Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | JUDITE PIRES | ||
| Descritores: | NOTIFICAÇÕES ENTRE MANDATÁRIOS JUDICIAIS TRANSMISSÃO ELECTRÓNICA DE DADOS NOTIFICAÇÃO POR CORREIO ELECTRÓNICO | ||
| Nº do Documento: | RP20251113587/24.2T8VFR-B.P1 | ||
| Data do Acordão: | 11/13/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | ANULADA | ||
| Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - De acordo com o disposto no artigo 255.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, as notificações entre os mandatários judiciais das partes são realizadas pelos meios previstos no nº 1 do artigo 132.º do mesmo diploma e nos termos definidos na portaria mencionada. II - O sistema informático de suporte à atividade dos tribunais assegura, mediante indicação do mandatário notificante, a notificação por transmissão eletrónica de dados automaticamente após a apresentação de qualquer peça processual ou documentos através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, conforme estabelece o n.º 1 do artigo 26.º da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto. III - Apesar de a notificação por correio electrónico não constituir forma legal de notificação entre mandatários, tal irregularidade será suprida mediante comprovação de que a mesma foi recebida pelo destinatário e a data em que tal recepção ocorreu. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo n.º 587/24.2T8VFR-B.P1 Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo Local Cível de Santa Maria da Feira – Juiz 3 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. RELATÓRIO. AA e BB apresentaram requerimento, no âmbito do incidente de remoção de cabeça de casal no inventário instaurado por óbito dos pais, suscitado pela interessada CC, juntando com o mesmo quatro documentos e “comprovativo da notificação do presente requerimento à parte contrária, via e-mail, face à impossibilidade de o fazer através da plataforma CITIUS”. Iniciada a diligência de produção de prova já anteriormente designada, pelo mandatário da interessada CC foi requerido o adiamento da diligência com fundamento no facto de não ter sido notificado electronicamente, através da plataforma CITIUS, do referido requerimento, apresentado a 20.11.2024. Assegurado o contraditório, o mandatário do cabeça de casal pronunciou-se pelo indeferimento do requerido, alegando que, por dificuldades técnicas do CITIUS, notificou a parte contrária através de email, dando conta disso nos autos. Seguidamente, foi proferido o seguinte despacho: “Atenta a tramitação dos autos, não obstante não constar que o requerimento de 19/11/2024, resposta ao requerimento de remoção de cabeça de casal, a notificação entre mandatários, o certo é que, devido à alegada inoperacionalidade do Citius, o Ilustre Mandatário da cabeça de casal notificou o Ilustre Mandatário da interessada CC via email, conforme consta do teor da referência 16953278. Assim sendo, verifica-se que não foi cometida qualquer irregularidade, pelo que temos condições para prosseguir com a diligência. Notifique”. Não se conformando o Autor com tal sentença, dela interpôs recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões: 1ª- O Ilustre mandatário da Recorrida não notificou, pelo meio legal, o mandatário da Recorrente, da oposição deduzida no incidente de remoção de cabeça-de-casal; 2ª – Da Lei resulta a obrigatoriedade, de todo e qualquer acto processual a ser realizado entre mandatários, o seja por via da plataforma informática Citius; 3ª - O que não foi feito em violação dos Artºs 221º, 255º, 132º, nº 2 do Código de Processo Civil e Artº 26º da Portaria nº 280/13 de 26 de Agosto 4ª - Da simples análise do formulário do requerimento de 19 de Novembro de 2024, resulta que o mandatário da Recorrente não foi notificado; 5ª - Entende e entendeu o mandatário da Recorrida que lhe é possível e conveniente a notificação via e-mail, em violação do previsto na Lei, de forma imperativa; 6ª – E-mail que nunca foi recebido, lido ou tomado conhecimento pelo subscritor, mandatário da Recorrente; 7ª – Ainda se pudesse aceitar a não prática da notificação ente mandatários nos termos legais, e atento o principio da auto-responsabilização das partes, teria de ser requerida a notificação oficiosa, ou realizar pelo mandatário, a notificação pelo meio legal, à posterior, o que não foi feitoi; 8ª – Os princípios da segurança jurídica e da igualdade de ar,as e do exercício do contraditório, impõe, por isso mesmo a certificação e garantia da notificação