Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0536911
Nº Convencional: JTRP00038802
Relator: FERNANDO BAPTISTA
Descritores: CONCORRÊNCIA DESLEAL
Nº do Documento: RP200602090536911
Data do Acordão: 02/09/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA.
Área Temática: .
Sumário: I- Para que se possa falar em «concorrência desleal» é essencial que as actividades económicas prosseguidas pelos dois – ou mais – empresários sejam afins.
II- Na definição de «concorrência desleal» continua a ser válido o Parecer da Procuradoria Geral da República nº 17/57, de 30.05, que referia constituírem «concorrência desleal os actos, repudiados pela consciência normal dos comerciantes como contrários aos usos honestos do comércio, que sejam susceptíveis de causar prejuízo à empresa dum competidor pela usurpação, ainda que parcial, da sua clientela».
III- Trata-se de um conceito móvel, com contornos vagos e oscilantes.
IV- O proémio do (actual) artigo 317º do Cód. da Prop. Ind. - tal como o do anterior artº 260º do mesmo Código-- é uma cláusula geral, de adaptabilidade à evolução sócio-económica. Pelo que, neste domínio, não há necessidade de recorrer à analogia ou à interpretação extensiva.
V- Inexistindo no nosso ordenamento jurídico um regime específico e autónomo de responsabilidade por actos de concorrência desleal, no enquadramento jurídico da ilicitude e da responsabilidade civil por aquela concorrência desleal é de aplicar o regime jurídico da responsabilidade por factos ilícitos ou extracontratuais previsto no artº 483º do CC.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I. RELATÓRIO:

No ..º Juízo do Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim, B......, Lda. intentou declarativa de condenação sob a forma ordinária contra, C........ e D.......

Pede:
A condenação dos RR. a absterem-se da prática dos actos de concorrência desleal que têm vindo a praticar contra a A. e a condenação dos mesmos a pagarem-lhe a quantia de 13.000.000$00 a título de danos que já sofreu em consequência de tais actos de concorrência desleal e ainda no que se vier a liquidar em execução de sentença por utilização abusiva de equipamentos certificados – caixas de desratização – da A.

Os RR. contestaram, impugnado que alguma vez se tenham associado para fazer concorrência á A., que apenas o 1º R. exerce por conta própria a actividade de desinfestação, trabalhando o 2º R. sob as suas ordens e direcção; actividade em que nunca praticou qualquer acto de concorrência desleal para com a A.
Concluem pela improcedência da acção.

Na resposta a A. concluiu na p.i.

Teve lugar o julgamento da causa pela forma prevista na lei, após o qual o tribunal respondeu à matéria de facto da base instrutória pela forma que consta de fls. 334 a 336.

Finalmente, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, com a absolvição dos RR do pedido.

Inconformada com o sentenciado, veio a autora interpor recurso, apresentando alegações que remata com as seguintes

“CONCLUSÕES:
1 - Após terem cessado a actividade profissional que exerciam ao serviço da A, enquanto trabalhadores desta, os RR estabeleceram-se por conta própria e levaram a efeito um projecto empresarial cujo segmento de actividade é o mesmo da apelante - desinfecção/desratização de estabelecimentos comerciais.
II - Ao iniciarem a sua actividade empresarial os RR decidiram afastar a A do mercado, passando a ocupar eles próprios o espaço até então ocupado por aquela.
III - Para atingirem esse fim, os RR serviram-se do conhecimento que tinham da lista de clientes da A, dos equipamentos, produtos e técnicas utilizadas por esta, sendo certo que adquiriram esses conhecimentos enquanto empregados da A..
IV - Os RR adquiriram equipamentos e produtos iguais aos utilizados pela A, mandaram confeccionar autocolantes idênticos aos desta e munidos da tabela de preços visitaram todos os clientes da a, oferecendo-lhe os mesmos serviços por preço mais baixo e anunciando falsamente, pelo menos a um cliente, que a A tinha fechado as suas instalações.
V - Ao estabelecerem os preços para os serviços que se propunham prestar, os RR não tiveram em conta os custos que iriam suportar, a margem de lucro que iriam retirar e os preços correntes de mercado para iguais serviços, tendo apenas e tão só como ponto de referência os preços praticados pela A..
VI - A actuação dos RR foi organizada e sistemática, tendo como objectivo a eliminação da A do mercado, substituindo-se eles próprios à A..
VII - Em consequência do "ataque" perpretado pelos RR, a A sofreu uma redução de cerca de 50% no seu volume de negócios.
VIII - Os RR não se limitaram a criar uma empresa destinada a concorrer com a A no mesmo mercado.
IX - Os RR porque conheciam todos os segredos, técnicas, produtos, clientes e preços da A, criaram uma empresa que, aos olhos dos clientes da A, era uma cópia desta, com uma vantagem acrescida, praticava preços mais baixos.
X - O comportamento dos RR não se insere no normal funcionamento do mercado livre e concorrencial, pelo contrário, é claramente violador das normas e usos honestos de qualquer actividade económica, configurando situação típica de concorrência desleal.
XI - Ao agirem da forma dada como provada, os RR constituíram-se na obrigação de indemnizar a A pelos prejuízos sofridos em consequência desse comportamento desleal nos termos do disposto no artº 483º do C. Civil.
XII - A sentença recorrida violou, entre outros, os artºs 317º do C.P.I. e os artºs 483 e 487º do C.Civil.

