Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
797/19.4T8VCD-E.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
INCUMPRIMENTO
MULTA
DANOS PATRIMONIAIS
JUÍZOS CONCLUSIVOS
Nº do Documento: RP20230712797/19.4T8VCD-E.P1
Data do Acordão: 07/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - É matéria conclusiva toda aquela que não consiste na perceção de uma ocorrência da vida real, trate-se de um facto externo ou interno, mas antes constitui um juízo acerca de certa realidade factual, devendo distinguir-se dentro desta matéria conclusiva os juízos de facto periciais, dos juízos de facto comuns passíveis de serem emitidos por qualquer pessoa com base nos seus conhecimentos.
II - O incumprimento da Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais é passível de punição com pena de multa que varia entre meia unidade de conta e vinte unidades de conta (artigo 41º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível e 27º, nº 1, do Regulamento das Custas Processuais).
III - A compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do nº 4, do artigo 496º do Código Civil).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 797/19.4T8VCD-E.P1



Sumário do acórdão proferido no processo nº 797/19.4T8VCD-E.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:
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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:


1. Relatório[1]
Em 29 de março de 2022, por apenso ao processo de regulação das responsabilidades parentais nº 797/19.4T8CVD, pendente no Juízo de Família e Menores de Vila do Conde, Juiz 1, AA instaurou o presente incidente de incumprimento de Regulação das Responsabilidades Parentais contra BB pedindo a marcação de conferência de pais, com vista à verificação do incumprimento da regulação das responsabilidades parentais referentes a CC e imposição de medidas que sancionem e constranjam a requerida a cumprir o regime de visitas.
Para fundamentar as suas pretensões alegou, em síntese, que, por sentença datada de 12 de setembro de 2019 foi homologado o acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, tendo ficado acordado entre os progenitores que a CC[2] ficaria com o progenitor de quinze em quinze dias, sendo que o transporte da menor ficaria ao cuidado do progenitor que recolheria a menor na residência da progenitora às 09 horas de sábado e a entregaria no mesmo local às 19 horas do domingo imediato. Mais ficou estabelecido que o progenitor poderia ver e estar com a menor todas as segundas-feiras, quartas-feiras e sextas-feiras indo para o efeito recolher a menor em casa da mãe às 17 horas e 30 minutos e entregando-a no mesmo local às 19 horas e 30 minutos. Porém, a requerida impediu o pai de ver e estar com a menor, logo após a separação de facto do requerente e da requerida e desde 17 de maio de 2021. Foi instaurado processo tutelar de Promoção e Proteção que correu termos por apenso ao processo principal, o qual findou em 14 de fevereiro de 2022 face à desnecessidade de se manter a medida aplicada à criança CC. Após termo deste processo, paulatinamente, o requerente tentou voltar a restabelecer com a filha CC a regularidade dos contactos entre pai e filha, comunicando ao tribunal essa mesma intenção por requerimento, manifestando a sua disponibilidade para estar presente em conferência com vista a atualizar o regime das responsabilidades parentais, caso o tribunal entendesse necessário pois já previa forte oposição da requerida para cumprir o regime vigente. Mesmo depois da notificação aos progenitores do despacho proferido no processo principal que mantém o regime de visitas, a requerida não permitiu que o pai visitasse a menor, achando-a como “propriedade sua”, brincando com o requerente, ora dizendo que o “regime de visitas caducou”, “que o seu mandatário diz que não há visitas agora”, “que não pode ver a filha”, “agora só para o ano”, entre outras expressões do mesmo género, não permitindo que o pai esteja com a menor. A requerida tem feito de tudo para impedir o pai de estar com a filha desde que acabaram as visitas acompanhadas. Desde esse momento, a requerida nunca deixou o pai privar com a filha. O pai tentou cumprir o regime de visitas e assim procurou estar com a menor nos dias 23, 25 e 28 fevereiro das 17 horas e 30 minutos às 19 horas e 30 minutos, nos dias 26 e 27 fevereiro para pernoitar em sua casa, nos dias 2, 4, 7, 9, 11, 14, 16, 18 e 21 de março das 17 horas e 30 minutos às 19 horas e 30 minutos, nos dias 12 e 13 março para pernoitar em sua casa, no dia 12 março, dia de aniversário da CC. A requerida não deixa o requerente ver ou estar com a filha, incluindo no dia de aniversário desta, em que não deixou sequer o pai estar com a menor para lhe dar um beijo.
Em 21 de abril de 2022, realizou-se uma infrutífera conferência de pais sendo as partes remetidas para a mediação familiar.
Frustrada a mediação familiar, as partes foram notificadas para, querendo, alegar.
A requerida apresentou as alegações dizendo que no âmbito do processo de promoção e proteção o tribunal entendeu determinar uma vistoria técnica às condições em que o progenitor se propunha albergar a filha menor CC, recorde-se, em casa dos avós paternos, onde se haveriam de efetivar as visitas/convívios com aquele. Dessa vistoria resultou um relatório onde se apontava para a falta de condições de higiene e segurança da sobredita menor naquela habitação. O progenitor indicou como alternativa a casa da irmã, tia da menor CC, que, chamada a pronunciar-se informou o tribunal que já havia diligenciado para acomodar a sobrinha CC tendo para o efeito organizado um quarto para uso exclusivo da menor. Mais tarde, o progenitor veio dizer nos autos que, afinal, a menor CC já não iria ser acomodada em casa da irmã, para as visitas/convívios, antes sim, iriam essas visitas/convívios passar a ser em casa da namorada com quem iniciara recentemente uma relação, sendo certo que nem a requerida nem o tribunal conhece as condições de alojamento em que a nova namorada daquele se propõe acomodar a menor CC. Por óbvia e manifesta coerência de princípios, desconhecendo-se as condições da casa da namorada do progenitor, a exemplo do que aconteceu com a inspeção técnica em casa dos avós da menor, deverá o tribunal determinar uma outra vistoria técnica a fim de se saber em que condições o progenitor se propõe receber a filha menor CC, desta feita em casa da namorada. Mais alega que nunca se opôs, não se opõe, nem nunca se oporá, ao regime e visitas/convívios da menor ao progenitor bem sabendo o quanto esse direito/dever, enquanto de natureza jurídica, deve ser estabelecido no interesse da filha menor CC, por forma a promover a manutenção dos laços de afetividade com o progenitor não residente e a salvaguardar as suas referências parentais, indispensáveis ao seu crescimento e desenvolvimento salutar e harmonioso. Não obstante preocupa-a não conhecer as condições em que a menor será alojada para esse efeito, sendo que, da mesma forma que levou ao conhecimento do tribunal que aquela não tinha, em casa dos avós paternos, as mínimas condições de higiene e segurança, da mesma forma deverá o tribunal solicitar vistoria técnica sobre as condições de alojamento da menor, devendo para o efeito vir aos autos informar o local onde será alojada a menor CC aquando do cumprimento do regime de visitas/convívios doutamente fixados. A repristinar-se o regime de visitas/convívios ab initio fixado nos seus rigorosos termos em que foi desenhado, fácil é concluir-se que o local onde essas visitas/convívios foram determinados – na casa dos avós paternos, obviamente está absolutamente fora de questão pelas razões antes aduzidas. O regime fixado ab initio valerá no seu todo e não fragmentado, ou seja, vale tanto para os dias de visitas/convívios fixados, como vale para o local onde tais visitas/convívios se deveriam realizar. Conclui afirmando existir uma impossibilidade superveniente de o requerente recolher a CC sem que para tanto venha aos autos informar o local onde a menor será acolhida em absolutas condições de higiene e segurança, para efeitos de visitas/convívios, nos termos doutamente fixados, pelo que deve o presente incidente de incumprimento ser arquivado, condenando-se o requerente em multa por ao mesmo ter dado causa.
O progenitor, ora requerente, apresentou as alegações dizendo, em síntese, que por acordo entre os progenitores alcançado na conferência de pais, em 12 de setembro de 2019 as responsabilidades parentais relativas às questões particulares para a vida da menor seriam exercidas em comum por ambos os progenitores. Ficou ainda acordado que a CC ficaria com o progenitor de 15 em 15 dias, sendo que o transporte da menor ficaria ao cuidado do progenitor que a recolheria na residência da progenitora às 9 horas de sábado e a entregaria no mesmo local às 19 horas do domingo imediato e que o progenitor poderia ainda estar com a menor todas as segundas-feiras, quartas-feiras e sextas-feiras indo para o efeito recolher a menor à casa da mãe às 17 horas e 30 minutos e entregá-la às 19 horas e 30 minutos. Logo em outubro de 2019 os progenitores da CC voltaram a viver em comunhão de mesa, cama e habitação, o que durou até maio de 2021, data em que o casal se separou, passando a requerida a residir naquela que era a casa de morada de família à data, sita na freguesia ... e onde ainda hoje se mantém. Desde o dia 17 de maio de 2021 que o requerente tem sem sucesso tentado cumprir o regime de visitas. O requerente encontra-se há mais de um ano sem poder privar ou estar com a menor. No dia de aniversário da menor, o pai apenas esteve com a CC cerca de 15 minutos para lhe entregar uma lembrança de aniversário, num parque de estacionamento.
Em 01 de setembro de 2022, o requerente veio alegar que a situação de impedimento de contactos da CC consigo se mantinha, pedindo que a requerida seja compelida a cumprir o acordado em sede de regulação das responsabilidade parentais e condenada em multa e indemnização.
