Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JOSÉ FERRAZ | ||
Descritores: | VENDA DE COISA DEFEITUOSA DENÚNCIA DOS DEFEITOS CADUCIDADE | ||
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Nº do Documento: | RP20120202661/06.7TBLSD.P1 | ||
Data do Acordão: | 02/02/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA. | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A aceitação, pelo vendedor, de defeitos na coisa vendida, que reparou, não implica a aceitação de outros defeitos que surjam posteriormente, mesmo que eles sejam o ressurgimento dos defeitos anteriormente reparados, devendo o comprador proceder à sua denúncia. II - Denunciados os defeitos em imóvel destinado a longa duração, sem que tenham sido reparados ou admitidos pelo vendedor, para obstar à caducidade do respectivo direito, o comprador deve propor a acção no ano seguinte à denúncia. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Proc. 661/06.7TBLSD – Apelação José Ferraz (636) Exmos adjuntos Des. Amaral Ferreira Des. Deolinda Varão Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1) – B… e C…, residentes no …, …, Lousada, pedem, em processo a condenação da ré – D…, Lda., com sede na Rua …, …, Bloco ., r/c dt.º, Porto: a) no reconhecimento dos defeitos e vícios existentes no imóvel propriedade dos autores e que àquela compraram, b) na sua reparação, suportando as despesas e encargos a ela inerentes ou, em alternativa, c) no pagamento aos autores do montante que vier a ser despendido para a realização de todas as obras de reparação necessárias à eliminação desses defeitos, e, ainda, d) no pagamento aos autores de uma indemnização pelos danos causados com os defeitos existentes, tudo a ser apurado em liquidação da sentença e acrescido dos juros de mora devidos, até integral pagamento. Em síntese, alegam que compraram à ré um imóvel para sua habitação permanente que apresenta diversos defeitos e deficiências de construção, quer no seu interior quer no exterior, que se têm avolumado ao longo do tempo. Na sequência de denúncia, a ré reconheceu os defeitos e reparou-os. Porém, novos defeitos foram denunciados, em tudo semelhantes aos anteriores mas que só agora se manifestaram e foram denunciados. Denunciados pelos AA e reconhecidos pela Ré, não foram eliminados, acrescendo que a reparação não se compadece com a permanência do agregado familiar dos AA na habitação, o que determinará a realização de despesas, com a privação do uso do imóvel, e que deverão ser ressarcidas. A ré contesta não só impugnando os factos relativos aos invocados defeitos do imóvel como excepcionado a caducidade pelo extemporâneo exercício dos direitos invocados, já que os mesmos defeitos haviam sido denunciados por carta de 10 de Novembro de 2004 e a acção só foi interposta em 24 de Abril de 2006. Pede, em qualquer dos casos, a improcedência da acção. Respondendo à excepcionada caducidade, os AA afirmam a tempestividade da denúncia em relação aos factos (defeitos) denunciados, pedindo a improcedência dessa excepção. Proferido despacho saneador, foi a instância julgada regular e relegou-se para final o conhecimento da invocada caducidade. Foi seleccionada a matéria de facto, fixando-se os factos assentes e organizando-se a base instrutória, sem reclamação das partes. Posteriormente, vieram os AA, em ampliação do pedido, liquidar o montante da indemnização pedida, que calcularam em € 20.350,00, a que pedem o acréscimo dos juros. Liquidação que a ré contestou. Após a realização de uma perícia, teve lugar a audiência de julgamento e, decidida a matéria de facto provada e não provada, foi proferida sentença que, julgando procedente a caducidade invocada pela ré, julgou a acção improcedente. 2) – Inconformados, recorrem os AA. Alegando, concluem: 1) A douta sentença deve ser revogada, por violar lei adjectiva e substantiva. 2) Deve ser dado como provado o facto 13.º da Base Instrutória, a saber: - A Ré reconheceu os vícios a que aludem os factos 2.º a 10.º da Base Instrutória e comprometeu-se a realizar obras necessárias à sua reparação. 3) Caso assim, não se entenda, o facto 13.º da Base Instrutória devia ter uma resposta positiva explicativa a saber: - Após denúncia dos A.A. efectuada em Julho e Setembro de 2001, a Ré reconheceu os vícios a que aludem os quesitos 2.º a 10.º da Base Instrutória e comprometeu-se a realizar as obras necessárias à sua reparação. 4) Isto porque: - Os defeitos aqui em discussão foram denunciados pelos Apelantes, através de cartas, subscritas pela anterior Mandatária, datadas de Julho e Setembro de 2001 e reconhecidos pela Ré e por ela executados em Abril de 2002 – vide art.º 31.º, 40.º da contestação – confissão judicial espontânea feita em articulado que expressamente se aceita – art.ºs 356.º, n.º 1 e 358.º, n.º 1 ambos do Código Civil e art.º 567.º, n.º 1 e 2 do CPC, quer através das cartas juntas aos autos em sessão de julgamento da anterior mandatária, quer através do depoimento de parte dos legais representantes da Ré e bem assim depoimentos prestados pelas testemunhas dos A.A.: E…; F…; L…; e da R.: G…, H… e I…; - O próprio tribunal nos argumentos usados para fundamentar a decisão sobre a matéria de facto refere, no penúltimo parágrafo: “…Quer o Senhor Perito quer as identificadas testemunhas …foram quase unânimes em afirmar que as deficiências que ora se discutem remontam ao momento que se seguiu à construção, basicamente constituindo todas elas, sobretudo as fissuras, um desenvolvimento ou uma agravação das que primeiramente se verificaram, surgidas logo após a construção e quando os autores começam a habitar a casa. Com pequenas divergências, respeitantes a um ou outro tipo de vício, todos foram nesse sentido, tendo por isso o tribunal ficado convencido de que estamos perante uma única realidade, de que, ao longo do tempo, os autores, ou nos termos do documentos escrito na alínea d) ou nos termos do fax da alínea c) dos factos assentes foram dando conta à Ré.”; 5) Em face da convicção manifestada nos fundamentos quanto à decisão da matéria de facto, ao abrigo do disposto nos art.