Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0710664
Nº Convencional: JTRP00040274
Relator: FERNANDA SOARES
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
CONTRATOS SUCESSIVOS
Nº do Documento: RP200704230710664
Data do Acordão: 04/23/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: LIVRO 92 - FLS. 90.
Área Temática: .
Sumário: A cessação do contrato de trabalho a termo, por motivo não imputável ao trabalhador, impede nova admissão a termo para o mesmo posto de trabalho, antes de decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato, incluindo as suas renovações.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I
B…………………. S.A., foi autuada pela Inspecção Geral do Trabalho por no dia 3.2.06 esta entidade ter verificado que a arguida admitiu ao seu serviço, por contrato de trabalho a termo, C……………….. para o mesmo posto de trabalho antes de decorrido um período de tempo equivalente a 1/3 da duração do contrato, incluindo as suas renovações, após a cessação por motivo não imputável à trabalhadora D……………….. do seu contrato de trabalho a termo, assim lhe imputando uma contra ordenação grave prevista no art.132º nº1 do CT e punida pelo nº2 do art.655º do mesmo diploma legal.
Por decisão final, proferida no processo de contra ordenação que correu termos na Subdelegação do IDICT de Vila Nova de Famalicão, foi aplicado à arguida a coima de € 1.424,00.
A arguida impugnou judicialmente a decisão e o Mmo. Juiz do Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Famalicão, após julgamento, julgou o recurso procedente e absolveu a arguida.
O Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo veio recorrer pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por acórdão que confirme a condenação da arguida, concluindo nos seguintes termos:
1. O contrato a termo não só é formal – exige-se a forma escrita (art.103º nº1 al.c) do CT) -, devendo dele constar os elementos referidos no art.131º, nomeadamente, a actividade contratada.
2. O regime previsto no art.132º nº1 do CT visa obstar à existência de situações fraudulentas e dele resulta que nos casos em que se verifique cessação de contrato de trabalho a termo, por motivo não imputável ao trabalhador, impende sobre o empregador a proibição de nova admissão a termo para o mesmo posto de trabalho, antes de decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato, incluindo as suas renovações.
3. O posto de trabalho considerado para efeitos de aferir se há ou não proibição de nova admissão deve apurar-se a partir: a) do conteúdo do contrato de trabalho (actividade contratada); b) do âmbito das funções que o trabalhador passa a exercer à data da admissão ou no denominado período experimental do contrato de trabalho a termo (já que circunstâncias posteriores ou supervenientes não devem ser levadas em linha de conta, sob pena de, por essa via, poder iludir-se as disposições legais e os fins visados pelo legislador com a previsão deste regime).
4. Resulta que, quer a trabalhadora D……………… (cujo contrato cessou por caducidade em 31.12.2005) quer a trabalhadora C……………… admitida em 10.1.2005 igualmente mediante contrato de trabalho a termo certo, foram admitidas mediante contratos a termo com conteúdo idêntico a saber: com a duração de sete meses; com a categoria de caixeira ajudante do 1ºano; local de trabalho o estabelecimento designado E…………………, sito na Av. …………………; a título principal, as suas funções eram as inerentes à sua categoria, nomeadamente, dar apoio aos clientes, proceder à arrumação e limpeza da loja e do armazém de apoio à loja; fundamento: o motivo da alteração da estratégia comercial da 1ªcontraente, que procedeu a uma reformulação da sua “imagem comercial”, através de uma reestruturação e reorganização das suas lojas de venda ao público e do lançamento de novas colecções e tipos de roupa, razões que justificam e determinam o recurso à contratação da trabalhadora.
5. Nos termos do CCT aplicável (BTE nº20 de 29.5.00 e actualmente BTE nº20 de 29.5.06) caixeira ajudante é a trabalhadora que terminado o período de estágio aguarda a passagem a caixeiro. Tem de ser promovido no período de dois anos.
6. Ou seja, nada impedia que, mantendo-se a necessidade da prestação de trabalho por uma trabalhadora com a categoria de caixeira ajudante, a trabalhadora “dispensada” pudesse desempenhar funções de operadora de caixa.
7. Em termos de matéria de facto nada foi dado como provado que obstasse à renovação do contrato de trabalho a termo da trabalhadora D………………. (e desse modo obstasse à admissão da C………………).
8. Pois os fundamentos para a admissão são os mesmos, sendo que a arguida, com a admissão da trabalhadora C………………. mais não procurou do que ocupar o posto de trabalho da D……………….. (a tal que se tinha revelado displicente) praticando, deste modo, a contra ordenação imputada.
