Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | CARLOS PORTELA | ||
Descritores: | REGISTO COMERCIAL | ||
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Nº do Documento: | RP201109294847/10.1TBVFR.P1 | ||
Data do Acordão: | 09/29/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | REVOGADA. | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | O registo de nomeação de gerentes de sociedade por quotas, pedido com base em acta que não se mostre assinada por todos os sócios que tiverem tomado parte na respectiva assembleia, deve ser feito como provisório e por dúvidas. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Apelação nº4847/10.1TBVFR.P1 Tribunal recorrido: 4º Juízo Cível de Santa Maria da Feira Relator: Carlos Portela (331) Adjuntos: Des. Joana Salinas Des. Pedro Lima Costa Acordam na 3ª Secção (2ª Cível) do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório: Nos termos do disposto no artigo 104º do Código do Registo Comercial, foi remetido a juízo a impugnação judicial apresentada por B…, C…e D… relativamente à decisão pela qual se determinou que o registo da nomeação de dois gerentes da sociedade E…, Lda. fosse lavrado provisório por dúvidas. No requerimento de interposição do recurso de impugnação judicial os mesmos e em síntese, alegam que pretendiam registar a designação de C… e D… como gerentes da sociedade “E…, Limitada” e, para o efeito, apresentaram cópia certificada da acta da assembleia-geral de tal sociedade realizada em 30 de Dezembro de 2009, e lavrada pelo Notário Dr. F…, no cartório deste sito em Santa Maria da Feira. Mais dizem que o registo da designação daqueles dois gerentes começou por ser recusado pela Sr.ª Conservadora da 1ª Conservadora do Registo Comercial de Santa Maria da Feira porque a acta da assembleia-geral só foi assinada por quatro dos sócios presentes, esclarecendo que desse despacho de recusa, os requerentes, aqui impugnantes, interpuseram recurso hierárquico para a Direcção-Geral de Registos e do Notariado. Esclarecem que esse recurso veio a ser julgado parcialmente procedente por decisão proferida em 28 de Julho de 2010 e que concluiu no sentido da possibilidade do registo (ao contrário da decisão inicial de recusa), mas, apenas, em termos provisórios (por causa de dúvidas quanto à existência da própria deliberação social). Defendem que a acta que serviu de base à apresentação n.º 02/31.12.2009 é um documento autêntico pelo que faz prova plena dos factos que da mesma constam e está dotada de fé pública e que não cabe na competência das Conservatórias aferir do carácter probatório ou não dos documentos elaborados pelo Notário, pois a força probatória plena dos mesmos resulta apenas e tão só da lei. Consideram que o despacho da Conservatória, primeiro, e a decisão recorrida, depois, ao colocarem em causa a força probatória da acta elaborada pelo Notário, violaram e extravasaram as regras da competência das Conservatórias do Registo Comercial e da Direcção Geral de Registos e do Notariado. Entendem que é aos sócios que cabe apreciar, caso assim o entendam, se o impedimento de voto de que foram objecto tem ou não fundamento legal, e em última instância, é aos Tribunais que caberá declarar, a pedido daqueles, se esse impedimento foi ou não válido, não podendo a Conservatória imiscuir-se em tal. Afirmam que não cabe ao Conservador apreciar da existência ou não de motivo bastante para determinar o impedimento de voto que foi declarado na acta, e, subsequentemente, apreciar da existência ou não de uma deliberação válida, porquanto, tal apreciação impunha, na prática, que a Conservatória se substituísse aos Tribunais na apreciação dos factos que estão a ser objecto de várias acções judiciais. Dão a conhecer que dois dos sócios que se recusaram a assinar a acta da assembleia-geral de 30 de Dezembro que instruiu o pedido de registo e onde foram tomadas as deliberações que se pretendem ver registadas definitivamente, instauraram uma providência cautelar de suspensão de deliberações sociais e uma acção de anulação de deliberações sociais que têm por objecto, precisamente, as deliberações tomadas na assembleia geral em causa. Terminam pedindo que seja revogada a decisão recorrida, devendo esta ser substituída por outra que ordene que seja lavrado, de forma definitiva, o competente registo de nomeação de gerentes, conforme foi requerido pela Apresentação n.