Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JOÃO PROENÇA | ||
Descritores: | ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS IMPUGNAÇÃO DA DELIBERAÇÃO CADUCIDADE | ||
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Nº do Documento: | RP201201174746/08.7TBVNG.P1 | ||
Data do Acordão: | 01/17/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA. | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A falta de demonstração da observância dos procedimentos de convocação e funcionamento da assembleia que aprovou a deliberação em crise só pode considerar-se suprida quando o condómino já não possa instaurar acção de impugnação, nos termos do art.º 1433.º do C.Civil, de tal sorte que, relativamente a ele, a deliberação adquira carácter definitivo. No caso vertente, por se tratar de condómino que não assinou a acta nem qualquer aviso convocatório, presumindo-se ausente e não notificado, deveria a deliberação ter-lhe sido comunicada por carta registada com aviso de recepção, nos termos do n.º 6 do art.º 1432.º do CCivil. Sem tal comunicação, que não se demonstra, estava o Réu em tempo para reagir contra a deliberação, pelos meios facultados pelos n.ºs 1 a 5 do art.º 1433.º do CCivil. II - Encontrando-se o Réu em prazo para impugnar a deliberação em apreço, não lhe é exigível o respectivo cumprimento, para mais sendo a acta omissa quanto à fixação das concretas quotas a seu cargo. Nem se diga que tal prazo começaria a correr a partir do momento em que foi citado para a presente acção. É que com a citação do Réu estabilizaram-se os elementos essenciais da instância, de acordo com o princípio consagrado no art.º 268.º do CP. Civil. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 4746/08.7TBVNG – Apelação Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Administração do Condomínio do Edifício …, sito na Avenida …, números … a …, e Rua …, n.° .. a .., …, Vila Nova de Gaia, propôs contra B…, residente na Rua …, lote .., …, Cascais, acção com processo comum sob a forma sumária, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de 8.778,67 €, acrescida de juros vencidos, no montante de 470,25 €, e vincendos, à taxa legal. Alega para tanto, em resumo, que o Réu é proprietário de duas fracções do prédio constituído em propriedade horizontal administrado pelo Autor, correspondentes a habitação e respectivo lugar de garagem. Em assembleia de condóminos datada de 5-6-2007 foram deliberadas quotas extras para pagamento das obras de conservação a executar no referido prédio, nos montantes, respectivamente, de € 8.339,76 e € 438,91 para cada uma das fracções propriedade do Réu, que as não pagou Citado, o Réu contestou, dizendo não ter sido notificado para qualquer reunião de condomínio nem do conteúdo de qualquer deliberação. Invoca ainda que as actas juntas pelo Autor não se mostram assinadas por qualquer dos condóminos alegadamente presentes nas assembleias a que se reportam e que, em qualquer caso, as deliberações aprovas tê-lo-iam sido sem que para as mesmas existisse quórum e que, por ser o Réu apenas proprietário da raiz das sobreditas fracções, são da responsabilidade da usufrutuária e não do Réu quaisquer quotas extra destinadas ao pagamento de obras de conservação do edifício. Dispensada a selecção da matéria assente e organização da base instrutória, realizou-se a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, julgando a acção improcedente, por não provada, absolvendo em consequência o Réu dos pedidos. Inconformado, interpôs o Autor recurso de apelação, finalizando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª - Vem o presente recurso interposto da sentença de fls... que julgou "...a presente acção improcedente, por não provada, absolvendo em consequência o Réus dos pedidos." 2ª - Salvo o devido respeito e melhor opinião, entendemos que o Tribunal "a quo" fez uma errada interpretação da matéria de facto e aplicação do direito. 3ª - Face à matéria de facto dada como provada entendeu o Tribunal "a quo" que a A. "...não provou nem a existência de uma qualquer deliberação que tivesse imposto ao Réu, ainda que este fosse proprietário pleno das fracções que aqui se discutem, o pagamento de qualquer montante a título de despesas de conservação, nem a sua oportuna comunicação ao mesmo." 