A audiência final realizou-se em três sessões e em 23 de novembro de 2022, fixou-se o valor da causa no montante de €30.000,01 e foi proferida sentença[3] que terminou com o seguinte dispositivo que na parte pertinente ao conhecimento do objeto do recurso se reproduz de seguida:
Por tudo o exposto, decido julgar procedente o incidente de incumprimento suscitado pelo requerente, AA, quanto ao regime de regulação das responsabilidades parentais no que toca ao regime de visitas fixado na decisão mencionada em 2) da factualidade provada, condenando a requerida, BB, na multa equivalente a 6 (seis) unidades de conta e na indemnização a favor do requerente no valor de €700,00 (setecentos euros) e de €700,00 (setecentos euros) a favor da criança CC, a pagar no prazo máximo de cinco meses a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sendo o valor respeitante à criança a depositar a seu favor.
Mais determino a fixação a título de sanção pecuniária compulsória, o montante de 50,00€ (cinquenta euros) por cada infracção, ou seja, por cada situação de incumprimento do regime de visitas fixado por decisão transitada em julgado imputável à progenitora, ora Requerida.
Em 12 de dezembro de 2022, inconformada com a sentença que precede, BB interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
65. Para o que interessa, no âmbito dos autos de regulação das responsabilidades parentais n.º 797/19.4T8VCD foi regulado o regime de visitas/convívios mediante acordo homologado judicialmente por decisão datada de 12/09/2019, transitada em julgado, nos seguintes termos:
- do regime de visitas/convívios
“A menor CC ficará com o progenitor de 15 em 15 dias, sendo que o transporte da menor ficará ao cuidado do progenitor que recolherá a menor na residência da progenitora às 09 horas de sábado e a entregará no mesmo local às 19 horas do domingo imediato;
A menor passará com cada um dos progenitores o respectivo dia de aniversário destes, bem como o dia do pai e dia da mãe;
No dia de aniversário da menor CC, esta almoçará em 2020 com o pai, que a entrega em casa da mãe até às 16 horas, para o lanche de aniversário, e jantará com a mãe no dia seguinte, no dia de aniversários da menor CC, proceder-se-á alternadamente, ou seja, a menor almoçará com a mãe, que a entregará ao pai após o almoço para com este lanchar, após o que a entregará à mãe até as 19 horas do mesmo dia, excepto se coincidir com o fim-de-semana em que aquela deva ficar com o progenitor.
A menor CC passará, alternadamente, a véspera de Natal com um dos progenitores e o dia de Natal com o outro, sendo que em 2019 este ciclo iniciar-se-á com a mãe, ou seja, véspera de Natal com a mãe e dia de Natal com o pai.
Na época de Ano Novo (véspera e dia de Ano Novo), a menor CC passará, alternadamente com cada um dos pais, sendo que o entregará em casa da mãe até às 18 horas do dia de Ano Novo, quando for o ano de passar com o pai, sendo que em 2019 este ciclo iniciar-se-á com o pai, ou seja, véspera de Ano Novo com o pai e dia de Ano Novo com a mãe.
O Domingo de Páscoa será passado pela menor CC, alternadamente, com cada um dos progenitores, sendo que em 2020, este ciclo iniciar-se-á com a mãe.
Todas as conduções da menor CC incumbirão ao pai, e serão com referência à casa da mãe, de acordo com o supra estipulado.
O progenitor pode ver e estar com a menor todas as segundas-feiras, quartas-feiras e sextas-feiras, indo para o efeito recolher a menor a casa da mãe às 17h30 horas e entregando-a no mesmo local às 19:30 horas “.
66. Conforme já alegado supra, no Processo de Promoção e Proteção apenso aos autos, resultou do conhecimento do tribunal a quo que o local indicado no regime de regulação das responsabilidades parentais para as visitas/convívios da menor com o progenitor, foi escolhido com referencia à casa onde este então residia, ou seja, na casa dos pais, não reunia as condições exigíveis para salvaguarda da saúde e segurança da menor CC.
67. Razão que, a informação do progenitor, levou o tribunal a quo a ordenar uma visita inspetiva à casa da tia paterna indicada como alternativa pelo progenitor pata as referidas visitas/convívios, da qual resultou um parecer positivo.
68. Ficou assim tacitamente definido naquele processo que, doravante, as visitas/convívios passariam então a ser feitas na casa da tia paterna da menor.
69. Eis senão quando, veio o progenitor aos autos, informar o tribunal que, afinal essas visitas/convívios já não seriam na casa da tia paterna antes sim na casa da nova namorada, alterando sem controlo judicial, o local então inspecionado e dado como aquele que melhor garantia os superiores interesses da menos, em cuidados de saúde e segurança.
70. Findo aquele processo especial, dúvidas não ficaram que, o único local conhecido e autorizado tacitamente pelo tribunal a quo para as visitas/convívios com pernoitas aos fins de semana, seria aquele que resultou da referida inspeção.
71. E então, findo aquele processo, conclui o progenitor que o regime em vigor era aquele que havia sido definido ab initio em sede de regulação das responsabilidades parentais e é a partir daí que interpela a recorrente para fazer a entrega da menor.
72. Esta, a recorrente, sabendo como sempre soube, que o local referenciado para essas visitas/convívios tinha como referencia a casa dos pais do progenitor mas sabendo também que o tribunal a quo o interditara e havia alterado esse local para um outro que, inclusive mandara inspecionar, não se opôs à execução desse regime que face às vicissitudes designou por represtinado, mas com a condição do progenitor a informar para que local aquele se proponha levar a filha e acomodá-la, ao que aquele entendeu não fazer, ou seja, negou tal informação à recorrente.
73. Chamados ao tribunal a quo em conferencia não foi possível obter um consenso dos progenitores sendo que, porém, nas alegações que remeteu aos autos de fls..., logo a recorrente disse que não se opunha a esse ou a outro qualquer regime desde que homologado pelo tribunal a quo e que este definisse qual o local dessas visitas /convívios, articulado ao qual o tribunal a quo nada disse.
74. Não disse nada e, salvo melhor e douta opinião, deveria o tribunal a quo dizer, desde logo e perante a indefinição relativa ao novo local onde aquelas se haveriam de realizar, proferir um despacho provisório de cumprimento obrigatório e imediato pelas partes, sobre as visitas/convívios e local onde haveriam de se realiza que, afinal, era o segmento do regime que separava os progenitores.
75. E fazendo-o estava encontrada a solução! Não o fazendo, omitiu o dever de o fazer, assim exigido pelo art.º 38.º do RGPTC e potenciou a continuidade do conflito ao qual não pôs termo e podia e devia fazê-lo, permitindo com tal omissão o agravamento do mesmo por longos 18 meses.
76. O que não pode, a nosso ver, a sentença a quo, perante a sobredita omissão, vir agora dizer que a recorrente pura e simplesmente é a única e exclusiva responsável pelos incumprimentos quando esta, no tempo adequado e oportuno, apelou ao tribunal a quo para redisciplinar ainda que provisoriamente o predito regime de visitas/convívios, designado o local para esse efeito, isto por absoluta coerência com que antes já havia feito.
77. Ou seja, se então havia prosseguido o superior interesse da menor em matéria de segurança, higiene e conforto, ordenando uma visita inspectiva ao local, como ali já se disse, por coerência ao mesmo princípio e procedimento, haveria de determinar nova inspeção ao novo local designado supervenientemente pelo progenitor e não o fez.
78. E também a nosso ver, não pode agora o tribunal a quo dizer como diz na sentença ora recorrida, que a recorrente incumpriu o regime definido ab initio, quando sabe perfeitamente que este, em face das vicissitudes supervenientes que justificaram a sua própria intervenção, impedindo tacitamente e bem quanto a nós, que as visitas/convívios de processassem no que ali designamos por “ local proibido “, permitisse que a sua filha, se cumprido esse regime como o exige o tribunal a quo viesse de novo a visitar/conviver com o progenitor nesse “ local proibido “pois outro não havia que estivesse homologado pelo tribunal a quo .
E, ASSIM SENDO, O OBJECTO DESTE RECURSO, RECONDUZ-SE, DESDE LOGO, EM FACE DO SUPRA ALEGADO E AGORA CONCUÍDO, PEDIR A ESTE VENERANDO TRIBUNAL QUE SE PRONUNCIE SOBRE AS SEGUINTES QUESTÕES:
79. Desde logo se face ao supra exposto alegado, era exigível à recorrente aceitar sem mais que a sua filha viesse a fazer visitas/convívios ao progenitor no local definido ab initio aquando da fixação do regime de regulação das responsabilidades parentais, ou seja, num local interditado pelo próprio tribunal a quo?
80. Por consequência, solicita a este Venerando Tribunal se pronuncie se tem razão o tribunal a quo quando entende que o referido regime foi incumprido pela recorrente, considerando aquele douto tribunal a quo na sentença a quo que o regime que aquela incumpriu, só podia ser o fixado ab initio e se é razoável que esse regime, não havendo outro, podia e devia ser cumprido parcialmente, ou seja, com exclusão do local fixado ?
81. Se está conforme ao direito – cfr. art.º 38.º do RGPTC, na falta de acordo na conferencia de pais, a omissão do tribunal a quo, quando não decidiu provisoriamente sobre a questão controvertida, i.é., face aos elementos já disponíveis por força do conhecimento que teve em sede das alegações proferidas pela recorrente de que era necessário decidir ainda que provisoriamente sobre o local das visitas/convívios futuros, digamos assim, em razão da interdição pelo mesmo tribunal a quo do local primitivo ?
82. Se está conforme ao direito a definição na sentença a quo de facto provado no n.º 14 ( 19.º das alegações ), no sentido em que a “ A Requerida está a prejudicar o crescimento e bem estar da filha, causando ao progenitor tristeza e revolta “, quando em razão do supra alegado, ou seja, demonstrada que está a óbvia contradição lógica entre a prova produzida em julgamento e a decisão, ou por diferentes palavras, por erro quanto à apreciação das provas e a fixação dos factos materiais da causa que consubstanciem razão suficiente para este Venerando Tribunal ad quem alterar tal facto para não provado, consignando a seguinte decisão: Altera-se o facto dado como provado no n.º 14 ( 19.º das alegações ) no sentido em que a recorrente está a prejudicar o crescimento e bem estar da filha, causando ao progenitor tristeza e revolta.