º ../……. Instruíram o processo de recurso com o requerimento dos requerentes e respectivos documentos e com certidão das seguintes peças: - da ficha de matrícula da sociedade comercial “E…, Lda.”, - do pacto social da sociedade; - da requisição de registo do acto impugnado; - da certidão notarial que instruiu o acto impugnado; - da resposta ao pedido de suprimento de deficiências; - do despacho de recusa; - do recurso hierárquico interposto; - do despacho de sustentação; - da decisão proferida no recurso hierárquico. Foram os autos com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público, tendo o mesmo defendido a improcedência do recurso, por considerar que as actas das assembleias-gerais que contenham deliberações dos sócios devem ser assinadas por todos os sócios, podendo sê-lo em momento posterior e, pese embora esteja prevista a possibilidade de as actas serem lavradas por notário, a lei não lhe atribuir um especial valor probatório que afaste o regime previsto nos artigos 63º, nº 3 e 248º, nº 6 do CSC. Foi então proferida decisão que julgou procedente por provada a presente impugnação e, em consequência, revogou a decisão recorrida determinando que o registo de nomeação dos gerentes C… e D… (apresentação nº../……), seja lavrado em termos definitivos. Inconformado com esta decisão dela veio recorrer o Presidente do Instituto dos Registos e do Notariado IP, apresentação desde logo as competentes alegações. Este recurso foi considerado tempestivo e legal, admitido como sendo de Apelação, com subida imediata, nos autos e efeito suspensivo do processo. Foram apresentadas contra alegações pelo Ministério Público e pelos Apelados B…, C… e D…. Recebido o processo nesta Relação foi proferido despacho que julgou o recurso como próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir o recurso em apreço. * II. Enquadramento de facto e de direito:A presente acção deu entrada em juízo no dia 18.10.2010. Assim sendo e atento o disposto nos artigos 11º, nº1 e 12º, nº1 do D.L. 303/2007 de 24 de Agosto, ao presente recurso não podem deixar de ser aplicadas as regras processuais postas a vigorar por este diploma legal. Ora como é por demais sabido e decorre do disposto nas regras conjugadas dos artigos 660º, nº2, 684º, nº3 e 685º-A, nº1 todos do Código de Processo Civil e sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, o objecto deste recurso está definido pelo teor das conclusões vertidas pelo Apelante nas suas alegações. E é o seguinte esse mesmo teor: 1ª) Os sócios que tenham estado presentes em assembleia geral devem dar testemunho das deliberações nela tomadas mediante a aposição da sua assinatura na respectiva acta e a sociedade tem o dever de requerer a notificação judicial avulsa dos sócios que não tenham assinado, podendo fazê-lo, para que a assinem num prazo não inferior a oito dias – cf. o disposto nos artigos 248º, nº6, 521º e 63º, nº3, todos do Código das Sociedades Comerciais. 2ª) A acta referida adquire força probatória mediante a assinatura da maioria dos sócios presentes na assembleia geral ainda que as assinaturas que permitam atingir essa maioria venham a ocorrer em momento posterior, como resulta da análise conjugada do prescrito nos nºs 1 e 3 do artigo 63º do citado código. 3ª) Contudo, os instrumentos de actas de reuniões de órgãos sociais lavrados pelo notário devem ser assinados por todos os sócios presentes na assembleia geral e pelo notário, quando respeitem a sociedades comerciais por quotas, sob pena de nulidade, por vício de forma, como decorre da análise conjugada do prescrito nos artigos 46º, nº6 e 70º, nº1, alíneas d) e e) do Código do Notariado. 4ª) Em regra, a referida nulidade pode ser sanada ou o acto revalidado, nos casos insusceptíveis de sanação, nos termos consagrados nos artigos 70º, nº2, alíneas c) e d) e 73º alíneas d) e e) do referido código. 5ª) Porém, faltando no aludido instrumento notarial a assinatura de alguns dos sócios presentes na assembleia geral da sociedade comercial por quotas, e sabendo-se, in casu, que o mesmo não é passível de sanação ou revalidação, o documento particular em causa fica desprovido da sua autenticidade, mas vale ainda assim como documento particular, revestindo a natureza de documento formalmente bastante para titular o registo de designação de gerentes peticionado. 6ª) No entanto, se existirem dúvidas acerca da existência da própria deliberação social, como acontece no caso configurado nos autos, o registo só poderá ser elaborado em termos definitivos em face de acertamento efectuado em acção judicial de simples apreciação. 