ºs 264.º, n.º 2, in fine; 514.º, n.º 2; 650.º, n.º 2, alínea f) e 3; 664.º todos do CPC, o tribunal deve ampliar e ou aditar a Base Instrutória nos seguintes termos: - Os defeitos denunciados pelos A.A., nas cartas datadas de 10/11/2004 e 26/04/2006 são o desenvolvimento e a agravação dos defeitos participados pelos A.A., através de cartas, subscritas pela anterior Mandatária, datadas de Julho e Setembro de 2001; - Os defeitos comunicados pelos A.A. através das cartas datadas de Julho e Setembro de 2001 foram reconhecidos pela Ré e por ela executados em Abril de 2002; - Os vícios reparados pela Ré em Abril de 2002 voltaram a manifestar-se de forma visível e mais gravosa, originando outros. 6) Isto porque, tendo estes factos resultado da discussão da causa e alegados pelas partes, não sendo factos instrumentais, acessórios ou laterais em relação ao objecto/causa de pedir da acção, mas principais e essenciais à descoberta da verdade material controvertida, o tribunal podia e devia socorrer-se deles, tal como os aproveitou para formular o seu juízo de convicção quanto a outros factos e levá-los à Base Instrutória; 7) E, não se diga, como parece querer dizer-se no último parágrafo da douta decisão sobre a matéria de facto, que os AA. não tendo invocado que os defeitos cuja denuncia foi efectuada em 10/11/2004 e 24/04/2006 também tinham sido reclamados em Julho e Setembro de 2001, em obediência ao princípio do dispositivo, deles não se podia o Tribunal aproveitar; 8) Efectivamente, quer as testemunhas dos Autores, quer a interpretação que se retira das características dos vícios novos que são participados em 10/11/2004 e 24/04/2006 vão no sentido de se entender que os factos novos participados nestas datas são o desenvolvimento e agravamento das avarias detectadas e comunicadas em Julho e Setembro de 2001; 9) Os Apelantes chamaram-lhe defeitos novos porque surgiram novamente e agravados após a reparação efectuada em Abril de 2002; 10) Aliás, esta conclusão também a extrai o tribunal, razão pela qual, estava obrigado a aproveitar-se deles para com seu fundamento considerá-los matéria de facto assente, após a sua inserção na Base Instrutória; 11) Sendo certo que, em relação a tais factos nem se verifica a necessidade de contraditório, na medida em que estes factos são aceites pelos A.A. e até invocados em proveito próprio pela Ré na sua defesa; 12) QUANTO À CADUCIDADE DA DENÚNCIA DOS DEFEITOS DE CONSTRUÇÃO, há casos em que o dono de obra está dispensado da denúncia dos defeitos. Quando essa dispensa resulta do reconhecimento pelo empreiteiro da sua responsabilidade pelos defeitos existentes; 13) Ora, aplicando o direito aos factos provados e a provar, tendo a Ré reconhecido a existência dos defeitos protestados em Julho e Setembro de 2001, corrigidos em Abril de 2002 e sendo os defeitos participados em 10/11/2004 e 24/04/2006 substancialmente idênticos aos inicialmente reclamados em 2001, dúvidas não existem que inexiste a caducidade da denuncia efectuada pelos Apelantes. 14) Valendo a pena dizer que, segundo o Dr. João Cura Mariano, in Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos defeitos da Obra, 3.º Edição Revista e Aumentada, Livraria Almedina, pag. 166 “…Quando se recorre a estes direitos, porque não obteve resultados o exercício do direito de eliminação de defeitos ou de realização de nova obra, devido ao defeito não ser reparável, à desproporção dos custos da eliminação do defeito ou da realização da nova construção, ou do incumprimento dessas obrigações, as finalidades do estabelecimento dos prazos de caducidade já foram postas em causa com a primeira interpelação. Para estas hipóteses o exercício dos primeiros direitos pelo dono de obra é suficiente para impedir a caducidade relativamente aos direitos subsidiários.”. 15) Ora, reportando-nos ao caso concreto, dúvidas não existem que os defeitos na construção dos AA. foram primeiramente denunciados em Julho e Setembro de 2001, foram reparados em Abril de 2002; 16) E porque as avarias denunciadas se voltaram a manifestar, a desenvolver e a agravar-se, dando origem a outras, por falta de reparação atempada, voltaram novamente a ser participados em 10/11/2004 e 24/04/2006; 17) Importando esclarecer que na pag. 169, da obra e autor supra citado, se lê: “…Podendo os direito do dono de obra serem exercidos extrajudicialmente, a simples declaração de redução do preço ou de resolução do contrato, ou mesmo a interpelação extrajudicial do empreiteiro para a eliminação dos defeito, realização de nova obra ou pagamento de indemnização, impedem a caducidade destes direitos. Em lado nenhum a lei exige que o acto impeditivo da caducidade deva ser a propositura da acção judicial, nomeadamente o art.º 1224.º, do CC. Daí que a invocação destes direitos, posteriormente às mencionada declarações de exercício, em acção judicial, por via de acção, reconvenção, ou excepção, já não está sujeita a qualquer prazo de caducidade, estando apenas o exercício dos direitos não potestativos (…), ou dos direitos resultantes da alteração provocada pelo exercício dos direitos de natureza potestativa (…), sujeitos a prazo de prescrição geral.”