Parecer do Conselho Consultivo da PGR |
Nº Convencional: | PGRP00003351 |
Parecer: | P000352015 |
Nº do Documento: | PPA12112015003500 |
Descritores: | MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARENTALIDADE PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PROTEÇÃO DA PATERNIDADE LEI GERAL DO TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS CONTRATO DE TRABALHO NOMEAÇÃO LICENÇA PARENTAL COMPLEMENTAR DIREITO POTESTATIVO LICENÇA PARENTAL ALARGADA LIMITE TEMPORAL CONTAGEM DE PRAZO PRAZO PROCEDIMENTAL PRAZO INTERPROCEDIMENTAL |
Texto Integral: | Senhora Procuradora-Geral da República Excelência: I. Apresentação da Consulta Solicitou V. Ex.ª ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República a emissão de parecer urgente[1] sobre “o regime da proteção na parentalidade aplicável aos magistrados do Ministério Público”. O pedido surge na sequência de um parecer do Ex.mo Procurador da República com funções de apoio jurídico ao Conselho Superior do Ministério Público, na qual se formulam as seguintes questões sobre o assunto em epígrafe: “a) Aos magistrados do Ministério Público são aplicáveis as normas da LTFP [Lei do Trabalho em Funções Públicas] e do Código do Trabalho em tudo o que respeita aos direitos de proteção na parentalidade, não obstante a especificidade do quadro funcional dos magistrados e a ausência de normas sobre essa matéria no Estatuto do Ministério Público? b) A norma do artigo 51.º, n.º 1, do Código do Trabalho deve ser interpretada no sentido em que a “idade não superior a seis anos” termina logo após o filho completar os 6 anos de idade, ou de que subsiste no decurso do sétimo ano de vida até que este se complete? c) A norma do artigo 52.º, n.º 1, do Código do Trabalho deve ser interpretada no sentido de que o direito à licença para assistência a filho tem o mesmo limite temporal estabelecido no artigo 51.º, n.º 1, ou prolonga-se até aos 12 anos, ou mesmo até à maioridade? d) Os prazos dos procedimentos de autorização do exercício de direitos de proteção na parentalidade estabelecidos no Código do Trabalho devem contar-se nos termos desse Código ou nos termos do Código do Procedimento Administrativo?” Cumpre, assim, emitir parecer, nos termos das disposições conjugadas da alínea e) do artigo 37.º do Estatuto do Ministério Público e do artigo 11.º, n.ºs 1 e 3, do Regimento do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, sobre as questões acima enunciadas. II. Razão de ordem Para tanto, o presente Parecer desenvolver-se-á em torno dos seguintes aspetos: (i) Regime jurídico aplicável aos magistrados do Ministério Público em matéria de proteção da parentalidade; (ii) Interpretação das normas dos artigos 51.º, n.º 1, e 52.º, n.º 1, do Código do Trabalho; (iii) Forma de contagem dos prazos dos procedimentos de autorização do exercício de direitos de proteção na parentalidade estabelecidos no Código do Trabalho. (iv) Conclusões. III. Regime jurídico aplicável aos magistrados do Ministério Público em matéria de proteção da parentalidade 1. O Estatuto do Ministério Público (EMP) não prevê nenhuma disposição relativa à proteção da parentalidade dos magistrados e magistradas do Ministério Público. No entanto, os direitos de proteção na maternidade e na paternidade são direitos fundamentais constitucionalmente consagrados no artigo 68.º da CRP, podendo mesmo ser considerados, em algumas das suas dimensões, como direitos análogos aos direitos, liberdades e garantias[2]. Esses direitos incluem a proteção no âmbito da relação laboral, seja qual for a sua natureza, forma ou características, tal como resulta dos n.ºs 3 e 4 daquele preceito, quando estabelecem que: i) “[A]s mulheres têm direito a especial proteção durante a gravidez e após o parto, tendo as mulheres trabalhadoras ainda direito a dispensa do trabalho por período adequado, sem perda da retribuição ou de quaisquer regalias” (n.º 3) e; ii) “[A] lei regula a atribuição às mães e aos pais de direitos de dispensa de trabalho por período adequado, de acordo com os interesses da criança e as necessidades do agregado familiar (n.º 4). Isto significa, sem sombra de dúvidas, que, apesar da total omissão do EMP nesta matéria, os magistrados do Ministério Público têm direito à proteção na parentalidade em todos os aspetos garantidos pelo artigo 68.º da CRP, designadamente no âmbito da sua relação laboral, incluindo o direito a dispensa do trabalho, nos termos dos n.ºs 3 e 4 daquele preceito, acima citados. Ora, inexistindo regulação específica da matéria no EMP, tem de se concluir que é aplicável o regime jurídico legalmente consagrado para a função pública ou, na terminologia atual, para os trabalhadores com relação jurídica de emprego público[3]. Isso resulta de diversas disposições do EMP que remetem, a propósito de diferentes matérias, para aquele regime: i) o artigo 108.º, sob epígrafe “disposições subsidiárias” determina que “[É] aplicável subsidiariamente aos magistrados do Ministério Público, quanto a incompatibilidades, deveres e direitos, o regime vigente para a função pública”; ii) o artigo 150.º, sob epígrafe “[R]egime subsidiário” estabelece que “[A]s matérias não expressamente reguladas no presente Estatuto, nomeadamente as condições de aposentação dos magistrados do Ministério Público e o sistema de pensões em que devem ser inscritos, regem-se pelo que se encontrar estabelecido para a função pública, nomeadamente no Estatuto da Aposentação, nas Leis n.ºs 60/2005, de 29 de dezembro, n.º 52/2007, de 31 de agosto; n.º 11/2008, de 20 de fevereiro, e 3-B/2010, de 28 de abril”, e; iii) o artigo 216.º, sob epígrafe “[R]egime supletivo”, relativo ao estatuto disciplinar dos magistrados, que refere que “[E]m tudo o que não for contrário à presente lei é subsidiariamente aplicável o disposto no Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, no Código Penal e no Código de Processo Penal.” Trata-se, obviamente, de uma remissão dinâmica para as normas aplicáveis aos trabalhadores da Administração Pública que estejam em vigor em cada momento, o que significa, atualmente, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho[4]. Aliás, o Conselho Consultivo já se pronunciou expressamente no sentido da aplicação subsidiária do regime da função pública aos magistrados do Ministério Público no Parecer n.º 103/82, de 22 de julho[5], em matéria de direitos de proteção na parentalidade. 1.2. Os direitos garantidos pelo artigo 68.º, n.