Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00000640
Parecer: P000041994
Nº do Documento: PPA19940512000400
Descritores: ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
PESSOAL DOCENTE
PROFESSOR
CORPO ESPECIAL
ESTATUTO
SERVIÇO DOCENTE
HORÁRIO LECTIVO
DURAÇÃO NORMAL DO SERVIÇO
COMPONENTE LECTIVO
SERVIÇO EXTRAORDINÁRIO
HORAS EXTRAORDINÁRIAS
CÁLCULO
INTERPRETAÇÃO DA LEI
Livro: 00
Pedido: 02/03/1994
Data de Distribuição: 02/03/1994
Relator: FERREIRA RAMOS
Sessões: 01
Data da Votação: 05/12/1994
Tipo de Votação: UNANIMIDADE
Sigla do Departamento 1: ME
Entidades do Departamento 1: MIN DA EDUCAÇÃO
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 06/06/1994
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: DR 940914
Nº do Jornal Oficial: 213
Nº da Página do Jornal Oficial: 9646
Indicação 2: ASSESSOR: MIGUEL
Área Temática:DIR ADM * FUNÇÃO PUBL / DIR ENS / DIR CIV * TEORIA GERAL.
Ref. Pareceres:P000241991
P000611991
P000231993
P000351993
Legislação:CONST76 ART43 ART73 ART74.; CCIV66 ART9. DESP 185/ME/93 DE 1993/08/12 DR IIS N204 DE 1993/08/31.; L 19/80 DE 1980/07/16. DESP 1-I/ME/94 DE 1994/02/14.; L 46/86 DE 1986/10/14 ART4 N1 N3 ART36 N1 ART59 N1 C.; DL 924/76 DE 1976/12/31 ART3 N1.; DL 448/79 DE 1979/11/13 ART68 N1 ART71 N1 N3.; DL 187/88 DE 1988/05/27 ART2 N1 ART4 N1 ART20 ART23 ART31 ART34.; DL 353-A/89 DE 1989/10/16 ART6.; DL 409/89 DE 1989/11/18 ART1 ART4 ART13 ART34 ART59.; DL 139-A/90 DE 1990/04/28 ART2 B ART6 N2.; ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE APROVADO PELO DL 139-A/90 DE 1990/04/28 ART61 ART62 ART76 ART77 ART78 ART79 ART81 ART83 ART84 ART85 ART94 ART138 N1. DRGU 89/77 DE 1977/12/31 ART2 N1 ART5 N1.; DRGU 18/78 DE 1978/07/01 ART2 ART4.
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: O factor N que figura no denominador da fórmula de cálculo prevista no artigo 13 do Decreto-Lei n 409/89, de 18 de Novembro, varia em função da diferente duração da compenente lectiva fixada no artigo 77 do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário - aprovado pelo Decreto-Lei n 139-A/90, de 28 de Abril -, não relevando, para este efeito, qualquer redução ou dispensa da componente lectiva de que os docentes possam beneficiar ao abrigo do disposto nos artigos 79 e 81, respectivamente, do referido Estatuto.

Texto Integral:

Senhora Ministra da Educação,

Excelência:



1

Confrontada com interpretações divergentes por parte dos Serviços do Ministério da Educação - Gabinete do Secretário de Estado dos Recursos Educativos e Auditoria Jurídica - e das Organizações Sindicais representativas dos professores - Federação Nacional dos Professores (FENPROF) e Sindicato Nacional Democrático dos Professores (SINDEP) -, dignou-se Vossa Excelência solicitar que a Procuradoria-Geral da República emitisse, com a urgência possível, parecer sobre a fórmula de cálculo da remuneração por trabalho docente extraordinário no domínio do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário (ECD), aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril.

Cumpre, assim, emiti-lo.



2

2.1. Subordinado à epígrafe "Cálculo da remuneração horária normal", o artigo 13º do Decreto-Lei nº 409/89, de 18 de Novembro, estabelece:

"A remuneração horária normal é calculada através da fórmula , sendo Rb a remuneração mensal fixada para o respectivo escalão ou nível remuneratório e N o número de horas correspondente a 35 horas semanais".

A esta fórmula de cálculo se refere o Despacho do Senhor Ministro da Educação nº 185/ME/93, de 12 de Agosto, publicado no Diário da República, II Série, nº 204, de 31 de Agosto de 1993, que se passa a reproduzir na íntegra:

"Considerando que a disposição do artigo 13º do Decreto-Lei nº 409/89, de 18-11, estabelece a fórmula de cálculo da retribuição horária normal do pessoal docente;

Considerando que o horário de trabalho do pessoal docente, integrando uma componente lectiva e uma componente não lectiva, tem a duração de 35 horas semanais de serviço, nos termos do artigo 76º do ECD, aprovado pelo Decreto-Lei nº 39-A/90, de 28-4;

Considerando que, de harmonia com o disposto no artigo 61º do ECD, aprovado pelo Decreto-Lei 139-A/90, de 28-4, as horas de serviço docente extraordinário são compensadas por acréscimo na retribuição horária normal, nas percentagens ali fixadas:

Determino:

A fórmula de cálculo prevista no artigo 13º do Decreto-Lei 409/89, de 18-11, é aplicável à determinação da remuneração por trabalho extraordinário, para efeito do disposto no artigo 61º do ECD, aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28-4".



2.2. Inócuo em si, ao menos aparentemente - já que se limita a mandar aplicar uma dada disposição legal à determinação da remuneração por trabalho extraordinário -, este despacho viria a transformar-se na fonte de todas as divergências entre serviços do Ministério da Educação e as organizações sindicais dos professores.

É, na verdade, a partir da sua publicação que se abandona a fórmula de cálculo de pagamento das horas extraordinárias que até aí vinha sendo adoptada, e se passa a proceder ao seu cálculo em novos termos (1).