. 18) Ora, regressando novamente ao nosso caso, além de estar provado que a Ré reconheceu os defeitos na construção dos A.A., importa também frisar que provado está que estes, pelo menos, por escrito interpelaram extra-judicialmente a Ré em 3 ocasiões, a saber: - Julho/Setembro de 2001; - 10/11/2004; - 24/04/2006. 19) Pelo exposto, à luz da doutrina predita e do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12.12.2006, in www.dgsi.pt, tendo os AA. interpelado extrajudicialmente a Ré para eliminar os defeitos de construção da sua moradia, ainda que a acção tenha entrado em tribunal um ano após a primeira e a segunda interpelação, não estamos perante uma caso de caducidade mas de prescrição, pelo que, atentos os factos provados nem se verifica a caducidade nem a prescrição da denúncia dos defeitos efectuada pelos Apelantes. 20) Assim, apodíctico é que sentença recorrida violou, entre outros, os seguintes preceitos legais: art.ºs 514.º, n.º 2; 650.º, n.º 2, alínea f) e 3; 653.º, 664.º, 668º, n.º 1, alínea d), 1ª parte, todos do CPC; 342º, n.º 1; 1220.º, 1221.º, 1224.º do Código Civil. Termos em que revogando-se a douta sentença proferida, será feita inteira justiça!!!” A ré responde em defesa da confirmação da sentença. Corridos os vistos legais, cumpre decidir. 3) – Na douta sentença vem julgada provada a seguinte factualidade: A) Através da escritura pública de compra e venda, junta aos autos a fls. 21 e seguintes, celebrada em 23 de Abril de 2001, no Cartório Notarial de Lousada, os autores B… e mulher C… adquiriram à ré D…, Lda. o prédio urbano composto de cave, r/c e andar, com logradouro, sito no …, da freguesia de …, concelho de Lousada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lousada sob o n.º 00594, G5 do prédio 00088, omisso na respectiva matriz, mas pedida a sua inscrição na Repartição de Finanças de Lousada, em 21712/2000.(a) B) No acto da escritura pública de A), os autores pagaram à ré a quantia de 17.000.000$00, devida pela aquisição do aludido prédio.(b) C) A fls. 28/29, encontra-se uma carta datada de 24 de Abril de 2006, subscrita pelo ilustre mandatário dos autores, remetida via fax, nesse dia, pelas 22 horas e 41 minutos, para o número ………, de onde consta como morada “…, Apartado .., Lousada” e como assunto “Moradia sita no …, freguesia de …, Lousada, Denúncia de novos defeitos de construção” e onde se pode ler: «Pelos m/constituintes B… e C…, residentes na morada em referência, fui incumbido de reclamar junto de V. Ex.ªs o ressarcimento dos danos (defeitos de construção) ocorridos na moradia sobredita adquirida pelos mesmos. § - Assim e apesar das reparações efectuadas na aludida moradia e respeitante a denúncias de defeitos anteriores, o certo é que os m/ constituintes constataram o aparecimento de novos defeitos, a saber: § - Exterior: corrigir as novas fissuras da fachada exterior, as portas exteriores apresentam os quadros partidos o que provoca rachadelas nas paredes, o que tem originado infiltrações e humidades que perpassa na parede, causando paredes rachadas e tectos com fendas, o piso do balcão exterior da casa deve ser nivelado uma vez que empoça água, alguns muros exteriores não foram realizados e os que foram a tinta está a descascar, as tijoleiras estão rachadas; § - Interior: os rodapés, madeiras das escadas e parque apresentam-se descoloridos e cheios de manchas pelo que devem ser substituídos; § - No salão: estancar as novas humidades e infiltrações que perpassam paredes e as tijoleiras estão rachadas; § - Na casa de banho: a banheira da casa de banho privada deve ser nivelada, existem duas torneiras misturadores que devem ser substituídas, o autoclismo deve ser afinado por não descarrega a água, os caixilhos das janelas estão enferrujados; § - Na garagem: eliminar novas as fissuras, humidade e tinta descascada das paredes interiores e exteriores, o que tem originado infiltrações e humidades que perpassa na parede, paredes rachadas; § A casa não tem projecto K…. § Padecem os defeitos enunciados de reparação urgente, pelo que ora expressamente se denunciam. § Pelo exposto, solicita-se a V. Ex.ªs no decurso do próximo 10 dias, me informem da disponibilidade para agendarmos uma reunião a fim de encarar uma saída para esta situação, de forma a evitar o recurso à via judicial».(c) D) A fls. 50/51, encontra-se uma carta dirigida pelos autores à ré, datada de 10 de Novembro de 2004, de onde consta como assunto “responsabilização por defeitos existentes no Prédio Urbano, sito em …, …, Lousada” e onde se pode ler: «Pelos meus constituintes, B… e C…, na sequência de anteriores contactos encetados pela m/ Ilustre Colega, Dra. J…, fui incumbido de propor uma acção judicial contra a V. Sociedade reclamando a realização de obras e competente indemnização civil por danos resultantes das avarias detectadas no Edifício supra referido. § Não obstante, é intenção dos m/ constituintes tentar resolver de forma amigável e extrajudicialmente toda esta situação. § Assim, proponho-vos que, no prazo máximo de 10 dias, V.ªs Ex.