Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | PEDRO VAZ PATO | ||
Descritores: | DIFAMAÇÃO CARTA ROGATÓRIA LEI DE IMPRENSA CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP2014031211315/10.0TDLSB.P1 | ||
Data do Acordão: | 03/12/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - O Tribunal não está vinculado à aceitação de um qualquer requerimento de inquirição de testemunhas por carta rogatória. Esta inquirição está sujeita a critérios de excecionalidade e de necessidade estrita. Resulta do nº 3 do artigo 230º do CPP que só será de admitir a expedição de cartas rogatórias quando se entender que são necessárias para a prova de algum facto essencial para a acusação ou para a defesa. II - A agravação da moldura da pena decorrente do nº 2 do artigo 182º do Cód. Penal não é inconstitucional por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade. III - Para que se considere provada a causa de justificação prevista no nº 2 do artigo 180º do Código Penal não basta que o jornalista alegue que se baseou em fontes fidedignas sem as identificar. IV - O facto de, nesse caso, o jornalista não beneficiar dessa causa de justificação não é contrário ao respeito pelo seu direito e dever de sigilo profissional. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Proc. nº 11315/10.0TDLSB.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I 1. – B… e C… vieram interpor recurso do despacho proferido nestes autos a 8 de fevereiro de 2013, que indeferiu a requerida inquirição por carta rogatória de testemunhas por elas indicadas. As conclusões da motivação do recurso são, em síntese, as seguintes: - O despacho recorrido é nulo por falta de fundamentação (artigos 120º, 121º, 374º e 379º, nº 1, do Código de Processo Penal). - Para que as arguidas possam defender os seus direitos e interesses e exercer o princípio do contraditório nos presentes autos, é de extrema importância a inquirição das testemunhas por ela indicadas em sede de contestação, porquanto elas têm conhecimento direto de factos essenciais à descoberta da verdade. - A relevância da inquirição destas testemunhas prende-se com o facto de só desta forma poderem as arguidas demonstrar a boa fé e a veracidade das fontes, factos que de outra forma não resultarão provados. - Foi violado o artigo 32º, nº 1, da Constituição («o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa»). - Foi violado o disposto no artigo 318º do Código de Processo Penal. - Foi violado o disposto no artigo 340º do mesmo Código (preceito que vale, por interpretação extensiva para apreciação da prova requerida antes e fora da audiência de julgamento, designadamente na contestação). - É do conhecimento geral o recurso a cartas rogatórias em processos como os dos casos “Cova da Beira” e “Freeport”, não colhendo o argumento de que tal contrariaria os princípios da imediação e contraditório que regem o processo penal português. O Ministério Público junto do Tribunal da primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso. A assistente também apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso. O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, reiterando a posição assumida pelo Ministério Público junto do Tribunal da primeira instância. Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir. 2. As questões que importa decidir são, de acordo com a motivação do recurso, por um lado, a de saber se o despacho recorrido é nulo, por falta de fundamentação, e, por outro lado, a de saber se deve, ou não, ser admitida a requerida inquirição de testemunhas por carta rogatória. 3. – É o seguinte o teor do despacho recorrido: «Requereram as arguidas, na sua contestação, a inquirição por carta rogatória das testemunhas D… e E…, residentes, respectivamente, em … (Natal) e Fortaleza, ambos no Brasil e F…, residente em Moçambique. Sucede, no entanto, que segundo se entende, não se poderá deferir o requerido uma vez que a estrutura penal e processual portuguesa não é harmonizável com a dos referidos países, sendo certo que o sistema português exige a observância dos princípios da imediação, a gravação da prova e a colocação de questões por todos os advogados intervenientes, em obediência ao princípio do contraditório. Assim sendo, caso exista interesse relevante para a boa decisão da causa na tomada de declarações às testemunhas supra indicadas, entende-se que o mesmo só poderá ser alcançado através do sistema de videoconferência ou com a apresentação das referidas testemunhas em julgamento. Pelo exposto, e porque se entende que a inquirição das testemunhas por carta rogatória não se mostra legalmente adequada a assegurar os princípios processuais vigentes no nosso ordenamento jurídico, indefere-se o requerido. Por outro lado, uma vez que o funcionamento do sistema de videoconferência depende da colaboração dos países acima referidos (Brasil e Moçambique), vão os autos com vista à Srª Procuradora – Coordenadora, para informar os mesmos sobre a viabilidade de tal inquirição.» 4.1. – Cumpre decidir. Vêm as arguidas e recorrentes alegar que o despacho recorrido é nulo, por falta de fundamentação, invocando o disposto nos artigos 120º, 121º, 374º e 379º, nº 1, do Código de Processo Penal. Estes preceitos são, porém, aplicáveis à sentença, não aos despachos. Nos termos do artigo 97º, nº 5, do Código de Processo Penal, os atos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão. A falta desta fundamentação só acarreta nulidade quando a lei o determine expressamente (ver artigo 118º, nº 1, do Código de Processo Penal), o que não se verifica neste caso. Poderíamos estar, assim, perante uma irregularidade (nº 2 desse mesmo artigo 118º). De qualquer modo, é evidente que o despacho recorrido está fundamentado. Tanto assim é que as arguidas e recorrentes contestam essa fundamentação, e com base nessa contestação motivam o recurso em apreço. Deverá, pois, ser negado provimento ao recurso quanto a este aspeto. 4. 2. - Vêm as arguidas e recorrentes alegar, por outro lado, que ao indeferir o seu requerimento de inquirição de testemunhas por carta rogatória, o despacho recorrido violou as suas garantias constitucionais de defesa e o disposto nos artigos 318º e 340º do Código de Processo Penal. Vejamos. O despacho recorrido é, na verdade, merecedor de reparo quando invoca os princípios da imediação e do contraditório para recusar, sem mais, inquirições de testemunhas por carta rogatória. O recurso a este meio está previsto nos artigos 230º e seguintes do Código de Processo Penal, tal como no artigo 152º da Lei nº 144/99, de 31 de agosto (Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal) e no artigo 1º, nº 2, d) da Convenção de Auxílio Judiciário em Matéria Penal entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, aprovada pela Resolução da Assembleia da República nº 46/2008, de 12 de setembro (aplicável ao caso em apreço, pois o Brasil e Moçambique são partes desta Convenção). Também é merecedora de reparo a afirmação, constante do despacho recorrido, de que a estrutura do processo penal do Brasil e de Moçambique não é harmonizável com a do processo penal português. Se assim fosse, não se compreenderia, além do mais, a aludida Convenção. O que poderá dizer-se é que os princípios da imediação, da oralidade e do contraditório levam a preferir a inquirição de testemunhas por videoconferência (neste aspeto, terá razão o Tribunal a quo ao diligenciar neste sentido) a essa inquirição por carta rogatória; mas o recurso a esta não está excluído quando a videoconferência não for possível (ver, neste sentido, o acórdão da Relação de Guimarães de 12 de junho de 2012, processo nº 1124/10.1TBGMR-G.G1, relatado por Espinheira Baltar, in www.dgsi.pt). No entanto, o Tribunal não está vinculado à aceitação de um qualquer requerimento de inquirição de testemunhas por carta rogatória. Esta inquirição, também em razão de exigências de celeridade processual, está sujeita a critérios de excecionalidade e de necessidade estrita. Resulta do nº 3 do artigo 230º do Código de Processo Penal que só será de admitir a expedição de cartas rogatórias quando se entender que são necessárias para a prova de algum facto essencial para a acusação ou para a defesa (ver, neste sentido, o acórdão desta Relação de 24 de setembro de 1997, in C.J., XXII, IV, p. 238; e o acórdão da Relação de Lisboa de 12 de janeiro de 1994, proc. nº 0325733, relatado por Leonardo Dias, in www.dgsi.pt). Alegam as arguidas e recorrentes que a inquirição das testemunhas em causa é essencial para a prova da veracidade da imputação de que são acusadas, ou da sua boa fé quanto a tal veracidade. A prova destes factos é, na verdade, essencial à defesa. Mas para o Tribunal concluir que uma inquirição de testemunhas é essencial à defesa, não basta que isso seja alegado, é necessário que tal resulta de algum outro elemento. Ora, no caso em apreço as arguidas afirmam que as testemunhas em causa deveriam ser inquiridas à matéria dos artigos 42º, 44º, 45º, 65º, 66º e 67º da contestação. Dos factos alegados nestes artigos tem relevo essencial para a defesa das arguidas, não certamente o que diga respeito a outras namoradas de G…, mas apenas o facto de ser verdade que a assistente trabalhou num local de diversão noturna, denominado “H…” e sito no Porto. Ora, não se consegue vislumbrar por que motivo a prova deste facto, relativo a factos ocorridos em Portugal e normalmente do conhecimento de várias pessoas, há de depender da inquirição de três testemunhas residentes no Brasil e em Moçambique, e não de uma qualquer outra testemunha residente em Portugal. Assim, não estão reunidos os requisitos que permitam deferir o requerimento, apresentado pelas arguidas, de inquirição por carta rogatória de testemunhas por esta indicadas. Deverá, pois, ser negado, provimento a este recurso. Cada uma das arguidas deverá ser condenada em taxa de justiça (artigo 513º, nº 1, do Código de Processo Penal e Tabela anexa ao Regulamento das Custas Processuais) 5. – Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento a este recurso, mantendo o despacho recorrido. Condenam cada uma das arguidas em 3 U.C.s de taxa de justiça. II 1. Vêm as arguidas também interpor recurso do despacho proferido durante a audiência de discussão e julgamento, a 4 de junho de 2013, que indeferiu o requerimento de inquirição das mesmas testemunhas (F…, D… e E…) por videoconferência. Da motivação deste recurso constam, em síntese, as seguintes conclusões: - O despacho recorrido é nulo por falta de fundamentação (artigos 97º, nº 5, 120º, 121º, 374º e 379º, nº 1, do Código de Processo Penal). - Ao indeferir a inquirição das testemunhas referidas por videoconferência, não possibilitou a Mmª Juiz a quo que as recorrentes assegurassem os seus direitos de defesa, impedindo-as de fazer prova dos fundamentos sérios e credíveis que as levaram a publicar a notícia que deu origem aos presente processo. - Tais testemunhas têm conhecimento direto de factos essenciais para a descoberta da verdade material. - Foi violado o artigo 32º, nº 1, da Constituição («o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa»). - Foi violado o disposto no artigo 318º do Código de Processo Penal. - Foi violado o disposto no artigo 340º do mesmo Código. - Por ter sido violado este artigo, foi cometida a nulidade prevista no artigo 120º, nº 2, d), do mesmo Código, o que invalida ao atos processuais subsequentes. O Ministério Público junto do Tribunal da primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso. O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, reiterando a posição assumida pelo Ministério Público junto do Tribunal da primeira instância. Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir. 2. As questões que importa decidir são, de acordo com a motivação do recurso, por um lado, a de saber se o despacho recorrido é nulo, por falta de fundamentação, e, por outro lado, a de saber se deve, ou não, ser admitida a requerida inquirição de testemunhas por videoconferência. 3. – É o seguinte o teor do despacho recorrido: «Por outro lado, no que concerne à inquirição das testemunhas F…, D… e E…, uma vez que quanto à sua inquirição por carta rogatória foi interposto recurso e não se mostra possível a sua inquirição por videoconferência e as mesmas não foram apresentadas em julgamento, indefere-se a requerida inquirição» 4.1. – Cumpre decidir. Vêm as arguidas e recorrentes alegar que o despacho recorrido é nulo, por falta de fundamentação, invocando o disposto nos artigos 97º, nº 5, 120º, 121º, 374º e 379º, nº 1, do Código de Processo Penal. À exceção do primeiro, estes preceitos são, porém, como acima se afirmou a propósito do recurso anteriormente apreciado, aplicáveis à sentença, não aos despachos. Vale aqui o que também acima de disse. Nos termos do artigo 97º, nº 5, do Código de Processo Penal, os atos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão. A falta desta fundamentação só acarreta nulidade quando a lei o determine expressamente (ver artigo 118º, nº 1, do Código de Processo Penal), o que não se verifica neste caso. Poderíamos estar, assim, perante uma irregularidade (nº 2 desse mesmo artigo 118º). Nos termos do artigo 123º, nº 1, do Código de Processo Penal, qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio ato, quando estes a ele tiverem assistido. As recorrentes não arguiram esta eventual irregularidade, sendo que o despacho em causa foi proferido em audiência e na presença do seu ilustre mandatário (ver fls. 814 a 817). Impõe-se considerar sanada a eventual irregularidade em causa Deverá, pois, ser negado provimento ao recurso quanto a este aspeto. 4. 2. - Vêm as arguidas e recorrentes alegar, por outro lado, que ao indeferir o seu requerimento de inquirição de testemunhas residentes no Brasil e em Moçambique por videoconferência violou as suas garantias constitucionais de defesa e o disposto nos artigos 318º e 340º do Código de Processo Penal. Vejamos. A inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro por videoconferência está prevista no artigo 145º, nº 3, da acima referida Lei nº 144/99 de 31 de agosto (Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal) e no artigo 1º, nº 3, da também acima referida Convenção de Auxílio Judiciário em Matéria Penal entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, aprovada pela Resolução da Assembleia da República nº 46/2008, de 12 de setembro (aplicável ao caso em apreço, pois o Brasil e Moçambique são partes desta Convenção). Nos termos destes preceitos, o recurso à videoconferência está, porém, condicionado à sua viabilidade técnica perante os recursos disponíveis (neste sentido há de ser interpretada a menção, constante desses dois preceitos: quando as circunstâncias do caso o aconselharem). Ora, não sendo viável (de acordo com o despacho recorrido) a realização das videoconferências requeridas, e não demonstrando as arguidas e recorrentes essa viabilidade, não pode ser atacado por esta via o despacho em apreço. È de salientar, a este respeito, que na resposta à motivação do recurso apresentada pelo Ministério Público se afirma que a Procuradoria-Geral da República informou que a República Popular de Moçambique não tem possibilidade de realizar a videoconferência e que a República Federativa do Brasil aceitaria a realização da videoconferência por meio do sistema “Sktpe”, sendo que este sistema não está instalado nas salas de audiência e não permitiria a gravação direta das declarações. No entanto, não está junta aos autos tal informação, apesar de a mesma ter sido solicitada no despacho de fls. 514 e 515. Alegam as arguidas e recorrentes que a inquirição das testemunhas em causa é essencial para a prova da veracidade da imputação de que são acusadas, ou da sua boa fé quanto a tal veracidade. Não sendo viável a inquirição por videoconferência e não sendo essas testemunhas apresentadas em julgamento, restaria a possibilidade da sua inquirição por carta rogatória, sobre que já nos debruçamos no recurso apreciado anteriormente. E vale aqui o que aí dissemos: A prova dos factos a que aludem as recorrentes é, na verdade, essencial à sua defesa. Mas para o Tribunal concluir que uma inquirição de testemunhas é essencial à defesa, não basta que isso seja alegado, é necessário que tal resulta de algum outro elemento. Ora, no caso em apreço as arguidas afirmam que as testemunhas em causa deveriam ser inquiridas à matéria dos artigos 42º, 44º, 45º, 65º, 66º e 67º da contestação. Dos factos alegados nestes artigos tem relevo essencial para a defesa das arguidas, não certamente o que diga respeito a outras namoradas de G…, mas apenas o facto de ser verdade que a assistente trabalhou num local de diversão noturna, denominado “H…” e sito no Porto. Ora, não se consegue vislumbrar por que motivo a prova deste facto, relativo a factos ocorridos em Portugal e normalmente do conhecimento de várias pessoas, há de depender da inquirição de três testemunhas residentes no Brasil e em Moçambique, e não de uma qualquer outra testemunha residente em Portugal. Deverá, pois, ser negado, provimento a este recurso. Cada uma das arguidas deverá ser condenada em taxa de justiça (artigo 513º, nº 1, do Código de Processo Penal e Tabela anexa ao Regulamento das Custas Processuais) 5. – Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento a este recurso, mantendo o despacho recorrido. Condenam cada uma das arguidas em 3 U.C.s de taxa de justiça. III 1. - Vêm as arguidas B… e C… interpor recurso da douta sentença do 3º Juízo (3ª secção) Criminal do Porto que condenou cada uma delas, pela prática de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos artigos 180º, nº1, e 183º, nº 2, do Código Penal, com remissão dos artigos 30º e 31º, nº 3, da Lei nº 2/99, de 13 de janeiro (Lei de Imprensa), na pena de cento e trinta dias de multa, a primeira à taxa diária de oito euros e a segunda à taxa diária de sete euros, e condenou ambas a pagarem, solidariamente, à assistente e demandante I… a quantia de dois mil euros, acrescida de juros legais, a título de indemnização de danos não patrimoniais. São as seguintes as conclusões da motivação do recurso: «1. Com o presente requerimento, pretendem as Arguidas que subam os recursos interpostos e que se encontram a aguardar a interposição do recurso da decisão final, da qual agora se recorre. 