Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
13469/18.8T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TERESA SÁ LOPES
Descritores: COMISSÃO DE SERVIÇO
CONSEQUÊNCIAS DECORRENTES DA FALTA DE OBSERVÂNCIA DA FORMA ESCRITA
LOCAL DE TRABALHO DO TRABALHADOR
NATUREZA DAS CHAMADAS DESPESAS DE REPRESENTAÇÃO
Nº do Documento: RP2024011513469/18.8T8PRT.P1
Data do Acordão: 01/15/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO PROCEDENTE; REVOGAÇÃO DA SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - «Não se considera em regime de comissão de serviço o contrato que não tenha a forma escrita (…)» - artigo 162º, nº3 do Código do Trabalho.
II - A exigência do documento escrito explica-se pela necessidade de consciencializar as partes, sobretudo o trabalhador, da precariedade do cargo - “a forma escrita tem em vista possibilitar uma maior reflexão das partes, uma formulação mais precisa e completa das declarações negociais e um maior elevado grau de certeza sobre os termos contratuais”.
- Nada ficando previsto no contrato de comissão de serviço para o período seguinte ao da sua cessação, em termos de local de trabalho, importa considerar o que no contrato inicial ficou previsto.
III - “As chamadas “despesas de representação”, tanto podem assumir a natureza compensatória como remuneratória, consoante correspondam à designação conceptual “tout court”, ou assuma a forma de um efetivo e constante suplemento remuneratório, indissociavelmente ligado à remuneração base de que depende, por forma regular, contínua e periódica.”

(sumário inclui parte de doutrina referenciada no texto e do sumário do Acórdão do STJ proferido no processo nº09A0556, referenciado no texto)
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº13469/18.8T8PRT.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 3
Recorrente: AA
Recorrida: Fundação A...
Relatora: Teresa Sá Lopes
1ºAdjunto: Desembargador António Luís Carvalhão
2ª Adjunta: Desembargadora Paula Leal de Carvalho

1. Relatório (com base no relatório efetuado na decisão recorrida):
AA, residente na Rua ..., ... Porto, contribuinte n.º ..., intentou a presente ação declarativa que segue a forma de processo comum contra Fundação A..., com sede na Calçada ..., ... Lisboa, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a importância de €18.187,50, respeitante às retribuições por isenção do horário de trabalho, devidas e não pagas, referentes ao período entre 1 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012, a importância de €4.154,73, respeitante às retribuições por isenção do horário de trabalho, devidas e não pagas, referentes ao período entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014, a importância de €34.962,84, respeitante às ajudas de custo, devidas e não pagas, pelas deslocações entre Porto e Braga em automóvel próprio, referentes ao período entre 1 de julho de 2015 e 12 de junho de 2018, as ajudas de custo que venham a vencer-se a partir de 12 de junho de 2018 enquanto subsistir a relação de trabalho entre as partes, a importância de €651,00, a título de diferenças salariais respeitantes às retribuições complementares que não foram pagas nos subsídios de férias e de Natal entre 20 de julho de 2016 e 10 de maio de 2017.
Pede ainda que a ré seja condenada a classificar o autor com a categoria de Coordenador de Unidade, reconhecendo que essa é a sua categoria profissional, sendo condenada a pagar-lhe a importância de €7.834,03, respeitante à soma das retribuições - complementares devidas e não pagas durante o período de tempo entre 11 de maio de 2017 e 12 de junho de 2018, o montante de €518,81 a título de retribuição complementar, a partir de 12 de junho de 2018 e enquanto subsistir a relação de trabalho entre as partes, os juros de mora sobre todas as quantias atrás referidas e a quantia de €10.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Pede, por último, que seja declarada nula e sem efeito a sanção disciplinar aplicada ao autor.
Para tanto alugou, em suma, que foi admitido ao serviço da Ré, em regime de comissão de serviço, nos termos do regime atualmente previsto nos artigos 161º e seguintes do Código do Trabalho, no dia 1 de abril de 2009, para, por conta desta e sob a sua autoridade e direção, exercer as funções correspondentes ao cargo de Delegado Regional da Região Norte, sendo que essa admissão foi deliberada em 26 de março de 2009.
Como contrapartida do exercício de tais funções foi ajustado que o autor auferiria uma retribuição de base mensal ilíquida no montante de €2.100,00, sendo que o autor sempre exerceu tais funções ao serviço da Ré na delegação/agência do Porto, sem prejuízo das respetivas deslocações em serviço a outras delegações da Ré.
No momento da admissão foi acordado que o autor exerceria a sua atividade na cidade do Porto, sendo esse o seu posto de trabalho, foi fixado um período de trabalho diário de 7 horas e um período de trabalho semanal de 35 horas e foi ajustado entre as partes que, no exercício da referida comissão de serviço, o autor ficaria sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
Em contrapartida, nos termos previstos no art.º 265º do Código do Trabalho, a Ré ficou legalmente obrigada a pagar ao autor a título de retribuição específica por isenção de horário de trabalho, um montante correspondente ao valor de uma hora de trabalho suplementar por dia.
Sucede que, durante todo o período de duração desta comissão de serviço, a Ré nunca pagou quaisquer verbas a esse título, apesar de as mesmas serem devidas e a elas o autor nunca ter renunciado.
A comissão de serviço cessou em outubro de 2012 e, no dia 19 de outubro de 2012 foi deliberada a nomeação do autor, uma vez mais em regime de comissão de serviço, como Diretor da Agência ....
Nessa sequência, autor e Ré subscreveram, em 22 de outubro de 2012, um documento designado “Acordo de Comissão de Serviço”, tendo sido acordado que o autor desempenharia funções de Diretor da Agência ..., dependente diretamente do administrador do pelouro, a partir do dia 23 de outubro de 2012.
Nos termos do referido Acordo, foi ajustado que o autor passaria a auferir uma retribuição de base mensal ilíquida no montante de €1.000,00, sendo que, nessa data, o autor passou a prestar a sua atividade ao serviço da Ré na delegação/agência ....
Em consequência da passagem do seu local de trabalho para Braga, foi garantido ao autor que lhe passaria a ser paga mensalmente uma verba a título de ajudas de custo por todos as deslocações efetuadas do Porto para Braga e vice-versa, tendo sido exarado na acta da reunião do Conselho de Administração em que o autor foi nomeado, que este teria “direito a receber deslocações em viatura própria nos dias úteis do Porto para Braga e vice-versa.”
Durante todo o período de duração desta nova comissão de serviço, a Ré cumpriu sempre essa sua obrigação de pagar ao autor as ajudas de custo em causa.
Por outro lado, foi uma vez mais ajustado pelas partes o “estabelecimento do regime de isenção de horário de trabalho”
Porém, durante todo o período de duração desta comissão de serviço, tal como acontecera no âmbito da comissão de serviço anterior, a Ré nunca pagou quaisquer verbas a esse título.
No “Acordo de Comissão de Serviço” foi ainda ajustado que caso a referida comissão viesse a cessar, o autor manter-se-ia vinculado à Ré, em regime de contrato individual de trabalho, com a categoria de Técnico Adjunto de Grau 1, Nível 4, Escalão 2.
No dia 31 de janeiro de 2014, a Ré comunicou ao autor que a comissão de serviço cessaria no dia 1 de abril de 2014. Não obstante, a cessação efetiva da comissão de serviço apenas se concretizou no dia 30 de junho de 2014.
Em consequência da cessação da comissão de serviço, o autor passou a exercer as funções correspondentes à categoria de Técnico Adjunto de Grau 1, Nível 4, Escalão 1, conforme tinha sido previamente deliberado e ajustado entre as partes e, a partir dessa data, passou a auferir a retribuição base mensal de €839,53.
Foi então determinado unilateralmente pela Ré que o autor continuaria a exercer a sua atividade ao serviço daquela na delegação/agência ..., o que o autor foi forçado a respeitar, contra a sua vontade, continuando, pois, a exercer a sua atividade ao serviço da Ré nas instalações ....
Porém, logo a partir do dia 1 de julho de 2014, a Ré deixou de pagar as ajudas de custo referentes às deslocações em veículo próprio entre Porto e Braga, ao contrário daquilo que se obrigara quando o transferira para Braga, sendo que o autor pediu informação à Ré sobre os motivos do não pagamento, mas nunca lhe foi dada qualquer resposta.
Em 1 de Outubro de 2014, o autor foi promovido, através da reclassificação profissional da categoria de base, para Técnico Superior Estagiário, Nível 1, Escalão Único, sendo que, em consequência dessa promoção, a retribuição base mensal do autor foi aumentada para €1.153,40.
Em 1 de Janeiro de 2015, o autor foi promovido na carreira Técnico Superior, da categoria de Estagiário para Técnico Superior de Grau I, Nível 1, Escalão 1, passando esta a ser a sua profissão ao serviço da Ré, o que se pode constatar igualmente através da Comunicação de Serviço 164/2014.
As funções correspondentes a tal categoria profissional - e que o autor passou então a estar obrigado a desempenhar -, são, segundo a própria Ré o transmitiu ao autor, as seguintes: “funções consultivas e de conceção que requerem um elevado grau de qualificação; elaborar pareceres, estudos e projetos, concebe e adapta métodos e processos científico-técnicos do âmbito da sua especialização, com vista à tomada de decisão. Pode supervisionar funcionalmente equipas de trabalho ou de projeto”.
Em consequência dessa promoção, a remuneração base mensal do autor foi aumentada para €1.431,27, tendo sido esse o montante que lhe passou a ser pago a esse título a partir de então.
No dia 20 de julho de 2016, o autor foi nomeado Coordenador da Unidade Local ..., com efeitos a partir dessa data. Alegadamente, o autor foi nomeado em “regime de substituição”, independentemente de se desconhecer em absoluto o significado jurídico de tal expressão no contexto do regime jurídico do contrato individual de trabalho.
A partir do referido dia 20 de julho de 2016, o autor passou assim a exercer as funções correspondentes ao cargo de Coordenador da Unidade Local ... da Ré. Em consequência da sua nomeação como Coordenador, passou a auferir uma remuneração complementar no valor de €518,81.
Unilateralmente, a Ré designou a referida retribuição complementar como “Despesas de Representação”, embora fosse e seja certo que a mesma consubstanciava uma efetiva retribuição, uma vez que visava remunerar o autor como contrapartida da sua atividade como Coordenador.
Tal retribuição fixa foi paga ao autor durante todo o período de tempo em que o mesmo exerceu funções como Coordenador.
Não obstante, a Ré continuou a não pagar as quantias devidas a título de ajudas de custo em resultado das deslocações para Braga.
No dia 7 de abril de 2017, através da Informação ..., foi comunicado pela Ré ao autor que no dia 10 de abril de 2017 cessaria “as funções que desempenhava como Coordenador da Unidade Local Orgânica ..., em regime de substituição, voltando à Categoria e funções anteriores”. Por via dessa informação foi igualmente comunicado que havia ficado estipulado também que “Volte a exercer as funções de Técnico Superior de Grau I, ficando vinculado à subordinação da Coordenação a ser nomeada, bem como à obrigatoriedade de cumprir todas as orientações que lhe forem atribuídas superiormente.”
A partir do referido dia 10 de abril de 2017, por decisão unilateral da Ré, o autor deixou de exercer as funções de Coordenador para que havia sido nomeado, tendo sido impedido de continuar a ocupar o cargo para o qual havia sido promovido. A Ré deixou de pagar ao autor a retribuição complementar de €518,81 a partir do trigésimo dia subsequente à data em que o autor deixou de ocupar o cargo de Coordenador por decisão unilateral daquela.
No mês de maio de 2017 foi paga ao autor uma verba respeitante a “Aviso Prévio” no exato montante de €518,81. O pagamento desse “Aviso Prévio” é naturalmente a expressão clara, assumida pela própria Ré, de que o pagamento mensal e regular daquele montante ao longo dos meses anteriores configurava o pagamento de uma verdadeira retribuição e não de quaisquer despesas de representação.
Mesmo depois de ter sido impedido de continuar a ocupar o cargo de Coordenador, o autor continuou a exercer a sua atividade em Braga, sendo, pois, certo que uma vez mais a Ré não permitiu o seu regresso ao seu local de trabalho no Porto.
Logo no dia 11 de abril de 2017, o autor solicitou a transferência do seu local de trabalho para o Porto. Esse pedido foi indeferido por despacho do Presidente do Conselho de Administração da Ré, pelo que o autor continuou, pois, a prestar serviço em Braga, embora tenha sido inicialmente contratado para exercer a sua atividade na cidade do Porto
Entre a residência do autor e a Agência da Ré em Braga, a menor distância possível, por estrada, é, segundo a aplicação da Michelin, de 54,5 quilómetros. Segundo a referida aplicação, a distância entre as Agências ... e ... é também de 54,5 quilómetros. Pelo que, em qualquer circunstância, em cada dia em que trabalhou ao serviço da Ré desde 1 de janeiro de 2014 até 12 de junho de 2018, o autor foi obrigado a efetuar 109 quilómetros em automóvel próprio.
Em 2014, deduzidos os dias de fins de semana, os feriados e os 22 dias úteis de férias que gozou, o autor trabalhou efetivamente 106 dias, tendo realizado em automóvel próprio um total de 11.554 km.
Em 2015, deduzidos os dias de fins de semana, os feriados e os 22 dias úteis de férias que gozou, o autor trabalhou efetivamente 230 dias, tendo realizado em automóvel próprio um total de 25.070 km.
Em 2016, deduzidos os dias de fins de semana, os feriados e os 23 dias úteis de férias que gozou, o autor trabalhou efetivamente 228 dias, tendo realizado em automóvel próprio um total de 24.852 km.
Em 2017, deduzidos os dias de fins de semana, os feriados, 22 dias úteis de férias que gozou e 12 dias de ausências, o autor trabalhou efetivamente 215 dias, tendo realizado em automóvel próprio um total de 23.435 km.
Em 2018, até ao dia 12 de junho, deduzidos os dias de fins de semana e os feriados, o autor trabalhou efetivamente 112 dias, tendo realizado em automóvel próprio um total de 12.208 km.
Tal como já se alegou, no dia 20 de julho de 2016, o autor foi nomeado Coordenador da Unidade Local ..., com efeitos a partir dessa data.
Alegadamente, o autor foi nomeado em “regime de substituição” e não em regime de comissão de serviço, sendo que o putativo regime de substituição não existe à luz do regime jurídico do contrato individual de trabalho. Significa o exposto que o autor foi efetivamente promovido para a categoria de Coordenador de Unidade Local.
Em consequência, ao determinar unilateralmente que o autor deixaria de ser Coordenador de Unidade e que passaria a exercer as funções de Técnico Superior de Grau I, a Ré mudou o autor para categoria inferior, o que lhe era e é proibido nos termos previstos no artigo 129º, n.º 1, alínea e), do Código do Trabalho. O autor tem, pois, direito à categoria de Coordenador de Unidade.
Desde o início da sua relação de trabalho com a Ré, até 10 de abril de 2017, o autor trabalhou sempre num Gabinete. A partir do dia 8 de junho de 2017 o autor foi colocado numa sala aberta, em formato habitualmente designado por “open-space”.
O autor está impedido de exercer as funções de chefia para que foi nomeado, mas está também impedido de exercer as funções correspondentes à categoria para que fora promovido antes da sua nomeação como Coordenador em Braga.
O autor foi incumbido de atendimento ao público, tendo sido colocado no balcão respetivo. Para agravar o desconforto, o autor foi inclusivamente obrigado pela Ré a usar uniforme de atendimento ao público.
Atualmente, o autor não tem quaisquer atribuições profissionais, sendo objetivamente impedido de trabalhar, com exceção de algumas tarefas relacionadas com o atendimento ao público.
Para além do exposto, as idas do autor ao quarto de banho são monitorizadas pela atual Coordenadora BB e/ou pelo colaborador CC, os quais o seguem quando àquele se dirige. Esse comportamento da Ré configura uma situação de assédio moral, sendo que o autor se sente profundamente humilhado, angustiado, tem dificuldades em dormir e não consegue concentrar-se, está triste e sofre profundamente com a forma como está a ser tratado pela Ré.
Tais danos devem ser ressarcidos pela Ré, visto que foi em consequência da sua conduta que os mesmos foram gerados, computando o autor tais danos em quantia nunca inferior a €10.000,00.
Em junho de 2017, o autor recebeu uma comunicação nos termos da qual constava que contra si fora decidido instaurar um processo disciplinar sem intenção de despedimento. Em anexo a tal documento, recebeu igualmente um documento designado “Nota de Culpa”.
Ambos os documentos acima referidos estavam assinados pela autodesignada instrutora do processo.
O autor apresentou a sua resposta à Nota de Culpa dentro do prazo legal, através de documento subscrito por mandatária e, em 13 de setembro de 2017, o autor recebeu uma carta a si dirigida, em papel timbrado da Ré, subscrita e assinada por DD, na qualidade de “A instrutora”, cujo teor era o seguinte: “Na sequência do processo disciplinar que esta Fundação decidiu instaurar a V. Exa. junto envio cópia do Relatório Final subscrito pela instrutora.”. Em anexo a essa carta, o autor recebeu um documento designado “Decisão”.
O referido documento foi assinado exclusivamente por DD, na qualidade de “A Instrutora”.
Depois desse o autor não recebeu qualquer outro documento relativo ao processo disciplinar em causa e nunca recebeu qualquer decisão subscrita por representante da administração da Ré.
A putativa decisão não foi formulada formalmente pela Ré. Todavia, a Ré inscreveu a sanção em causa no registo atualizado das sanções disciplinares.
Mesmo que se entendesse que aquela “Decisão” consubstancia efetivamente uma decisão e não uma mera proposta, ainda assim seria tal decisão nula. Na verdade, nos termos previstos no artigo 329º do Código do Trabalho, o procedimento disciplinar pode ser exercido diretamente pelo empregador ou por superior hierárquico do trabalhador.
A instrutora do processo, DD, não é nem nunca foi superior hierárquica do autor pelo que não tinha nem competência nem legitimidade para sancionar o autor, pelo que, também por tal motivo deve ser anulada e dadas sem efeito a sanção aplicada bem como a inscrição no respetivo registo.
Acresce que a sanção aplicada ao autor não teve qualquer fundamento.
Com efeito, conforme foi alegado pela Ré na nota de culpa e na decisão do processo disciplinar, o autor foi acusado e sancionado por alegadamente não ter registado as suas entradas e saídas das instalações da Ré durante o período em que foi Diretor/Coordenador da Agência ... e, foi também o autor acusado de não comparecer “no seu local de trabalho às quartas feiras” (sic), alegadamente também no período em que exerceu aquelas funções de Diretor/Coordenador da Agência ....
Decorreu também da nota de culpa do processo disciplinar, apesar da sua evidente vacuidade e das suas manifestas contradições, que, alegadamente, as putativas condutas do autor eram já do conhecimento dos superiores hierárquicos deste último, durante o período em que o mesmo exercia funções de Coordenador.
Ora, o autor cessou as funções que desempenhava como Coordenador da Unidade Local ... no dia 10 de abril de 2017. Sucede que a nota de culpa lhe foi entregue no dia 28 de junho de 2017, ou seja, mais de sessenta dias depois de a Ré ter tomado conhecimento dos factos que diz terem ocorrido.
A Ré estava então sujeita ao referido prazo de 60 dias para instauração do processo disciplinar, conforme estipula o art.º 329, n.º 2, do Código do Trabalho. Esse prazo, na melhor das hipóteses para a Ré, iniciou-se no dia 11 de abril de 2017. pelo que se extinguiu no dia 9 de junho de 2017.
O autor invoca, pois, a exceção da prescrição, devendo também por tal motivo revogada e dada sem efeito a sanção aplicada.
Ademais, as imputações efetuadas ao autor pela ré, não incluiu factos concretos. Pelo contrário, verifica-se, pela análise da nota de culpa, que não foram identificados com o detalhe indispensável os factos que constituiriam a alegada infração, o que, por si só, determinaria que o procedimento fosse e seja arquivado. Acresce que não constaram igualmente da nota de culpa as circunstâncias em que as putativas infrações teriam sido supostamente praticadas.