Nestes termos e pelo que doutamente será suprido,
Deve ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida e julgando-se a acção procedente e provada”.

Os recorridos contra-alegaram, sustentando a manutenção da sentença.

Foram colhidos os vistos legais.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II. 1. AS QUESTÕES:

Tendo presente que:
- O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil);
- Nos recursos se apreciam questões e não razões;
- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,

A questão - ou questões, se quisermos-- a resolver consiste em saber se os réus, ao actuarem do modo que os factos provados patenteiam, violaram as normas e usos honestos da respectiva actividade económica - actuando em concorrência desleal para com a Autora - e, em caso afirmativo, quais as consequências.

II. 2. FACTOS PROVADOS:

Na 1ª instância deram-se como provados os seguintes factos:

1. A A. dedica-se, para além da venda e montagem de equipamentos de hotelaria e escritório, a desinfecções em estabelecimentos comerciais e casas particulares.
2. Os RR. foram empregados da A., o R. C........ até 10.2.1997 e o D...... até ao dia 1.2.1997.
3. A área de trabalho efectivo dos RR. compreendia o segmento de desinfecção.
4. Os RR. pelo exercício das suas funções enquanto funcionários da A. tinham acesso à lista de clientes, aos equipamentos e aos produtos por esta utilizados na sua actividade de desinfecção.
5. Após ter deixado de trabalhar para a A., o R. C......a passou a visitar a generalidade dos clientes daquela.
6. O R. C....... nas circunstancias referidas na resposta ao art. 2º anunciou a pelo menos a um cliente da A. que esta tinha fechado as suas instalações.
7. Os preços praticados pelo R. C......, porque conhecia os da A. e teve acesso aos contratos celebrados por sta, eram mais baixos que os praticados pela A..
8. Na sequência das visitas efectuadas pelo R. C...... referidas na resposta ao art. 2º, rescindiram os contratos com a A. cerca de 80 clientes desta.
9. Sendo o valor anual desses contratos de cerca de 4.000.000$00.
10. A A. com intuitos publicitários, afixa nas janelas ou portas dos estabelecimentos por si assistidos, um autocolante especial.
11. Como consequência da rescisão de contratos referida na resposta ao art. 8º a A. deixou de auferir uma quantia não inferior a 30.000,00€.


III. O DIREITO:

Não vem impugnada a matéria de facto. O que significa que, não se vislumbrando alteração da mesma por via da aplicação do artº 712º do CPC, é com a factualidade dada como assente no tribunal a quo que teremos de apreciar a questão suscitada nas conclusões da apelação (cfr. nº 6 do citado artº 712º).

A questão central a decidir consiste, como vimos, em saber se os factos provados consubstanciam concorrência desleal por banda dos réus em relação à Autora - isto é, se com a sua actuação violaram as normas e usos honestos da respectiva actividade económica.

Entende a apelante que a actuação dos réus foi desleal e/ou desonesta, que “não se insere no normal funcionamento do mercado livre e concorrencial”, ao passo que os recorridos sustentam que “sempre actuaram de acordo com as normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade”.
Isto é, fundamenta a autora a sua pretensão na concorrência desleal por banda dos réus, após terem deixado de trabalhar para si e passado a trabalhar por conta própria e no mesmo ramo de actividade da autora.
Qui juris?

Impõe-se, assim, desde logo, definir e desenvolver o conceito de concorrência desleal.

Antes de mais, como se extrai da própria expressão, para haver “concorrência desleal” obviamente que tem de haver duas formas de acto: o acto de concorrência -- que é necessariamente permitido, lícito - e o acto de “concorrência desleal” - que sem aquele primeiro não pode verificar-se e que é proibido, ilícito.
Por outro lado, para que se possa falar em concorrência é essencial que as actividades económicas prosseguidas pelos dois – ou mais – empresários sejam afins [Era o que ensinava Carnelitti, que afirmava que concorrer vem do étimo latino cumcurrere, que significa correr em conjunto para a conquista dum bem: o cliente ou o mercado e que, só em face de cada caso concreto, se pode determinar se existe ou não concorrência ( apud Franceschelli, Studi Riuniti di Diritto industriale, Giufrè , Milano, 1959, pág. 356)]