2. No que diz respeito à matéria de fato, entendem as Arguidas que deveriam ter sido considerados “não provados” os fatos constantes dos pontos 35º (no que diz respeito à Arguida B…); bem como os pontos 37, 43, 45 e 46 da matéria considerada provada. 3. Para além disso, deveria ter sido considerado “provado” o fato constante do artigo 77º da Contestação, tudo isto, no que diz respeito à matéria de fato, com base nos concretos fundamentos e meios probatórios, individualizados nas presentes alegações, e para as quais desde já se remete para todos os devidos efeitos. Por outro lado, no que diz respeito às várias questões de direito que se levanta, sempre se dirá o seguinte: 4. A título de questão prévia e incidental, entendem as Arguidas que o número 2, do artigo 183º do Código Penal, viola o princípio da igualdade e como tal, está em manifesta oposição com a nossa constituição, nomeadamente, com o Princípio da Igualdade. 5. Entendem as Arguidas que, o número 2, do artigo 183º do Código Penal, pelo qual foram condenadas, é inconstitucional, na medida em que prevê uma pena mais grave a condutas que são material e juridicamente iguais, pondo em causa o princípio constitucional da Proporcionalidade e da Igualdade. 6. A mero título de exemplo, se idêntico texto tivesse sido publicado num “blog” ou numa página pessoal de alguém, disponível para todos “on-line” na Internet, o agente do crime ficaria sujeito a uma pena mais benévola e substancialmente inferior. 7. Ora, nos termos do número 1 do artigo 13º da Constituição, “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”, dispondo ainda o número 2 que, “Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.” 8. É manifesto que, a aplicação do número 2 do artigo 183º entra em contradição com o artigo 13º da Constituição, pois aplica a situação idênticas, (onde está em causa o mesmo bom jurídico) penas manifestamente diferentes e desproporcionais. 9. Pese embora o “Princípio da Igualdade” acima referido, o número 2, do artigo 183º do Código Penal, prevê uma pena que apenas se aplica aos “órgãos de comunicação social”, mesmo que estes publique, conteúdos idênticos aos que constam em blogs ou em qualquer página da Internet, e que sejam já do conhecimento público. 10. Tanto é que, se um mesmo texto tiver sido difundido numa página de internet, blog ou até mesmo num livro, cairá sempre, na alínea a) do número 1, do artigo 183º do Código Penal, correspondendo-lhe uma pena menos gravosa e um prazo de prescrição mais benévolo. 11. Os dois anos de prisão para os factos praticados na comunicação social, são manifestamente desproporcionais, quando comparados com a pena agravada de oito meses prevista para a “ofensa for praticada através de meios ou circunstâncias que facilitem a sua divulgação”, (ex. Internet) violando desta forma o Principio da Proporcionalidade, plasmado nos artigos 18º nº 2 e 266º nº 2, ambos da Constituição da Republica Portuguesa. 12. Para além do acima referido, e salvo melhor opinião, entendem as Arguidas que se encontravam preenchidos os pressupostos de exclusão da ilicitude, previstos no número 2, do artigo 180º do Código Penal. 13. Nos termos da referida norma, “a conduta não será punível quando: (a) a imputação for feita para realizar interesses legítimos; e (b) o agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé, a reputar como verdadeira. 14. Ora, é nesta última frase que as Arguidas se pretendem focar, uma vez que, o Tribunal “a quo” aceitou que, no caso concreto, para o segmento de revista “cor-de-rosa” estaria preenchido o pressuposto da alínea (a), pois existiria um “interesse legítimo”. 15. No que diz respeito ao critério do “fundamento sério para, em boa fé, a reputar verdadeira”, salvo melhor opinião, entendem as Arguidas que o Tribunal “a quo” andou mal ao não ter reconhecido que o mesmo também se encontrava presente, nomeadamente, depois de ouvir o depoimento das duas Arguidas e da convicção mostrada por ambas nas suas fontes explicando detalhadamente, o motivo pelo qual, entendem que as fontes eram fidedignas. 16. Tanto é assim que, o Tribunal “a quo” considerou como NÃO PROVADO que: (i) “A notícia elaborada pelas Arguidas e a que se referem os autos não tenha por base nenhuma fonte, tratando-se de pura invenção das Arguidas”; (ponto o dos fatos não provados) (ii) “As Arguidas sabiam que os fatos referidos na notícia eram falsos”; (ponto p dos fatos não provados) (iii) “As Arguidas sabiam que os fatos que relataram na notícia não eram verdadeiros e não se importaram, com a repercussão que esta falsa notícia teria na vida da Assistente”; (ponto q dos fatos não provados) (iv) “As Arguidas ao redigirem a notícia dos autos, se tenham apenas preocupado com a venda do maior número de exemplares possível da revista”; (ponto r dos fatos não provados) 17. Assim, e desde logo, dos fatos que o Tribunal “a quo” considerou “não provados” resulta desde logo a ideia de que, as jornalistas tiveram fontes credíveis nas quais se basearam para escrever o artigo objeto dos presentes autos. 18. Será também importante referir que, as testemunhas não se conheciam, eram de diferentes meios, nenhuma delas tinha qualquer inimizade com a Assistente (lembre-se inclusivamente que, a fonte amiga de G… referiu que gostava muito dela e que era uma pessoa que “fazia bem a G…”) e todas elas confirmaram a referida informação. 19. Assim, e salvo melhor opinião, entendem as Assistentes que provaram mais do que o simples convencimento subjetivo da veracidade que atribuíram às várias fontes que ouviram. 20. Mais ao não decidir nos termos acima referidos, a sentença em recurso violou o disposto no número 2, do artigo 180º do Código Penal. 21. Para além disso será de ter presente que, nos termos do artigo 6º do Estatuto dos Jornalistas, “Constituem direitos fundamentais dos jornalistas (…) c) A garantia de sigilo profissional” 22. Mais, nos termos do artigo 11º do mesmo estatuto, “Sem prejuízo do disposto na lei processual penal, os jornalistas não são obrigados a revelar as suas fontes de informação, não sendo o seu silêncio passível de qualquer sanção, direta ou indireta.” 23. Assim, entendem as Arguidas que o Tribunal ao ter decidido que não poderia aferir da “qualidade” das fontes, por estas não terem prestado depoimento e por, as Arguidas não terem revelado a sua identidade, está a sancionar, direta e indiretamente, as Arguidas violando assim tanto o artigo 11º como o 6 alínea c), ambos do Estatuto do Jornalistas. 24. Isto é, estando as Arguidas a exercer um direito que lhes é legalmente conferido por lei, não pode o Tribunal “a quo”, salvo melhor opinião, retirar ilações ou conclusões que as prejudique. 25. É que, diferente teria sido se, as Arguidas se tivessem limitado a referir que a informação tinha sido obtida por fontes que pretendiam não revelar e não tivessem dado detalhes sobre a ligação de cada uma delas aos fatos, 26. Mas neste caso, qualquer uma das Arguidas referiu, em detalhe, a “razão de ciência” para que cada uma das testemunhas tivesse conhecimento da informação (ou porque eram amigos próximos de G…, trabalhavam no bar em causa, conheciam amigos da Assistente, conheciam a “noite” do Porto) bem como as razões para que aquelas tenham sido consideradas fidedignas e credíveis. 27. Por fim, é indiscutível que as Arguidas atuaram porque, entenderam e legitimamente confiaram que a informação que estavam a transmitir era verdadeira. 28. Conforme fico acima explicitado e resulta da convicção do depoimento de ambas as Arguidas, nenhuma delas teria publicado o texto se não tivesse totalmente convencida que os fatos eram verdadeiros. 29. Ora, dispõe o artigo 16º do Código Penal que, “o erro sobre elementos de fato ou de direito de um tipo de crime, ou sobre proibições cujo conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente possa tomar consciência da ilicitude do fato, exclui o dolo.” 30. Assim, e salvo melhor opinião, tendo as Arguidas agido por entender que se verificava um elemento extintivo da sua responsabilidade criminal, deveria o Tribunal “a quo” ter aplicado o regime previsto no artigo 16º do Código Penal, absolvendo as Arguidas do crime de que vinham pronunciadas.» A assistente apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso. O Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando também pelo não provimento do recurso. O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, reiterando a posição assumida pelo Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância. Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir. 2. - As questões que importa decidir são, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, as seguintes: - saber se a prova produzida impõe que se considerem não provados os factos constantes dos pontos 36 (este quanto à arguida B…), 37, 43, 45 e 46 do elenco dos factos provados constante da douta sentença recorrida e provado o facto constante do artigo 77º da contestação; - saber se o nº 2 do artigo 183º do Código Penal é inconstitucional por contrário aos princípios da igualdade e da proporcionalidade; - saber se se verifica, quanto à conduta das arguidas, a previsão do nº 2 do artigo 180º do Código Penal; - saber se a sentença recorrida viola a garantia de sigilo profissional dos jornalistas; - saber se as arguidas agiram em erro sobre circunstâncias do facto, nos termos do artigo 16º do Código Penal. 3. – É o seguinte o teor da fundamentação da douta sentença recorrida: «(…) II – FUNDAMENTAÇÃO: 1) Instruída e discutida a causa resultaram provados os seguintes factos: 1. O J… é um jornal de grande divulgação e notoriedade em Portugal e tem por suplemento, com edição aos Sábados, a revista J1…. 2. Na edição da referida revista correspondente à semana de 30 de Outubro a 05 de Novembro de 2010, a qual ficou disponível para venda ao público no dia 30 de Outubro do mesmo ano – cfr. documento junto aos autos a fls. 11 e que aqui se dá por reproduzido -, sob a rubrica "A Ferver" (pág. 13 e ss. da citada revista, cujo teor se dá aqui por reproduzido), 3. com o título "VIDA POLÉMICA" e subtítulo "I… ESCONDE PASSADO refere-se (…) “a actual companheira de G… terá trabalhado numa conhecida casa de alterne do Porto (…)" e pode-se ler o seguinte excerto: "(...) segundo o que a J1… conseguiu apurar, a história é afinal, bem semelhante a alguns dos anteriores relacionamentos de G…, que terá, afinal, conhecido I… quando esta trabalhava numa das mais conhecidas casas de alterne do Porto, a H… (...) E continua ... 4. "Quando a I… veio para Portugal, esperava que o então companheiro K…, lhe proporcionasse uma vida luxuosa. Mas o que aconteceu foi bem diferente. Os dois passaram por algumas dificuldades financeiras e a I…, que sempre foi ambiciosa, decidiu trabalhar na noite para ganhar dinheiro (...) o trabalho da H… acabou por durar poucos meses, até à altura em que I… conheceu G…. Em Novembro de 2009, a jovem deixou o mundo da noite e, a conselho do presidente L…, aceitou então o modesto trabalho na loja M… (...); 5. "(...) Na altura em que I… começou a trabalhar na noite, o menino tinha apenas dois anos (...)" A I… estava muito confiante em que a mudança lhe trouxesse melhorias na vida mas nada correu como ela queria e acabou por se virar para o mundo da noite (...)". 6. Este tema teve direito a destaque na capa da mencionada edição da revista J1…. 7. A capa da mencionada edição da revista J1…, tem em destaque a referência à reportagem com uma imagem da Assistente e o seguinte título: "As últimas conquistas de G… têm todas algo em comum: um passado vivido nas boites do norte"; 8. e subtítulo em letras garrafais: "AMORES DA NOITE". 9. O teor do título e subtítulo são pejorativos da imagem e reputação da Assistente. 10. O teor do título e subtítulo têm como intuito provocar curiosidade no público em geral a fim de obter o maior lucro possível com a venda de exemplares. 11. Nos presentes autos, o teor do título e subtítulo acima referidos reproduzem o teor do texto e corpo da notícia (fls. 14-17 da revista cujo teor aqui se dá por reproduzido), notícia essa escrita e elaborada pelas arguidas. 12. A ilustrar, quer na capa, quer no corpo da notícia, surgem fotografias da Assistente e, até, uma imagem alusiva à "H…", com a legenda: "jovem brasileira terá trabalhado na H…". 13. Os factos mencionados nos excertos supra transcritos, quer sejam os referentes à capa, quer sejam os contidos nas páginas da notícia, reportam-se à Assistente. 14. Na referida notícia vem ainda escrito, referindo-se à Assistente: "Quando eles começaram a ficar mais próximos, G… disse-lhe que era melhor trabalhar uns tempos numa loja, para que ninguém desconfiasse do seu passado". 15. A notícia pretendeu dar a ideia que existiu um "lavar da imagem" da Assistente, passando a ideia de que a Assistente tinha algo a esconder (o facto de ter trabalhado na noite) e que por isso tivera de ir trabalhar para uma loja de roupa. 16. A notícia transmite que a Assistente não é aquilo que aparenta e que trabalhou no mundo da noite até conhecer o Presidente L…. 17. Na referida notícia compara-se a Assistente a outras mulheres conotadas com a vida na noite e que segundo a notícia terão trabalhado em conhecidas casas de diversão nocturna do Porto (casas de alterne) e tido ligações amorosas com G…, actual marido da Assistente. 18. Na notícia diz-se directamente que a Assistente é ambiciosa e que tudo o que sempre almejou foi um nível de vida desafogado e luxuoso. 19. Ao pretender ligar a Assistente ao mundo da noite e alterne, a notícia imputou-lhe um comportamento socialmente reprovável, como sendo alguém que exerceria, pelo menos, a profissão de "alternadeira". 20. A notícia em causa nos autos refere ainda que "o trabalho de I… na noite e o posterior relacionamento com G… fizeram com que o ex-companheiro da jovem brasileira movesse um processo judicial contra esta" e que "a vida dela não lhe permitia dar a devida atenção ao filho". 21. Na referida notícia diz-se que a Assistente abandonou o seu filho menor, e que teria descurado as suas responsabilidades enquanto mãe. 22. O ex- companheiro da assistente só intentou contra a mesma acção relativa à regulação do poder paternal do menor, filho de ambos. 23. Os factos imputados à Assistente denigrem a imagem e credibilidade da mesma, ofendendo-a na sua honra e consideração. 24. A Assistente ficou profundamente abalada com a notícia que se referem os autos. 25. Após a publicação da referida notícia a Assistente foi abordada por inúmeras pessoas, durante largos dias, que lhe falaram sobre a mesma. 26. A Assistente não trabalhou "na noite", nem em qualquer actividade semelhante. 27. A Assistente não trabalhou na "H…" ou estabelecimento semelhante; 28. Não foi "na noite" que a assistente conheceu o Presidente L…, G…, seu actual marido. 29. A Assistente trabalhou na loja do N… da marca de roupa "M…" de 21 de Maio de 2009 a 31 de Janeiro de 2010. 30. Inicialmente, fê-lo através da empresa O…, S.A. e em resposta a um anúncio. 31. Mais tarde, em Junho de 2009, celebrou um contrato de trabalho a termo certo por sete meses com a própria marca (P…, S.A.), passando a trabalhar como "Sales assistant", com a categoria de operadora ajudante de primeiro ano. 32. O trabalho que desempenhou na loja do N… da marca de roupa "M…" não foi qualquer manobra para encobrir o seu passado. 33. Foi no âmbito e no decorrer desse trabalho na referida loja do N… que a Assistente conheceu o Presidente L…. 34. O filho da assistente encontra-se actualmente, e ao abrigo de um regime provisório, à guarda do pai, correndo termos uma acção de regulação das responsabilidades parentais. 35. As arguidas criaram, redigiram, aceitaram e assinaram a notícia que veio a ser publicada (fls. 14-17 da revista junta aos autos) e o teor dos textos supra transcritos e em causa nos autos, sabendo a repercussão que esta notícia - de quatro páginas com direito a capa-, teria na vida pessoal, social e profissional da Assistente. 36. As arguidas sabiam também, que caso os factos descritos na notícia não fossem verdadeiros, tais palavras denegriam e ofendiam o bom-nome, honra e dignidade de qualquer pessoa e da Assistente em particular. 37. As Arguidas não tentaram contactar com a Assistente, visada na notícia, previamente à sua publicação. 38. As Arguidas não contactaram a gerência da própria "H…", o então namorado/companheiro da assistente, G… (seu actual marido) ou o ex-companheiro da assistente e pai do seu filho, previamente à publicação da notícia. 