ºs 3 e 4, da CRP aplicam-se, portanto, a todos os trabalhadores, independentemente do concreto estatuto profissional, apesar de, como referem JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, a Constituição deixar liberdade de concretização ao legislador ordinário, permitindo, designadamente, a existência de um regime diferenciado entre as relações laborais privadas – relativamente às quais o legislador pode limitar-se a impor, através de normas imperativas, um regime de proteção mínima – e os trabalhadores da Administração Pública, perante os quais o Estado se compromete a assegurar um determinado nível de proteção, que pode ser superior ao limite mínimo fixado para as relações privadas[6]. No entanto, não é isso que se verifica atualmente, uma vez que o legislador tem vindo a proceder a uma aproximação entre o regime das relações de emprego público e das relações laborais privadas, que culminou com a aprovação da LGTFP, que, além de consagrar um regime “privatizado”[7], ainda remete para o Código do Trabalho (CT), aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro[8], a regulação de um enorme conjunto de matérias. Efetivamente, o artigo 4.º da LGTFP remete para o CT a regulação de uma série de aspetos da relação de trabalho em funções públicas, entre os quais a matéria da parentalidade, nos termos do n.º 1, alínea d) daquele preceito[9], que determina a aplicação dos artigos 33.º a 65.º do CT, correspondentes à subsecção IV da Divisão III deste diploma, incluindo as seguintes disposições: - artigo 33.º (parentalidade); - artigo 34.º (articulação com regime de proteção social); - artigo 35.º (proteção na parentalidade); - artigo 36.º (conceitos em matéria de proteção da parentalidade); - artigo 37.º (licença em situação de risco clínico durante a gravidez - artigo 38.º (licença por interrupção da gravidez); - artigo 39.º (modalidades de licença parental - Artigo 40.º (licença parental inicial); - artigo 41.º (períodos de licença parental exclusiva da mãe); - artigo 42.º (licença parental inicial a gozar por um progenitor em caso de impossibilidade do outro); - artigo 43.º (licença parental exclusiva do pai); - artigo 44.º (licença por adoção); - artigo 45.º (dispensa para avaliação para a adoção); - artigo 46.º (dispensa para consulta pré-natal); - artigo 47.º (dispensa para amamentação ou aleitação); - artigo 48.º (procedimento de dispensa para amamentação ou aleitação); - artigo 49.º (falta para assistência a filho); - artigo 50.º (falta para assistência a neto); - artigo 51.º (licença parental complementar); - artigo 52.º (licença para assistência a filho); - artigo 53.º (licença para assistência a filho com deficiência ou doença crónica); - artigo 54.º (redução do tempo de trabalho para assistência a filho menor com deficiência ou doença crónica); - artigo 55.º (trabalho a tempo parcial de trabalhador com responsabilidades familiares); - artigo 56.º (horário flexível de trabalhador com responsabilidades familiares); - artigo 57.º (autorização de trabalho a tempo parcial ou em regime de horário flexível); - artigo 58.º (dispensa de algumas formas de organização do tempo de trabalho); - artigo 59.º (dispensa de prestação de trabalho suplementar); - artigo 60.º (dispensa de prestação de trabalho no período nocturno); - artigo 61.º (formação para reinserção profissional); - artigo 62.º (proteção da segurança e saúde de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante); - artigo 63.º (proteção em caso de despedimento); - artigo 64.º (extensão de direitos atribuídos a progenitores); - artigo 65.º (regime de licenças, faltas e dispensas). Isto significa que são aplicáveis aos trabalhadores que exerçam funções públicas, quer na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas, quer na modalidade de nomeação, as disposições do CT relativas à parentalidade[10]. No entanto, quanto à proteção na parentalidade, designadamente, a atribuição de subsídios quando a ausência ao trabalho implica perda de remuneração (cfr. infra) continua a subsistir uma diferença de regimes entre: i) os trabalhadores integrados no regime da proteção social convergente, ou seja, aqueles cujo vínculo de emprego público foi constituído até 31 de dezembro de 2005, nos termos dos artigos 7.º e 11.º da Lei n.º 4/2009, de 21 de janeiro[11], aos quais se aplica o Decreto-Lei n.º 89/2009, de 9 de abril[12]; ii) os trabalhadores integrados no regime de segurança social, que inclui todos os trabalhadores com vínculo de emprego público constituído a partir de 1 de janeiro de 2006, nos termos dos mesmos artigos 7.º e 11.º da Lei n.º 4/2009, de 21 de janeiro, aos quais se aplica o Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de abril[13]. Saliente-se que no primeiro conjunto de casos (abrangido pelo Decreto-Lei n.º 89/2009, de 9 de abril) é ao empregador público que compete proceder ao pagamento dos subsídios e não aos serviços da Segurança Social, ao contrário do que acontece no âmbito do Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de abril[14]. 1.3. No que respeita às licenças que estão em causa na presente Consulta - a licença parental complementar e a licença para assistência a filho, previstas nos artigos 51.º e 52.º do CT -, as mesmas não contrariam o EMP, operando, por isso, a dupla remissão resultante do artigo 108.º do EMP e do artigo 4.º da LGTFP. Efetivamente, os preceitos do EMP sobre faltas (artigo 87.º[15]), dispensas de serviço (artigo 88.º[16]), licença sem vencimento de longa duração (artigo 89.º[17]) e férias e licenças (artigo 105.º[18]) não contrariam, em geral, as disposições do CT sobre direitos de proteção da parentalidade, nem aquelas normas poderiam afastar estas últimas, sob pena de violação do artigo 68.º da CRP. No Parecer n.º 103/82, já citado, o Conselho entendeu, quanto à conjugação da licença por maternidade com as férias dos magistrados do Ministério Público, que, se aquela licença abranger o período de férias, impossibilitando o gozo integral dos trinta dias de férias a que os mesmos magistrados têm direito em cada ano, estas férias podem ser fruídas, na parte não gozada, fora daquele período. Termos em que se conclui que a LGTFP e o CT são aplicáveis aos magistrados do Ministério Público em tudo o que respeita aos direitos de proteção na parentalidade, designadamente em matéria de licença parental complementar e de licença para assistência a filho, previstas nos artigos 51.º e 52.º do CT. IV. Interpretação das normas dos artigos 51.º, n.º 1, e 52.º, n.º 1, do Código do Trabalho 2. Tendo concluído pela aplicação dos artigos 51.º e 52.º do CT aos magistrados do Ministério Público, cumpre proceder à sua análise para responder às questões colocadas na Consulta, a saber: i) A norma do artigo 51.º, n.º 1, do Código do Trabalho deve ser interpretada no sentido em que a “idade não superior a seis anos” termina logo após o filho completar os 6 anos de idade, ou de que subsiste no decurso do sétimo ano de vida até que este se complete? ii) A norma do artigo 52.