Foi realizada audiência de partes.

Devidamente notificada a ré deduziu contestação.
Alegou, em síntese, que entre a Ré e o autor vigora um contrato de trabalho por tempo indeterminado desde 1 de julho de 2014, tendo antes disso, entre 1 de Abril de 2009 e 30 de Junho de 2014, exercido funções na Fundação A... em regime de Comissão de Serviço: a 1ª Comissão de Serviços sustentou o exercício de funções de Delegado da Região Norte de 1 de Abril de 2009 até 22 de Outubro de 2012, a 2ª Comissão de Serviços enquadrou o exercício das funções de Diretor da Agência ..., em acumulação com as anteriores funções, entre 11 de Fevereiro de 2011 e 22 de Outubro de 2012, e a 3ª Comissão de Serviço titulou o exercício das funções de Diretor da Agência ..., já sem acumulação de funções de Delegado da Região Norte, de 23 de Outubro de 2012 até 30 de Junho de 2014.
A passagem para os quadros da Ré em 1 de julho de 2014 deveu-se a acordo no 3º contrato de comissão de serviços, nos termos do qual aquando da cessação do mesmo o autor permaneceria ao serviço da Ré, sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico Adjunto de Grau I, Nível 4, escalão 2, acordo que foi cumprido nesses precisos termos, tendo o A passado a ter a referida categoria profissional até 30 de setembro de 2014.
Em 1 de Outubro de 2014 o autor foi promovido para a categoria profissional de Técnico Superior Estagiário, Nível 1, Escalão 1, tendo progredido nessa categoria profissional de Técnico Superior para o Grau I, Nível 1, Escalão 1 em 1 de janeiro de 2015, ou seja, para o nível e escalão máximo da referida categoria profissional de Técnico Superior. O autor mantém ainda hoje a referida categoria profissional de Técnico Superior de Grau I, Nível 1, Escalão 1.
Já enquanto parte dos quadros de pessoal da Ré, o autor exerceu, entre 20 de Julho de 2016 e 10 de Abril de 2017, as funções de Coordenador da Unidade Local ..., em regime de Comissão de Serviços, conforme aliás decorre do artº 9º nº 2 do Regulamento e Quadro de Pessoal da Ré (RQP), que o autor bem conhece e que se encontra legalmente aprovado e publicado (mas que em todo o caso se junta), e que expressamente determina que “Os cargos de Secretário-Geral, Diretor de Departamento e de Chefe de Divisão ou equiparado são exercidos em regime de comissão de serviço”.
Nunca foram elaborados acordos de comissão de serviço em regime de substituição. A expressão “regime de substituição” foi utilizada numa Comunicação Interna pelo Conselho de Administração por habituado ao Regime da Administração Pública, mas a referida figura jurídica não se aplica à Ré nem pode tal lapso originar uma figura legal nova no Código do Trabalho, esse sim aplicado à Ré.
Em 11 de Abril de 2017 terminou a referida Comissão de Serviços e o autor voltou ao seu anterior posto de trabalho, na Agência ....
Delegado de Região, Diretor de Agência e Coordenador de Unidade Local não são categorias profissionais, conforme resulta evidente do Quadro de Pessoal da Ré em Anexo ao respetivo regulamento. São, sim, cargos dirigentes que podem ser exercidos – sempre em regime de comissão de serviços, como se viu – por um trabalhador cujas habilitações e categoria profissional (no caso de ser funcionário da própria Ré) o habilitem a tal, e cujo desempenho em cada momento decorre de decisão que só ao CA compete, no exercício dos seus poderes de direção.
Assim sendo, o autor não adquiriu o direito de permanecer para sempre no cargo de Coordenador da Unidade Local ..., o qual não corresponde a nenhuma categoria profissional, tendo o exercício das respetivas funções sido determinado pelo CA enquanto considerou serem as que se justificavam serem exercidas pelo autor, considerando uma estratégia geral de distribuição de tarefas pelos vários trabalhadores da Ré, e considerando que tais funções eram, naquela altura, adequadas às suas aptidões e qualificação profissional, sendo o CA inteiramente livre de encarregar os trabalhadores de diferentes funções, enquanto permanecem ao seu serviço, desde que tais funções correspondam à categoria profissional do trabalhador ou lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas.
Nos termos previstos no RQP, o conteúdo funcional da categoria profissional do autor é o seguinte: TÉCNICO SUPERIOR: exerce fundamentalmente funções consultivas e de conceção que requerem um elevado grau de qualificação. Elabora pareceres, efetua estudos e projetos, concebe e adapta métodos e processos cientifico-técnicos do âmbito da sua especialização, com vista à tomada de decisão. - Pode supervisionar funcionalmente equipas de trabalho ou de projeto.
Pelo que, pese embora o autor pretenda exercer apenas funções de supervisão (pretende chefiar, por força), facto é que, nem contratualmente, nem legalmente, lhe compete exercer necessariamente e para sempre as funções de Coordenador nem é exigível à Ré que o mantenha nessas funções.
É verdade que o autor recebeu durante a 3ª comissão de serviço (que formalizou o exercício das funções de Diretor da Agência ..., já sem a acumulação com as anteriores funções, entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014) uma ajuda de custo para compensar as deslocações entre o Porto e Braga, conforme previsto na reunião de 19.10.2012.
Com efeito, embora nada se diga no respetivo contrato de Comissão de Serviço, o que foi determinado é que o autor, a partir de então, enquanto exercesse as funções de Diretor na Agência ..., teria direito a receber o valor das deslocações em viatura própria, nos dias úteis, do Porto para Braga e vice-versa, conforme decorre da referida ata, que determina que tal pagamento se fará “No exercício das funções em Braga” (leia-se, das funções de diretor de agência para as quais acabava de ser nomeado). Consequentemente, com a cessação das referidas funções de diretor de agência ..., em 30 de Junho de 2014 (final da 3ª Comissão de Serviços), também terminou o pagamento da referida Ajuda de Custo.
Nos acordos de comissão de serviço prevê-se efetivamente que o trabalhador está sujeito a isenção de horário de trabalho, por não estar sujeito ao limite máximo do período normal de trabalho. Não há, contudo, lugar ao pagamento em separado da compensação prevista no artº 265º CT, não porque o trabalhador tenha prescindido de a receber, nos termos do artº 265º nº 2 CT, mas sim porque se encontra já incluída na retribuição paga ao trabalhador. Com efeito, e ao abrigo do estipulado no Anexo II do RQP, que se encontra legalmente aprovado e publicado, e que o A conhece, os vencimentos (índices retributivos) dos cargos exercidos em regime de comissão de serviços (cargos dirigentes) incluem o complemento do IHT.
Foram atribuídas e pagas ao autor despesas de representação enquanto este exercesse funções de Coordenador. Trata-se de um montante que permite ao dirigente custear os próprios gastos inerentes à dignidade da função representativa que exerce, neste caso para representar com dignidade a Fundação A... perante as exigências sociais, não podendo esta socorrer-se de outros meios para cobrir tais gastos porquanto não existem pagamentos das “despesas de representação” contra faturas que a Ré aceite nos seus usos. Tratam-se, pois, de despesas de representação de natureza compensatória pois que, apesar de serem atribuídas de forma regular, contínua e periódica, assumem natureza compensatória, pois foram atribuídas a título de compensação aos dirigentes pelos gastos acrescidos que a dignidade do cargo impõe.
Em abril de 2017 foi efetuado o pagamento das despesas de representação por inteiro. Contudo, em maio do mesmo ano, foi recalculado o valor e realizado o encontro de contas que correspondeu ao pagamento de despesas de representação respeitantes a 10 dias do mês de Abril. Igualmente, e considerando que o termo da comissão de serviço foi em 10.04.2017, também em Maio foram pagos 30 dias referentes ao incumprimento do aviso prévio para cessação da comissão de serviços, que a Ré admite não ter cumprido, pese embora tal incumprimento não obste a que a Comissão de Serviços termine, nos termos previstos no artº 163º nº 2 CT. Com o fim do exercício das referidas funções de Coordenador, seja por cessação da Comissão de Serviço, seja por alteração das funções atribuídas ao trabalhador no âmbito da faculdade que é conferida ao CA pelo artº 118º CT, cessou também em 10 de abril de 2014 o direito de o trabalhador continuar a auferir a referida despesa de representação.
O autor já foi colocado de novo a trabalhar num gabinete, não porque o seu cargo o imponha, mas porque se recusou terminantemente a cumprir todas as ordens que lhe foram dadas enquanto esteve colocado na sala com outros colegas, portanto a sua superior hierárquica (BB, como absolutamente todos lhe chamam, e não BB, como o autor insiste em chamá-la, claramente com vista a achincalhá-la, bem sabendo que não é assim que se chama nem por esse nome que é conhecida) acabou por decidir reconduzi-lo a um gabinete onde pelo menos não incomoda os colegas com a sua atitude e postura.
Ora, o autor já não é coordenador (cargo que é exercido hoje pela referida BB, razão aliás porque o autor lhe tem tanta e tão indisfarçável hostilidade), e, portanto, não lhe são atribuídas as funções de chefia que pretende, mas que não lhe competem, sendo antes sim Técnico Superior. É o autor quem se recusa a cumprir todas as ordens que lhe são dadas e todas as funções que lhe são distribuídas, sempre com o argumento de que tais funções não são da sua competência, porque apenas deve exercer funções de supervisão.
O próprio trabalho de encerrar files (confirmar e encerrar processos de viagens ou ações levadas a cabo pela Unidade), função que compete a um Coordenador ou Diretor de loja e que a Coordenadora tentou delegar no autor, ao fim de algum tempo foi também recusado pelo autor, com o argumento da sua simplicidade.
O autor não foi obrigado a usar uniforme. Ninguém monitoriza as idas do autor ao quarto de banho. Apenas se anotam as entradas e saídas (manhã, almoço e tarde) e também todos reparam que o autor se ausenta normalmente todas as manhãs e outra vez todas as tardes para tomar um café, sem dar qualquer justificação a ninguém e muitas vezes prolongando a saída por mais de meia hora.
A única reação da Ré ao comportamento do autor foi a abertura de um processo disciplinar, que agora o autor vem impugnar, e ultimamente de um segundo processo disciplinar, pelas razões constantes da Nota de Culpa aqui junta e que se dá por reproduzida, encontrando-se este último em fase instrutória.
O processo disciplinar a que o autor se refere tem por objeto a violação do dever de registar o livro de ponto por parte do autor, e da não justificação das faltas (nomeadamente às 4ªs feiras, em que sistematicamente faltava sem justificar), e terá culminado com a aplicação da sanção disciplinar de repreensão registada, por se ter dado como provado os factos.
A sanção disciplinar foi aplicada com total cumprimento do estabelecido nos artºs 328º a 332º CT, e com salvaguarda dos direitos do trabalhador quanto à sua audição prévia prevista no artº 329º nº 6 CT e quanto à notificação ao trabalhador da decisão final. Ademais, a sanção aplicada (a 2ª mais leve prevista na legislação laboral) não pode ser considerada desproporcional à gravidade da infração, a não ser por defeito.
Finalmente, e como também consta claramente do relatório final, não se verificou a caducidade alegada por interrupção do prazo do artº 329º CT em virtude do inquérito prévio aí referido, nos termos do disposto no artº 352º CT.

