Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00040769 | ||
Relator: | ATAÍDE DAS NEVES | ||
Descritores: | EXPEDIENTE DILATÓRIO EXAME PERICIAL JUNÇÃO DE DISCO DO TACÓGRAFO | ||
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Nº do Documento: | RP200710250733634 | ||
Data do Acordão: | 10/25/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Indicações Eventuais: | LIVRO 734 - FLS. 221. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I – Por expediente dilatório deve entender-se o desonestamente usado pela parte, sem intuito sério ou construtivo, sem cabimento processual, que visa apenas torpedear e retardar o prosseguimento da acção, entorpecer a sua normal tramitação e a realização da justiça. II – Não consubstancia expediente dilatório o requerimento em que as AA. pedem a realização de exame pericial – que implica conhecimentos técnicos sofisticados – ao disco do tacógrafo – por si, então, junto aos autos – do veículo pesado interveniente no acidente de viação de que resultou a morte imediata do seu marido e pai e condutor do veículo ligeiro envolvido no acidente, sem que prova tenha sido feita da velocidade a que aquele, então, circulava. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Cível do tribunal da Relação do Porto B………………….., viúva, C………………., solteira, e D………………..., solteira, todas residentes na Rua…….., nº….., Freguesia de ………, Vila Nova de Famalicão, instauraram no Tribunal de Círculo de Vila Nova de Famalicão, onde foi distribuída ao ….º Juízo Cível sob o nº ……./2002, a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra a E……………, S.A., com sede na Rua……., torre…., …., Lisboa, pedindo a condenação da Ré a pagar a todas as AA., solidariamente, o quantitativo de esc. 7.000.000$00; à A. B………….., o quantitativo de esc. 18.840.000$00; e a cada uma das autoras C………………. e D………………., o quantitativo de esc. 3.000.000$00; a título de indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelas mesmas com o acidente; e com a actualização dos quantitativos indemnizatórios à data da prolação da respectiva sentença de mérito. Alegou em síntese que em virtude de acidente de viação provocado pelo condutor do veículo segurado na Ré, veio a falecer o marido e pai das AA., pelo que as mesmas sofreram variados danos patrimoniais e não patrimoniais que pretendem ver indemnizados. Contestou a Ré, impugnando por desconhecimento as circunstâncias e consequências do acidente. A fls. 43 a 47, veio o Instituto de Solidariedade e Segurança Social, deduzir pedido de reembolso de prestações de Segurança Social, no montante de esc. 1.355.920$00. Contestou a Ré tal pedido de reembolso, impugnando os factos alegados e invocando a inexistência de qualquer sub-rogação nos direitos do lesado. Replicou o ISSS, pedindo que se julgue improcedente a excepção invocada. Foi proferido despacho saneador, mais se fixando os factos assentes e a base instrutória. A fls. 133 e segs. veio o réu apresentar articulado superveniente, que veio a ser admitido por despacho de fls. 166 e ss. e na sequência do que foram aditados quesitos à base instrutória. Pelo requerimento de fls. 204 vieram as AA. requerer a realização de exame pericial ao disco do tacógrafo por si junto aos autos, uma vez que, alegam, do seu exame macroscópico podem resultar dúvidas inconciliáveis com a descoberta da verdade material. Sobre este requerimento foi proferido o seguinte despacho a fls. 226: “Fls.204 – Indefiro o requerido, uma vez que tal perícia é intempestiva e dilatória, e aquilo que os AA. pretendem pode perfeitamente ser comprovado ou não através de prova testemunhal, nomeadamente através da pessoa que conduzia o veículo automóvel, pois que os mesmos encontravam-se aptos a “lerem” o tacógrafo”. I – DO AGRAVO Inconformadas com este despacho, as AA. interpuseram o correspondente agravo para este Tribunal, concluindo as suas alegações nos termos seguintes: 1 – A requerida perícia ao disco do tacógrafo deveria ter sido deferida; 2 – O requerimento das AA. não é extemporâneo nem dilatório; 3 – Pode ser formulado até ao encerramento da audiência de julgamento; 4 – É essencial, ou, pelo menos, de grande importância para a descoberta da verdade; 5 – As testemunhas e o segurado da Ré, condutor do pesado EL não têm capacidade para lerem o gráfico de tal disco; 6 – As primeiras são cidadãos comuns, sem qualquer