Muito sinteticamente, o pomo da discórdia reside no seguinte: o factor N contido na fórmula do citado artigo 13º é uma "variável", em função do número de horas que integram a componente lectiva do docente (posição dos professores), ou uma "constante" (2), que atende ao horário semanal dos docentes - 35 horas -, o qual integra, além da componente lectiva, uma componente não lectiva (posição dos serviços)?

Por outras palavras: a expressão numérica de N é de 35 (salvo nas situações de tempo parcial), ou varia consoante a duração horária semanal da componente lectiva, definida no artigo 77º do ECD?

Questão não despicienda, pois, como bem se vê, o valor da hora normal será tanto maior quanto menor for o factor N, e a esse valor se atende, nomeadamente, para determinar a remuneração do trabalho extraordinário.



3

A boa compreensão do parecer só ganhará se enunciarmos desde já, com mais algum pormenor, o essencial das teses em confronto.



3.1. Em Informação prestada por um Adjunto do Gabinete do Senhor Secretário de Estado dos Recursos Educativos concluíu-se por sugerir, face à "clara natureza técnico-jurídica da questão", que fosse solicitado parecer à Auditoria Jurídica do Ministério, visando esclarecer, fundamentalmente, as seguintes questões:

"a) O factor N contido na fórmula prevista no artigo 13º do Decreto-Lei nº 409/89, de 18 de Novembro, varia exclusivamente em função do horário semanal do docente - 35 horas ou qualquer outro horário em tempo parcial -, ou, diferentemente, em função do número de horas que integram a componente lectiva do docente?

b) O alcance dos normativos contidos no artigo 83º do ECD no que à determinação da remuneração por trabalho extraordinário do docente interessa".

Não obstante esta sugestão, a Informação cuidou de tratar e tomou posição sobre as referidas questões.



3.1.1. Assim, e no respeitante ao alcance do artigo 83º, entendeu ser este preceito irrelevante para efeitos da determinação da remuneração horário normal do docente e, logo, para a do trabalho extraordinário - aquela norma apenas interessa para a determinação das horas que devem ser consideradas serviço docente extraordinário.

3.1.2. No tocante à questão "de fundo", manifestou-se o entendimento de que para a "variável N" não podem deixar de considerar-se as 35 horas semanais a que o docente está vinculado por força do disposto no nº 1 do artigo 76º.

É certo que o legislador se poderia ter limitado a indicar, em vez de uma variável (N), apenas o factor 35 (as 35 horas semanais); ao usar, na parte final do artigo 13º, o termo "correspondente", pretendeu, porém, abranger os casos em que o docente não se encontra vinculado à prestação de 35 horas de trabalho semanais, como sucede nas situações de trabalho a tempo parcial (havendo, então, que fazer corresponder N às horas que o docente em regime de tempo parcial se encontra vinculado a prestar, assim se conferindo "sentido útil aquela norma").

A perfilhar-se o entendimento defendido pelas organizações sindicais - acrescenta-se -, para quem o termo "correspondente" se refere apenas à componente lectiva - ou seja, a variável N é determinada de acordo com as horas correspondentes à componente lectiva -, haveria uma "variação acentuada no valor da hora extraordinária: este seria tanto maior quanto mais reduzida fosse a componente lectiva do docente que a prestasse, o que sucede, designadamente, em virtude da mera antiguidade na carreira, nos termos do nº 1 do artigo 79º do ECD e até em casos de redução da componente lectiva em virtude do exercício de cargos directivos ou pedagógicos nas escolas, de doença e de um grande número de situações tipificadas pelo legislador".



3.1.3. Deste entendimento "sindical" - ainda segundo a Informação que estamos acompanhando - resultaria que:

"a) O legislador teria querido remunerar de forma diferente o trabalho extraordinário dos docentes de acordo com o peso específico da componente lectiva, o que violaria designadamente o princípio constitucional da igualdade;

b) Criar-se-ia, deste modo, uma diferenciação remuneratória perturbadora da filosofia em que assenta o sistema retributivo dos docentes (espelhada, designadamente, no facto de, para o legislador do ECD, os efeitos do tempo de serviço se circunscreverem à diferenciação remuneratória resultante da progressão nos diferentes escalões da carreira e à redução da componente lectiva e apenas a estes), atribuindo-se, ainda que indirectamente, à antiguidade na carreira um efeito que o legislador nunca pretendeu, por certo, contemplar e que não parece encontrar qualquer apoio na letra da lei;

c) A hora de trabalho da componente lectiva teria um valor superior ao da componente não lectiva caso se fizesse corresponder a variável N apenas às horas que integram a componente lectiva, nos termos do artigo 77º do ECD, e não às trinta e cinco horas previstas no nº 1 do artigo 76º do mesmo Estatuto, ou, dito de outra forma, a hora extraordinária dos docentes seria remunerada não como a 36ª, 37ª ou 38ª hora de trabalho (única posição defensável, face à obrigatoriedade da prestação das trinta e cinco horas semanais por parte dos docentes) mas como a 23ª, 24ª ou 25ª (para os docentes com uma componente lectiva de 22 horas semanais - cfr. nº 2 do artigo 77º do ECD), ou como a 21ª, 22ª ou 23ª (para os docentes do ensino secundário sem redução da componente lectiva - cfr. nº 3 do mesmo preceito), ou como 19ª, 20ª ou 21ª (para os docentes com uma componente reduzida para 18 horas lectivas - cfr. nº 1 do artigo 79º do ECD), e assim sucessivamente".



3.2. A posição sustentada nesta Informação viria a ser inteiramente acolhida pela Auditoria Jurídica (parecer nº 5/94, de 31 de Janeiro).

Por isso que, deste parecer, nos limitemos a recolher e acentuar o seguinte passo:

"... afigura-se que a lei pode enfermar de certos conflitos inter-textuais, uma vez que define a hora extraordinária como a prestada para além do número de horas da componente lectiva (artigo 83º); e também na medida em que manda considerar como um dia de falta um número de horas igual ao quociente da divisão por cinco do número de horas de serviço lectivo semanal ou equiparado distribuído ao docente (nº 2 do artigo 94º)".