39. As arguidas são as autoras da notícia em questão, foi por sua pena que a notícia veio ao público e foram as mesmas quem conformou o conteúdo do artigo. 40. Sobre as arguidas pende a séria obrigação de aferir da conformidade de tudo aquilo que fazem chegar ao grande público, ainda mais quando se trata de tão gravosas e incisivas imputações. 41. As Arguidas deviam ter aferido da credibilidade das suas fontes, antes de redigir a notícia, bem como deviam ter contactado a visada, e, pelo menos, a casa nocturna envolvida e não o fizeram. 42. Às Arguidas são imputáveis as expressões em forma de texto narrativo, mas também as referências que aparecem "entre aspas", uma vez que não se identificam o suposto autor das mesmas. 43. As Arguidas agiram livre, voluntária e conscientemente, sabendo que os factos descritos na notícia que elaboraram e foi publicada, eram susceptíveis de ofender, como ofenderam, a honra e consideração da assistente e denegrir a sua imagem e não obstante escreveram-na –sem confirmar os factos junto da visada-, conformando-se que os resultados que das suas condutas poderiam advir e sabendo que as mesmas eram proibidas e punidas por lei. 44. Não desconheciam as arguidas o alcance dos factos imputados à assistente, bem como as consequências que tal imputação teria na vida da Assistente. 45. E tinham plena consciência da ilicitude do que faziam já que, jornalistas de profissão, não poderiam legitimamente desconhecer os limites da sua actuação, que é deontologicamente conformada, e que decorrem directamente do Estatuto do Jornalista e da Constituição. 46. Sabiam as arguidas que ao escrever a referida notícia da forma em que a escreveram, seriam citadas e faladas por todos aqueles que se interessam pelo mundo "cor-de-rosa" e até futebolístico, que o público-alvo da revista se interessaria pela notícia e que a mesma causaria impacto. 47. A divulgação dos factos descritos na acusação, pelo seu teor e falsidade, abalaram muito a honra e reputação da Assistente, tanto a nível social, como pessoal e profissional. 48. A assistente viu a sua credibilidade, enquanto pessoa séria e respeitável posta em causa com a notícia a que se referem os autos. 49. Foram muitas as pessoas que a si se dirigiram, questionando-a sobre o teor do artigo. 50. Após a publicação da notícia, durante muitas semanas, a Assistente sentiu um clima de desconforto e desconfiança, bem sabendo que todos comentavam o artigo. 51. Por força da conduta das arguidas, a Assistente sentiu-se fortemente afectada e quando tomou conhecimento do artigo em causa nos autos, sentiu grande indignação, desânimo e desalento. 52. A nível pessoal a Assistente sentiu-se vexada e muito entristecida com a notícia, sentiu revolta pela injustiça de ver a sua imagem lesada com recurso a falsidades e sentiu que se cometia uma tremenda injustiça e que havia sido dado um golpe fundo na sua credibilidade e imagem. 53. A assistente tem um filho menor e temeu e teme que um dia o mesmo tome conhecimento da notícia e que possa duvidar da rectidão da mãe, além do facto da notícia fazer referência ao menor, acusando a mãe de abandono. 54. Actualmente a Assistente não trabalha mas a notícia também a afecta a nível profissional, porque passa a ideia que não gosta de trabalhar e apenas de ganhar dinheiro. 55. A assistente casou com G…, presidente L… em 28/07/12 e conheceram-se em 11/10/09; 56. A casa onde a assistente viveu com o pai do seu filho em Portugal era um condomínio privado com piscina e court de ténis. 57. A assistente teve conhecimento da notícia mas não exerceu qualquer direito de resposta ou rectificação sobre a mesma, nem tentou desmentir publicamente o facto referido da notícia, ou seja, de ter trabalhado na noite. 58. A arguida B…: a) é jornalista e trabalha há 6 anos no Jornal “J…”, onde aufere o salário mensal líquido de cerca de €1.200,00 mensais; b) é solteira e vive em união de facto, em casa própria do companheiro; c) o companheiro é jornalista reformado e aufere montante não apurado; d) confessou parcialmente os factos de que vinha acusada (autoria do texto da notícia a que se referem os autos); e) Não tem antecedentes criminais. 59. A arguida C…: a) é jornalista desde 2004-2005; b) trabalha há 6 anos no Jornal “J…”, onde aufere o salário mensal líquido de cerca de €900,00 mensais; anteriormente trabalhou no Jornal “Q…” e revista “S…”; c) é solteira e vive com o irmão –actualmente desempregado-, em casa própria dos dois, pagando do empréstimo que contraiu para aquisição da mesma cerca de €430,00 mensais; d) confessou parcialmente os factos de que vinha acusada (autoria do texto da notícia a que se referem os autos); e) Não tem antecedentes criminais. 2) Factos não provados: Não se provou: a) que a assistente I… tenha trabalhado na H…, conhecida casa de alterne do Porto ou em qualquer outra casa de alterne; b) que G…, actual marido da assistente, a tenha conhecido quando esta trabalhava na H…; c) que quando a assistente e o seu companheiro K… vieram para Portugal, tenham passado por dificuldades financeiras; d) que a assistente, que sempre foi ambiciosa, decidiu trabalhar na noite para ganhar dinheiro; e) que a assistente tenha trabalhado da H… por poucos meses, até à altura em que conheceu G…; f) que em Novembro de 2009, a assistente deixou o mundo da noite e, a conselho do presidente L…s, aceitou então o modesto trabalho na loja M…; g) que tenha sido G… a arranjar o trabalho na M… à assistente; h) que enquanto vivia com o ex-companheiro, a assistente não desse a devida atenção ao filho menor, designadamente por trabalhar na noite; i) que o ex-companheiro da assistente tivesse intentado contra a mesma qualquer acção judicial, para além da relativa ao exercício do poder paternal; j) que tenham sido as arguidas as responsáveis pelo destaque e escolha dos títulos e subtítulos (fls. 13), capa e a própria edição do artigo em causa nos autos; l) que os factos referidos pelas arguidas na notícia a que se referem os autos já tivessem sido divulgados por outros órgãos de comunicação social e as arguidas se tivessem limitado a dar uma opinião sobre a relação dos assistentes; m) que as arguidas ao elaborar a notícia dos autos tenham actuado com o propósito directo ou firme de denegrir a imagem da Assistente e ofender a sua honra e consideração; n) que as arguidas procuraram forjar um notícia sensacionalista e vendável, com a inerente auto-projecção pessoal, movidas por um escopo de auto-projecção e lucro; o) que a notícia elaborada pelas arguidas e a que se referem os autos não tenha por base nenhuma fonte, tratando-se de pura invenção das arguidas,; p) que as Arguidas sabiam que os factos referidos na "notícia" eram falsos; q) que as arguidas sabiam que os factos que relataram na notícia não eram verdadeiros e não se importaram, com a repercussão que esta falsa notícia teria na vida da Assistente; r) que as arguidas ao redigir a notícia dos autos, se tenham apenas preocupado com a venda do maior número de exemplares possível da revista; s) que as arguidas tudo fizeram para reunir e confirmar a informação, antes de a relatar; t) se as arguidas antes da publicação da notícia contactaram alguém da loja da “M…”, no N…; u) que em virtude da notícia e por força do nervosismo e stress que lhe causou a notícia, a assistente teve dificuldades em dormir à noite; v) que até à publicação da notícia a que se referem os autos, a Assistente soubesse onde ficava a "H…"; x) não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos dados como provados, com interesse para a boa decisão da causa. 3) Convicção do Tribunal: A convicção do Tribunal ao dar como provados e não provados os factos supra descritos, fundou-se na análise conjugada e crítica do conjunto da prova produzida –documental, testemunhal e declarações das arguidas e assistente-, apreciada nos termos do art. 127.º, do C.P.P., mais concretamente: 1) nas declarações: a) da assistente I…, que depôs de forma credível e referiu que soube do artigo publicado na revista J1…, a que se referem os autos, porque amigos lhe telefonaram a falar sobre o artigo e foi comprar a revista. Lembra-se do conteúdo da revista e referiu que ficou ofendida com todo o conteúdo da revista. Primeiro sentiu-se indignada e depois triste e envergonhada. O jornal em causa nos autos é o mais lido em Portugal e o que estava escrito na notícia não é verdade. É tudo falso, nunca trabalhou na H…, não conhece nem sabe onde fica. Ficou ofendida porque sabe que esse lugar, pelo que falam, é um local de prostituição. A notícia “muda toda a história”, diz que foi trabalhar para a M… para esconder a verdade, diz que a história aí referida é verdadeira mas é tudo falso; alteraram o seu percurso de vida. Na altura amigas próximas telefonaram-lhe; até pessoas e familiares do Brasil lhe telefonaram a falar da notícia. As pessoas que lhe são próximas também ficaram indignadas, queriam saber se tinha lido; as pessoas próximas não perguntaram se era verdade mas as que não a conhecem só não perguntaram por não terem coragem. Referiu que para si, dizer que trabalhava numa casa de alterne é a pior ofensa que se pode fazer a uma mulher. Referiu que foi trabalhar para a loja da M… através duma empresa de trabalho temporário, inicialmente um mês, para reforço das férias; depois assinou um contrato por 7 meses. Foi nessa loja que conheceu o marido G… e não numa casa de alterne, como dizia a notícia. Mesmo quando passou a viver com o seu actual marido, G…, continuou a trabalhar na loja até terminar o contrato; vivia por cima, no …. Acabou o contrato e entretanto casou e deixou de trabalhar. Além da M… trabalhou cerca de 2 semanas numa empresa de telecomunicações, a vender planos para a T…. Nunca trabalhou à noite nem de noite, referindo que mesmo na M… nunca fez horário nocturno; trabalhava enquanto o menino estava no infantário. Inquirida sobre se conhecia a testemunha de defesa D…, referiu ser um jornalista de …, sua terra natal. É conhecido por “D1… e trabalha na rádio em Natal e organiza eventos, sendo amigo do pai do seu filho; conheceu os dois ao mesmo tempo. Referiu que conheceu o seu ex-companheiro no Brasil e veio com este para Portugal em 2008, tendo-se separado do mesmo nesse ano. Em Portugal não teve contacto com esse jornalista. Inquirida sobre se conhecia as testemunhas de defesa E… e F…, referiu que sabe que a primeira foi namorada do seu actual marido e a segundo a sua ex-mulher, mas não a conhece pessoalmente. Inquirida sobre o art. 47.º da acusação, referiu que ficou incomodada por todos os motivos que referiu antes; referiu também que o pai do filho também vivia bem, os problemas do casal eram outros. Não fala com o ex-companheiro desde que saiu de casa; sobre a regulação do poder paternal não se entenderam, teve que ser através do Tribunal. Também ficou incomodada porque a notícia fala do filho; não sabe o que vai responder ao filho se alguém falar no assunto. b) as testemunhas de acusação depuseram também de forma que se afigurou credível: b.1- G…, referiu ser casado com a assistente desde 28/07/12 e não conhecer a assistente. Referiu que conheceu a assistente no dia 11/10/09, na loja M…, no N…. Era cliente da loja em frente (S…), que era quem vestia o L…; na altura esqueceram-se de mandar umas calças e não teve “lata” e ir lá pedir outras calças e foi comprá-las à loja da M…, onde trabalhava a assistente e que durante cerca de 2 anos tinha sido a patrocinadora do L…. O contrato com a M… como patrocinadora do L… já tinha acabado quando conheceu a assistente; nessa altura já era a S…. Foi aí, nessa loja, que conheceu a assistente; nunca lhes pediu para a contratarem; se quisesse andar com ela não precisava de lhe arranjar emprego na M…. Referiu que a assistente nunca trabalhou na noite nem na loja trabalhava em horário nocturno. O depoente conhece a H…, que até pertenceu a um amigo seu mas sabe que a assistente, sua esposa, nunca lá tinha ido. Uns dias depois da notícia é que lhe foi mostrar onde era. Referiu que o que está na notícia é falso. Relativamente à notícia referiu que a assistente ficou indignada e queria voltar para o Brasil; dizia que alguém podia dizer ao filho, que era uma coisa que a magoava imenso. Aguentou porque teve o apoio de muitas pessoas. Na altura a assistente não estava preparada para a notícia, nem a conseguiu ler toda sozinha e começou a chorar. Não o contactaram previamente mas também não falaria com eles. Referiu que o “J…” publica tudo o que quer. Depois da notícia a que se referem os autos publicou fotografias de 3 casas e a dizer que num mês, tinha oferecido 3 casas à actual esposa, o que segundo o mesmo, infelizmente, não é verdade. Inquirido referiu que a sua ex-mulher F… não conhece a assistente nem nunca falou com ela sobre a sua actual esposa. A testemunha E… referiu que conheceu-a na H…, era lá alternadeira; admitiu ter tido com a mesma um relacionamento e referiu que foi um “conhecimento ocasional” e que esta regressou ao Brasil ainda nem o depoente conhecia a assistente; são de terras diferentes. Quanto a T…, também foi sua namorada (como é do conhecimento público). Quanto à outra senhora referida na notícia (U…), referiu que não teve qualquer relacionamento com a mesma. D… não sabe quem é. Confirmou que há anos que os seus relacionamentos vêm na comunicação social, mas segundo o mesmo não se expõe a isso, só se for uma fotografia num evento. b.2- V…, referiu director de relações externas no L… há cerca de 11 anos e durante alguns anos foi o responsável pela comunicação social. O depoente é formado em Jornalismo; nunca trabalhou no J… mas trabalhou noutros jornais, como o W… e Q…. Referiu que sabe a assistente trabalhava na M…, no N…. Antes de saber que tinha uma relação com o Presidente G… já a conhecia de a ver na loja. Nunca ouviu falar que trabalhasse na H… nem nada que suportasse a notícia; no seu entender a notícia é falsa. Sabe que a M… patrocinou o L… e mudaram mas não sabe quem data. Relativamente à notícia a que se referem os autos percebeu que ia gerar algum incómodo, incluindo no L…; foi um assunto falado mas as pessoas mais próximas diziam que era um absurdo. Sabe que a notícia causou revolta na assistente e no actual marido. No L… ninguém os contactou no sentido de obter o contraditório; tinham o contacto do L…; a relação com o J… nunca foi amistosas mas no caso concreto teria respondido. Segundo entende foi uma escrita “leve e irresponsável”, entrou na esfera privada das pessoas sem nenhum suporte. Era preciso verificar a história; quando não é verdade não se escreve. Na notícia referem-se “fontes” mas não as identifica. Põem as afirmações entre aspas para defesa do jornalista. Segundo o mesmo ou o jornalista tem uma confiança máxima na fonte ou tem que confirmar a notícia. Segundo o mesmo a notícia foi capa da revista e a revista é um semanário, pelo que teve que ser discutida pelos superiores das arguidas; é escolhida com o objectivo de causar impacto e o objectivo é o lucro. Referiu ainda que a publicação em causa nos autos é muito lida e a figura do Presidente do L… é sempre muito visada nesta revista. Não se falou em exercer o direito de resposta mas apenas recorrer ao Tribunal. b.3- X…, referiu colaboradora do L… há cerca de 5 anos; trabalha no departamento de relações públicas (foi criado por si) e actualmente exerce funções relacionadas com a criação do Museu do L…. Referiu que também é amiga da família do Presidente G…. Quanto à notícia dos autos, referiu que a leu e ficou estupefacta e preocupada pela I… (assistente), na altura companheira do Presidente do L…. Sabia que ia ficar muito triste e incomodada com a notícia. Referiu que em Portugal qualquer notícia dessas leva a generalidade das pessoa a pensar que era verdade. A notícia colocou a assistente em locais conotados com a prostituição, o que não era verdade; foi por isso que achou que ela ia ficar preocupada. A assistente acompanhava a comitiva do L… a todos os jogos, no Y… e fora dele e a depoente tinha por funções zelar pelas pessoas do L…. Referiu que no dia em que saiu a notícia dos autos ia haver jogo e a assistente ia levar o filho; como não são permitidas crianças no camarote do presidente, caso não houvesse mais camarotes a assistente teria que ir para as bancadas, no meio do público. Por esse motivo achou que podia não ser conveniente a assistente ir para a bancada e ligou-lhe a falar da notícia; a assistente ainda não tinha lido; não lhe quis dizer o teor mas disse-lhe que não era positiva e que lesse. A assistente ligou depois e disse que ia na mesma para a bancada com o menor. Quando chegou a assistente estava muito em baixo; é uma pessoa muito sensível e chorava com facilidade; ficava facilmente emocionada. Só soube que a assistente e o Presidente andavam juntos quando a mesma trabalhava na M…; viu-os algumas vezes juntos e apercebeu-se que trabalhava nessa loja. b.4- Z…, referiu ser o gerente da “H…” desde 2002 até aos dias de hoje; em 2006-2007, esteve ausente dessas funções e era gerente AB…. Conhece a assistente e o Presidente L… dos jornais. Referiu que enquanto o depoente foi gerente desse estabelecimento, a assistente nunca lá desempenhou qualquer tipo de função. Referiu que também nunca foi contactado por qualquer jornalista sobre esse assunto. Referiu que antes de iniciar a gerência