experiência na matéria e o segundo, para além de leigo na matéria, não vai agir contra ele próprio, já que é arguido em processo crime que, ainda corre termos e profissionalmente poderia ser sancionado; 7 – A leitura do disco do tacógrafo exige técnico, ou instituição, especializada e credível; 8 – É essencial para determinar a velocidade a que o condutor do pesado seguia e apurar a sua responsabilidade; 9 – Nos acidentes de viação o excesso de velocidade, especialmente dentro de localidades, é um factor importante a levar em conta; 10 – O excesso de velocidade do pesado está alegado e o croquis elaborado pela GNR parece claro; 11 – Impõe-se, assim, que se proceda à requerida perícia; 12 – Esta exigência constitui, com o devido respeito, um poder-dever do tribunal, atento o disposto no art. 535º nº 1 do CPC. 13 – O despacho recorrido violou as normas dos art. 156º e 535º nº 2 do CPC. Termina no sentido da revogação do despacho recorrido e sua substituição por outro que admita a prova pericial requerida. Não foram oferecidas contra-alegações. Procedeu-se a julgamento, sendo pelo ISSS ampliado o pedido para a quantia de € 19.941,13, ampliação essa que foi admitida. Foi realizada a audiência de julgamento, vindo a matéria de facto constante da base instrutória a ser decidida nos termos do despacho de fls. 453 e segs., que não foi alvo de qualquer censura, após o que foi proferida sentença que, imputando a culpa do acidente ao próprio sinistrados, julgou a acção inteiramente improcedente, absolvendo a Ré do pedido. Inconformadas, as AA. vieram apelar para este Tribunal, oferecendo as suas alegações, que terminam com as seguintes conclusões: 1- Perante a matéria dada como provada e que atrás enunciamos, a culpa da verificação do acidente foi do condutor do pesado EL; 2- Ou então, perante tal matéria, fotos, croquis e demais elementos de prova dos autos, pelo menos, também, foi de tal condutor; 3- O local onde o acidente se verificou é de extrema perigosidade; 4- Constitui uma longa recta, na qual, a cerca de 300 metros de distância da curva onde apareceu a circular o pesado EL, existe uma placa limitadora de velocidade a 50 Km/horários; 5- Onde aparecem dois traços de linha descontínua a permitirem a inversão de marcha em qualquer sentido da estrada; 6- Uma área de serviço do lado direito, atento o sentido Famalicão/Braga em que seguia o camião; 7- E uma zona em elipse, barrada, com interrupção da linha descontínua, a admitir, ali, também, a inversão de marcha, principalmente, de qualquer viatura que saia da área de serviço e pretenda passar a circular de Braga para Famalicão; 8- Este local, assim, extremamente, sensível, é do inteiro conhecimento do condutor do pesado EL, que ali passava frequentemente; 9- Como tal, impunham-se-lhe cuidados redobrados; 10- O camião EL é um pesado de mercadorias, que vinha carregado e com atrelado, pesando tudo mais de 40 toneladas; 11- Com deficiência de travões, atento o facto da travagem ter incidido só sobre a roda direita traseira do atrelado, como o demonstra o croquis da G. N. R.; 12- Com excesso de velocidade de grande significado para a segurança da sua circulação; 13- Circulava a mais de 80 Km/horários, atentos os depoimentos das testemunhas já indicadas, a travagem expressa no croquis e disco do tacógrafo; 14- Tal excesso de velocidade desgovernou a sua marcha; 15- E levou-o a sair da sua mão de trânsito, passar para a hemi-faixa de rodagem contrária e a colher a viatura da pobre vítima; 16- A derrapagem de mais de 49 metros e a distância entre o ponto do embate e o ponto da sua imobilização, 64 metros como o demonstra o croquis, são prova plena desse excesso de velocidade; 17- O arrastamento da viatura ligeira da pobre vítima, à frente do camião, implicou uma ajuda à travagem deste de mais quatro pneus atravessados na via e com forte resistência ao asfalto e mesmo assim foram necessários 64 metros e um muro para parar; 18- A falta de cuidado do condutor do pesado EL e este excesso de velocidade foram a causa directa do acidente; 19- A causa exclusiva das terríveis consequências do acidente e, por isso, da morte do marido e pai das autoras; 20- A Meretíssima Juiz “a quo” ao não valorar tais elementos, com o devido respeito, cometeu um erro de justiça; 21- Ao não deferir o exame pericial ao disco do tacógrafo para uma melhor aferição