entre mandatários; 9ª – Nunca a Recorrente, até ao dia da realização da audiência de julgamento tomou conhecimento do requerimento apresentado pela contraparte, ora por não ter acesso aos autos na plataforma informática, ora por nunca ter sido notificado do requerimento de 19 de Novembro de 2024, apresentado pela contraparte, o que impossibilitou o exercício do contraditório ou a análise do requerimento apresentado; 10ª - Invocada a nulidade junto do Tribunal a quo decorrente da omissão perpetrda, nos termos do Artº 195º do Código de Processo Penal, e que comstange a igualdade de armas e de justa composição do litigio, o Tribunal considerou a notificação válida, a debalde do que defende a Lei, a Doutrina e a Jusrisprudência; 11ºª – A noma prevista no nº 3 do Artº 26º da Portaria nº 280/13 só prevê, excepcionalmente, a prática d actos mna impossibilidade de operacionalidade do Citius, aos Senhores Magistrados e às secretarias, não prevendo tal possibilidade aos mandatários, o que é assertivo que não foi considerada a possibilidade da pratica de actos entre mandatários, por tal modo, face a que se presume que há que atender ao contexto literal da Lei e se presume que o Legislador soube expresaar o seu propósito, ainda que mal redigido, atentos os princípios da interpretação das Leis previstos no Artº 9º do código Civil; 12º - A ser admissível a interpretação defendida pelo Tribunal recorrido, a debalde da Lei, poderse-ia permitir que cada mandatário notificasse a contraparte pelo meio que lhe conviesse, como por carta simples, fax, telefonema, sinais de fumo ou “canto da cigarra”, o que redundaria numa incerteza e inseguranças jurídicas, que o legislador não quer, e razão da imperatividade prevista; 13º - O douto despacho recorrido viola os princípios da segurança e certeza jurídicas, de normas imperativas da notificação entre mandatários e do exercício do direito ao contraditório; 14ª – O Douto despacho recorrido, viola as normas previstas no Artsº 3º, nº 3, 6º, 221º, 255º, 132º, nº 2 do Código de Processo Civil e o Artº 26º da Portaria nº 280/13 de 26 de Agosto; Nestes termos e nos de Direito, deve ser dado provimento ao recurso e por via disso ser revogado o douto despacho que ordenou a realização da audiência de julgamento e consequente produção de prova, ante a invocada omissão da notificação pelo meio legal obrigatório e que impediu o exercício do contraditório e do conhecimento do alegado e designada nova data para aquela produção de prova, com o que se fará a sempre esperada e costumada JUSTIÇA”. Os apelados apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso. Colhidos os vistos, cumpre apreciar. II.OBJECTO DO RECURSO. A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito. B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar: - se a notificação electrónica, via email, efectuada por AA e BB à parte contrária enferma de vício e, na afirmativa, consequências jurídicas do mesmo. III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO. Os factos/incidências processuais relevantes à apreciação do objecto do recurso são os narrados no relatório introdutório. IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. Como já se precisou, a única questão que aqui importa equacionar reporta-se à validade ou irregularidade da notificação do requerimento apresentado, a 19.11.2024, pelo cabeça de casal, AA e interessada BB, efectuada através de email. Dispõe o n.º 1 do artigo 221.º do Código de Processo Civil: “Nos processos em que as partes tenham constituído mandatário judicial, os atos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes após a notificação da contestação do réu ao autor são notificados pelo mandatário judicial do apresentante ao mandatário judicial da contraparte através do sistema de informação de suporte à atividade dos tribunais, nos termos previstos no artigo 255.º” O referido artigo 255.º, estabelece, por sua vez: “As notificações entre os mandatários judiciais das partes são realizadas por via eletrónica nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º, devendo o sistema de informação de suporte à atividade dos tribunais certificar a data da elaboração da notificação, presumindo-se esta feita no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja”. E de acordo com o n.º 1 do artigo 144.