Não vamos aqui discorrer sobre as noções técnicas da ciência económica.
O acto de concorrência existe sempre que uma empresa, ou surgindo como um novo vendedor, ou modificando as condições da sua oferta, perturba em relação a um dado mercado de procura de certos produtos idênticos ou afins, as condições da transacção que os interessados estão dispostos a aceitar, e a liberdade de escolha do interveniente com o qual essa transacção será mais vantajosa.
Por outro lado, é manifesto que a concorrência tem - e não pode deixar de ter, sob pena de se cair numa autêntica selva - os seus limites: uns resultantes (directa e expressamente) da lei e outros estabelecidos por acordo das partes dentro dos limites permitidos pela lei (limites convencionais).
Mas a proibição da concorrência desleal é totalmente distinta das limitações da liberdade de concorrência.
Efectivamente, a concorrência desleal não só pressupõe, para poder existir, a liberdade de concorrência, como é mesmo um seu complemento necessário, um meio de garantia dessa mesma liberdade.
Os actos qualificados como desleais são proibidos não com a finalidade de limitar ou restringir a concorrência, mas, bem pelo contrário, com a justificação de que, de outro modo, a concorrência não poderia atingir o seu objectivo, que é o de permitir o triunfo das empresas que os consumidores reputem mais dignas de sucesso.
Se se permitissem os actos de confusão entre as empresas, não teria sentido a concorrência, pois a actividade desenvolvida por uma empresa poderia ser atribuída a outra e, assim, a maior procura dos produtos daquela, como justo prémio dessa mesma actividade, verificar-se-ia em relação à segunda. Deste modo, seria traído o direito, que a liberdade de concorrência procura assegurar a cada empresário, de receber a recompensa justa da actividade despendida.
No acto da concorrência desleal o que é proibido é o meio desleal por que ele foi praticado, a modalidade de concorrência que ele revestiu, a incorrecção da actuação que por ele se manifestou, e não a actividade desenvolvida, o facto de ser um acto concorrente.
Portanto, se concorrência é esforço no campo da actividade económica de outrem, no sentido de atrair clientela, é, porém, desleal quando exercida com fraude.

A concorrência desleal é um acto ilícito, civil e penalmente.
Actualmente a noção é dada pelo artº 317º do Cód. da Prop. Industrial - aprovado pelo Dec.-Lei nº 36/2003, de 5.3 Código este que veio, ainda “clarificar, corrigir, simplificar e aperfeiçoar o Código da Propriedade Industrial aprovado pelo Decreto –Lei nº 16/95, de 24 de Janeiro” (ut relatório preambular) - noção essa que é idêntica à que anteriormente vigorava, e que é a seguinte:
“Constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade económica” - seguindo-se a exemplificação de situações em que tal “concorrência desleal” se verifica.
Na esteira da legislação europeia -- onde a concorrência desleal é tratada como simples acto ilícito--, também entre nós, é acto ilícito gerador de responsabilidade de perdas e danos.
O actual artº 317º citado supra - tal como o artº 260º do DL 16/95 e o artº 210º do anterior diploma (CPI) - representa uma quase tradução do disposto no artº 10º bis da Convenção da União de Paris (ver Bigotte Chorão, Notas sobre o Âmbito da Concorrência Desleal R.O.A., 1995, 713º ss).
A referência aos «usos» significa um apelo a «padrões sociais de comportamento» a «padrões extrajurídicos de conduta» (Oliveira Ascensão, Direito Comercial II, págs. 54 e 59).
Trata-se, portanto, de um conceito móvel.
A norma geral incriminadora é a do corpo do artº 260º e actualmente do artº 317º, sendo as suas várias alíneas ou números apenas indicação das hipóteses expressamente previstas, por serem os actos de concorrência desleal mais importantes ou de concorrência mais frequentes.
Assim, é acto de concorrência desleal qualquer conduta, mesmo que não inserida em qualquer das aludidas alíneas ou números, desde que praticada em concorrência e contrária às normas e usos honestos de determinado ramo de actividade económica, não havendo necessidade de recorrer à analogia ou à interpretação extensiva (ut Jorge Paul, Concorrência Desleal, págs. 92-93).
É, assim, o proémio de tal artigo uma cláusula geral, de adaptabilidade à evolução sócio-económica.
Também o Prof. Ferrer Correia, in Lições de Direito Comercial, 1º, 224, escrevia que concorrência desleal é todo o acto susceptível de criar confusão com o estabelecimento, os produtos, os serviços ou o crédito dos comerciantes, qualquer que seja o meio empregado.
Assim se vê, portanto -- como escreve Jorge Paul, in Concorrência Desleal, págs. 92,93 --, que para que se verifique concorrência desleal tem de ter lugar uma conduta praticada em concorrência, mas contrária às normas e usos honestos de determinado ramo de actividade económica. Daqui que não havendo susceptibilidade de determinar erro ou confusão, não faça sentido falar em concorrência desleal.
Efectivamente - como o mesmo autor refere (ob. cit., a págs. 41/42)-- «os actos qualificados como desleais são proibidos, não com a finalidade de limitar ou restringir a concorrência, mas, bem pelo contrário, com a justificação de que, de outro modo, a concorrência não poderia atingir o seu objectivo, que é o de permitir o triunfo das empresas que os consumidores reputem mais dignas de sucesso… No acto de concorrência desleal é o meio desleal por ele praticado, a modalidade de concorrência que ele revestiu, a incorrecção da actuação que por ele se manifestou…».