ªs dêem início à realização das obras ainda não efectuadas e por ambas as partes aceites na reunião realizada no dia 25/07/2001, e que infra se relembram: § - substituir os quadros partidos das portas exteriores que provocam rachadelas na parede; § - arranjar as fissuras da fachada exterior; §- substituir rodapés de madeira; § - nivelar banheira da casa de banho privada; § - substituir o parqué levantado; § - estancar a humidade das paredes do salão; § - substituir duas torneiras misturadoras da casa de banho; § - concertar fissuras, humidade e tinta descascada das paredes interiores e exteriores da garagem; § - afinar autoclismo da casa de banho que não descarrega água; § - instalar fios do telefone; § - nivelar piso do balcão exterior da casa ou terraço uma vez que empoça água; § - os muros exteriores têm a tinta a descascar e alguns não foram feitos; § - a casa não possui projecto K…». E) A presente acção deu entrada no dia 24 de Abril de 2006, pelas 22 horas e 49 minutos. F) Após a realização da escritura de A), os autores passaram a residir no imóvel adquirido à ré e que esta havia construído. G) A moradia de A) tem fissuras na fachada exterior e as portas exteriores apresentam os quadros partidos, o que provoca rachadelas nas paredes. H) Essas fissuras e rachadelas provocam infiltrações e humidades que perpassam nas paredes, causando rachas nessas paredes e fendas nos tetos. I) O piso do balcão exterior da casa em poça água. J) Há descascamentos de tinta em alguns muros exteriores. K) As tijoleiras estão rachadas. L) No interior, os rodapés, as madeiras das escadas e o parquet estão descoloridos e cheios de manchas. M) No salão, existem humidades e infiltrações que perpassam as paredes e as tijoleiras estão rachadas. N) Na casa de banho privada, a banheira está desnivelada. O) Na garagem, existem fissuras, humidade e tinta descascada nas paredes interiores e exteriores, o que tem provocado infiltrações e humidades que perpassam nas paredes, que estão rachadas. P) A moradia de A) não possui projecto K…. Q) Para reparar o vício de I), é preciso nivelar o balcão exterior da casa. R) Para reparar o vício de L), é preciso substituir os rodapés, as madeiras das escadas e o parquet. S) Para reparar o vício de N), é necessário nivelar a banheira da casa de banho privada. T) Os vícios descritos em G) a O) são devidos à má execução dos trabalhos de especialidade de construção civil. U) Os vícios descritos em G) a O) são visíveis à vista desarmada e tendem a agravar-se a cada dia que passa. V) As situações descritas em G) a O) causam incómodo, angústia e ansiedade aos autores. W) Durante o tempo necessário à reparação dos vícios a que se reportam G) a O), os autores terão que sair de casa, procurar alojamento num hotel e tomar as refeições fora de casa. X) O fax referido em C) foi remetido para um escritório que a ré tem em Lousada, em véspera de feriado, às 22 horas e 41 minutos, não tendo a ré tomado conhecimento dele nesse dia, mas posteriormente, em dia e hora não apuradas. Y) Os vícios referidos em G) a O) foram denunciados à ré pelos autores através da carta de D), datada de 10 de Novembro de 2004. Z) As fissuras/rachadelas descritas em G) e H) não provocam problemas ao nível de segurança. 4) – Perante o teor das conclusões recursórias, e atento o disposto nos arts. 684º/3 e 690º/1 do CPC (na versão anterior à introduzida pelo DL 303/2007, inaplicável nos autos), são suscitadas as questões, a apreciar: - modificação da decisão sobre a matéria de facto, - ampliação da matéria de facto, - reconhecimento dos defeitos pela apelada a obstar à caducidade. 5) – Quanto à decisão sobre a matéria de facto. Pretendem os apelantes que o ponto 13 da base instrutória seja julgado provado. Pergunta-se “A ré reconheceu os vícios a que aludem os quesitos 2º a 10º e comprometeu-se a realizara as obras necessários à sua reparação?” Vícios esses que são os descritos sob as alíneas G) a P) da matéria de facto provada. Importa precisar – é na petição que os autores devem alegar os fundamentos do pedido, isto é, expor, concretizando, a causa de pedir. O tribunal, na sua apreciação, está limitado, por exigência dos princípios do dispositivo e do pedido (arts.3º, 264º/1 e 661º/1 do CPC) aos factos e pretensões alegados e deduzidas pelas partes. Não deve, na decisão, operar com factos não alegados (artigo 664º, sem prejuízo do disposto no artigo 264º/2 e 3, do mesmo código). Os (ora) recorrentes, na petição, alegam muito claramente “acontece que o imóvel em causa apresenta NOVOS defeitos e deficiências evidentes …” (item 6º da petição) que se têm avolumado ao longo do tempo e “já foram denunciados à ora Ré – ut se constata do Doc. nº 3 que ora se junta …” (documento datado de 24 de Abril de 2006) – ponto 13º da petição. Acrescentam que “no seguimento de interpelações e denúncias anteriormente levadas a cabo pela autora, a ré, após ter conhecimento do visual dos então defeitos através de visitas de funcionários seus, sempre reconheceu a existência dos mesmos e, nomeadamente, tendo procedido à reparação desses defeitos”[1] – ponto 14º da petição. Porém, continua, “os novos defeitos entretanto denunciados, embora sejam em tudo parecidos com os anteriores, certo é que só agora se manifestaram e só agora foram denunciados” – ponto 15º da petição. Por isso, os defeitos que os AA afirmam e em que fundam os pedidos de reparação e indemnização são os defeitos que dizem denunciados em 2006 e que são defeitos novos ou que só agora se manifestaram (daí, também, só agora denunciados). Não os que terão surgido e terão sido denunciados em 2001 e/ou 2002, porque esses foram, segundo afirmação peremptória dos AA., reparados (ponto 14 da petição). E (acrescentamos nós) não dizem que pelos AA. foram mal ou deficientemente reparados. Aliás, face à defesa da ré, com a invocação da caducidade da acção – dizendo que os defeitos são os mesmos que