do estabelecimento era gerente do mesmo, AC…; não sabe se este era amigo do presidente G…. Referiu também que na “H…” só há alternadeiras ou empregadas de limpeza, esclarecendo que empregada de limpeza só há uma; as outras são alternadeiras e não há contratos. Inquirida sobre se lá trabalhou a testemunha E… (ou E1…, que segundo o referido em julgamento será o nome verdadeiro), com cuja fotografia –que consta da notícia foi confrontado- referiu que não conhece e que as mulheres que aí trabalham usam nomes “artísticos”, ou seja, falsos. b.5- K…, referiu ser o ex-companheiro da assistente e que têm um filho em comum; nunca foram casados; não fala com a assistente desde 2009, altura em que a mesma saiu de casa e “abandonou o filho”. Referiu que a assistente é que o pôs em Tribunal várias vezes; o depoente também intentou um processo em Tribunal contra a assistente por causa do poder paternal. Referiu que conheceu a assistente no Brasil e vieram para Portugal em Janeiro de 2009, tinha o filho cerca de um ano (nasceu em 11/11/07). Separaram-se em Outubro de 2009. Referiu que enquanto estiveram juntos a assistente trabalhava na M… e não como alternadeira. No Brasil também não trabalhava como alternadeira ou na noite. Passados uns meses de chegarem a Portugal a assistente foi trabalhar para a loja da M…, emprego que conseguiu através de um anúncio. À noite estava em casa; enquanto estiveram juntos não trabalhava na noite. Conhece a “H…”; não pode falar pela assistente mas pelo que sabe ela nunca aí trabalhou. Conhece o D… ou “D1…; desconhece o que ele possa saber sobre a vida da assistente. O depoente tinha uma empresa no Brasil e o “D1…” era radialista e organizava eventos; é muito conhecido em Natal e promoveu alguns eventos do depoente. Pensa que foi aí que o mesmo conheceu a assistente; que saiba não se conheciam antes. Em Portugal, o referido “D1…” ainda chegou a estar na sua casa, ainda estava com a assistente. E1… ou E… não conhece (apesar de ter sido confrontado com a fotografia da mesma que consta da revista em causa nos autos). Referiu que não chegou a ler a notícia dos autos e só ouviu comentar. Referiu que não foi a fonte da notícia; até se sente ofendido com a mesma porque é a mãe do seu filho. Depois da notícia todos os dias era assediado para dar entrevistas e até queriam pagar-lhe. Teve seguranças e jornalistas atrás dele; muita gente a mandar mails chegando a dizer que a assistente namorava com um velhinho, que trabalhava na noite; nunca ligou a nada disso. Nunca comentou nem comentaria alguma coisa que pusesse em causa o seu filho. Quando saiu de casa a assistente trabalhava na M… e ganhava €500-600; gastava tudo rapidamente, pelo que segundo o mesmo teria que ter outra fonte de rendimento (no entanto, daqui não se pode extrair nem o depoente referiu e segundo se entende não sugeriu que a assistente trabalhasse na noite); da existência do relacionamento da assistente com G… só soube pela comunicação social. c) as arguidas: c.1- a arguida B…, confirmou ser jornalista e que em conjunto com a arguida C…, redigiu a notícia a que se referem os autos. Referiu que ouviram fontes anónimas, segundo a mesma fidedignas e credíveis, com ligações à assistente e ao Presidente G…; não tinham razões para duvidar. As fontes foram várias, pelo que o texto foi escrito com segurança. Escreveu porque estava convencida que era verdade. Referiu ainda que tentaram obter o contacto da assistente mas não o conseguiram obter. Segundo referiu no gabinete de imprensa não quiseram passar o contacto. No entanto, em momento posterior do seu depoimento referiu que não sabe se foi contactado o L…. Não houve qualquer desmentido ou direito de resposta. Contactaram com “alguém” que tinha trabalhado na H… e disse que a assistente lá tinha trabalhado e ficou convencida que estava a falar verdade; com o dono ou gerente não contactaram. Contactou com a M… mas não se recorda quem. As fontes eram fidedignas, porque já anteriormente tinham fornecido informações que não foram contestadas. As fontes não se conheciam e transmitiram tais factos. Conferiu a informação com as fontes, que eram credíveis; tudo parte duma base de confiança. Uma das fontes era ligada a G… que já tinham transmitido outras informações anteriores, que não eram falsas; essa fonte até informou do casamento e mandou fotografias. Outra fonte é do Brasil e já vinha da anterior editora; a outra fonte era da noite do Porto. Em 2010 trabalhava noutra área e nessa altura passou para a J1…; as fontes passam de uns para os outros; já tinham sido escritas notícias com base nas mesmas fontes. As expressões entre aspas representa alguém a falar; não é identificado para proteger as fontes. Nunca foi intenção ofender a assistente –que não conhece pessoalmente- nem escreveram o texto levianamente. É jornalista e o seu dever profissional é informar. Segundo referiu, na notícia nunca se disse quais eram as funções da assistente naquele bar, nunca disseram que era alternadeira. Não sabe onde fica a H…, não é do Porto. Referiu ainda que dizer que a assistente era ambiciosa e luta pela vida não é injurioso. Referiu que G… e seus relacionamentos é um tema debatido pelo próprio desde sempre, como por exemplo o casamento com F…, a relação com T…. Referiu que a relação com T… foi polémica e G… mostrou não ser preconceituoso ao dizer que tinha transformado uma alternadeira numa escritora. O tema é falado abertamente na imprensa. Quanto às relações entre o Presidente G… e o “J…”, referiu que o mesmo não costuma falar com o “J…”. Quanto ao processo em que é feita a revista, referiu que a informação é debatida dentro da equipa; pedem fotografias ao departamento de fotografia. O que as arguidas fizeram foi redigir o texto e contactar as fontes. A escolha das imagens é feita pelo director do departamento de fotografia. Ainda trabalha na revista J1…. c.2- a arguida C…, confirmou ser jornalista e que em conjunto com a arguida B…, redigiu a notícia a que se referem os autos e contactaram as fontes. Referiu que as fontes eram já antigas e fidedignas e não eram exclusivas da revista J1…. Se achasse que não eram fidedignas não escrevia. No caso dos autos, uma das fontes era próxima de G…, não tem nada contra ele nem pretende denegrir a sua imagem, daí ser “fidedigna”. Aliás, até refere que a fonte gosta da assistente e diz que esta faz bem a G…. Outra fonte é uma pessoa da noite e confirmou que a assistente trabalhou naquele local (referido na notícia) por pouco tempo; ainda contou pormenores piores que não escreveram. Outra fonte era do Brasil, próxima da assistente, também disse que tinha conhecido um velho rico. No entanto, referiu que na notícia disseram que trabalhava na noite, não disseram que era alternadeira. Referiu também que “nem sabe” o que se fazia na “H…”, embora admita que a fonte lhe disse (no entanto, a notícia que redigiu diz expressamente o que se faz nesse estabelecimento, dizendo que é uma conhecida casa de alterne). Referiu que tentaram obter o contacto da assistente e não conseguiram. No entanto, em momento posterior do seu depoimento referiu que “que saiba a assistente não fala à imprensa”, “acha que ela não teria respondido” (assim, daqui terá que se extrair que não a contactaram). Referiu ainda que G… não fala com o “J…”, é um dado adquirido; nem tentaram. Também não contactaram o L…. Está convencida que a notícia é verdadeira, motivo pela qual a escreveu. Redigiu o texto com a arguida B…; o texto e caixas de fls. 14-17 são elaborados pelas arguidas. Não escolheram a capa e o título e subtítulo (há uma hierarquia que trata disso), mas confirma que os mesmos estão de acordo com o texto que redigiram. As fotografias são pedidas ao departamento próprio por e-mail e depois entregues à paginação. Admite que para uma pessoa que não trabalhou no alterne pode ser ofensiva, se trabalhou não é ofensivo. Referiu no entanto, que o que diz a notícia é verdade, ficou com essa convicção; que trabalhou na H… não tem dúvidas. Os factos foram relatados por uma pessoa muito próxima de G…, que também tem uma boa relação com a imprensa. Referiu que nunca teve qualquer intenção de ofender a assistente ou mesmo G…. Checaram a informação com as fontes; todas as notícias pressupõem um trabalho de investigação. Desconhece quanto tempo a assistente trabalhou na M…. Referiu ainda que na revista AD… foi publicada notícia semelhantes mas não sabe se foi antes ou depois (nem foi junta qualquer prova nesse sentido). Trabalha no J… há 6 anos; escreve para revistas cor-de-rosa há sete. * d) testemunhas de defesa:d.1- AE…, referiu ser jornalista e trabalhar para o “J…” desde há cerca de 18 anos e que também escreve para a revista J1… desde 2005; desde essa altura escreve para a secção cor-de-rosa e lê diariamente a imprensa do género da concorrência. Não teve qualquer intervenção na notícia dos autos. Desde que se lembra há notícia sobre os “amores e desamores” de G…; a sua vida pessoal foi sempre discutida publicamente. Para qualquer notícia têm que checar a informação. Trabalham juntas e partilham o mesmo espaço (é um open space); vão sabendo o que as outras fazem. A depoente assistiu a conversas das arguidas com pessoas diferentes; uma das pessoas (fontes) é pessoa com quem costumam falar há muito tempo (pelo menos desde 2005, altura em que entrou para a J1… e tem ideia que já vinha de trás) e nunca deu razão para desconfiar (até foi essa pessoa que informou do casamento de G… com a assistente); também informou do casamento com a ex-mulher F…, da relação com T… e com E…, que viveu também com G…. Essa pessoa fala com o J… para que as notícias sejam verdadeiras e não para denegrir; pedem sigilo. Outra fonte tinha trabalhado na “H…”; outra era um contacto no estrangeiro (Brasil), que conhece a assistente. As arguidas fizeram averiguações no sentido de apurar o que veio a ser escrito; assistiu a telefonemas; as arguidas também iam partilhando o que estavam a fazer, pelo que acompanhou a investigação. Sabe que quando veio para Portugal a assistente estava casada com um senhor português e tinha um filho (no entanto, conforme se apurou viviam em união de facto); depois de virem para Portugal a relação não durou muito. Sabe também que trabalhou uns meses na M…. Referiu ainda que “obviamente” que as arguidas contactaram pessoas ligadas à “H…” (no entanto, pelo menos o gerente referiu que não foi contactado). Pela experiência que tem a relação de G… com o “J…” é má; ele não fala com o jornal. Acredita que a assistente também não falaria. Já viu a assistente falar com outras publicações (AF…, AG…) em eventos em que o casal apareceu. Referiu que também já escreveu sobre G… e a assistente; ele não fala com o J…, pelo que deixaram de tentar falar com o mesmo. Não sabe se as colegas tentaram contactar a assistente. d.2- AH…, referiu ser jornalista e trabalhar para o “J…” desde há cerca de 25 anos; é chefe de redacção das Revistas do J…, onde se insere a revista J1…. Pelo cargo que exerce vai acompanhando a imprensa cor-de-rosa. Os relacionamentos de G… são temas recorrentes na imprensa e o próprio não esconde. Referiu que é das pessoas mais amadas e odiadas (em termos desportivos) do país, tudo é motivo de notícia; é uma personagem incontornável da vida social. Não existe relação entre G… e o J…; pensa que não terá ficado agradado com notícias que aí se publicaram. Referiu que tem toda a confiança nas jornalistas que acompanharam e elaboraram a notícia (arguidas). É impensável publicar a primeira coisa que lhes digam; a imprensa cor-de-rosa imprime o mesmo rigor de qualquer outro sector. O texto dos autos não é conclusivo mas é feito em conformidade com a deontologia. Quanto ao título da notícia não sabe quem o fez; há várias pessoas que podiam ter feito isso. d.3- AI…, referiu ser jornalista e trabalhar para o “J…” desde há cerca de 4 anos; também escreve para a revista J1…. Não conhece a assistente nem acompanhou a investigação dos autos; soube apenas que as colegas estiveram a investigar. Lê a imprensa cor-de-rosa concorrente. Muitas vezes G… é notícia, nomeadamente pelos seus relacionamentos, citando como exemplos, T…, amplamente divulgado; U…, que entrou num reallity e referiu ter tido um relacionamento com o mesmo (sendo que este último relacionamento foi negado pelo próprio durante o julgamento). Referiu que não se recorda de ter lido a notícia dos autos. d.4- AJ…, referiu ser jornalista e trabalhar para o “J…” desde 2009; trabalha na redacção do Porto; às vezes participa na revista J1…. Conhece as arguidas. Já viu a assistente em eventos, a que o depoente se deslocou profissionalmente. Referiu que quando surgiram as primeiras notícias sobre o relacionamento de G… com a assistente, havia entre jornalistas a informação de que trabalhava na noite. Acha que assumiram a relação em Março de 2010; já se comentava o relacionamento, porque era fotografada no camarote …. Na altura a assistente tinha facebook e publicava fotografias com os dois em férias. O depoente já escreveu várias vezes sobre G…. Quando apareceu o nome da assistente na imprensa começou a fazer diligências para saber mais sobre ela. Acha que falaram com um tio (entretanto já falecido), que disse que esta tinha conhecido um velho rico. O depoente fez diligências no Porto e não conseguiu confirmar nada. Não sabe quem são as fontes das arguidas. Sabe que contactaram fontes no Brasil; surgiu uma informação valiosa do tio e “entretanto chegaram ao Brasil”. Não averiguou os factos a que se refere a notícia dos autos nem lhe foi solicitada qualquer colaboração para a investigação. Pensa que a notícia dos autos foi a 1.ª notícia sobre o assunto. Referiu que o relacionamento e G… e o “J…” é muito mau; os colegas do desporto são sempre barrados e nunca deu qualquer entrevista ao jornal. *** As arguidas prestaram novamente declarações e, além de deporem sobre a sua situação pessoal, referiu ainda a arguida B… que nunca teve intenção de ofender a assistente, quer pela profissão, quer pela diferença de idades; não tem qualquer preconceitoReferiu ainda que sabe que a sociedade é conservadora e preconceituosa mas nunca lhe passou pela cabeça ferir susceptibilidades. **** Tiveram-se ainda em conta os seguintes documentos: revista junta aos autos a fls. 11; teor de fls. 27-29 (moradas da M… e H…); certidão da sentença proferida no Tribunal de Menores do Porto de fls. 165-168; informação da M… de 170 e da empresa “AK…, SA” de fls. 357 e 610-617; sentença de fls. 269-290, assento de casamento de fls. 517; informação relativa à declaração de IRS da assistente de fls. 601-606 e 676 e 679-680; informação e mapa de pessoal da “H…” de fls. 623-672. Teve-se ainda em conta o teor de fls. 762-774, relativos a notícias on line, juntas pelas arguidas, sendo que a primeira notícia (fls. 762-765) da revista J1… em causa nestes autos, referindo-se à Assistente e à loja M…, no N…, refere que “terá sido naquele espaço comercial que a brasileira conheceu G…” (ou seja, em sentido contrário do que se refere na notícia em causa nos presentes autos). *** Analisando, então a prova produzida e para além do já referido, temos que a notícia a que se referem os autos foi publicada na Revista “J1…”, um suplemento semanal do Jornal “J…”, jornal de grande divulgação e inserindo-se a referida revista na designada imprensa cor-de-rosa. As arguidas confirmaram a autoria e redacção da notícia dos autos (fls. 14-17) e que realizaram a investigação que deu origem à mesma. Negaram apenas ter elaborado o texto da capa, as imagens, os títulos e subtítulos da página 13. De qualquer forma, tal como as arguidas reconhecem, a capa, título e subtítulos da página 13, mais não fazem do que reproduzir o texto da notícia elaborado pelas arguidas. No caso dos autos, dúvidas não existem que a notícia se refere à pessoa da Assistente, I… e refere-se a factos da vida privada da mesma, então companheira de G… e sua actual esposa. Por outro lado, dúvidas não existem que a referida notícia refere que a mesma trabalhou na “H…”, conhecida casa de alterne do Porto. Ora, as arguidas referiram que a notícia não diz que a mesma trabalhou nessa casa como alternadeira, uma vez que não referem qual a actividade que ai desempenhava; no entanto, o certo é que também não diz que a mesma desempenhava na referida casa qualquer outra profissão ou actividade. Por outro lado, conforme referiu o gerente dessa casa nocturna, para além da empregada de limpeza (que só há uma), as restantes mulheres que aí trabalham são alternadeiras. Acresce que lendo a notícia e o respectivo contexto, dúvidas não existem que a mesma refere que a assistente aí trabalhou como alternadeira e não em qualquer outra actividade, sendo certo que a comparam com outras alegadas namoradas de G…, alegadamente alternadeiras (pela menos uma delas, T…, assumiu tal facto publicamente), que referem ser ambiciosa, que trabalhou numa conhecida casa de alterne, que lhe foi arranjado um modesto trabalho na M… para esconder que tinha trabalhado na referida casa de alterne. Acresce que as próprias arguidas admitem que dizer que a assistente trabalhou numa casa de alterne, não sendo verdade, é ofensivo. No entanto, as mesmas afirmam que o que disseram na notícia é verdade, porque confiam nas fontes das referidas informações, que não identificaram e, consequentemente, não foram ouvidas em julgamento. Acresce que face ao conjunto da prova