O certo, porém, é que nem sempre é fácil determinar quando se está perante uma conduta integradora de concorrência desleal. É que, como já em 1908 escrevia Bonfante (Ver.Dir. Com., vol. II, pág. 164), «a concorrência desleal é uma nebulosa de consciência duvidosa com contornos vagos e oscilantes».

Vistas as coisas de outro ângulo, igualmente resulta do explanado que se pode, então, falar num direito à leal concorrência - exigível por todos os comerciantes --, o qual se concretiza no direito à abstenção, por parte dos concorrentes, de todos os actos susceptíveis de prejudicar a obtenção do resultado económico considerado legítimo, de acordo com o mecanismo da liberdade de concorrência. É um direito pessoal com conteúdo patrimonial (Patrício Paul, Concorrência Desleal, cit.,1965, 151).

Impõe-se, assim, ver se a conduta dos réus deve, ou não, ser, censurada. E só o poderá ser, não por ser concorrente da actividade da autora - dedicam-se ambos à mesma actividade - mas apenas sendo desenvolvida de forma incorrecta, desleal, para com a mesma.

Antes, porém, referira-se que estando em causa uma alegada retirada de clientela da autora por parte do réu - ou réus -, não é pelo simples facto de, eventualmente, a clientela se ter desviado da autora para os réus que se pode dizer que estes tiveram uma conduta desleal, contrária às normas e usos do respectivo ramo de actividade económica.
É certo que a concorrência desleal se fundamenta na protecção do estabelecimento, como organização concreta, posicionada no mercado, de factores produtivos, especialmente a clientela sua principal projecção exterior.
No entanto, não se pode deixar de considerar que a clientela é, de per si, algo de movediço que, naturalmente, se desloca em função da qualidade do serviço, da forma de apresentar os produtos, do seu preço e qualidade, de uma enorme variedade de factores de ordem económica, social, sociológico e psicológica (ac. da Rel. do Porto de 14.03.1996, Col. Jur., 1996, ano XXI, Tomo II, págs. 200 a 202).

Temos, assim, que se impõe continuar a seguir o parecer da Procuradoria Geral da República nº 17/57, de 30.05.57, in Bol. 69º-449 a 456, e D. do G., II Série, de 20.7.957, que escrevia constituírem «concorrência desleal os actos, repudiados pela consciência normal dos comerciantes como contrários aos usos honestos do comércio, que sejam susceptíveis de causar prejuízo à empresa dum competidor pela usurpação, ainda que parcial, da sua clientela».
E é neste entendimento do conceito de «concorrência desleal» que se fará a análise dos factos provados.

Sobre os actos de aproveitamento com que o concorrente se «enfeita» para criar confusão com o outro concorrente, beneficiando da respectiva clientela, pode ver-se a Revista da Faculdade de Direito de Lisboa, vol. XXXVII, ano 1996, a págs. 79 a 86 (pontos 16 17 e 18).

Saliente-se que a lei se basta com a prática de um acto que seja contrário aos usos honestos do comércio, não exigindo - embora a concorrência desleal seja considerada como delito penal - que o acto praticado seja, em si mesmo, penalmente ou até civilmente ilícito, e é-lhe indiferente o tipo de actuação, dolosa ou meramente culposa, do agente.
Com efeito, a ilicitude do acto provém exclusivamente de ser enquadrável no tipo legal de «Concorrência Desleal».
Tal ilicitude verifica-se, portanto, independentemente até de intenção do concorrente (Acs. STJ de 13.11.1973, Bol. 231º-181; e da Rel. de Lisboa, de 11.10.1974, Bol. 240º-267).
Daí que para haver concorrência desleal não seja necessária a culpa do agente (Roubier, Le Droit de Proprieté Industrielle, Paris, 1952, vol. I, pág. 513, em anotação ao artº 1.382 do Código Civil Fracês).

Como dissemos já, para que exista um acto de concorrência desleal, tem de se estar perante uma actividade dos comerciantes afins ou que se esteja perante uma afinidade dos produtos.
A lei não define o conteúdo da afinidade. Pelo que esta tem de ser apreciada, em todos os casos, tendo como base os destinos e aplicações idênticos, isto é, a mesma utilidade e afinidade dos produtos, tendo a jurisprudência suprimido a omissão e considerando afins os produtos quando estes são concorrentes no mercado, quando traduzem a mesma actividade e o mesmo fim (Acs. STJ de 3.4.70, Bol. 196-265; de 13.2.1979, Bol. 234-238; e de 21.5.1981, Bol. 307-291).