83. Se está conforme ao direito a definição na sentença a quo ora recorrida de facto provado no n.º 15 ( art.º 19.º das alegações do requerente e 9.º do requerimento inicial ) no sentido em que “ A Requerida diz ao Requerente que ele só verá a filha “para o ano”, “quando ela quiser”, dizendo ao Requerente, que o “regime de visitas caducou”, “que o seu mandatário diz que não há visitas agora”, “que não pode ver a filha”, “agora só para o ano”, provocando no Requerente um sentimento de revolta e tristeza “, quando em razão do supra alegado, ou seja, demonstrada que está a óbvia contradição lógica entre a prova produzida em julgamento e a decisão, ou por diferentes palavras, por erro quanto à apreciação das provas e a fixação dos factos materiais da causa que consubstanciem razão suficiente para este Venerando Tribunal ad quem alterar tal facto para não provado, consignando a seguinte decisão: Altera-se o facto dado como provado no n.º 15 (art.º 19.º das alegações do requerente e 9.º do requerimento inicial ) no sentido em que a “ Requerida diz ao Requerente que ele só verá a filha “para o ano”, “quando ela quiser”, dizendo ao Requerente, que o “regime de visitas caducou”, “que o seu mandatário diz que não há visitas agora”, “que não pode ver a filha”, “agora só para o ano”, provocando no Requerente um sentimento de revolta e tristeza.
E, FINALMENTE:
- da determinação da culpa e do respectivo quantum punitivo e indemnizatório.
84. Resulta da sentença a quo ora recorrida que face à culpa da Recorrente no que aos incidentes de incumprimento respeita, se justifica a sua responsabilização com imediatos reflexos patrimoniais.
85. Assim, relegando a questão da culpa para a decisão do Venerando Tribunal ad quem, vejamos se o quantum da pena e indemnizatório fixado na douta sentença a quo ora recorrida encontra respaldo na lei tendo em consideração os princípios da proporcionalidade e da equidade. Vejamos:
86. Provado ficou que a recorrente tem como único rendimento mensal proveniente do trabalho o SMN de €705,00 e que paga de renda de casa o valor de €400,00.
87. Aquele rendimento importa reduzir os descontos obrigatórios para a segurança social e de IRS, o que reduz aquele rendimento para pouco mais de €650,00 líquidos.
88. Subtraído o valor fixo mensal com a renda de casa de habitação, sobraria cerca de €250,00. E diz–se sobraria porque de facto assim não é, pois a esse valor há que acrescer a despesas regulares comuns a todos nós, com água, luz eletricidade, gás, saúde, alimentação e vestuário e transportes ao que acresce, ainda, toda a despesa que tem de suportar com a sua filha menor CC, de quem tem a guarda.
89. Ou seja, mister é concluir que a recorrente se não recebesse ajudas financeira e de géneros dos pais e avós, viveria muito abaixo do limiar da pobreza, arrastando com ela a própria filha CC, uma vez que durante mais de ano e meio não recebeu do progenitor um único cêntimo de pensão alimentícia.
90. Sem muitos mais considerandos, face ao quadro económico descrito, a recorrente solicita ao Venerando Tribunal ad quem que se pronuncie sobre o critério do tribunal a quo que presidiu à fixação do quantum punitivo e indemnizatório, como se indica:
90.1 – €612,00 de multa
90.2 - €700,00 a título de indemnização, a pagar ao requerente
90.3 - €700,00 a favor da criança
91. A recorrente face à insuficiência económica demonstrada e provada perante a Segurança Social, beneficia de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
92. Assim sendo, observando o referido quadro económico e considerando os sobreditos princípios de proporcionalidade, de equidade aos quais juntamos também o mais importante, i.é., o da justiça, entende a recorrente como adequado, caso o Venerando Tribunal ad quem encontre na sua conduta algum nível de culpa, ainda que mitigado, sejam computadas no seu mínimo legal de € 51,00 priorizando-se assim os seus encargos mínimos, designadamente os encargos com a saúde, educação e bem estar da sua filha menor CC, garantindo-se, pois à recorrente o mínimo condigna á subsistência do agregado familiar.
- DA VIOLAÇÃO PRIMÁRIA DE DIREITO ADJECTIVO POR ERRO DE ESTATUIÇÃO
Argui-se a nulidade secundária da douta decisão ora recorrida, nos termos do n.º 1 do art.º 195.º do CPC.
Destarte:
Por vício de decisão por erros notórios de apreciação das provas produzidas.
Por vicio de decisão por manifesta insuficiência das provas carreadas para os autos, designadamente a omissão do dever de decidir provisoriamente em sede de conferência dos progenitores
Por manifesta falta de fundamentação ou insuficiência desta;
A douta decisão recorrida é ainda nula por errada aplicação do direito, quanto ao facto do tribunal a quo, não valorizar os superiores interesses da menor CC impondo-lhe um regime que atenta contra os seus superiores interesses, concretamente quanto ao local para se efectivarem as visitas/convívios com o progenitor, consubstanciando erro nos pressupostos de facto e de direito da decisão.
Pelo que, quanto ao que a esta parte respeita, deverá a douta decisão ora recorrida do tribunal a quo ser anulada e/ou reformada pelo Venerando Tribunal Superior ad quem, consignando ser de condenar a progenitora remissa nos termos da lei e subsidiariamente determinar a imediata medida de execução direta consubstanciada na entrega judicial, sem mais, do menor DD [sic[4]] ao recorrente para cumprimento do regime de Regulação das Responsabilidades Parentais em vigor, nos seus precisos termos.
De tal sorte, por esse Venerando Tribunal ad quem, que dispõe da matéria de facto e de direito consignada na fundamentação da decisão vv recorrida, examinando serena e criteriosamente a prova dos autos.
NORMAS JURÍDICAS VIOLADAS:
§. Art.ºs 154.º e 607.º do CPC, este último por força das remissões que resultam da conjugação do disposto nos arts.º 295.º e 986.º, nº 1, do mesmo diploma legal.
§. Art.º 3.º n.º 3 e art.º 6.º e 547.º do CPC
§. Art.ºs 195.º, n.º 1 e 507.º do CPC.
§. Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27-11-2003 (RB II a / II bis) e 4/2009, de 18/12, ambos do Conselho
§. Art.ºs n.ºs 9, n.ºs 1 e 3, 11 e 18, da Convenção sobre os Direitos da Criança.
A Digna Magistrada do Ministério Público respondeu ao recurso pugnando pela sua total improcedência.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e no efeito suspensivo da decisão.
Colhidos os vistos dos restantes membros do coletivo, cumpre agora apreciar e decidir.

2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil

2.1 Da nulidade secundária da decisão recorrida por omissão de decisão provisória sobre o local em que decorreriam as visitas, por erro na apreciação das provas, por falta ou insuficiência de fundamentação da decisão recorrida e por erro na aplicação do direito;
2.2 Da reapreciação dos pontos 14 e 15 dos factos provados;
2.3 Dos reflexos da eventual alteração da decisão da matéria de facto na verificação do incumprimento do regime de visitas e, mantendo-se esta violação, do quantum da multa e das indemnizações impostas à recorrente.

3. Fundamentos
3.1 Da nulidade secundária da decisão recorrida por omissão de decisão provisória sobre o local em que decorreriam as visitas, por erro na apreciação das provas, por falta ou insuficiência de fundamentação da decisão recorrida e por erro na aplicação do direito
A recorrente imputa à decisão recorrida a prática de nulidade secundária, nos termos previstos no nº 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil, por omissão de decisão provisória sobre o local em que decorreriam as visitas, por erro na apreciação das provas, por falta ou insuficiência de fundamentação da decisão recorrida e por erro na aplicação do direito.
Cumpre apreciar e decidir.
A recorrente imputa à decisão recorrida diversas nulidades que qualifica de secundárias, citando o nº 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil e não fazendo qualquer referência às nulidades da sentença previstas no nº 1 do artigo 615º do mesmo diploma legal.
Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil, “[f]ora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.”
De acordo com o disposto no artigo 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aplicável ao incidente de incumprimento por força do previsto no nº 7 do artigo 41º do mesmo regime geral, “[s]e ambos os pais estiverem presentes ou representados na conferência, mas não chegarem a acordo que seja homologado, o juiz decide provisoriamente em função dos elementos já obtidos, suspende a conferência e remete as partes para;
a) Mediação, nos termos e com os pressupostos previstos no artigo 24º, por um período máximo de três meses; ou
b) Audição técnica especializada, nos termos previstos no artigo 23º, por um período máximo de dois meses.”
As nulidades secundárias atípicas, estando a parte presente por si ou mandatário, no momento em que forem cometidas, podem [devem] ser arguidas enquanto o ato não terminar (artigo 199º, nº 1, do Código de Processo Civil)[5].
Na posse dos dados normativos que precedem, é ostensivo que se acaso a omissão de decisão provisória sobre o local em que decorreriam as visitas à menor CC constituísse uma nulidade atípica, a mesma estaria sanada por não ter sido oportunamente arguida nos termos previstos na primeira parte do nº 1 do artigo 199º do Código de Processo Civil.
Sempre se dirá que é insólita a pretensão da recorrente de que se fixe um local onde decorrerão as visitas da menor ao pai, rectius os convívios quinzenais da menor com o progenitor, pois que esse local é aquele onde então o pai residir ou se achar, por exemplo, em férias, desde que em território nacional[6]. Nesta última eventualidade, o mais que se admite é que o progenitor informe a progenitora do local para onde tenciona deslocar-se com a criança.
Se acaso a mãe da criança considera que o local onde a criança é acolhida pelo pai não tem as necessárias condições de segurança ou sanitárias, deve de imediato dar conta de tal facto ao tribunal a fim de que sejam tomadas as medidas necessárias e verificar se os receios da mãe são ou não justificados.