do excesso de velocidade do pesado EL, cometeu um grave erro de justiça e, por conseguinte, do ponto de vista legal, uma nulidade insuprível que torna a sentença nula, já que o apuramento de tal elemento era de grande importância para a descoberta da verdade material; 22- Com a devida vénia, pensamos que a forma indutora de respostas como decorreu a instância da ré em pleno julgamento, contribuiu para o equívoco da Meretíssima Juiz “a quo” e, consequentemente, para a improcedência total da acção; 23- A, douta, sentença deverá ser revogada, pelo menos, parcialmente, co-responsabilizando o condutor do pesado EL nas causa e consequências do acidente. - A nosso ver, violou a, douta, sentença recorrida, entre outras, as normas dos art. 265º, nº 3; 659º, nº 3 e 668º, nº 1, alínea d), todas do C. P. Civil. A factualidade decorrente do depoimento das testemunhas F………………..; G……………….; H………………. e do próprio condutor do EL, I…………………, respectivamente, gravadas nas cassetes 321, lado A, de rotações 0 até ao fim; 321, lado B, de rotações 0 até ao fim e cassete 322, lado A, de rotações 0 até 225; 330, lado B, de rotações 4698 até ao fim e na cassete 331, lado A, de rotações 0 até 4037 e 340, lado A, de rotações 2916 até ao fim e no lado B, de rotações 0 até 2513; as fotos juntas aos autos, o croquis da G.N.R. e o próprio disco do tacógrafo junto aos mesmos autos, deveriam ter produzido sentença contrária àquela, doutamente, produzida, dando a acção, pelo menos, em parte, procedente, por provada, com a co-responsabilização do condutor do pesado EL e, assim, respostas positivas aos quesitos nºs 7; 10; 11, quanto a 49 metros; 14, quanto a, pelo menos, 80/90 Km/horários e 18, da Base Instrutória. O ISSS aderiu ao recurso das AA., enquanto o Fundo de garantia Automóvel contra-alegou, pugnando pela manutenção do julgado. Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir, tendo presente que o recurso é balizado pelas conclusões das alegações, estando vedado ao tribunal apreciar e conhecer de matérias que naquelas se não encontrem incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso (art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3 do CPC), acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido. Reunamos a matéria de facto que foi considerada provada: 1) O proprietário da viatura pesada de mercadorias, de matrícula ..-.. -EL, à data do acidente, tinha transferido para a ré a responsabilidade civil decorrente de acidentes de viação causados por esta viatura a terceiros, através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 47187/47190. 2) No dia 15 de Dezembro de 1999, pelas 12.30 horas, na EN nº 14, no Lugar da………, …………, ………, Vila Nova de Famalicão, próximo da estação de serviço ESSO, ocorreu um acidente de viação. 3) Entre a viatura ligeira de passageiros de marca Renault Clio, de matrícula QX-..-.., propriedade do falecido marido da autora B…………….. e pai das autoras C…………………. e D……………, J……………., que a conduzia, e a viatura pesada de mercadorias de matrícula ..-.. -EL. 4) Propriedade de L…………….., na altura conduzido pelo seu empregado I……………... 5) À data da verificação do acidente o tempo estava bom. 6) A visibilidade era óptima. 7) A estrada configurava e configura, uma recta com, cerca de, 600/700 m de comprimento e 7 m e 50 cm, de largura, aproximadamente. 8) Com o piso em asfalto e em bom estado. 9) Nas circunstâncias de tempo e local atrás descritas, encontrava-se o QX estacionado num pequeno parque, contíguo a Sul à Estação de Serviço ESSO, situada do lado direito atento o sentido Vila Nova de Famalicão/Braga. 10) Como o seu condutor pretendesse dirigir-se para a sua residência ao lugar da Igreja, da freguesia de Jesufrei, deste concelho, e, assim, atravessar a estrada em causa, para tomar o sentido Braga/V.N. de Famalicão, colocou-o em marcha, parou junto da berma daquele lado direito da dita estrada (atento o sentido de marcha Famalicão-Braga). 11) E avançou para o eixo da via, onde no solo existe, desenhada, uma faixa separadora, das hemi-faixas de rodagem, com a configuração de uma elipse, com, cerca de 80 metros de extensão, por cerca de 3 metros de eixo menor. 12) Quando se encontrava em cima da faixa separadora, foi embatido pelo EL, no seu lado esquerdo. 13) Que o arrastou à sua frente, cerca de 40 metros. 