Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00036755 | ||
Relator: | PINTO FERREIRA | ||
Descritores: | CONDOMÍNIO ACTAS TÍTULO EXECUTIVO | ||
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Nº do Documento: | RP200402190450201 | ||
Data do Acordão: | 02/19/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Constitui título executivo a acta da assembleia de condóminos que deliberou sobre o montante das contribuições devidas por cada condómino, inexistindo impugnação. II - Assim, logo que vencido o prazo e o pagamento não tiver sido satisfeito, a força coerciva da acta existe, contra o condómino devedor, não carecendo o condomínio de, em ulterior assembleia, aprovar as dívidas (anteriores), para só então as fazer executar. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – Relatório A Administração do Condomínio do prédio sito na Rua ............., n.ºs ... a ... e Rua .............. n.ºs ..., ..., ... e ..., ............., intentaram execução para pagamento de quantia certa com processo ordinário contra Fernando .............. e Maria ..............., residentes na Rua ............, ........., ............., pedindo que se proceda á penhora de bens a estes pertencentes com fundamento na falta de pagamento das prestações trimestrais devidas ao condomínio desde Fevereiro de 2001 a Julho de 2002, com os respectivos juros legais. Juntaram, como títulos executivos, as actas das assembleias de condóminos que entenderam como adequadas. Concluso o processo, o tribunal considerou que em nenhumas delas constava a aprovação do valor em dívida e aqui em causa, não preenchendo os requisitos que considera essenciais, pelo que indeferiu liminarmente a execução, absolvendo os executados da instância. Inconformado recorre a exequente, recurso recebido como de agravo e efeito suspensivo. Apresentou alegações. Sustentou-se o despacho proferido. Colhidos os vistos legais, nada obsta ao conhecimento do recurso. * II – Fundamentos do recurso Limitam e demarcam o âmbito dos recursos o teor das respectivas conclusões – artigos 684º n.º 3 e 690º n.º 1 do CPC –, que, no caso concreto, foram: 1 - Veio o presente recurso interposto da sentença, que indeferiu o requerimento executivo, por as actas juntas não preencherem os requisitos para serem títulos executivos. 2 - A expressão "contribuições devidas ao condomínio" pode ser interpretada no sentido de "contribuições em dívida ao condomínio" ou no sentido de "contribuições que vierem a ser devidas ao condomínio" desde que estejam vencidas. 3 - Uma interpretação não exclui a outra do âmbito das actas como título executivo. 4 - A exclusão de uma das interpretações vai contra a letra da lei e a outra contra o seu espírito. 5 - Entendimento que vem sendo seguido pela jurisprudência. 6 - No caso vertente das actas juntas a acta número dois enquadra-se numa interpretação e a acta número quatro enquadra-se na outra. 7 - Ambas correspondem á deliberação da mesma vontade colectiva, a de obter o pagamento, das quantias necessárias ao normal funcionamento do condomínio. 8 - E apenas divergem por força da deliberação ser tomada em momentos subsequentes. 9 - Pelo que deve prosseguir a presente execução nos termos requeridos. Termos em que deve a decisão recorrida ser revogada, ser a execução recebida, prosseguindo-se os demais termos até final. * III – Os factos e o direito Considerou o tribunal a quo que a acta da assembleia de condóminos para valer como título executivo tem de nela constar a aprovação do valor em dívida pelo condómino relapso. Como no caso presente considerou que tal não constava, indeferiu o requerimento executivo liminarmente. Para a agravante basta-lhe, para ser título executivo, a acta em que se aprove e se delibere a quota-parte das contribuições de cada condómino, bem como o prazo de pagamento e que esteja vencida a dívida. Analisemos a questão. Determina o art. 6º do DL 268/94 de 25/10 que: - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixe de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte. Ora, sobre este normativo tem-se vindo a discutir se, quando se fala em “contribuições devidas ao condomínio” se deve entender