O autor apresentou resposta.
Alegou que é totalmente falso que a retribuição específica pela isenção de horário de trabalho estivesse incluída naquilo que era pago, nunca tendo sido acordado ou sequer sugerido que o autor não receberia a retribuição pela isenção de horário de trabalho.
Por outro lado, não foi a Ré capaz de referir por quem, de que forma e quando foi aprovado o RQP a que se refere, nem quando e onde foi publicado. A Fundação A... nunca fez aprovar e publicar qualquer regulamento interno. O regulamento invocado e junto pela Ré aos autos dizia respeito a um instituto público: A.... Sucede que o referido instituto foi extinto pelo mesmo diploma que criou a Fundação. Com a extinção do instituto, mesmo no caso de o regulamento alguma vez ter existido, é manifesto que o mesmo extinguiu então os seus efeitos. Constata-se assim que, quando o autor foi admitido ao serviço da Ré, o citado regulamento, a ter existido, já não produzia quaisquer efeitos desde o dia 1 de julho do ano anterior. Mesmo que por absurdo se admitisse que o regulamento poderia ter transitado do instituto público para a fundação privada no que se refere às relações entre a Ré e os seus trabalhadores então ao serviço, ainda assim seria sempre insuscetível de ser aplicado ao autor, tendo em conta a sua admissão ulterior.
Mesmo que o regulamento tivesse sido regularmente aprovado e publicado pela Ré, já enquanto Fundação, e em consequência aplicado genericamente à relação laboral entre autor e Ré – o que não se concede -, ainda assim não poderia o mesmo determinar a diminuição de quaisquer direitos do autor. Com efeito, estando o autor vinculado à Ré através de contrato celebrado ao abrigo do regime jurídico do contrato individual do trabalho, nunca um regulamento interno poderia afastar em prejuízo do trabalhador qualquer direito deste em matéria de retribuição.
A Ré deduziu também exceção quando sustentou o detalhe de que as ajudas de custo pagas ao autor por força das deslocações para Braga, apenas eram devidas pelo facto de este exercer as funções de Diretor na Agência da referida cidade de Braga.
Em primeiro lugar, constata-se que, conforme está expressamente exarado na ata da reunião do Conselho de Administração da Ré que o autor juntou aos autos, a decisão de proceder a esse pagamento foi motivada pelas deslocações que este estava obrigado a fazer entre casa e o trabalho e por razões legais. Sucede que nenhum preceito legal impunha ou impõe que o exercício de funções de direção determinasse ou determine o pagamento de ajudas de custo. Tais ajudas de custo foram pagas porque o autor vivia no Porto e trabalhava em Braga.
Acresce por outro lado que, como é sabido, o autor voltou a exercer funções de Diretor da Agência ... entre 20 de julho de 2016 e 10 de abril de 2017 e continuou a residir no Porto durante esse período de tempo. Não obstante, a Ré não pagou ao autor qualquer verba a título de ajudas de custo no decurso dos meses em causa.
Termina o autor pedindo a condenação da ré como litigante de má-fé.” (realce e alteração do tamanho de letra nossos)

Foi realizada a audiência de julgamento.
Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julga-se a presente ação improcedente e, em consequência, absolve-se a ré dos pedidos formulados nas alíneas a) a j) da petição inicial.
Decide-se ainda julgar extinta a instância quanto ao pedido formulado na alínea k) por inutilidade superveniente da lide.
Custas pelo autor.”

Inconformado com essa decisão, o Autor apresentou recurso de apelação, pedindo a procedência do recurso, em consequência revogando-se a sentença recorrida.
Terminou com as seguintes conclusões:
“I. A decisão de que se recorre é a proferida no âmbito do Proc. n.º 13469/18.8T8PRT, que correu os seus termos no Juiz 3 do Juízo do Trabalho do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, com a referência 438676207.
II. O recurso restringe-se às seguintes questões da decisão recorrida:
a) O pedido do Autor de que a Ré fosse condenada a pagar-lhe determinadas importâncias a título de retribuição pela isenção de horário de trabalho;
b) O pedido do Autor de que a Ré fosse condenada a pagar-lhe determinadas importâncias a título de ajudas de custo;
c) O pedido do Autor de que a Ré fosse condenada a pagar-lhe diferenças salariais respeitantes a retribuições complementares devidas e não pagas.
III. São fundamentos da recorribilidade a contradição entre a prova produzida no processo e em julgamento e os factos dados como provados e a errada aplicação do Direito a estes.
IV. A sentença considerou como provado que no período compreendido entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 o Recorrente exerceu para a Recorrida o cargo de delegado regional da Região Norte, em regime de comissão de serviço, sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
V. Considerou ainda que existia em vigor na Recorrida um Regulamento aprovado por despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991, que previa que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho, e que o Recorrente conhecia tal Regulamento.
VI. Sucede que não foi junto aos autos nenhum contrato de comissão de serviço para este período (ao contrário do que sucedeu para períodos posteriores) e, nos termos do art.º 162º, n.º 4 do Código do Trabalho, “Não se considera em regime de comissão de serviço o contrato que não tenha a forma escrita”.
VII. Pelo que não bastava a existência de uma deliberação do conselho de administração da Recorrida (como a que se dá por provada sob o Facto n.º5), de nomear o Recorrente para o referido cargo em regime de comissão de serviço, já que tal deliberação não constitui um acordo com o trabalhador (de resto, alheio à mesma) nem se substitui a tal acordo, legalmente necessário para a instituição de uma comissão de serviço.
VIII. Não tendo sido junto aos autos qualquer contrato de comissão de serviço entre Recorrida e Recorrente, impunha-se julgar que o que os vinculou entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 foi tão-só um contrato de trabalho.
IX. Ao abrigo desse contrato de trabalho, foi acordado entre as partes o regime de isenção de horário de trabalho, sem que o Recorrente possa ser prejudicado por não o ter sido por escrito, já que tal ónus impendia sobre a entidade empregadora, conforme é pacificamente entendido pela jurisprudência.
X. O despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991 que supostamente aprovou o Regulamento que alegadamente previa que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço na Recorrida incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho não está junto aos autos, nem sequer disponível na internet, nem o Tribunal referiu na fundamentação da sentença tê-lo consultado.
XI. Pelo que não é possível concluir que a referida disposição - de que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço na Recorrida incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho - existe.
XII. Para além disso, nos termos do artigo 70º do Decreto-Lei n.º 61/89, de 23 de fevereiro, que aprovou os Estatutos do A..., “carecem de aprovação, por despacho do Ministro da Tutela [o Ministro do Emprego e da Segurança Social, cfr. art.º 3º do mesmo diploma] o regulamento e o quadro de pessoal do A....” (cfr. al. a) do art.º 70º), pelo que o secretário de Estado do Emprego e formação profissional nem sequer tinha competência para emitir o despacho em causa, a não ser no âmbito da delegação de poderes – que não está provado que tenha existido, de forma válida, já que não se conhece o referido despacho.
XIII. Acresce ainda que a prova relativa à existência do despacho e do regulamento que o mesmo aprovou tinha de ser feita documentalmente, nos termos do n.º 2 do art.º 393º do Código Civil, já que se trata de um facto que seria plenamente provável por documento.
XIV. Pelo que a Recorrida tinha de ter feito prova documental da existência do despacho, juntando-o aos autos, sem o que o Tribunal não podia ter considerado provada a existência do mesmo nem dessa existência ter extraído quaisquer consequências.
XV. De qualquer forma, mesmo que estivesse provada a existência do despacho e, por decorrência, do regulamento (que supostamente previa que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço na Recorrida incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho), o certo é que o Recorrente não desempenhou as suas funções ao serviço da Ré entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 ao abrigo de nenhuma comissão de serviço, uma vez que não foi celebrado qualquer contrato escrito nesse sentido.
XVI. E ainda, mesmo que existisse tal despacho (e tal regulamento pelo mesmo aprovado), a respetiva disposição de que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho sempre seria nula, por ilegal, uma vez que estando o A. vinculado à Ré através de contrato celebrado ao abrigo do regime jurídico do contrato individual do trabalho, nunca um regulamento interno poderia afastar em prejuízo do trabalhador qualquer direito deste em matéria de retribuição, sendo que o artigo 265º do Código do Trabalho tem natureza imperativa.
XVII. Pelo que a sentença recorrida é nula nesta parte, por violação do disposto no art.º 162º, n.º 4 do Código do Trabalho, no n.º 2 do art.º 393º do Código Civil e no art.º 265º do Código do Trabalho, devendo ser substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente a retribuição devida pela isenção de horário de trabalho a que aquele esteve sujeito no período compreendido entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012.
XVIII. Após tal período, o Recorrente celebrou efetivamente com a Recorrida um contrato de comissão de serviço para o exercício do cargo/funções de Diretor da Agência ..., que vigorou entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014 e no qual foi acordado, por escrito, o regime de isenção de horário de trabalho, na modalidade de não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho, sem que a Recorrida lhe tenha pago qualquer montante a título de retribuição pela IHT nesse período.
XIX. Dão-se aqui por reproduzidos os argumentos anteriormente expendidos relativamente à falta de prova da existência do despacho (e, consequentemente, do regulamento supostamente aprovado pelo mesmo) e também da nulidade e consequente inaplicabilidade de qualquer disposição constante do mesmo que dispusesse em sentido menos favorável para o trabalhador numa matéria imperativa.
XX. Pelo que também nesta parte é a sentença recorrida nula, por violação do disposto no n.º 2 do art.º 393º do Código Civil e no art.º 265º do Código do Trabalho, devendo pois ser substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente a retribuição devida pela isenção de horário de trabalho a que aquele esteve sujeito no período compreendido entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014.
XXI. Acresce ainda que a convicção formada pelo Tribunal no sentido de que o Recorrente conhecia o Regulamento e o aceitou por ter subscrito um contrato de comissão de serviço que para o mesmo remetia, de acordo com regras de experiência comum, se afigura mal formada, porque pelo contrário o que as regras de experiência comum nos dizem é que a generalidade dos trabalhadores, por precisar de trabalhar, assina os contratos de trabalho (ou de comissão de serviço, no caso) conforme lhes são apresentados pelas entidades empregadoras, confiando que respeitam as disposições legais aplicáveis.
XXII. Para além disso, na formação de tal convicção, o Tribunal desconsiderou a prova feita em julgamento pelo depoimento da testemunha EE, do qual resultou que o Recorrente desconhecia efetivamente o Regulamento e respetivas disposições relativas à retribuição pela isenção de horário de trabalho,
XXIII. desconsiderando igualmente que resultou do depoimento da testemunha FF, que desempenha um cargo dirigente ao serviço da Recorrida, que nem os titulares destes cargos têm a perceção de que não têm direito à retribuição pela isenção de horário de trabalho por via do Regulamento.
XXIV. A sentença deu como provado que em 19/10/2012 a Recorrida deliberou nomear o Recorrente como Diretor da Agência ..., e que na mesma ata em que a Recorrida deliberou tal nomeação, deliberou também que “(…) No exercício de funções em Braga e por razões legais o Sr. Eng. AA terá direito a receber deslocações em viatura própria nos dias úteis do Porto para Braga e vice-versa.”
XXV. No seguimento do que Recorrente e Recorrida celebraram efetivamente, em 22/10/2012, um acordo de comissão de serviço ao abrigo do qual aquele desempenhou ao serviço desta as funções inerentes ao cargo de Diretor da Agência ..., no período compreendido entre 22 de Outubro de 2012 e 30 de junho de 2014.
XXVI. Em tal acordo, ficou previsto que o local de trabalho do Recorrente durante a comissão de serviço contratada seria a Agência da Recorrida em Braga
XXVII. e que, se e quando a comissão de serviço cessasse, o trabalhador permaneceria ao serviço da Recorrida, com a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
XXVIII. A sentença considerou provado que durante o tempo que durou essa comissão de serviço a Recorrida pagou ao Recorrente as ajudas de custo respeitantes às deslocações em viatura própria entre o Porto e Braga e vice-versa, ao valor por km previsto para os trabalhadores em funções públicas e que após 30 de junho de 2014, data em que por comunicação da Recorrida cessou a comissão de serviço, deixou de as pagar, apesar de o Recorrente ter continuado a exercer funções em Braga, desta feita com a categoria de Técnico Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
XXIX. Considerou a sentença que a Recorrida não tinha de pagar ajudas de custo ao Recorrente a partir de 01 de julho de 2014, por falta de fundamento legal para o efeito, uma vez que a partir daí passou a ser trabalhador da Recorrida com a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, escalação 2, sendo o seu local de trabalho – aceite pelo mesmo – a agência ..., e que o pagamento das ajudas de custo apenas foi deliberado pela Recorrida para o período de tempo que durasse a comissão de serviço, pelo que, cessando a mesma, cessou também o fundamento para o pagamento das ajudas de custo.
XXX. Ora, o fundamento para o pagamento de ajudas de custo nunca reside na categoria profissional do trabalhador, e sim no facto de este ter de suportar despesas na realização da sua atividade ao serviço da entidade empregadora, nomeadamente com deslocações.
XXXI. Pelo que, mantendo-se o Recorrente a desempenhar, ao serviço da Recorrida, funções que implicavam que se deslocasse diariamente entre Porto e Braga, é manifesto que tinham de lhe ser pagas por esta as respetivas ajudas de custo.
XXXII. O Recorrente não acordou na alteração do seu local de trabalho para Braga após a comissão de serviço: tal local de trabalho ficou apenas definido no contrato de comissão de serviço mediante o qual o Recorrente aceitou exercer funções como Diretor da agência ... e, portanto, para o período correspondente ao exercício dessas funções.
XXXIII. O facto de se ter estabelecido a atividade e categoria profissional do Recorrente quando cessasse a comissão de serviço visava dar cumprimento ao n.º 3 do art.º 162º e ao art.º 164º do Código do Trabalho, não podendo significar que a tal atividade seriam aplicáveis as restantes condições acordadas no contrato de comissão de serviço.
XXXIV. Anteriormente à celebração do contrato de comissão de serviço, e desde a sua admissão ao serviço da Recorrida, o local de trabalho do Recorrente foi sempre o Porto, sendo legalmente legítima e fundada a sua expectativa de que, cessando o contrato de comissão de serviço celebrado para aquele cargo de Diretor da agência ... - necessariamente a desempenhar em Braga - voltaria a desempenhar a sua atividade ao serviço da Recorrida no local inicial da execução do seu contrato, uma vez que nada foi previsto no contrato de comissão de serviço para o período seguinte ao da sua cessação.
XXXV. Pelo que, cessando a comissão de serviço, que deveria ser exercida em Braga, e não tendo o Recorrente regressado ao seu local de trabalho anterior (o Porto), é forçoso entender que a Recorrida determinou unilateralmente que o Recorrente exerceria as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2 em Braga.
XXXVI. Pelo que, ao ter de se deslocar do Porto para Braga a partir de 01 de julho de 2014), o Recorrente tinha o direito a receber ajudas de custo por cada deslocação.
XXXVII. A esse propósito, o Tribunal não considerou provado que entre a residência do Recorrente e a agência da Recorrida em Braga a menor distância possível fosse de 54,5km, por não ter sido feita qualquer prova concreta disso nos autos, mas esta não é matéria sujeita a prova, nos termos do art.º 412º do CPC, pois trata-se de um facto notório, porque é do conhecimento geral.
XXXVIII. Pelo que a sentença recorrida deverá ser revogada na parte que julgou improcedente o pedido de pagamento de ajudas de custo pelo Recorrente, sendo substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente ajudas de custo por cada dia útil de trabalho que prestou a partir de 01 de julho de 2014 (deduzidos, pois, os fins de semana, feriados e 22 dias úteis de férias em cada ano) até à data em que cessou a relação laboral que o vinculava à Ré, correspondentes a 109 km x 0,36 € por km, por cada dia útil de trabalho.
XXXIX. Mesmo que assim não se entendesse, e que vingasse o entendimento do Tribunal a quo de que o fundamento para o pagamento de ajudas de custo no período anterior fora o desempenho da atividade pelo Recorrente em regime de comissão de serviço, então sempre seria forçoso condenar a Recorrida a pagar ajudas de custo pelo menos no período compreendido entre 20 de julho de 2016 e 10 de abril de 2017, em que o Recorrente desempenhou as funções de Coordenador da Unidade Local ..., tendo a sentença entendido que o fez em regime de comissão de serviço.
XL. A sentença deu como provado que entre 20 de julho de 2016 e 10 de abril de 2017 o Recorrente exerceu as funções de Coordenador da Unidade Local ..., tendo recebido durante esse período o montante de €518,81 mensais a título de “despesas de representação”.
XLI. A sentença considerou que o exercício daquelas funções foi feito em regime de comissão de serviço, por força do já referido Regulamento do A..., que prevê que todos os cargos dirigentes são exercidos nesse regime.
XLII. Como já se referiu, não foi feita nos autos prova da aprovação e, portanto, da validade e eficácia desse Regulamento, pelo que desde logo não poderia ter-se considerado aplicável essa disposição, sendo forçoso julgar que não existiu qualquer comissão de serviço para esse período.
XLIII. Mas, mais ainda, também desta vez não foi celebrado entre Recorrente e Recorrida qualquer contrato de comissão de serviço para o exercício de tal cargo, ao arrepio do que impõe o n.º 4 do art.º 162º do Código do Trabalho.
XLIV. O que tem de significar que o exercício das funções de Coordenador da Unidade Local ... pelo Recorrente foi feito ao abrigo do contrato de trabalho que o vinculava à Recorrida, consubstanciando pois, indubitavelmente, uma promoção (independentemente de os recibos de vencimento do Recorrente não terem sido atualizados em conformidade pela Recorrida, o que não tem a virtualidade de provar o que quer que seja).
XLV. Não se pode julgar que houve qualquer declaração negocial tácita do Recorrente, de forma automática, no sentido de aceitar a proposta negocial da Ré, que se traduzia no desempenho de funções de chefia em regime de comissão de serviço, só pelo facto de existir um suposto Regulamento (cuja aprovação não está comprovada nos autos) que o previa!
XLVI. A sentença recorrida é nula por mais uma vez violar o disposto no n.º 4 do art.º 162º do Código do Trabalho, desconsiderando que aquele impõe a forma escrita para a celebração do contrato em comissão de serviço, e não retirando quaisquer consequências do seu incumprimento pela Recorrida.
XLVII. O exercício das funções de Coordenador da Unidade Local ... foi feito ao abrigo do contrato de trabalho que vinculava o Recorrente à Recorrida, não tendo sido estipulado por período temporário, pelo que consubstanciou uma verdadeira promoção, sendo, pois, vedado à Recorrida mudar posteriormente o Recorrente para categoria inferior sem o seu acordo (que aquele não deu).
XLVIII. Ao decidir em contrário, a sentença violou o disposto nos artigos 119º e na al. e) do art.º 129º do Código do Trabalho.
XLIX. Em consequência, o Recorrente tinha direito a auferir o montante mensal de €518,81 que lhe era pago pelo exercício das funções de Coordenador da Unidade Local ... até ao final da relação laboral que manteve com a Recorrida, sendo irrelevante a caraterização do referido montante a partir do momento em que está provado que era devido pelo exercício daquelas funções pelo Recorrente, que não podiam ter-lhe sido retiradas.
L. Pelo que se impõe alterar em conformidade a matéria de facto provada e não provada e substituir a sentença proferida por outra que condene a Recorrida nos pedidos feitos pelo Recorrente nas alíneas a), b), c), d), g), e h) da petição inicial, bem como os correspondentes juros de mora, revendo as custas a pagar a final pelo Recorrente em proporção do seu real decaimento, como é de DIREITO e JUSTIÇA!”