E, a concluir, o parecer, afirmando embora que o despacho nº 185/ME/93 faz uma correcta interpretação do disposto no artigo 13º do Decreto-Lei nº 409/89 (3), não deixa de considerar que o problema nele versado é merecedor de ponderação a nível de política legislativa, uma vez que se articula mal com as definições de serviço docente extraordinário e de falta a um dia completo.



3.3. Diverso é o entendimento sustentado pela FENPROF e pelo SINDEP, o qual pode assim sintetizar-se: o cálculo da remuneração do trabalho extraordinário tem sempre como denominador exclusivamente a componente lectiva, e não as 35 horas.

Apoiam-se, para tanto, e fundamentalmente, no disposto no nº 1 do artigo 83º - que considera serviço docente extraordinário o que for prestado além do número de horas da componente lectiva -, fazendo também apelo ao "sentido" da articulação entre as componentes lectiva e não lectiva do horário docente: a componente não lectiva é instrumental da lectiva, visando assegurar a sua normal prestação (assim, por exemplo, se um docente tem um horário lectivo completo "presume-se, inilidivelmente, que tem um horário global completo").



4

4.1. O artigo 2º, nº 1, do Decreto-Lei nº 187/88, de 27 de Maio, estabelece a seguinte duração semanal do trabalho para todos os serviços da Administração Pública, incluindo os institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos (4):

"a) 35 horas para o pessoal dos grupos técnico superior, técnico, técnico-profissional e administrativo e, ainda, para telefonistas;

b) 40 e 45 horas, respectivamente, para o pessoal dos grupos auxiliar e operário".

É de sete, oito ou nove horas o limite máximo do período normal de trabalho diário, consoante a duração semanal seja, respectivamente, de 35, 40 ou 45 horas (artigo 4º, nº 1).

Considera-se extraordinário o trabalho que, por determinação superior, for prestado fora do período normal de trabalho diário (artigo 20º, nº 1, alínea a)) (5).

As horas extraordinárias são compensadas, de acordo com a opção do funcionário ou agente, por um dos seguintes sistemas:

- dedução posterior no período normal de trabalho;

- acréscimo na retribuição horária, segundo determinadas percentagens que vão de 25% a 90% (artigo 23º, nº 1, alínea b)).



4.2. Retenha-se, por último, o disposto no artigo 31º, epigrafado de "Cálculo da remuneração horária normal":

"A remuneração horária normal é calculada através da fórmula , sendo V o vencimento mensal fixado para a respectiva categoria na tabela salarial e N o número de horas correspondente à normal duração semanal do trabalho".

Através desta parte final opera-se uma remissão para o citado nº 1 do artigo 2º, configurando-se, assim, N, e compreensivelmente, como uma variável em função da diferente duração semanal do trabalho assinalada às diferentes categorias de pessoal (portanto com um valor numérico de 35, 40 ou 45).



4.3. A mesma fórmula de cálculo vamos também encontrá-la no Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro - diploma que estabeleceu regras sobre o estatuto remuneratório dos funcionários e agentes da Administração Pública e a estrutura das remunerações base das carreiras e categorias nele contempladas -, cujo artigo 6º ("Remuneração horária") estabelece:

"1. Para todos os efeitos legais, o valor da hora normal de trabalho é calculado através da fórmula , sendo Rb a remuneração mensal e N o número de horas correspondente à normal duração semanal de trabalho.

2. ......................................................................................................".



5

Após este breve excurso pelo regime da função pública em geral, centremos a nossa especial atenção na disciplina jurídica do pessoal docente, a qual oferece grandes especificidades neste domínio.



5.1. A Lei nº 46/86, de 14 de Outubro - Lei de Bases do Sistema Educativo - estabeleceu o quadro geral do sistema educativo à luz, nomeadamente, dos artigos 43º, 73º e 74º da Constituição da República.

O sistema educativo integra a educação pré-escolar, a educação escolar e extra-escolar, compreendendo a educação escolar os ensinos básico, secundário e superior (artigo 4º, nºs. 1 e 3).

O capítulo IV é dedicado aos "recursos humanos" e nele se inclui o artigo 36º, cujo nº 1 estabelece:

"Os educadores, professores e outros profissionais da educação têm direito a retribuição e carreira compatíveis com as suas habilitações e responsabilidades profissionais, sociais e culturais".

Entre a legislação complementar que o Governo deveria publicar para o desenvolvimento da Lei, o artigo 59º, nº 1, alínea c), mencionava a que contemplasse as "carreiras de pessoal docente e outros profissionais da educação".



5.2. Abra-se aqui um parêntesis para referenciar dois diplomas que regulamentaram o serviço docente extraordinário nos ensinos preparatório, secundário e médio - os Decretos Regulamentares nºs 89/77 e 18/78, de 31 de Dezembro e 1 de Julho, respectivamente.



5.2.1. Considerava-se como trabalho docente extraordinário todo o serviço lectivo prestado para além do que, nos termos da lei em vigor, constituía o horário semanal obrigatório - artigo 2º, nº 1, do Decreto Regulamentar nº 89/77, cujo artigo 5º, nº 1, prescrevia:

"Para efeitos de cálculo da remuneração do trabalho docente extraordinário, considera-se como valor da hora de serviço normal a fórmula sendo V o vencimento mensal do docente e H o número de horas de serviço semanal obrigatório" (6).

5.2.2. Este artigo 5º, nº 1, veio a ser expressamente revogado pelo Decreto-Regulamentar nº 18/78 (cfr. artigo 4º), o qual, sobre a matéria, dispôs no artigo 2º:

"Para efeitos do cálculo da remuneração do trabalho docente extraordinário, considera-se como valor da hora de serviço normal a fórmula:



sendo V o vencimento mensal do professor" (7).