como “contribuições em dívida ao condomínio” ou “ contribuições que vierem a ser devidas ao condomínio”. E esta simples e vulgar divisão temporal “em dívida”, portanto já apuradas, ou que “vierem a ser devidas”, portanto, mesmo as futuras, torna-se de enorme e importante relevo. De facto, existe, normalmente, em todos os condomínios uma acta, a 1ª, onde se fixam as quotas-partes dos valores a pagar por cada condómino, em função da permilagem que a sua fracção ocupa no seu todo e, anualmente, uma acta em que se aprovam as contas do ano anterior e se apresentam as despesas e receitas para o novo ano, tendo sempre em atenção a quota-parte de cada condómino, e em cujo relatório anual constam também e vulgarmente todos os montantes em dívidas pelos condóminos relapsos. Daí que, da decisão desta problemática se extrairá as condições que deverão constar da acta para que possa ser usada e considerada como título executivo e obedeça, também, aos comandos legais dos artigos 45º e 46º do CPC, disposições que estabelecem a função do título executivo, determinando o fim e limites da acção executiva e as espécies que lhe podem servir de base. Outro normativo a ter em conta para análise desta situação será o 802º do CPC que exige como requisitos da obrigação exequenda que esta seja certa, exigível e líquida, se o não for em face do título executivo, ainda que constitua uma fase introdutória da execução. Convirá ainda reter que o referido DL, como se vê do seu preâmbulo, teve em vista procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros, donde a atribuição de força executiva às respectivas actas. Haverá ainda de conjugar todos estes factores, com o espírito e a letra da lei, a retirar pelo intérprete, quer resultante do citado DL – art. 6º -, quer das normas processuais que o coadjuvam – artigos 45º, 46º e 802º do CPC- , quer ainda de direito civil – art. 9º n.º 1 do C. Civil -, para se concluir que uma acta, para servir de título executivo, terá de fixar a quota-parte de cada condómino, como os montantes e o valor das contribuições devidas ao condomínio ou de despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns ou serviços de interesse comum, como o prazo para o respectivo pagamento. O facto de, no relatório anual surgir, normalmente como documento anexo, os valores concretamente em dívida pelo condóminos, é meio meramente contabilístico, apenas para efeitos de prestação de contas. Isto é, a acta em que se determina o montante anual a pagar pelo condómino será sempre título executivo, na medida em que fixa a sua contribuição, não exigindo que contenha, mas podendo constar e resultar da acta, a dívida ou dívidas do condómino relapso, mas dívidas já existentes, apuradas e conhecidas. Porém, a acta deverá ser tida logo título executivo, na medida em que fixa o montante da contribuição de cada condómino, com a ressalva de, naturalmente, não ser impugnada pelo condómino nos termos do art. 1433º, n.º 2 e 3º do C. Civil (conforme esteja presente ou ausente), caso em que, então, deverá ser entendido como a ela tendo aderido, reconhecendo, portanto, a dívida. O condómino é convocado para a assembleia – art. 1432º do C. Civil -, conhece a ordem do dia e o que nela se irá discutir e sabe que o fim último e essencial desta é para analisar e aprovar as contas respeitantes ao último ano e aprovar o orçamento de despesas, ordinárias ou extraordinárias, a efectuar durante o ano que se inicia – art. 1431º do C. Civil -. E sempre ficará salvaguardada a posição do condómino faltoso no pagamento, uma vez que ainda pode usar os embargos, nos termos do art. 815º do CPC. Evidentemente, que as prestações exequíveis serão aquelas e apenas aquelas que estejam já vencidas. Interpretar o art. 6º do DL n.