º, n.º 1, do Código do Trabalho deve ser interpretado no sentido de que o direito à licença para assistência a filho tem o mesmo limite temporal estabelecido no artigo 51.º, n.º 1, ou prolonga-se até aos 12 anos, ou mesmo até à maioridade? 2.1. Quanto à primeira questão, justifica-se transcrever o artigo 51.º do CT, que consagra a licença parental complementar[19]: “Artigo 51.º 1 - O pai e a mãe têm direito, para assistência a filho ou adotado com idade não superior a seis anos, a licença parental complementar, em qualquer das seguintes modalidades: Licença parental complementar a) Licença parental alargada, por três meses; b) Trabalho a tempo parcial durante 12 meses, com um período normal de trabalho igual a metade do tempo completo; c) Períodos intercalados de licença parental alargada e de trabalho a tempo parcial em que a duração total da ausência e da redução do tempo de trabalho seja igual aos períodos normais de trabalho de três meses; d) Ausências interpoladas ao trabalho com duração igual aos períodos normais de trabalho de três meses, desde que previstas em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho. 2 - O pai e a mãe podem gozar qualquer das modalidades referidas no número anterior de modo consecutivo ou até três períodos interpolados, não sendo permitida a cumulação por um dos progenitores do direito do outro. 3 - Se ambos os progenitores pretenderem gozar simultaneamente a licença e estiverem ao serviço do mesmo empregador, este pode adiar a licença de um deles com fundamento em exigências imperiosas ligadas ao funcionamento da empresa ou serviço, desde que seja fornecida por escrito a respetiva fundamentação. 4 - Durante o período de licença parental complementar em qualquer das modalidades, o trabalhador não pode exercer outra atividade incompatível com a respetiva finalidade, nomeadamente trabalho subordinado ou prestação continuada de serviços fora da sua residência habitual. 5 - O exercício dos direitos referidos nos números anteriores depende de informação sobre a modalidade pretendida e o início e o termo de cada período, dirigida por escrito ao empregador com antecedência de 30 dias relativamente ao seu início. 6 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 1, 2 ou 3.” As ausências ao trabalho por motivo de maternidade e paternidade incluem faltas, dispensas e licenças[20]. As faltas são justificadas e podem ou não conferir o direito à retribuição, as dispensas são ausências por lapso de tempo inferior a um dia ou a meio dia, não configurando, por isso, uma falta e, finalmente, as licenças são ausências mais prolongadas e que não conferem direito à retribuição. As licenças parentais incluem a licença parental inicial (artigo 40.º), a licença parental inicial exclusiva da mãe (artigo 41.º), a licença parental inicial a gozar exclusivamente pelo pai por impossibilidade da mãe (artigo 42.º), licença parental exclusiva do pai (artigo 43.º), licença por adoção (artigo 44.º), licença parental complementar (artigo 51.º) e a licença para assistência a filho portador de deficiência ou de doença crónica (artigo 53.º). Nos termos do artigo 65.º do CT, as licenças não determinam perda de quaisquer direitos e são equiparadas a prestação efetiva de serviço, exceto para efeitos retributivos. A perda da retribuição é compensada pela atribuição, no caso dos trabalhadores que sejam titulares de uma relação jurídica de emprego público constituída até 31 de dezembro de 2005, dos subsídios previstos no Decreto-Lei n.º 89/2009, de 9 de abril, já citado, e no caso dos restantes trabalhadores pela atribuição dos subsídios previstos no Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de abril, também já citado. O subsídio parental alargado, relativo ao gozo da licença parental complementar está previsto no artigo 16.º daqueles diplomas, sendo atribuído pelo período até três meses a qualquer um ou a ambos os progenitores ou adotantes, alternadamente, durante o gozo de licença parental complementar para assistência a filho integrado no agregado familiar, desde que gozada imediatamente após o período de atribuição do subsídio parental inicial ou do subsídio parental alargado do outro progenitor. Refira-se, finalmente, que a licença parental complementar é configurada no artigo 51.º do CT como um direito potestativo das mães e dos pais, que pode ser exercido numa das quatro modalidades previstas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º 1 daquele preceito[21]. Esse direito potestativo é exercido unilateralmente, através de informação dirigida ao empregador sobre a modalidade em que se pretende utilizar a licença. O empregador não pode recusar o exercício do direito, já que o mesmo não depende da autorização daquele[22], limitando-se a fazer uma verificação do preenchimento dos pressupostos previstos no artigo 51.º do CT. 2.2. Concretamente quanto à questão colocada, transcrita supra no ponto 2., o artigo 51.º, n.º 1, do CT determina que os direitos consagrados no preceito podem ser gozados pelo pai ou pela mãe de “filho ou adotado com idade não superior a seis anos”, devendo entender-se, em resposta à questão colocada na Consulta, que aqueles direitos terminam logo após o filho completar os 6 anos, pelas razões que de seguida se passarão a expor. Trata-se de uma dúvida que é suscitada pela utilização da expressão “não superior a seis anos”, uma vez que a mesma pode ser em dois sentidos: (i) no sentido de os direitos terminarem assim que a criança completa seis anos de idade; ou (ii) tendo a lei utilizado uma unidade de tempo em anos, os direitos mantêm-se enquanto a criança tiver seis anos de idade. Ora, se é verdade que o legislador utilizou a unidade de tempo em anos – até porque seria estranho utilizar outra fórmula para contabilizar a idade de uma pessoa -, também é verdade que determinou que os direitos são conferidos a pais de crianças com “idade não superior a 6 anos” = “idade inferior a 6 anos[23]”, o que só pode significar que esses direitos terminam quando a criança completa seis anos de vida. De uma outra perspetiva - que parece ser a que o legislador quis adotar - os direitos são conferidos durante os primeiros seis anos de vida da criança, sendo que esses seis anos terminam exatamente no dia em que a criança completa seis anos de idade. Pelo contrário, se se considerasse que os direitos subsistiam enquanto a criança tem seis anos de idade, estariam a prolongar-se no decurso do sétimo ano de vida da criança, ultrapassando o limite legal. Por outro lado, se o legislador pretendesse incluir no âmbito do artigo 51.º as crianças de seis anos teria utilizado a expressão “idade igual ou inferior a seis anos”, à semelhança do que acontece no próprio CT, a propósito do trabalho de menores, nos artigos 75.