A Entidade empregadora não apresentou contra-alegações.

Os autos, uma vez chegados a esta Relação foram presentes ao Digno Procurador Geral Adjunto, nos termos e para os efeitos do artigo 87º, nº3, do Código de Processo do Trabalho, o qual emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, no qual se lê:
“A Recorrente impugna a matéria de facto e subsequente decisão de direito.
*
2. Da leitura da sentença e alegação do Recorrente, entende-se, salvo melhor opinião, que lhe assiste razão.
Na verdade, atento o disposto no art.º 164º, n.º 4, do CT, “não se considera em regime de comissão de serviço o contrato que não tenha a forma escrita ou que falte a menção referida na al. b) do número anterior” (indicação do cargo ou funções a desempenhar, com menção expressa do regime de comissão de serviço).
Faltando este requisito não pode considerar-se a prestação de trabalho em regime de comissão de serviço, nem o regime legal previsto para esta.
Depois é referido o Despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991, sem que, aparentemente, fosse junto aos autos e pudesse ser confirmada a orientação referida. Não sendo junto, não poderia ser considerado.
Ainda, tem o trabalhador direito a, “cessando a comissão de serviço, caso se mantenha ao serviço da empresa, a exercer a atividade desempenhada antes da comissão de serviço, ou a correspondente à categoria a que tenha sido promovido ou, ainda, a factividade prevista no acordo a que se refere a alínea c) ou d) do n.º 3 do artigo 162º”, o que, salvo melhor opinião pressupõe também o mesmo local de trabalho anterior.
Assim não acontecendo deverá o trabalhador ter direito a receber o montante das despesas feitas com a deslocação, ou ajudas de custo.
Acompanhamos, pois, a alegação e conclusões do trabalhador, devendo, por isso, proceder o recurso.
*
3. Pelo que, ressalvando sempre diferente e melhor opinião, se emite parecer no sentido de que deveria conceder-se provimento ao recurso.”

Respondeu a Ré/Apelada nos seguintes termos:
“1. Afirma o Dmo Procurador que da leitura da sentença e alegação do recorrente entende que lhe assiste razão, e que deve portanto conceder-se-lhe provimento ao recurso.
2. Lendo porém o referido Parecer, não indica nas suas frugais 2 páginas absolutamente qualquer razão para considerar procedente o recurso do Recorrente nos seus diversos, todos eles ilustremente e detalhadamente analisados e refutados pelo Mmo Juiz a quo nas suas 37 páginas, salvo apenas um único deles: o de que a última nomeação do Recorrente para as funções de Coordenador, entre Julho de 2016 e abril de 2017 não terão sido em regime de Comissão de Serviço por tal não constar de acordo escrito entre as partes, parecendo entender que o Recorrente teria por isso o direito a continuar em permanência a exercer o cargo de chefia em causa.
3. Ora, salvo o devido respeito, e como bem esclareceu o Mmo Juiz a quo, neste caso não era necessário formalizar por escrito a Comissão de Serviço pois que o Regulamento da Recorrida, aprovado pelo Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional, expressamente prevê que os seus cargos de chefia são sempre exercidos em regime de comissão de serviço, pelo que o C. do Trabalho, que se aplica às relações laborais supletivamente apenas em caso de omissão do Regulamento e dos Estatutos, não tem aqui aplicação na parte em que apenas admite existir comissão de serviço quando expressa e formalmente acordada.
4. Por outro lado, e como também claramente foi confirmado pela douta sentença recorrida, o cargo de Coordenador não é uma categoria profissional, pelo que não se lhe ascende por progressão na carreira nem por promoção, sendo exclusivamente exercido por nomeação (em comissão de serviço, como se viu) e, como cargo de chefia que é, por período forçosamente limitado ao tempo em que a cada momento a Administração (também ela mandatada por períodos limitados, pelo Governo) assim entenda.
5. Pretender que uma pessoa possa ter o direito vitalício a um lugar de chefia numa estrutura como a Fundação A..., ao arrepio dos seus Estatutos (aprovados por DL) e do seu Regulamento (aprovado pelo membro do Governo com a sua tutela) seria ilegal e abusivo.
6. Quanto a não ter sido junto aos autos o Despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do emprego e da Formação Profissional, que aprovou o regulamento e Quadro de Pessoal da Recorrida, como é sabido não é exigível às partes que façam prova de lei nem prova de atos publicados em Diário da República (no caso na II Série), pois a publicação serve justamente para tornar público o ato. Em todo o caso, os autos contêm a prova do regulamento da Recorrida, da sua aprovação e da sua divulgação a fls. 86 e seguintes e a fls 133.
7. Quanto à afirmação de que cessando a comissão de serviço, caso o trabalhador se mantenha na empresa, tem o direito de voltar a exercer a atividade desempenhada antes da comissão de serviço, e de que tal pressupõe o mesmo local de trabalho anterior, a Recorrida humildemente discorda, sendo amplamente aceite que o retorno garantido não tem de ser para o mesmíssimo posto de trabalho mas sim para a mesma categoria e o mesmo tipo de funções. Trata-se contudo de discussão inútil nos autos pois o facto é que o Recorrente aquando do final da comissão de serviços retornou às funções que exercia e ao local onde as exercia antes do seu início: em Braga.
8. Finalmente, tendo ficado demonstrado e assente que as despesas de representação e as ajudas de custo que recebeu estavam exclusivamente ligadas às funções de chefia e não ao local de trabalho, deixaram de ser devidas quando as referidas funções deixaram de ser exercidas – como todos os seus colegas com funções de chefia, tal como se demonstrou nos autos.
Termos em que deve o recurso intentado pelo Autor e ora Recorrente ser considerado improcedente por não provado e em consequência confirmada a douta sentença recorrida,
Assim se fazendo JUSTIÇA!”

Foram colhidos os vistos legais.

Objeto do recurso:
Tendo em conta as conclusões formuladas pelo Recorrente, são as seguintes as questões nele suscitadas:
- impugnação da matéria de facto;
- nulidade da sentença;
- retribuição pela isenção de horário de trabalho a que aquele esteve sujeito no período compreendido entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 e no período compreendido entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014;
- ajudas de custo;
- diferenças salariais respeitantes a retribuições complementares.