A arguida contra alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
Nesta Relação a Exma. Procuradora Geral Adjunta acompanhou as alegações proferidas pelo MP na 1ªinstãncia.
Admitido o recurso e colhidos os vistos cumpre decidir.
* * *
II
Matéria dada como provada pelo Tribunal a quo.
1. Em 1.6.2005 a arguida celebrou com D…………………… um contrato de trabalho a termo certo, com duração de sete meses.
2. A referida trabalhadora foi admitida para desempenhar as funções inerentes à categoria de caixeira ajudante de 1ºano, incumbindo-lhe ainda proceder à arrumação e limpeza da loja e do armazém de apoio à loja.
3. A trabalhadora D………………. desempenhou as suas funções no estabelecimento da arguida, designado E…………….., sito na Av. ……….. .
4. Em 16.12.2005 a arguida comunicou à trabalhadora D……………… a cessação por caducidade em 31.12.2005 do contrato de trabalho celebrado entre ambas.
5. Em 10.1.2006 a arguida celebrou com C……………… um contrato de trabalho a termo certo, com duração de sete meses.
6. A trabalhadora referida no número anterior foi admitida com a categoria de caixeira ajudante de 1ºano mas para desempenhar, após um período de formação inicial, em que desempenhava também as funções inerentes à categoria de caixeira ajudante, funções de operadora de caixa, funções estas que efectivamente exerce pelo menos desde o mês de Março pp.
7. A trabalhadora C………………. desempenhou e desempenha as suas funções no estabelecimento da arguida, designado E……………, sito na Av. …………………….
8. O motivo justificativo invocado pela arguida para efeito da celebração dos contratos de trabalho a termo referidos em 1 e 5 foi o mesmo, a saber: “alteração da estratégia comercial da primeira contraente, que procedeu a uma reformulação da sua “imagem comercial”, através nomeadamente de uma reestruturação e reorganização das suas lojas de venda ao público e do lançamento de novas colecções e tipos de roupa, razões que justificam e determinam – atenta a incerteza e contingência da viabilidade e do sucesso desta nova estratégia, bem como o acréscimo excepcional de trabalho que este estratégia poderá implicar”.
9. Por carta datada de 9.12.2005 a trabalhadora F………………., que desempenhava as mesmas funções de operadora de caixa, comunicou à arguida a rescisão do seu contrato de trabalho.
10. A época de saldos na loja da arguida em …….. começou no início de Janeiro de 2006.
11. Em meados de Fevereiro de 2006 começaram a chegar á loja de Ribeirão roupas da nova colecção Primavera /Verão, mas só no mês de Março de 2006 é que mudaram a colecção na loja.
12. No mapa de quadro de pessoal relativo ao ano de 2005 a arguida declarou ter tido um volume de negócios de 26.511.820,28 euros.
13. Nos últimos meses de cumprimento do contrato de trabalho, a trabalhadora D…………….. enganava-se por vezes na colocação dos preços nas peças de vestuário.
No ponto 9 da matéria de facto faz-se referência à revogação do contrato de trabalho da trabalhadora F……………….. Para melhor compreensão da situação laboral da referida trabalhadora passa-se a transcrever, na parte que interessa, o teor do contrato de trabalho celebrado entre a referida F……………….. e a arguida (junto a fls.78), bem como o teor da carta de rescisão:
14. Com a data de 3.1.2000 a arguida celebrou com F………………. um contrato de trabalho a termo certo, pelo período de seis meses, tendo a mesma sido admitida para exercer as funções de 3ªcaixeira.O motivo da celebração do contrato foi “um acréscimo temporário da actividade do primeiro outorgante” (a arguida).
15. Com a data de 9.12.2005 a referida F……………… remeteu á arguida carta com o seguinte teor: … “Venho pela presente carta comunicar a minha vontade de rescindir o contrato de trabalho celebrado com V/Ex.as em 3 de Janeiro de 2000, com efeitos a partir da presente data. Informo ainda que pretendo cumprir o aviso prévio devido, nos termos e ao abrigo do Código de Trabalho vigente”.
* * *
III
Questão a apreciar.
Se está provado que a arguida violou o disposto no art.132º nº1 do CT..
Na sentença recorrida concluiu-se, face à matéria dada como provada, que “não é legítimo dizer que a trabalhadora C…………..” …. “foi ocupar o posto de trabalho que fora da trabalhadora D………………. È que nessa ocasião encontravam-se, já então, vagos ou, pelo menos quanto à trabalhadora F……………., em vias de o ser mas que para a arguida já era seguro que tal aconteceria, os postos de trabalho não só da trabalhadora D……………………., mas também da trabalhadora F………………. E sendo assim as coisas, o mais que se pode concluir é que a trabalhadora C……………….. iria exercer funções que ambas aquelas trabalhadoras exerceram mas, pelo menos à míngua de outra factualidade adjuvante, não se vê como se possa asseverar que a trabalhadora por último contratada foi substituir ou apenas uma ou apenas outra das trabalhadoras cujos contratos de trabalho cessaram pela mesma altura”.