º, n.º 2, 76.º, n.ºs 2 e 3, 77.º, n.º 1, 78.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 79.º, n.ºs 1 e 2, que se referem a “idade igual ou superior a 16 anos”. Termos em que conclui que a norma do artigo 51.º, n.º 1, do CT deve ser interpretada no sentido em que a “idade não superior a seis anos” termina logo após o filho completar os 6 anos de idade, não subsistindo durante o decurso do sétimo ano de vida. 3. Na Consulta coloca-se ainda a questão de saber se a norma do artigo 52.º, n.º 1, do CT deve ser interpretada no sentido de que o direito à licença para assistência a filho tem o mesmo limite temporal estabelecido no artigo 51.º, n.º 1, ou, pelo contrário, se se prolonga até aos 12 anos, ou mesmo até à maioridade. O artigo 52.º prevê a “licença para assistência a filho” nos seguintes termos: “1 - Depois de esgotado o direito referido no artigo anterior, os progenitores têm direito a licença para assistência a filho, de modo consecutivo ou interpolado, até ao limite de dois anos. 2 - No caso de terceiro filho ou mais, a licença prevista no número anterior tem o limite de três anos. 3 - O trabalhador tem direito a licença se o outro progenitor exercer atividade profissional ou estiver impedido ou inibido totalmente de exercer o poder paternal. 4 - Se houver dois titulares, a licença pode ser gozada por qualquer deles ou por ambos em períodos sucessivos. 5 - Durante o período de licença para assistência a filho, o trabalhador não pode exercer outra atividade incompatível com a respetiva finalidade, nomeadamente trabalho subordinado ou prestação continuada de serviços fora da sua residência habitual. 6 - Para exercício do direito, o trabalhador informa o empregador, por escrito e com a antecedência de 30 dias: a) Do início e do termo do período em que pretende gozar a licença; b) Que o outro progenitor tem atividade profissional e não se encontra ao mesmo tempo em situação de licença, ou que está impedido ou inibido totalmente de exercer o poder paternal; c) Que o menor vive com ele em comunhão de mesa e habitação; d) Que não está esgotado o período máximo de duração da licença. 7 - Na falta de indicação em contrário por parte do trabalhador, a licença tem a duração de seis meses. 8 - À prorrogação do período de licença pelo trabalhador, dentro dos limites previstos nos n.ºs 1 e 2, é aplicável o disposto no n.º 6. 9 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 1 ou 2.” 3.1. Trata-se de uma licença complementar da licença parental alargada prevista no artigo 51.º e que, por isso, tem o mesmo limite temporal que esta última, ou seja, até aos seis anos de idade do filho ou adotado. Esta conclusão assenta em três fundamentos. Em primeiro lugar, o n.º 1 do artigo 52.º inicia com a expressão “[D]epois de esgotado o direito referido no artigo anterior..”, o que estabelece de forma clara a natureza complementar da licença prevista no artigo 52.º, significando que o pai ou a mãe que tenha um filho com idade inferior a seis anos mas já tenha esgotado a licença prevista no artigo 51.º pode ainda utilizar a licença do artigo 52.º. Aliás, no CT de 2003[24] a licença parental equivalente ao atual artigo 51.º estava prevista no artigo 43.º, que se transcreve de seguida, e a licença para assistência consagrada no atual artigo 52.º correspondia ao n.º 3 desse artigo 43.º, salientando que se trata de licenças complementares entre si[25]: “Artigo 43.º 1 - Para assistência a filho ou adotado e até aos 6 anos de idade da criança, o pai e a mãe que não estejam impedidos ou inibidos totalmente de exercer o poder paternal têm direito, alternativamente: Licença parental e especial para assistência a filho ou adotado a) A licença parental de três meses; b) A trabalhar a tempo parcial durante 12 meses, com um período normal de trabalho igual a metade do tempo completo; c) A períodos intercalados de licença parental e de trabalho a tempo parcial em que a duração total da ausência e da redução do tempo de trabalho seja igual aos períodos normais de trabalho de três meses. 2 - O pai e a mãe podem gozar qualquer dos direitos referidos no número anterior de modo consecutivo ou até três períodos interpolados, não sendo permitida a acumulação por um dos progenitores do direito do outro. 3 - Depois de esgotado qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, o pai ou a mãe têm direito a licença especial para assistência a filho ou adotado, de modo consecutivo ou interpolado, até ao limite de dois anos. 4 - No caso de nascimento de um terceiro filho ou mais, a licença prevista no número anterior é prorrogável até três anos. 5 - O trabalhador tem direito a licença para assistência a filho de cônjuge ou de pessoa em união de facto que com este resida, nos termos do presente artigo. 6 - O exercício dos direitos referidos nos números anteriores depende de aviso prévio dirigido ao empregador, com antecedência de 30 dias relativamente ao início do período de licença ou de trabalho a tempo parcial. 7 - Em alternativa ao disposto no n.º 1, o pai e a mãe podem ter ausências interpoladas ao trabalho com duração igual aos períodos normais de trabalho de três meses, desde que reguladas em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.” Em segundo lugar, existem no CT preceitos específicos para a assistência a filhos e adotados com idade até 12 anos. Trata-se dos artigos 55.º - trabalho a tempo parcial de trabalhador com responsabilidades familiares[26] – e 56.º - horário flexível de trabalhador com responsabilidades familiares[27]. Sendo assim, o artigo 52.º não poderia ter o mesmo âmbito de aplicação destes preceitos, sob pena de se traduzir numa duplicação de regimes jurídicos, criando uma proteção maior para os pais de crianças com idade superior a 6 anos do que de crianças até aos seis anos, o que se afigura ilógico. Finalmente, caso não se considerasse o artigo 52.º complementar do artigo 51.º, aplicando-se, consequentemente, o mesmo limite temporal (idade não superior a seis anos), aquele preceito não teria, pura e simplesmente, balizas temporais, o que significaria, por absurdo, que poderia ser utilizado até à maioridade do filho ou adotado – solução seguramente não desejada pelo legislador. V. Forma de contagem dos prazos dos procedimentos de autorização do exercício de direitos de proteção na parentalidade estabelecidos no Código do Trabalho 4. Na Consulta é colocada ainda uma última questão, relativa a contagem dos prazos previstos no CT em matéria de direitos de parentalidade, nos seguintes termos: “[O]s prazos dos procedimentos de autorização do exercício de direitos de proteção na parentalidade estabelecidos no Código do Trabalho devem contar-se nos termos desse Código ou nos termos do Código do Procedimento Administrativo?”