialmente desprovido da susceptibilidade intrínseca de produzir os efeitos jurídicos prototípicos.
Uma coisa é não haver acto algum; outra é existir acto, mas ele ser objecto de uma depreciação mais ou menos intensa pelo Direito, privando-o da generalidade das virtualidades jurídicas que lhe deviam corresponder (104).

8.4. É a esta luz que deve ser interpretado o catálogo exemplificativo de actos nulos constante do nº 2 do artigo 133º do CPA. Ao elenco de nulidades enunciadas no artigo 88º, nº 1, do Decreto-Lei nº 100/84 (LAL) (105) acrescem agora aquelas que eram designadas pela doutrina como nulidades por natureza, que constam das alíneas c) e d) do nº 2.
Como observam Freitas do Amaral e outros, anotando o artigo 133º, as ditas nulidades por natureza - infelizmente nunca reconhecidas pela nossa jurisprudência - passam a ser nulidades por determinação da lei (106).
Atento o disposto pela alínea c) do nº 2, são actos nulos "os actos cujo objecto seja impossível, ininteligível ou constitua um crime"(107).

8.5. Considerando que, à data da sua abertura (bem como ao longo do tempo por que se desenvolveu o respectivo procedimento), o respectivo objecto era juridicamente impossível, deveria o acto de abertura do concurso público em apreço ser considerado nulo (108).
Tal nulidade afectaria, como consequência, todo o desenvolvimento do concurso, posto que o objecto do mesmo continuou a ser legalmente impossível.
A nulidade do concurso teria como consequência permitir concluir que a adjudicação ou o contrato que, subsequentemente, viessem a ser outorgados, não tinham o indispensável suporte de um concurso público válido, pelo que também quedariam feridos de nulidade.
Em face da caracterização do vício, e do correlativo regime jurídico, compaginável com a profundidade da violação do princípio da legalidade que afectou, desde a génese, o concurso público, a respectiva sanção seria a nulidade de todo o concurso. Do mesmo modo, atenta a inexistência jurídica do respectivo objecto, ficariam feridos de nulidade absoluta o acto de adjudicação, bem como o contrato que viesse a ser outorgado.


9.

Estamos, todavia, longe de resolver as questões colocadas à nossa consideração. Com efeito, importará atentar agora no problema de saber se a legislação entretanto publicada, e já desenvolvidamente apresentada (Decretos-Leis nºs 372/93 e 379/93, de 29 de Outubro e 5 de Novembro, respectivamente), entrada em vigor no decurso da tramitação do concurso público (antes do acto de adjudicação) teve ou não como consequência jurídica a validação da ilegalidade que afectava o concurso público em referência.
Não se confunda, porém, a perspectiva em que nos situamos agora - eventual validação por acto legislativo posterior de actos feridos de nulidade anteriormente praticados - com a sanação de acto anulável.
A qualificação do efeito do vício, como nulidade, resulta do que atrás se expôs e da subsunção da situação em presença ao artigo 133º do CPA (falta de elemento essencial, nos termos do nº 1 e/ou objecto legalmente impossível, de acordo com a alínea c) do nº 2).
Do que agora se cura é de coisa distinta: saber se a entrada em vigor de lei posterior que torna legal o objecto, até então ilegal, do concurso, não terá o efeito de validar os actos já praticados.
E, para a resolução desta questão, importa ponderar acerca do regime jurídico da aplicação da lei no tempo.

9.1. Escreveu-se no parecer 62/93 (109) que os problemas da sucessão de leis no tempo suscitados pela entrada em vigor de uma lei nova podem, ao menos em parte, ser directamente resolvidos por essa mesma lei, mediante disposições adrede formuladas, chamadas "disposições transitórias".
Discorrendo acerca do assunto, escreve Baptista Machado:
"Estas disposições transitórias podem ter carácter formal ou material. Dizem-se de direito transitório formal aquelas disposições que se limitam a determinar qual das leis, a LA ou a LN, é aplicável a determinadas situações. São de direito transitório material aquelas que estabelecem uma regulamentação própria, não coincidente nem com a
LA nem com a LN, para certas situações que se encontram na fronteira entre as duas leis (110).
No entanto, a maior parte das vezes ou para a grande maioria dos casos o legislador nada diz em especial sobre a lei aplicável a situações em que se suscita um problema de conflitos de lei no tempo. Deverá então o intérprete socorrer-se dos princípios vertidos no artigo 12º do Código Civil.
Como escreve Menezes Cordeiro, em estudo recente, (111), o direito transitório formal dispõe hoje de um regime geral, inserido no artigo 12º do Código Civil, preceito que funciona "como uma autêntica bitola profunda da ordem jurídica, dando uma medida de valor que se deve ter sempre em conta".
Prescrevendo acerca da aplicação das leis no tempo, dispõe o artigo 12º do Código Civil:
"1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor".
Do preceito reproduzido ressaltam dois princípios: o da não retroactividade da lei e o da sua aplicação imediata.
A lei nova, em princípio, só tem eficácia para o futuro, pelo que, como regra, apresenta eficácia prospectiva constituindo excepção os casos de eficácia retroactiva. O fundamento do princípio de não retroactividade é geralmente encontrado na necessidade de segurança jurídica, na protecção da confiança, na estabilidade do direito, podendo encontrar apoio na ideia de que a lei só é obrigatória depois de regularmente elaborada e publicada.

Para o princípio da aplicação imediata da lei nova também se invocam vários fundamentos. Desde o império que dimana da lei nova, como a única vigente no momento da aplicação, passando pela superioridade das leis novas sobre as leis antigas (pelo progresso que, em princípio, revelam), pelo facto de a lei apenas proteger no presente os direitos dos indivíduos, de modo algum os garantindo no futuro, até à razão, decisiva para Paul Roubier, da unidade da legislação num dado país, sob pena de tudo se saldar numa confusão inextricável nas relações jurídicas (112).
Os grandes escolhos na aplicação das leis que se sucedem no tempo levantam-se nos casos de situações jurídicas duradouras, que perduram, de "trato sucessivo", como lhes chama A. Rodrigues Queiró (113).
Escreve, a esse propósito, Galvão Telles:
"Sucede porém que a lei nova não raro encontra diante de si situações da vida, relações sociais, que vêm já do passado, nele lançam as sua raízes.
Isto pode pôr limites e condições à imediata aplicação da lei publicada, a fim de que se não perturbe a necessária estabilidade daquelas situações ou relações.
Daí a possível sobrevivência do Direito anterior, que se prolonga na sua aplicação mesmo para além do momento em que foi revogado.
É o problema extremamente difícil do Direito intertemporal, ou da aplicação da lei no tempo, problema que consiste em saber, publicadas sucessivamente duas leis a segunda das quais revoga a primeira, qual delas é a que se aplica às situações que se colocam por assim dizer na fronteira temporal entre as duas" (114).
Vejamos qual o entendimento que resulta, para tais situações, do disposto no nº 2 do artigo 12º do Código Civil.
Na esteira da doutrina aí citada, transcrevemos do parecer nº 239/77:
"Neste nº 2 estabelece-se a seguinte disjuntiva: a lei nova ou regula a validade de certos factos ou os seus efeitos (e neste caso só se aplica aos factos novos) ou define o conteúdo, os efeitos de certa relação jurídica independentemente dos factos que a essa relação deram origem (hipótese em que é de aplicação imediata, quer dizer, aplica-se, de futuro, às relações jurídicas constituídas e subsistentes à data da sua entrada em vigor).
"Precisamente a ratio legis que está na base desta regra da aplicação imediata é: por um lado, o interesse na adaptação à alteração das condições sociais, tomadas naturalmente em conta pela nova lei, o interesse no ajustamento às novas concepções e valorações da comunidade e do legislador, bem como a existência da unidade do ordenamento jurídico, a qual seria posta em causa e com ela a segurança do comércio jurídico, pela subsistência de um grande número de situações duradouras, ou até de carácter perpétuo, regidas por uma lei há muito abrogada; por outro lado, o reduzido ou nulo valor da expectativa dos indivíduos que confiaram, sem bases, na continuidade do regime estabelecido pela lei antiga uma vez que se trata de um regime puramente legal, e não de um regime posto na dependência da vontade dos mesmos indivíduos".
Ver-se-á oportunamente qual a aplicação que importa fazer dos princípios expostos à situação sob consulta.

9.2. O problema fulcral que importa analisar consiste em saber em que medida e com que limites pode o legislador validar procedimentos administrativos ilegais.
Concretizando: a Administração não pode, perante um acto insusceptível de produzir quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade, sendo esta invocável a todo o tempo por qualquer interessado, podendo ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer Tribunal (115), a Administração não pode, repete-se, apagar os efeitos dessa nulidade, "regularizando os actos nulos".
Podem, todavia, configurar-se motivações de indiscutível interesse público, susceptíveis de aconselharem a alteração do quadro jurídico existente à data da prática do acto e/ou do procedimento ferido de nulidade.
O legislador pode, pois, ser chamado a intervir para evitar tais malefícios sociais e "a desordem jurídica" que poderia resultar da sanção da actividade administrativa. Tal intervenção, que terá, todavia, de respeitar o princípio da juridicidade da administração, tal como oportunamente o configurámos (116), encontra o seu fundamento no próprio texto fundamental, desde que respeitados os ditames constitucionais.

9.3. A intervenção do legislador pode consistir numa transformação das condições de legalidade de um acto (117).
Através de tal medida, o legislador pode tornar legal o que, na origem, o não era.
Tal atribuição de base legal pode simplesmente efectuar-se pela edição de uma lei retroactiva (ou interpretativa) que dá ao acto (ou ao procedimento) administrativo a base legal que lhe faltava.
Assim, a par da lei interpretativa, a lei com efeitos retroactivos modifica as condições da legalidade de um acto ilegal, porventura, ferido de nulidade, atribuindo-lhe, desde a origem, a base legal relativamente ao(s) elemento(s) ou pressuposto(s) ferido(s) pelo vício.
Por força de uma ficção, a lei nova, seja interpretativa ou retroactiva, é suposta como estando em vigor desde a data em que o acto administrativo foi praticado, pelo que a legalidade desse acto deixa de ser apreciada pela normação realmente em vigor àquela data mas por referência às normas posteriormente editadas.
Apesar de, em termos teóricos, a lei interpretativa não ser considerada como uma lei inovadora, mais não fazendo do que exprimir, ab initio, a vontade do legislador, pelo que como que se "incorpora" na lei interpretada.
Todavia, uma lei não retroactiva já não pode tornar legal um acto administrativo inválido à data da sua entrada em vigor (118).
Escreve Bernard Mathieu:
"Que le législateur procède à une "validation" par substitution de base légale, ou à une "validation" partielle, il donne base légale à un acte administratif non conforme à la législation antérieure; il modifie également les règles que le juge a pour mission d'appliquer. En effet, le juge devra apprécier l'acte au regard de la loi nouvelle et non plus selon la législation en vigueur à la date d'édiction de l'acte administratif" (119).