7ª) Foram violadas as normas dos artigos 47º e 49º do Código de Registo Comercial. Nestes termos e nos demais que V.Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida e, em sua substituição, determinando-se a elaboração do registo em causa com a natureza de provisório por dúvidas. Quanto aos Apelados os mesmos sem concluir, acabam por pugnar pela improcedência do recurso e pela confirmação da decisão recorrida. Já o Digno Magistrado do MºPº na sua resposta, defende agora a procedência do recurso. * Como melhor consta da decisão recorrida, os factos a considerar, com interesse para a boa decisão da causa e que resultam documentalmente demonstrados, são os seguintes:1. No dia 30 de Dezembro de 2009, no cartório notarial sito à …, nº .., e perante o notário F…, teve lugar uma assembleia-geral dos sócios da sociedade comercial por quotas “E…, Lda.”, presidida pelo sócio G…; 2. Nessa assembleia-geral foi deliberado nomear gerentes da sociedade identificada em 1. C… e D…, deliberação essa que obteve os votos favoráveis de G…, C…, D… e B…, por si e aqueles que representam outros também em nome dos seus representados, num total de sete milhões setecentos e cinquenta e um mil trezentos e vinte votos. 3. Após o encerramento dos trabalhos, a acta da referida assembleia foi dada a assinar a todos os presentes só o tendo sido por quatro dos sócios presentes. 4. O Notário lavrou a seguinte declaração em acta: “Eu notário, F…, declaro que os restantes presentes H…, I…, J…, K…, L… e M…, apenas após as assinaturas acima constantes me declararam não assinar a presente acta, não o tendo feito antes de se anunciarem as assinaturas” após o que assinou.” 5. No dia 31 de Dezembro de 2009, B… entregou na Conservatória do Registo Comercial de Santa Maria da Feira o pedido de registo da nomeação dos gerentes, entregando, para o efeito, a acta lavrada pelo notário e referida em 3.; 6. No dia 02/02/2010, o registo foi recusado com os seguintes motivos: “1. A acta apresentada carece de força probatória plena. A assembleia-geral reuniu, perante Notário, com a presença da quase totalidade dos sócios, contudo, dos presentes, apenas 4 a assinaram, tendo atestado o Sr. Notário a recusa de assinatura dos restantes. Impõe o CSC, que as actas das assembleias-gerais “devem ser assinadas por todos os sócios que nelas tenham participado”. A não ser assim, devem os sócios que não assinaram ser notificados judicialmente, para o fazerem em prazo nunca inferior a 8 dia. Findo esse prazo a acta adquire força probatória se assinada pela maioria dos sócios que tomaram parte na assembleia. Se se verificasse tão só o vício supra o registo seria lavrado provisório por DÚVIDAS. 2. Contudo, importa ainda qualificar a deliberação social de designação de gerentes, que em concreto sustenta o pedido de registo. Sobre o ponto da ordem de trabalhos em particular, é invocada, a fls. 8, 11v e 12 da acta, pelo presidente da assembleia-geral, a impossibilidade de alguns sócios exercerem o direito de voto nos termos do artigo 251.º CSC. Não compete ao Conservador pronunciar-se sobre a viabilidade ou inviabilidade do impedimento de voto. Certo é que não se conhece deliberação, regra do contrato social ou decisão judicial que impossibilite o exercício do voto por qualquer dos sócios. Assim, não obstante a impossibilidade de voto invocada, os sócios pretensamente impossibilitados “rejeitaram” a designação, sendo que a globalidade do capital que representam, excluída a parte respeitante a quotas próprias da sociedade, constitui maioria que permite concluir pela não aprovação da proposta de designação de gerentes – assim, o facto não está titulado nos documentos apresentados, o que conduz a RECUSA”. 7. Deste despacho de recusa, interpuseram os aqui impugnantes recurso hierárquico para o Director-Geral dos Registos e do Notariado defendendo que a acta que serviu de base ao pedido de registo do acto de nomeação de gerentes tem força probatória plena, por ser documento autêntico, pelo que não pode ser posta em causa pelo Conservador ou Notário, que é desnecessária a notificação dos demais sócios para assinarem a acta uma vez que a reunião de assembleia-geral foi presidida por notário e tais sócios já recusaram, perante o notário, assinar tal acta e que a análise pela conservatória da validade da deliberação constitui acto que só cabe aos Tribunais. 8. Por despacho proferido a 11 de Março de 2010, a Exma. Sra. Conservadora sustentou a decisão de recusa. 