foram denunciados em 2004, esquecendo-se os AA de propor a acção até Novembro de 2005 – respondem estes, sem equívocos, “… é evidente que inexiste qualquer esquecimento por parte dos A.A., porquanto se tratam de defeitos novos … como cristalinamente se percebe do teor do artº 15º da PI” – ponto 11º da resposta. E mais impressivamente “… esses defeitos … não foram denunciados na comunicação de 10/11/2004, como a ré atrabiliariamente quer fazer transparecer” – ponto 17º da resposta. Face à defesa da ré, não redireccionaram os AA. os fundamentos da acção (alterando-os ou modificando-os). Pelo contrário, reafirmam a novidade dos defeitos que querem ver eliminados (repare-se que, potencialmente, os defeitos são genéticos e, por isso, pela sua reparação responde o vendedor e/ou construtor, simplesmente que se manifestam posteriormente e só quando isso sucede é que o comprador deles se apercebe e os pode denunciar). Portanto, o reconhecimento e compromisso de reparação que com o quesito se pretende apurar respeitam a esses NOVOS defeitos (não aos passados que até terão sido reparados), conforme se alega no artigo 17º da petição. Daí que a decisão a essa questão 13 da base instrutória tem de reportar-se aos defeitos (afirmados como novos) que os AA alegaram denunciados pela comunicação de Abril de 2006 (embora se vindo a provar terem já sido denunciados em Novembro de 2004). Sendo assim, como entendemos ser, para a decisão ao mencionado quesito 13º só releva o reconhecimento que a ré terá feitos dos defeitos novos (tenham sido comunicados/denunciados em 2004 ou em 2006) e não os que terão surgido em 2001 e/ou 2002. Só àqueles se dirige a pretensão dos AA, ora, recorrentes, afirmada e reafirmada nos articulados. Ora, toda a construção dos apelantes (no recurso) para uma decisão afirmativa ao quesito 13º assenta – os defeitos denunciados são agravamento dos denunciados em 2001 e estes foram aceites pela ré, pelo que, reconhecidos estes, devem considerar-se reconhecidos os denunciados pelas comunicações de 2004 e 2006 (que seriam os mesmos, mas agravados). Não estão em causa os vícios ou defeitos surgidos e denunciados em 2001, em relação aos quais se admite o reconhecimento expresso da Ré (pelo menos de parte) – artigo 30º da contestação (e a que, sem clareza, o representante da ré faz referência no seu depoimento, na acta de fls. 355/359). Defeitos que a ré afirma ter reparado, como essa reparação foi, e desde logo, afirmada na petição (artigo 14º da PI). Mas os defeitos alegados pelos AA, para pedir nesta acção, que alegaram ser novos (e até seriam posteriores a 10 de Novembro de 2004 – conforme decorre do por eles alegado na resposta à excepcionada caducidade, no seu ponto 11º), e que querem reparados são os denunciados pela comunicação de Abril de 2006 (que veio a provar-se terem sido também denunciados em Novembro de 2004), até porque, e são os próprios AA. a alegar, aqueles outros foram reparados. E, quanto a estes (denunciados em 2006), desligados dos denunciados (e reconhecidos) em 2001, nenhuma razão probatória adiantam os recorrentes para se afirmar qualquer reconhecimento e/ou compromisso da apelada para efectuar a sua reparação. Se são os AA a afirmar (na petição) que se trata de defeitos novos, isto é, “que só agora se manifestaram e só agora foram denunciados” (pela comunicação de Abril de 2006), opondo-se mesmo a que sejam os denunciados em Novembro de 2004, não vai o tribunal dizer que os defeitos são os denunciados em 2001 (o que também não foi alegado por eles ou pela Ré) só para julgar provado o quesito 13º, até porque, e repete-se, estes foram reparados (na alegação de ambas as partes). Razão porque, nesse aspecto, a pretensão improcede. Mas entendem ainda os apelantes que, a não se considerar simplesmente provada a questão 13 da base instrutória, dever-se-á, então atribuir uma resposta explicativa à questão, assim “Após denúncia dos A.A. efectuada em Julho e Setembro de 2001, a Ré reconheceu os vícios a que aludem os quesitos 2.º a 10.º da Base Instrutória e comprometeu-se a realizar as obras necessárias à sua reparação”. É desnecessário confundir. O que a Ré reconheceu foram os defeitos denunciados em 2001. Os defeitos descritos em 2º a 10º não são os denunciados nessa data, até porque esses – dizem os AA – foram reparados. E, haver uma “recidiva” dos defeitos, necessária seria nova denúncia para serem eliminados, frustrada que fosse tentativa anterior. O que foi alegado pelos AA., na petição, é que a ré reconheceu a existência dos defeitos denunciados pela comunicação de Abril de 2006 (não os denunciados em 2001) e se comprometeu a repará-los e que tais defeitos denunciados naquela data (2006) só agora se manifestaram (pelo que são novos defeitos). São esses os que se descrevem nos pontos 2º a 10º da base instrutória. Não faz sentido que na sequência da denúncia de 2001, se reconheça defeitos só surgidos (e de denunciados) posteriormente (até porque os primeiros foram reparados, segundo alegação de ambas as partes). A decisão, nos termos requeridos, não se conteria na questão formulada; antes constituiria matéria nova e não alegada. O perguntado é se os defeitos denunciados em 2006 foram reconhecidos pela ré e quanto a esses nenhuma razão ou elemento de prova se adianta no recurso para impor uma resposta positiva. Mantém-se a decisão. 6) – Querem os apelantes que se amplie a base instrutória (atento o disposto nos arts. 264.º, n.º 2, in fine; 514.º, n.º 2; 650.º, n.º 2, alínea f) e 3; 664.