9.4. Permita-se que, em jeito de remate, se estabeleça o seguinte quadro.
O recurso às "validações" legislativas é, em face das necessidades sociais e jurídicas, uma inevitabilidade.
Em contrapartida, não se poderá permitir que tais "validações" se transformem em mézinha capaz de resolver o conjunto de problemas que a invalidade dos seus actos coloca à Administração.
O compromisso que se impõe, a cuja luz se deve julgar o bom fundamento das referidas "validações", deve buscar-se na conciliação daquelas exigências contrárias.
A intervenção do legislador deve ser admitida quando, e apenas quando, o estrito respeito do princípio da legalidade provoque desproporcionada desordem jurídica e desadequadas e desnecessárias violações de interesses sociais relevantes.
Em tais casos, justificar-se-á, excepcionalmente, o estabelecimento de uma nova disciplina jurídica a fim de reparar os inconvenientes resultantes da invalidade da situação existente.
O que terá que ser feito, como vimos, por intermédio de um diploma legal dotado de efeitos retroactivos (ou de natureza interpretativa).

9.5. Procuremos no nosso ordenamento jurídico a concretização exemplificativa da doutrina acabada de expor.
Um exemplo de "validação", por via da lei, de actos nulos e, mesmo, de actos inexistentes, pode encontrar-se no Decreto-Lei nº 413/91, de 19 de Outubro, diploma que definiu o regime de regularização de actos de provimento de agentes e funcionários dos serviços dos municípios e que estabelece sanções para a prática de actos de provimento nulos ou inexistentes. Nos termos do nº 1 do artigo 3º, "os funcionários que tenham sido promovidos com violação de disposições legais geradores de nulidade ou inexistência jurídica consideram-se providos nessa categoria...". Trata-se de um caso daquilo a que uma autora chama "validação directa" (120).
Uma outra concretização que se pode dar diz respeito ao disposto no nº 3 do artigo 30º do CPA, a propósito da fixação, por lei posterior, de competência ao órgão administrativo a que o procedimento estava afecto (e que dela carecia).


10.

10.1 Cabe, pois, agora, apreciar o regime dos Decretos-Leis nºs 372/93 e 379/93 quanto à sua aplicação no tempo.
Do Decreto-Lei nº 372/93 não é possível destacar qualquer elemento normativo de direito transitório, pelo que, sem outros subsídios, haveria que recorrer aos compassos do artigo 12º do Código Civil.
Encontramos, todavia, no Decreto-Lei nº 379/93, no artigo 18º ("Disposições transitórias e finais") alguns elementos de direito transitório de que nos podemos socorrer. Recorde-se o nº 1 desse artigo, segundo o qual "as situações actualmente existentes relativas aos serviços mencionados no presente diploma devem ser reajustadas ao regime agora estabelecido...".
É certo que o diploma que "abriu" à iniciativa privada o sector da actividade económica, até então vedado, que constituía o objecto do concurso público em apreço, foi o Decreto-Lei nº 372/93.
Mas não se recusará que o referido artigo 18º do Decreto-Lei nº 379/93, sem ser uma norma interpretativa do Decreto-Lei nº 372/93, é indiscutivelmente um elemento relevante de interpretação quanto ao regime de aplicação temporal do precedente diploma.
Isto porque os dois decretos-leis constituem um "bloco normativo" unitário, abrangente e indissociável.
Di-lo, como se compreende, o preâmbulo do Decreto-Lei nº 379/93: "Uma vez alterada a lei da delimitação de sectores, no sentido de permitir o acesso de capitais privados às actividades de [...], estão reunidas as condições para se consagrar o regime legal da gestão e exploração de sistemas que tenham por objecto aquelas actividades".
E, na normação editada estabeleceu-se o princípio segundo o qual "as situações actualmente existentes [...] devem ser reajustadas ao regime agora estabelecido, no prazo máximo de 180 dias, a contar da data de entrada em vigor do presente diploma".

É manifesto que o legislador, ciente da verificação de "situações actualmente existentes", feridas de ilegalidade e desconformes com o modelo que consagrou, pretendeu, mediante o mecanismo do reajustamento, proceder à respectiva "validação".
Compreender-se-á o sentido consequente de tal intencionalidade legislativa, se se atentar na génese e no processamento do concurso público LIPOR II. Em todos os momentos, por múltiplos meios e através de diversificados actos de diferentes entidades, o Governo deu o seu aval à abertura e ao desenvolvimento do processo.
O que se compreende, se se ponderarem os relevantes interesses públicos cuja prossecução se visava e se se pensar na probabilidade pressentida ou prevista de uma "liberalização" legislativa do regime de delimitação dos sectores económicos.
Assim, a vontade de produção de efeitos retroactivos que ressalta, com lógica clareza, do referido nº 1do Decreto-Lei nº 379/93, não pode deixar de "iluminar", conformando-o pela mesma óptica, o regime de aplicação temporal do Decreto-Lei nº 372/93.

10.2. Dado como adquirido o escopo retroactivo pretendido pelo nº 1 do artigo 18º do Decreto-Lei nº 379/93, que não pode deixar de iluminar o sentido da aplicação no tempo do precedente Decreto-Lei nº 372/93, apreciemos com mais detalhe a expressão "situações actualmente existentes", ali inserida.
Pode considerar-se que em tal sintagma é possível incluir não só os processos em curso (concursos abertos), em que ainda não há adjudicação, bem como os processos em que, já tendo havido adjudicação, ainda não foi outorgado o contrato de concessão, e ainda os processos em que o referido contrato de concessão já foi celebrado.
Tudo aponta, com efeito, no sentido de se entender que mesmo os contratos de concessão já outorgados devem ser, na medida do possível, reajustados ao regime resultante da nova normação.
Entendimento que encontra amparo no disposto no nº 2 do artigo 18º, cuja previsão (situações actualmente existentes não precedidas de concurso público) inclui as concessões já outorgadas (121).

10.3. Mas, a ser assim, ou seja, se os próprios contratos de concessão estão sujeitos a reajustamento, por maioria de razão o estarão os processos em concurso em que a concessão ainda não foi outorgada.
E, no caso de, à data da entrada em vigor do diploma, ainda não ter ocorrido a adjudicação (122), não existindo então quaisquer direitos ou interesses legítimos constituídos a favor de qualquer concorrente, que o dono da obra seja obrigado a respeitar, a amplitude de movimentos quanto ao reajustamento é maior, podendo ir até, se tal fosse necessário, à possibilidade de recomeçar de novo o processo, desde o começo. O reajustamento da situação existente deverá ter então em vista que o próprio acto de adjudicação seja, ele próprio, compatível com a nova legislação, visto ser posterior à entrada em vigor da mesma, com ela se conformando materialmente na medida do que for necessário, adequado e pertinente. O que significará que não se justifica destruir o já processado, na medida em que for conforme com o núcleo das disposições de natureza imperativa constantes do novo regime (123).

10.4. Era, como já se disse, nesta fase, anterior à adjudicação, que se encontrava o concurso público de concepção, construção, financiamento e exploração da Estação LIPOR II, aquando da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 379/93. Os concorrentes tinham sido notificados da intenção de adjudicação - acto de natureza instrutória, não constitutivo de quaisquer direitos ou interesses legalmente protegidos -, nos termos e para os efeitos dos artigos 100º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
Quer isto dizer que, mesmo aceitando-se, como se aceita, a "validação", pela lei nova, dos actos e do procedimento do concurso público, se deveria ter procedido então ao reajustamento do concurso, nos termos do artigo 18º, nº 1, do Decreto-Lei nº 379/93.
Ou seja, a "validação", operada pela nova legislação, do objecto do concurso público, e, por consequência, dos actos relativos à sua abertura e procedimento, é problema distinto da ilegalidade que afecta o acto de adjudicação, praticado em 4 de Janeiro do ano em curso, ou seja, após a entrada em vigor do novo regime legal, definidor de exigências relativas à formação, conteúdo e natureza do contrato de concessão para a exploração e gestão dos serviços públicos municipais de recolha e tratamento de resíduos sólidos.
Exigências, constantes do regime da nova lei, não se acham, como vimos, respeitadas pelo caderno de encargos nem pelo programa de concurso, pelo que a adjudicação em desconformidade, porque não "reajustada",
às referidas normas legais imperativas é ilegal e o contrato que venha a ser celebrado sem respeito pelo conteúdo nelas consagrado será nulo, atento o disposto no artigo 17º, já transcrito.

10.5. Atento o regime - regra da anulabilidade dos actos administrativos, será essa a forma de invalidade que afecta o acto de adjudicação praticado, sendo susceptível de impugnação perante os tribunais nos termos da legislação reguladora do contencioso administrativo (124) (artigos 135º e 136º, nº 2, do CPA) e podendo ser revogado nos termos previstos pelo artigo 141º do mesmo Código (artigo 136º, nº 1).
Por outro lado, o acto anulável é susceptível de convalidação, por ratificação, reforma ou conversão (artigo 137º, nº 1).
Como é óbvio, a convalidação de uma adjudicação imporá, quando for viável face à dimensão confinada da paleta onde se inscrevem os "matizes" a compatibilizar, o prévio reajustamento da situação existente ao regime estabelecido pelo Decreto-Lei nº 379/93, por forma a conformar-se com o mesmo.
Decorrido o prazo de impugnação previsto no artigo 28º da LPTA, o acto deixa de ser contenciosamente impugnável (125).
Todavia, e como se viu, atento o disposto no artigo 17º do Decreto-Lei nº 379/93 (em ligação com a segunda parte do nº 1 do artigo 133º do CPA), será nulo o contrato de concessão que venha a ser celebrado com violação do disposto pelo citado diploma.

10.6. Solicita-se também na consulta, sob a alínea c), que se indique o procedimento a seguir pelo Estado (126), no caso de os mencionados actos (de adjudicação e contrato de concessão) serem considerados inválidos.
Como se tem repetidamente afirmado, ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República compete emitir parecer restrito à matéria de legalidade nos casos de consulta obrigatória previstos na lei e naqueles em que o Governo o solicite, sendo os pareceres sobre disposições de ordem genérica, quando homologados e publicados no "Diário da República" para valerem como interpretação oficial, perante os respectivos serviços, das matérias que se destinam a esclarecer (artigos 34º, alínea a), e 40º, nº 1, da Lei nº 47/86, de 15 de Outubro).
Todavia, essa interpretação não vincula os Tribunais, os quais são independentes e apenas estão sujeitos à lei, sendo as suas decisões obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas, prevalecendo ainda sobre as de quaisquer outras autoridades (artigos 206º e 208º, nº 2, da Constituição da República (127).