O erro na apreciação das provas não constitui nulidade secundária ou de sentença, antes, a existir, determina a ilegalidade da decisão sob censura, vício suscitado mediante pedido de reapreciação da decisão da matéria de facto nos segmentos em que ocorre o alegado erro na apreciação das provas, pretensão que a recorrente formulou no recurso que interpôs.
A falta da fundamentação da sentença, ou, num certo entendimento, uma qualificada insuficiência da mesma fundamentação, seja ela de facto ou de direito, está tipificada como nulidade de sentença (artigo 615º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil), não constituindo, manifestamente uma nulidade atípica.
De todo o modo, procedendo à correta qualificação desta patologia (artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil), é ostensivo que a decisão recorrida está factual e juridicamente fundamentada, sem que isso implique qualquer juízo sobre o acerto de tal fundamentação, pelo que também não se preenche a alínea b) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
Finalmente, o erro na aplicação do direito não constitui qualquer nulidade atípica de uma decisão judicial, nem sequer uma nulidade de sentença, como inequivocamente decorre do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, mas antes uma ilegalidade sindicável mediante a interposição de recurso (veja-se o nº 2 do artigo 639º do Código de Processo Civil), quando legalmente admissível.
Assim, pelo que precede, conclui-se pela total improcedência desta questão recursória.

3.2 Da reapreciação dos pontos 14 e 15 dos factos provados
A recorrente pede nas conclusões das suas alegações a reapreciação dos pontos 14 e 15 dos factos provados, pugnando por que tal matéria seja julgada não provada.
Em síntese, a recorrente alicerça as suas pretensões no seguinte:
- quanto ao ponto 14 dos factos provados, refere que a sua primeira parte é conclusiva e, de todo o modo, nenhuma prova desta matéria foi produzida na audiência final;
- quanto ao ponto 15 dos factos provados, a recorrente afirma que a prova produzida na audiência final é de todo insuficiente para permitir a formação de uma convicção positiva quanto à realidade de tal factualidade.
Os pontos de facto cuja reapreciação é requerida pela recorrente têm o seguinte teor:
- A requerida está a prejudicar o crescimento e bem-estar da filha, causando ao progenitor tristeza e revolta (ponto 14 dos factos provados);
- A requerida diz ao requerente que ele só verá a filha “para o ano”, “quando ela quiser”, dizendo ao requerente, que o “regime de visitas caducou”, “que o seu mandatário diz que não há visitas agora”, “que não pode ver a filha”, “agora só para o ano”, provocando no requerente um sentimento de revolta e tristeza (ponto 15 dos factos provados).
A motivação destes pontos de facto pelo tribunal recorrido foi a seguinte:
Assim, e concretizando:
- desde logo, quanto aos factos provados sob o ponto 1) a 4) e 19), na análise dos autos principais de regulação das responsabilidades parentais mais propriamente no assento de nascimento e na decisão aí contida em sede de acta da conferência de pais que regulou o exercício das responsabilidades parentais, bem como na decisão junta aos autos de promoção e protecção – apenso D – e no trânsito da mesma;
- relativamente à demais factualidade, desde logo, na análise da documentação junta pelo Requerente com as alegações nomeadamente as mensagens enviadas à Requerida onde a interpelava para ver e falar com a filha e nas sucessivas participações à entidade policial juntas aos autos, documentação essa não impugnada quanto à sua veracidade pela Requerida, bem como na total ausência de prova pela Requerida.
Note-se que as declarações de parte requerida e admitidas em sede de julgamento por si só – sem qualquer outra prova v.g. testemunhal e/ou documental – são insuficientes para fazer a prova de factos impeditivos ou extintivos do direito. Refira-se a este propósito que a Requerida não arrolou como podia e em momento próprio prova além da documental, v.g. testemunhal. Limitou-se em sede de julgamento a requerer a tomada de declarações a si própria. Ora, citando a este propósito os Acs. da Relação do Porto de 15/09/2014 e de 7/11/2016, disponíveis in www.dgsi.pt, aos quais aderimos quanto aos seus fundamentos: “Como é sabido, uma das inovações introduzidas pelo actual CPC, nomeadamente no art.º 466.º, consiste na possibilidade que foi facultada às partes de poderem requerer, até ao início das alegações orais em primeira instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento directo (n.º1). Em conformidade com o estabelecido no mesmo artigo (n.º2), às declarações das partes aplica-se o disposto no art.º 417.º, norma que regula o dever de cooperação para a descoberta da verdade; e, no que respeita à valoração dessas declarações (n.º3), estabelece-se, ainda, que o tribunal aprecia-as livremente, isto é, segundo a sua prudente convicção (art.º 607.º/5, CPC), salvo se as mesmas constituírem confissão. (sublinhado nosso). Significa isto, pois, que em face do disposto no art.º 466.º, actualmente é inequívoco que as declarações de parte sobre factos que lhe sejam favoráveis devem ser apreciadas pelo tribunal, sendo valoradas segundo o princípio da livre apreciação da prova, nomeadamente, a prova testemunhal, consagrado nos artigos 396.º do Código Civil e 607.º n.º 5, do CPC. (…) A este propósito, observa José lebre de Freitas, o seguinte: -«O CPC de 2013 introduziu, ao lado da prova por confissão, mas como meio de prova autónomo, a figura da prova pro declarações de parte. Através dela, a parte (..) pode, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, requerer a prestação de declarações sobre factos em que tenha tido intervenção pessoal ou de que tenha conhecimento directo (art.º 466-1), isto é, sobre factos pessoais, na aceção que a esta expressão é dada nos arts. 454-1 e 547-3 (..)”. As declarações de parte não podem ser ordenadas oficiosamente nem, obviamente, ser requeridas pela parte contrária. A sua valoração está sujeita à regra da livre apreciação da prova (466-3). (..) A apreciação que o juiz faça das declarações de parte importará sobretudo como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas e, quando outros não haja, como prova subsidiária, maxime se ambas as partes sido efectivamente ouvidas” [A Acção Declarativa Comum – À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª Edição, Coimbra Editora, p. 277/278].
Ora, na situação concreta as declarações de parte requeridas e prestadas pela Requerida foram prestadas na nossa perspectiva claramente tendenciosa e interessada no desfecho da lide pelo que nessa medida, sem qualquer outra prova, não nos permitiram formar uma convicção segura e clara sobre a factualidade que possa contrariar de forma consistente a alegação do Requerente pai.
Tiveram-se ainda em conta os depoimentos de EE, FF e GG, respectivamente, irmã, mãe e companheira do Requerente, os quais, não obstante as relações de parentesco e de grande proximidade com o Requerente, se afiguraram sinceros, objectivos e claros assim corroborando a factualidade alegada pelo progenitor nas suas declarações bem como a prova documental carreada para os autos.
Por último, e quanto à situação económica da Requerida tiveram-se em conta nesta parte as suas declarações as quais foram confirmadas pela prova documental cuja junção aos autos foi determinada pelo Tribunal (recibos de renda e recibo de vencimento).
Quanto aos factos provados em 13), 14) e 17), o tribunal teve em conta não só os depoimentos acima mencionados (dos quais se extrai a relação de carinho que o pai nutre pela filha, as inúmeras participações criminais juntas das quais decorre todas as tentativas goradas de ver a filha e, ainda, a foto cuja junção aos autos foi determinada pelo Tribunal após a audição da CC que, apesar da tenra idade, demonstrou de forma clara (após um discurso inicial em que refere que o pai é mau – reportando tal realidade ao período de convivência dos pais – que não deu um beijo ao pai no átrio do tribunal porque a mãe não deixou) o carinho que tem para com o pai após longos 18 meses sem qualquer convivência evidenciado nos largos sorrisos de ambos! Todas as testemunhas, bem como as inúmeras participações criminais nos levam a conclui pela tristeza, a imensa saudade e mau estar provocados no Requerente face à conduta levada a cabo pela progenitora e pelas consequências nefastas que tal conduta provoca não só no Requerente progenitor mas também na CC, filha de ambos.
Cumpre apreciar e decidir.
Uma vez que a recorrente observa suficientemente os ónus que impendem sobre quem pretende a reapreciação da decisão da matéria de facto, analisou-se criticamente a prova documental junta aos autos e pertinente, como sejam as cópias dos relatórios de serviço da GNR datados de 01 de julho de 2022, de 29 de junho de 2022, de 29 de agosto de 2022[7], as cópias das mensagens telefónicas que o recorrido ofereceu com as suas alegações e que não foram impugnadas pela ora recorrente, a fotografia da menor CC tirada na segunda sessão da audiência final na companhia do ora recorrido e junta com o requerimento de 19 de outubro de 2022 e procedeu-se à audição da prova pessoal produzida nas diversas sessões da audiência final. Além disso, relevou-se através da funcionalidade do sistema citius de seguimento do processo o que consta no processo eletrónico de incidente de incumprimento que constitui o apenso C e bem assim do processo de promoção e proteção que correu termos desde finais de maio de 2021 e findou em 14 de fevereiro de 2022 (apenso D).
Na primeira sessão da audiência final foram ouvidos AA, EE, FF e BB, resumindo-se o essencial dos seus depoimentos de seguida.
AA[8] declarou ter vivido com a mãe da sua filha CC até 17 de maio de 2021, data em que saiu da casa onde então residiam, continuando a mãe da criança a residir nessa casa. Desde então tem tentado cumprir o regime de visitas acordado em sede de regulação das responsabilidades parentais, só tendo conseguido ver a filha nas visitas organizadas pelo CAFAP e não mais a tendo visto após a cessação da intervenção desta entidade. Declarou que a mãe da criança dizia que o seu mandatário afirmava que não havia visitas, que só havia visitas para o ano, talvez para o Natal; em 2022 conseguiu estar cerca de quinze minutos com sua filha CC no dia do aniversário desta, tendo-lhe entregado uma prenda; recentemente manteve uma conversa telefónica com a filha, dizendo esta que tinha saudades dele; confirmou ser um pai preocupado com a filha e com muitas saudades da mesma.