º todos do CPC) com os factos: - “Os defeitos denunciados pelos A.A., nas cartas datadas de 10/11/2004 e 26/04/2006 são o desenvolvimento e a agravação dos defeitos participados pelos A.A., através de cartas, subscritas pela anterior Mandatária, datadas de Julho e Setembro de 2001; - Os defeitos comunicados pelos A.A. através das cartas datadas de Julho e Setembro de 2001 foram reconhecidos pela Ré e por ela executados em Abril de 2002; - Os vícios reparados pela Ré em Abril de 2002 voltaram a manifestar-se de forma visível e mais gravosa, originando outros”. Que dizem nem sequer ser factos instrumentais, acessórios ou laterais em relação ao objecto/causa de pedir mas constituir “factos principais e essenciais à descoberta da verdade material controvertida, podendo e devendo o tribunal socorrer-se deles, tal como aproveitou para formular o seu juízo de convicção e levá-los à base instrutória”. O juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes (arts. 264º/2 e 664º do CPC), tendo estas o ónus da alegação dos factos constitutivos do direito ou da excepção (sem prejuízo da aquisição processual). No entanto, decorre do artigo 264º/2 que o tribunal pode considerar, mesmo oficiosamente, os factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa. São factos que indiciam os factos essenciais e que podem ser usados para prova indiciária destes últimos, ou factos de cuja prova se pode inferir a demonstração dos correspondentes factos principais[2] ou que permitem presumir o facto principal. Como os apelantes referem, não têm essa natureza os factos que querem aditar (à base instrutória). Dizem ser factos essenciais (ao acolhimento da sua pretensão). Os factos principais (constitutivos do direito ou da excepção) devem ser alegados pelas partes. Se o autor não articula esses factos para pedir – artigo 264º/1 -, a petição é inepta. A sua omissão não é suprível. Conforme estatui o nº 3 desse artigo, mesmo que não tenham sido alegados nos articulados, “serão ainda considerados na decisão os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complementares ou concretização de outros factos que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório”. São esses factos complementares ou concretizadores aqueles “cuja falta não constitui motivo de inviabilidade da acção ou da excepção, mas que participam de uma causa de pedir ou de uma excepção complexa e que, por isso, são indispensáveis à procedência dessa acção ou excepção; sem eles a acção ou a excepção não pode proceder. “Os factos complementares não são necessários à identificação da situação jurídica alegada”, por isso, sem eles, a petição não é inepta, mas são indispensáveis á procedência da acção (ou da excepção), implicando a sua falta a improcedência[3]. O apelo dos recorrentes não pode merecer acolhimento porque se, por um lado, os factos em causa não são complementares (dos alegados nos articulados) mas completamente diferentes, podendo constituir novo fundamento de pedido idêntico ao formulado, por outro, mesmo em relação aos factos complementares ou concretizadores com que o tribunal pode operar para a decisão, não se dispensa o dispositivo, pois que aqueles só são atendíveis se a “parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar”, além de, quanto aos mesmos, ser facultado o exercício do contraditório. Na petição (sem modificação na resposta), os AA alegam que o bem imóvel comprado à ré tem defeitos que se manifestaram agora (com relação á denúncia de 2006) e concretizaram esses vícios que dizem ser novos, tendo anteriores vícios denunciados sido reparados. Vícios estes que, pelo desenvolvimento da lide, se verifica terem sido denunciados em 2001 e reparados em 2002. É naqueles vícios, denunciados (na sua alegação) em 2006, descritos nos pontos 2º a 10º da base instrutória – als. G) a O) da matéria de facto, que fundam a sua pretensão. Não em defeitos anteriormente denunciados e que foram reparados. O vir-se, agora, dizer que os vícios reparados em 2002 voltaram a manifestar-se de forma visível e mais gravosa, originando outros, não é facto complementar dos inicialmente alegados, mas factos diferentes, que não se integram na situação jurídica inicialmente alegada. Nem à procedência, a provarem-se os inicialmente alegados (incluindo o reconhecimento da Ré), se pedia a prova dos factos que os apelantes agora quem “aditados”. Na verdade, o decaimento da pretensão aconteceu por se provar que os defeitos provados já eram do seu conhecimento (e foram denunciados) em 10 de Novembro de 2004 (al. Y) da matéria de facto) e não se provou que a ré reconheceu esses defeitos e se comprometeu a repará-los. Para evitar a caducidade, alegam, como facto essencial, o reconhecimento dos defeitos pela Ré e o compromisso da sua reparação (quer os defeitos fossem denunciados só em 2006 ou também em 2004). O que não se provou e não é aceitável que uma aceitação (e reparação) de defeitos denunciados em 2001, valha para todos os defeitos surgidos e denunciados posteriormente. São factos diversos, não complementares, a aceitação dos defeitos denunciados em 2001 (que foram reparados) da alegada (e não provada) aceitação dos vícios denunciados em 2006 (ou 2004) que afirmaram ser defeitos novos e fundamentam a acção. Novos por surgidos (ou se manifestarem) posteriormente (já que, em princípio, todos os defeitos existem, ao menos em germe, na data da contratação, sejam aparentes ou ocultos, presentes ou futuros, só que, alguns deles, só se manifestam ou são detectados posteriormente). Sem relevância na decisão, mas chama-se a atenção que, mesmo que se