3. Fundamentação:
3.1. Fundamentação de facto:
3.1.1. Foi esta a decisão de facto proferida na sentença recorrida (em realce e noutro formato de letra a matéria alterada em conformidade com o decido infra):
“Com interesse para a decisão resultaram provados os seguintes factos:
1. A ré foi instituída pelo Estado Português através do DL n.º 106/2008, de 25/6, que também extinguiu o A..., I. P.
2. Nesse diploma, que entrou em vigor em 1 de julho de 2018, ficou previsto que “até à entrada em vigor de novos regulamentos da Fundação A..., mantêm-se em vigor os regulamentos aprovados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei 61/89, de 23 de fevereiro”.
3. O regulamento e quadro de pessoal cuja cópia se encontra junta a fls. 86 e seguintes fora aprovado por despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991.
4. A direção do A..., I. P. proferiu a Ordem de serviço n.º ... datada de 22 de agosto de 1991 cuja cópia se encontra junta a fls. 133 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
5. O conselho de administração da ré deliberou em 26 de março de 2009 nomear o autor para o cargo de delegado regional da Região Norte a partir de 1 de abril de 2009 em regime de comissão de serviço.
Alterado para:
5. O conselho de administração da ré deliberou em 26 de março de 2009 nomear o autor para o cargo de delegado regional da Região Norte a partir de 1 de abril de 2009.
6. O autor conhecia o Regulamento Quadro de pessoal mencionado em 3 e sabia que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho.
7. A partir de 1 de abril de 2009 o autor passou a exercer para a ré as funções de delegado da Região Norte.
8. O autor exercia essas funções na agência do Porto, sem prejuízo das respetivas deslocações em serviço a outras delegações da ré.
9. Como contrapartida do exercício de tais funções foi acordado que o autor auferiria uma retribuição base ilíquida no montante de €2.100,00.
10.Foi fixado entre as partes um período de trabalho diário de 7 horas e um período de trabalho semanal de 35 horas.
11.Foi, também, ajustado entre as partes que, no exercício da referida comissão de serviço, o autor ficaria sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
Alterado para:
11. Foi, também, ajustado entre as partes que o autor ficaria sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
12.Entre 11 de fevereiro de 2011 e 22 de outubro de 2012 o autor exerceu cumulativamente as funções de Diretor da agência ... em regime de comissão de serviço.
13.As referidas comissões de serviço terminaram em outubro de 2012.
14.Durante todo o tempo (entre 11 de fevereiro de 2011 e 22 de outubro de 2012) em que o autor exerceu essa comissão de serviço, a ré pagou ao autor a remuneração base ilíquida de 2.100,00 euros.
15.No dia 19 de outubro de 2012 foi deliberada pela ré a nomeação do autor, em regime de comissão de serviço, como Diretor da Agência ....
Alterados para:
12.Entre 11 de fevereiro de 2011 e 22 de outubro de 2012 o autor exerceu cumulativamente as funções de Diretor da agência ....
13.As referidas funções terminaram em outubro de 2012.
14.Durante todo o tempo, entre 11 de fevereiro de 2011 e 22 de outubro de 2012, a ré pagou ao autor a remuneração base ilíquida de 2.100,00 euros.
15.No dia 19 de outubro de 2012 foi deliberada pela ré a nomeação do autor como Diretor da Agência ....
16.Na ata em que consta essa deliberação a ré fez constar que “ao cessar funções de coordenador regional das Agências da Região Norte, do Sr. Eng. AA e uma vez que esta exercia funções na Agência ..., foi deliberado nomeá-lo diretor desta Agência, com a remuneração equivalente a qualquer outro diretor que não seja trabalhador da A..., no caso de 1.000,00 euros por mês e caso cesse esta Comissão de Serviço ficará com a categoria de Técnico-adjunto de Grau I, Nível 4, escalão 1, a que corresponde a remuneração ilíquida de 839,53 euros. No exercício de funções em Braga e por razões legais o Sr. Eng. AA terá direito a receber deslocações em viatura própria nos dias úteis do Porto para Braga e vice-versa.”
17.No dia 22 de outubro de 2022 o autor e a ré subscreveram o “acordo de comissão de serviço” cuja cópia se encontra junta a fls. 21 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando desse acordo designadamente que:
1. O TRABALHADOR desempenhará em regime de comissão de serviço, funções de Diretor da Agência ... dependente do Administrador do pelouro (…)
2. O TRABALHADOR auferirá a retribuição mensal base correspondente ilíquida de €1.000,00 (…)
3. As partes acordam no estabelecimento do regime de isenção de horário de trabalho ao abrigo do disposto no artigo 218.º do código do Trabalho e na modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 219.º
4. (…) Após a cessação da comissão de serviço, o trabalhador permanecerá ao serviço da A..., sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
5. (…) Nos casos omissos, aplicar-se-á o disposto no Código do Trabalho e na legislação especial que o complementa ou regulamenta, bem como no Regulamento e Quadro de Pessoal e Ordens de Serviço em vigor no A....”
Alterado para:
17. No dia 22 de outubro de 2012, o autor e a ré subscreveram o “acordo de comissão de serviço” cuja cópia se encontra junta a fls. 21 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando desse acordo designadamente que:
1. O TRABALHADOR desempenhará em regime de comissão de serviço, funções de Diretor da Agência ... dependente do Administrador do pelouro (…)
2. O TRABALHADOR auferirá a retribuição mensal base correspondente ilíquida de €1.000,00 (…)
3. As partes acordam no estabelecimento do regime de isenção de horário de trabalho ao abrigo do disposto no artigo 218.º do código do Trabalho e na modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 219.º
4. (…) Após a cessação da comissão de serviço, o trabalhador permanecerá ao serviço da A..., sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
5. (…) Nos casos omissos, aplicar-se-á o disposto no Código do Trabalho e na legislação especial que o complementa ou regulamenta, bem como no Regulamento e Quadro de Pessoal e Ordens de Serviço em vigor no A....
18.Durante o tempo que durou essa comissão de serviço a ré pagou ao autor a retribuição base de €1.000,00
Alterado para:
18. Durante o tempo que durou o desempenho das funções de Director da Agência ..., a ré pagou ao autor a retribuição base de €1.000,00.
19.E pagou ao autor as ajudas de custo respeitantes às deslocações em viatura própria entre o Porto e Braga e vice-versa, pagando um valor por km de acordo com o valor pago aos trabalhadores em funções públicas.
Alterado para:
19.E pagou ao autor um valor por km de acordo com o valor pago aos trabalhadores em funções públicas.
20.No dia 31 de janeiro de 2014 a ré comunicou ao autor que a comissão de serviço mencionada em 16 terminaria em 1 de abril de 2022, sendo que a cessação efetiva dessa comissão de serviço se concretizou em 30 de junho de 2014.
Alterado para:
20. No dia 31 de janeiro de 2014 a ré comunicou ao autor que as funções referidas em 16 terminariam em 1 de abril de 2014, sendo que a cessação efetiva dessa comissão de serviço se concretizou em 30 de junho de 2014.
21.Em consequência dessa cessação o autor passou a exercer as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
22.A partir dessa altura passou a auferir uma retribuição base mensal de €839,53.
23.O autor continuou a exercer a sua atividade na agência ....
24.A ré deixou de pagar ao autor ajudas de custas pelas deslocações em viatura própria entre Porto e Braga e vice-versa a partir do momento em que o mesmo passou a exercer as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
Alterado para:
24.A ré deixou de pagar ao autor esse valor a partir do momento em que o mesmo passou a exercer as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
25.Em 1 de outubro 2016 o autor passou, através da reclassificação profissional da categoria, para Técnico Superior Estagiário, Nível 1, escalão único, passando a auferir uma retribuição mensal de €1.153,40.
26.A ré reclassificou os trabalhadores Técnicos Superiores Estagiários para Técnicos Superiores de Grau 1, nível 1, escalão 1 a partir de 1 de janeiro de 2015 entre os quais o Autor.
27.Em consequência dessa reclassificação o autor passou a auferir uma remuneração base de €1.431,27
28.Enquanto trabalhador da ré o autor exerceu, entre 20 de julho de 2016 e 10 de abril de 2017 as funções de Coordenador da Unidade Local ..., tendo sido nomeado como coordenador dessa Unidade local por deliberação do Conselho de administração da ré em reunião de 18/7/2016
29.A partir dessa data o autor passou a exercer as funções de Coordenador da Unidade local ....
30.A partir dessa data a ré passou a pagar ao autor o montante de €518,81 mensais a título de “despesas de representação”.
31.Esse montante foi sempre pago ao autor enquanto o mesmo exerceu funções de Coordenador da Unidade local ....
32.Essas “despesas de representação” destinavam-se a permitir ao autor custear os próprios gastos inerentes à dignidade da função de representação da ré, sendo atribuídas pela ré a cargos dirigentes.
Alterado para:
32.Esse montante destinava-se a permitir ao autor custear os próprios gastos inerentes à dignidade da função de representação da ré, sendo atribuídas pela ré a cargos dirigentes.
33.No dia 19 de dezembro de 2016 o autor enviou GG o email cuja cópia se encontra junta a fls. 35 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando do mesmo, designadamente, que “Em 2012 foi entendimento do CA que a minha experiência e provas dadas seriam uma mais valia em Braga. A minha transferência foi portanto deliberação do CA, não decorreu a pedido meu. Aceitei na condição de receber compensação pela despesa acrescida decorrente da deslocação diária de 120km Porto-Braga conforme estipulado no ponto 4 do artigo 194 do código do trabalho.
(…) A partir de 2014 deixei de receber as minhas deslocações. A partir de 2014, por razões que desconheço, deixei de receber.
(…) Na possibilidade de ser retomada a atribuição da compensação prevista no código do trabalho e explicitada na acta n.º ..., estou disposto a abdicar do valor que não recebi de 2014 a 2016”.
34.No dia 3/2/2017 o autor remeteu email a HH cuja cópia se encontra junta a fls. 36 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando do mesmo, designadamente, que: “Uma vez que ainda não tive oportunidade de lhe agradecer a confiança que depositou em mim ao encarregar-me da missão de coordenar a unidade ..., faço-o agora por escrito.
(…) Contudo há um detalhe que me causa dificuldades no cumprimento do dever. Como sabe fui transferido para Braga em 2012 por iniciativa do CA.
Apesar das dificuldades decorrentes de trabalhar a 60km de casa aceitei o desafio.
Ficou escrito que por razões legais tenho direito a receber despesas de deslocação em viatura própria. Recebi as referidas despesas até 2014. A partir daí foram suspensas (desconheço o motivo).
Oportunamente pedi informações à DRH mas não obtive resposta. Parece-me que a Fundação está em falta.
(…)
proponho uma solução equilibrada: que me conceda utilização de um cartão de abastecimento no âmbito no nosso protocolo com a B..., bem como um identificador Via Verde, a utilizar exclusivamente nas deslocações profissionais.
Da minha parta aceito os encargos decorrentes de desgaste e manutenção acrescida do meu carro.
Sem o auxílio do Senhor Presidente não tenho possibilidades para suportar os encargos inerentes às deslocações diárias”.
35.No dia 11 de abril de 2017 o autor terminou a sua comissão de serviço como Coordenador da Unidade local ....
Alterado para:
35.No dia 11 de abril de 2017 o autor terminou as funções de Coordenador da Unidade local ....
36.No dia 11 de abril de 2017 o autor solicitou à ré a sua transferência para a unidade local da sua residência através do pedido cuja cópia se encontra junta a fls. 38 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
37.Tal pedido foi indeferido pelo Sr. Presidente do Conselho de Administração da ré em 15/5/2017, tendo essa decisão sido comunicada ao autor através da resposta cuja cópia se encontra junta a fls. 38 verso.
38.No mês de abril de 2017 a ré procedeu ao pagamento ao autor do montante de €518,81 a título de “despesas de representação”.
39.No mês de maio de 2017 a ré procedeu ao desconto no vencimento do autor da quantia de €345,87 de despesas de representação e procedeu ao pagamento de €518,81 a título de “aviso prévio”.
40.O autor enquanto desempenhou funções de Diretor da agência ... e de Coordenador da unidade local ... trabalhou sempre num gabinete.
41.Em 8 de junho de 2017 o autor recebeu o email cuja cópia se encontra junta a fls. 39 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, remetido por BB, Coordenadora de Unidade local, com o assunto “transferência de local de trabalho” no qual lhe é comunicado que “foi superiormente entendido que a partir de amanhã, dia 9 de junho, passará a executar funções de atendimento, no qual contará com o nosso apoio para exercício do mesmo. Poderá manter ou reajustar o seu horário, caso pretenda. Neste sentido, solicita-se a libertação do espaço “Gabinete desportivo” que atualmente ocupa”.
42.O autor foi incumbido de atendimento ao público, tendo sido colocado inicialmente no balcão respetivo.
43.Posteriormente o autor voltou a trabalhar num gabinete.
44.Foi entregue ao autor um uniforme de atendimento ao público que o mesmo nunca usou.
45.O autor recusou-se a exercer qualquer função que considere não ser de um Coordenador, recusando-se a cumprir funções que lhe são distribuídas pela Coordenadora BB, designadamente atendimento ao público e encerramento de files.
46.O autor sentiu-se angustiado e triste pelo facto de ter perdido o gabinete e ter deixado de exercer funções de Coordenador de Unidade local.
47.Em 15/5/2017 a ré decidiu instaurar ao autor um procedimento disciplinar, tendo nomeado como instrutora a Sra. Dra. DD, advogada.
48.A Sra. Dra. DD em 15 de maio de 2017 deu por aberto um processo de inquérito prévio
49.Através de carta entregue ao autor no dia 28 de junho de 2017 a ré comunicou ao autor a intenção de proceder à aplicação da sanção de repreensão registada, com base na nota de culpa anexa à mesma, informando-o da nomeação da Sra. Dra. DD como instrutora desse procedimento disciplinar.
50.O autor, através de Mandatária, no dia 10 de julho de 2017, apresentou à ré, que a recebeu em 11 de julho de 2017, resposta à nota de culpa.
51.O autor foi notificado da cópia da decisão cuja cópia se encontra junta a fls. 51 e seguintes subscrita pela instrutora DD e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
52.A decisão de aplicação da sanção disciplinar de repreensão registada ao autor foi aprovada pelo Presidente do Conselho de Administração da ré em 11 de agosto de 2017, tendo sido ratificada por deliberação do Conselho de Administração da ré em 11 de setembro de 2017
53.O autor recebeu ajudas de custo pelos Km percorridos entre outubro de 2012 e julho de 2013 enquanto exerceu funções de diretor da agência ....
Alterado para:
53.O autor recebeu esse valor pelos Km percorridos entre outubro de 2012 e julho de 2013 enquanto exerceu funções de diretor da agência ....
54.E recebeu despesas de representação entre julho de 2016 e abril de 2017 enquanto exerceu funções de Coordenador da Unidade local ....
54.E recebeu esse montante entre julho de 2016 e abril de 2017 enquanto exerceu funções de Coordenador da Unidade local ....
Da prova produzida em audiência resultou ainda provado que:
55.O Autor já não mantém qualquer contrato de trabalho com a ré, tendo o mesmo cessado na pendência da presente ação.

Para além da factualidade acima elencada e com interesse para a decisão não resultaram provados quaisquer outros factos e, designadamente, não resultou provado que:
1. Foi determinado unilateralmente pela ré que o autor exerceria as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2 na agência ....
2. A verba paga ao autor a título de “despesas de representação” mencionada no ponto 28 dos factos provados visava remunerar o autor como contrapartida da sua atividade como Coordenador.
3. Entre a residência do autor e a agência da ré em Braga a menor distância possível é de 54,5km.
4. Em 2014 o autor trabalhou 106 dias, em 2015 trabalhou 230 dias, em 2016 trabalhou 228 dias, em 2017 trabalhou 215 dias, em 2018 trabalhou 112 dias.
5. Em 2016 o autor foi promovido para a categoria de Coordenador de unidade local ....
6. O autor não tem quaisquer atribuições profissionais sendo impedido de trabalhar pela ré.
7. As idas do autor à casa de banho são monitorizadas pela Coordenadora BB e/ou pelo colaborador CC, os quais o seguem quando àquele se dirige.
8. Tais condutas são determinadas pela ré, nomeadamente pelas superioras hierárquicas GG e BB.
9. O autor ficou angustiado, triste, humilhado e sem conseguir dormir em consequência de ter sido colocado no atendimento ao público, obrigado a usar uniforme e por a ré não lhe atribuir outras funções profissionais e monitorizar as suas idas à casa de banho.