EE, irmã do recorrido, titular de uma empresa de pavimentos, conhece a recorrente, mas não tem qualquer relação com ela nos últimos tempos, desde que seu irmão se separou dela; referiu ter acompanhado o irmão em diversas tentativas de visitas à sobrinha CC, umas seis vezes à casa da avó materna onde então residia a requerida e uma ou duas vezes na casa sita em ..., nunca tendo conseguido estar com a criança; seu irmão disse-lhe que enviava mensagens telefónicas à mãe da menor para visitar e falar com a criança, sempre sem resposta; seu irmão conseguiu estar com a criança nas reuniões organizadas pelo CAFAP e uma outra vez, cerca de quinze minutos, no dia de aniversário da criança, no parque de estacionamento de um centro comercial; a mãe da criança proibiu que os avós paternos visitassem a criança nas reuniões organizadas pelo CAFAP; seu irmão sente falta da filha e manifesta tristeza, chorando quando falam nisso; seu irmão sempre tratou bem a criança, dando-lhe sempre o que ela queria, sendo um pai babado; numa das visitas organizadas pelo CAFAP e que presenciou a sua sobrinha disse que queria estar mais algum tempo com o seu pai; seu irmão chegou uma vez junto de si transtornado e dizendo que a mãe da menina lhe tinha dito que só a veria para o ano e se quisesse.
FF, mãe do recorrido e avó da criança CC, referiu que não está de boas relações com a recorrente porque não a deixa ver a neta, declarou que seu filho deixou de viver com a mãe da sua neta CC no dia 17 de maio de 2021 e que, pelo que ele lhe disse, não vê a filha há mais de um ano; encontra-se com o filho aos fins-de-semana e noutras ocasiões e nunca viu a sua neta na companhia do pai, seu filho; seu filho disse-lhe que tentou visitar a filha CC, sem o conseguir e disse-lhe que tem muitas saudades dela; já apanhou o filho a chorar e acha-o triste.
BB, ora recorrente declarou ser empregada de refeitório no Colégio ..., na Maia, tendo começado a trabalhar no dia 07 de setembro de 2022; habita na casa onde residia aquando da sua separação do pai de sua filha CC; aufere o salário mínimo nacional e não recebe subsídio de alimentação em virtude de ter direito a almoçar no refeitório onde trabalha; antes disso trabalhou em lares; paga quatrocentos euros mensais de renda de casa e suporta as despesas com água, energia elétrica e água, além das restantes despesas com a sua subsistência e da filha, não tendo contraído empréstimos; tem um veículo automóvel de 2003, de marca Audi, modelo ....
Na segunda sessão da audiência final foram ouvidos CC, GG e de novo BB, prestando as declarações que seguidamente se resumem tendo em conta o objeto do recurso.
CC foi ouvida pela Sra. Juíza que presidiu à audiência final com a presença da Digna Magistrada do Ministério Público e da Sra. Oficial de Justiça; disse ter quatro anos, não sabendo onde fica a sua escola e não saber onde está; veio com a avó e a mãe; gosta de comer arroz e massa; tem uma cadela; disse que há muito tempo o seu pai lhe partiu a televisão, roubou-lhe os brinquedos e um tapete, que é mau e que lhe bateu a si e à mãe; referiu que se lembrava das coisas de quando era bebé; ao chegar viu o pai e não o beijou porque a mãe não deixou mas gostava de lhe dar um beijo; seguidamente, o recorrido foi chamado à presença da filha e estiveram a conversar, tendo com autorização do tribunal sido tirada uma fotografia da criança e do seu progenitor cuja cópia o recorrido juntou aos autos com o seu requerimento de 19 de outubro de 2022.
GG, atual companheira do recorrido e desde dezembro de 2021, depois de advertida declarou pretender depor; declarou conhecer o recorrido desde junho de 2021 e que este se terá separado da mãe da CC em maio de 2021; desde que estão a viver juntos sabe que o recorrido se dirige às casas da avó materna e bem assim à da mãe da CC para ver esta, sem o conseguir; por várias vezes o recorrido chamou a GNR para tomar conta da ocorrência; declarou que, por vezes, a mãe da CC dizia que não a entregava e noutras vezes não dizia nada; a mãe da criança justificava a sua recusa com o facto de não saber para onde ia a CC; chegou a ver a BB a recusar-se entregar a CC ao AA.
BB, esclarecendo que depois de ter prestado declarações na anterior sessão esteve sempre a assistir à produção de prova, prestou declarações de parte declarando que desde se separou do pai da sua filha não o deixou ficar com a filha de ambos porque não sabe para onde ele a leva; declarou que no dia do aniversário da CC, o recorrido esteve com esta, cerca de meia hora, no lugar por ele escolhido, no parque de estacionamento de um Centro Comercial; além disso, o recorrido esteve com a CC nas reuniões organizadas pelo CAFAP e que isso apenas não sucedeu nas três primeiras reuniões porque na primeira a criança estava doente e na segunda e terceira não quis estar com o pai; em setembro de 2022 recebeu trezentos e sessenta e seis euros em virtude de ter começado a trabalhar a sete e o fecho do mês ser a vinte e um de cada mês.
Rememorado o essencial da prova pessoal produzida na audiência final importa não perder de vista que no dia 08 de junho de 2021, no âmbito do apenso C foi proferido despacho em que, além do mais, se determinou a suspensão das visitas até decisão definitiva.
Deve ainda vincar-se que no processo eletrónico do Processo de Promoção e Proteção não há rasto de qualquer decisão judicial que tenha determinado vistorias às casas da avó paterna e da tia paterna da CC.
Por outro lado, deve ainda relevar-se que na fase administrativa deste processo, a ora recorrente declarou que o seu advogado HH tinha pedido a suspensão das visitas da CC ao pai desta e que em 09 de julho de 2021 foi proferido despacho em que, além do mais, se decidiu o seguinte:
- “entendemos que a suspensão do regime de visitas deve permanecer contudo deve-se fomentar uma reaproximação do progenitor e da menor mesmo que sob supervisão de modo a fomentar o estreitamento de laços e de modo a indagar da interacção da menor com o progenitor.
Face ao exposto, deverá o EMAT no relatório a enviar informar da pertinência de restabelecimento das visitas do progenitor à menor e de que forma.
Rememorada a prova documental e pessoal relevante para a requerida reapreciação da decisão da matéria de facto, reapreciemos o ponto 14 dos factos provados.
A recorrente tem razão quando afirma que a primeira parte deste ponto de facto tem natureza conclusiva.
Na nossa perspetiva, é matéria conclusiva toda aquela que não consiste na perceção de uma ocorrência da vida real, trate-se de um facto externo ou interno[9], mas antes constitui um juízo acerca de certa realidade factual[10]. Dentro desta matéria conclusiva, devem em nosso entender, distinguir-se os juízos de facto periciais[11], dos juízos de facto comuns passíveis de serem emitidos por qualquer pessoa com base nos seus conhecimentos[12].
Saber se a privação de visitas de uma filha ao progenitor contende com o desenvolvimento e a saúde da criança é um juízo que é passível de ser emitido por um profissional da área da saúde, mas que também é passível de ser formulado, ainda que sem qualquer aparato científico, pelo julgador e com base nas regras da experiência comum.
A nosso ver, os juízos de valor comuns, porque independentes de quaisquer conhecimentos especiais, não devem ser incluídos nos temas da prova nem na decisão da matéria de facto, sob pena de se perverter o objeto da prova testemunhal.
Na verdade, como resulta do Código de Processo Civil, a testemunha é inquirida sobre temas da prova, rectius factos que se reconduzam a tais temas[13] e deve depor com precisão, indicando a razão de ciência e as circunstâncias que possam justificar o conhecimento dos factos (artigo 516º, nº 1, do Código de Processo Civil).
A inclusão nos temas da prova ou a recondução a tais temas de matéria que implica a emissão de juízos de valor, de opiniões ou apreciações, não sendo matéria que possa ser objeto de prova pericial, leva a que se possa extravasar do objeto legalmente possível da prova testemunhal, quando se formulem essas perguntas às testemunhas em sede de audiência final.
Na nossa perspetiva, não é por acaso que o depoimento testemunhal deve incidir sobre factos concretos e não deve consistir na emissão de juízos de valor, opiniões ou apreciações. É que a emissão de juízos de valor e de apreciações sobre os factos, ressalvados os casos que requeiram conhecimentos especiais, objeto da prova pericial, cai na esfera própria do julgador, na apreciação e decisão da matéria de facto e na extração de presunções dos factos apurados, com base nas regras de experiência (veja-se o artigo 607º, nºs 4 e 5, do Código de Processo Civil)[14]. Admitir uma testemunha a emitir juízos de valor ou apreciações sobre certos factos, traduz-se numa usurpação da função própria do julgador por parte da testemunha, impedindo aquele de aceder às razões pelas quais é emitido certo juízo.
Neste contexto, deve reservar-se para a fase da valoração da factualidade provada a emissão do juízo de valor sobre o impacto que a privação de visitas da criança CC a seu pai pode ter no seu desenvolvimento e bem-estar e com base nas regras da experiência comum.
Por isso, usando dos poderes conferidos pela alínea c) do nº 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil, deve amputar-se ao ponto 14 dos factos provados a sua primeira parte e sem prejuízo deste tribunal em momento ulterior de valoração e apreciação da globalidade da factualidade provada emitir um tal juízo com base nas regras da experiência comum.