tratasse de um ressurgimento dos mesmos defeitos, depois de “eliminados”, não estavam os apelantes dispensados da denúncia e exercício dos demais direitos nos prazos legais (iniciados com a entrega da coisa reparada – entendemos nós) para evitar a caducidade. Sendo os AA. a alegar a reparação desses defeitos (o que equivale ao reconhecimento do direito daqueles pela ré), quaisquer outros que surgissem ou fossem os mesmos que ressurgissem após a tentativa de eliminação frustrada, teriam de ser comunicados (denunciados) à ré para os eliminar. Acresce que, como se verifica dos termos processuais, não se detecta que os (ora) apelantes tenham manifestado a vontade de se aproveitarem dos factos que querem ver aditados à base instrutória e o tribunal não pode atendê-los oficiosamente. Essa manifestação de vontade tem de ocorrer antes da sentença, para que o Juiz possa pronunciar-se. Se não se declara ao tribunal a vontade de aproveitamento de situação factícia vantajosa, para que possa apreciar da admissibilidade da pretensão, não tem aquele (nem deve) pronunciar-se sobre questão não colocada pelas partes, a quem cabe definir a controvérsia. Não seria tempestiva a suscitação da questão apenas nas alegações de recurso, já que este tribunal só pode apreciar as questões objecto de decisão no tribunal recorrido (e na parte impugnada), ou, ao menos, suscitadas perante esse tribunal e cuja pronúncia o mesmo indevidamente omitiu, em contravenção com o estatuído no artigo 660º/2 do CPC. Com os recursos não se visa criar decisões novas sobre matéria nova, estando seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido. Não preenchida a situação prevista no artigo 264º/3 do CPC, improcede o recurso nesta parte. 7) – A acção foi julgada improcedente por proceder caducidade. No entanto, na douta sentença faz-se decorrer a improcedência da caducidade da denúncia. Não obstante dissente-se dessa posição. Como consta da al. Y) da matéria de facto, os defeitos foram denunciados em Novembro de 2004, por carta datada de 10 desse mês. Denunciar é comunicar á vendedora a existência dos defeitos para esta os eliminar ou reparar. Como esta, a não ser que actue com dolo (caso em que se dispensa a denúncia), pode não conhecer os vícios que se manifestaram após entregar o imóvel e tendo o direito de, em execução específica, proceder ás reparações necessárias, com vista ao exacto cumprimento, é que se exige essa denúncia para possibilitar ao devedor eliminar o defeito da sua prestação. Ora, não se mostra indiciado que quando os defeitos foram denunciados (em 2004), já se tivesse esgotado o prazo legal de denúncia. Mas, a ré também não pretende propriamente excepcionar a caducidade da denúncia. O que alega de 17º a 20º da contestação direcciona-o antes no sentido da falta de denúncia, que entende pressuposto do exercício do direito de acção, por a denúncia datada de 24/04/2006 apenas chegar, e sem culpa sua, ao seu conhecimento em 26/ 04/2006, depois de interposta acção (e isto, apesar de alegar que, já em 2004, os AA haviam denunciado os mesmos defeitos). O credor não está impedido de efectuar a denúncia na própria petição. Ao credor não se exige nova denúncia, nem qualquer manifestação nesse sentido importa a suspensão ou interrupção (o que nem acontece com a caducidade – artigo 328º do CC) dos prazos em curso. Com a denúncia dos defeitos, inicia-se o decurso de outro prazo – o de caducidade do exercício dos direitos de que beneficia o comprador de coisa defeituosa. E é essa a caducidade invocada pela ré/apelada, conforme, de modo claro, se verifica do que expõe nos arts. 21º a 25º da contestação, ao dizer que, tendo os AA denunciado os defeitos em 10 de Novembro de 2004, teriam de propor a acção até 09 de Novembro de 2005, pelo que ao proporem-na em 24 de Abril de 2006, caducou direito dos AA. para peticionar em juízo. Os apelantes compraram o imóvel, de sua habitação, à apelada que o havia construído (als. A) e F) da matéria de facto). No caso, o vendedor foi também o construtor do prédio. Por isso que, e atento o disposto no artigo 1225º/4 do CC, é aplicável, nomeadamente quanto aos prazos que o comprador tem para a denúncia do defeito da prestação e para o exercício dos direito em juízo, o regime legal previsto nesse artigo. Como dispõe o artigo 913º, “se a coisa vendida sofre de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias à realização daquele fim”, tem o comprador “direito a exigir do vendedor a reparação da coisa ou, se for necessário e esta tiver natureza fungível, a substituição dela” (artigo 914º), redução do preço (artigo 911º), anulação do contrato (artigo 905º) e indemnização (arts. 908 e 909), direitos de exercício alternativo, sempre passíveis de acumulação com a indemnização pelos prejuízos sofridos. Padecendo a coisa vendida de vícios ou defeitos, nos termos do referido artigo 913º, o comprador, para exercer o direito de reparação ou substituição da coisa, há-de proceder á sua denúncia ao vendedor, por forma que a este seja dada a possibilidade de realizar os direitos conferidos ao comprador (artigo 916ºº), sem o que, e decorridos os prazos aí fixados (ampliados ao abrigo do artigo 1225º, na situação do contrato de compra e venda ter por objecto edifício ou sua fracção destinados a longa duração e o vendedor ser também o construtor – como na concreta situação), o direito do comprador caduca. Acresce que, denunciado o vício ou defeito, não sendo satisfeitos os direitos do comprador, pela eliminação dos vícios ou defeitos (ou, se necessário, pela