10.7. Entende-se por tutela administrativa (128)"o poder conferido ao órgão de uma pessoa colectiva de intervir na gestão de outra pessoa colectiva autónoma - autorizando ou aprovando os seus actos ou, excepcionalmente, modificando-os, revogando-os ou suspendendo-os, fiscalizando os seus serviços ou suprindo a omissão dos seus deveres legais -, no intuito de coordenar os interesses próprios da tutela com os interesses mais amplos representados pelo órgão tutelar" (129); ou "o conjunto dos poderes de intervenção de uma pessoa colectiva pública na gestão de outra pessoa colectiva, a fim de assegurar a legalidade ou o mérito da sua actuação" (130).
Segundo o critério do fim, "concebe-se, pois, uma tutela que visa aferir da legalidade da decisão da entidade tutelada, da sua conformidade à lei (tutela de legalidade); ao lado de uma tutela que procura indagar do seu mérito, isto é, se a decisão, abstraindo da sua legalidade, é ou não conveniente e oportuna, correcta ou incorrecta, dos pontos de vista administrativo, técnico, financeiro, etc.
"Segundo o conteúdo, distinguem-se três espécies fundamentais de tutela administrativa: a tutela "correctiva", tendente a corrigir os eventuais inconvenientes resultantes do conteúdo dos actos projectados ou decididos pelos órgãos tutelados; a tutela "inspectiva", traduzindo o poder de fiscalizar órgãos e serviços da pessoa colectiva tutelada, para o efeito de promover a aplicação de sanções por ilegalidade ou má gestão; a tutela "substitutiva" ou "supletiva" que consiste no poder conferido à autoridade tutelar de suprir as omissões do órgão tutelado, praticando em seu lugar os actos devidos" (131).
Como rector da intervenção tutelar, considera-se, porém, o princípio expresso na fórmula "os poderes de tutela não se presumem", que significa, além do mais, que os poderes compreendidos na esfera do ente tutelar são estritamente os que a lei prevê (132).
No que respeita à tutela, a liberdade da entidade a ela sujeita é a regra e o controlo a excepção. A tutela há-de ser prevista na lei que designe a autoridade tutelar, e defina o conteúdo, o modo e as formas de intervenção tutelar (133).
É o princípio contido na regra clássica "pas de tutelle sans texte, pas de tutelle au delà des textes" (134).
A intervenção tutelar, como limite (ou excepção) à autonomia dos entes descentralizados, supõe a concorrência de uma habilitação legal para agir. A tutela apenas pode ser exercida nos casos, nos limites e segundo as condições previstas na lei; o controlo de tutela há-de ser expressamente atribuído pelo direito positivo (135).
O princípio permite destacar duas características essenciais. De um lado, que não existem poderes gerais de tutela; a atribuição de competência em matéria tutelar não se pode exprimir pela enunciação de uma missão de controlo relativamente a uma generalidade de actos, mas apenas pelo desenvolvimento de poderes em hipóteses particularizadas, claramente determinadas na lei. O mesmo é dizer, que a tutela apenas se exerce de maneira pontual nas hipóteses limitativamente especificadas.
Por outro lado, que a autoridade tutelar, tendo o exercício das respectivas competências limitado às formas, modos e condições expressamente previstos nos textos, apenas poderá actuar, em cada caso, segundo um processo de intervenção previsto, preciso e organizado (136).


10.8. A tutela administrativa sobre as autarquias locais consiste na verificação do cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos e é exercida nos casos e segundo as formas previstas na lei (artigo 243º, nº 1, da CRP). Tal tutela administrativa perfila-se, pois, estritamente como tutela de legalidade e é extensiva, por expressa menção do artigo 1º da Lei nº 87/89, de 9 de Setembro, às associações de municípios de direito público.
Como, com mais desenvolvimento, prescreve, acerca do seu objectivo, o artigo 2º da referida Lei, "a tutela administrativa consiste na verificação do cumprimento das leis, e regulamentos por parte dos órgãos autárquicos e do funcionamento dos serviços das autarquias locais e associações de municípios, bem como na aplicação das medidas sancionatórias nos casos previstos no presente diploma".
A tutela exerce-se através de inspecções, inquéritos e sindicâncias, bem como através da recolha e análise de informações e esclarecimentos, com interesse para a verificação das leis e regulamentos pelos órgãos e serviços das autarquias locais e associações de municípios (artigo 3º).
A tutela de legalidade visa aferir da legalidade da decisão da entidade tutelada; se o acto praticado pela entidade sujeita a tutela estiver viciado de ilegalidade, a intervenção da entidade tutelar poderá, conforme os modos de previsão, consistir na não aprovação do acto ou na faculdade de correcção através de revogação, modificação ou suspensão do acto - tutela 'revogatória'.
O modo privilegiado de exercício de tutela revogatória é o denominado recurso tutelar, modalidade de "recurso administrativo mediante o qual se impugna um acto de uma pessoa colectiva autónoma perante a autoridade que sobre ela exerça poderes tutelares" (137).
"O seu carácter excepcional advém de que a competência correctiva do órgão de tutela não compreende normalmente poderes revogatórios, os quais só podem, portanto, ser exercidos, como se sublinhou, nos casos em que a lei directamente os confere (138) ou institui um recurso administrativo para a autoridade tutelar (139)".
O carácter de excepção da intervenção tutelar reconduzido ao princípio "pas de tutelle sans texte" e determinando a interpretação precisa sobre os modos e as formas de intervenção, implica, assim, que os poderes da entidade tutelar apenas podem ser exercidos se e onde a lei expressamente os constitui, nos termos, nos modos, nas formas e nos respectivos efeitos.
Deste modo, o controlo de legalidade dos actos da entidade sujeita a tutela, apenas poderá ser exercido no âmbito da relação tutelar desde que, de forma directa, precisa e processualmente definida, esteja especificamente previsto.
Definido de uma forma positiva, o conceito constitucional de tutela designa uma função administrativa de controlo por aí se distinguindo dos meios jurisdicionais de controlo (contencioso administrativo, etc.) -, exercida de acordo com o procedimento juridicamente ordenado a tal fim e apenas com o objectivo de verificar o cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos e associações de municípios.
Não se trata, pois, de assegurar uma superioridade abstracta do poder central sobre o poder local, mas de garantir a unidade da ordem jurídica e o respeito da legalidade democrática (a tutela como função do Estado de direito democrático).(140).


10.9. Resulta do que se expôs supra em 10.4. e seguintes, que, inexistindo na lei a previsão de mecanismos específicos de reacção, nomeadamente através do recurso tutelar (cfr. artigo 177º do CPA), e não se dispondo, por outro lado, de elementos susceptíveis de indiciarem a prática de factos justificativos da aplicação das sanções previstas nos artigos 8º e seguintes da Lei nº 87/89 (141), poderá o Governo directamente, ou através do governador civil do distrito, participar ao agente do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo de Círculo o vício que afecta a adjudicação efectuada, com vista à interposição do competente recurso contencioso de anulação - cfr. artigos 5º, nºs 1 e 2, e 7º, alínea c), da Lei nº 87/89, 136º, nº
2, do CPA, e 28º, nº 1, alínea c), da LPTA.
Vindo a ser outorgado o contrato de concessão em violação do disposto no artigo 17º do Decreto-Lei nº 379/93 (cfr 133º, nº 1, 2ª parte, do CPA), poderia o Governo invocar a nulidade a todo o tempo perante o tribunal competente - artigo 134º, nº 2, do CPA.
E, sem prejuízo do que se disse a propósito da pureza conceitual do instituto da tutela, de mais a mais, enquanto tutela de legalidade, pode o Governo, como é óbvio, no desenvolvimento do seu diálogo institucional com o poder local, aconselhar ou sugerir à LIPOR a revogação do acto de adjudicação praticado, com o subsequente reajustamento da situação existente ao regime do Decreto-Lei nº 379/93.
Motivo por que se justificarão algumas considerações adicionais sobre tal matéria, assim se indo ao encontro do que se pensa ser a intencionalidade da última questão da consulta.


11.

Já o dissemos: o reajustamento não pode deixar de ser prévio ao acto de adjudicação - cfr. supra, pontos 10.2. e 10.3.
Ora, face às diferenças entre o quadro jurídico de base que conformou os documentos normativos do concurso e o regime do Decreto-Lei nº 379/93, será inevitável o reexame do procedimento, com vista à introdução de adaptações por forma a alcançar o escopo da lei (142).
Observa-se, a propósito, que ainda se está a tempo de o fazer, tendo presente o prazo de 180 dias, a contar da data de entrada em vigor do Decreto-Lei nº 379/93, de 5 de Novembro, fixado no nº 1 do referido artigo 18º.
Refira-se, ainda que a título apendicular, que uma forma alternativa de contornar, eventualmente, a exigência legal de "reajustamento", poderia consistir em cindir as componentes integrantes do contrato, retirando
à disciplina do Decreto-Lei nº 379/93, e, por conseguinte, ao imperativo do reajustamento, as parcelas "concepção", "construção" e "financiamento", procedendo à respectiva adjudicação, o mesmo não fazendo, porém, quanto à vertente "exploração.
Tratar-se-ia, porém, de uma flagrante violação da lógica unitária do concurso e do contrato, representanto alteração essencial dos respectivos pressupostos e condições, o que inquinaria irremediavelmente a adjudicação e o contrato subsequentemente celebrado.
O reajustamento imporá, assim, a necessidade de reexame dos documentos do concurso (mormente do programa e do caderno de encargos), tendo em vista a realização das adaptações resultantes da natureza imperativa das disposições do Decreto-Lei nº 379/93, mencionando-se, a título exemplificativo, as seguintes preocupações a ter em conta:
- adopção do tipo contratual de concessão de serviço público, legalmente imposto e definição do objecto da concessão;
- fixação do regime de reversão da propriedade dos bens afectos à concessão;
- proibição da admissibilidade de variantes em relação às propostas dos concorrentes e enumeração rigorosa dos critérios de adjudicação;
- enunciação, de acordo com o novo regime, dos poderes do concedente e correspectivos deveres do concessionário, estabelecimento do regime de sequestro, de rescisão e de resgate e prescrição das sanções pecuniárias a aplicar em consequência do incumprimento do contrato pelo concessionário (143).
O cotejo das súmulas supra efectuadas em 4.3. e 4.4. (incluindo 4.4.1.), quanto aos documentos do concurso e, bem assim, nos diversos itens do ponto 5.6., no respeitante ao regime do Decreto-Lei nº 379/93, ajudará a inventariar as questões que, no âmbito do reajustamento a empreender, deverão merecer consideração.
Em consequência das alterações a que nos temos vindo a referir, importará conceder aos concorrentes um prazo que permita a adaptação das suas propostas, do que decorrerá a necessidade de reapreciação global das mesmas, após alteração de acordo com os novos parâmetros.
Como é evidente, o reajustamento a efectuar deverá ter sempre presente o respeito dos princípios da igualdade, da justiça e da boa fé, indissociáveis da estabilidade das regras do concurso público e do conteúdo do convite a contratar que o inicia.