Provados ficaram na primeira instância os seguintes factos com relevo para a questão que ora nos ocupa:
- A A. dedica-se, para além do mais, a desinfecções em estabelecimentos comerciais e casas particulares.
- Os RR. foram empregados da A. até Fevereiro de 1997, compreendendo a sua área de trabalho naquela o segmento de desinfecção.
- Os RR. pelo exercício das suas funções enquanto funcionários da A. tinham acesso à lista de clientes, aos equipamentos e aos produtos por esta utilizados na sua actividade de desinfecção.
- Após ter deixado de trabalhar para a A., o R. C...... passou a visitar a generalidade dos clientes daquela (resposta ao quesito 2º), tendo anunciado, nessas circunstâncias, a pelo menos a um cliente da A. que esta tinha fechado as suas instalações.
- Os preços praticados pelo R. C....., porque conhecia os da A. e teve acesso aos contratos celebrados por esta, eram mais baixos que os praticados pela A..
- Na sequência das referidas visitas efectuadas pelo R. C....., rescindiram os contratos com a A. cerca de 80 clientes desta, sendo o valor anual desses contratos de cerca de 4.000.000$00.
- A A. com intuitos publicitários, afixa nas janelas ou portas dos estabelecimentos por si assistidos, um autocolante especial.
- Como consequência da rescisão dos aludidos contratos a A. deixou de auferir uma quantia não inferior a 30.000,00€.

Desta factualidade logo ressalta que o réu C........ - pois nada vem provado relativamente ao réu D......., a não ser que trabalhou para a autora até Fevereiro de 1997, o que implica o seu afastamento de qualquer responsabilidade contratual ou extracontratual perante a Autora por eventuais danos que esta tenha sofrido com a perda de clientela --, após deixar de trabalhar para a autora, passou a dedicar-se à mesma actividade que a autora desenvolvia e desenvolve. O que significa, desde logo, que entre autora e réu C..... existe a supra aludida afinidade - aliás, existe, até, identidade de actividades por ambos desenvolvidas e de produtos comercializados.

Mas poderá dizer-se que o réu C...... exerceu «concorrência desleal» para com a autora, no exercício da sua actividade?

Para responder a esta questão, ter-se-á que analisar, não só a factualidade provada, como toda a que vinha alegada pela autora – e que foi levada à base instrutória - mas que esta não logrou provar.

Ora, foram quesitada a seguinte matéria de facto que não ficou provada -- ónus probandi esse que à autora pertencia (ut artº 342º do CC) --, apesar de levada à base instrutória:
Que os réus se haviam associado de facto após terem deixado de trabalhar para a autora ( quesito 2º);
Que os réus tinham anunciado à generalidade dos clientes da autora que a autora tinha fechado as suas instalações (quesitos 2º e 3º);
Que foram os réus que elaboraram as cartas em que os clientes da A. rescindiam os seus contratos com esta, após o que eram enviadas à autora (quesito 4º);
Que os réus vêm usando como suas as caixas da A. propriedade desta - devidamente certificada pelo Ministério da Indústria e Energia e com cópia a fls. 13--, bem assim que usam as dosagens próprias da A., sendo que usam, também, produtos químicos da A. que possuem pelo facto de serem trabalhadores da A. (quesitos 5º e 6º);
Que os cerca de 80 clientes que rescindiram os contratos com a A. o fizeram “por causa da conduta dos RR” - apenas se provou que tais rescisões ocorreram “na sequência das visitas efectuadas pelo Réu C......”, após os réus terem deixado de trabalhar para a A. (quesito 8º);
Que os RR imitaram a A. na afixação de um autocolante pessoal, passando, também - tal como aquela fazia - a afixá-lo nos estabelecimentos dos clientes da A. (quesito 11º);
Que os RR se apoderaram dos clientes que rescindiram com a A. - cerca de 80 (quesito 11º);
Que os RR retiraram dos estabelecimentos da autora o autocolante desta - donde consta o nº de telefone - e colocaram o seu - donde também consta o nº de telefone (quesito 12º),
…. e que tal tenha sido feito “em ordem a obter o serviço - ou seja, fazer a aplicação do produto - na tentativa de desviarem o cliente da A. para si RR” ( quesito 13º);
Que os RR aliciaram trabalhadores da A. para que fossem trabalhar com eles, com o intuito de paralisarem completamente a actividade da A. (quesito 14º);
Que as rescisões dos contratos da autora com os seus (cerca de 80) clientes -- no que esta teve um prejuízo não inferior a 30.000,oo € -- tivessem sido “provocadas pelos RR.” (quesito 15º);
Que os RR tivessem efectuado uma “campanha de desinformação e maledicência” contra a A e que isso trouxesse dificuldades com a sua clientela (quesito 16º);
Que os clientes da A., por virtude da referida “campanha de desinformação e maledicência” dos RR, passassem a duvidar da capacidade da A. para exercer a sua actividade, impondo à A. um esforço suplementar, quer de publicidade, quer para desfazer a “distorcida imagem da A. levada a efeito pelos RR” (quesitos 17º e 18º);
Que a A. tenha sofrido prejuízo com a “utilização” - pelos RR - “abusiva dos” seus “equipamentos”, “bem como pelo consumo do seu produto” (quesito 20º ) ;
Que a conduta dos RR tenha desviado, para estes, e continue a desviar, a clientela que usa os serviços da A: (quesitos 21º e 11º).