9. O recurso obteve deferimento parcial tendo sido determinado que o registo fosse efectuado como provisório por dúvidas ao abrigo do disposto no artigo 49º do CRC. Para fundamentar a decisão proferida, o Conselho Técnico do IRN entendeu que a “acta referida adquire forca probatória mediante a assinatura da maioria dos sócios presentes na assembleia-geral ainda que as assinaturas que permitam atingir essa maioria venham a ocorrer em momento posterior”. “Faltando no aludido instrumento notarial a assinatura de alguns dos sócios presentes na assembleia geral da sociedade comercial por quotas, e sabendo-se, in casu, que o mesmo não é passível de sanação ou revalidação, o documento em causa fica desprovido da sua autenticidade, mas vale ainda assim como documento particular, revestindo a natureza de documento formalmente bastante para titular o registo de designação de gerentes peticionado”. “No entanto, se existirem dúvidas acerca da existência da própria deliberação social, como acontece no caso configurado nos autos, o registo só poderá ser elaborado em termos definitivos em face do acertamento efectuado em sede de acção judicial de simples apreciação”. 10. I… e H… instauraram procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais e também a respectiva acção de anulação de deliberações sociais, pendentes no 3.º Juízo Cível deste Tribunal, tendo formulado, respectivamente, os pedidos de suspensão da execução e de declaração de inexistência, ou ineficácia, ou nulidade e de nenhum efeito, ou ainda de anulabilidade da deliberação de nomeação para gerentes da sociedade de C… e D…; * Perante ao antes exposto, resulta claro que a questão que nos é colocada no âmbito deste recurso é a de saber se existe ou não fundamento para revogar a decisão recorrida e, em consequência, determinar a elaboração do registo em apreço mas com a natureza de provisório por dúvidas.Como já vimos, na mesma decisão, a MMª Juiz “a quo” entendeu que o pedido de impugnação judicial formulado merecia provimento e, em consequência, revogou a decisão antes proferida e determinou que o mesmo registo fosse lavrado em termos definitivos. Fundou tal decisão e em suma, na inexistência de fundamentos para que tal registo não pudesse ser efectuado em termos definitivos, essencialmente, porque, mesmo que se considere nula por falta de forma, a acta notarial melhor descrita nos pontos 1) a 4) dos Factos Provados, sempre a mesma e ainda que não valendo como documento autêntico, poderia nos termos das disposições conjugadas dos artigos 63º do Código das Sociedades Comerciais e 32º do Código de Registo Comercial, justificar tal registo. Mas salvo melhor opinião, tal decisão merece a nossa censura. Senão vejamos. Do conjunto de factos provados já antes descritos consideramos que são mais relevantes para a decisão agora proferir, os seguintes: No dia 31.12.2009 foi apresentado junto da Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira, o pedido de registo da designação de dois sócios gerentes da sociedade E…, Ldª. Tal pedido teve por base uma fotocópia certificada da acta lavrada no dia 30.12.2009 no Cartório Notarial de Santa Maria da Feira e perante o respectivo notário Dr. F…. Da mesma acta e entre o mais, constava que apenas quatro dos sócios então presentes procederam à respectiva assinatura e que a maioria dos sócios ali presentes, declarou expressamente ao aludido Notário que iriam proceder à assinatura da mesma acta, manifestação de vontade que ficou a constar expressamente de tal acto. O supra referido pedido de registo foi recusado por despacho de 2.02.2010 e entre o mais, por se entender que a acta em apreço carece de força probatória plena, pelo facto de não estar assinada por todos os sócios presentes na já antes aludida assembleia-geral do dia 31.12.2009. Notificados de tal decisão vieram três dos sócios da dita sociedade interpor recurso hierárquico da mesma, defendendo para além do mais que a acta em apreço é um documento autêntico, que faz prova plena dos factos dela constantes e que está dotada de fé pública por ter sido elaborada por um Notário no cabal exercício das suas competências e que a notificação judicial dos sócios que não assinaram a acta para procederem no prazo à ditas assinatura, não tem qualquer sentido, uma vez que a recusa teve lugar perante o notário que é uma autoridade pública. Concluíram nos termos já antes aqui melhor referidos, solicitando que o peticionado registo seja efectuado em termos definitivos. O mesmo recurso hierárquico acabou por ter provimento