O Digno Magistrado do Ministérios Público defende que a matéria provada aponta no sentido de que as trabalhadoras D………………. e C…………………. foram contratadas pelo período de sete meses, com a categoria de caixeiras ajudantes do 1ºano, a exercerem funções no mesmo local, e tendo ambos os contratos a termo precisamente o mesmo fundamento para a sua celebração. Por isso, com a admissão da trabalhadora C…………….. a arguida limitou-se a fazer ocupar o posto de trabalho da trabalhadora D…………………., violando, assim, o prescrito no art.132º nº1 do C. Trabalho. Vejamos então.
Sob a epígrafe “Contratos Sucessivos” dispõe o art.132º nº1 do CT que “a cessação, por motivo não imputável ao trabalhador, de contrato de trabalho a termo impede nova admissão a termo para o mesmo posto de trabalho, antes de decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato, incluindo as suas renovações”.
A citada disposição legal proíbe a celebração de sucessivos contratos de trabalho a termo para o mesmo posto de trabalho, quer seja com o mesmo trabalhador (nº3 da citada disposição legal), quer seja com outro.
Quando a lei fala em “posto de trabalho” está a referir-se às funções que o trabalhador exerce e para as quais foi contratado e cuja menção deve constar do contrato de trabalho a termo – art.131º nº1 al.b) do CT.. Por isso, no caso em apreço, importa averiguar se as trabalhadoras D………………. e C…………………. foram contratadas para exercer funções a que corresponde o mesmo posto de trabalho.
E a resposta terá de ser afirmativa tendo em conta que em ambos os contratos de trabalho a termo a arguida fez constar que ambas as trabalhadoras eram admitidas para exercer as funções de “caixeira ajudante de 1ºano” – e que na verdade exerceram –, sendo que a trabalhadora C……………. só mais tarde passou a exercer as funções de operadora de caixa (nº6 da matéria provada). Acresce que a trabalhadora que exercia as funções de operadora de caixa, a F…………………., estava vinculada à arguida por contrato de trabalho por tempo indeterminado. Logo, se a trabalhadora C……………. tivesse ido substituir a trabalhadora F…………….. (ocupando o seu posto de trabalho), não se compreende, nem se alcança o motivo para a celebração de contrato de trabalho a termo quando as funções de operador de caixa estavam a ser exercidas mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado. Ou seja, se a trabalhadora C………………… foi contratada para substituir a trabalhadora F……………… (exercendo as funções de operadora de caixa) – o que aliás não está provado – então, deveria ter sido celebrado com ela um contrato de trabalho por tempo indeterminado. E mesmo admitindo, por mera hipótese, que a contratação da trabalhadora C………………. poderia ter sido feita por contrato a termo (para substituir aquela operadora F…………….), então, esse motivo deveria constar expressamente do contrato, e não consta.
Por isso, e com o devido respeito, não acompanhamos a conclusão do Mmo. Juiz a quo quando refere que “não se vê como se possa asseverar que a trabalhadora por último contratada foi substituir ou apenas uma ou apenas outra das trabalhadoras cujos contratos de trabalho cessam pela mesma altura”, na medida em que se desconhece quando cessou o contrato de trabalho da F…………….. (a carta de rescisão está datada de 9.12.05 mas não se sabe se ela concedeu à entidade patronal o aviso prévio de 60 dias a que estaria obrigada nos termos do art.447º nº1 do CT., a significar que o seu contrato de trabalho só terminaria em 7.2.06).
E provado que a trabalhadora C………………. foi contratada para exercer as mesmas funções que a anterior trabalhadora – a D……………….. – e porque entre a data da cessação do contrato desta última (31.12.05) e a contratação daquela (10.1.06) decorreu menos de dois meses, há que concluir que a arguida violou o disposto no art.132º nº1 do CT..
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Termos em que se julga o recurso procedente, se revoga a sentença recorrida, e se substitui pelo presente acórdão, confirmando-se a decisão administrativa que aplicou à arguida a coima de € 1.424,00.
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Custas pela arguida. Taxa de justiça: 5 UCs.
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Porto, 23 de Abril de 2007
Maria Fernanda Pereira Soares
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
Domingos José de Morais