12.

Termos em que se extraem as seguintes conclusões:
1ª A LIPOR - Serviço Intermunicipalizado de Tratamento de Lixos da Região do Porto - é uma associação de municípios, constituída pelos municípios de Espinho, Gondomar, Maia, Porto e Valongo, com a posterior admissão de Matosinhos e Vila do Conde, tendo como objecto o tratamento e aproveitamento final dos lixos entregues pelos municípios associados, gerindo, mantendo e desenvolvendo as necessárias instalações e serviços privativos;
2ª Por anúncio publicado no "Diário da República", III Série, nº 247, de 26 de Outubro de 1992, a LIPOR lançou um concurso público de concepção, construção, financiamento e exploração, pelo período de 15 anos, de uma estação de tratamento de resíduos sólidos pelo processo de incineração, ao qual eram admitidas empresas nacionais, agrupamentos de empresas nacionais, empresas estrangeiras, agrupamentos de empresas estrangeiras e agrupamentos de empresas nacionais e estrangeiras;
3ª A essa data o acesso à actividade económica do saneamento básico era vedado a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza - artigo 4º, nº 1, alínea b), da Lei nº 46/77, de 8 de Julho, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 339/91, de 10 de Setembro;
4ª O Decreto-Lei nº 372/93, de 29 de Outubro, publicado no uso de autorização legislativa concedida pela Lei nº 58/93, de 6 de Agosto, veio permitir o acesso de capitais privados, em regime de concessão, às actividades de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos;
5ª A consagração do regime legal da gestão e exploração de sistemas que tenham por objecto as actividades indicadas na conclusão anterior foi feita através do Decreto-Lei nº 379/93, de 5 de Novembro;
6ª O sistema de tratamento de resíduos sólidos que é objecto do concurso público referido na conclusão 2ª configura-se como um "sistema municipal", sendo gerido por uma associação de municípios e não exigindo um investimento predominante por parte do Estado - artigos
4º, nº 2, da Lei nº 46/77, na redacção dada pelo Decreto- Lei nº 372/93, e 1º, nº 3, do Decreto-Lei nº 379/93;
7ª Atento o disposto nas conclusões 3ª e 4ª, os actos administrativos praticados com vista à abertura e ao desenvolvimento do concurso público violaram o princípio da legalidade, por virtude da impossibilidade jurídica do respectivo objecto, do que resultou a invalidade dos mesmos, com a consequente nulidade do concurso - cfr. artigo 133º, nºs 1 e 2, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aprovado pelo Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de Novembro;
8ª Os actos viciados podem ser, todavia, objecto de "validação" por força de lei posterior, dotada de efeitos retroactivos;
9ª Atento o disposto no artigo 18º, nº 1, do Decreto-Lei nº 379/93, "as situações actualmente existentes" devem ser "reajustadas" ao regime estabelecido no referido diploma, no prazo máximo de 180 dias, a contar da respectiva entrada em vigor;
10ª Na expressão "situações actualmente existentes" devem considerar-se incluídos: a) os processos em curso, correspondentes a concursos abertos em que ainda não há adjudicação; b) os processos em que, tendo já havido adjudicação, ainda não foi outorgado o contrato de concessão; c) os processos em que o referido contrato de concessão já foi outorgado;
11ª Constituindo os Decretos-Leis nºs 372/93 e 379/93 um conjunto normativo coerente, unitário e teleológicamente indissociável, o escopo de produção de efeitos retroactivos que ressalta do citado nº 1 do artigo 18º do Decreto-Lei nº 379/93 serve à interpretação do regime de aplicação no tempo do Decreto-Lei nº 372/93, iluminando-a de acordo com a sua intencionalidade;
12ª Resulta das conclusões 9ª a 11ª que, não obstante a convalidação do concurso a que se fez referência na conclusão 8ª, o acto de adjudicação praticado em 4 de Janeiro do corrente ano, deveria ter sido precedido do "reajustamento" imposto por lei;
13ª Não o tendo sido, a adjudicação em referência, desconforme às normas imperativas do Decreto-Lei nº 379/93, é ilegal, sendo o respectivo acto contenciosamente anulável, nos termos da lei - artigos 135º e 136º, nº 2, do CPA, e 28º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais (LPTA), aprovada pelo Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho;
14ª Se vier a ser celebrado contrato de concessão, em contradição com o disposto em normas imperativas do Decreto-Lei nº 379/93, o mesmo será nulo - artigo 17º do referido diploma legal;
15ª Sendo a tutela administrativa sobre as autarquias locais uma tutela de mera legalidade, e inexistindo na lei a previsão de mecanismos específicos de reacção, nomeadamente através da via do recurso tutelar, poderá o Governo, directamente, ou através do governador civil do distrito, participar ao magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo de Círculo, o vício que afecta a adjudicação efectuada, com vista à interposição do competente recurso contencioso - artigos 5º, nºs 1 e 2, e 7º, alínea c), da Lei nº 87/89, de 9 de Setembro, 136º, nº 2, do CPA, e 28º, nº 1, alínea c) da LPTA;
16ª O reajustamento a realizar não obriga ao recomeço do processo, mas impõe o reexame dos elementos normativos que lhe serviram de base, mormente do programa do concurso e do caderno de encargos, à luz da disciplina do Decreto-Lei nº 379/93, com vista à conformação material do procedimento com as disposições de natureza imperativa enformadoras do novo regime, implicando ainda a prática dos procedimentos consequentes.





1) Segundo a qual compete ao Governo, no exercício de funções administrativas, "defender a legalidade democrática".
2) O artigo 34º da Lei nº 47/86, de 15 de Outubro (e não de 11 de Outubro, como, por lapso, se refere na carta) enuncia a competência do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, sendo de sublinhar que, nos termos da alínea a), lhe cabe "emitir parecer restrito a matéria de legalidade nos casos de consulta obrigatória previstos na lei e naqueles em que o Governo o solicite".
3) Cfr. ofício MARN/0581/94 (Procº 2.6.5.1/94), de 4 de Fevereiro.
4) Cfr. ofício 1806(R-3166/93), de 3 de Fevereiro.
5) Cfr. ofício nº 105, acompanhado, entre outros, pelos seguintes documentos: Estatutos da LIPOR; Memorando do projecto LIPOR II; Despacho Conjunto de 15 de Maio de
1991, dos Ministros do Planeamento e da Administração do Território (MPAT) e do Ambiente e Recursos Naturais (MARN), publicado no "Diário da República", II Série, nº 158, de 12 de Julho de 1991, nomeando um grupo de trabalho com vista a analisar e propor soluções técnicas e financeiras para o tratamento e destino final dos resíduos sólidos urbanos da área metropolitana do Porto (Grupo de Trabalho "LIPOR");
Relatório de 19 de Setembro de 1991 do referido grupo de trabalho; Despacho Conjunto da Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (SEPDR) e do Secretário de Estado dos Recursos Naturais (SERN), de 25 de Fevereiro de 1993, criando e constituindo uma Comissão de Acompanhamento (CA) do processo relativo à central de incineração da LIPOR II, mormente no que se refere ao processo de concurso e subsequente adjudicação; Protocolo celebrado entre o MPAT, representado pela Direcção-Geral do Desenvolvimento Regional, o MARN, representado pela Direcção-Geral do Ambiente, a LIPOR e a Empresa Geral de Fomento (EGF), em 14 de Junho de 1993; Relatório da CA de Outubro de 1993, apreciando as propostas admitidas ao concurso;
Acta da reunião extraordinária do Conselho de Administração, realizada em 20 de Outubro de 1993, em que foi deliberado manifestar a intenção de adjudicação ao Agrupamento de Empresas CNIM-ESYS MONTENAY e proceder à notificação dos concorrentes do conteúdo da deliberação; Actas das reuniões da CA, realizadas em 6 e 20 de Dezembro de 1993; Acta da reunião extraordinária do Conselho de Administração da LIPOR, realizada em 4 de Janeiro de 1994, em que foi deliberado proceder à adjudicação ao referido agrupamento de empresas da concepção, construção, financiamento e exploração da estação de tratamento LIPOR II; o já referido (primeiro) parecer do Dr. Mário Esteves de Oliveira; Informação do Advogado Dr. Zacarias de Carvalho; Minuta de contrato administrativo a celebrar entre a LIPOR e o Consórcio ESYS MONTENAY *CNIM; acta da reunião da CA realizada em 5 de Janeiro de 1994; Despacho de 11 de Outubro de 1993 do SERN, transmitido à LIPOR, através do ofício SERN/2106/93/2311, da mesma data, em que é manifestada concordância com o relatório da CA, já mencionado, e através do qual aquele membro do Governo manifesta o entendimento de que, após a aprovação do relatório pelo Conselho Administrativo da LIPOR, deverá ser tomada a decisão de intenção de adjudicação ao concorrente classificado em primeiro lugar.
6) Cfr. o ofício nº 155, subscrito pelo Senhor Presidente do Conselho de Administração da LIPOR, bem como o requerimento que lhe está anexo, endereçado, na mesma data, pela referida entidade, ao "Senhor Procurador-Geral Adjunto".
7) Para além da documentação sumariada, foram apresentados "dossiers" pelos seguintes concorrentes:
"WASTE MANAGEMENT INTERNATIONAL PLC"; "GRUPO TIRPOR"; STEIN INDUSTRIE, UNIFER CONFRETH, ENGIL e RESIN"; "RELITRATE, KVAERNER e PARSONS TURBINE GENERTORS LIMITED". Conforme resulta dos termos da consulta e da precisão, a esse propósito, efectuada, tal documentação apenas suscitou abordagem na medida da sua pertinência com relação às questões colocadas à consideração deste corpo consultivo.
8) Cfr. o parecer nº 13/93, de 6 de Maio de 1993, mormente no que se refere ao confronto entre os regimes legais relativos às associações de municípios e às regiões de turismo.
9) Anote-se, desde já, a existência de sensíveis diferenças entre o regime constante do Decreto-Lei nº 390/82 (Capítulo IV) e o que viria a ser estabelecido pelo Decreto-Lei nº 379/93, de 5 de Novembro, que, oportunamente, analisaremos com o devido detalhe, diploma que permitiu o acesso de capitais privados às actividades económicas de captação, tratamento e rejeição de efluentes e recolha e tratamento de resíduos sólidos.
10) O Decreto-Lei nº 235/86, de 18 de Agosto foi, entretanto, revogado pelo Decreto-Lei nº 405/93, de 10 de Dezembro (artigo 241º), diploma que, todavia, só entrará em vigor seis meses após a data da sua publicação (artigo 242º).
11) Extrai-se do respectivo preâmbulo que o Decreto-Lei nº 235/86 revogou o Decreto-Lei nº 48871, de 19 de Fevereiro de 1969 (artigo 235º), por se tornar evidente, decorridos dezassete anos sobre a sua entrada em vigor, "a desactualização de algumas das suas disposições, facto que, aliado à necessidade de introduzir na ordem jurídica interna as regras de concorrência constantes das directivas da Comunidade Económica Europeia, nomeadamente da 71/304/CEE e da 71/305/CEE, levou a que se tenha optado por uma reformulação global do regime jurídico do contrato de empreitada de obras públicas, aproveitando ainda para reunir num só diploma toda a legislação avulsa posterior a 1969".
12) Veja-se, na interpretação de alguns normativos do Decreto-Lei nº 235/86, mormente no que se refere à compatibilização, lógica e sistemática, do disposto nos seus artigos 71º, nº 2, 72º, nº 2, e 80º, alínea b), o parecer nº 58/92, de 29 de Outubro de 1992.
A hipótese aí analisada reportava-se a um contrato administrativo (de empreitada de obras públicas e concessão de serviços públicos).