No que respeita à causação ao recorrido de revolta e tristeza a prova é clara e inequívoca, não só com base no depoimento interessado do recorrido mas também com base nos testemunhos da irmã e da mãe do recorrida e ainda da atual companheira do mesmo recorrido. Por outro lado, o envolvimento e a persistência que o recorrido tem demonstrado nestes autos (vejam-se as cópias das muitas mensagens que o recorrido enviou à ora recorrente a fim de visitar a CC) também revelam o sofrimento e a revolta que esta situação lhe tem vindo a causar e a vontade de pôr termo à mesma, inclusivamente com vários apelos à autoridade policial.
Por isso, o ponto 14 dos factos provados deve passar a ter a seguinte redação:
- O requerente sente revolta e tristeza por não poder visitar sua filha CC.
Debrucemo-nos agora sobre o ponto 15 dos factos provados.
No que respeita este ponto de facto, o depoimento produzido pelo recorrido é suficiente para a sua comprovação.
No entanto, tendo em conta que a recorrente nega ter proferido estas justificações para a sua conduta, afirmando que não se dispunha a entregar sua filha CC ao progenitor sem saber para onde este a levaria[15] e que não há prova direta da mesma proveniente de terceiras pessoas, importa verificar se existe alguma corroboração da posição assumida por qualquer das partes, de modo a dar prevalência a uma das versões em presença.
A nosso ver, esta corroboração colhe-se nas declarações que a ora recorrente prestou ainda na fase administrativa do processo de promoção e proteção, em 30 de junho de 2021[16], quando declarou que a CC já não visita o pai desde 17 de maio e que foi o Dr. HH que pediu a suspensão das visitas da criança ao pai.
A corroboração que antes se identificou conforta o depoimento do agora recorrido, razão pela qual se deve manter intocado o ponto 15 dos factos provados, improcedendo nesta parte a reapreciação da decisão da matéria de facto.
Pelo exposto, procede parcialmente a reapreciação da decisão da matéria de facto e apenas no que respeita ao ponto 14 dos factos provados.

3.3 Fundamentos de facto exarados na decisão recorrida e que se mantêm com exceção da alteração do ponto 14 dos factos provados em consequência da parcial procedência da reapreciação da decisão da matéria de facto

3.3.1 Factos provados
3.3.1.1
CC, nascida em .../.../2018, é filha do requerente, AA, e da requerida, BB.
3.3.1.2
No âmbito dos autos de regulação das responsabilidades parentais nº 797/19.4T8VCD foram reguladas as responsabilidades parentais mediante acordo homologado judicialmente por decisão datada de 12/09/2019, transitada em julgado, nos seguintes termos:
a) A criança CC fica à guarda e cuidados da mãe, exercendo esta as responsabilidades parentais relativas aos actos de vida corrente da criança, nos termos previstos no art.º 1906.º, nº 3 do Código Civil;
b) As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da menor, são exercidas em comum por ambos os progenitores salvo nos casos de manifesta urgência, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
c) O progenitor AA, pai, fica obrigado a pagar de alimentos, devidos à menor CC, a importância de 80,00 (oitenta euros) até ao dia 8 de cada mês, através de transferência bancária para conta da Requerente e por esta a indicar. A indicada quantia será automaticamente actualizada, a partir de Janeiro de 2020 e em igual mês dos anos subsequentes, no montante de €3,00 (três euros);
d) As despesas médicas e medicamentosas extraordinárias (v.g. consultas, próteses dentárias, óculos, cirúrgicas etc.), despesas de infantário e futuras despesas escolares do início do ano lectivo (v.g. livros e material escolar), de que a menor necessite na parte não comparticipada pelo Estado ou por qualquer seguro, serão suportadas em partes iguais desde que devidamente comprovadas e contra a apresentação dos respectivos comprovativos, devendo a progenitora efectuar tais despesas e enviar os comprovativos ao progenitor ficando este obrigado a efectuar metade do correspondente pagamento, no prazo de 15 (quinze) dias a partir da recepção de tais comprovativos, para o IBAN que é transferida a pensão alimentícia.
e) A menor CC ficará com o progenitor de 15 em 15 dias, sendo que o transporte da menor ficará ao cuidado do progenitor que recolherá a menor na residência da progenitora às 09 horas de sábado e a entregará no mesmo local às 19 horas do domingo imediato.
f) O menor passará com cada um dos progenitores o respectivo dia de aniversário destes, bem como o dia do pai e dia da mãe;
g) No dia de aniversário da menor CC, esta almoçará em 2020 com o pai, que a entrega em casa da mãe até às 16 horas, para o lanche de aniversário, e jantará com a mãe no dia seguinte, no dia de aniversários da menor CC, proceder-se- á alternadamente, ou seja, a menor almoçará com a mãe, que a entregará ao pai após o almoço para com este lanchar, após o que a entregará à mãe até as 19 horas do mesmo dia, excepto se coincidir com o fim-de-semana em que aquela deva ficar com o progenitor.
h) A menor CC passará, alternadamente, a véspera de Natal com um dos progenitores e o dia de Natal com o outro, sendo que em 2019 este ciclo iniciar-se-á com a mãe, ou seja, véspera de Natal com a mãe e dia de Natal com o pai.
i) Na época de Ano Novo (véspera e dia de Ano Novo), a menor CC passará, alternadamente com cada um dos pais, sendo que o entregará em casa da mãe até às 18 horas do dia de Ano Novo, quando for o ano de passar com o pai, sendo que em 2019 este ciclo iniciar-se-á com o pai, ou seja, véspera de Ano Novo com o pai e dia de Ano Novo com a mãe.
j) O Domingo de Páscoa será passado pela menor CC, alternadamente, com cada um dos progenitores, sendo que em 2020, este ciclo iniciar-se-á com a mãe.
l) Todas as conduções da menor CC incumbirão ao pai, e serão com referência à casa da mãe, de acordo com o supra estipulado.
m) O progenitor pode ver e estar com a menor todas as segundas-feiras, quartas-feiras e sextas-feiras indo para o efeito recolher a menor a casa da mãe às 17:30 horas e entregando-a no mesmo local às 19:30 horas.
3.3.1.3
No âmbito dos autos de promoção e proteção – apenso D – relativamente à CC, foi determinada, por decisão datada de 30/09/2021 a aplicação da medida de apoio junto da mãe pelo período de um ano, com revisão trimestral medida essa prevista no artigo 35º, al. a) da LPPCJP e por decisão datada de 16/02/2022[17], transitada em julgado, nenhuma fragilidade foi apontada ao agregado onde a criança está integrada tendo sido apurados os seguintes factos:
a) a CC integrou o Jardim de Infância da rede pública na Escola Básica ...;
b) relativamente aos convívios da criança com o pai, estes têm ocorrido em contexto de supervisão do CAFAP “Horizontes”, com a periodicidade semanal, entre as 18h.30 e as 19h.30 conforme a disponibilidade da mãe da criança;
c) de acordo com o relatório realizado pelo CAFAP e apresentada em anexo, o primeiro convívio da CC com o pai apenas ocorreu a 17/11/2021, em virtude desta ter estado doente na primeira data agendada e posteriormente nos dois convívios seguintes se recusar a sair do colo da mãe;
d) ultrapassados estes receios da criança, as visitas têm decorrido de forma positiva, embora a mãe continue a demostrar e verbalizar medos em relação ao ex-companheiro, colocando igualmente reservas nos contactos de outros familiares como a tia e o avô paterno quando acompanharam o pai ao espaço do CAFAP para também desfrutarem do convívio com a criança.
e) o pai tem cumprido com as orientações do CAFAP e tem demonstrado nos convívios interesse e empenho quando tem de garantir alguns cuidados à criança como a alimentação no decurso da visita.
f) manifesta vontade em permanecer mais tempo com a filha.
g) o pai refere estar a organizar a sua vida afetiva, possuindo uma nova namorada, pretendendo vir a coabitar com ela num futuro próximo.
h) diz que a namorada também tem uma filha com idade próxima da CC, situação que poderá ser facilitadora para a reaproximação da criança.
3.3.1.4
Na decisão referida em 3) [3.3.1.3] datada de 16/02/2022[18], transitada em julgado, foi declarada cessada a medida protetiva.
3.3.1.5
Seguidamente à realização da Conferência de Pais a que se alude em 2) [3.3.1.2], mais concretamente em outubro de 2019, os progenitores da CC voltaram a viver em união de facto, a qual durou até maio de 2021.
3.3.1.6
Data em que o casal se separou, passando a requerida a residir naquela que era a casa de morada de família à data, sita na freguesia ..., onde ainda hoje se mantém.
3.3.1.7
Desde o dia 17 de maio de 2021 que o requerente tem tentado cumprir o regime de visitas, porém, sem sucesso.
3.3.1.8
Realizada a Conferência de Pais, veio a ser instaurado processo tutelar de Promoção e Proteção, o qual findou em 16 de fevereiro de 2022[19], constando do Relatório da Sra. Técnica que nada obsta aos contactos do pai com a menor.
3.3.1.9
Inexistindo assim justificação para o impedimento das visitas do pai à menor.
3.3.1.10
A única vez em que o pai conseguiu estar com a menor foi sempre nas visitas que decorreram nas instalações do CAFAP.
3.3.1.11
Desde maio de 2021, que o requerente não consegue estar ou privar com a sua filha CC.
3.3.1.12
No dia de aniversário da CC, o requerente apenas conseguiu estar com a CC cerca de 15 minutos para lhe entregar uma lembrança de aniversário, num parque de estacionamento, tendo sido a requerida quem decidiu o local e tempo da visita.
3.3.1.13
O requerente é um pai preocupado, carinhoso e tem muitas saudades da filha.
3.3.1.14
O requerente sente revolta e tristeza por não poder visitar sua filha CC.
3.3.1.15
A requerida diz ao requerente que ele só verá a filha “para o ano”, “quando ela quiser”, dizendo ao requerente, que o “regime de visitas caducou”, “que o seu mandatário diz que não há visitas agora”, “que não pode ver a filha”, “agora só para o ano”, provocando no requerente um sentimento de revolta e tristeza.