. 4.1. Refira-se, em primeiro lugar, que a licença parental complementar do artigo 51.º se configura como um direito potestativo, pelo que o mesmo pode começar a ser gozado assim que o trabalhador envia ao empregador uma informação com os elementos impostos por aquele preceito, designadamente, a modalidade na qual pretende utilizar a licença. Trata-se de um direito a exercer unilateralmente pelo trabalhador. Isto significa que, relativamente a essa licença, não pode haver propriamente um ato de aceitação ou de recusa por parte do empregador[28]. A questão apresentada na Consulta continua, no entanto, a ter pertinência porque há outros direitos de parentalidade que implicam um ato por parte do empregador. 4.2. O artigo 3.º do diploma preambular que aprovou a LGTFP estabelece que os prazos previstos nesta lei contam-se nos termos do Código do Procedimento Administrativo (CPA). Atualmente, esta remissão deve ter-se como efetuada para o artigo 87.º do CPA aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, cujo conteúdo se transcreve de seguida: “Artigo 87.º À contagem dos prazos são aplicáveis as seguintes regras: Contagem dos prazos a) O prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades; b) Não se inclui na contagem dia em que ocorra o evento a partir do qual o prazo começa a correr; c) O prazo fixado suspende-se nos sábados, domingos e feriados; d) Na contagem dos prazos legalmente fixados em mais de seis meses, incluem-se os sábados, domingos e feriados; e) É havido como prazo de um ou dois dias o designado, respetivamente, por 24 ou 48 horas; f) O termo do prazo que coincida com dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte; g) Considera-se que o serviço não está aberto ao público quando for concedida tolerância de ponto, total ou parcial.” A solução que consta do artigo 3.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, já resultaria diretamente do próprio CPA para os prazos procedimentais previstos na LGTFP, uma vez que os empregadores abrangidos pelo âmbito de aplicação daquela lei são entidades integradas na Administração Pública em sentido orgânico ou, pelo menos, entidades públicas no exercício de funções administrativas (cfr. o artigo 1.º, n.ºs 2, 3 e 4 da LGTFP). Contudo, nem todos os prazos previstos na LGTFP são prazos procedimentais no sentido em que estejam inseridos num procedimento administrativo, tal como, aliás, acontece no próprio CPA. Efetivamente, como referem MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO GONÇALVES e PACHECO DE AMORIM[29], a propósito do artigo 72.º do CPA de 1991, que corresponde, com poucas alterações, ao artigo 87.º do atual CPA: "[N]ão se inclui, obviamente, no conceito de prazos procedimentais, o próprio prazo estabelecido na lei como condição de exercício (fator de caducidade ou prescrição) do direito ou da posição jurídica a cuja atribuição ou reconhecimento o procedimento tende. É um prazo não procedimental, como acaba por o ser também, por exemplo, o prazo para a revogação ex officio do ato administrativo - pois é fixado por referência ao prazo para a interposição de recurso contencioso, que é um prazo substantivo.” E continuam: "O mesmo se diga quanto aos prazos respeitantes à titularidade ou exercício de posições extra-procedimentais, que se queiram levar ao procedimento, como um modo de colaborar na sua instrução ou para decisão de incidentes nela suscitados. Mas já se incluem na regra geral do Código os prazos respeitantes à conclusão do procedimento ou à instauração de procedimentos (secundários) de execução e de revisão (reclamação ou recurso) da decisão tomada no procedimento principal." Neste sentido, e já a propósito da LGTFP, PAULO VEIGA E MOURA e CÁTIA ARRIMAR defendem que “apenas estão sujeitos às regras ali definidas [no artigo 3.º] os prazos procedimentais e já não os prazos substantivos consagrados na LGTFP”[30]. E continuam: “Na verdade, esta lei consagra diversos prazos substantivos, como sejam os prazos de prescrição ou de caducidade (v. artigos 178.º e 220.º, n.º 6), os prazos das obrigações de não concorrência ou de permanência (v. artigos 77.º e 78.º) ou os prazos de duração máxima da mobilidade (v. artigo 97.º), os quais seguramente não têm qualquer natureza procedimental e relativamente aos quais nada justifica que sejam contabilizados como prazos procedimentais, até por muitos deles se computarem em meses ou anos e, portanto, terem de ser contabilizados nos termos do artigo 279.º do Código Civil. Para além disso, nem mesmo todos os prazos procedimentais previstos na presente lei [Lei n.º 35/2014, de 26 de junho] e na LTFP são contabilizados nos termos do CPA, sendo disso um bom exemplo os prazos de 60 ou 30 dias referidos nos artigos 24.º e 31.º desta lei [pedido de submissão a junta médica e cômputo do prazo de faltas por doença], o prazo para a aceitação da nomeação previsto no artigo 43.º da LTFP ou mesmo os prazos de duração do período experimental ali previstos. Aliás, e em bom rigor, muitas vezes nem sequer se está a referir a prazos procedimentais mas antes a reportar-se a dias de calendário, como nos parece suceder com os artigos 24.º, 31.º e 34.º, n.º 5, da LGTFP, pelo que é um erro pretender-se aplicar uma norma que regula prazos procedimentais quando em causa não está qualquer prazo dessa natureza”[31]. Estas considerações são ainda mais pertinentes quando se trata de uma matéria que não é regulada pela LGTFP mas sim pelo CT por remissão expressa constante do artigo 4.º daquele diploma, como é o caso da proteção na parentalidade. Ainda assim, deve adotar-se relativamente aos prazos previstos no CT em matéria de parentalidade o mesmo critério que se adota para os prazos consagrados na LGTFP, ou seja, analisar, em concreto, quais os prazos que se podem considerar de natureza procedimental. Os direitos de parentalidade estão previstos na Subsecção IV do CT, correspondendo aos artigos 33.º a 65.º, sendo aí estabelecidos vários prazos de diferentes naturezas, que se podem classificar em quatro grandes grupos. Em primeiro lugar, os prazos de duração das licenças, que não são procedimentais, contando-se em dias seguidos, tais como os que constam dos seguintes preceitos: - artigo 35.º, n.º 2, relativo ao exercício dos direitos de parentalidade, determinando que apenas se aplicam, após o nascimento do filho, a trabalhadores progenitores que não estejam impedidos ou inibidos totalmente do exercício do poder paternal, com exceção do direito de a mãe gozar 14 semanas de licença parental inicial e dos referentes a proteção durante a amamentação; - artigo 36.º, n.