documental e testemunhal produzida em julgamento, nada resultou no sentido que seja verdade que a assistente tenha trabalhado na noite ou na citada casa de diversão nocturna ou casa de alterne, “H…” ou qualquer outra. Assim, da prova produzida, resultou que desde Maio de 2009 a 31 de Janeiro de 2010, a assistente trabalhou na loja M…, no N… e não trabalhava sequer em horário nocturno. Acresce que da prova produzida, a mesma só veio para Portugal, na companhia do então companheiro em Janeiro de 2009 e separou-se do mesmo em Outubro do mesmo ano. Por outro lado, resultou que as arguidas não confirmaram a notícia com a assistente, com a testemunha G… ou sequer com o L…, acabando por referir que não valia pena porque estes não iam responder, atentas as más relações do Presidente do L… com o Jornal J…. Por outro lado, foi ouvido o gerente da “H…”, que referiu que não conhece a assistente, nunca lá trabalhou nem foi contactado por qualquer jornalista para confirmar tal notícia. Da prova produzida, não resultou também que as arguidas tenham contactado a empresa M… para confirmar a referida informação. Acresce que o ex-companheiro da assistente –apesar de revelar uma certa mágoa para com a mesma, compreensível quando as relações amorosas terminam unilateralmente como terá sido o caso-, referiu que enquanto estiveram juntos a assistente não trabalhou em casas de alterne e trabalhava na loja acima referida; viviam num condomínio privado com piscina e court de ténis e não tinham dificuldades económicas. E, de acordo com o depoimento do mesmo, também não confirmou tal notícia perante qualquer jornalista e, sendo a mesma mãe do seu filho, nunca a acusaria de tal coisa porque também põe em causa e prejudica o próprio filho. As arguidas disseram que a vida amorosa de G… é um assunto de interesse público, para o sector da imprensa cor-de-rosa. Ora, ainda que assim se entendesse e que tal assunto não é mais do que satisfazer a curiosidade de tal público, apesar da alegada credibilidade das fontes invocada pelas arguidas, tal notícia, implicando um assunto da vida privada da assistente (sendo que ela própria nem sequer é uma figura pública), teria que ser confirmada junto dos visados, no caso a própria assistente. E, quanto à assistente, resultou que as arguidas que referiram ter feito a investigação nem sequer tentaram o contacto com a mesma. Por outro lado, dizer que uma mulher ou a assistente é alternadeira ou prostituta (palavras que andam geralmente associadas), não o sendo, é sem dúvida uma expressão que a ofende na sua honra e consideração, uma vez que tais funções não são bem vistas na sociedade portuguesa e têm uma conotação negativa acentuada. Assim, há que concluir face à prova produzida que a notícia divulgou factos falsos (sendo certo que nada resultou provado no sentido da veracidade dos mesmos) e que objectiva e subjectivamente ofendem a honra e consideração a assistente. III - Do Direito: As arguidas vêm pronunciadas pela prática de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º1, 183., n.º 2, do Cód. Penal, com remissão dos arts. 30.º e 31.º, n.º3, da Lei 2/99, de 13/01- Lei da Imprensa. Cabe então averiguar se os factos dados como provados preenchem os elementos objectivos e subjectivos do crime imputado às arguidas. Estabelece o art. 30.º da Lei 2/99, de 13/01 (Lei da Imprensa), que 1. “A publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofendam bens jurídicos penalmente protegidos é punida nos termos gerais, sem prejuízo do disposto na presente lei…”. 2. “Sempre que a lei não cominar agravação diversa, em razão do meio de comissão, os crimes cometidos através da imprensa são punidos com as penas previstas na respectiva norma incriminatória, elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo”. Por seu turno, o art. 31.º, n.º1, da referida lei, estabelece que “Sem prejuízo do disposto na lei penal, a autoria dos crimes cometidos através da imprensa cabe a quem tiver criado o texto ou a imagem cuja publicação constitua ofensas dos bens jurídicos protegidos pelas disposições incriminadoras”. O n.º 4, refere que “tratando-se de declarações correctamente reproduzidas, prestadas por pessoas devidamente identificadas, só estas podem ser responsabilizadas, a menos que o seu teor constitua instigação à prática de um crime”. O nº 3, da referida norma estabelece que “O director, o director-adjunto, o subdirector ou quem concretamente o substitua, assim como o editor, no caso de publicações não periódicas, que não se oponha, através de acção adequada, à comissão de crime através de imprensa, podendo fazê-lo, é punido com as penas cominadas nos correspondentes tipos legais, reduzidas de um terço nos seus limites”. De acordo com o acórdão da R.P. de 20/01/00, CJ, XXV, 1, p. 141 (citado por Paulo Albuquerque, p. 503), com o actual art. 31.º, n.º3, da citada lei, esta não descriminalizou as condutas dos directores, subdirectores ou quem concretamente o substitua, quando nas respectivas publicações são cometidos crimes de abuso de liberdade de imprensa, mas recai agora sobre o Ministério Público o ónus de provar que o acusado conhece o escrito ou a imagem publicados e não se opôs ao mesmo, podendo fazê-lo. Assim, de acordo com o citado art. 30.º, n.º1, da Lei de Imprensa, os crimes cometidos através da imprensa consistem em condutas lesivas de bens jurídicos penalmente protegidos consumadas através da publicação de textos ou imagens na imprensa. A realização do ilícito implica, no entanto, o preenchimento de um tipo legal de crime previsto na legislação penal comum. Atenta a pronúncia dos autos, os crimes cometidos através de imprensa a que se referem os autos e foram imputados às arguidas foram preenchidos através de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º1, 183., n.º 2, do Cód. Penal. Dispõe o n.º 1, do art. 180.º, do Cód. Penal, que “quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração ou reproduzir uma tal imputação ou juízo”, preenche o tipo legal do crime de difamação. O n.º 2, estabelece que a conduta não é punível quando: a) a imputação for feita para realizar interesses legítimos e; b) O agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé, a reputar verdadeira. (...) O n.º 4 estabelece que a boa-fé referida na alínea b) do nº2, excluiu-se quando o agente não tiver cumprido o dever de informação, que as circunstâncias do caso impunham, sobre a verdade da imputação.” Nos termos do art. 183º, 1- Se no caso dos crimes previstos no art. 180(...) a) a ofensa for praticada através de meios ou circunstâncias que facilitam a sua divulgação; ou b) Tratando-se de imputação de factos, se averiguar que o agente conhecia a falsidade da imputação; as penas da difamação (...) são elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo. 2. Se o crime for praticado através de meio da comunicação social, o agente é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa nunca inferior a 120 dias.” São, assim, requisitos do crime de difamação: a) que o agente se dirija a terceiro; b) e impute a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formule sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra e consideração ou reproduza uma tal imputação ou juízo; b) existência de dolo genérico. A ofensa pode ser concretizada por quem quer que seja (sujeito activo), contra toda e qualquer pessoa (sujeito passivo), singular ou colectiva (embora estas últimas com um âmbito de protecção diverso). Por outro lado, pode ser efectuada através: a) imputação de facto ofensivo da honra de outrem; b) por meio de formulação de um juízo, ofensivo da honra de outrem; c) pela reprodução daquela imputação ou juízo; d) pelo rodeio ou enviezamento. Assim, ao contrário do que sucede no crime de injúrias, exige-se aqui que a ofensa seja feita perante terceiros, ou seja, não se façam directamente ao ofendido, na presença do mesmo. Do ponto de vista doutrinário pode definir-se difamação “como sendo a atribuição a alguém de facto ou conduta, ainda que não criminosos, que encerrem em si uma reprovação ético-social, isto é, que sejam ofensivos da reputação do visado” (Leal-Henriques e Simas Santos, Cód. Penal anot., 2.º vol., 1996, p. 317). E, legalmente, difamação será o comportamento lesivo da honra e consideração de alguém. Convém então referir que honra é “a dignidade subjectiva, ou seja, o elenco de valores éticos que cada pessoa humana possui. Diz respeito ao património pessoal e interno de cada um...” e consideração é “o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, a reputação, a boa fama, a estima, a dignidade objectiva,...., a forma como a sociedade vê cada cidadão- a opinião pública” ” (Leal-Henriques e Simas Santos, ob. e p. cits.). Relativamente ao elemento subjectivo, basta-se este crime com o dolo genérico, em qualquer das suas formas (directo, necessário ou eventual), não se exigindo, pois, um dolo específico, ou seja, o fim de injuriar ou difamar (animus injuriandi vel diffamandi) – neste sentido a maioria da jurisprudência e, entre outros, o Ac. da RP de 24/10/84, CJ, ano IX, t. 4, p. 251. Assim sendo, basta que o agente “quisesse com o seu comportamento ofender a honra e consideração alheias ou previsse essa ofensa de modo que a mesma lhe pudesse ser imputada dolosamente” (Maia Gonçalves, Código Penal Português, anot., 1995, 8.ª ed., p. 657). Assim, basta a consciência de que a sua conduta é de molde a produzir ofensa na honra e consideração de alguém, em qualquer das modalidades do art. 14.º do Cod. Penal. Por outro lado, a conduta descrita no tipo incriminador no caso dos autos consiste na imputação de factos e na formulação de juízos de valor publicamente, usando meio de comunicação social, lesivos da honra e consideração dos visados. Entende-se por imputação de factos, a imputação de acontecimentos ou situações pertencentes à realidade passada ou presente e susceptíveis de prova. E, por formulação de juízos de valor, toda a afirmação contendo uma apreciação sobre o carácter ou conduta dos visados, que não está inscrito nos factos (valoração de factos). Quando estejamos perante factos e juízos de valor, estes últimos ocultam-se em factos, o que traduz a valoração negativa da personalidade e ou imagem dos visados. São assim vários, os processos executivos deste tipo de crime: a imputação de um facto ofensivo, ainda que sob a forma de suspeita; a formulação de um juízo de desvalor ou a reprodução de uma imputação ou de um juízo, que seja levado a terceiros. E, tal imputação constitui um crime de difamação, a menos que tal imputação surja para realizar interesses legítimos (como será o caso do exercício do direito de informar ou no cumprimento de um dever) e se faça a prova da verdade da imputação ou a mesma seja tida, de boa fé, como verdadeira (cfr. nº2 do art. 180º Código Penal). Tais condições objectivas de punibilidade são requisitos cumulativos que forçosamente se têm que verificar, de modo a afastar a punição do agente. Sendo os factos divulgados nas notícias idóneos, a lesar a honra dos visados, ou seja, se são factos e/ou juízos de valor divulgados nos meios de comunicação social (rádio, jornais e televisão) adequados a desacreditar, desprestigiar, diminuir o bom nome dos visados perante a opinião pública, então verificam-se os ilícitos. Assinale-se que, os factos cuja imputação se divulga não carecem de ser ilícitos, ou possuírem carácter criminoso, bastando lançar o descrédito e a sua suspeita na opinião pública. E, por opinião pública, devemos entender o círculo de pessoas que não esteja em contradição com as valorações da ordem jurídica: de acordo com o contexto interno e externo grau de cultura de intervenção ou posição social, objectivamente reconhecidos. Ou seja, como encarará o círculo de leitores da notícia dada, aferida de acordo com padrões médios, a divulgação das afirmações. No caso dos autos, o despacho de pronúncia que imputou às arguidas o crime dos autos, remete para a acusação particular de fls. 248 e ss.. Vêm as arguidas acusadas de serem responsáveis pela notícia (fls. 14-17), bem como, pela capa, título e subtítulos a que se referem os autos. Conforme resultou dos factos provados e as arguidas assumiram foram as mesmas que redigiram a notícia que se referem os autos (fls. 14-17), sendo responsáveis pela mesma. De acordo com a prova produzida foram também as mesmas as responsáveis pelas investigação que as mesmas referem ter efectuado e que esteve na origem por tal notícia. Por outro lado, face à prova produzida, não resultou que fossem as arguidas as responsáveis pela capa da revista –o que sucederá em princípio em qualquer revista-, ou pela página 13 da revista –que constitui um resumo da notícia e tem a respectiva autora identificada-. No entanto, analisando a referida capa e página 13, para além do tamanho das letras, estas nenhuns outros factos acrescentam aos que constam do corpo da notícia e cuja autoria as arguidas assumiram. No caso dos autos, a publicação em causa em causa nos mesmos é a edição da revista J1…, correspondente à semana de 30 de Outubro a 05 de Novembro de 2010 e a qual ficou disponível para venda ao público no dia 30 de Outubro do mesmo ano, revista essa que constitui um suplemento do Jornal “J…” e que tem edição aos sábados. Ora, face aos factos dados como provados –e sendo certo que a revista foi junta aos autos a fls. 11-, dúvidas não existem que os factos mencionados na notícia e nos excertos transcritos nos factos dados como provados, quer sejam os referentes à capa, quer sejam os contidos nas páginas da notícia, se reportam à pessoa da Assistente I…. Por outro lado, conforme se apurou, na data da notícia a assistente era namorada ou companheira do Presidente L…, G…, sendo o mesmo figura pública nacional. Ora, analisando a notícia em causa nos autos, subscrita pelas arguidas -que a capa e subtítulo reproduzem-, dúvidas não existem que na mesma se refere que a assistente, trabalhou na “H...”, conhecida casa de alterne do Porto, à semelhança de outros relacionamentos de G… que aí se referem e que foi nesse local que G… a conheceu. Aliás, na referida notícia refere-se que o trabalho na M… foi sugerido por G… para que ninguém desconfiasse do seu passado, ou seja, que trabalhou na H…. Apesar das arguidas referirem que não dizem expressamente na notícia que a assistente aí trabalhou como “alternadeira”, entende-se que da leitura da notícia tem que se concluir em sentido contrário, ou seja, que a notícia refere que a assistente trabalhou na “H…”, como alternadeira. Assim, lendo a notícia e o respectivo contexto, dúvidas não existem que a mesma refere que a assistente aí trabalhou como alternadeira e não em qualquer outra actividade, sendo certo que a comparam com outras alegadas namoradas de G…, alegadamente alternadeiras (algumas até que como foi do conhecimento público o confirmaram publicamente, como será o caso da sra. T…, que até escreveu ou publicou um livro com tais informações), que refere que a assistente é ambiciosa motivo pelo qual foi trabalhar para a noite, que trabalhou numa conhecida casa de alterne e que lhe foi arranjado um modesto trabalho na M… para esconder que tinha trabalhado na referida casa de alterne. Aliás, conforme referiu o gerente dessa casa nocturna, ouvido em julgamento, para além da empregada de limpeza (que só há uma), as restantes mulheres que aí trabalham são alternadeiras. Por outro lado, tendo em conta o teor da notícia não era certamente a fazer limpeza numa casa de alterne que uma pessoa ambiciosa vai trabalhar para ganhar muito dinheiro, nem seria certamente necessário qualquer trabalho numa loja modesta para esconder um passado na referida casa de alterne, caso a assistente lá tivesse trabalhado a exercer outras funções, como sendo a de uma modesta empregada de limpeza. Acresce que qualquer cidadão médio que leia a notícia a que se referem os autos conclui que a notícia refere que a assistente trabalhou na referida casa de alterne, como “alternadeira”. Ora, como alternadeira pode definir-se a “pessoa que a troco de gratificação fornece aos clientes companhia na mesa de um bar ou pista de dança” (http://weblog.aventar.eu.troll-urbano. weblog.com.pt). No entanto, tendo em conta o significado associado à referida palavra, qualquer cidadão médio entende que uma alternadeira é alguém que trabalha num estabelecimento de diversão nocturna e exerce uma actividade semelhante a prostituição ou que pelo menos, não exercendo a prostituição, incentiva os clientes a beber em troco de dinheiro, o que implica pelo menos alguma proximidade física ou sedução. Ora, de acordo com a prova produzida, a assistente não trabalhou “na noite” ou como alternadeira, seja na “H…”, seja em qualquer outro local do género, sendo assim o facto relatado na notícia falso ou inverídico. E, conforme se apurou, a assistente veio para Portugal com o seu ex companheiro e pai do seu filho em Janeiro de 2009. Segundo o mesmo referiu, pouco tempo depois a mesma começou a trabalhar na loja da M…, no N…, emprego que conseguiu através de um anúncio e trabalhou nesse local pelo menos até Outubro de 2009, data em que saiu de casa; durante o tempo que viveu consigo em Portugal à noite a assistente estava em casa. De acordo com a prova documental junta aos autos, a assistente trabalhou na referida loja desde 21 de Maio de 2009 a 31 de Janeiro de 2010, através de uma empresa de trabalho