Com o devido respeito, parece-nos manifesto que, atentos os factos provados e os não provados e que foram levados à base instrutória, supra relacionados, se não pode concluir que os RR tenham actuado de forma desleal para com a autora, ou seja, que a sua conduta comercial possa ser qualificada como “concorrência desleal”.
É certo que a falta de prova aos quesitos, ou resposta negativa, apenas significa que os factos constantes desses quesitos se têm de entender como não alegados, sequer (cfr. v.g., Ac. Rel. Porto de 14.04.94, Cil. Jur 1994-II-213 e Jur. e Doutrina ali referidas). Ou, dito de outra forma, a não prova dos quesitos apenas significa isso mesmo: não se terem provados os factos quesitados, e não que se tenham demonstrado os factos contrários (Acs. STJ de 8.2.66, 28.5.68, 30.10.70, 11.6.71, 23.6.73, 5.6.73, 23.10.73, 4.6.74, in Bol. M.J., respectivamente, 154-304,177-260, 200-254, 208-159, 218-239, 228-195, 228-239 e 238-211).
No entanto, essa factualidade não pode deixar de ser considerada, para referir que só com a prova de tais factos se poderia, eventualmente, concluir pela «concorrência desleal» dos Réus.
Mas não provaram. E sem tal prova não almejamos a aludida conduta censurável dos apelados.

Efectivamente, apenas e só sabemos que os réus deixaram de trabalhar para a autora - direito que, obviamente, lhes assiste - e que a partir daí passaram a dedicar-se à mesma actividade a que a autora se vinha dedicando.
Não consta que os réus tenham feito para com a autora qualquer pacto de não concorrência, que os impedisse de - pelo menos durante certo tempo - não navegar “nas mesmas águas” da autora.
O facto de, após deixarem de trabalhar para a autora terem visitado os clientes desta, por si só, não é censurável. Antes é mais que normal, pois eram pessoas que - no livre jogo do mercado - poderiam passar a ser seus clientes. Apenas se censuraria a sua actuação caso se provasse que os RR tivessem actuado de forma desonesta, mentindo aos clientes sobre os produtos da autora e trabalho por esta praticado para, por via disso, os desviarem para si.
É certo que se provou que o R C...... “anunciou a um cliente da A. que esta tinha fechado as suas portas” (resposta ao quesito 3º).
No entanto, primeiro, tratou-se de um acto isolado - pois outros se não provaram; segundo, não se sabe que repercussão teve esse “anúncio” no desvio da clientela da A.; terceiro, não se sabe, sequer, se esse cliente foi um dos que rescindiram o contrato com a autora - nem, sequer, se esse cliente acreditou no que o R. lhe terá dito !...
Ou seja, parece claro que a apelação lavra em meras suposições, não sustentadas nos factos provados.
Efectivamente - como referido supra --, os actos de pretensa “concorrência desleal” imputados aos RR e que a A. inseriu na factualidade por si alegada na petição inicial, não se provaram.
De facto, a provarem-se as condutas (todas elas) imputadas aos réus e levadas à base instrutória, certamente que seriam qualificadas como actos de “concorrência desleal”.
São elas, designadamente:
- Que os RR anunciaram à generalidade dos clientes da autora que a autora tinha fechado as suas instalações; que elaboraram as cartas em que os clientes da A. rescindiam os seus contratos com esta; que vêm usando como suas as caixas da A. propriedade desta, bem assim as dosagens próprias da A., tendo usado, ainda, produtos químicos da A.; que a rescisão dos contratos com os cerca de 80 clientes da A. tenha ocorrido “por causa da conduta” (censurável e desonesta) “dos RR”; que imitaram a A. na afixação de um autocolante pessoal, passando, também a afixá-lo nos estabelecimentos dos clientes da A.; que se tenham apoderado dos clientes que rescindiram com a A. (cerca de 80(); que retiraram dos estabelecimentos dos clientes da autora o autocolante desta e colocado o seu, “na tentativa de desviarem o cliente da A. para si RR”; que os clientes da A. tenham sido aliciados pelos R.R. a trabalhar para eles “com o intuito de paralisar completamente a actividade da A.”; que tenham feito uma “campanha de desinformação e maledicência” contra a A e que isso trouxesse dificuldades com a sua clientela, tendo, por isso, os clientes da A., passado a duvidar da capacidade dela a A. para exercer a sua actividade.