º 1, que define o prazo de puerpério (120 dias subsequentes ao parto); - artigo 38.º, que determina que a licença por interrupção da gravidez tem a duração entre 14 e 30 dias; - artigo 40.º, que fixa em licença parental inicial em 120 a 150 dias consecutivos); - artigo 51.º (duração da licença parental complementar); - artigos 52.º e 53.º, relativos à duração das licenças para assistência a filho e adotados, entre outras licenças. Em segundo lugar, prazos de duração de licenças que são expressamente fixados em dias úteis, como é o caso da licença parental exclusiva do pai prevista no artigo 43.º: 15 dias úteis, seguidos ou interpolados, nos 30 dias seguintes ao nascimento do filho, cinco dos quais gozados de modo consecutivo imediatamente a seguir a este (n.º 1) e ainda, após gozo desta licença, mais 10 dias úteis de licença, seguidos ou interpolados, desde que gozados em simultâneo com o gozo da licença parental inicial por parte da mãe (n.º 2). Num terceiro grupo inclui-se um conjunto de situações mais complexas, que se prendem com os prazos para o trabalhador informar o empregador de que preenche os requisitos e pretende exercer direitos parentais, tais como as previstas: - no artigo 37.º, que estabelece um prazo de 10 dias para a trabalhadora informar que se encontra em situação de risco clínico na gravidez; - no artigo 48.º, que fixa um prazo de 10 dias de antecedência para a trabalhadora informar que aleita o filho; - no artigo 51.º, n.º 5, que determina que a informação de que se pretende gozar a licença parental complementar e a modalidade em que se pretende exercer esse direito deve ser dirigida por escrito ao empregador com antecedência de 30 dias relativamente ao seu início; - no artigo 52.º, n.º 6, relativo à licença para assistência ao filho, no qual se estabelece que para o exercício desse direito, o trabalhador deve enviar ao empregador, por escrito e com a antecedência de 30 dias, as informações a que se referem as alíneas a) a d) daquele preceito; - no artigo 57.º, sobre o pedido de autorização de trabalho a tempo parcial ou em regime de horário flexível, determinando-se que o trabalhador que pretenda trabalhar a tempo parcial ou em regime de horário de trabalho flexível deve solicitá-lo ao empregador, por escrito, com a antecedência de 30 dias, com os elementos constantes das diversas alíneas do n.º 1. Ora, apesar de mais duvidoso, afigura-se que também estes prazos não são procedimentais por se tratar de prazos para exercer posições jurídicas substantivas e extraprocedimentais por parte dos particulares. De facto, só podem considerar-se procedimentais os prazos que (i) independentemente de se destinarem à Administração ou aos particulares se insiram dentro de um procedimento já iniciado (intraprocedimentais); (ii) os prazos cujo destinatário é a Administração, ou seja, que fixam o período em que a Administração deve atuar. O quarto grupo de casos são exatamente aqueles em que se fixam prazos para a entidade empregadora pública atuar e esses são, efetivamente, prazos procedimentais, mesmo quando previstos no CT e não na LGTFP, por via da remissão operada pelo artigo 4.º deste diploma, cujo n.º 3 esclarece (embora tal já decorresse logicamente da norma) que “[P]ara efeitos da aplicação do regime previsto no Código do Trabalho ao vínculo de emprego público, as referências a empregador e empresa ou estabelecimento, consideram-se feitas a empregador público e órgão e serviço, respetivamente.” Contudo, em matéria de parentalidade, apenas se encontra um prazo desse tipo no CT, mais concretamente no artigo 57.º, n.º 3, relativo à autorização para trabalho em tempo parcial ou em regime de horário flexível, que determina que “[N]o prazo de 20 dias contatos da receção do pedido, o empregador comunica ao trabalhador, por escrito, a sua decisão”. É que, como se referiu supra, os direitos de proteção da parentalidade são configurados na legislação como direitos potestativos, cujo exercício depende apenas de uma mera informação ao empregador, que não pode recusar exatamente porque aqueles direitos não estão sujeitos a qualquer tipo de autorização sua. Prova disso é que nos preceitos do CT sobre parentalidade – artigos 33.º a 65.º - há apenas um que fixa um prazo cujo destinatário é o empregador – o artigo 57.º, acima citado – , visto que a passagem ao regime de trabalho em tempo parcial ou em regime de horário flexível é o único direito parental que não tem a natureza de direito potestativo, estando dependente de autorização do empregador (isso mesmo consta da própria epígrafe do artigo 57.º)[32]. Termos em que se conclui que os prazos dos procedimentos de autorização do exercício de direitos de proteção na parentalidade estabelecidos no CT contam-se nos termos do CPA quando se trate de prazos destinados a uma tomada de decisão por parte da entidade empregadora, de autorização ou de recusa do exercício do direito, o que, no caso dos direitos de parentalidade, ocorre no caso do artigo 57.º do CT. VII. Conclusões Termos em que se formulam as seguintes conclusões: 1. Os magistrados do Ministério Público têm direito à proteção na parentalidade em todos os aspetos garantidos pelo artigo 68.º da CRP, pelo que, perante a omissão do Estatuto do Ministério Público quanto a esta matéria, é aplicável o regime jurídico legalmente consagrado para a função pública ou, na terminologia atual, para os trabalhadores com relação jurídica de emprego público, ou seja, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 26 de junho (cfr., designadamente, o artigo 108.º do Estatuto do Ministério Público). 2. O artigo 4.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas remete para o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, a regulação de vários aspetos da relação de trabalho em funções públicas, entre os quais a matéria da parentalidade, nos termos do n.º 1, alínea d) daquele preceito, o que determina a aplicação dos artigos 33.º a 65.º do Código do Trabalho quer aos trabalhadores que se encontrem na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas, quer na modalidade de nomeação, incluindo os magistrados do Ministério Público. 3. A licença parental complementar consagrada no artigo 51.º do Código do Trabalho configura um direito potestativo exercido unilateralmente pelo trabalhador, através de informação dirigida ao empregador sobre a modalidade em que pretende utilizar a licença, não podendo este recusar o exercício do direito, já que o mesmo não depende da sua autorização, limitando-se a verificar o preenchimento dos pressupostos previstos no artigo 51.º do Código do Trabalho. 4. A norma do artigo 51.º, n.