13) Sobre os "elementos que servem de base ao concurso", vejam-se os artigos 59º, que refere o projecto, o caderno de encargos e o programa de concurso, 61º (caderno de encargos) e 62º (programa de concurso).
14) Vejam-se, v.g., os artigos 59º, sobre os elementos que servem de base ao concurso, 61º, sobre o caderno de encargos, 62º, nº 1, alínea c), sobre admissão, ou não, de propostas com condições divergentes das do caderno de encargos, 63º, nº 2, alínea l), sobre as modalidades essenciais de financiamento (a indicar pelo anúncio do concurso), 76º, sobre "propostas condicionadas" e 81º, alínea d), segundo a qual a proposta não será considerada se, tratando-se de proposta condicionada, contiver alterações de cláusulas do caderno de encargos em relação às quais o programa do concurso não admite modificações.
15) Nos termos do nº 7 do artigo 43º, foi concedida permissão à futura admissão dos municípios de Matosinhos, Póvoa de Varzim, Vila do Conde e Vila Nova de Gaia. Nos demais casos, compete à assembleia intermunicipal pronunciar-se sobre a admissão de outros municípios - alínea g) do artigo 16º. Veja-se também o disposto na alínea p) do artigo 21º e nos artigos 43, nº 5, e 44º.
16) A associação tem a sua sede provisoriamente no lugar de Bouça da Macieira, Vila de Ermesinde, concelho de Valongo, sendo constituída por tempo indeterminado e podendo criar delegações, secções ou estabelecimentos em qualquer localidade (artigos 4º e 5º).
17) Cfr. o nº 6 do artigo 43º.
18) Por sua vez, a assembleia é o órgão de representação dos municípios na associação e é constituída pelos presidentes ou seus substitutos e por dois vereadores de cada uma das câmaras dos municípios associados, designados pelo respectivo executivo - artigo 14º.
19) Nos termos do artigo 42º, nº 1, é da competência do Tribunal de Contas o julgamento das contas da associação.
20) Cfr. o artigo 32º.
21) A executar na freguesia de Moreira, concelho da Maia - cfr. ponto 3, alíneas a) e b), do anúncio do concurso, a que se faz referência supra, em 2.1.
22) A Central de compostagem de resíduos sólidos de Ermesinde integra-se, como se viu, no património da Associação e recebe actualmente os resíduos provenierntes dos cinco municípios inicialmente constituintes da mesma, sendo a parte excedentária desta em relação à capacidade de tratamento da instalação depositada em aterro a ela anexo - cfr. nota descritiva, pontos 1 e 2, documento cujas linhas essenciais se vão agora acompanhar.
23) A capacidade da central de Ermesinde, única que se pode considerar em termos de tratamento adequado, corresponde a 64 500 toneladas/ano, insuficiente para a produção actual dos cinco municípios que descarregam na instalação, que totalizou em 1991 um montante de 215 100 toneladas. Deste modo, os resíduos conduzidos nesse ano para o aterro adjacente à estação estimam-se em 150 600 toneladas, provenientes dos referidos municípios e em 28 800 toneladas de rejeitados do processo de compostagem. Em termos globais, o défice de tratamento engloba, para além destes quantitativos, os resíduos sólidos produzidos em Matosinhos e Vila do Conde, estimados em 74 800 toneladas em 1991.
24) Em termos de evolução da produção, admite-se um cenário de crescimento que aponte para uma produção em 2010 da ordem de grandeza de 528 000 toneladas.
25) Do anúncio do concurso constava, sob a epígrafe "modalidade de financiamento e de pagamento" que o financiamento seria assegurado pelo adjudicatário e que o pagamento, reportado à tonelada de resíduos sólidos tratados, seria efectuado ao longo do período de exploração (ponto 8).
26) Até às 17,30 horas do dia 26 de Fevereiro de 1993, na Secretaria da LIPOR, entidade que preside ao concurso, designada no processo por "dono da obra" (3.1.), prescerevendo-se acerca do envio pelo correio no ponto 3.2.
27) A ter lugar na LIPOR pelas 10.00 horas do primeiro dia útil após a data limite de recepção das propostas (ponto 4.1.).
28) Podendo apresentar-se empresas nacionais, agrupamentos de empresas nacionais, empresas estrangeiras, agrupamentos de empresas estrangeiras e agrupamentos de empresas nacionais e estrangeiras (ponto 5.1.), sendo possível que os agrupamentos de empresas se constituam em consórcio ou sem que entre elas exista qualquer modalidade jurídica de associação (ponto 6.1.).
29) Redigida em língua portuguesa, conforme modelo apresentado em Anexo.
30) Depois de se prescrever que as propostas serão analisadas por uma comissão de apreciação nomeada pelo Conselho de Administração da LIPOR, a qual "é soberana e das suas decisões não há lugar a qualquer reclamação ou recurso, sendo o respectivo parecer devidamente fundamentado e enviado a todos os concorrentes" (pontos
12.1. e 12.2.), consignam-se, no ponto 12.3., os critérios de apreciação que servirão de base à classificação das propostas e que são os seguintes: qualidade técnica-4; preço por tonelada tratada-2,5; currículo do concorrente-2; capacidade financeira do concorrente-1,75; prazo de concepção/construção-1,5; aproveitamento e valorização dos suprodutos-1,25; concepção arquitectónica do empreendimento-1 (critérios e ponderações já constantes do ponto 12 do anúncio).
31) Consignando-se que são encargos dos concorrentes as despesas inerentes à elaboração das propostas, sendo ainda da sua conta as despesas e encargos relativos à prestação da caução e do contrato.
32) Onde se prevê que "em tudo o omisso no presente programa de concurso, observar-se-á o disposto no Decreto-Lei nº 235/86, de 18 de Agosto, e restante legislação aplicável".
33) Na definição de Sérvulo Correia, "contrato administrativo" é um contrato que constitui um processo próprio de agir da Administração pública e que cria, modifica ou extingue relações jurídicas, disciplinadas em termos específicos do sujeito administrativo, entre pessoas colectivas da Administração ou entre a Administração e os particulares - cfr. "Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos", Colecção Teses, Almedina, Coimbra, 1987, pág.396. Sobre a temática dos contratos administrativos, vejam-se também: Sérvulo Correia, "Contrato Administrativo", 1972, separata do Dicionário Jurídico da Administração Pública; Diogo Freitas do Amaral, "Direito Administrativo", 1984, vol. III, págs. 277 e segs.; Barbosa de Melo-Alves Correia, "Contrato Administrativo", Coimbra, 1984; Maria João Estorninho, "Princípio da legalidade e contratos da Administração", "Boletim do Ministério da Justiça", nº 368, págs. 79 a 124 e "Requiem pelo Contrato Administrativo", 1990, Almedina, Coimbra; Ramon Parada, "Derecho Administrativo", Parte Geral, 4ª edição, Marcial Pons, 1992, págs. 246 e segs; Eduardo Barrachina Juan,"Lecciones de Derecho Administrativo", vol. I, PPU,1985, págs. 548 e segs; Fernando Garrido Falla, "Tratado de Derecho Administrativo", vol. II, reimpressão da 6ª edição, Madrid, 1983, págs. 30 e segs; Dominique Pouyaud, "La nullité des contrats administratifs", LGDJ, 1991, págs. 33 e segs; Jean Rivero, "Direito Administrativo", Almedina, 1981, págs. 181 e segs; André de Laubadère, Jean-Claude Venezia e Yves Gaudemet, "Traité de Droit Administratif", L.G.D.J., Tomo I, 11ª edição, págs 611 e segs; André de Laubadère, Franck Moderne e Pierre Delvolvé, "Traité des Contrats Administratifs", L.G.D.J., Tomo I, 2ª edição; "Trattato di Diritto Amministrativo", direcção de Giuseppe Santaniello, vol 7, CEDAM, Padova, págs. 37 e segs; Massimo Severo Giannini, "Diritto Amministrativo", vol. II, 2ª edição, Milano, Dott. A. Giuffrè Editore, 1988, págs. 847 e segs.
34) Nos termos da cláusula 1ª, (2), consideram-se integrados no contrato o caderno de encargos, os restantes elementos constantes do processo de concurso, a proposta e, bem assim, todos os documentos que sejam referidos no título contratual ou no C.E..
35) Reitera-se na cláusula 8ª que o contrato tem por objecto a realização dos trabalhos inerentes à concepção, construção e financiamento da Estação LIPOR II e à sua exploração por um período de quinze anos.
36) O preço dos trabalhos contratados será o que resultar da proposta do adjudicatário, com as correcções devidas aos esquemas de financiamento que venham a ser concretizados [cláusula 9ª, (1)].
37) Estabelece-se, por sua vez, no ponto (1) da cláusula 10ª, que em cada pagamento será efectuado um desconto de 5% para garantia do contrato, o qual pode ser substituído por depósito de títulos emitidos ou garantidos pelo Estado, por garantia bancária ou por seguro caução. Mais serão descontadas ao adjudicatário as quantias discriminadas no ponto (2) da mesma cláusula, nelas se incluindo todas as que, a qualquer título, o adjudicatário deva ao dono da obra e que lhe sejam imediatamente exigíveis.
38) A respeito da notificação pelo dono da obra da identidade dos agentes da fiscalização, bem como da sujeição da obra e do adjudicatário à fiscalização por outras entidades, determina-se a observância do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 156º do Decreto-Lei nº 235/86.
39) A rescisão do contrato pelo dono da obra é disciplinada nas cláusulas 27ª e 28ª durante o período da obra e durante o período de exploração, respectivamente. A cláusula 27(3) prevê a rescisão por conveniência do dono da obra. À rescisão do contrato pelo adjudicatário aplica-se a cláusula 29ª. Em diversos pontos das aludidas cláusulas remete-se para a disciplina constante do Decreto-Lei nº 235/86 - cfr. as cláusulas 27ª, (1), (i), 27.(4), 27(5) e 29(2), onde se remete para os artigos 184º, nº 5, 212º e seguintes,
130º, nº 2, 215º e seguintes daquele diploma.
40) Também o CE estabelece, como se disse, na cláusula 34ª que nos casos omissos se observará o disposto no Decreto-Lei nº 235/86 e na restante legislação aplicável. Aliás, já a cláusula 32ª (arbitragem) prescreve, no ponto (6), que os litígios relativos ao contrato que não sejam arbitralmente resolvidos, serão dirimidos nos termos previstos no Capítulo VII do Decreto-Lei nº 235/86, considerando-se para o efeito competente o foro do Porto.