temporário, o que vai de encontro às declarações da assistente e seu actual marido, no sentido de que a mesma ficou a trabalhar na loja até finalizar o contrato e no sentido do ex-companheiro que referiu que a assistente foi trabalhar para essa loja pouco tempo depois de chegarem a Portugal. Aliás, de acordo com a notícia em causa nos autos teria sido Novembro de 2009, que a assistente deixou o mundo da noite e, a conselho do presidente L…, aceitou então o modesto trabalho na loja M…, quando o certo é que a mesma já trabalhava nessa loja desde Maio de 2009. Por outro lado, o gerente da “H…” negou conhecer a assistente e negou que a mesma lá tivesse trabalhado. Acresce que nenhuma prova foi feita em julgamento de onde resulte que a assistente trabalhasse na referida “H…” ou em qualquer outro local semelhante, como alternadeira ou qualquer profissão do género. Caberá então averiguar se no caso dos autos, se verificam, os elementos objectivos e subjectivos do ilícito que às arguidas foi imputado nos autos. Da factualidade apurada resulta que as arguidas, ao redigirem o texto supra descrito, referiram que a assistente tinha trabalhado na “H…”, conhecida casa de alterne do Porto, quando se apurou que tal não corresponde à verdade. Com a referida revista, sendo uma publicação, as arguidas dirigiram-se a terceiros (leitores da mesma) e referindo-se à assistente, disseram que a mesma trabalhou nessa casa de alterne, imputam-lhe factos que não correspondem à verdade e que são considerados ofensivos na sua honra e consideração da assistente, sendo certo que uma tal actividade tem subjacente uma carga negativa acentuada e é mal vista na sociedade. Acresce que as próprias arguidas admitem que dizer que a assistente trabalhou numa casa de alterne, não sendo verdade, é ofensivo da honra e consideração desta. Ora, tendo em conta os factos imputados à assistente na notícia, ou seja, dizer que a mesma trabalhou na noite como alternadeira não o tendo feito e atendendo aos conceitos de honra e consideração acima referidos, entende-se que os referidos factos são objectivamente ofensivos da honra e consideração da assistente e o seriam mesmo para qualquer mulher (que não exerça as funções de alternadeira). Assim, somos forçados a concluir que tais factos que lhe são imputados na notícia, sendo falsos, são objectivamente adequados a lesar a sua pretensão ao bom nome e respeito social e possuem carácter difamatório. De qualquer forma, não seria necessário que os factos divulgados pelo meio de comunicação social fossem falsos, já que a verdade surge como pressuposto objectivo da causa de justificação (art. 180.º, n.º2, al. b), do Cód. Penal) e não como elemento negativo da tipicidade e traduzir-se-à na prova da veracidade dos factos divulgados pela comunicação social. Conforme acima se referiu, a difamação compreende comportamentos lesivos da honra e da consideração do visado. Para além do já referido, cumpre referir que a honra tem a ver com a seriedade ou dignidade moral de um indivíduo, com o que ele vale diante de si próprio e traduz a estima ou, pelo menos, o não desprezo moral por si próprio, que sente, em geral, qualquer pessoa (Revista Subjudice, n.º4, 1992, “Imprensa e Difamação”, p. 91). Refere-se à probidade, à rectidão, à lealdade, ao carácter e trata-se de um conjunto de valores éticos que cada ser humano possui (Leal-Henriques e Simas Santos, ob. e p. cits.). A consideração tem a ver com o apreço ou não desprezo do público por determinada pessoa, no sentido de considerar alguém um bom elemento social ou, pelo menos de não o julgar com valor negativo. A protecção legal neste âmbito vai além destes valores, abrangendo a própria capacidade intelectual e profissional, a competência, a aptidão ou diligência no trabalho, desde que afectando o amor prório de outrem, o desprestígio, o desconceito público (mesma revista e p. 91 e 93). O art. 26.º da Constituição da República Portuguesa estabelece no seu n.º 1, que “a todos são reconhecidos os direitos … ao bom nome e reputação, à imagem,…, à reserva da intimidade da vida privada e familiar…”. Assim, encontra-se consagrado constitucionalmente nesta norma, por um lado individual (o bom nome) e por outro social (reputação ou consideração) fundidos numa pretensão de respeito que tem como correlativo na conduta negativa dos outros; é uma pretensão a não ser depreciado ou vilipendiado no seu valor aos olhos da sociedade. Por outro lado, a lei não exige, como elemento do tipo criminal, um dano efectivo do sentimento de honra e consideração, bastando para a sua existência, o perigo de que aquele dano possa verificar-se (revista acima citada, p. 93). Acresce que nem tudo aquilo que alguém considere ofensivo da sua honra e consideração deverá considerar-se como difamatório e ser punido como crime. Assim, só poderá considerar-se como difamação aquilo que razoavelmente, segundo a sã opinião da generalidade das pessoas de bem, deverá considerar-se ofensivo daqueles valores. Usa-se aqui o critério do bom pai de família, ou seja, o critério baseado na impressão que tais expressões produziriam num bom pai de família, do meio sócio-económico e cultural em questão do destinatário, do visado (cfr,, entre outros, Acs. da R.P. 30/11/88, CJ, V, p. 121). Há que referir ainda que no âmbito da liberdade de imprensa, o direito de informação pode consistir numa causa de justificação específica, na realização do interesse público legítimo e, portanto, implicar uma restrição do direito à honra. Trata-se nestes casos duma relação de conflito entre direitos com igual dignidade e constitucionalmente garantidos (arts. 26.º e 37-38.º da CRP). No entanto, tem-se entendido que a tutela jurídico-penal da honra só deve recuar no mínimo indispensável para a conservação do núcleo essencial do direito à informação, perante o livre exercício da função da imprensa. Assim, o direito à informação não abrange todo o âmbito da imprensa moderna e exige, para que se verifique tal direito, a objectividade e veracidade das notícias publicadas. Exige-se pois vários requisitos para que se restrinja a honra do visado para o exercício do direito de informação pela imprensa: a ofensa à honra cometida tem que revelar-se meio adequado e razoável do cumprimento da função pública da imprensa; exige-se que a imprensa, no âmbito da sua actividade, actue com animus de cumprir a função pública e exercer o seu direito-dever de informação; deverá haver no exercício do direito de informar, uma crença fundada na verdade dos factos imputados, ou seja, só deverão ser publicados factos verdadeiros ou justificadamente tidos como tais (cfr. RLJ, n.º 3697, Figueiredo Dias, “Direito de Informação e tutela da honra no Direito penal da Imprensa Português; Ac. R.P. de 21/03/07, www.gde.pt). Assim, o direito de informar, expresso no art. 38.º da Constituição, não é um direito absoluto e não pode sobrepor-se, sem mais, a outros direitos fundamentais, designadamente, o direito ao bom-nome, reputação, honra e consideração e princípio de presunção de inocência, havendo que recorrer a critérios de proporcionalidade, de modo a obter-se uma harmonização dos bens em colisão ou a sua optimização traduzida numa mútua compressão, de modo a atribuir a cada um a máxima eficácia possível (neste sentido, o Prof. Figueiredo Dias, RLJ, ano 115, n.º 3697, p. 101-102). Tal significa que a honra protegida terá que ser vista num contexto conflitual com outros bens jurídicos constitucionalmente garantidos, estando o Direito Penal obrigado a harmonizar ou efectuar a concordância prática entre bens jurídicos colidentes, havendo que efectuar uma ponderação de interesses. Assim, a questão de saber se pode ser salvaguardado um interesse legítimo à custa de uma lesão na honra, apenas pode ser resolvido no contexto do art. 180.º, n.º2, do Cód. Penal. Por outro lado, conforme acima se referiu e resulta do art. 180.º, n.º2, do Cód. Penal, se o referido direito de informar implicar ao mesmo tempo, uma imputação difamatória, tal conduta não será punível, quando for usado para realizar interesses legítimos e o agente provar a verdade da imputação ou tiver fundamento sério para, em boa fé, a reputar como verdadeira. A interpretação do julgador terá que ser no sentido que os autores dos ilícitos prosseguem um interesse legítimo e provam a verdade dos factos ou pelo menos que presidiu boa fé para reputar os factos verdadeiros e sérios (só aqui a ordem jurídica recua na protecção da honra). * Caberá então analisar se se verifica nos autos o n.º2, do art. 180.º, do Cód. Penal, conforme referem as arguidas.Assim, estabelece a referida norma que a conduta não é punível quando: a) a imputação for feita para realizar interesses legítimos e; b) O agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé, a reputar verdadeira. (...). O n.º 4 estabelece que a boa-fé referida na alínea b) do nº2, excluiu-se quando o agente não tiver cumprido o dever de informação, que as circunstâncias do caso impunham, sobre a verdade da imputação.” Os requisitos do n.º2, são cumulativos mas “a prova da verdade dos factos pode ser substituída pela prova da boa-fé do agente para reputar o facto como verdadeiro” (Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, 2008, p. 497). De acordo com o citado autor, a boa-fé tem uma vertente subjectiva (convicção da verdade dos factos) e uma dimensão objectiva, concretizada no cumprimento pelo agente das regras profissionais para obtenção da informação (o chamado “dever de esclarecimento”), de acordo com as características do caso concreto. Por outro lado, a prova da verdade dos factos não é admissível no caso de factos relativos à intimidade da vida privada e familiar, o que resulta do n.º3, do citado art. 180.º, do Cód. Penal. Acresce que não basta que o facto seja verdadeiro ou o agente tenha fundamento sério para o reputar verdadeiro. A revelação do facto deve prosseguir interesses legítimos (públicos ou particulares). Por interesse legítimo deve entender-se todo aquele que é respeitante à colectividade e que é conforme com a ordem jurídica, apesar do direito à informação ter consagração constitucional e representar uma face da liberdade de expressão enquanto alicerce da formação da opinião pública democrática, para a sua realização. Tem que haver veracidade na informação divulgada, o que constitui um dos elementos da causa objectiva de justificação, as quais têm natureza cumulativa. Tem-se entendido que mesmo o juízo de valor desonroso não é ilícito quando resulta do exercício da liberdade de expressão, da liberdade de imprensa e da liberdade de criação artística, numa sociedade democrática e tolerante. A crítica pode ser legitimamente exercida num contexto de luta política, no exercício do dever funcional de sindicar ou informar. O juízo de valor torna-se ilícito, “quando enxovalha e rebaixa a pessoa visada…, sendo-lhe atribuídas características que o singularizam como pessoa merecedora de repugnância” (Paulo Pinto de Albuquerque, ob. cit., p. 497). No que concerne aos meios de comunicação social, estes “desempenham uma função com interesse público quando os factos ou juízos divulgados respeitem a uma actividade relativa à formação democrática e pluralista em matéria social, política, económica e cultural mas não beneficiam do regime especial de justificação previsto no n.º 2, do art. 180.º, quando esta se destine à mera satisfação de necessidades “lúdicas, curiosidade ou sensacionalismo”, pois aqui não satisfaz um interesse público (Paulo Pinto de Albuquerque, ob. cit., p. 498-499). Refere ainda o citado autor (p. 499), que a “actividade judiciária e policial é manifestamente de interesse público numa sociedade democrática, mesmo quando diga respeito a pessoas que não são conhecidas do público. Com efeito, a publicidade da justiça (entendida no seu sentido mais amplo) é uma garantia constitucional fundamental do próprio sistema da administração da justiça, pois numa sociedade democrática não basta que o sistema seja justo, sendo imprescindível que ele seja visto… pelo público como justo. Assim, todos os actos do sistema, incluindo os actos que respeitem a factos ofensivos da honra, podem ser relatados nos limites do segredo de justiça”. Por outro lado, de acordo com o citado autor (p. 499), o modo de comunicar a informação deve ser norteado pelos princípios da proporcionalidade e da necessidade. Assim, “não é lícita a divulgação de um facto com efeitos devastadores sobre a pessoa visada por causa de um interesse insignificante ou pouco relevante”; por outro lado, deve escolher-se o modo de divulgação menos lesivo para a honra do visado,… devendo respeitar-se, se possível, o anonimato, designadamente nos casos de criminalidade de pequena e média gravidade cometidos por pessoas comuns, mas já não se impondo semelhante restrição nos casos de crimes graves cometidos por pessoas comuns e de crimes de pequena, média ou elevada gravidade cometidos por pessoas notórias”. No caso dos autos, conforme acima se referiu, entende-se que as imputações efectuadas pelas arguidas à pessoa da assistente, na notícia a que se refere os autos, configuram uma ofensa à honra e consideração da mesma. Assim, afirmar que a assistente trabalhava na referida casa de alterne –quando tal não corresponde à verdade- põe em causa o seu bom-nome, rectidão de carácter, prestígio, reputação e credibilidade, uma vez que tal profissão é considerada socialmente com uma carga negativa. E, tal só não sucederia, se tal facto correspondesse à verdade e a assistente aí tivesse trabalhado. E, face à prova produzida, resultou que tal afirmação não é verdadeira e que a assistente nunca trabalhou em tal casa diversão nocturna ou qualquer outra. Por outro lado, dizer que a assistente era ambiciosa e não prestava a devida assistência ao menor, sem mais entende-se que não é susceptível de lesar a honra e consideração da assistente mas já o poderá ser tendo em conta o conjunto da notícia, quando refere que por ser ambiciosa e pretender uma vida de luxos, é que foi trabalhar para a referida casa de alterne mas pretende fazer crer que apenas trabalhava numa modesta loja. Conforme se apurou a notícia em causa nos autos foi escrita numa publicação semanal vendida aos sábados juntamente com o jornal “J…”, jornal de grande tiragem e lido por milhares de portugueses, com capacidade de formação de opinião. Ora, as afirmações e juízos imputados à assistente não são susceptíveis de integrar a imputação à mesma (assistente) de qualquer ilícito criminal mas ofendem a sua honra e consideração. As arguidas alegaram que os factos referidos na notícia são verdadeiros e se basearam em fontes fidedignas que não identificaram nem foram ouvidas, pelo que o Tribunal não poderá considerar. E, pelos mesmos motivos, desconhecendo o Tribunal quem são tais fontes e de onde lhes vem a razão de ciência para afirmar da veracidade de tais afirmações, não poderá o Tribunal concluir que os factos imputados à assistente são verdadeiros ou que, houvesse fundamento sério para em boa fé, as arguidas, os reputarem como verdadeiros. Ora, conforme acima se referiu, a ilicitude da ofensa à honra só é excluída quando os autores, no caso as arguidas, prosseguem de forma adequada um interesse legítimo (no caso o direito de informar) e prova a verdade dos factos –que no caso não foi feita- ou, pelo menos, a boa fé na respectiva imputação ou reprodução. Só assim, a ordem jurídica recua na protecção do direito à honra e direito à privacidade ou credibilidade. As arguidas alegaram em julgamento que a vida amorosa de G… é um assunto de interesse público, para o sector da imprensa cor-de-rosa. Ora, no caso concreto, entende-se que se mostra duvidoso a existência de um interesse legítimo em informar os leitores que a namorada ou companheira actual (da altura) de G… trabalhou numa casa de alterne e queria dar a entender que trabalhou apenas numa loja de roupa, o que parece mais uma questão de mera satisfação de necessidades “lúdicas, curiosidade ou sensacionalismo”, acima referidas. No entanto, tendo em conta o público-alvo das revistas designadas por “imprensa cor-de-rosa”, pode admitir-se que exista um tal interesse. Ora, ainda que se entenda que tal assunto não é mais do que satisfazer a curiosidade de tal público, apesar da alegada credibilidade das fontes invocada pelas arguidas, tal notícia, implicando um assunto da vida privada da assistente (sendo que ela própria nem sequer é uma figura pública), teria que ser confirmada junto da visada. O certo porém é que no caso dos autos, as arguidas veicularam os factos com a publicação de uma notícia que foi apta para lesar a honra e credibilidade da visada (assistente) e tal exigia o exame, com cuidado da veracidade da informação fonte da notícia publicada. As arguidas deveriam ter provado que cumpriram o dever de verificação da veracidade da imputação e não o fizeram, limitando-se a alegrar a fidedignidade de fontes cuja identidade de acordo com o segredo profissional previsto no Estatuto de Jornalista, não revelaram em audiência, atitude essa deontologicamente correcta mas que impede o Tribunal de apreciar os fundamentos alegados pelas arguido e a idoneidade das referidas fontes. Por outro lado, nenhuma outra prova consistente foi produzida quanto à investigação efectuada pelas arguidas ou que contactos foram feitos, documentos consultados ou outras. E, quanto à assistente, resultou que nem sequer tentaram o contacto com a mesma. Como refere o prof. Faria Costa, em anotação ao artigo 180º (Comentário Conimbricence ao Código Penal, parte especial, tomo I, pg.623): “a boa-fé não pode significar uma pura convicção subjectiva por parte do jornalista na veracidade dos factos, antes tem de assentar numa imprescindível dimensão objectiva. Isto é: a boa fé está dependente do respeito das regras de cuidado inerentes à actividade de imprensa e que impõe ao profissional o cuidadoso cumprimento de um dever de informação antes da publicação da notícia”. Refere ainda o mesmo autor “que a observância de tal dever concretiza-se no cuidado na recolha de informações, na selecção e credibilidade das fontes, no adiamento da publicação caso a versão mais provável ainda não seja suficientemente forte, etc. Implica, para além disso, que antes da imputação de factos desonrosos a alguém identificado na notícia se dê a possibilidade ao visado de apresentar a sua própria versão dos factos” (neste sentido, Ac. da R.P. de 08/03/00, www.dgsi.pt). Na verdade, no caso dos autos, além de não se ter provado a veracidade dos factos que as arguidas imputam à assistente, nomeadamente que trabalhou na referida casa de alterne (ou qualquer outra), também não se pode concluir que as arguidas, em boa fé, as pudessem tomar como verdadeiras. Por outro lado, dizer que uma mulher ou a assistente é alternadeira ou prostituta (palavras que andam geralmente associadas), não o sendo, é sem dúvida uma expressão que a ofende na sua honra e consideração, uma vez que tais funções não são bem vistas na sociedade e têm uma conotação negativa acentuada. Assim sendo, e face aos factos apurados, não pode, pois, concluir-se, que tenham as arguidas cumprido o dever de esclarecimento e comprovação da veracidade dos factos imputados ao assistente e que as circunstâncias do caso impunham e, consequentemente, que tenham as arguidas fundamentos sérios para, em boa fé, reputarem tais factos como verdadeiros, pelo que não se verifica a causa de justificação prevista no n.