3.3.1.16
A requerida não permitiu que o pai visitasse a CC nos dias 23, 25 e 28 fevereiro das 17:30 às 19:30 h; 26 e 27 fevereiro para pernoitar em sua casa; 2, 4, 7, 9, 11, 14, 16, 18 e 21 março das 17:30 às 19:30h; 12 e 13 março para pernoitar em sua casa; 12 março – dia de aniversário da CC, tendo o requerente se deslocado à residência da progenitora para o efeito[20].
3.3.1.17
Entre a CC e o progenitor existe uma relação de muito carinho, não tendo a criança criado qualquer resistência a abraçar o progenitor perante o Tribunal.
3.3.1.18
A requerida aufere, como empregada de refeitório, e por conta da empresa “A..., Lda” que presta serviços no Colégio ..., a quantia mensal líquida de €705,00; paga a título de renda €400,00.
3.3.1.9
Em 21 de março de 2022, transitado em julgado, nos autos principais foi proferido o seguinte despacho: “Está esgotado o poder jurisdicional nos presentes autos e não se impõe definir qualquer regime de visitas uma vez que o mesmo está definido apenas tendo de ser cumprido. Notifique. D.n.”

3.3.2. Factos não provados
Com interesse para a boa decisão da causa não se provou qualquer outro facto
com relevância para a boa decisão da causa.

4. Fundamentos de direito
Dos reflexos da eventual alteração da decisão da matéria de facto na verificação do incumprimento do regime de visitas e, mantendo-se esta violação, do quantum da multa e das indemnizações impostas à recorrente
A recorrente sustenta que na falta de definição pelo tribunal de um local onde as visitas deverão decorrer não se pode considerar existir incumprimento do regime de visitas da sua parte. Se assim não se entender, atenta a debilidade económica da recorrente, deve o sancionamento do referido incumprimento reduzir-se ao mínimo possível, ou seja, a uma multa no montante de €51,00.
Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 41º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, “[s]e, relativamente à situação da criança, um dos pais ou a terceira pessoa a quem aquela haja sido confiada não cumprir com o que tiver sido acordado ou decidido, pode o Tribunal, oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou do outro progenitor, requerer, ao tribunal que no momento for territorialmente competente, as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação do remisso em multa até vinte unidades de conta e, verificando-se os respetivos pressupostos, em indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos.”
Na reapreciação da decisão da matéria de facto extirpou-se do ponto 14 dos factos provados matéria conclusiva, relegando-se para momento ulterior a valoração da factualidade provada e a emissão de juízo sobre os reflexos da factualidade provada sobre o crescimento e o bem-estar da criança.
Ora, à luz das regras da experiência comum, tendo em conta a tenra idade da criança, que se acha num processo de construção da sua personalidade procurando segurança afetiva e cognitiva junto dos que lhe são mais próximos, há que concluir que a privação de visitas da criança a um dos seus progenitores a amputa de uma das suas referências fulcrais, prejudicando o seu crescimento emocional, afetivo e cognitivo e bem assim o seu bem-estar.
Por isso, não obstante a alteração da decisão da matéria de facto, atenta a conclusão que se extrai em face da factualidade provada, conclui-se que a referida alteração é inócua para a sorte do recurso.
Vejamos agora se, como sustenta a recorrente, apenas após uma prévia definição do local em que devem decorrer as visitas[21], existe base suficiente para se poder afirmar um incumprimento do regime de visitas por parte da recorrente.
A nosso ver, como já anteriormente tivemos ocasião de referir, esta pretensão da recorrente é insólita pois que, esse local é aquele onde então o pai residir ou se achar, por exemplo, em férias, desde que em território nacional. Nesta última eventualidade, o mais que se admite é que o progenitor informe a progenitora do local para onde tenciona deslocar-se com a criança.
Aliás, nem é isso que decorre do acordo celebrado entre as partes e homologado pelo tribunal, não tendo a ora recorrente suscitado então qualquer questão quanto ao local em que a criança iria pernoitar quando estivesse à guarda do pai.
A fixação de um local onde deveriam decorrer as visitas do pai à sua filha constituiria uma abusiva intromissão na liberdade de deslocação do progenitor, apenas sendo tolerável tal procedimento se houvesse dados que com alguma segurança permitissem concluir que a residência do progenitor não guardião oferecia riscos para a saúde e segurança da criança, o que não resulta da factualidade apurada nos autos.
Assim, ao não permitir as visitas do recorrido à criança CC, a ora recorrente violou o regime de Regulação das Responsabilidades Parentais homologado por sentença proferida em 12 de setembro de 2019.
Importa reter que o regime das visitas esteve suspenso desde 08 de junho de 2021 até ao trânsito em julgado da decisão que declarou cessada a medida de promoção e proteção aplicada no processo nº 797/19.4T8CVD-D, ou seja dia 08 de março de 2022, pois que este era o último dia em que podia ser interposto recurso da decisão que declarou a cessação da medida de promoção e proteção aplicada e mediante o pagamento da multa prevista no artigo 139º do Código de Processo Civil.
Além disso, mesmo antes de 08 de junho de 2021 e desde a cessação da comunhão de vida da recorrente com o recorrido em 17 de maio de 2021, afigura-se-nos que o eventual incumprimento do regime de visitas que então possa ter existido se deve considerar não culposo, dado o contexto conflitual que então se desenvolvia e que levou a que poucos dias depois da cessação da comunhão de vida entre os progenitores da CC tivesse sido instaurado um processo criminal por violência doméstica.
Neste enquadramento, a extensão do incumprimento é bem menor do que a que foi relevada pelo tribunal recorrido e que foi num primeiro passo de mais de dezassete meses (veja-se a página 23 da sentença recorrida) e mais adiante passou a ser de dezoito meses (veja-se a página 26 da sentença recorrida), considerando como termo inicial do incumprimento o dia 17 de maio de 2021, olvidando a suspensão do regime de visitas por si decretada em 08 de junho de 2021 e que se manteve até ao trânsito em julgado da decisão que em 14 de fevereiro de 2022 declarou cessada a medida de promoção e proteção aplicada à criança CC.
Na realidade, o incumprimento do regime de visitas por parte da ora recorrente, pelo que antes se adiantou, apenas se pode considerar existente a partir de 09 de março de 2022 em diante, o que na data da prolação da sentença recorrida totalizava um pouco mais de oito meses, sendo que a maior parte deste tempo de incumprimento se verificou já na pendência destes autos, pois que foram instaurados em 29 de março de 2022.
O incumprimento do regime de visitas por parte da ora recorrente tem que se considerar culposo pois que a sua conduta é de todo desconforme à que qualquer progenitor guardião deve adotar face ao progenitor não guardião e à filha de ambos. Além disso, dada a pertinácia da resolução da ora recorrente de não cumprir o regime de visitas e o seu prolongamento no tempo, indiferente às consequências negativas de tal situação para a sua filha CC, tal incumprimento tem que se considerar grave.
No entanto, a extensão do incumprimento fica muito aquém daquela que o tribunal recorrido relevou, tendo a sua maior parte decorrido já na pendência destes autos.
Apreciemos agora das consequências jurídicas do incumprimento do regime de visitas por parte da ora recorrente.
Viu-se já anteriormente que o incumprimento da Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais é passível de punição com pena de multa que varia entre meia unidade de conta e vinte unidades de conta (artigo 41º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível e 27º, nº 1, do Regulamento das Custas Processuais).
Uma vez que no Regime Geral do Processo Tutelar Cível não constam regras sobre os critérios que regem a determinação do montante da multa, devem seguir-se, com as necessárias adaptações, as regras vertidas no nº 4 do artigo 27º do Regulamento das Custas Processuais, relevando-se também a gravidade do incumprimento sancionado e as consequências da conduta sancionada.
Assim, tendo em conta a intensidade da culpa da ora recorrente bem evidenciada pela sua pertinácia no incumprimento do regime de visitas, o prolongamento no tempo desse incumprimento, as consequências dessa conduta inadimplente quer para o progenitor não guardião, quer para a criança CC, a condição económica modesta da recorrente pois que se provou, sem impugnação da recorrente[22], que aufere o vencimento mensal líquido de €705,00, pagando de renda de casa, mensalmente, o valor de €400,00, afigura-se-nos adequada e proporcionada a multa de uma unidade de conta.
Além da sanção civil de multa, o progenitor inadimplente do Regime de Regulação das Responsabilidades Parentais, verificando-se os respectivos pressupostos, incorre na obrigação de indemnizar a criança e ou o progenitor requerente do incidente de incumprimento.
No caso dos autos, a conduta da ora recorrente constitui sem sombra de dúvidas um facto humano controlável pela vontade, violador do regime estabelecido em acordo judicialmente homologado e por isso ilícito, com culpa, como se viu antes, devendo presumir-se a imputabilidade da recorrente, pois que corresponde ao normal acontecer dos factos e se configura como um facto impeditivo da obrigação de indemnizar (artigos 488º e 342º nº 2, ambos do Código Civil) e causador de danos não patrimoniais quer na pessoa da criança, quer na pessoa do progenitor requerente do incidente de incumprimento.
Na hipótese em apreço, verificada a situação de incumprimento do regime da Regulação das Responsabilidades Parentais, a recorrente apenas questiona verdadeiramente o quantum da obrigação de indemnizar por parte da recorrente a favor do recorrido e da criança CC pugnando por uma substancial redução dos montantes arbitrados que considera desproporcionados e violadores das regras da equidade.
A compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do nº 4, do artigo 496º do Código Civil).
Também nesta vertente deve atentar-se no disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil, em ordem a uma aplicação, tanto quanto possível, uniforme do direito, assim se respeitando e realizando o princípio da igualdade.