41) Veja-se o nº 5 do artigo 44º do Código Administrativo.
42) Cfr. o parecer nº 60/85, de 25 de Julho de 1985, publicado no "Boletim do Ministério da Justiça, nº 352, pág. 99, e no "Diário da República", II Série, nº 281, de 6 de Dezembro de 1985, pág. 11549.
43) O artigo 51º do CA foi revogado pela Lei nº 79/77, de 25 de Outubro (artigo 114º, nº 1), definidor das atribuições das autarquias e competências dos respectivos órgãos, diploma que seria revisto pelo Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março, cujo artigo 2º, nº 1, estabelece que é atribuição das autarquias locais o que diz respeito aos interesses próprios, comuns e específicos das populações respectivas e, designadamente, "à salubridade e ao saneamento básico" [nº 1, alínea d)].
44) Tendo passado a ser, sem alterações, o nº 3 do artigo 85º, após a primeira revisão constitucional, corresponde-lhe hoje, ainda sem alterações, o nº 3 do artigo 87º.
45) Sobre a temática da delimitação de sectores da actividade económica, podem ver-se: Carlos Ferreira de Almeida, "Propriedade dos meios de produção, AFDL, polic., 1982, págs. 33 e segs. e 60 e segs.; Guilherme d'Oliveira Martins, "Lições sobre a Constituição Económica Portuguesa", AAFDL, polic., 1984, volume I, pág. 115 e segs.; A.L.Sousa Franco, "Nota sobre o princípio da liberdade económica", "Boletim do Ministério da Justiça", 355, págs. 11 e segs.; A.L. Sousa Franco e Guilherme d'Oliveira Martins, "A Constituição Económica Portuguesa - Ensaio Interpretativo", Livraria Almedina, Coimbra, 1993, págs. 197 e segs. e 210 (acerca da iniciativa privada) e 255 e segs., em especial, 273 (a respeito dos sectores de propriedade dos meios de produção); J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira "Constituição da República Portuguesa Anotada", 3ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, anotações ao artigo 87º, págs. 420 e seguintes.
46) Posteriormente, o artigo 4º da Lei 46/77 seria ainda alterado, sem que a alteração mereça relevo na economia deste parecer, pelo Decreto-Lei nº 339/91, de 10 de Setembro, editado no uso da autorização legislativa concedida pela Lei nº 28/91, de 17 de Julho.
47) Corresponde ao nº 1 do artigo 7º, na redacção que ao preceito foi dada pelo Decreto-Lei nº 449/88, após a concessão de autorização legislativa ao Governo no sentido de tornar extensivo o regime de exploração ou gestão, em regime de concessão, às empresas do sector público que exerçam actividade no âmbito da indústria petroquímica de base - cfr. artigo 1º, nº 4, da Lei nº 110/88, e o nº 2, aditado ao artigo 7º da Lei nº 46/77, pelo Decreto-Lei nº 449/88.
48) A excepção das actividades mencionadas nas alíneas g) e h) do nº 1 do artigo 4º resulta do facto de as mesmas não serem, na opinião do autor, em boa verdade, verdadeiros sectores básicos - cfr. loc. cit., página 66, nota (26).
49) Abrange, pois, os "sectores industriais de base" elencados nas citadas alíneas a) a e) do nº 1 do artigo 5º.
50) Veja-se, quanto à polémica suscitada à volta da conformidade constitucional do artigo 9º, a Resolução nº 266/77 do Conselho da Revolução, no "Diário da República", de 17 de Setembro de 1977, que decidiu não declarar a sua inconstitucionalidade, em conformidade com a pronúncia (por maioria mínima, embora) da Comissão Constitucional, no parecer nº 15/77 ("Pareceres da Comissão Constitucional", 2º vol., 1977, págs. 67 e segs). Defendendo a tese da inconstitucionalidade, Carlos Ferreira de Almeida, loc. cit.,págs. 65 e segs. Representando outras tomadas de posição em matéria de fiscalização da constitucionalidade de normas relativas ao regime jurídico dos sectores básicos da economia vedada à iniciativa privada, vejam-se os pareceres da Comissão Constitucional nºs 8/80, 10/80, 13/80 e 23/81, publicados em "Pareceres da Comissão Constitucional", 11º volume, 1981, págs. 191 e segs., 12º volume, 1982, pág. 3 e segs., 12º volume, 1982, págs. 109 e segs., e 23/81, 16º volume, 1983, págs. 215 e segs., respectivamente, e o acórdão do Tribunal Constitucional nº 25/85 (Processo 87/83), publicado no "Diário da República", II Série, nº 98, de 29 de Abril de 1985.
51) "Diário da Assembleia da República", II Série-A, nº 40, de 12 de Junho de 1993, pág. 736.
52) Cfr. "Diário da Assembleia da República", I Série, nº 92, de 3 de Julho de 1993, pág. 3030.
53) Loc. cit na nota anterior, pág. 3061.
54) Invocando a necessidade de clarificação do conceito de sistema multimunicipal, cuja necessidade e validade contestou, o PCP apresentou o requerimento de ratificação nº 104/VI - cfr. "Diário da Assembleia da República", II Série-B, nº 7, de 17 de Dezembro de
1993. Vejam-se também o DAR, II Série-B, nº 15, de 26 de Fevereiro de 1994 e, relativamente à respectiva apreciação, o DAR, I Série, nº 42, também de 26 de Fevereiro de 1994. Na reunião plenária de 3 de Março de 1994 foi rejeitado o projecto de resolução nº 90/VI - recusa de ratificação do Decreto-Lei nº 372/93, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PS, do PCP e do Deputado independente Corregedor da Fonseca e a abstenção do PSN - cfr. DAR, I Série, nº 44, de 4 de Março de 1994.
55) Estabelece a correspondente reversão para o Estado, no termo da concessão, da titularidade do património integrado nos sistemas multimunicipais, o artigo 5º, alínea f).
56) Segundo Esteves de Oliveira o que, no artigo 7º, "é vinculante para os contratos de concessão nestes sectores é a reversão dos bens do estabelecimento da concessão, no termo desta, para o concedente: o contrato onde se preveja que bens desses (sejam os adquiridos pelo concedente ou pelo próprio concessionário) ficam na propriedade deste após o termo de concessão é manifestamente nulo, por violação do referido artigo 8º". (Trata-se de lapso, devendo a referência ler-se em relação ao artigo 7º) E, depois de afirmar que, no entanto, "já não é nulo o contrato onde se preveja que os bens afectos à concessão são da propriedade do concedente, e não da concessionária", acrescenta:
"Temos a proposição por indiscutível: não faltava mais nada que os bens da propriedade do concedente, que sejam afectados à concessão passassem para a propriedade da concessionária. É boa!". Para além dos trechos transcritos, e de outros, dedicados ao tema da "propriedade dos bens da concessão", no segundo parecer citado, vejam-se, no primeiro parecer do mesmo autor o que se escreve a páginas 32 e seguintes, mormente, na nota (10), da página 35, visando-se rebater afirmações e argumentos constantes da 1ª Recomendação do Senhor Provedor de Justiça, no ponto 5.
57) Reitera-se que, por se tratar de matéria estranha à economia deste parecer, não nos envolveremos na apreciação de tal controvérsia suscitada a propósito da conformidade ou desconformidade entre a proposta do concorrente preferido e os documentos normativos do concurso.
Trata-se de matéria abordada nos pontos 5, 6 e 7 da 1ª Recomendação de Sua Excelência o Provedor de Justiça e em IV, c) e d), págs. 54 a 61 do primeiro parecer de Esteves de Oliveira.
58) Deverá reconhecer-se que é possível a divisibilidade dos sectores ou fases integrantes do ciclo produtivo da actividade económica para fins de concessão (ou de municipalização). Ou seja, no que concerne ao lixo, é possível ao(s) município(s) conceder(em) só a recolha ou só o tratamento. Tal divisibilidade corresponde, aliás, à situação existente nos municípios abrangidos pela LIPOR, cuja designação, só por si, esclarece ter sido constituída apenas para cuidar da parcela respeitante ao tratamento do lixo, continuando a sua recolha a caber a serviços explorados, directa ou indirectamente, no âmbito de cada um dos municípios que integram a LIPOR.
59) Voltaremos à temática da qualificação jurídica do contrato LIPOR II.
60) Cfr. o segundo parecer citado, Parte III, B), I, ponto 5.
61) André de Laubadère, Franck Moderne e Pierre Delvolvé, "Traité des contrats administratifs", Tomo 1, 2ª edição, LGDJ, 1983, págs. 283, e seguintes, maxime, págs. 285 e 289.
62) Na definição de Sérvulo Correia, ainda na vigência do §2º do artigo 815º do Código Administrativo, revogado pelo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril (artigo 9º), contrato de concessão de serviço público é "o acordo pelo qual uma pessoa colectiva de direito público transfere para outra pessoa, durante o prazo estipulado, o seu poder de estabelecer e explorar determinado serviço público, para ser exercido por conta e risco do concessionário mas sempre no interesse público".
63) Assim é que os autores indicados supra, na nota (60), que temos vindo a acompanhar, propõem a seguinte definição para a concessão de serviço público: contrato pelo qual uma pessoa colectiva de direito público encarrega outra pessoa da exploração de um serviço público mediante uma remuneração determinada pelos resultados financeiros da exploração - cfr. loc. cit., pág. 297.
64) Recorda-se que o artigo 18º, último normativo do Decreto-Lei nº 379/93, integra a Secção II ("Disposições transitórias e finais") do Capítulo III.
65) Veja-se Mário Esteves de Oliveira, no contexto do segundo parecer de que é autor, cuja dissertação se aproxima do exposto - cfr. Parte III, c), II, b).
66) O facto de não se prever num contrato de concessão celebrado neste sector o pagamento de uma retribuição não significa que ocorra nulidade, por violação da alínea l) do nº 2 do artigo 11º ou dos artigos 12º ou
14º. Existiria, sim, nulidade, se, ao prever-se tal retribuição, se estipulasse que ela consistia na assunção dos débitos dos municípios concedentes, em violação do disposto pelo nº 2 do artigo 14º.
67) Com efeito, se o contrato de concessão não previr que a concessionária deva proceder à "extensão" de obras e equipamentos, por se tratar, por exemplo, de uma concessão com prazo muito curto, isso não implica nulidade do contrato nos termos do artigo 17º.