º 2, do art. 180.º, do Cód. Penal. Assim, há que concluir face à prova produzida que a notícia divulgou factos falsos e que objectiva e subjectivamente ofendem a honra e consideração a assistente. Assim entende-se que as arguidas praticaram o crime que lhes foi imputados nos autos, sendo quanto ao elemento subjectivo sob a forma de dolo eventual (uma vez que se entende não ter ficado provado o dolo directo de que vinham acusadas). Resulta assim provado a prática pelas arguidas de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º1, 183., n.º 2, do Cód. Penal, com remissão dos arts. 30.º e 31.º, n.º3, da Lei 2/99, de 13/01- Lei da Imprensa. B) Consequências Jurídicas do Crime: 1. Qualificados os factos, segue-se a à escolha da natureza e determinação da medida da pena, tendo em conta que a moldura abstracta é de “pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa não inferior a 120 dias e até 240 dias” (cfr. arts. 180.º, n.º1, 183., n.º 2, do Cód. Penal, com remissão dos arts. 30.º e 31.º, n.º3, da Lei 2/99, de 13/01- Lei da Imprensa). 1.1 - Antes de mais cabe referir que nos termos do art. 70.º do C. P., entende-se que no caso concreto, do ponto de vista político-criminal, se revela suficiente aplicar às arguidas uma pena de multa por a mesma assegurar as finalidades da punição, não se revelando pois necessário ou sequer adequado, para reposição das normas violadas ou protecção dos bens jurídico-penais, que as mesmas cumpra uma pena de prisão. Relevou nesta decisão o facto das arguidas não terem antecedentes criminais, bem como, a sua situação pessoal apurada nos autos e o tipo de crime em causa nos autos. 1.2 – Nos termos do no 1 do art. 71º do C. P. “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e tendo em conta as exigências de prevenção”. A culpa e a prevenção são assim, os critérios gerais reguladores da medida da pena. A culpa entendida como um juízo de censura dirigido ao agente, em virtude de uma atitude desvaliosa manifestada no facto, constitui o limite máximo que a pena em caso algum poderá ultrapassar. O limite mínimo será fixado em função de considerações de prevenção geral positiva ou de integração, que se traduzem na necessidade de protecção dos bens jurídico-penais e de reafirmação das normas violadas. Por outro lado, devem ter-se aqui em conta considerações de prevenção especial e de socialização, que visam evitar a quebra da inserção social do agente e servir a sua reintegração na comunidade. São estas considerações de prevenção especial de ressocialização que vão determinar, em último termo, a medida da pena. 1.3 - Cabe então agora, a determinação da medida concreta da pena: Cabe então agora proceder à valoração dos concretos factores de medida da pena, identificando-se quais os que relevam para a culpa e para a prevenção, e tendo em conta que a moldura penal abstracta acima referida (pena de multa não inferior a 120 dias e até 240 dias). Importa então considerar no estabelecimento da medida concreta da pena, e relativamente à culpa que face aos factos provados, as arguidas ao redigirem a referida noticia que veio a ser publicada, sabiam que a mesma continham factos susceptíveis de ofender a honra e consideração da assistente e mesma assim actuaram, conformando-se com os resultados que da sua conduta poderiam advir, actuando assim, a título de dolo eventual. Por outro lado, a ilicitude do facto e a gravidade das consequências das suas condutas são elevadas, uma vez que estão em causa bens jurídicos –a honra e consideração- cuja lesão provoca danos de difícil reparação, uma vez que o bom nome da assistente cai em descrédito e desprestígio perante a opinião pública e dificilmente é plenamente recuperável, atenta a suspeita que se instala. Há que atender ainda ao tipo de expressões concretamente referidas na notícia, as quais, pelo menos quanto ao facto de ter trabalhado num casa de alterne, não podem deixar de ser consideradas injuriosas e difamatórias. Por outro lado e quanto às razões de prevenção: a favor das arguidas depõe o facto de não terem antecedentes criminais e se encontrarem plenamente inseridas na sociedade, família e trabalho, sendo que o crime dos autos, foi praticado no exercício das suas actividades profissionais. São medianas as exigências de prevenção geral, visando a punição deste ilícito, evitar o desrespeito pela honra e consideração das pessoas ofendidas. Tudo ponderado, nomeadamente as condições sócio-económicas das arguidas e atentos os critérios do art. 71.º e 47.º, n.º 2, ambos do C. Penal, julgo como proporcionais e adequadas a aplicação a cada uma das arguidas, da pena de 130 dias de multa, sendo quanto à arguida B…, à taxa diária de €8,00 e quanto à arguida C…, à taxa diária de €7,00. * A sentença não será publicada nos termos do art. 189.º, do Cód. Penal, uma vez que tal não foi requerido no prazo aí previsto. * II - Pedido de Indemnização Cível: Nos termos do art. 29.º,m nº1, da Lei de Imprensa, “na determinação das formas de efectivação da responsabilidade civil emergente de factos cometidos por meio da imprensa, observam-se os princípio gerais”. A responsabilidade civil emergente de um crime é regulada pela lei civil (art. 129.º, do C.P. revisto, 128.º, do C.P. de 1982), tendo a indemnização atribuída no âmbito do processo penal a natureza de indemnização civil de perdas e danos (art. 129.º, do C.P. revisto, 71.º e ss. do C.P.P., e 483.º do C.C.). O princípio geral da responsabilidade civil por factos ilícitos encontra-se consagrado no art. 483.º, n.º 1, do Cód. Civil: “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”. Para além da regra do art. 483.º, prevê-se ainda, no art. 70.º, n.º 1, do Cód. Civil, a protecção dos indivíduos “contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral”. Os direitos absolutos, nomeadamente, direitos de personalidade, constitucional e legalmente protegidos (art. 24.º e ss. da Constituição e 70.º e ss. do Cód. Civil), são danos à personalidade moral da pessoa e merecem, por isso, a tutela do direito. Assim, o art. 70.º, n.º1, do C.Civil, determina como princípio básico que todo o indivíduo tem o direito de ver protegida a sua personalidade física e moral. Este direito geral de personalidade visa a realização da autodeterminação e defende contra intervenções ou limitações injustificadas, referindo-se ao direito à vida, à integridade física e psíquica, à liberdade, à honra, à imagem social e de carácter, entre outros (cfr. H.E. Horster, A Parte Geral do C.C. Português, Coimbra, 1992, p. 259 e ss.). O responsável pelo ilícito extracontratual fica, obrigado a indemnizar o lesado pelos danos patrimoniais ou não patrimoniais de que o facto foi causa adequada. Constituem pressupostos do dever de reparação resultante da responsabilidade civil por factos ilícitos: a existência de um facto voluntário do agente (dependente da sua vontade, não um mero facto natural causador de danos); a ilicitude desse facto; que se verifique um nexo de imputação do facto ao lesante; que da violação do direito subjectivo ou da lei derive um dano, e haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima (de modo a poder concluir-se que o dano resulta daquele facto). Nos termos dos arts. 562 e 566.º do Cód. Civil, o obrigado a indemnizar deve reparar os danos reconstituindo a situação que existiria se não tivesse ocorrido a lesão, e caso esta não seja possível, a indemnização é fixada em dinheiro. Por outro lado, o dever de indemnizar compreende os danos não patrimoniais previstos no art. 496.º, do C.Civil, bem como, os danos patrimoniais, correspondentes ao prejuízo causado (dano emergente) e aos benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (lucro cessante), incluindo os danos futuros, desde que previsíveis, ao abrigo do disposto no art. 564.º, do C. Civil. A fls. 263 e ss., a assistente I… deduziu pedido de indemnização cível contra as arguidas acima identificadas –e ainda o arguido AL… que foi despronunciado e relativamente ao qual foi rejeitado o pedido cível, cfr. fls. 413-, pedindo a condenação destas a pagarem-lhe, solidariamente, para ressarcimento de danos não patrimoniais quantia não inferior a €2.039,99, acrescida de juros de mora desde a notificação do pedido até integral pagamento e alegando nos termos aí referidos cujo teor aqui se dá por reproduzido. Os danos alegados pela demandante a fls. 263 e ss., são danos de natureza não patrimonial. O Código Civil admite a ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, mas limitando-se àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496.º, do C. Civil). A gravidade do dano mede-se por um padrão objectivo, embora atendendo às particularidades de cada caso e não à luz de factores subjectivos (como uma sensibilidade exarcebada) e segundo critérios de equidade, devendo se possível ter em conta a comparação com situações análogas decididas em outras decisões judiciais e tendo em conta que a indemnização a arbitrar tem natureza mista: a compensação do lesado pelos danos sofridos e a sua reprovação civilística. No caso dos autos, decorre dos factos provados que as arguidas tiveram uma actuação ilícita e culposa porque veicularam uma notícia sem fundamentos sérios e concretos, ofendendo assim, a honra e consideração da assistente. Conforme se apurou ainda com a actuação das arguidas e em virtude da notícia a que se referem os autos e factos aí descritos, a demandante ficou profundamente abalada com a notícia e foi abordada por inúmeras pessoas, durante largos dias, sobre a mesma. A assistente viu a sua credibilidade, enquanto pessoa séria e respeitável posta em causa com a notícia a que se referem os autos. Foram muitas as pessoas que a si se dirigiram, questionando-a sobre o teor do artigo. Apurou-se ainda que durante muitas semanas a assistente sentiu um clima de desconforto e desconfiança, bem sabendo que todos comentavam o artigo. Por força da conduta dos arguidos sentiu-se fortemente afectada e quando tomou conhecimento do artigo em causa nos autos, sentiu grande indignação, desânimo e desalento. Apurou-se ainda que a assistente a nível pessoal sentiu-se vexada e muito entristecida, não podendo deixar de sentir revolta pela injustiça de ver a sua imagem lesada com recurso a falsidades e sentiu que se cometia uma tremenda injustiça e que havia sido dado um golpe fundo na sua credibilidade e imagem. A assistente tem um filho menor e temeu e teme que um dia o mesmo teme conhecimento da notícia e que possa duvidar da rectidão da mãe, além do facto da notícia fazer referência ao menor, acusando a mãe de abandono. Apurou-se ainda que actualmente a assistente não trabalha mas a notícia também a afecta a nível profissional, porque passa a ideia que não gosta de trabalhar e apenas de ganhar dinheiro. Acresce que a revista em causa nos autos é uma publicação semanal, constituindo um suplemento do Jornal o “J…”, jornal de grande tiragem e lido por inúmeras pessoas a nível nacional, o que alarga o âmbito do conhecimento pela opinião pública, da ofensa. Acresce que a notícia em causa nos autos foi capa da citada revista, sendo certo que as capas são atribuídas às notícias de grande destaque, pois são estas que publicitam e permitem o maior número de vendas possíveis, o que demonstra repercussão e impacto desta notícia (sendo pouco relevante se a capa foi ou escolhida ou elaborada pelas arguidas, uma vez que a mesma se baseia na notícia por estas elaborada). Assim, resulta do exposto que os danos supra referidos, sofridos pela assistente e dados como provados resultaram da conduta das arguidas /demandadas, verificam-se os pressupostos do art. 483.º, do C.Civil. Por outro lado, tendo em conta os factos provados, não restam dúvidas que os danos sofridos pela demandante na sua personalidade moral, são danos não patrimoniais que merecem a tutela do direito e são ressarcíveis com recurso à equidade e tendo em conta as condições da demandante e demandadas (arts. 496.º, n.º 1 e 562.º e ss., todos Cód. Civil). Assim sendo, é de fixar um montante monetário em ordem a compensar a ofendida, pelos referidos danos não patrimoniais sofridos, devendo recorrer-se a critérios de equidade (art. 566.º, n.º 3, do referido diploma legal), tomando em consideração a culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, bem como as exigências do princípio da igualdade (cfr. Ac. da R.C. de 12/04/11, www.dgsi.pt). No caso dos autos, atentos os critérios supra referidos, circunstâncias apuradas nos autos e o valor peticionado, reputo como adequada e equitativa a quantia de €2.000,00 (dois mil euros), que caberá às arguidas, solidariamente e a título de danos não patrimoniais, indemnizar, improcedendo, quanto ao restante. A esta quantia acrescem juros de mora, contados à taxa legal, desde a data da presente sentença (cfr. interpretação do disposto no art. 805.º, n.º3, do C. Civil, dada pela Jurisprudência n.º 4/02, de 09/05/02, publicado no DR n.º 164, I-A, de 27/06/02), até integral pagamento. (…)» 4.1. – Cumpre decidir. Vêm as arguidas e recorrentes alegar que a prova produzida impõe que se considerem não provados os factos constantes dos pontos 36 (este no que diz respeito à arguida B…, sendo que por lapso se indica o nº 35), 37, 43, 45 e 46 do elenco dos factos provados da douta sentença recorrida, e provado o facto constante do artigo 77º da contestação. Os factos em questão e constantes do elenco dos factos provados da douta sentença recorrida são os seguintes: «36. As arguidas sabiam também, que caso os factos descritos na notícia não fossem verdadeiros, tais palavras denegriam e ofendiam o bom-nome, honra e dignidade de qualquer pessoa e da Assistente em particular. (…) 37. As Arguidas não tentaram contactar com a Assistente, visada na notícia, previamente à sua publicação. (…) 43. As Arguidas agiram livre, voluntária e conscientemente, sabendo que os factos descritos na notícia que elaboraram e foi publicada, eram susceptíveis de ofender, como ofenderam, a honra e consideração da assistente e denegrir a sua imagem e não obstante escreveram-na – sem confirmar os factos junto da visada -, conformando-se que os resultados que das suas condutas poderiam advir e sabendo que as mesmas eram proibidas e punidas por lei. (…) 45. E tinham plena consciência da ilicitude do que faziam já que, jornalistas de profissão, não poderiam legitimamente desconhecer os limites da sua actuação, que é deontologicamente conformada, e que decorrem directamente do Estatuto do Jornalista e da Constituição. 