substituição da coisa), a acção destinada a exercer esses direitos deve ser proposta dentro dos seis meses seguintes (artigo 917º) ou do ano seguinte (no caso de aplicação do artigo 1225º) à denúncia dos defeitos sob pena de caducidade. Não obstante o teor literal do artigo 917º, se referir apenas às acções de anulação por simples erro, abrange, na sua doutrina, aplicada extensivamente (pois que a razão de ser dos curtos prazos para a acção previstos nesse normativo, colhe no exercício de qualquer das demais garantias, qualquer que seja a escolhida pelo comprador), as acções em que se pede a reparação dos defeitos e outras em que esteja em causa a responsabilidade do vendedor por defeitos da coisa vendida, como as que se destinam a accionar outras garantias, que assistam ao comprador de coisa defeituosa, no termos dos arts. 913º e seguintes do CC. Assim, “não se compreenderia que o legislador só tivesse estabelecido um prazo para a anulação do contrato, deixando os outros pedidos sujeitos a prescrição geral de vinte anos (artigo 309.º); por outro lado, tendo a lei estatuído que, em caso de garantia de bom funcionamento, todas as acções derivadas do cumprimento defeituoso caducam em seis meses (artigo 921.º, n.º4), não se entenderia muito bem porque é que, na falta de tal garantia, parte dessas acções prescreveria no prazo de vinte anos; além disso, contando-se o prazo de seis meses a partir da denúncia, e sendo esta necessária em relação a todos os defeitos (artigo 916.º), não parece sustentável que se distingam os prazos para o pedido judicial; por último, se o artigo 917.º não fosse aplicável, por interpretação extensiva, a todos os pedidos derivados do defeito da prestação, estava criado um caminho para iludir os prazos curtos”[4].” É neste sentido a doutrina e jurisprudência[5] dominantes. Por isso, sendo a coisa comprada defeituosa, perante a doutrina do artigo 917º do CC, desde a denúncia, teria o comprador o prazo de seis meses para o exercício da acção. Porém, á que ponderar o disposto no artigo 1225º/2, 3 e 4, do CC (na redacção do DL 267/94, de 25/10), aplicável nas relações entre o comprador e o vendedor, quando a coisa imóvel vendida seja defeituosa, e este seja, simultaneamente, o construtor do imóvel – que constitui a coisa defeituosa ou em que a mesma se integra. Nessa situação, o prazo de caducidade da acção para o exercício dos direitos de reparação dos defeitos e indemnização é de um ano subsequente à denúncia dos defeitos ou vícios da coisa vendida, nos termos desse artigo 1225º/2 e 3, do CC. No caso dos autos, não está em causa a denúncia que, efectivamente, foi efectuada (ver al. Y) da matéria de facto) e não foi questionada a sua tempestividade, mas apenas a caducidade da acção. O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine (artigo 328). Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei atribua efeito interruptivo ou, quando se trate de direito disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido (artigo 331º). Reconhecimento que, alegado pelos AA., não se provou (conforme decisão negativa ao ponto 13º da base instrutória). Na ausência desse reconhecimento dos defeitos pela Ré e compromisso da sua eliminação, não há que falar em prazo (normal – artigo 309º do CC) de prescrição dos direitos subsequente ao reconhecimento. Só pela proposição da acção se impediria a caducidade, que teria de ser instaurada dentro do prazo legalmente previsto, ou seja, um ano[6] após a denúncia. Na espécie, atenta a data da propositura da acção (24/04/2006), e em consideração da data da denúncia, efectuada por comunicação de 10/11/2004, quando se propõe a acção há muito que estava extinto o prazo de caducidade, de um ano. A apelação improcede. Em síntese - A aceitação, pelo vendedor, de defeitos na coisa vendida, que reparou, não implica a aceitação de outros alegados defeitos que surjam posteriormente, mesmo que sejam o ressurgimento dos defeitos anteriormente reparados, devendo o comprador proceder à sua denúncia. Denunciados os defeitos no imóvel/habitação, como os apelantes fizeram, sem que tenham sido reparados ou admitidos pelo vendedor, para obstar à caducidade do direito, devia a acção ser proposta no ano seguinte á denúncia, não evitando a caducidade a renovação desta. 8) – Pelo exposto, acorda-se neste tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida. Custas pelos apelantes. Porto, 02/02/2012 José Manuel Carvalho Ferraz António do Amaral Ferreira Deolinda Maria Fazendas Borges Varão ___________ [1] Os itálicos são nossos. [2] Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, em Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 70 e 72/73. [3] Idem, pág. 70. [4] Romano Matrinez, em “Cumprimento Defeituoso em Especial na Empreitada e na Compra e Venda”, ed. de 1994, 413. [5] Ver Calvão da Silva, Compra e Venda de Coisas Defeituosas, Conformidade e Segurança, 4.ª ed., 77, Luís Teles de Menezes, Direito das Obrigações, III, 126, Armando Braga, em A Venda de Coisas Defeituosas no Código Civil, A Venda de Bens de Consumo, 47 e Pires de Lima/Antunes Varela, em CC Anotado, II, e, entre outros, Acs. do STJ, de 04/05/2010, de 02/11/2010 e de 16/03/2011, todos em www.dgsi.pt, procs. 2990/06.0TBACB.C1.S1, 6473/06.0TBALM.L1.S1 e 558/03.2TVPRT.P1.S1). [6] Face à lei vigente na data do contrato e da propositura. Pelo DL 67/2003, de 08/0, na redacção do DL 84/2008, de 21/05, que só entrou em vigor trinta dias após a sua publicação, a solução poderia ser diversa (face ao artigo 5º-A/3, introduzido por este último DL). |