º do mesmo diploma legal, “os atos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes são apresentados a juízo por transmissão eletrónica de dados, nos termos definidos na portaria prevista no nº 1 do artigo 132º, valendo como data da prática do ato processual a da respetiva expedição.” A portaria mencionada nestas duas disposições é a Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, com as sucessiva alterações e rectificações que à mesma foram sendo sucessivamente introduzidas. Nos termos do disposto no artigo 26.º, n.º 1 da referida Portaria n.º 280/2013, “o sistema informático de suporte à atividade dos tribunais assegura, mediante indicação do mandatário notificante, a notificação por transmissão eletrónica de dados automaticamente após a apresentação de qualquer peça processual ou documentos através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais.” O n.º 8 do artigo 144.º do Código de Processo Civil previne a eventualidade de justo de impedimento para a prática do acto processual em conformidade com o determinado pelo seu n.º 1. Nessa hipótese, o acto poderá ser praticado com recurso a um dos meios previsto no n.º 7 do mesmo dispositivo, designadamente, através de “entrega por via eletrónica, nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º, valendo como data da prática do ato a da respetiva expedição” – alínea c). Embora fixado para a prática de actos processuais, por idênticas razões de segurança jurídica justifica-se que a aplicabilidade de tal regime se estenda à notificação entre mandatários, com os limites procedimentais fixados pelos citados normativos. No caso em apreço, não se achando comprovada a impossibilidade da notificação à contraparte do requerimento apresentado a 19.11.2024, e documentos que o acompanham, poder ser realizada de acordo com as exigências formais exigidas para o efeito, isto é, através do sistema informático CITIUS, nos termos definidos pelo artigo 26.º, n.º 1 da Portaria n.º 280/2013, é indiscutível que a notificação em causa se processou por forma diversa da legalmente estabelecida. Como resulta do n.º 1, do artigo 195.º do Código de Processo Civil, a preterição de uma formalidade legal só releva quando a lei assim o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. A notificação tem por finalidade dar conhecimento ao destinatário de certo facto ou declaração, importando ao processo judicial a comprovação dessa transmissão ou, pelo menos, que apenas por razões imputáveis ao destinatário, não foi tomado conhecimento da notificação e ainda a certeza de que essa transmissão ocorreu ou se deve considerar como tendo ocorrido, a fim de que se possam contar os prazos para o exercício de faculdades processuais que caibam ao notificado. Neste contexto, apesar da notificação por correio electrónico entre mandatários não poder ser considerada forma legalmente correcta, apurando-se que a mesma chegou ao seu destinatário e a data em que a recepção ocorreu, aquela irregularidade, sem influir no exame ou decisão da causa, pode considerar-se suprida, uma vez garantido o fim da notificação – conhecimento do acto ou facto pelo respectivo destinatário. Não basta, pois, que a notificação tenha sido enviada para o endereço electrónico do mandatário da contraparte; para que aquela irregularidade possa ser suprida, exige-se, além disso, comprovação de entrega ao destinatário e data em que a mesma ocorreu. Dessa prévia indagação não cuidou o tribunal a quo, que, prematuramente, concluiu, através do despacho aqui em recurso, pela inexistência de qualquer irregularidade e obstáculo ao prosseguimento da diligência iniciada. Impõe-se, como tal, a anulação de tal decisão, que deverá ser substituída por outra que determine a notificação dos apelados AA e BB para, em prazo a fixar, comprovarem a recepção do email, remetido para o endereço do correio electrónico do mandatário do recorrente, para notificação do requerimento apresentado nos autos a 19.11.2024, assim como data de tal recepção, a ter a mesma ocorrido. * Síntese conclusiva: ……………………………… ……………………………… ……………………………… * Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em, julgando parcialmente procedente o recurso, anular a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra que, em prazo a fixar, convide os apelados a comprovar que o email destinado à notificação do requerimento apresentado a 19.11.2014, e respectivos documentos, enviado para o endereço electrónico do mandatário da aqui recorrente foi recebido pelo destinatário e data dessa recepção.Custas da apelação – a fixar a final. Notifique. Porto, 13.11.2025 Acórdão processado informaticamente e revisto pela primeira signatária. Judite Pires António Carneiro da Silva Isabel Ferreira |