Mas - repete-se -- nada disto se provou !!
Tais actos - que a autora alegara terem sido praticados pelos RR --, eram, de facto, contrários “às normas e usos honestos” daquele ramo de actividade económica - como o seriam de qualquer outro.

Assim, razão têm os apelados ao referirem que a apelante dá como provados factos que, de facto, se não provaram - referidos a fls. 383.
Efectivamente, a apelante parte do pressuposto de que a versão dos factos que levou à petição inicial ficou provada, para, com base nela, concluir pela censurabilidade da conduta dos RR. Só que, como já referido, lavra em meras conjecturas, hipóteses factuais, que não tiveram correspondência na relação de factos que a autora - a quem competia o respectivo ónus - logrou provar.

Assim sendo, não vemos como censurar a sentença recorrida. É que dos factos provados não resulta - com o mínimo de segurança e muito menos com a segurança que uma revogação do sentenciado impõe – que os recorridos tenham ido muito além da simples abertura dum negócio do mesmo ramo da autora, servindo-se para tal dos seus naturais conhecimentos no ramo e da sua capacidade. Se tal concorrência - que se não vê tenha sido desleal - causou prejuízo à autora, designadamente, lhe retirando clientela, não vemos como censurar os RR por isso. Trata-se do livre jogo da concorrência, do regular funcionamento do mercado (ver Carlos Olavo, Col. Jur., Ano XII, Tomo IV, pág. 14), numa sociedade de mercado livre, onde cada um procura fazer valer a sua capacidade e argúcia, singrando, naturalmente, os melhores, em função da sua forma de trabalhar e da aceitação que da mesma tenha o mercado, nas suas múltiplas vertentes.
Assim sendo - porque não vemos que os RR tenham tido uma actuação que extravase do padrão do homem médio naquele ramo de actividade [Ver Ac. Rel. do Porto, de 30.11.2004, pproc. nº 042160, na Internet, em www.dgsi.pt] --, não há que impor qualquer abstenção aos apelados, bem assim se lhes não impondo a obrigação de indemnizar a A. no que quer que seja - mesmo reconhecendo que, inexistindo no nosso ordenamento jurídico um regime específico e autónomo de responsabilidade por actos de concorrência desleal, no enquadramento jurídico da ilicitude e da responsabilidade civil por aquela concorrência desleal é de aplicar o regime jurídico da responsabilidade por factos ilícitos ou extracontratuais previsto no artº 483º do CC.

Não deixaremos, a finalizar, de transcrever as seguintes passagens da sentença recorrida, por nos parecerem pertinentes, sem merecimento de qualquer reparo ou censura:
“Nada dos factos provados permite concluir que os RR. tenham acedido à lista de clientes e preços praticados pela A. de forma ilícita, ou seja, contrária à vontade desta, resultando ao invés apurado que obtiveram tal acesso em virtude das funções que aí desempenharam.
- Por outro lado e considerando o sistema livre de mercado concorrencial entre empresas, entendemos que apenas haveria lugar a tal prática de concorrência desleal ou desonesta se por qualquer forma RR. tivessem restringido a livre opção de escolha da A. de com esta continuarem a contratar.
- Assim e no que se refere ao facto apurado de acerca de 80 clientes de A. terem rescindido os contratos na sequência de visitas aos mesmos efectuados pelo R. C......, na medida em que nada resulta dos factos provados no sentido de que os clientes da A. tenham rescindido os contratos em violação com os termos contratuais com esta estabelecidos por acção ou omissão dos RR., tal actuação do R., face à ausência de norma que expressamente a proíba, não será susceptível de configurar só por si a prática de acto de concorrência desleal.
Quanto ao facto de o R. C...... ter proposto a clientes da A. preços mais baixos do que os por esta praticados, da matéria provada não resulta que os preços pelo R. fossem preços abaixo de custo, ou seja que este tenha incorrido na prática do designado “dumping” – prática comercial expressamente proibida por desvirtuar de sã concorrência de preços – e por esta forma lograr desviar clientela da A.
Assim e atendendo a que o preço é seguramente um dos elementos decisivos na escolha de contratar por parte do cliente, não se poderá considerar que pelo facto de o R. oferecer um preço mais reduzido constitua só por si uma prática comercial desonesta, atendendo ainda a que nada impediria os cliente A . de contactarem, confrontando-a com os preços propostos pelo R. e permitindo-lhe assim exercer relativamente a este a concorrência quanto ao factor preço e ou qualidade do serviço prestado.
É certo que neste ponto resultou apurado que o R. C....... anunciou a pelo menos a um cliente da A. que este tinha fechado as suas instalações, prática esta que por induzir em erro, será certamente de considerar como ilicitamente restringidora da livre opção de contratar de tal cliente para com a A., configurando-se assim como prática comercial desonesta para os efeitos que temos vindo a tratar.
Todavia e como supra se referiu não bastará a prática de uma tal acção isolada de acto de concordância desleal, será ainda necessário, para que a mesma seja fonte de responsabilidade, que se mostre apurada a existência de nexo casual entre tal prática e dano sofrido como consequência da mesma.
Ora em tal caso concreto não resultou apurado que em consequência de uma tal acção ilícita do R. o cliente em questão tenha rescindido ou deixado de contratar com a A., ou seja, não resultou provado que o cliente em questão tenha sido um dos cerca de 80 que resultou provado terem rescindido contrato com a A..”.