14) E o foi esmagar completamente contra o muro existente do lado direito da faixa de rodagem atento o sentido Famalicão/Braga, destruindo-o totalmente. 15) E causando a morte instantânea ao seu condutor. 16) O condutor do EL circulava a mais de 60 Km/h. 17) E onde existem sinais de velocidade condicionada aos 50 Km/horários. 18) O condutor do EL avistou o veículo QX a cerca de 300 metros. 19) Como consequência directa e necessária do descrito acidente, o QX ficou completamente destruído e, por isso, irrecuperável 20) O condutor do QX teve morte imediata. 21) O condutor do QX, à data do acidente, tinha 53 anos. 22) Com a tragédia da repentina morte de seu marido e pai, as autoras sofreram um enorme desgosto, angústia e depressão. 23) O condutor do QX era uma pessoa saudável. 24) As autoras não puderam ver o seu ente mais querido, tal foi o terrível estado físico em que ficou. 25) A autora viúva sofre de artrose do ombro esquerdo e patologia degenerativa da coluna vertebral, estando diminuída funcionalmente, e necessitando de executar esforços acrescidos. 26) A autora viúva despende dinheiro em médicos e medicamentos. 27) O seu vencimento, na altura do acidente, ao serviço da firma “M…………….”, com sede na freguesia de…………., do concelho de Barcelos, era tão só de Esc. 68.000$00 por mês. 28) O marido da autora, à data do acidente, embora desempregado, auferia a quantia de 61.300$00 mensais de uma bolsa, acrescidos de esc. 625$00 diários de subsídio de refeição. 29) O falecido marido da autora contribuía mensalmente com a quantia de esc. 60.000$00. 30) ... e frequentava um curso de formação profissional. 31) O QX, embora fosse do ano de 1991, estava em óptimo estado. 32) Em consequência do acidente, o Centro Nacional de Pensões, a título de subsídio de morte de J…………., pagou a quantia de 510.140$00. 33) ... e 845.780$00 a título de pensões de sobrevivência entre o período 2001/01 e 2001/07. 34) O Centro Nacional de Pensões pagou pensões de sobrevivência no período de Janeiro de 2000 a Setembro de 2005, no total de € 16.514,15, à autora B…………….., sendo o valor mensal actual de € 216,86. APRECIANDO: I – DO AGRAVO Com acima ficou referido, as AA. requereram diligência pericial ao disco do tacógrafo do pesado EL por si junto aos autos a fls. 17 dos autos, com vista a fazerem prova da velocidade de que pesado vinha animado na altura do embate. Tendo alegado que o dito camião circulava então a 100 Km/hora, fora este facto quesitado sob o nº 14 da base instrutória. Como é sabido, no nosso sistema processual, apesar de gizado ante o princípio do dispositivo, segundo o qual o tribunal tem sempre de cingir-se apenas aos factos fundamentais alegados pelas partes, que têm o ónus da afirmação, o juiz goza do poder de realizar directamente ou ordenar oficiosamente todas as diligências necessárias ao descobrimento da verdade, existindo a livre iniciativa do juiz em matéria instrutória. O lado activo de tais poderes de instrução encontram-se retratados no artigo 265º nº 3 do CPC, que concede ao julgador a prerrogativa de realização directa de todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade. A segunda face dos poderes instrutórios do juiz (a que Alberto dos reis deu o nome de poder de disciplina) vem descrita no nº 1 do dito art. 265º do CPC, por força do qual “cumpre ao juiz… providenciar pelo andamento regular e célere do processo, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção ou recusando o que for impertinente ou meramente dilatório”. A nota fundamental deste preceito reside no poder conferido ao juiz de se opor à execução de diligências meramente dilatórias ou impertinentes, cujo único fim ou resultado seja o retardamento do processo, ou seja de reconhecer ao juiz o poder-dever de separar o trigo do joio nas próprias diligências requeridas pelas partes. De realçar, também subjacente ao dito preceito, o poder de direcção da causa do juiz, cabendo-lhe não apenas despachar e sentenciar, mas também assegurar a necessária prontidão da justiça, removendo os obstáculos que se oponham ao regular andamento da causa. (1) É com o fim de assegurar a conveniente eficácia dos poderes do juiz ligados à concepção publicística do processo que a lei impõe, tanto às partes como a terceiros, o dever de colaboração no descobrimento da verdade. O legislador da redacção vigente do Código de Processo Civil consagrou, como princípio angular e exponencial do processo civil, o da cooperação, de forma a propiciar que todos os intervenientes processuais cooperem entre si de molde a alcançar-se de uma forma expedita e eficaz, a justiça do caso concreto, transformando-se, dessa forma, o processo civil numa "comunidade de trabalho", com a consequente responsabilidade das partes e do tribunal pelo resultado da actividade pelos mesmos desenvolvida.