46. Sabiam as arguidas que ao escrever a referida notícia da forma em que a escreveram, seriam citadas e faladas por todos aqueles que se interessam pelo mundo "cor-de-rosa" e até futebolístico, que o público-alvo da revista se interessaria pela notícia e que a mesma causaria impacto.» O facto constante do artigo 77º da contestação é o seguinte: «As jornalistas publicaram a informação porque, em boa fé, consideraram que a mesma era verdadeira». Alegam as arguidas que, ao contrário do que sucedeu com a arguida C…, nunca à arguida B… foi colocada a questão indicada no citado ponto 36 do elenco dos factos provados da douta sentença recorrida. E alegam também que nunca a qualquer delas foi colocada a questão indicada no ponto 46 desse mesmo elenco. Não se nos afigura, porém, indispensável que às arguidas sejam colocadas qualquer dessas questões. É um facto notório e de conhecimento generalizado que o teor da notícia em questão, se fosse verdadeiro, denegria o bom nome, honra e dignidade de qualquer pessoa e da assistente em particular (ponto 36). E também que essa notícia causaria impacte, por ela se interessaria o público-alvo da revista e seria citada e falada por todos os que se interessam pelo mundo “cor-de-rosa” e até futebolístico (ponto 46). Fosse qual fosse a resposta das arguidas a tais questões, é razoável considerar tais factos provados, que são notórios, de conhecimento generalizado e conformes às regras da experiência comum. Alegam também as arguidas que afirmaram o contrário do que consta dos citados pontos 37, 43 e 45 do elenco dos factos provados e afirmaram o que consta do citado artigo 77º da contestação. Mas, como é óbvio, não basta que as próprias arguidas aleguem factos que lhe digam respeito e lhes sejam favoráveis para que os mesmos sejam considerados provados. Para além das suas próprias declarações, as arguidas não invocam outra prova, nem contestam a outra prova em que se baseou a sentença recorrida. Não pode, assim, dizer-se que a prova produzida impõe, nos termos do artigo 412º, nº 3, b), do Código de Processo Penal, quanto a este aspeto, decisão diferente da que foi tomada na douta sentença recorrida. Assim, deverá ser negado provimento ao recurso quanto a este aspeto. 4.2. - Vêm as arguidas e recorrentes alegar, por outro lado, que o nº 2 do artigo 183º do Código Penal, nos termos do qual foram condenadas, é inconstitucional, por contrário aos princípios da igualdade e da proporcionalidade. Invocam os artigos 13º, 18º, nº 2, e 266º, nº 2, da Constituição. Alegam que esse preceito é aplicável apenas aos profissionais do jornalismo, o que configura uma discriminação “em razão da instrução”. Se um mesmo texto for publicado na internet, num blogue ou num livro, integrará a previsão da alínea a) do número 1 desse artigo 183º; se for publicado por um jornalista num órgão de comunicação social, integrará a previsão do nº 2, de onde decorre a aplicação de uma pena mais grave e de um prazo de prescrição maior. Para alem disso, os limites da moldura da pena aplicáveis neste caso são exagerados e contrários ao princípio da proporcionalidade. Vejamos. Como é orientação constante e uniforme da jurisprudência do Tribunal Constitucional, não se verifica violação do princípio da igualdade quando um tratamento diferenciado se funda em motivos objetivos, racionais e justos, e não subjetivos, arbitrários ou discriminatórios. O princípio da igualdade não veda (e pode até impor em algumas circunstâncias) tratamentos diferenciados: proíbe que se trate de forma desigual o que é objetivamente igual, mas não que se trate de forma desigual o que é objetivamente desigual. Nos termos do artigo 183º, nº 1, a), do Código Penal, se uma difamação ou uma injúria for praticada através de meios ou em circunstâncias que facilitem a sua divulgação, as penas aplicáveis (de prisão até seis meses ou multa até duzentos e quarenta dias, em caso de difamação, e de prisão até três meses ou multa até cento e vinte dias, em caso de injúria) são elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo. Nos termos do nº 2 desse mesmo artigo, se algum desses crimes for cometido através de meio de comunicação social, a pena será de prisão até dois anos ou multa não inferior a cento e vinte dias. Antes de mais, deve esclarecer-se que, ao contrário do que alegam as recorrentes, não é a circunstância de o crime ser cometido por jornalista, por si, que constitui a agravante em causa; é o que facto de o crime ser cometido através da comunicação social (mesmo por quem não exerça o jornalismo como profissão). Por outro lado, e também ao contrário do que parecem entender as recorrentes, a prática do crime através da internet ou de um blogue, quando o acesso é generalizado e não restrito, também pode integrar a previsão do citado nº 2 do artigo 183º do Código Penal (ver, neste sentido, o acórdão desta Relação de 30 de outubro de 2013, processo nº 1087/12.9TAMTS.P1, relatado por Eduarda Lobo, acessível in www.dgsi.pt). Há que reconhecer que a diferença de tratamento em causa não é arbitrária, baseia-se numa diferença objetiva. A prática do crime através da comunicação social confere-lhe um alcance substancialmente maior, porque maior será o universo de leitores ou ouvintes e maior, portanto, a sua repercussão social. Dir-se-á que, em concreto, uma ofensa pode ser divulgada através de um meio com maior repercussão do que a de um determinado meio de comunicação social. Mas isso é o que se verifica sempre que estão em causa normas gerais e abstratas. Podem sempre verificar-se situações concretas que não correspondam à situação mais comum e típica. Se em geral a repercussão social de uma ofensa é maior quando praticada através da comunicação social (e não há, por isso, violação do princípio da igualdade quando se estabelece uma moldura abstrata da pena mais grave), pode tal não se verificar numa concreta situação. Para atender a estas particularidades, está o julgador, que a elas adequa a pena concreta, dentro da amplitude de uma moldura abstrata. E com a possibilidade dessa adequação, fica sempre salvaguardado o princípio da igualdade. Também não pode dizer-se que a pena decorrente do citado nº 2 do artigo 183º do Código Penal é exagerada e desproporcional. Não o é, desde logo precisamente porque permite a adequação às circunstâncias dos casos concretos. Permite, por exemplo, que no caso em apreço a pena aplicada tenha sido de cento e trinta dias de multa, o que, tendo em conta a gravidade da ofensa e suas consequências, não pode considerar-se, de modo algum, desproporcionado. 4.3. – Vêm as arguidas e recorrentes alegar que está preenchida, quanto à sua conduta, a previsão do nº 2 do artigo 180º do Código Penal. Estatui este preceito que a difamação não será punível quando a imputação for feita para realizar interesses legítimos (alínea a)) e quando o agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé, a reputar verdadeira (alínea b)). Alegam as recorrentes, por um lado, que a imputação foi feita para realizar interesses legítimos, ou seja, o direito e dever de informar no âmbito da chamada “imprensa cor-de-rosa”, que relata a vida dos “famosos”, personagens conhecidas do grande público, satisfazendo, assim, o interesse dos leitores dessa imprensa. Alegam, por outro lado, que agiram, de boa fé, na convicção de que a imputação era verdadeira e tinham fundamento sério para essa convicção, pois se basearam em informações provenientes de fontes fidedignas. Uma dessas fontes era alguém muito próximo do marido da assistente, em quem elas confiam por prestar informações ao jornal há mais de dez anos, sem nunca ter prestado informações falsas; outra fonte era alguém próximo de familiares da assistente; outra terá visto a assistente no estabelecimento de diversão noturna em questão e outra aí terá trabalhado. Essas testemunhas não se conheciam, eram de diferentes meios, nenhuma delas tinha qualquer inimizade com a assistente e todas elas confirmaram a referida informação. Mesmo sem ser conhecida a identidade das fontes em questão (por as arguidas estarem, a tal respeito, deontologicamente vinculadas a um dever de sigilo), o Tribunal tinha a possibilidade de aferir a sua qualidade e a sua proximidade aos factos relatados. Vejamos. Quanto ao facto de a imputação em causa ter sido realizada para a realização de interesses legítimos, a dúvida pode claramente suscitar-se e o douto acórdão recorrido chega a aflorá-la, embora acabe por aceitar, em termos não inteiramente categóricos, que esse pressuposto se verifica. Na verdade, estamos perante factos relativos à vida de uma pessoa que não exerce funções públicas, e à sua vida privada. Não estamos, pois, perante factos que devam estar sujeitos a escrutínio da opinião pública. O interesse informativo que possa aqui estar em causa não é o desse escrutínio (um verdadeiro interesse público), mas o de satisfazer a simples curiosidade do público. É verdade que a chamada “imprensa cor-de-rosa”se alimenta do relato de factos relativos à vida privada de pessoas famosas (a cujo estatuto terá ascendido a assistente devido ao seu relacionamento com o seu atual marido). É o conhecimento desses factos que procuram os leitores desse tipo de imprensa. E o próprio círculo de pessoas que são objeto desse tipo de jornalismo, que se deixa entrevistar ou fotografar nesse âmbito, em grande medida renuncia voluntariamente à tutela de alguns domínios da sua privacidade. Mas tal não significa que essas pessoas renunciem em absoluto a essa privacidade, ou que essas pessoas, por serem famosas (“personagens da história do nosso tempo”, como são designadas na doutrina alemã), deixem, pura e simplesmente, de ter direito à tutela da sua privacidade. No caso em apreço, não podemos concluir com segurança que a assistente tenha voluntariamente renunciado à tutela da sua privacidade no domínio em questão. Não é, pois, seguro que a conduta das arguidas seja ditada pela realização de interesses legítimos. De qualquer modo, e como o douto acórdão recorrido considerou, apesar de tudo, que esse pressuposto da causa de justificação prevista no citado nº 2 do artigo 180º do Código Penal, se verificava; vamos, antes, debruçar-nos sobre o outro pressuposto dessa causa de justificação (que esse acórdão considerou não se verificar): a prova da verdade da imputação, ou de que o agente tinha fundamento sério para, em boa fé, reputar como verdadeira essa imputação. Não está, agora, em causa a prova da verdade da imputação. Está em causa a prova de que as arguidas tinham fundamento sério para, em boa fé, reputarem como verdadeira essa imputação. Alegam elas que tinham fundamento sério para, em boa fé, reputarem como verdadeira a imputação em apreço, pois se basearam em fontes fidedignas e com conhecimento dos factos e que, mesmo sem ser conhecida a identidade das fontes em questão, o Tribunal a quo tinha a possibilidade de aferir a sua qualidade e a sua proximidade aos factos relatados. Se se provassem os factos alegados pelas arguidas e recorrentes, poderia, na verdade, considerar-se que elas tinham fundamento sério para, em boa fé, reputarem como verdadeira a imputação em causa. No entanto, são só as declarações das próprias arguidas que sustentam estas suas afirmações. É natural que a douta sentença recorrida não tenha considerado suficientes essas afirmações para considerar provados os factos respetivos. Não sendo identificadas as pessoas aludidas, não há qualquer forma de controlar a veracidade das afirmações das arguidas. Não é verdade que, como estas alegam, o Tribunal a quo tinha a possibilidade de aferir a qualidade e a proximidade em relação aos factos relatados das testemunhas em que elas se basearam (como, se essas testemunhas não são identificadas?). Sem a possibilidade desse controlo, seria muito fácil a qualquer jornalista forjar uma qualquer versão dos factos e com ela beneficiar da causa de justificação em questão. Há que sublinhar que o ónus da prova da verdade dos factos imputados, assim como do fundamento sério para os considerar verdadeiros, recai sobre quem faz a imputação. Não se trata de uma inadmissível exceção ao princípio in dúbio pro reo, pois a função pública dos meios de comunicação social cumpre-se só através da publicação de factos verdadeiros, ou justificadamente tidos como tais, recaindo sobre quem faz a imputação de factos desonrosos um certo risco pela sua conduta (ver, neste sentido, Figueiredo Dias, «Direito de Informação e Tutela da Honra no Direito Penal da Imprensa Português», in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 115º, pg. 172). Ou seja, a imputação de factos desonrosos sem a prova da sua veracidade, ou sem fundamento sério para os considerar verdadeiros, em caso de simples suspeita ou de dúvida sobre tal veracidade, configura um crime de difamação; para que este se verifique não é necessária a prova da falsidade da imputação, basta que não se prove a sua veracidade (ou o fundamento sério para considerar essa veracidade). Assim, deverá ser negado provimento ao recurso também quanto a este aspeto. 4.4. – Vêm as arguidas e recorrentes alegar, por outro lado, que a sentença recorrida viola a garantia de sigilo profissional dos jornalistas. Invocam o Estatuto dos Jornalistas, o seu artigo 6º, que consagra a garantia de sigilo profissional como direito fundamental dos jornalistas, e o seu artigo 11º, nº 1, que estatui que estes não são obrigados a revelar as suas fontes de informação, não sendo o seu silêncio passível de qualquer sanção, direta ou indireta. Ao considerar que, por não terem revelado a identidade das suas fontes, as arguidas não podem beneficiar da causa de justificação prevista no nº 2 do artigo 180º do Código Penal, a sentença recorrida está a sancioná-las, direta e indiretamente, pelo exercício legítimo de um direito. Vejamos. Não se discute, nem o douto acórdão recorrido discutiu, o direito e dever de sigilo profissional das arguidas, designadamente no que diz respeito à revelação da identidade das suas fontes de informação. Mas tal não significa que as arguidas, por serem jornalistas e invocarem o sigilo profissional, para beneficiarem da causa de justificação prevista no nº 2 do artigo 180º do Código Penal fiquem dispensadas da prova da verdade da imputação, ou da prova do fundamento sério para considerarem tal imputação verdadeira. Se assim fosse, fácil seria para um jornalista escapar a qualquer condenação por difamação, beneficiando sempre dessa causa de justificação. Bastaria alegar que se baseou em fontes fidedignas, invocando o sigilo profissional para não revelar a sua identidade e impedindo, assim, o controlo da veracidade dessas suas alegações. A liberdade de imprensa não pode prevalecer em absoluto sobre o direito à honra e consideração social de qualquer pessoa (artigo 26º, nº 1, da Constituição). E estaríamos –então, sim - perante uma violação do princípio da igualdade, pois essa possível impunidade só beneficiaria os jornalistas, não qualquer outra pessoa que cometesse um crime de difamação. A douta sentença recorrida não sancionou, pois, nem direta, nem indiretamente, as arguidas por terem exercido o seu direito de não revelar as suas fontes. Limitou-se a tirar as necessárias consequências da ausência de prova dos pressupostos da causa de justificação prevista no nº 2 do artigo 180ºdo Código Penal. Dir-se-á que os jornalistas ficarão sempre impedidos de beneficiar desta causa de justificação, por estarem sujeitos ao dever de sigilo profissional. Não é assim, pois sempre poderão fazer prova da veracidade da imputação, ou do fundamento sério para considerarem tal imputação verdadeira, de outra forma, através de outros meios que não impliquem a violação do seu sigilo profissional, ou porque não está em causa uma prova testemunhal, ou porque a testemunha em causa aceita ser identificada. Deve, pois, ser negado provimento ao recurso também quanto a este aspeto. 4. 5. – Vêm as arguidas e recorrentes alegar, por último, que agiram em erro sobre circunstâncias do facto, nos termos do artigo 16º do Código Penal, uma vez que estavam convencidas de que a imputação em causa era verdadeira. Não agiram, pois, com dolo. Já vimos que não há motivos para considerar provado, ao contrário do que consta do douto acórdão recorrido, que as arguidas atuaram convencidas de que a imputação em apreço era verdadeira. Mas mesmo que assim não se entendesse, mesmo que se considerasse provado que as arguidas estavam convencidas da veracidade dessa imputação, não estaríamos perante um erro sobre elementos de facto do tipo de crime de difamação, nos termos do artigo 16º, nº 1, do Código Penal. É que, como vimos, a falsidade da imputação não é elemento desse tipo de crime, mas antes o carater desonroso dessa imputação. Poderia invocar-se o erro sobre um pressuposto de facto de uma causa de justificação, nos termos do nº 3 do mesmo artigo. A causa de justificação seria a prevista no já referido nº 2 do artigo 180º do Código Penal. E o erro incidiria sobre a veracidade da imputação, um pressuposto de facto dessa causa de justificação. No entanto, não se pode admitir que por esta via se desvirtue a referida causa de justificação, Para que ela opere, não basta que o agente esteja convencido da veracidade da imputação, é necessário que ele prove essa veracidade ou o fundamento sério para reputar como verdadeira essa imputação. Considerar relevante o erro quanto a veracidade da imputação (independentemente da existência de fundamentos objetivos que tornem compreensível tal erro) seria dispensar o agente dessa prova, seria deixar entrar pela janela aquilo a que se fechou a porta, o que manifestamente contraria o espírito da lei. Assim, impõe-se negar provimento ao recurso também quanto a este aspeto. Cada uma das arguidas deverá ser condenada em taxa de justiça (artigo 513º, nº 1, do Código de Processo Penal e Tabela anexa ao Regulamento das Custas Processuais). 5. – Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em negar provimento ao recurso, mantendo-se o douto acórdão recorrido. Condenam cada uma das arguidas em 4 U.Cs de taxa de justiça. Notifique Porto, (processado em computador e revisto pelo signatário) Pedro Vaz Pato Eduarda Lobo |