É certo que o réu C...... - não os réus, como vimos--, surgindo como novo empresário no mesmo ramo de actividade da autora, modificou as condições da oferta do respectivo produto - designadamente praticando preços mais baixos--, o que, obviamente, perturbou no mercado de procura de tais produtos as condições da transacção que os clientes/interessados estavam até então dispostos a aceitar.
No entanto, se os clientes que antes eram da autora o deixaram de ser, não resultou provado que isso se devesse a algo que extravasasse o âmbito da mera liberdade de escolha do(s) interveniente(s) com o qual as respectivas transacções seriam mais vantajosas. Não se vislumbra nos factos provados que, quer na rescisão dos clientes da autora, quer na mudança dos mesmos para outra empresa - designadamente para o(s) réu(s) (o que se não provou tenha acontecido, aliás) -, qualquer dos réus tenha tido uma conduta desleal, em violação das normas e usos honestos daquele ramo de actividade, que justificasse a sanção que a autora pretende com fazer valer através destes autos.

Nunca é de mais acentuar que a autora não era dona da clientela de que dispunha à altura da saída dos réus.
Como já salientado supra, a clientela é, de per si, algo de movediço que, naturalmente, se desloca em função da qualidade do serviço, da forma de apresentar os produtos, do seu preço e qualidade, de uma enorme variedade de factores de ordem económica, social, sociológico e psicológica
Ora, à falta de outros elementos probatórios que demonstrem o contrário - prova a cargo da Autora, reitera-se (ut artº 342º CC) -, não se pode deixar de presumir que se os clientes da autora rescindiram os contratos que com ela celebraram foi porque viram boas razões para tal, as quais, naturalmente, que também terão a ver com a diferente (supõe-se ?... que melhor) qualidade do serviço e/ou dos próprios produtos, preços praticados, forma de tratamento, etc., etc.

Nada nos mostra, portanto, que tal rescisão dos contratos-- e inerentes prejuízos para a autora-- tenha tido origem em conduta dos réus censurável pela ordem jurídica vigente.
Dito de outra forma: não se extrai da factualidade apurada nos autos que qualquer dos réus tenha praticado conduta ou condutas - exceptuando, eventualmente, a contida na resposta ao quesito 3º, mas que se não provou tivesse repercussão negativa para a autora, designadamente influenciando qualquer das rescisões de contratos de clientes seus - que se pudessem qualificar como desleais (designadamente para a autora) e, por isso, repudiadas pela consciência normal dos comerciantes por contrárias aos usos honestos do comércio, condutas susceptíveis de causar prejuízo à empresa de qualquer competidor - maxime a Autora-- pela usurpação, ainda que parcial, da sua clientela.

Assim sendo, claudicam as conclusões das alegações da apelante.

CONCLUINDO:
- Para que se possa falar em «concorrência desleal» é essencial que as actividades económicas prosseguidas pelos dois – ou mais – empresários sejam afins.
- Na definição de «concorrência desleal» continua a ser válido o Parecer da Procuradoria Geral da República nº 17/57, de 30.05, que referia constituírem «concorrência desleal os actos, repudiados pela consciência normal dos comerciantes como contrários aos usos honestos do comércio, que sejam susceptíveis de causar prejuízo à empresa dum competidor pela usurpação, ainda que parcial, da sua clientela».
- Trata-se de um conceito móvel, com contornos vagos e oscilantes.
- O proémio do (actual) artigo 317º do Cód. da Prop. Ind. - tal como o do anterior artº 260º do mesmo Código-- é uma cláusula geral, de adaptabilidade à evolução sócio-económica. Pelo que, neste domínio, não há necessidade de recorrer à analogia ou à interpretação extensiva.
- Inexistindo no nosso ordenamento jurídico um regime específico e autónomo de responsabilidade por actos de concorrência desleal, no enquadramento jurídico da ilicitude e da responsabilidade civil por aquela concorrência desleal é de aplicar o regime jurídico da responsabilidade por factos ilícitos ou extracontratuais previsto no artº 483º do CC.

IV. DECISÃO:

Termos em que acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela apelante.

Porto, 09 de Fevereiro de 2006
Fernando Baptista Oliveira
José Manuel Carvalho Ferraz
Nuno Ângelo Rainho Ataíde das Neves