(2) Este dever encontra eco no princípio da cooperação plasmado no art. 266º do CPC, que afirma aos agentes judiciários (magistrados, mandatários judiciais e as próprias partes) o dever de cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio. Este dever de cooperação abrange também terceiros alheios à lide processual, encontrando especial ressonância no art. 519º do CPC, segundo o qual todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os actos que forem determinados (nº 1). Do que vem exposto, resulta que o tribunal pode e deve, por sua iniciativa ou mediante a sugestão de qualquer das partes ordenar diligências probatórias para o esclarecimento da verdade, sempre que haja a razão superior da boa instrução do processo. Sugerindo uma das partes ao juiz que ordene a realização de diligência pericial, impõe-se ao julgador, para além da audição da parte contrária, a avaliação prévia da pertinência de tal diligência, quer em termos substantivos, por força da necessária correlação com a matéria de facto controvertida, quer em termos adjectivos, tocantes aos meios de acesso ou aquisição dos meios probatórios requeridos, e concernentes à dimensão eventualmente dilatória da diligência. O Senhor Juiz, reputando de dilatória e extemporânea a diligência probatória requerida e considerando que o desiderato pretendido com a mesma pode ser alcançado com a prova testemunhal arrolada, designadamente o condutor do pesado em causa, indeferiu a perícia requerida. O agravo mantém a sua utilidade, uma vez que aquele quesito não resultou inteiramente provado, apenas que o pesado circulava a mais de 60 Km/hora, mais se entendendo na sentença proferida que essa velocidade, apesar de objectivamente irregular ou contravencional, não foi causal do acidente. É, pois, natural que, a provar-se que o pesado circulava à alegada velocidade de 100 Km/hora ou outra concretamente superior à que resultou vagamente apurada da audiência de julgamento, onde nenhum perito se pronunciou sobre o disco do tacógrafo, se possa (eventualmente) concluir no sentido da culpabilidade (total ou parcial) do condutor do pesado em causa. Mal andou o Senhor Juiz ao indeferir a diligência, como veremos: Tacógrafo é um dispositivo empregado em veículos para monitorar o tempo de uso e a velocidade que desenvolveu. Foi criado por Max Maria von Weber, sendo aplicado inicialmente em trens. Utiliza um disco de papel para registrar as informações, sendo que cada disco pode registrar a informação de um dia, uma semana ou outro período de tempo conforme o ajuste do aparelho. Muito utilizado por empresas de transporte, assegura que os motoristas cumpram os tempos máximos legais de condução, ajudando também a evitar multas por excesso de velocidade, uma vez que regista a velocidade desenvolvida durante os trajectos percorridos. Vários países tornaram o uso do tacógrafo obrigatório em veículos de transportadoras por exigência de sindicatos.
Daí que venha sendo implementado em Portugal o tacógrafo digital, com utilização de smart cards, impedindo adulterações nos registros, sistema muito mais muito robusto e seguro que o tradicional analógico, com funcionalidades de que este não dispõem, cuja utilização passou a ser obrigatória desde 1 de Maio de 2006(3) nos novos veículos pesados de mercadorias e passageiros (medida que surge no âmbito do novo pacote legislativo que abrange o Regulamento CE nº 561/2006(4) e a Directiva 2006/22/CE(5)), já em plena utilização na generalidade dos Países da Comunidade Europeia, de muito mais fácil e rigorosa análise e elaboração do correspondente relatório e menos susceptível a manipulações ou falsificações que as empresas e muitas vezes os próprios camionistas conseguem realizar, bem conhecidas do sector dos transportes pesados e também das entidades inspectivas que laboram no mesmo, fazendo também parte dos próprios manuais de formação.
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