parcial, sendo determinado que o registo fosse efectuado como provisório por dúvidas. E isto por se considerar que existem dúvidas acerca da existência da própria deliberação social, dúvidas essas que só podem ser superadas dando lugar ao registo definitivo, em consequência de correcção (acertamento), efectuada em sede de acção judicial de simples apreciação, oportunamente intentada para o efeito. Perante tais elementos, foi proferida a decisão recorrida a qual e como já dissemos, nos merece censura, antes se justificando a plena adesão aos argumentos recursivos esgrimidos pelo Apelante nas suas alegações. Na verdade, tem a mesma razão quando considera que não cabia nem à Sr.ª Conservadora, em primeiro lugar nem ao Conselho Técnico do IRN, em segundo lugar, apreciar da legitimidade legal do impedimento do exercício de voto de alguns dos sócios presentes e, consequentemente da validade ou invalidade das deliberações sociais em apreço, á que a competência para o efeito cabe exclusivamente aos Tribunais em sede própria. Na verdade, como é por demais sabido e decorre nomeadamente do disposto no artigo 53º do Código das Sociedades Comerciais, as deliberações dos sócios, são em regra, tomadas em assembleias-gerais nas quais devem participar os sócios, presencialmente ou por representação. É igualmente aceite que as deliberações tomadas em tal acto devem ser vertidas numa acta, a qual deve ser assinada por todos os sócios que tiverem tomado parte na respectiva assembleia. Quanto existam sócios que tendo estado presentes e tendo podido assinar tal documento, o não tenham feito, cabe chamar à colação o disposto no nº3 do art.63º do CSC. Assim, verificada que seja tal situação, prescreve o mesmo artigo que devem aqueles ser judicialmente notificados pela sociedade para no prazo de oito dias, procederem às assinaturas em falta. O mesmo determina que decorrido o antes aludido prazo e desde que assinada pela maioria dos sócios participantes na assembleia, a acta passa a ter a força probatória referida no seu nº1, cujo teor aqui recordamos: “As deliberações dos sócios só podem ser provadas pelas actas das assembleias ou, quando sejam admitidas deliberações por escrito, pelos documentos donde elas constem.” E isto sem prejuízo dos direitos dos sócios que não assinaram a mesma acta, virem a invocar em juízo a sua falsidade. Continua a ter razão o Apelante quando aludindo ao disposto no nº6 do mesmo artigo, recorda que os instrumentos de actas e reuniões também podem ser lavrados notarialmente quando a assembleia assim o delibere ou a pedido de qualquer dos sócios, não deixando de alertar para o facto de o notário não ficar investido na função de controlo da legalidade da reunião, a qual continua a pertencer à assembleia. Já quanto à disciplina de tais instrumentos notariais, é certeira a afirmação de que os mesmos são regidos pela lei notarial, (cf. art.46º, nº1 do Código do Notariado), devendo no caso de sociedades comerciais por quotas, como é a dos autos, ser assinados por todos os sócios presentes na reunião dos respectivos órgãos sociais. Subscrevemos igualmente a ideia de que nos termos do disposto nos artigos 369º e 370º do Código Civil, os instrumentos notariais e desde que preencham os requisitos legalmente impostos, revestem a forma de documentos autênticos e que tendo por base a percepção da entidade documentadora, fazem prova plena dos factos neles atestados, prova essa que só pode ser posta em causa através da dedução do competente incidente de falsidade. Assim sendo, ao Notário cabe pois apenas e só, historiar os factos ocorridos tal como estes foram apreendidos pelos seus sentidos (cf. art.371º, nº1 do CC). Já quanto à “justeza desse acertamento”, (no qual e como já vimos, o documentador não intervém) e diversamente, dúvidas não existem de que a mesma pode ser afastada nos temos gerais, quer por prova em contrário quer por contraprova. Ora na situação concreta e como já vimos, o acto notarial em apreço não foi assinado por todos os sócios presentes, circunstância que nos termos das disposições conjugadas dos artigos 46º, nº6 e 70º, nº1 alíneas d) e e) do CN e 48º, nº1 do Código do Registo Comercial, conduziriam à nulidade do mesmo acto e, consequentemente, à recusa do correspondente registo. No entanto e como também defendemos, os actos notariais que enfermem de nulidade nos casos que não são susceptíveis de sanação, podem ser objecto de sanação ou de revalidação, nos termos previstos nos artigos 70º, nº2, alíneas c) e d) e 73º, alíneas d) e e) do CN. Já vimos em que termos se realizou a assembleia da sociedade E…, Ld.