4ª - É verdade que da matéria dada como provada não se alcança a deliberação da forma de pagamento e a comunicação dessa deliberação, mas tais factos apenas implicam que, relativamente ao Réu, o prazo de impugnação das deliberações só se começaria a contar do momento em que foi citado para a presente acção. 5ª - Face ao documento junto, o Tribunal "a quo", facilmente poderia através de uma operação aritmética chegar ao valor que caberia ao Réu, pois da lista de presenças que faz parte do doe. n° 1, junto com a P.I., consta a permilagem das fracções "BB", 19,30 por mil e "DU", 2,00 por mil. 6ª - Face ao valor da obra adjudicada, € 389.776,00, acrescido de IVA, à taxa legal (em 2007 a taxa era de 21%) daria para a fracção "BB" € 9.102,00 e para a fracção "DU" € 943,00. 7ª - É verdade que os valores reclamados são inferiores ao cálculo aritmético em virtude da distribuição dos centros de custos das obras pelas várias partes do edifício (facto que o Tribunal "a quo" desconhece e não teria forma de conhecer), mas isso não invalida, salvo o devido respeito e melhor opinião, que o Tribunal "a quo" pudesse condenar no valor peticionado, uma vez que face ao valor da obra e à permilagem das fracções o valor abstractamente devido até seria maior e poderia aplicar o princípio de que o que permite o mais, permite o menos. 8ª - Salvo o devido respeito e melhor opinião, o Tribunal "a quo" fez uma incorrecta apreciação dos elementos probatórios à sua disposição, nomeadamente o documento junto, uma vez que face aos elementos ali constantes estaria em condições de dar como provados os valores peticionados a título de obras. 9ª - Impõe-se a este Venerando Tribunal, no uso dos poderes que lhe são conferidos, corrigir a matéria dada como provada, dando como provado os valores peticionados a título de obras, com as legais consequências. 10ª - Vem o Tribunal "a quo" pronunciar-se, ainda, no sentido de "...que o Réu é apenas o nu-proprietário das fracções e sendo o usufrutuário das mesmas outra pessoa, sempre seria a esta e não aquele que competiria o pagamento dos montantes que aqui estão a ser peticionados, já que são a cargo do usufrutuário as despesas ordinárias indispensáveis para a reparação do edifício, categoria nas quais as despesas nestes autos reclamadas se inserem - artigo 1472° n° 1 do Código Civil. Sempre teria pois a presente acção, quanto mais não fosse com este fundamento, que improceder." 11ª - Salvo o devido respeito e melhor opinião não podia o Tribunal "a quo" ter-se pronunciado sobre esta questão uma vez que não deu como provado o montante da quota que caberia ao Réu. 12ª - Não dando o Tribunal "a quo" como provado o montante da quota que caberia ao Réu, não pode classificar tal despesa como ordinária uma vez que não tem matéria que sustente tal decisão. 13ª - O artigo 1472° do código civil classifica as despesas ordinárias como sendo aquelas que são indispensáveis para a conservação da coisa, mas tem como limite de valor o estatuído no n° 2 do mesmo artigo, não excedam dois terços do rendimento líquido. 14ª - Se na matéria dada como provada não consta o valor da quota parte da obra, não pode o Tribunal "a quo" conhecer da natureza da obra e, ao fazê-lo, cometeu a nulidade prescrita na al. d) do n° 1 do art. 668° do C.P.C., nulidade que se invoca com as legais consequências. 15ª - Se assim não se entender, mal andou o Tribunal "a quo" a decidir como decidiu, uma vez que o mesmo art. 1472° do Código Civil no seu n° 2 prescreve que "2 - não se consideram ordinárias as reparações que, no ano em que forem necessárias, excedam dois terços do rendimento liquido desse ano.". 16a - Ora, face à matéria constante dos autos, da certidão junta a fls... resulta que a fracção "BB" tinha um valor patrimonial de € 101.883,79 e a fracção "DU" um valor patrimonial de € 5.038,20. 17ª - Se aplicarmos analogicamente o n° 2 do art. 1434° do Código Civil, teríamos que aplicar o rendimento colectável, que face ao Código do Imposto Municipal de Imóveis corresponde ao valor patrimonial. Aqui teríamos que dar razão ao Tribunal "a quo" uma vez que os valores a partir dos quais as obras seriam extraordinárias seriam respectivamente € 67.923,00 e€ 3.359,00. 18ª - Salvo o devido respeito e melhor opinião, parece-nos que o n° 2 do art. 1474° ao referir-se ao "rendimento liquido" não se está a referir ao rendimento colectável mas antes ao valor do rendimento concreto, se for possível apurar, ou abstracto se não for possível apurar concretamente, como é o caso dos autos uma vez que tanto quanto se sabe não produz qualquer rendimento directo. 