Motivação:
A factualidade ínsita nos pontos 1 e 2 resultam da análise do DL 106/2008.
Quanto à factualidade ínsita nos pontos 3 e 4 valoraram-se os documentos junto a fls. 86 e seguintes e 133, sendo que a testemunha II (técnico de recursos humanos da ré) esclareceu, no seu depoimento, que o Regulamento de Quadro de pessoal cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 86 e seguintes, para além de estar na intranet disponível para quem trabalha na ré, era também mencionado em várias ordens de serviço.
A factualidade ínsita no ponto 5 e 7 a 31 resultou da conjugação dos depoimentos das testemunhas JJ, II, EE, KK, LL, FF e MM com a prova documental junta aos autos, designadamente, os documentos juntos a fls. 17, os recibos de vencimento do autor juntos ao processo, o documento de fls. 19/20, o acordo de comissão de serviço de fls. 21/22, o documentos de fls. 25, 26, 27 e a documentação junta ao processo de inquérito prévio apenso sendo que da conjugação desses meios de prova resultou manifesto que o autor foi nomeado para o cargo de Delegado regional da Região Norte a partir de 1/4/2009 em regime de comissão de serviço, exercendo funções no Porto, auferindo uma retribuição ilíquida de 2.100,00 euros, tendo as partes acordado que o mesmo ficaria sujeito a um regime de comissão de serviço, sendo que a partir de 11/2/2011 o mesmo passou a exercer cumulativamente as funções de Diretor da agência ... em regime de comissão de serviço, sendo que tais comissões cessaram em outubro de 2012.
Resultou também claro – e tal resulta também do alegado pelas próprias partes – que nesse mês de outubro de 2012 foi deliberada a nomeação do autor como Diretor da agência ..., tendo sido junta aos autos a ata que contém essa deliberação e, a fls. 21, o acordo de comissão de serviço outorgado entre as partes.
Quanto aos valores pagos pela ré ao autor valoraram-se os recibos de vencimento juntos aos autos, sendo que os pontos 20 a 27 resulta assente também por acordo das partes. Os recibos de abril e maio de 2017 foram essenciais para se dar como provada a factualidade ínsita nos pontos 38 e 39 dos factos assentes e os pontos 53 e 54 resultaram também da análise dos recibos de vencimento juntos aos autos.
Relativamente aos pontos 28 a 31 da documentação junta aos autos, nomeadamente do documento junto a fls. 31, resulta que a ré nomeou, em julho de 2016, o autor como Coordenador da Unidade local ..., sendo que, nessa altura, o autor já era trabalhador da ré.
Ora, da prova testemunhal produzida, resultou manifesto que as funções de Coordenador de qualquer Unidade Local, quando exercidas por alguém que fosse já trabalhador da ré, eram prestadas em regime de comissão de serviço, tal como prevê o Regulamento e Quadro de pessoal da ré junto a fls. 86 e seguintes que é um regulamento aplicável a todo o pessoal vinculado à ré por contrato de trabalho.
Ora, a verdade é que os recibos de vencimento do próprio autor juntos aos autos e respeitantes a esse período corroboram essas declarações. Com efeito, nos mesmos consta que a categoria/cargo do autor era de “Técnico superior de Gr. I” pelo que a alegação do autor de que foi “promovido” para uma nova categoria de Coordenador de Unidade local carece totalmente de prova (pelo que não foi dada como assente a factualidade ínsita no ponto 5 dos factos não provados).
De acordo com a prova testemunhal produzida, o Regulamento do Quadro de pessoal mencionado no ponto 3, para além de estar disponível na intranet, a que o autor teria certamente acesso, estava também disponível nos recursos humanos e era mencionado em várias ordens de serviços que a ré emanava.
Por outro lado, analisado o acordo de comissão de serviços que as partes subscreveram em outubro de 2012 cuja cópia se encontra junta a fls. 21/22 é possível verificarmos que esse acordo faz uma remissão para esse Regulamento e Quadro de pessoal.
Ora, se o autor aceitou subscrever esse acordo com essa remissão é porque obviamente conheceria esse Regulamento e Quadro de pessoal visto que, atendendo a regras de experiência comum, não é credível que aceitasse subscrever esse acordo sem conhecer esse Regulamento que iria regulamentar o seu contrato.
Por outro lado, entre abril de 2009 e a data de celebração desse acordo de comissão de serviço de outubro de 2012 apurámos que o autor exercer funções de delegado Regional da Região Norte e, a partir de 2011, também de Diretor da agência ....
Enquanto Delegado Regional da Região Norte o autor tinha funções de chefia e de elevada responsabilidade na ré, considerando que, a nível nacional, poucos delegados Regionais existiam. Não é, assim, credível que o autor não conhecesse o Regulamento e quadro de pessoal que estava em vigor na ré.
Se assim fosse, isto é, se o autor não conhecesse esse Regulamento – que prevê expressamente que os “índices retributivos incluem o complemento por isenção de horário de trabalho” (ver fls. 112, nota 2) – não seria credível que o autor logo nos anos seguintes ao início de funções na ré não tivesse interpelado esta a pagar-lhe qualquer montante a título de isenção de horário. E a verdade é que analisados os recibos de vencimento de 2009 e anos posteriores, se verifica que a ré nunca procedeu a qualquer pagamento autónomo pela isenção de horário de trabalho, sendo certo que dos depoimentos testemunhais prestados em juízo resulta claro que a ré não pagava a quaisquer dirigentes qualquer valor autónomo pela isenção de horário de trabalho visto que a norma era a de que a retribuição base já incluía esse pagamento.
Acresce que de acordo com a prova testemunhal produzida resultou claro que para todos os que tinham cargos de chefia e os exerciam em regime de comissão de serviço as retribuições acordadas incluíam as retribuições especificas pela isenção de horário de trabalho.
Ora, apurando-se que o autor desde o início da primeira comissão de serviço sempre auferiu a retribuição acordada e que nunca reclamou o pagamento autónomo de qualquer montante pela isenção de horário de trabalho e que, posteriormente, veio a celebrar outra comissão de serviço ficou este tribunal convencido que sempre soube que a retribuição acordada incluía o complemento da isenção de horário de trabalho. Na verdade, de acordo com regras der experiência comum e juízos de normalidade, não é credível que o autor – que foi exercer um primeiro cargo de chefia de elevado grau – desconhecesse que esse era o regime que vigorava na ré para todos os contratos de comissão de serviço. Para além disso, não é credível que, arrogando-se o autor um direito a esse pagamento autónomo, aceitasse uma posterior comissão de serviço nos mesmos termos.
O depoimento das testemunhas II e FF foram determinantes para se dar como provado o ponto 32 dos factos assentes e como não provado o ponto 2 dos factos não assentes sendo que essas testemunhas demonstraram ter conhecimento sobre essa factualidade, esclarecendo a que título e a quem são pagas pela ré as despesas de representação, resultando manifesto desses depoimentos que tais despesas visavam custear despesas inerentes à dignidade da função de representação da ré, pelo que só quem ocupava cargos dirigentes recebia essas despesas e o valor das mesmas era variável, sendo superior para quem exercesse cargos dirigentes mais representativos e menor para quem exercesse hierarquicamente um cargo dirigente considerado menos representativo.
Os documentos de fls. 35 verso, 36, 38 e 39 foram determinantes para se darem como provados os pontos 33, 34, 36, 37 e 41 e quanto ao ponto 35 valorou-se o documento junto a fls. 56 do processo de inquérito.
O ponto 40 resultou provado por acordo das partes, tendo-se valorado ainda os depoimentos das testemunhas KK, MM e JJ.
A factualidade ínsita nos pontos 42 a 45 resultou provada atendendo aos depoimentos das testemunhas MM, BB e NN que demonstraram conhecimento sobre a mesma, tendo deposto de uma forma clara, isenta e esclarecida.
Desses depoimentos resultou manifesto que o autor foi incumbido de executar tarefas, pelo que não foi dada como provada a factualidade ínsita no ponto 6 dos factos não assentes. Tais testemunhas negaram perentoriamente a factualidade ínsita no ponto 7 e 8 dos factos não provados pelo que tal factualidade não foi dada como assente por total ausência de prova.
Apurando-se que o autor exerceu, na agência ..., funções de chefia, tendo direito a um gabinete qualquer e que depois perdeu essas funções para uma outra pessoa, o que implicou que o mesmo tivesse, inicialmente, perdido direito a ter gabinete próprio e tivesse passado a receber instruções para ficar no atendimento ao publico com aqueles que, anteriormente, eram seus “inferiores” hierarquicamente e analisada a prova testemunhal é manifesto que evidente que o autor se sentiu angustiado e triste visto que tal resulta até de regras de experiência comum e de juízos de normalidade (ponto 46 dos factos provados).
A verdade é que não se considerou assente o ponto 9 dos factos não provados visto que, desde logo, não se provou que o autor alguma vez tenha usado qualquer uniforme. Por outro lado, não se fez qualquer prova de que o autor ficou sem qualquer função profissional, resultando, sim, da prova testemunhal produzida que o autor recebia instruções daquela que passou a ser a sua superiora hierárquica, BB, para exercer funções e o mesmo se recusava a executá-las. Acresce que não foi feita qualquer prova de que as idas do autor à casa de banho eram monitorizadas.
Quanto aos pontos 47 a 52 valorou-se o processo de inquérito prévio apenso aos autos, assim como os documentos de fls. 39 e seguintes.
O ponto 55 resultou da prova testemunhal sendo que do depoimento das testemunhas JJ, EE, KK e FF resultou claro que o autor já não trabalha para a ré.
Os pontos 1, 3 e 4 dos factos não provados não resultou assente por total ausência de prova. Com efeito, não foi feita qualquer prova nos autos que a ré unilateralmente tivesse determinado que o autor exerceria as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, nível 4, escalão 2 na agência ....
Por outro lado, não foi feita qualquer prova nos autos de qual a distância concreta entre a residência do autor e a agência da ré em Braga, nem foi feita prova de quais os concretos dias que o autor trabalhou nos anos de 2014 a 2018.”

3.1.2. Impugnação da decisão de facto:
De harmonia com o disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil (ex vi do artigo 1º, nº 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho), o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Os poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto foram reforçados na atual redação do Código de Processo Civil.
Abrantes Geraldes, (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, pág. 230) refere que, “… a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”. Apesar de (obra citada, pág. 245), “… a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662º não poder confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”.
Na reapreciação da força probatória das declarações de parte, dos depoimentos das testemunhas e dos documentos, importa ter presente o princípio da livre apreciação, como resulta do disposto nos artigos 607º, nº5 e 466º, nº3, ambos do Código de Processo Civil e 396º e 366º.
Dito de outro modo, cabe à Relação, enquanto tribunal de 2ª instância, reapreciar, não apenas se a convicção expressa pelo tribunal de 1ª instância tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e os restantes elementos constantes dos autos revelam, mas, também, avaliar e valorar, de acordo com o princípio da livre convicção, toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.
Preceitua ainda o artigo 640º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil:
«1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;».
Como se lê no Acórdão do STJ de 01.10.2015, in www.dgsi.pt, “Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão. (…)”.
Servindo-nos também do texto do acórdão desta secção de 22.10.2018, proferido no processo 246/16.OT8VLG.P1, (Relatora Desembargadora Rita Romeira, no qual foi 1ª adjunta a aqui relatora):
«Verifica-se, assim, que o cumprimento do ónus de impugnação da decisão de facto, não se satisfaz com a mera indicação genérica da prova que na perspetiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal “a quo”, impõe-lhe a concretização quer dos pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância como a especificação das provas produzidas que, por as considerar como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, quanto a cada um dos factos que impugna sendo que, quando se funde em provas gravadas se torna, também, necessário que indique com exatidão as passagens da gravação em que se baseia, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.
Além disso, nas palavras, (…) de (Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, págs. 132 e 133), “O recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto;”.
Sobre este assunto, no (Ac. STJ de 27.10.2016) pode ler-se: “…Como resulta claro do art. 640º nº 1 do CPC, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto.”…(…).».
Ainda a este propósito, lê-se no Acórdão desta secção de 15.04.2013 (Relatora Paula Leal de Carvalho, aqui 2ª Adjunta, in www.dgsi.pt, também citado no acórdão de 22.10.2018), “Na impugnação da matéria de facto o Recorrente deverá, pois, identificar, com clareza e precisão, os concretos pontos da decisão da matéria de facto de que discorda, o que deverá fazer por reporte à concreta matéria de facto que consta dos articulados (em caso de inexistência de base instrutória, como é a situação dos autos).
E deverá também relacionar ou conectar cada facto, individualizadamente, com o concreto meio de prova que, em seu entender, sustentaria diferente decisão, designadamente, caso a discordância se fundamente em depoimentos que hajam sido gravados, identificando as testemunhas por referência a cada um dos factos que impugna (para além “de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.”».
Ainda com fundamentação da mesma Desembargadora Paula Leal de Carvalho:
“Pretendendo-se a reapreciação da decisão da matéria de facto, tem o Recorrente que dar cumprimento aos requisitos exigidos pelo art. 640º do CPC/2013, em cujos nºs 1 e 2 se dispõe que:
“Sendo o objeto do recurso, como é, delimitado pela conclusões, a parte que pretenda impugnar a decisão da matéria de facto deverá indicar quais os concretos pontos da decisão da matéria de facto de que discorda. E tal indicação deve ter lugar nas conclusões do recurso, por estas consubstanciarem a delimitação do objeto do recurso no que tange à matéria de facto; ou seja, delimitando as conclusões o que se pretende com o recurso, deverá o Recorrente nelas indicar o ou os concretos factos de cuja decisão discorda. Diga-se que tal indicação deve ser feita por referência aos concretos factos que constam da decisão da matéria de facto e/ou dos articulados e não por referência a meros “temas” das questões de facto sobre as quais o Recorrente discorde.
E, nos termos do citado art. 640º, nº 1, al. c), o Recorrente deverá também indicar o sentido das respostas que pretende.
(…)
Por outro lado, na indicação dos meios probatórios [sejam eles documentais ou pessoais] que sustentariam diferente decisão [art. 640º, nº 1, al. b)], deverão eles ser identificados e indicados por referência aos concretos pontos da factualidade impugnada [ou a um conjunto de factos que estejam interligados e em que os meios de prova sejam os mesmos] de modo a que se entenda a que concretos pontos dessa factualidade se reportam os meios probatórios com base nos quais a impugnação é sustentada, mormente nos casos em que se pretende a alteração de diversa matéria de facto. Só assim será possível ao tribunal ad quem perceber e saber quais são os concretos meios de prova que, segundo o Recorrente, levariam a que determinado facto devesse ter resposta diferente da que foi dada.
[Cfr. Acórdão do STJ de 20.12.2017, Proc. 299/13.2TTVRL.G1.S2, e de 19.12.2018, Proc. 271/14.5TTMTS.P1.S1, ambos in www.dgsi.pt, constando do sumário deste último o seguinte: “I - A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “[o]s concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos. II - Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, agrega a matéria de facto impugnada em blocos ou temas e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.
Assim também os Acórdãos do STJ de 21.09.2022, Proc. 1996/18.1T8LRA.C1.S1, constando do respetivo sumário: “I- A impugnação da matéria de facto “em bloco” viola o disposto no artigo 640.º do CPC, mormente quando não está em causa um pequeno número de factos ligados entre si e um número reduzido de meios de prova (por exemplo, o mesmo depoimento), mas um amplíssimo conjunto de factos (ou, melhor, dois amplos blocos de factos) e numerosos meios de prova” e de 12.10.2022. Proc. 14565/18.7T8PRT.P1.S1, constando do respetivo sumário: “I – Para poder validamente impugnar a matéria de facto, o Recorrente tem de cumprir os ónus imposto pelo art.º 640º do CPC. II – Em princípio, a impugnação da matéria de facto não pode ser feita por blocos de factos, antes tem de ser feita discriminadamente, por concreto ponto de facto. III - E não pode ser feita por remissão genérica para determinados meios de prova, sem demonstrar a sua relevância quanto a determinado facto concreto.”, ambos in www.dgsi.pt].]
Quanto à fundamentação dessa impugnação, mormente quanto aos meios probatórios em que assenta a impugnação, entendemos que poderá ela ter lugar em sede de alegações.”, (realce e sublinhado nossos).
Analisaremos se o Apelante cumpriu os ónus a que nesta sede estava vinculado, relativamente a toda a matéria.
*
Antes de analisar a impugnação suscitada pela Apelante, ao abrigo dos poderes oficiosos contemplados no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil, entendemos que se impõe alterar a decisão sobre a matéria de facto dada como provada, da a matéria conclusiva aí incluída.
No Acórdão desta Secção de 27.09.2017, proferido no processo nº3978/15.6T8VFR.P1, (Relator Desembargador Jerónimo Freitas, in www.dgsi.pt), lê-se “Como é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, as conclusões apenas podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada.(…) ”.
Ainda a este propósito lê-se nos Acórdãos do S.T.J., aí citados:
Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa ou latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes”, Acórdão do S.T.J. de 12.03.2014, in www.dgsi.pt.
«Sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de facto que se insira de forma relevante na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta ou componente relevante da resposta àquelas questões, ou cuja determinação de sentido exija o recurso a critérios jurídicos, deve o mesmo ser eliminado», Acórdão do S.T.J. de 28.01.2016, in www.dgsi.pt.
Na matéria de facto dada como provada é incluída a matéria “em comissão de serviço”, “no exercício da referida comissão de serviço”, “a sua comissão de serviço”, “em regime de comissão de serviço”, “As referidas comissões de serviço”, “exerceu essa comissão de serviço”, “comissão de serviço mencionada”, “dessa comissão de serviço”, nos pontos 5, 11, 12, 13, 14, 15, 18, 20 e 35 da mesma factualidade.
Ora, só mediante um critério jurídico, a ponderar em sede de subsunção dos factos ao direito, é possível aferir se o Autor/Apelante exerceu nos períodos, em causa, funções em regime de comissão de serviço.
Importa, pois, eliminar tal matéria dos factos provados.
Importa também retificar o manifesto lapso de escrita constante do ponto 20, onde aí se lê 2022, deve passar a constar 2014.
Passando a redação dos mesmos a ser:
5. O conselho de administração da ré deliberou em 26 de março de 2009 nomear o autor para o cargo de delegado regional da Região Norte a partir de 1 de abril de 2009.
11. Foi, também, ajustado entre as partes que o autor ficaria sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
12.Entre 11 de fevereiro de 2011 e 22 de outubro de 2012 o autor exerceu cumulativamente as funções de Diretor da agência ....
13.As referidas funções terminaram em outubro de 2012.
14.Durante todo o tempo, entre 11 de fevereiro de 2011 e 22 de outubro de 2012, a ré pagou ao autor a remuneração base ilíquida de 2.100,00 euros.
15.No dia 19 de outubro de 2012 foi deliberada pela ré a nomeação do autor como Diretor da Agência ....
18. Durante o tempo que durou o desempenho das funções de Director da Agência ..., a ré pagou ao autor a retribuição base de €1.000,00.
20. No dia 31 de janeiro de 2014 a ré comunicou ao autor que as funções referidas em 16 terminariam em 1 de abril de 2014, sendo que a cessação efetiva dessa comissão de serviço se concretizou em 30 de junho de 2014.
35.No dia 11 de abril de 2017 o autor terminou as funções de Coordenador da Unidade local ....