ª e como é que foi elaborada a respectiva acta no Cartório Notarial de Santa Maria da Feira, sendo certo que face ao antes melhor exposto, o mesmo documento apenas pode manter a força probatória de documento particular avulso que decorre do nº7 do artigo 63º do CSC (neste sentido e entre outros, ver o Professor Menezes Cordeiro, Código das Sociedades Comerciais, 2009, a pág.241). Como avisadamente afirma o Apelante nas alegações, a necessidade de notificação judicial dos sócios presentes na assembleia e que então não assinaram a respectiva acta, foi em tempo oportuno liminarmente afastada em sede hierárquica, nomeadamente porque tal mecanismo não se compadece com a disciplina aplicável aos actos notariais por estar exclusivamente pensada para as actas lavradas por entidades privadas (cf. os artigos 70º e 73 do CN). É ainda de subscrever a ideia já antes salientada de que não cabia à Sr.ª Juiz “a quo”, emitir juízo relativamente à apreciação pelo Apelante da matéria que respeita à verificação da existência de impedimentos ao exercício do direito de voto da sociedade em apreço, matéria que é, recorde-se, da exclusiva competência dos tribunais. Antes se deve defender, como faz o IRN. I.P., que perante as diversas vicissitudes de que padece a acta em questão, “é legítimo concluir pela dúvida quanto à existência da própria deliberação, razão pela qual o registo só poderá ser definitivamente efectuado em face de acertamento definitivo sobre a existência de deliberação (positiva), através de acção de simples apreciação.” E isto por “se dever ter designadamente em conta que, por um lado, o presidente da mesa da assembleia geral não declarou que a proposta de designação de gerentes tenha sido aprovada, por outro, atenta a junção das duas declarações escritas apresentadas por um grupo de sócios, alegadamente maioritário, no sentido da suspensão da assembleia (cf. artigos 387º, nº1, e 248º, nº1 do CSC) e da rejeição da pretensa designação eventualmente tomada após aquela suspensão.” A ser assim e perante o acabado de dizer, somos a concluir que embora não seja da sua competência avaliar da existência ou não da deliberação em apreço, o responsável pela avaliação do pedido de registo, não pode ignorar as “irregularidades” que tenham ocorrido no processo deliberativo, e que podem questionar a sua “credibilidade”. Deste modo, outra solução não resta que não seja a de considerar que o acto peticionado, só como provisório por dúvidas pode ser realizado. E tudo ao abrigo do disposto no art.49º do CRC. Em suma, procedem totalmente os argumentos recursivos do Apelante, impondo-se por isso a revogação da decisão proferida em 1ª instância. * Sintetizando a argumentação nos termos do nº7 do artigo 713º do CPC:1.Os sócios que tenham estado presentes em assembleia-geral da respectiva sociedade comercial, devem dar testemunho das deliberações tomadas mediante a aposição da sua assinatura na respectiva acta e a sociedade tem o dever de requerer a notificação judicial avulsa daqueles que a não tenham assinado, podendo fazê-lo, para que a assinem num prazo não inferior a oito dias. 2.Os instrumentos de actas de reuniões de órgãos sociais lavrados por notário e sob pena de nulidade por vício de forma, devem ser assinados por todos os sócios presentes na assembleia-geral e pelo notário, quando respeitem a sociedade comerciais por quotas. 3.Faltando no aludido instrumento notarial a assinatura de alguns dos sócios presentes na assembleia-geral de uma sociedade comercial por quotas, e sabendo-se que no caso, o mesmo não é passível de sanação ou revalidação, o documento em causa fica desprovido das sua autenticidade, mas vale ainda assim, como documento particular. 4.Se existirem dúvidas acerca da existência da própria deliberação social, o registo de designação de gerentes, só poderá ser elaborado em termos definitivos em face de acertamento efectuado em acção judicial de simples apreciação. * III. Decisão:Pelo exposto, julga-se procedente o presente recurso de Apelação e, em consequência, revoga-se a decisão proferida, determinando-se que o registo requerido seja elaborado com a natureza de provisório por dúvidas. * Custas do presente recurso a cargo dos Apelados (cf. artigo 446º, nºs 1 e 2 do CPC).* Notifique.Porto, 29 de Setembro de 2011 Carlos Jorge Ferreira Portela Joana Salinas Calado do Carmo Vaz Pedro André Maciel Lima da Costa |