6

6.1. O Decreto-Lei nº 409/89, de 18 de Novembro - cujo preâmbulo anunciava encontrar-se "em fase de conclusão de negociação" o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário - aprovou a estrutura da carreira do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário e estabeleceu as normas relativas ao seu estatuto remuneratório, constituindo esse pessoal um corpo especial, integrado numa carreira única (artigos 1º e 4º).

É no capítulo III ("Remunerações") que se localiza o tão questionado artigo 13º, epigrafado de "Cálculo da remuneração horária normal", e cujo conteúdo já conhecemos (cfr. ponto 2.1).



6.2. O anunciado Estatuto da Carreira de Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário (também designado por Estatuto da Carreira Docente - ECD) veio a ser aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril (8).

6.2.1. No contexto da reforma educativa em curso, o Governo optou por fazer aprovar um estatuto da função docente, com a preocupação da revisão e substituição da legislação em vigor, dispersa por inúmeros diplomas; em matéria de carreira docente, afirmada que foi pelo Decreto-Lei nº 409/89 a sua natureza de carreira única e o respectivo desenvolvimento em escalões de progressão e de promoção, o estatuto, para além de remeter para o mencionado diploma legal, define as condições do acesso na carreira e a intercomunicabilidade com as carreira do regime geral (do respectivo preâmbulo).

No seu relatório preambular são também expressamente reconhecidas as especialidades inerentes ao exercício da actividade docente, nomeadamente no tocante ao regime geral de férias, faltas e licenças - que é "adaptado às especiais e específicas condições da actividade docente" - e em matéria de horário de trabalho - "constatadas as especialidades características da actividade docente, foi mantida a duração da componente lectiva vigente (9) fixando-se, contudo, nas 20 horas semanais no ensino secundário, de modo a criar condições de preparação das aulas neste nível de ensino".



6.2.2. Para efeitos do ECD, entende-se por docentes - educadores de infância, professores dos 1º, 2º e 3º ciclos do ensino básico e professores do ensino secundário profissionalizados ou a aguardar profissionalização (artigo 2º, alínea b)).

O pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário constitui um corpo especial e integra-se numa carreira única, e as suas remunerações são as previstas nos anexos constantes do Decreto-Lei nº 409/89 (artigos 34º e 59º).

A apreciação da questão submetida à nossa análise reclama o conhecimento mais pormenorizado de alguns preceitos do ECD, que tivemos o cuidado de seleccionar.



6.2.3. À remuneração por trabalho extraordinário e por trabalho nocturno referem-se, respectivamente, os artigos 61º e 62º, dispondo o primeiro:

"As horas de serviço docente extraordinário são compensadas por um acréscimo na retribuição horária normal de acordo com as seguintes percentagens:

25% para a primeira hora semanal de trabalho extraordinário diurno;

50% para as horas subsequentes de trabalho extraordinário diurno".

Como se vê, a remuneração do trabalho extraordinário é determinada pelo valor da hora normal, assim se remetendo para o disposto no transcrito artigo 13º do Decreto-Lei nº 409/89, que contém a fórmula de cálculo da remuneração horária normal.

Prescreve, por seu turno, o artigo 62º:

"A retribuição do trabalho nocturno prestado para além da componente lectiva semanal do docente é calculada através da multiplicação do valor da hora extraordinária diurna de serviço docente pelo coeficiente 1,25" (sublinhados nossos).

Retenha-se, pelo seu significado, que é o valor da hora extraordinária que serve de base de cálculo para a retribuição do trabalho nocturno prestado para além (apenas) da componente lectiva semanal, não se fazendo qualquer referência à componente não lectiva (10).

6.2.4. Inserem-se no subcapítulo II - Duração de trabalho - do capítulo X - Condições de trabalho - os principais normativos que ainda interessa considerar.



6.2.4.1. Dispõe o artigo 76º ("Duração semanal"):

"1. O pessoal docente em exercício de funções é obrigado à prestação de 35 horas semanais de serviço.

2. O horário semanal dos docentes integra uma componente lectiva e uma componente não lectiva e desenvolve-se em cinco dias de trabalho".

Passou, assim, a assinalar-se ao horário do pessoal docente uma duração semanal de 35 horas (11) e, por outro lado, a distinguir-se nesse horário duas componentes - lectiva e não lectiva.



6.2.4.2. Do mesmo passo consignou-se que o horário semanal se desenvolve em 5 dias de trabalho.

À componente lectiva refere-se o artigo 77º nos seguintes termos:

"1 - A componente lectiva do pessoal docente da educação pré-escolar e do 1º ciclo do ensino básico é de 25 horas semanais.

2 - A componente lectiva do pessoal docente dos 2º e 3º ciclos do ensino básico é de 22 horas semanais.

3 - A componente lectiva do pessoal docente do ensino secundário, desde que prestada na totalidade neste nível de ensino, é de 20 horas semanais.

4 - A componente lectiva dos docentes da educação e ensino especial é de 23 ou de 20 horas semanais, consoante se encontrem em exercício de funções na educação pré-escolar e no 1º ciclo do ensino básico ou nos 2º e 3º ciclos do ensino básico e no ensino secundário" (12).

Como se vê, a duração da componente lectiva não é a mesma para todos os níveis de ensino, variando entre um mínimo de 20 horas semanais e um máximo de 25 horas.

Manteve-se, como se diz no preâmbulo, a duração vigente (13), excepto para o ensino secundário, que passou a ser de 20 horas semanais.

Em jeito de parêntesis, refira-se que está agora posto mais a nu o punctum saliens da divergência interpretativa que determinou o pedido de consulta - enquanto os serviços entendem que o factor N da fórmula se reporta às componentes lectiva e não lectiva (em princípio, 35 - artigo 76º, nº 1), os sindicatos defendem que varia apenas em função da componente lectiva, cuja duração é definida no artigo 77º.