Importa também retificar o manifesto lapso de escrita constante do ponto 17, onde aí se lê 2022, deve passar a constar 2012:
17. No dia 22 de outubro de 2012, o autor e a ré subscreveram o “acordo de comissão de serviço” cuja cópia se encontra junta a fls. 21 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando desse acordo designadamente que:
1. O TRABALHADOR desempenhará em regime de comissão de serviço, funções de Diretor da Agência ... dependente do Administrador do pelouro (…)
2. O TRABALHADOR auferirá a retribuição mensal base correspondente ilíquida de €1.000,00 (…)
3. As partes acordam no estabelecimento do regime de isenção de horário de trabalho ao abrigo do disposto no artigo 218.º do código do Trabalho e na modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 219.º
4. (…) Após a cessação da comissão de serviço, o trabalhador permanecerá ao serviço da A..., sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
5. (…) Nos casos omissos, aplicar-se-á o disposto no Código do Trabalho e na legislação especial que o complementa ou regulamenta, bem como no Regulamento e Quadro de Pessoal e Ordens de Serviço em vigor no A....

Na matéria de facto dada como provada é incluída a matéria “as ajudas de custo respeitantes às deslocações em viatura própria entre o Porto e Braga e vice-versa”, nos pontos 19, 24 e 53.
Também só mediante um critério jurídico, a ponderar em sede de subsunção dos factos ao direito, é possível aferir se foram pagas ao Autor/Apelante ajudas de custo.
Importa, pois, eliminar tal matéria dos factos provados, passando a redação dos mesmos a ser:
19.E pagou ao autor um valor por km de acordo com o valor pago aos trabalhadores em funções públicas.
24.A ré deixou de pagar ao autor esse valor a partir do momento em que o mesmo passou a exercer as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
53.O autor recebeu esse valor pelos Km percorridos entre outubro de 2012 e julho de 2013 enquanto exerceu funções de diretor da agência ....

É também conclusiva, nos pontos 32 e 54, a matéria “as despesas de representação”
O teor de tal ponto passa a ser:
32.Esse montante destinava-se a permitir ao autor custear os próprios gastos inerentes à dignidade da função de representação da ré, sendo atribuídas pela ré a cargos dirigentes.
54.E recebeu esse montante entre julho de 2016 e abril de 2017 enquanto exerceu funções de Coordenador da Unidade local ....
*
Desde já se consigna o reparo de que o Apelante não tratou autonomamente a impugnação da matéria de facto relativamente ao enquadramento jurídico tido por pertinente relativamente à factualidade apurada.
Ainda assim, analisaremos de seguida, sem deixar de considerar a matéria já alterada, a impugnação da matéria de facto deduzida pelo Apelante.
Invoca o Apelante a existência de contradição entre a prova produzida no processo e em julgamento e os factos dados como provados.
Insurge-se o Apelante contra ter sido dado como provado que na sentença seja considerado como provado que no período compreendido entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 o Recorrente exerceu para a Recorrida o cargo de delegado regional da Região Norte, em regime de comissão de serviço, sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
Conclui que não tendo sido junto aos autos qualquer contrato de comissão de serviço entre Recorrida e Recorrente, impunha-se julgar que o que os vinculou entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 foi tão-só um contrato de trabalho.
Da leitura das alegações percebe-se que o Apelante pretende se considere não provado que tenha sido em regime de comissão de serviço que entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 o Recorrente exerceu para a Recorrida o cargo de delegado regional da Região Norte, “devendo, em consequência, ser alterados para não provados os factos 11, nos termos em que está formulado, e 12)”
A alteração do teor destes pontos da factualidade provada, em conformidade com tal pretensão, foi já decidida supra, ficando assente que a respetiva redação passa a ser a de que entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 o Recorrente exerceu para a Recorrida o cargo de delegado regional da Região Norte, sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
Nada mais importa ponderar a respeito da pretensão, nesta parte, do Apelante.

Afirma ainda o Apelante que “o Tribunal motivou mal a sua conclusão de que O regulamento e quadro de pessoal cuja cópia se encontra junta a fls. 86 e seguintes fora aprovado por despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e Formação profissional (facto provado 3)”
Mais concluiu o Apelante que a prova relativa à existência do despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, com efeitos a partir de 1/1/1991 que supostamente aprovou o Regulamento - que alegadamente previa que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço na Recorrida incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho - tinha de ser feita documentalmente, nos termos do nº 2 do artigo 393º do Código Civil, já que se trata de um facto que seria plenamente provável por documento.
Ainda que o mesmo não está junto aos autos, nem sequer disponível na internet, nem o Tribunal referiu na fundamentação da sentença tê-lo consultado, pelo que não podia ter considerado provada a existência do mesmo nem dessa existência ter extraído quaisquer consequências, como que a referida disposição - de que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço na Recorrida incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho - existe.
Para além disso, nos termos do artigo 70º do Decreto-Lei n.º 61/89, de 23 de fevereiro, que aprovou os Estatutos do A..., “carecem de aprovação, por despacho do Ministro da Tutela [o Ministro do Emprego e da Segurança Social, cfr. art.º 3º do mesmo diploma] o regulamento e o quadro de pessoal do A....” (cfr. al. a) do art.º 70º), pelo que o secretário de Estado do Emprego e formação profissional nem sequer tinha competência para emitir o despacho em causa, a não ser no âmbito da delegação de poderes – que não está provado que tenha existido, de forma válida, já que não se conhece o referido despacho.
O Apelante alega que se impõe alterar para não provada a matéria do item 3 dos factos provados.
Por seu turno, o Réu refere na resposta ao parecer do Exm.º Procurador Geral Adjunto que quanto a não ter sido junto aos autos o Despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do emprego e da Formação Profissional, que aprovou o regulamento e Quadro de Pessoal da Recorrida, não é exigível às partes que façam prova de lei nem prova de atos publicados em Diário da República (no caso na II Série), pois a publicação serve justamente para tornar público o ato. Em todo o caso, os autos contêm a prova do regulamento da Recorrida, da sua aprovação e da sua divulgação a fls. 86 e seguintes e a fls 133.
Os documentos que se encontram juntos aos autos, referenciados pelo Apelado, são “O Regulamento e Quadro de Pessoal do A...” e a “Ordem de serviço nº...” (fls. 133).
É este o teor do item 3 dos factos provados:
- O regulamento e quadro de pessoal cuja cópia se encontra junta a fls. 86 e seguintes fora aprovado por despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991.
O que o Apelante põe em causa em sede de recurso é a existência do despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional.
A questão da existência e mesmo validade do despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional, com efeitos a partir de 1/1/1991, é questão nova que como tal não pode ser tratada em sede do presente recurso.
São coisas distintas, uma que existia em vigor na Recorrida um Regulamento outra a forma como o mesmo foi aprovado.
Dito de outra forma, ao insurgir-se que o Regulamento que previa que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho foi aprovado por despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991, não resulta que o Apelante considere que não existia em vigor na Recorrida tal Regulamento, nem o conhecimento do mesmo.
Ora, a forma como foi aprovado o mesmo Regulamento é matéria que não se entende como relevante, para a decisão a proferir, ainda que incluída na matéria de facto (mantendo-se tal matéria tão só por ao Regulamento na mesma referenciado e identificado se reportarem outros itens da matéria de facto provada).
Improcede como tal nesta parte a pretensão que se depreende do alegado pelo Apelante de que se considere não provada a mesma matéria.

Questão diversa, como se adiantou, é a do conhecimento da existência do mesmo Regulamento por parte do Apelante.
A este respeito ficou provado (matéria cuja necessidade de alteração é também alegada pelo Apelante) no item 6º dos factos provados:
- O autor conhecia o Regulamento Quadro de pessoal mencionado em 3 e sabia que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho.
Alega o Apelante que foi feira prova de que desconhecia o referido regulamento e as putativas disposições do mesmo relativas à retribuição pela isenção de horário de trabalho, invocando os depoimentos das testemunhas EE e FF, indicando os minutos da gravação do início dos excertos tidos por pertinentes, procedendo à respetiva transcrição que integralmente lemos.
Não chegamos a uma convicção diferente, ou seja, de que não se provou que o Apelante conhecia o mesmo Regulamento, sendo escassa a prova para tal, atenta divulgação do Regulamento pela Ordem de serviço junta a fls. 133 que justifica seja considerado provado o conhecimento do mesmo.
A testemunha EE reportou-se à sua situação ao seu próprio contrato, e ao diferendo que teve com a Ré que o levou a intentar uma ação em tribunal. Quanto ao Autor referiu que estava na mesma situação, não recebia a isenção de horário e sem situar em termos de tempo que lhe disse (em que data é que o fez): “passou-se isto comigo, eu agora saí e vim reclamar isto e não mo querem dar” e que o Autor lhe respondeu “deixa-me cá ver o meu contrato a ver se está igual”.
A testemunha FF para além de referir “Todos nós temos isenção de horário”, “somos obrigados a picar”, reporta-se tão só ao seu próprio contrato e ao conhecimento que tem do seu teor, não referindo que o Apelante não conhecia o mesmo Regulamento e o nele previsto, ou algo mais que permitisse assim aferir.
Improcede assim nesta parte a pretensão do Apelante.
Quanto a justificar-se, independentemente de tal conhecimento, o reclamado pagamento pela retribuição pela isenção de horário de trabalho, é questão a analisar em sede de subsunção dos factos ao direito.

Alega ainda a Apelante que se impõe alterar o facto não provado n.º1 para provado.
É este o teor do ponto 1 dos factos não provados:
- Foi determinado unilateralmente pela ré que o autor exerceria as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2 na agência ....
A este respeito o Apelante não cumpre os ónus que lhe incumbiam, não indicando os meios de prova que em seu entender justificariam uma convicção diferente sobre a mesma matéria.
Rejeita-se como tal, nesta parte a impugnação.
Quanto aquele que deve ser o local de trabalho a considerar-se como sendo o do Autor, nomeadamente após a cessação da comissão de serviço como Diretor da Agência ..., em 30 de Junho de 2014 (item 20 dos factos provados), é questão a analisar em sede de subsunção dos factos ao direito.

Alega o Apelante que se impõe alterar o facto não provado nº3 para provado.
É este o teor do ponto 3 dos factos não provados:
- Entre a residência do autor e a agência da ré em Braga a menor distância possível é de 54,5km.
Alega o Apelante que esta não é matéria sujeita a prova, nos termos do artigo 412º do Código de Processo Civil, pois trata-se de um facto notório, porque é do conhecimento geral.
Sob a epígrafe «Factos que não carecem de alegação ou de prova», dispõe o artigo 412º, nº1 do CPC:
«Não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral.»
Não é um facto notório.
Improcede assim nesta parte a pretensão do Apelante.

Num último segmento, alega o Apelante que se impõe alterar o facto não provado nº5 para provado.
É este o teor do ponto 5 dos factos não provados:
- Em 2016 o Autor foi promovido para a categoria de Coordenador da Unidade Local ....
A este respeito o Apelante não cumpre os ónus que lhe incumbiam, não indicando os meios de prova que em seu entender justificariam uma convicção diferente sobre a mesma matéria.
Rejeita-se como tal, nesta parte a impugnação.

3.3. Fundamentação de direito:
3.3.1. Nulidade da sentença:
Desde já se refere que não enferma a sentença das apontadas nulidades.
Já sobre se ocorreu erro de julgamento – ‘errada aplicação do Direito’ - é questão a ser tratada infra.