º 1, do Código do Trabalho deve ser interpretada no sentido em que a “idade não superior a seis anos” termina logo após o filho completar os 6 anos de idade, não subsistindo durante o decurso do sétimo ano de vida, visto que o direito é conferido durante os primeiros seis anos de vida da criança, sendo que esses seis anos terminam exatamente no dia em que a criança completa seis anos. 5. A licença prevista no artigo 52.º do Código do Trabalho é complementar da licença parental alargada do artigo 51.º e, por isso, tem o mesmo limite temporal que esta última, ou seja, até aos seis anos de idade da criança. Só assim se compreende que o artigo 52.º não consagre quaisquer balizas temporais e que a licença aí prevista só se inicie depois de esgotada a licença do artigo 51.º. 6. Apesar de o artigo 3.º da Lei n.º 35/2014, de 26 de junho, estabelecer que os prazos previstos nesta lei contam-se nos termos do Código do Procedimento Administrativo, só são procedimentais os prazos cujo destinatário é a Administração (as entidades empregadoras públicas), ou seja, que fixam um prazo para a Administração decidir, e aqueles que, independentemente de se destinarem à Administração ou aos particulares, se insiram dentro de um procedimento já iniciado (intraprocedimentais). 7. Assim, contam-se nos termos do Código do Procedimento Administrativo os prazos consagrados no Código do Trabalho que fixem um prazo para a entidade empregadora pública tomar uma decisão, de autorização ou de recusa do exercício de um direito por parte do trabalhador, o que, em matéria de proteção da parentalidade, ocorre no caso previsto no artigo 57.º do Código do Trabalho. ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 12 DE NOVEMBRO DE 2015. Maria Joana Raposo Marques Vidal – Alexandra Ludomila Ribeiro Fernandes Leitão (Relatora) – Luís Armando Bilro Verão – Maria de Fátima da Graça Carvalho – Fernando Bento – Maria Manuela Flores Ferreira – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita. [1] Através do Despacho de 19 de outubro de 2015, distribuído à Relatora no dia 20 de outubro de 2015. [2] V. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa anotada, Tomo I, 2.ª edição, Coimbra editora, Coimbra, 2010, pág. 1378. [3] Neste sentido, referindo-se, à data, ao Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de março, v. PAULA MARÇALO, Estatuto do Ministério Público anotado, Coimbra editora, Coimbra, 2011, págs. 373 e 374. [4] Alterada pelas Leis n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, e n.º 84/2015, de 7 de agosto. [5] Inédito. [6] V. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, op. cit., pág. 1377. [7] Analisando de forma muito critica esta aproximação, v. PAULO VEIGA E MOURA e CÁTIA ARRIMAR, Comentários à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, 1.º volume, Coimbra editora, Coimbra, 2014, págs. 10 e 11. [8] Alterado pelas Leis n.º 105/2009, de 14 de setembro, n.º 53/2011, de 14 de outubro; n.º 23/2012, de 25 de junho, n.º 47/2012, de 29 de agosto; n.º 69/2013, de 30 de agosto; n.º 27/2014, de 8 de maio; n.º 55/2014, de 25 de agosto; n.º 28/2015, de 14 de abril, e n.º 120/2015, de 1 de setembro. [9] Solução também criticada por PAULO VEIGA E MOURA e CÁTIA ARRIMAR, op. cit., pág. 17, não só pela privatização que a mesma acarreta, mas também por implicar uma fragmentação da legislação reguladora do emprego público e dificultar muito a determinação do Direito aplicável. [10] V. CLÁUDIA SOFIA HENRIQUES NUNES, O contrato de trabalho em funções públicas face à Lei Geral do Trabalho, Coimbra editora, Coimbra, 2014, pág. 142. [11] Alterada pela Lei n.º 10/2009, de 10 de março. [12] Com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 133/2012, de 27 de junho, e pela Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro. [13] Com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.º 70/2010, de 16 de junho, e n.º 133/2012, de 17 de junho, e pela Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, [14] Sobre esta matéria, v. CARLA ACÚRCIO, A proteção social no regime das responsabilidades parentais. A especificidade da proteção social convergente face ao regime geral da segurança social, Quid Juris, Lisboa, 2010, págs. 59 e seguintes. [15] Nos termos do qual: “1 - Quando ocorra motivo ponderoso, os magistrados do Ministério Público podem ausentar-se da circunscrição por número de dias que não exceda 3 em cada mês e 10 em cada ano, mediante autorização prévia do superior hierárquico ou, não sendo possível obtê-la, comunicando e justificando a ausência imediatamente após o regresso. 2 - Não são contadas como faltas as ausências em dias úteis, fora das horas de funcionamento normal da secretaria, quando não impliquem falta a qualquer ato de serviço ou perturbação deste. 3 – São equiparadas às ausências referidas no número anterior, até ao limite de quatro por mês, as que ocorram em virtude do exercício de funções diretivas em organizações representativas da magistratura do Ministério Público. 4 - Em caso de ausência, os magistrados do Ministério Público devem informar do local em que podem ser encontrados.” [16] Com o seguinte teor: “1 - Não existindo inconveniente para o serviço, o Conselho Superior do Ministério Público ou o procurador-geral distrital, por delegação daquele, pode conceder aos magistrados do Ministério Público dispensa de serviço para participação em congressos, simpósios, cursos, seminários, reuniões ou outras realizações que tenham lugar no País ou no estrangeiro, conexas com a sua atividade profissional. 2 - Podem ainda ser autorizadas dispensas de serviço, independentemente da finalidade e verificada a inexistência de inconveniente para o serviço, até ao limite de seis dias por ano, por períodos não superiores a dois dias consecutivos, não acumuláveis entre si ou com o período ou períodos de gozo de férias. 3 - É aplicável aos magistrados do Ministério Público, com as devidas adaptações, o disposto no Decreto-Lei n.º 272/88, de 3 de Agosto, quando se proponham realizar programas de trabalho e estudo, bem como frequentar cursos ou estágios de reconhecido interesse público. 4 - As pretensões a que se refere o número anterior são submetidas a despacho do Ministro da Justiça, sob proposta do Conselho Superior do Ministério Público, na qual se indica a duração, as condições e os termos dos programas e estágios.” [17] Nos termos do qual “[O]s magistrados do Ministério Público na situação de licença sem vencimento de longa duração não podem invocar aquela qualidade em quaisquer meios de identificação relativos à profissão que exerçam”. [18] Cujo conteúdo é o seguinte: “1 - Os magistrados do Ministério Público gozam as suas férias preferencialmente durante o período de férias judiciais, sem prejuízo dos turnos a que se encontrem sujeitos, bem como do serviço que haja de ter lugar em férias nos termos da lei. 2 - As férias dos magistrados do Ministério Público podem ainda ser gozadas no período compreendido entre 15 e 31 de Julho. 