6.2.4.3. Sobre a "Componente não lectiva" dispõe o artigo 82º:

"1 - A componente não lectiva do pessoal docente abrange a realização de trabalho a nível individual e a prestação de trabalho a nível do estabelecimento de educação ou de ensino.

2 - O trabalho a nível individual pode compreender, para além da preparação das aulas e da avaliação do processo ensino-aprendizagem, a elaboração de estudos e de trabalhos de investigação de natureza pedagógica ou científico-pedagógica.

3 - O trabalho a nível do estabelecimento de educação ou de ensino deve integrar-se nas respectivas estruturas pedagógicas com o objectivo de contribuir para a realização do projecto educativo da escola, podendo compreender:

a) A colaboração em actividades de complemento curricular que visem promover o enriquecimento cultural e a inserção dos educandos na comunidade;

b) A informação e orientação educacional dos alunos, em colaboração com as famílias e com as estruturas escolares locais e regionais;

c) A participação em reuniões de natureza pedagógica legalmente convocadas;

d) A participação, promovida nos termos legais ou devidamente autorizada, em acções de formação contínua ou em congressos, conferências, seminários e reuniões para estudo e debate de questões e problemas relacionados com a actividade docente;

e) A substituição de outros docentes do mesmo estabelecimento de educação ou de ensino, nos termos da alínea h) do nº 2 e do nº 3 do artigo 10º;

f) A realização de estudos e de trabalhos de investigação que, entre outros objectivos, visem contribuir para a promoção do sucesso escolar e educativo.

4 - Por portaria do Ministro da Educação serão definidas as condições em que pode ainda ser determinada uma redução total ou parcial da componente lectiva, nos casos previstos nas alíneas a), b) e f) do número anterior".



6.2.4.5. Reza assim o artigo 83º, sob a epígrafe "Serviço docente extraordinário":

"1 - Considera-se serviço docente extraordinário aquele que, por determinação do órgão de administração e gestão do estabelecimento de educação ou de ensino, for prestado além do número de horas da componente lectiva a cujo cumprimento o docente está obrigado.

2 - Considera-se ainda serviço docente extraordinário o que for prestado nos termos da alínea e) do nº 3 do artigo anterior.

3 - O docente não pode recusar-se ao cumprimento do serviço extraordinário que lhe for distribuído resultante de situações ocorridas no decurso do ano lectivo, podendo, no entanto, solicitar dispensa da respectiva prestação por motivos atendíveis.

4 - O serviço docente extraordinário não pode exceder cinco horas por semana, salvo casos excepcionais devidamente fundamentados e autorizados pelo director regional.

5 - Para efeitos do disposto no número anterior não é considerado o serviço docente extraordinário previsto no nº 2".

O sublinhado, de nossa autoria, revela claramente que para a determinação do serviço docente extraordinário se atende apenas à duração da componente lectiva (a cujo cumprimento o docente está obrigado).

Em nosso entender, este normativo assume particular valor interpretativo na dilucidação da questão em análise, não podendo dizer-se, se bem pensamos, que o mesmo é irrelevante, apenas interessando para a determinação das horas que devem ser consideradas extraordinárias (como se faz na Informação do Gabinete - cfr. ponto 3.1.1.).

6.2.4.6. A encerrar o subcapítulo II (duração de trabalho, recorde-se) deparamos com o artigo 85º ("Tempo parcial"), do seguinte teor:

"O pessoal docente dos 2º e 3º ciclos do ensino básico e do ensino secundário pode exercer funções em regime de tempo parcial, nos termos previstos para a função pública em geral".

Flui do exposto que o exercício de funções em regime de tempo parcial está limitado ao ensino secundário e ao ensino básico, e neste apenas aos 2ª e 3ª ciclos.



6.2.4.7. Integrado já noutro subcapítulo, atente-se, por último, no teor do artigo 94º, "Conceito de faltas":

"1 - Falta é a ausência do docente durante a totalidade ou parte do período diário de presença obrigatória no estabelecimento de educação ou de ensino ou em local a que se deva deslocar em exercício de funções.

2 - É considerado um dia de falta a ausência a um número de horas igual ao quociente da divisão por cinco do número de horas de serviço lectivo semanal ou equiparado distribuído ao docente.

3 - As faltas por períodos inferiores a um dia são adicionadas no decurso do ano lectivo, para efeitos do disposto no nº 2."

Também aqui, o nº 2, atende apenas ao serviço lectivo semanal para efeitos de cálculo de um dia de falta.



7

A solução do problema submetido à nossa apreciação radica e esgota-se, como é reconhecido, na interpretação da lei - questão "a dirimir no puro domínio técnico jurídico", lê-se num despacho do Senhor Secretário de Estado dos Recursos Educativos.

Mais especificamente, está em causa a interpretação da norma do artigo 13º do Decreto-Lei 409/89.

Porém, uma advertência cumpre desde já assinalar: a interpretação demanda uma tarefa de conjunto, em que se procura descobrir o sentido legislativo da norma no todo do ordenamento jurídico (14).

Advertência que ganha, aqui, particular relevo, na medida em que o citado artigo 13º há-de necessariamente conjugar-se e articular-se com o disposto no ECD, em particular com os preceitos que oportunamente recenseámos.

A interpretação tem por objecto descobrir, de entre os sentidos possíveis da lei, o seu sentido prevalente ou decisivo (15).

O limite da interpretação é a letra , o texto da norma (16), cabendo-lhe desde logo uma função negativa - a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos uma qualquer correspondência ou ""ressonância" nas palavras da lei.

A apreensão literal do texto, ponto de partida de toda a interpretação, é já interpretação, embora incompleta, pois será sempre necessária uma "tarefa de interligação e valoração que escapa ao domínio literal" (17).

Nesta tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal, intervêm elementos lógicos, apontando a doutrina elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica.

Segundo a doutrina tradicional, o intérprete, socorrendo-se dos elementos interpretativos acabados de referir, acabará por chegar a um dos seguintes resultados ou modalidades de interpretação: interpretação declarativa, interpretação extensiva, interpretação restritiva, interpretação revogatória e interpretação enunciativa.