68) Sabe-se como a doutrina tradicional tem acentuado a ideia de que o regime jurídico especial dos contratos administrativos decorre de um certo número de princípios que dominam a própria natureza jurídica de tais contratos. Avultam elementos tais como a natureza das partes; a associação duradoura e especial do particular co-contratante, mediante retribuição, ao cumprimento das atribuições da pessoa colectiva; a supremacia do interesse público de que decorre a submissão do particular consubstanciada numa cláusula de sujeição explícita ou implícita, tudo elementos que apontam para a concretização do critério da subordinação. -Cfr. Sérvulo Correia, "Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos", op. cit. na nota (33), Almedina, Colecção Teses, Coimbra, 1987, págs. 354 e segs.
Há, não se ignora, uma corrente de doutrina (minoritária) que contesta a existência de um regime jurídico exorbitante próprio dos contratos administrativos - veja-se, nessa linha, Maria João Estorninho, "Requiem pelo Contrato Administrativo", Almedina, Coimbra, 1990, mormente págs. 115 e segs.
69) Veja-se o artigo 1207º do Código Civil.
70) Esteves de Oliveira dá conta de que, como resultado das buscas realizadas na jurisprudência administrativa do Tribunal de Contas, não se encontrou "senão um despacho ou acórdão de visto (...) (proferido no processo nº 74780/92, 1ª Secção), onde, a propósito de um caso similar, se negava ao contrato entre uma autarquia e uma empresa privada (para a concepção, construção, equipamento e montagem e exploração de uma central de tratamento de resíduos sólidos) o carácter de contrato de empreitada de obras públicas - mas por se tratar de uma concessão, não por se tratar de uma empreitada privada.
71) Para não se repetirem as referências normativas ao Decreto-Lei nº 379/93, veja-se, verbi gratia, o Decreto-Lei nº 287/84, de 23 de Agosto, que autoriza a Administração-Geral do Porto de Lisboa a contratar com uma empresa privada nacional, após concurso público, a concessão do direito de exploração em regime de serviço público de um terminal de contentores nas instalações portuárias de Alcântara Sul.
72) É a construção que, em linhas gerais, corresponde à solução defendida na segunda Recomendação de Sua Excelência o Provedor de Justiça.
73) Sempre faltaria reflectir, no entanto, sobre a circunstância de a adjudicação efectuada no princípio do ano em curso, posteriormente, portanto, à entrada em vigor dos Decretos-Leis nº 372/93 e 379/93, não se tendo conformado com o regime instituído por este último diploma.
74) O Senhor Provedor de Justiça concluiu, todavia, com recomendação (reiterativa do sentido enformador da que antecedentemente já emitira), segundo a qual, por força de fundamentos cuja reprodução e análise são dispensáveis em face da economia deste parecer, o Conselho de Administração da LIPOR deveria revogar, por ilegal, o acto administrativo de adjudicação ao agrupamento CNUM/ESYS-MONTENAY, e, bem assim, no sentido de que se proceda, nos termos e no prazo fixado no nº 1 do artigo 18º do Decreto-Lei nº 379/83, a todos os reajustamentos necessários.
75) Corresponde, no essencial, à concepção defendida no (segundo) dos pareceres emitidos por Esteves de Oliveira - cfr. Parte II do referido documento -, cujas linhas basilares se acompanham de perto neste ponto, tornando-se dispensável manifestar, aqui e agora, a nossa posição sobre a matéria.
76) Cfr., verbi gratia, quanto à fixação superveniente da competência do órgão, o artigo 30º, nº 2, in fine, do CPA.
77) Anotando o artigo 30º do CPA, escrevem Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim que "o facto de um procedimento se iniciar sob o "mando" de órgão incompetente para o decidir (sem prejuízo do artigo 34º), não o torna, ou à respectiva decisão, sempre inválido: pode, em virtude de modificação de direito ocorrida no decurso do processo, aquele órgão passar a deter a competência que lhe faltava e, então, como que se convalida aquilo que já tivesse processado ou mandado processar. Diferente é a hipótese de a respectiva decisão já ter sido tomada, porque, neste caso, o facto de sobrevir (mesmo imediatamente a seguir) uma alteração normativa de competência não a salvaria da sanção da invalidade".
Acrescentam em seguida, os referidos autores:
"Note-se, aliás, que mesmo naquela primeira hipótese, de convalidação processual, esta só abrange as "ilegalidades" que se reportam ao elemento competência
- pois, se simultaneamente houver formas, formalidades, pressupostos e interesses que não tenham sido observados ou considerados (por causa do modo como foi exercida a competência), claro que o procedimento é ilegal e inválido nessa parte" - cfr. "Código do Procedimento Administrativo Comentado", vol. I, Almedina, 1993, págs. 245 e 246.
78) Na tentativa de ilustração da aludida afirmação, é dado o exemplo de um concurso aberto para o preenchimento dum lugar inexistente num quadro de pessoal, caso em que a criação, no decurso do procedimento, desse lugar no quadro prevenia a impossibilidade da respectiva decisão (e do procedimento que o antecedeu).
79) Após o que, prosseguindo o raciocínio desenvolvido no segundo parecer do mencionado jurisconsulto, das duas, uma: ou tal alteração ocorre, e as autoridades administrativas confrontam o procedimento adoptado com ela e, havendo conformidade, procedem em consequência; ou não é editada a referida alteração legislativa (ou não existe conformidade), e retiram ou extinguem o procedimento, nos termos do artigo 112º, nº 1, do CPA, respondendo eventualmente pelos prejuízos causados.
80) Cfr. referido parecer, Parte II, ponto 6.
81) Vejam-se, nesse sentido, o parecer de Marcelo Rebelo de Sousa, ponto II, 2.8. e o citado segundo parecer de Mário Esteves de Oliveira, Parte II, ponto 7 e nota 8.
82) Cfr. "O Concurso Público na Formação do Contrato Administrativo - Alguns Aspectos", in Revista da Ordem dos Advogados, Ano 47, Lisboa, Dezembro de 1987, págs.
701 e seguintes, que, de momento, se irá acompanhar.
83) O autor conforta esta afirmação na expressão do sentido do "direito comparado", de que dá como exemplo a lei espanhola dos contratos do Estado, de 8 de Abril de 1965, com as modificações ulteriormente introduzidas, mormente pela Lei de 17 de Março de 1973.
Reconhece, todavia, não ser essa a orientação do Decreto-lei nº 235/86, ao colocar em plano de paridade o concurso público e o concurso limitado.
84) Sobre o princípio da legalidade nos contratos administrativos, vejam-se Diogo Freitas do Amara
l "Direito Administrativo", lições policopiadas, vol. II, pág. 223; Sérvulo Correia, op. cit., págs. 532 e segs. e 610 e segs.; e Maria João Rosário Estorninho,
"Princípio da Legalidade e Contratos da Administração", op.cit. na nota (33), Lisboa, 1987, separata do "Boletim do Ministério da Justiça", nº 368.
85) Cfr. loc. cit, pág. 709.
86) Sobre a distinção, em Direito Administrativo, entre inexistência e invalidade e, dentro desta, entre nulidade (ou nulidade absoluta) e anulabilidade (ou nulidade relativa), vejam-se: Marcello Caetano, "Manual de Direito Administrativo", Tomo I, págs. 512 e segs.;Freitas do Amaral, op. cit., vol. III, págs. 301 e segs.; Garcia de Enterria e Ramon Hernandez, "Curso de Derecho Administrativo", tomo I, 4ª edição, pág. 563 e segs.; André de Laubadère, Jean-Claude Venezia e Yves Gaudement, tomo I, 11ª edição, L.G.D.J., págs. 531 e segs.; J.M.Auby, "La théorie de l'inexistence des actes administratifs", Paris, 1945; Prosper Weil, "Une réssurrection: la théorie de l'inexistence en droit administratif", Recueil Dalloz, 1958; Brechon - Moulènes, "Remarques sur la notion de nullité absolue dans le contentieux des contrats administratifs", in Semaine Juridique - Jurisclasseur périodique 1973/I, pág. 2588.
87) Discorrendo acerca da questão de saber quais os géneros de irregularidade que provoca a inexistência do acto, escrevem Laubadère, Venezia e Gaudemet que não se levantam dificuldades relativamente ao acto materialmente (ou literalmente) inexistente (acto apenas aparente e não efectivamente praticado).
Acrescentam, porém, que é igualmente admitida a inexistência jurídica que afecta "actos quase- inexistentes". Precisando, ponderam o seguinte: "Elle concerne notamment les actes entachés de pure usurpation de fonctions ou d'empiètement sur les attributions d'autorité d'un autre ordre [...], mais aussi d'actes que l'on peut considérer comme ne se rattachant à aucun pouvoir de l'administration", n'étant prévus par aucune disposition législative ou réglementaire".
88) Hoje constante do artigo 133º do CPA.
89) Loc. cit, pág. 711.
90) Loc. cit., pág. 715.
91) Veja-se, neste sentido, com desenvolvimento, Fausto de Quadros, loc. cit., págs. 717 e segs.
92) J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, "Constituição da República Portuguesa Anotada", 3ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, anotações IV e VII ao artigo 266º, págs. 922 a 925, que, por momentos, se acompanharam.
93) À data da publicação do anúncio de abertura do concurso público LIPOR II (no "Diário da República, II Série, nº 247, de 26 de Outubro de 1992) já estava em vigor o CPA, cuja vigência datava de 15 de Maio desse ano - cfr. o artigo 2º do Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de Novembro.
94) Diogo Freitas do Amaral, João Caupers, João Martins Claro, João Raposo, Pedro Siza Vieira e Vasco Pereira da Silva, "Código do Procedimento Administrativo Anotado", Almedina, Coimbra, anotação ao artigo 135º, pág. 209.
95) Loc. cit na nota anterior, pág. 207. Outro caso de inexistência citado pelos autores indicados, é o de o presidente de um órgão colegial fazer passar por deliberação deste uma decisão individual dele num caso em que não tenha havido deliberação.
96) Segundo o qual é possível a atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de actos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito.
97) Para Rogério Soares, a inadmissibilidade da categoria "inexistência jurídica" ocorreria, desde logo, no plano conceitual - cfr. "Interesse Público, Legalidade e Mérito", pág. 290.
98) Veja-se uma resenha de autores que defendem tal entendimento em José Manuel Santos Botelho, Arménio Pires Esteves e José Cândido de Pinho "Código do Procedimento Administrativo", 2ª edição, Livraria Almedina, Coimbra, 1992, pág. 424, anotação 6 ao artigo 133º; Vejam-se também, num e noutro sentido, os autores indicados por Marcelo Rebelo de Sousa, "O Valor Jurídico do Acto Inconstitucional", I, Lisboa, 1988, págs. 156, nota (233), e 161, nota (243).
99) "Manual de Direito Administrativo", vol. I, pág. 513.