º 268/94 no sentido de apenas serem exequíveis as actas da assembleia onde constasse já as dívidas apuradas e já existentes, â data dessa aprovação, seria demasiado redutora e restritiva, que poderia levar mesmo à paralisação de grande parte das administrações de condomínios. Basta prever, quer para pequenas quer mesmo para grandes administrações, a necessidade de convocação permanente de assembleias, para que, na respectiva acta, para servir de título executivo, constasse a aprovação do valor em dívida do condómino relapso até aquele momento, dificultando, deste modo, a eficácia da deliberação e impedindo, inclusive, o decorrer normal das relações entre condóminos. Todo o condómino sabe que as prestações anuais correspondentes à sua quota-parte nas despesas comuns, são para serem pagas e que, anualmente, se fixam valores para essa mesma contribuição, em função da sua quota-parte, pelo que está obrigado ao seu pagamento. Igualmente sabe que todas as obras levadas a cabo no seu prédio em virtude da sua conservação ou fruição, serão também para pagar, nos termos definidos no art. 1424º do C. Civil. Somos assim, de opinião diferente da manifestada pelo tribunal a quo e seguimos a propugnada pela agravante, sem prejuízo do entendimento supra manifestado. Ora, no caso concreto dos autos, a exequente juntou a acta n.º 2 (fls. 30), de 4 de Novembro de 1999, na qual se determina a quota-parte mensal de cada um dos condóminos, vencimento e forma de pagamento e a acta n.º 4, de Agosto de 2001, onde se delibera a aprovação das contas até final de Julho de 2001, em cujo anexo consta a listagem dos devedores, entre os quais, o autor. Eis, aqui, o exemplo de junção de duas actas, consideradas úteis à acção executiva, em que se apresentam os valores devidos pelo condómino e se justifica o pedido dos que vierem a ser devidos pela acta em que se fixou a sua quota-parte, ambas tendo em vista a cobrança do débito. Mas, para que tudo fique claro, entendemos que é exequível e como tal, título executivo bastante e suficiente, a acta da assembleia de condóminos em que se fixa a quota-parte de comparticipação de cada condómino para as despesas comuns, bem como o prazo e modo de pagamento, para suportar a execução movida contra o condómino relapso nesse pagamento, desde que estejam vencidas, como igualmente o será para cobrança de despesas extraordinárias feitas para conservação e manutenção do edifício. A entender-se doutro modo, seria necessário deixar decorrer um prazo para, na nova assembleia, se aprovar o valor das dívidas ocorridas até aí e, então, constituir tal acta título executivo. Seria coarctar, as mais das vezes, o funcionamento normal de um condomínio, levando-o, porventura, ao seu estrangulamento e favorecer, injustificadamente, os condóminos devedores. Bastará pensar num condomínio de 10 fracções em que basta os condóminos de 6 ou 5 não pagarem e mais grave ainda quando desde o início da administração, para a bloquear totalmente. Mais perigoso ainda quando se trata de despesas extraordinárias. As sucessivas assembleias seriam impraticáveis. Portanto, a acta que vale como título executivo é a que tiver deliberado sobre o montante das contribuições devidas pelo condómino, em função da quota de comparticipação de cada uma das unidades da fracção do prédio e fixa prazo de pagamento. Naturalmente, desde que vencidas e não pagas. Verificada esta última condição, tal acta será logo título executivo, na medida em que fixa a contribuição de cada um para as despesas de condomínio. O que se mostra necessário é que a acta da assembleia expresse que os condóminos deliberaram a fixação de um montante, tanto para despesas ordinárias como extraordinárias, a serem comparticipadas pelos condóminos, em função da sua quota-parte, bem como o prazo e modo do seu pagamento Assim, em face do exposto, consideramos que as actas apresentadas pela exequente são suficientes para serem tidas como títulos executivos no presente execução e com o valor nela pedido, tudo ao abrigo do art. 6º do DL n.º 268/94. A decisão deverá ser substituída por outra em que receba a execução e ordene o seu prosseguimento, salvo se, por outra razão, não for de prosseguir. * V – Decisão Nos termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em se dar provimento ao agravo e, como tal, revogar a decisão recorrida que deve ser substituída por outra em que receba a execução e ordene o seu prosseguimento. Sem custas. * Porto, 19 de Fevereiro de 2004 Rui de Sousa Pinto Ferreira Joaquim Matias de Carvalho Marques Pereira Manuel José Caimoto Jácome |