Na interpretação declarativa, o intérprete limita-se a eleger um dos sentidos que o texto directa e claramente comporta, por ser esse aquele que corresponde ao pensamento legislativo 18).

Ou seja: há interpretação declarativa quando o sentido da lei cabe dentro da sua letra, quando o intérprete fixa à norma, com o seu verdadeiro sentido, o sentido ou um dos sentidos literais, nada mais fazendo que declarar o sentido linguístico coincidente com o pensar legislativo (19).

A interpretação declarativa pode ser restrita ou lata, segundo toma em sentido limitado ou em sentido amplo as expressões que têm vários significados: tal distinção, como adverte FRANCESCO FERRARA (20), não deve confundir-se com a interpretação extensiva ou restritiva, pois nada se restringe ou se estende quando entre os significados possíveis da palavra se elege aquele que parece mais adaptado à mens legis.

A interpretação restritiva aplica-se quando se reconhece que o legislador, posto se tenha exprimido em forma genérica e ampla, quis referir-se a uma classe especial de relação, e "tem lugar particularmente nos seguintes casos: 1º se o texto, entendido no modo tão geral como está redigido, viria a contradizer outro texto de lei; 2º se a lei contém em si uma contradição íntima (é o chamado argumento ad absurdum); 3º se o princípio aplicado sem restrições, ultrapassa o fim para que foi ordenado" (21).





8

Como se disse , a solução da questão em análise passa, necessária e fundamentalmente, pela interpretação da norma do artigo 13º do Decreto-Lei nº 409/89.

Por comodidade de exposição, reproduzir-se-á de novo:

"A remuneração horária normal é calculada através da fórmula , sendo Rb a remuneração mensal fixada para o respectivo escalão ou nível remuneratório e N o número de horas correspondente a 35 horas semanais" (22).



8.1. Pensa-se poder afirmar que o legislador não terá sido particularmente feliz ao definir, nos apontados termos, o factor N do denominador da fórmula (23).

Não será despiciendo recordar, neste momento, duas notas, concedendo-lhes o destaque devido:

Primeira - a fórmula de cálculo contida no artigo 2º do Decreto Regulamentar nº 18/78 (24) não dava margem a dúvidas, já que inseria no seu denominador uma constante, (que correspondia, como regra, à duração semanal do serviço lectivo), e não um qualquer factor variável;

Segunda - após o Decreto-Lei nº 409/89, e mesmo depois do ECD, os serviços processadores do pagamento do trabalho docente extraordinário continuaram a atender apenas à componente lectiva, procedimento que só veio a ser alterado com a publicação do Despacho nº 185/ME/93 (25).



8.2. Mas sendo assim, se tivesse sido propósito do legislador alterar, e de forma tão significativa, um elemento da fórmula de cálculo, em relação ao que, até aí, estava consignado na lei e era a prática dos serviços, seria de "exigir" que ele tivesse exprimido esse seu pensamento em termos mais adequados à sua tradução (cfr. artigo 9º, do Código Civil).

Neste contexto, contra a tese perfilhada na Informação do Gabinete e no parecer da Auditoria Jurídica poder-se-á desde logo argumentar, dizendo: se o legislador quisesse que N se reportasse às componentes lectiva e não lectiva, não havia necessidade de ter feito uso de N, devendo ter-se limitado a inscrever, em sua vez, 35 (soma daquelas duas componentes , e que traduz a duração semanal do trabalho, ou seja, o horário global semanal).

Dando-se conta da valia deste argumento, tanto a Informação como o parecer cuidaram de logo o rebater, contra-argumentando nos seguintes termos: ao usar na parte final da norma o termo "correspondente", o legislador pretendeu abranger os casos em que o docente não se encontra vinculado à prestação de 35 horas de trabalho semanais, como sucede nas situações de tempo parcial (26)

Ao invés, defendem os sindicatos que o termo "correspondente" se refere apenas à componente lectiva - N varia de acordo com a "carga" horária da componente lectiva, tal como está definida no artigo 77º do ECD.



8.3. Também nós propendemos para este entendimento.



8.3.1. Aceitando, embora, que o referido "contra-argumento" poderia acabar por conferir à norma algum sentido útil, não pode deixar de reconhecer-se que, assim, se reduziria drasticamente o "interesse prático" da sua estatuição, como que circunscrevendo o seu "campo de aplicação" a situações muito restritas (ainda mais, se tivermos presente as limitações previstas no artigo 85º para o exercício de funções em regime de tempo parcial - cfr. ponto 6.2.4.6.).

Ou seja: só uma outra interpretação reconhece e confere à norma toda a "plenitude" que, em princípio, lhe deve assistir.

De qualquer modo, pensa-se dever reconhecer que o elemento literal, embora forneça algumas indicações que apontam no sentido por nós defendido, não constitui um suporte decisivo para qualquer das teses em confronto, pelo que a dilucidação da dúvida que nos ocupa só se alcançará a outros níveis de interpretação, nomeadamente através dos elementos sistemático e teleológico.



8.3.2. Em abono do entendimento perfilhado assumem, porém,. a nosso ver, um valor decisivo as normas, e sua necessária conjugação e articulação, dos artigos 62º (remuneração por trabalho nocturno), 83º (serviço docente extraordinário) e 94º (conceito de falta).

Por isso lhe demos, oportunamente, o necessário relevo (cfr. pontos 6.2.3., 6.2.4.5., e 6.2.4.7.).

Em todas elas se atende apenas à componente lectiva semanal - para efeitos da retribuição do trabalho nocturno (artigo 63º), do que se entende por serviço docente extraordinário (artigo 83º, nº 2) e do cálculo de um dia de faltas (artigo 94º, nº 2) (27).

O "sentido da articulação" destas normas, como também das componentes lectiva e não lectiva , confortam, pois, a interpretação segundo a qual o factor N varia apenas segundo a componente lectiva (28).