3 - Por motivo de serviço público, por motivo justificado ou outro legalmente previsto, os magistrados do Ministério Público podem gozar as suas férias em períodos diferentes dos referidos nos números anteriores. 4 - A ausência para gozo de férias e o local para onde os magistrados se desloquem devem ser comunicados ao imediato superior hierárquico. 5 - O superior hierárquico imediato do magistrado pode determinar o seu regresso às funções, por fundadas razões de urgência de serviço, sem prejuízo do direito de este gozar em cada ano os dias úteis de férias a que tenha direito nos termos legalmente previstos para a função pública. 6 - Os magistrados em serviço nas Regiões Autónomas têm direito ao gozo de férias judiciais de Verão no continente, acompanhados do agregado familiar, ficando as despesas de deslocação a cargo do Estado. 7 - Quando, em gozo de férias ao abrigo do disposto no número anterior, os magistrados tenham de deslocar-se a região autónoma para cumprirem o serviço de turno que lhes couber, as despesas de deslocação ficam a cargo do Estado.” [19] Esta licença surge na sequência do disposto na Diretiva 96/34/CE do Conselho, de 3 de junho de 1996, relativa ao Acordo-quadro sobre a licença parental celebrado pela UNICEF, pelo CEEP e pela CES, publicada no Jornal Oficial da União Europeia n.º 145, de 19 de junho de 1996, posteriormente revogada pela Diretiva n.º 2010/18/UE do Conselho, de 8 de março de 2010, que aplicou o Acordo-Quadro revisto sobre licença parental celebrado entre a BUSINESSEUROPE, a UEAPME, o CEEP e a CES, publicada no Jornal Oficial da União Europeia de 18 de março de 2010. [20] V. MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, Tratado de Direito do Trabalho. Parte II – situações laborais individuais, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, págs. 637 e 638. [21] Há vários pareceres neste sentido da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), entidade que tem por missão, nos termos do Decreto-Lei n.º 76/2012, de 26 de março, prosseguir a igualdade e a não discriminação entre homens e mulheres no trabalho. V., por exemplo, os Pareceres n.º 34/CITE/2011, proferido no Processo n.º 890-QX/2009, e n.º 31/CITE/2014, proferido no Processo n.º 76-DV/2014, ambos in www.cite.gov.pt. [22] Cfr. os Pareceres referidos na nota anterior. [23] As expressões são utilizadas como sinónimos em diversos textos. V., a título de exemplo, MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, op. cit., pág. 645. [24] Aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, e revogado pelo atual CT de 2009. [25] No mesmo sentido de que o artigo 52.º é “um regime complementar ao do fixado no artigo anterior”, v. GUILHERME DRAY, Código do Trabalho anotado, obra coletiva, 8.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, pág. 220. [26] Com o seguinte conteúdo: “1 - O trabalhador com filho menor de 12 anos ou, independentemente da idade, filho com deficiência ou doença crónica que com ele viva em comunhão de mesa e habitação tem direito a trabalhar a tempo parcial. 2 - O direito pode ser exercido por qualquer dos progenitores ou por ambos em períodos sucessivos, depois da licença parental complementar, em qualquer das suas modalidades. 3 - Salvo acordo em contrário, o período normal de trabalho a tempo parcial corresponde a metade do praticado a tempo completo numa situação comparável e, conforme o pedido do trabalhador, é prestado diariamente, de manhã ou de tarde, ou em três dias por semana. 4 - A prestação de trabalho a tempo parcial pode ser prorrogada até dois anos ou, no caso de terceiro filho ou mais, três anos, ou ainda, no caso de filho com deficiência ou doença crónica, quatro anos. 5 - Durante o período de trabalho em regime de tempo parcial, o trabalhador não pode exercer outra atividade incompatível com a respetiva finalidade, nomeadamente trabalho subordinado ou prestação continuada de serviços fora da sua residência habitual. 6 - A prestação de trabalho a tempo parcial cessa no termo do período para que foi concedida ou no da sua prorrogação, retomando o trabalhador a prestação de trabalho a tempo completo. 7 - O trabalhador que opte pelo trabalho em regime de tempo parcial nos termos do presente artigo não pode ser penalizado em matéria de avaliação e de progressão na carreira. 8 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto neste artigo.” [27] Com o seguinte conteúdo: “1- O trabalhador com filho menor de 12 anos ou, independentemente da idade, filho com deficiência ou doença crónica que com ele viva em comunhão de mesa e habitação tem direito a trabalhar em regime de horário de trabalho flexível, podendo o direito ser exercido por qualquer dos progenitores ou por ambos. 2 - Entende-se por horário flexível aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário. 3 - O horário flexível, a elaborar pelo empregador, deve: a) Conter um ou dois períodos de presença obrigatória, com duração igual a metade do período normal de trabalho diário; b) Indicar os períodos para início e termo do trabalho normal diário, cada um com duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário, podendo esta duração ser reduzida na medida do necessário para que o horário se contenha dentro do período de funcionamento do estabelecimento; c) Estabelecer um período para intervalo de descanso não superior a duas horas. 4 - O trabalhador que trabalhe em regime de horário flexível pode efetuar até seis horas consecutivas de trabalho e até dez horas de trabalho em cada dia e deve cumprir o correspondente período normal de trabalho semanal, em média de cada período de quatro semanas. 5 - O trabalhador que opte pelo trabalho em regime de horário flexível, nos termos do presente artigo, não pode ser penalizado em matéria de avaliação e de progressão na carreira. 6 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto no n.º 1.” [28] Cfr., entre outros, os Pareceres da CITE n.º 34/CITE/2011 e n.º 31/CITE/2014, acima citados. [29] Cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO GONÇALVES e PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo anotado, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 1997, pág. 368. [30] Cfr. PAULO VEIGA E MOURA e CÁTIA ARRIMAR, op. cit., pág. 13. [31] Idem. [32] Ainda assim, o empregador só pode recusar o pedido “com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa, ou na impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável” (n.º 2) e essa recusa está sujeita a parecer vinculativo da CITE (n.ºs 5, 6 e 7). |