100) Cfr. "Noções de Direito Administrativo", pág. 350 e seguintes, mormente, a págs. 358.
101) Cfr. "Direito Administrativo", vol. I, Almedina, Coimbra, págs. 533 e segs.
102) Loc. cit., na nota anterior, pág. 534. De acordo com a posição exposta, o autor considera como inexistentes os actos do demente.
103) Cfr. loc. cit., nota (1), a pág. 534.
104) Veja-se Marcelo Rebelo de Sousa, ob. cit., págs. 155 e segs.
105) O elenco de nulidades constantes do artigo 88º, nº 1, da Lei das Autarquias Locais (Decreto-lei nº 100/84), considerava-se já aplicável, por analogia, aos actos de todos os órgãos da Administração pública portuguesa.
106) Cfr. loc. cit, págs. 206 e 207.
107) Segundo o nº 1 do artigo 280º do Código Civil, é nulo o negócio jurídico cujo objecto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável.
108) Vários são os pareceres desta instância consultiva que qualificam como nulos os actos sem objecto legalmente possível. Vejam-se, a título de exemplo, os pareceres nºs 32/79, de 1 de Março de 1979, publicado no "Boletim do Ministério da Justiça", nº 290, págs. 130 e seguintes; 102/87, de 26 de Janeiro de 1989; 83/88, de 10 de Novembro de 1988, publicado no "Diário da República", nº 72, de 28 de Março de 1989; e 12/87, de 27 de Outubro de 1989, publicado no "Diário da República", nº 251, de 31 de Outubro de 1989.
Observe-se, a título lateral, que o primeiro dos indicados pareceres qualificou o acto administrativo "nulo ou inexistente por falta de objecto legalmente possível". Todos os restantes procederam à caracterização dos efeitos do vício como correspondendo à nulidade absoluta.
Igual orientação é perfilhada na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo. Vejam-se, por exemplo, os acórdãos do STA, de 9 de Dezembro de 1988 (Recurso nº 023288), 16 de Junho de 1987 (Recurso nº 023391), 2 de Novembro de 1986 (Recurso nº 005233), inéditos, e de 2 de Novembro de 1988, publicado em "Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo", Ano XXVIII, Maio de 1989, nº 329, págs. 667 e segs.
109) Aprovado na sessão de 14 de Janeiro de 1994.
110) "Introdução ao direito e ao discurso legitimador", 2ª reimpressão, Coimbra, 1987, pág. 230.
111) "Da aplicação da lei no tempo e das disposições transitórias", "Cadernos de Ciência de Legislação", INA, nº 7, Abril-Junho de 1993, págs. 7 e segs.
112) "Le Droit Transitoire", Dalloz e Sirey, 1960, 2ª edição, pág. 223.
113) "Lições de Direito Administrativo", Coimbra, 1976, vol. I, págs. 516 e segs.
114) "Introdução ao Estudo do Direito", Lisboa, 1988, vol. I, pág. 209.
115) Cfr. nºs 1 e 2 do artigo 134º do CPA. Atente-se também no nº 3.
116) Cfr. artigo 266º, nº 2, da CRP.
117) Cfr. Bernard Mathieu, "Les "Validations" Legislatives - Pratique Legislative et Jurisprudence Constitutionelle", Collection Droit Public Positif,
ECONOMICA, Paris, págs 18 e segs., 41 e segs. e 66 e segs., que aqui acompanharemos.
Veja-se também Danielle Perrot, "Validation Législative et Actes Administratives Unilatéraux - Observation à la lumiére de la jurisprudence récente", in "Revue du
Droit Public, 4-1983, págs. 983 e segs.
118) Vejam-se abundantes ilustrações dos princípios expostos à luz da jurisprudência do Conseil d'Etat, em Bernard Mathieu, loc. cit., pág. 80 e segs. e págs. 100 e segs.
119) Op. cit, pág. 235.
120) Cfr. Danielle Perrot, loc. cit., pág. 985.
121) Observa o Senhor Provedor de Justiça que "a própria terminologia adoptada aponta no mesmo sentido:
"situações actualmente existentes" inculca uma ideia de estabilidade, de situações definitivas. Além de que, se fosse intenção do legislador deixar de fora do artigo
18º as concessões já outorgadas, sempre poderia ter recorrido à terminologia, já consagrada, de "processos pendentes".
122) Era a situação no âmbito do processo LIPOR II.
123) A dado passo da sua (segunda) Recomendação, Sua Excelência o Provedor de Justiça pondera que não se impõe o recomeço puro e simples do processo, podendo aproveitar-se tudo o que respeite o novo regime legal.
124) Cfr. o artigo 28º da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, aprovada pelo Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho.
125) Atento o disposto pela alínea d) do nº 1 do artigo 28º da LPTA é de um ano o prazo de interposição do recurso contencioso por parte do Ministério Público.
126) Entende-se "Estado" na acepção administrativa, ou seja, a pessoa colectiva pública que, no seio da comunidade nacional, desempenha sob a direcção do Governo, a actividade administrativa - cfr. Freitas do Amaral, "Curso de Direito Administrativo" - vol. I (Reimpressão), 1993, Almedina, Coimbra, págs. 197 e 198.
127) Cfr., verbi gratia, o parecer nº 105/90, de 15 de Maio de 1991, inédito, mormente quanto às conclusões 5ª e 6ª.
128) Neste ponto segue-se muito de perto, por vezes textualmente, a elaboração do tema no Parecer deste Conselho nº 7/90, votado na sessão de 12 de Março de
1990.
Cfr. Também, os Pareceres deste Conselho nºs 90/85, de 12 de Janeiro de 1988, 63/86, de 9 de Junho, e 101/88, de 9 de Fevereiro de 1989, publicado no Diário da República, II Série, nº 131, de 8 de Junho de 1989.
129) Cfr. Sérvulo Correia, Noções, cit. pág. 202; Marcello Caetano, Manual, cit., vol. I, pág. 230.
130) Cfr. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. I, págs. 692 e segs..
131) Cfr. o já citado Parecer nº 90/85.
132) Cfr., neste sentido, os acórdãos da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 24 de Março de 1977, in "Acórdãos Doutrinais", ano XVI, nº 191, págs 972 e segs. e de 24 de Maio de 1979, no "Boletim do Ministério da Justiça", nº 290, pág. 447.
133) Cfr. Fausto de Quadros, Anotação ao acórdão da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 19 de Julho de 1979, "Revista da Ordem dos Advogados", Ano 41, III, 1981, pág. 767. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, Anotado, 3ª ed., 2º vol. Lisboa, 1985, pág. 394 falam de um princípio da tipicidade das medidas de tutela.
134) Reflectido no artigo 243º da Constituição da República e na Lei nº 87/89, de 9 de Setembro, no que respeita à tutela administrativa sobre as autarquias locais.
135) Cfr., referências à formulação conceitual em Rafael Entrena Cuesta, Curso de Derecho Administrativo, 3ª ed., ED. Tecnos, Madrid, 1982, pág. 153.
136) Cfr., sobre a validade e o conteúdo da regra "pas de tutelle sans texte", Serge Regourd, L'acte de tutelle en droit administratif français L.G.D.J. Paris, 1982, págs. 92 e segs.
137) Cfr. Freitas do Amaral, Conceito e Natureza do Recurso Hierárquico, pág. 137.
138) Assim também Esteves de Oliveira, op. cit., pág. 608, citando o artigo 221º do Projecto de Código de Processo Administrativo Gracioso.
139) Freitas do Amaral, Conceito e Natureza, pág. 138;
Robin de Andrade, A revogação dos Actos Administrativos, 2ª edição, Coimbra, 1985, págs. 325 e segs.; Coelho Lima op. cit., pág. 57, nota 83, acrescentando, a propósito, não se detectar na legislação portuguesa qualquer situação de competência revogatória, por iniciativa própria, de órgão de tutela".
140) J.J.Gomes Canotilho e Vital Moreira, op. cit., págs. 896 e segs. Segundo estes autores, Estão, portanto, excluídas à partida formas de tutela incompatíveis com essa função constitucional, nomeadamente a tutela orientadora (informações, recomendações), a tutela homologatória, a tutela substitutiva, o recurso tutelar
141) Havendo-os, poderia o Governo determinar a realização de inspecção ou inquérito, nos termos dos artigos 4º, nºs 1 e 2, e 6º da referida Lei.
142) Marcelo Rebelo de Sousa, no parecer, a propósito, emitido, referindo-se às exigências relativas à formação e ao conteúdo do contrato de concessão de serviço público fixadas pelo Decreto-Lei nº 379/93, observou mesmo que "múltiplas dessas exigências - e essenciais -, não se acham respeitadas pelo caderno de encargos, pelo que a adjudicação contrária às aludidas normas imperativas seria ilegal e o contrato celebrado sem o conteúdo nelas consagrado seria nulo".
143) Cfr., designadamente, os artigos 6º, 7º, 9º, 10º, nº2, alíneas g) e o), 11º, nº 2, alíneas a), b), e) e p), 12º e 13º do Decreto-Lei nº 379/93.