Componente lectiva que não é a mesma, segundo tivemos oportunidade de salientar (cfr. ponto 6.2.4.2.), para todos os níveis de ensino, como claramente resulta do disposto no artigo 77º.



8.3.3. Mas sendo assim, se N "corresponde" à componente lectiva que o artigo 77º define em abstracto, consoante os níveis de ensino, deixarão de ter razão de ser as "consequências" a que conduziria a tese dos sindicatos, e que a Informação do Gabinete criticamente assinala (cfr. alíneas b) e c) do ponto 3.1.3.) (29).

É que, se bem as interpretamos, essas críticas (ao menos a da alínea b)) parecem assentar no pressuposto de que, para a tese sufragada, N varia segundo a componente lectiva concreta de cada docente, atendendo, pois, à redução ou dispensa da "carga" lectiva de que possa beneficiar cada docente.

O que não é o caso - varia sim, mas em função da componente lectiva abstractamente fixada no artigo 77º.



8.3.4. Significa o exposto, que o factor N corresponde ou é preenchido pela diferente duração da componente lectiva que o artigo 77º fixa objectivamente para os diferentes níveis de ensino, não relevando, para este efeito, qualquer redução ou dispensa da componente lectiva de que o docente possa beneficiar ao abrigo do disposto nos artigos 79º e 81º, respectivamente.

Por isso que, em nosso entender, não tenham razão de ser as críticas que, a este propósito, estão contidas na Informação do Gabinete (cfr. pontos 3.1.2., in fine, e 3.1.3.).



9

Pelo exposto, conclui-se:



O factor N que figura no denominador da fórmula de cálculo prevista no artigo 13º do Decreto-Lei nº 409/89, de 18 de Novembro, varia em função da diferente duração da componente lectiva fixada no artigo 77º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário - aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril -, não relevando, para este efeito, qualquer redução ou dispensa da componente lectiva de que os docentes possam beneficiar ao abrigo do disposto nos artigos 79º e 81º, respectivamente, do referido Estatuto.




1) Já posteriormente ao pedido de parecer, a Senhora Ministra da Educação exarou o Despacho nº 1-I/ME/94, de 14/2/94:
"Considerando que o Ministério da Educação solicitou ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República parecer sobre o correcto enquadramento jurídico do regime remuneratório do serviço docente extraordinário;
Tendo em conta a imprevisibilidade do momento em que a questão controvertida possa vir a ser resolvida;
Atendendo aos prejuízos que se fazem sentir aos alunos afectados pela falta de algumas aulas, com a consequente situação de desigualdade perante aqueles cujas aulas têm regularmente sido asseguradas;
Ponderando, por último, que se torna ainda conveniente proceder à redistribuição de horários e à contratação de novos docentes com vista a dar resposta adequada e atempada às necessidades provenientes da substituição de professores em variadas situações, nomeadamente baixa médica, licença de maternidade e apoio pedagógico acrescido aos alunos, com vista à recuperação de eventuais atrasos;
Determino que:
1. Até completo esclarecimento sobre a interpretação jurídica do regime remuneratório do serviço docente extraordinário, o pagamento das horas extraordinárias a efectuar pelos docentes será processado nos mesmos termos em que se vinha efectuando até à publicação do despacho nº 185/ME/93, de 12 de Agosto.
2. Os órgãos de gestão das escolas procedam à redistribuição dos horários docentes e contratem os professores necessários para assegurar aos alunos todas as aulas das diversas disciplinas e a leccionação integral dos respectivos programas".

2) Como de seguida melhor se verá, só grosso modo e, porventura, de modo menos correcto, se poderá falar de uma "constante", pois nesta tese o factor N varia em função do horário a tempo parcial.

3) Como se deixou já transparecer, o despacho em causa não procede, em boa verdade, a qualquer interpretação do citado artigo 13º, limitando-se a mandar aplicar a fórmula de cálculo nele prevista à determinação da remuneração por trabalho extraordinário.
Ora, como vimos, a questão consiste precisamente em interpretar essa fórmula de cálculo - mais concretamente, em determinar o sentido do factor N que surge no denominador da fórmula.

4) Mantiveram-se, todavia, em vigor certos regimes de trabalho fixados em legislação especial, nomeadamente para o pessoal docente (cfr. artigo 34º).

5) Sobre o tema, cfr. JOÃO ALFAIA Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público, Livraria Almedina, 1º vol. 1985, págs. 489 e segs., e 2º vol., 1988, págs. 785 e segs., e MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, Livraria Almedina, 1991, págs. 687 e segs., maxime págs. 696-698.

6) Entre os diplomas expressamente revogados pelo Decreto-Lei nº 139-A/90 - a que nos referiremos de seguida com mais pormenor - inclui-se (cfr. artigo 6º, nº 2) o Decreto nº 48572, de 9 de Setembro de 1968, que aprovou o Estatuto do Ciclo Preparatório, em cujo 228º, nº 1, se estabelecia que o serviço obrigatório era de 22 horas por semana para todos os professores, com excepção dos de Trabalhos Manuais (cfr., ainda, os Decretos nº 36508, de 17/9/47, que aprovou o Estatuto do Ensino Liceal, e nº 37029, de 25/8/48, que promulgou o Estatuto do Ensino Profissional Industrial e Comercial, e os seus artigos 127º, nº 1, e 326º, respectivamente, com a nota de que estes diplomas também figuram na revogação expressa determinada pelo citado artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 139-A/90).

7) O Decreto Regulamentar nº 18/78 foi objecto de expressa revogação por força do disposto no nº 2 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 139-A/90, que também revogou o Decreto-Regulamentar nº 89/77.

8) Rectificado no Diário da República, I Série, nº 149, de 30/6/90.