19ª - Se tivermos em atenção que um apartamento com as mesmas características e localização poderá ter uma renda entre € 700,00 e € 1.000,00 mensais, sendo que nestes valores está incluído o lugar de garagem que custará cerca de € 50,00 mensalmente, chegaremos aos seguintes valores: - fracção BB - € 950,00 xl2 = € 11.400,00 por ano; - fracção DU - € 50,00 x 12 = € 600,00 por ano. 20ª - Se considerarmos 2/3 do rendimento bruto estaremos a falar de € 7.600,00 para a fracção "BB" e € 400,00 para a fracção "DU". 21ª - Face aos valores alcançados, parece-nos claramente que face ao estatuído no n° 2 do artigo 1474° do Código Civil estaremos perante uma despesa extraordinária da responsabilidade do nu-proprietário e não do usufrutuário. 22ª - Ao decidir como decidiu o Tribunal "a quo" fez uma errada interpretação e aplicação do estatuído nos números 1 e 2 do art. 1472° do Código Civil, vicio que se invoca com as legais consequências e que se impõe corrigir. 23ª - Impõe-se, assim, a este Venerando Tribunal alterar a sentença por outra que decida considerar a obra como extraordinária e portanto da responsabilidade do nu-proprietário. *** Não houve contra-alegações.Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. *** Na sentença recorrida vem dado como provado:1 - O Autor é administrador do condomínio do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida …, n.° … a … e Rua … n.° .. a .., da Freguesia de …, concelho de Vila Nova de Gaia. 2 - A nua propriedade das fracções designadas pelas letras "BB" e "DU" do prédio identificado no ponto 1 dos factos provados, a que correspondem uma habitação no .º andar direito, frente, com entrada pelo n.° … da Avenida …, Vila Nova de Gaia, e respectivo lugar de garagem, com entrada pelo n.° .. da Rua …, Vila Nova de Gaia, encontra-se registada a favor do Réu. 3 - Foi lavrada uma acta, à qual foi dado o n.° 3, donde consta que no dia 19-4-2007, pelas 21H00, reuniram-se em continuação da assembleia geral extraordinária de condóminos iniciada a 26-5-2006, os condóminos do edifício em regime de propriedade horizontal sito na Avenida … números … a … e Rua … números .. a .., aonde se encontravam presentes, ou devidamente representados, entre outros, o condómino proprietário das fracções "BB" e "DU", tendo sido deliberado pela maioria dos condóminos presentes, que perfaziam 754 por 1000 do capital investido do prédio, adjudicar a obra a realizar no aludido edifício à empresa C…, que havia apresentado um orçamento para a realização de tais obras no valor de 389.776,00 €, acrescido de IVA, à taxa legal - documento de fls. 11 a 13 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. *** Em causa no presente recurso está essencialmente a questão de saber se o A. demonstra a existência de deliberação da assembleia de condóminos que vincule o Réu, e que decorra para este a obrigação de pagar quotas extraordinárias referentes a obras de conservação nos montantes de € 8.339,76 para a fracção "BB" e de € 438,91 para a fracção.A douta sentença recorrida respondeu-lhe negativamente, por não ter o Autor provado, nem a existência de deliberação que tivesse imposto ao Réu o pagamento de qualquer montante a título de despesas de conservação, nem a sua oportuna comunicação ao mesmo. E, não obstante se afigurar que existiu efectivamente deliberação com tal conteúdo, ainda que sem discriminação da concreta quota a cargo do Réu, ajuizou acertadamente quanto ao mérito da causa. Vejamos porquê. Dispõe o art. 1.º, n.º 2 do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro que as deliberações das assembleias de condóminos devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para terceiros titulares de direitos relativos às fracções. Tais actas devem ser, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado. Tratando-se, porém, de documentos “ad probationem”, as aludidas assinaturas não são elemento constitutivo, nem pressuposto de validade da deliberação, não sancionando a com a nulidade a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia (cfr. acórdão desta Relação e Secção de 15/11/2007, JTRP00042062, Rel. Des. José Carvalho, acessível em www.dgsi.pt). Impõe-se, porém, que se demonstre a observância do regime aplicável à sua convocação e funcionamento, maxime o disposto no Cód. Civil, nos seus arts. 1432º e 1433º. Ora, nos termos do n° 1 do art. 1432° do Código Civil "a assembleia é convocada por meio de carta registada, enviada com 10 dias de antecedência, ou mediante aviso convocatório feito com a mesma antecedência, desde que haja recibo de recepção assinado pelos condóminos", devendo a convocatória indicar o dia, hora local e ordem de trabalhos da reunião (n.