Pela sua própria natureza, os danos não patrimoniais não são passíveis de reconstituição natural e, por outro lado, nem em rigor são indemnizáveis mas apenas compensáveis pecuniariamente.
A compensação arbitrada nestes casos não é o preço da dor ou de qualquer outro bem não patrimonial, mas sim uma satisfação concedida ao lesado para minorar o seu sofrimento, paliativo que numa sociedade que deifica o dinheiro assume naturalmente esta feição.
Importa ainda não perder de vista que apenas são compensáveis os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, estando afastados do círculo dos danos indemnizáveis os simples incómodos (artigo 496º, n.º 1, do Código Civil).
Ensina o Professor Antunes Varela[23] que a “gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias do caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)”. Em nota de rodapé, na mesma página da obra citada, aludia o Ilustre Professor ao facto de Carbonnier considerar de todo aberrante a decisão judicial que concedeu a indemnização por danos morais pedida pelo dono duma écurie de course, com fundamento no desgosto que lhe causou a morte de um dos seus cavalos. Embora este exemplo não tenha na atualidade a pertinência que tinha num tempo em que os animais eram vistos exclusivamente como coisas[24], destituídos de sentimentos[25], aponta para que o sofrimento a compensar atinja um patamar mínimo de gravidade para que se torne merecedor da tutela do direito[26]. Existe como que uma tolerância ou adequação social de certo nível de incomodidade ou sofrimento e que constitui o preço que cada ser humano tem de pagar por viver em sociedade.
No caso dos autos, o sofrimento causado ao recorrido e bem assim à criança CC pela conduta da recorrente tendente a inviabilizar o cumprimento do regime de visitas acordado entre ambos os progenitores e judicialmente homologado reveste-se de evidente gravidade (vejam-se os factos provados em 3.3.1.12 a 3.3.1.15 e as conclusões que se extraíram anteriormente quanto aos reflexos da conduta da recorrente no crescimento e bem-estar da CC), sendo por isso ambos merecedores de uma compensação, compensação que tem que ser substancialmente reduzida porque a duração do incumprimento é substancialmente menor do que a que foi considerada na decisão recorrida e, além disso, a nosso ver, deve a compensação arbitrada à criança ser superior à fixada a favor do progenitor, já que as consequências do incumprimento do regime de visitas têm um impacto previsivelmente mais grave e prolongado no tempo na criança do que no progenitor.
Além disso, deve ponderar-se a frágil condição económica da recorrente e não se pode perder de vista que uma compensação de montante elevado a cargo da progenitora se repercute mediatamente na criança.
Tudo sopesado, afigura-se-nos adequada a compensação de duzentos euros para o progenitor e de trezentos euros para a criança CC, mantendo-se no mais a decisão recorrida.
As custas do recurso são da responsabilidade da recorrente na exata proporção do seu decaimento mas sem prejuízo do apoio judiciário de que goza e, na parte em que procedeu, é sem custas uma vez que o Ministério Público goza de isenção de custas.

5. Dispositivo
Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por BB e, em consequência, altera-se a decisão da matéria de facto nos termos precedentemente expostos revogando-se parcialmente a decisão recorrida proferida em 23 de novembro de 2022, indo BB condenada a pagar multa no montante de uma unidade de conta, uma compensação por danos não patrimoniais a favor de AA no montante de duzentos euros e uma compensação por danos não patrimoniais a favor de CC no montante de trezentos euros, compensações a pagar no prazo máximo de cinco meses a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sendo o valor respeitante à criança a depositar a favor desta, mantendo-se no mais a decisão recorrida.
As custas do recurso são da responsabilidade da recorrente na exata proporção do seu decaimento mas sem prejuízo do apoio judiciário de que goza e, na parte em que procedeu, é sem custas uma vez que o Ministério Público goza de isenção de custas, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso.
***
O presente acórdão compõe-se de trinta e duas páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.


Porto, 12 de julho de 2023
Carlos Gil
Mendes Coelho
Joaquim Moura
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[1] Segue-se, com alterações, o relatório da decisão recorrida.
[2] Nascida em .../.../2018.
[3] Notificada às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 24 de novembro de 2022.
[4] Não se entende a referência a um menor DD que não é parte nestes autos, tal como não se entende mais adiante a imputada violação do Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27-11-2003 num caso que apenas tem conexão com a ordem jurídica nacional.
[5] Por isso, também quanto à violação da ordem na produção das alegações (veja-se o artigo 29º, nº 1, alínea c) do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aplicável ao incidente de incumprimento, ex vi artigo 41º nº 7 do mesmo regime), a ora recorrente devia ter reclamado no momento em que ocorreu tal violação da lei adjetiva, violação que de todo o modo se nos afigura inócua.
[6] A nosso ver, a deslocação da criança em férias para o estrangeiro com o progenitor carecerá, em regra, do acordo de ambos os progenitores.
[7] Apesar de na motivação se aludir a inúmeras participações policiais, apenas se detetaram três relatórios de serviço, datados de 29 de junho de 2022, 01 de julho de 2022 e 29 de agosto de 2022.
[8] Identificado na ata de audiência de 29 de Setembro de 2022, como AA.
[9] Referimo-nos aos factos psíquicos.
[10] As operações aritméticas são também matéria conclusiva, sendo matéria de facto a prova das parcelas necessárias à efetivação de tais operações. A aritmética, enquanto tal, por razões óbvias, não constitui objeto de prova, tratando-se de regras universais que são do conhecimento geral.
[11] Como exemplos destes juízos periciais de facto podem referir-se a incapacidade para o trabalho, o perigo de ruína (artigo 1226º nº 1 do Código Civil) e a graduação do quantum doloris e do dano estético. Michele Taruffo, in Simplemente la verdad, El juez y la construcción de los hechos, Marcial Pons 2010, páginas 53 a 56 [existe tradução portuguesa desta obra de 2012, encontrando-se a passagem citada nas páginas 59 a 62], reduz os factos aos históricos e aos psicológicos, afirmando que os enunciados de facto que os veiculam são apofânticos, no sentido de que podem ser verdadeiros ou falsos, não aludindo aos denominados factos hipotéticos, nem aos juízos periciais de facto, a que se refere, por exemplo, J.P. Remédio Marques in Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, 2ª edição, Coimbra Editora 2009, páginas 524 a 527.
[12] Incluir-se-ão nestes os factos hipotéticos ou conjeturais que não careçam de conhecimentos especiais para serem emitidos, como sucede relativamente à vontade hipotética ou conjetural das partes (artigos 292º, parte final, 293º, parte final e 2202º, parte final, todos do Código Civil).
[13] Esta conclusão extrai-se com segurança do disposto na segunda parte do artigo 410º do Código de Processo Civil, porquanto nos casos em que não haja lugar à enunciação dos temas da prova, a instrução tem por objeto os factos necessitados de prova. No processo penal o acerto desta asserção é legislativamente mais nítido (vejam-se os artigos 128º, nº 1 e 130º, nº 2, ambos do Código de Processo Penal). No entanto, face a normativo de conteúdo similar à vigente no processo civil, já o Sr. Professor Alberto dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, Volume IV, Reimpressão, Coimbra Editora 1987, página 327, escrevia: “A nossa lei assenta no pressuposto de que a função da testemunha é única e simplesmente narrar factos. O art. 641.º determina que a testemunha será interrogada sobre os factos incluídos no questionário, articulados pela parte que a ofereceu, e deporá com precisão, indicando a razão de ciência e quaisquer circunstâncias que possam justificar o conhecimento dos factos. Portanto a testemunha é chamada para narrar ao tribunal os factos de que tem conhecimento e para indicar a fonte desse conhecimento. Mais nada.
Sei muito bem que, a cada passo, se vai além desta linha: é frequente formularem-se à testemunha perguntas tendentes a obter dela o juízo ou a opinião que formou sobre os factos observados. Mas temos como certo que em tais casos se ultrapassa o limite da prova testemunhal e que a testemunha tem o direito de se recusar a responder.
[14] Por exemplo, concluindo que o condutor face aos factos concretos apurados – velocidade de circulação, tempo de reação do condutor, distância a que o obstáculo surgiu – não conseguiu travar ou desviar-se.
[15] Sublinhe-se que esta justificação para a recusa de entrega da criança parece um mero pretexto pois que em 2019 os progenitores acordaram num regime de Regulação das Responsabilidades Parentais sem qualquer fixação de local onde deviam decorrer as visitas. E se, como afirma a recorrente, estava implícito que esse local era a residência dos avós paternos que não reunirá as adequadas condições de higiene, por que razão a ora recorrente não levantou então qualquer objeção?
[16] No auto consta o ano de 2020 por manifesto lapso.
[17] Na realidade, esta decisão está datada de 14 de fevereiro de 2022, tendo sido notificada no dia 16 de fevereiro de 2022.
[18] Reitera-se o conteúdo da nota de rodapé que precede.
[19] Reitera-se o conteúdo das duas notas de rodapé que precedem.
[20] Embora não conste da factualidade provada o ano em que os factos se passaram, parece inequívoco que se trata do ano de 2022.
[21] Visitas em sentido amplo que abarcam o simples contacto do progenitor não guardião com a criança, num período curto de tempo e a pernoita em fins de semana, na residência do mesmo progenitor.
[22] E da análise de toda a prova produzida nos autos até teria boas razões para impugnar a liquidez deste valor…
[23] In Das Obrigações em Geral, Vol I, 6ª edição, Almedina 1989, página 576.
[24] A Lei nº 8/2017, de 03 de março, alterou o Código Civil e de acordo com o disposto no artigo 201º-B deste diploma legal, os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica em virtude da sua natureza.
[25] A propósito do estatuto jurídico dos animais, numa concepção atualizada, veja-se, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Portuguesa 2014, páginas 454 a 456, anotação 5 ao artigo 202º do Código Civil.
[26] Escreve o Professor Antunes Varela, no mesmo local: “Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.”