9) Que era, em regra, para o ciclo preparatório do ensino secundário, de 22 horas por semana (cfr. nota 6).
Recorde-se que era precisamente o nº 22 que figurava no denominador da fórmula contida no Decreto-Regulamentar nº 18/78, agora revogado pelo artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 139-A/90.

10) Cfr., também, o artigo 84º:
"1. Considera-se serviço docente nocturno o que for prestado para além das 19 horas.
2. Para efeitos de cumprimento da componente lectiva, as horas de serviço docente nocturno são bonificadas com o factor 1,5".

11) Porventura, para ir de par com a duração prevista no artigo 2º, nº 1, do Decreto-Lei nº 187/88, significativamente com a mesma epígrafe - "duração semanal do trabalho" (cfr. ponto 4.)
Também o artigo 68º, nº 1, do Estatuto da Carreira Docente Universitária - aprovado pelo Decreto-Lei n º 448/79, de 13 de Novembro, alterado, por ratificação, pela Lei nº 19/80, de 16 Julho - define regime de tempo integral como "aquele que corresponde, em média, à duração semanal do trabalho para a generalidade dos trabalhadores da função pública".
Por seu turno, o artigo 71º, nº 1, do mesmo Estatuto dispõe que "cada docente em regime de tempo integral é obrigado à prestação de horas semanais de serviço de aulas ou seminários que lhe for fixado pelo conselho científico, num mínimo de seis horas e um máximo de nove", acrescentando o nº 3: "Para além do tempo de leccionação de aulas, o horário de serviço docente integra a componente relativa a serviços de assistência a alunos, devendo este, em regra, corresponder a metade daquele tempo".

12) Os artigos 78º, 79º e 181º regem sobre a organização, a redução e dispensa da componente lectiva, respectivamente.
O disposto nos nºs. 1 e 2 do artigo 77º e no artigo 78º apenas foi aplicável a partir do ano escolar de 1990-1991, por força do nº 1 do artigo 138º.

13) Cfr. nota (6) e ponto 6.2., in fine.

14) Sobre este aspecto específico, cfr. parecer nº 24/91, de 17/9/92.

15) Na exposição que vai seguir-se acompanharemos quase textualmente o parecer nº 61/91, publicado no DR, II Série, nº 274, de 26/11/92.
Cfr., também, os recentes pareceres nº 35/93, de 27/1/94, e nº 23/93, de 10/2/94.

16) Sobre a matéria, cfr. KARL LARENZ, Metodologia da Ciência do Direito, 2ª ed., tradução, p.p. 369 e segs. e 399-400; BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 4ª reimpressão, Coimbra, 1990, p.p. 183-188; FRANCESCO FERRARA, Interpreção e Aplicação das Leis, tradução de MANUEL DE ANDRADE, 2ª edi., 1963, p.p. 138 e segs.; JOSÉ OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito, Introdução e Teoria Geral, 4ª ed., Revista Editorial Verbo, 1987, p.p. 345 e segs.; JOÃO DE CASTRO MENDES, Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa 1984, p.p. 252-255.

17) JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, ob. e cit, cits.

18) BAPTISTA MACHADO, ibidem. p. 185.

19) JOSÉ OLIVEIRA ASCENSÃO, JOÃO CASTRO MENDES e FRANCESCO FERRARA, ob.cit. e loc.cit., p.p. 348, 252 e 174, respectivamente.

20) Ob. e loc. cits., págs. 147-148.

21) FRANCESCO FERRARA, ibidem, pág. 149.

22) Esta referência às 35 horas semanais parece surgir um "tanto antecipadamente", de um ponto de vista cronológico (em 1989), pois o horário global semanal do pessoal docente só veio a ser fixado em 35 horas pelo ECD, aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90.
Uma possível explicação para este "desfasamento" residirá, porventura, no facto de o Governo ter, então, em curso uma reforma educativa de alguma envergadura, e de à data da publicação do Decreto-Lei nº 409/89 se encontrar já "em fase de conclusão de negociação com as organizações sindicais de pessoal docente" o ECD que viria a ser aprovado, alguns meses mais tarde, pelo citado Decreto-Lei nº 139-A/90 (cfr. ponto 6.1.).

23) Também aqui o legislador terá sido "influenciado" pelas fórmulas dos Decretos-Leis nº 187/88 (cfr. ponto 4.2.) e nº 353-A/89 (cfr. ponto 4.3.), passando-se "fenómeno" semelhante ao já referenciado na nota (11).

24) Recorde-se que este diploma só veio a ser expressamente revogado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90 (cfr. artigo 6º, nº 2).

25) Alteração que, segundo parece, não terá sido seguida nas Regiões Autónomas (hoje, voltou-se ao procedimento anterior, por força do Despacho transcrito na nota (1)).

26) "Incluindo mesmo, se bem julgamos, os casos de horários incompletos" (acrescenta-se no parecer da Auditoria Jurídica).

27) Se bem pensamos, é também (só) a componente lectiva a determinar se o docente tem ou não um horário (global) completo; assim, se um docente do ensino secundário tem um horário lectivo completo de (20 horas semanais - artigo 77º, nº 3), parece dever entender-se que tem um horário global completo (para este sentido apontava claramente o artigo 3º, nº 1, do Decreto nº 924/76, de 31 de Dezembro, ao dispor que "a hora normal de serviço docente nocturno vale para todos os efeitos hora e meia de serviço docente diurno, considerando-se o horário de quinze tempos nocturnos semanais como horário completo").

28) Cumpre aqui salientar que no parecer da Auditoria Jurídica já se aludia, neste contexto, a certos conflitos "inter-textuais" de que a lei enfermaria, referindo precisamente os artigos 83º e 94º, nº 2 (cfr. ponto 3.2.).

29) Afigura-se não ter qualquer razão de ser a violação do princípio da igualdade apontada na alínea a).
Aliás, o problema por-se-ia, então, logo a propósito do cálculo do valor da hora normal.
Este valor é que é, depois, considerado para efeitos de remuneração do trabalho extraordinário.