º 2 do mencionado artigo). As deliberações são tomadas por maioria dos votos representativos do capital investido e, caso não compareça o número de condóminos suficiente para se obter vencimento e na convocatória não tiver sido desde logo fixada outra data, considera-se convocada outra reunião para uma semana depois, na mesma hora local, podendo então a assembleia deliberar por maioria de votos dos condóminos presentes, desde que representem permilagem não inferior a um quarto do capital do prédio (n.ºs 3 e 4 do mesmo artigo). Reclamando-se na acção o pagamento de prestações de condomínio alusivas a fracções de prédio constituído em propriedade horizontal, é sobre o credor que impende o ónus de alegação e prova de que efectuou os procedimentos alusivos à convocatória para a assembleia e que mesma deliberou e podia deliberar com vista à fixação do valor dessas prestações (cfr. Ac. Relação de Coimbra de 03-03-2009, Proc. 3/06.1TBALB.C1, in www.dgsi.pt). No caso vertente, o autor, ora recorrente, não provou, quer relativamente ao Réu, quer aos restantes condóminos, ter cumprido os procedimentos legalmente exigíveis para a convocatória, assim como não provou que relativamente às prestações cujo pagamento peticiona, o condomínio tenha deliberado com o número de votos indispensáveis. Disso se dá perfeitamente conta o recorrente, ao escrever nas suas doutas alegações “É verdade que da matéria dada como provada não se alcança a deliberação da forma de pagamento e a comunicação dessa deliberação, mas tais factos apenas implicam que, relativamente ao Réu, o prazo de impugnação das deliberações só se começaria a contar do momento em que foi citado para a presente acção”. Como implicitamente reconhece o recorrente, a falta de demonstração da observância dos procedimentos de convocação e funcionamento da assembleia que aprovou a deliberação em crise só pode considerar-se suprida quando o condómino já não possa instaurar acção de impugnação, nos termos do art.º 1433.º do C.Civil, de tal sorte que, relativamente a ele, a deliberação adquira carácter definitivo. No caso vertente, por se tratar de condómino que não assinou a acta nem qualquer aviso convocatório, presumindo-se ausente e não notificado, deveria a deliberação ter-lhe sido comunicada por carta registada com aviso de recepção, nos termos do n.º 6 do art.º 1432.º do CCivil. Sem tal comunicação, que não se demonstra, estava o Réu em tempo para reagir contra a deliberação, pelos meios facultados pelos n.ºs 1 a 5 do art.º 1433.º do CCivil – sendo jurisprudência uniforme a de que a caducidade do direito de acção de anulação opera, sempre, tanto para os condóminos presentes como para os ausentes, no prazo de 60 dias contados da data da deliberação, conforme o n. 4 do artigo 1433.º (Acs. do Supremo Tribunal de Justiça de 17-03-2005, Proc. 05B018, 22-06-1999, Proc.º 99A1089, e Ac. da Relação de Lisboa de 25-11-2008, Proc. 2838/2008-1, todos in www.dgsi.pt), pressupõe, todavia, que se trate, em ambos os casos de condóminos notificados. Encontrando-se o Réu em prazo para impugnar a deliberação em apreço, não lhe é exigível o respectivo cumprimento, para mais sendo a acta omissa quanto à fixação das concretas quotas a seu cargo. Nem se diga que tal prazo começaria a correr a partir do momento em que foi citado para a presente acção. É que com a citação do Réu estabilizaram-se os elementos essenciais da instância, de acordo com o princípio consagrado no art.º 268.º do CP. Civil. E tal inexigibilidade dita, inexoravelmente, o insucesso da acção, nos termos em que a 1.a instância decidiu, prejudicada ficando a questão de saber a qual dos titulares incumbia a responsabilidade pelo encargo das obras, se ao usufrutuário, se ao proprietário da raiz. Decisão. Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida. Custas pelo recorrente. Porto, 2012/01/17 João Carlos Proença de Oliveira Costa Maria da Graça Pereira Marques Mira António Francisco Martins |