3.3.2. Retribuição pela isenção de horário de trabalho.
A este respeito, lê-se na sentença recorrida:
“Através da presente ação o autor vem peticionar, em primeiro lugar, que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de €18.187,50 respeitante às retribuições por isenção de horário de trabalho devidas e não pagas referente ao período de 1 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 e o montante de €4.154,73 respeitante às retribuições por isenção de horário de trabalho devidas e não pagas referentes ao período de 23 de outubro de 2012 a 30 de junho de 2014.
Analisada a factualidade provada dela resulta que o conselho de administração da ré deliberou, em março de 2009, nomear o autor para o cargo de delegado regional da Região Norte a partir de 1 de abril de 2009 em regime de comissão de serviço, cargo que o autor passou a desempenhar a partir dessa data, tendo sido acordado que auferiria uma retribuição base ilíquida no montante de 2100,00 euros e um período de trabalho semanal de 35 horas. Foi também acordado que, no exercício dessa comissão de serviço, o autor ficaria sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho e que essa comissão terminou em outubro de 2012, sendo que a ré sempre pagou ao autor, enquanto essa comissão de serviço durou, a remuneração base ilíquida de 2.100,00 euros.
Resultou ainda assente que o autor, entre 11/2/2011 e 22/10/2012 exercer cumulativamente as funções de diretor da agência ... em regime de comissão de serviço, sendo que esta terminou também em outubro de 2012, sendo que nesta altura o autor foi nomeado, em regime de comissão de serviço, como Diretor da Agência ..., tendo sido acordada uma remuneração de 1.000,00 por mês, remuneração que sempre foi paga ao autor, sendo que no contrato de comissão que foi assinado pelas partes, foi acordado o regime de isenção de horário de trabalho.
Estatui o artigo 161.º do Cod. do Trabalho de 2009 (lei 7/2009, de 12/2) (serão deste diploma as demais normas citadas sem menção de proveniência) que “Pode ser exercido, em comissão de serviço, cargo de administração ou equivalente, de direção ou chefia diretamente dependente da administração ou de diretor-geral ou equivalente, funções de secretariado pessoal de titular de qualquer desses cargos, ou ainda, desde que instrumento de regulamentação coletiva de trabalho o preveja, funções cuja natureza também suponha especial relação de confiança em relação a titular daqueles cargos e funções de chefia.”
Por sua vez estatui o art. 218.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma que “Por acordo escrito, pode ser isento de horário de trabalho o trabalhador que se encontre numa das seguintes situações: a) Exercício de cargo de administração ou direção, ou de funções de confiança, fiscalização ou apoio a titular desses cargos”.
E prevê o artigo 265.º que “O trabalhador isento de horário de trabalho tem direito a retribuição específica, estabelecida por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou, na falta deste, não inferior a:
a) Uma hora de trabalho suplementar por dia;
b) Duas horas de trabalho suplementar por semana, quando se trate de regime de isenção de horário com observância do período normal de trabalho.
2 - O trabalhador que exerça cargo de administração ou de direção pode renunciar à retribuição referida no número anterior.
No caso em apreço, apurámos que o autor conhecia o Regulamento Quadro de pessoal mencionado em 3 e sabia que os vencimentos dos cargos exercidos em regime de comissão de serviço incluíam o complemento da isenção de horário de trabalho.
Quando o autor iniciou a primeira comissão de serviço na ré – 1/4/2009 – a ré já havia sido instituída como Fundação e estava ainda em vigor na mesma o Regulamento e quadro de pessoal que fora aprovado por despacho de 7/8/1991 do Sr. secretário de Estado do Emprego e formação profissional que previa que a remuneração acordada já incluía o complemento da isenção de horário de trabalho.
Assim sendo, entende este tribunal que não é devida qualquer retribuição especial a título de isenção de horário ao pessoal dirigente, como era o caso do autor.
Há ainda que não esquecer que pelo facto de a ré se tratar de uma Fundação de utilidade pública não estamos perante uma relação de contrato de trabalho exclusivamente privado, sendo aplicável à mesma as normas previstas no Regulamento e quadro de pessoal aprovado, e tendo o Código do Trabalho uma aplicação apenas supletiva, isto é, apenas para as situações omissas.
Assim, não há aqui que proceder à sua aplicação, porquanto o RQP aprovado para a ré não é omisso e é aplicável.
Em consequência, os pedidos formulados pelo autor nas alíneas a) e b) da petição inicial devem improceder na íntegra.”
Desde já se adianta que revela aqui o decidido em sede de impugnação da matéria de facto.
3.3.2.1. A primeira questão a resolver é a de saber se é devida a retribuição pela isenção de horário de trabalho a que aquele esteve sujeito no período compreendido entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012.
Alega o Apelante que não desempenhou as suas funções na Ré, nesse período, ao abrigo de alguma comissão de serviço.
Ainda que estando vinculado à Ré através do contrato celebrado ao abrigo do regime jurídico do contrato individual do trabalho, nunca um regulamento interno poderia afastar em prejuízo do trabalhador qualquer direito deste em matéria de retribuição.
Conclui a este respeito o Apelante que a sentença violou o disposto no artigo 162º, nº 4 do Código do Trabalho, no nº 2 do artigo 393º do Código Civil e no artigo 265º do Código do Trabalho, devendo ser substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente a retribuição devida pela isenção de horário de trabalho a que aquele esteve sujeito no período compreendido entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012, período em que os vinculou foi tão-só um contrato de trabalho.
Atendendo-se ao que resultou demonstrado:
- O Autor em 01 de Abril de 2009, passou a exercer as funções de Delegado da Região Norte (item 7 dos factos provados).
- O Autor exercia essas funções na agência do Porto, sem prejuízo das respetivas deslocações em serviço a outras delegações da Ré (item 8 dos factos provados).
- Como contrapartida do exercício de tais funções foi acordado que o Autor uma retribuição base ilíquida no montante de €2.100,00 (item 9 dos factos provados).
- Foi fixado entre as partes um período de trabalho diário de 7 horas e um período de trabalho semanal de 35 horas (item 10 dos factos provados).
- Foi, também ajustado entre as partes que o Autor ficaria sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho.
Importa começar por aferir se no período compreendido entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012, as funções que o Apelante passou a fazer, o foram em regime de comissão de serviço.
Não resulta da factualidade provada que o Autor, apenas a dada altura, em 01 de Abril de 2009, passou a exercer as funções de Delegado da Região Norte, sofrendo o respetivo contrato de trabalho em momento ulterior ao seu início uma vicissitude modificativa.
De todo modo, no acórdão desta secção proferido no processo nº6952/20.7T8PRT.P1, de 17 de Abril de 2023 (este mesmo coletivo), entendemos que «As duas posições – contrato de trabalho por tempo indeterminado (para umas funções) e em comissão de serviço (para outras) não são incompatíveis, nem é incompatível que os contratos sejam celebrados em simultâneo ou ab initio».
No caso concreto, porém, desde já se adianta que não tendo sido junto aos autos qualquer contrato de comissão de serviço entre Recorrida e Recorrente, assiste razão ao Apelante impondo-se julgar que o que os vinculou entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012 foi tão-só um contrato de trabalho.
Independentemente da existência do invocado Regulamento (identificado como aprovado por despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991) - Regulamento e Quadro de Pessoal do A...”, do Autor conhecer tal Regulamento e que os vencimentos dos cargos exercidos e da “Ordem de serviço nº...”, certo é que a Lei prevê o contrato de trabalho em comissão de serviço.
Com efeito, sob a epígrafe «Regime de contrato de trabalho em comissão de serviço», dispõe o artigo 162º, nº1 do Código do Trabalho que «Pode exercer cargo ou funções em comissão de serviço um trabalhador da empresa ou outro admitido para o efeito».
Dispõe ainda o artigo 162º, nº3 que «Não se considera em regime de comissão de serviço o contrato que não tenha a forma escrita (…)».
Não se olvida a razão da exigência do documento escrito prescrito no artigo 162º, nº3 do Código do Trabalho - necessidade de consciencializar as partes, sobretudo o trabalhador, da precariedade do cargo.
Acolhemos os ensinamentos da doutrina, a este propósito, de que “a forma escrita tem em vista possibilitar uma maior reflexão das partes, uma formulação mais precisa e completa das declarações negociais e um maior elevado grau de certeza sobre os termos contratuais” (cfr. IRENE GOMES, “Principais aspetos do regime jurídico do trabalho exercido em comissão de serviço”, Estudos de Direito do Trabalho em Homenagem ao Prof. Manuel Alonso Olea, Almedina, 2004, pp. 241 e ss, citação também incluída no Ac. do STJ de 24.01.2018, in www.dgsi.pt).
Ora acompanhamos o Apelante quando conclui que não bastava a existência de uma deliberação do conselho de administração da Recorrida (como a que se dá por provada sob o Facto nº5), de nomear o Recorrente para o referido cargo em regime de comissão de serviço, já que tal deliberação não constitui um acordo com o trabalhador (de resto, alheio à mesma) nem se substitui a tal acordo, legalmente necessário para a instituição de uma comissão de serviço.
Sob a epígrafe «Retribuição por isenção de horário de trabalho» dispõe o artigo 265º do Código do Trabalho:
«1 - O trabalhador isento de horário de trabalho tem direito a retribuição específica, estabelecida por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou, na falta deste, não inferior a:
a) Uma hora de trabalho suplementar por dia;
b) Duas horas de trabalho suplementar por semana, quando se trate de regime de isenção de horário com observância do período normal de trabalho.
2 - O trabalhador que exerça cargo de administração ou de direção pode renunciar à retribuição referida no número anterior.
(…)».
Tendo ficado assente que o Autor ficaria sujeito a um regime de isenção de horário de trabalho mas também que foi fixado um período de trabalho diário de 7 horas e um período de trabalho semanal de 35 horas, tem o Autor direito à retribuição equivalente a duas horas de trabalho suplementar por semana, no período que decorreu entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012.
A este respeito o Autor pediu que a Ré seja condenada a pagar-lhe a importância de €18.187,50.
No cálculo a proceder, importa aqui atender às alterações legislativas.
Na redação dada pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro, quanto ao pagamento do trabalho suplementar, previa o artigo 268º do Código do Trabalho:
«1 - O trabalho suplementar é pago pelo valor da retribuição horária com os seguintes acréscimos:
a) 50 % pela primeira hora ou fração desta e 75 % por hora ou fracção subsequente, em dia útil;
(…)».
Com as alterações introduzidas pela Lei nº 23/2012, de 25 de Junho (Lei que entrou em vigor no primeiro dia do segundo mês seguinte ao da sua publicação - artigo 11º), o mesmo preceito passou a dispor:
«1 - O trabalho suplementar é pago pelo valor da retribuição horária com os seguintes acréscimos:
a) 25 % pela primeira hora ou fração desta e 37,5 % por hora ou fração subsequente, em dia útil;
(…)».
Revoga-se, nesta parte a sentença recorrida, condenando-se a Ré a pagar ao Autor a título de retribuição por isenção de horário de trabalho, na quantia correspondente a duas horas de trabalho suplementar por semana, no período que decorreu entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012, considerando-se os acréscimos que decorrem do quadro legislativo que se consignou.

3.3.2.2. A segunda questão a resolver é a de saber se é devida a retribuição pela isenção de horário de trabalho a que aquele esteve sujeito no período compreendido entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014.
Alega o Apelante que após o período que decorreu entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012, celebrou efetivamente com a Recorrida um contrato de comissão de serviço para o exercício do cargo/funções de Diretor da Agência ..., que vigorou entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014 e no qual foi acordado, por escrito, o regime de isenção de horário de trabalho, na modalidade de não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho, sem que a Recorrida lhe tenha pago qualquer montante a título de retribuição pela isenção de horário de trabalho nesse período.
Conclui a este respeito o Apelante que a sentença violou o disposto no artigo 162º, nº 4 do Código do Trabalho, no nº 2 do artigo 393º do Código Civil e no artigo 265º do Código do Trabalho, devendo ser substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente a retribuição devida pela isenção de horário de trabalho a que aquele esteve sujeito no período compreendido entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014.
Também aqui importa atender ao que resultou demonstrado e para além da factualidade que se deixou evidenciada em 3.3.2.1., mais ainda à seguinte:
- No dia 19 de outubro de 2012 foi deliberada pela ré a nomeação do autor como Diretor da Agência .... (item 15 dos factos provados)
- Na ata em que consta essa deliberação a ré fez constar que “ao cessar funções de coordenador regional das Agências da Região Norte, do Sr. Eng. AA e uma vez que esta exercia funções na Agência ..., foi deliberado nomeá-lo diretor desta Agência, com a remuneração equivalente a qualquer outro diretor que não seja trabalhador da A..., no caso de 1.000,00 euros por mês e caso cesse esta Comissão de Serviço ficará com a categoria de Técnico-adjunto de Grau I, Nível 4, escalão 1, a que corresponde a remuneração ilíquida de 839,53 euros. No exercício de funções em Braga e por razões legais o Sr. Eng. AA terá direito a receber deslocações em viatura própria nos dias úteis do Porto para Braga e vice-versa.”. (item 16 dos factos provados)
- No dia 22 de outubro de 2012, o autor e a ré subscreveram o “acordo de comissão de serviço” cuja cópia se encontra junta a fls. 21 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando desse acordo designadamente que:
1. O TRABALHADOR desempenhará em regime de comissão de serviço, funções de Diretor da Agência ... dependente do Administrador do pelouro (…)
2. O TRABALHADOR auferirá a retribuição mensal base correspondente ilíquida de €1.000,00 (…)
3. As partes acordam no estabelecimento do regime de isenção de horário de trabalho ao abrigo do disposto no artigo 218.º do código do Trabalho e na modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 219.º
4. (…) Após a cessação da comissão de serviço, o trabalhador permanecerá ao serviço da A..., sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
5. (…) Nos casos omissos, aplicar-se-á o disposto no Código do Trabalho e na legislação especial que o complementa ou regulamenta, bem como no Regulamento e Quadro de Pessoal e Ordens de Serviço em vigor no A.... (item 17 dos factos provados)
- Durante o tempo que durou o desempenho das funções de Diretor da Agência ..., a ré pagou ao autor a retribuição base de €1.000,00. (item 18 dos factos provados)
- No dia 31 de janeiro de 2014 a ré comunicou ao autor que as funções referidas em 16 terminariam em 1 de abril de 2014, sendo que a cessação efetiva dessa comissão de serviço se concretizou em 30 de junho de 2014. (item 20 dos factos provados)
Como se referiu já, o Apelante não questiona que celebrou efetivamente com a Recorrida um contrato de comissão de serviço para o exercício do cargo/funções de Diretor da Agência ..., que vigorou entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014, tendo subscrito o “acordo de comissão de serviço”.
Ou seja, só nessa data foi formalizado o contrato de comissão de serviço para o exercício do cargo/funções de Diretor da Agência ..., clausulando-se que após a cessação dessa comissão, o trabalhador permanecerá ao serviço da Ré, sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
No mesmo contrato de comissão de serviço, é feita expressa remição para os artigos 218º e 219º do Código do Trabalho, transcrevendo-se aqui o respetivo teor:
«Artigo 218.º
Condições de isenção de horário de trabalho
1 - Por acordo escrito, pode ser isento de horário de trabalho o trabalhador que se encontre numa das seguintes situações:
a) Exercício de cargo de administração ou direção, ou de funções de confiança, fiscalização ou apoio a titular desses cargos;
b) Execução de trabalhos preparatórios ou complementares que, pela sua natureza, só possam ser efetuados fora dos limites do horário de trabalho;
c) Teletrabalho e outros casos de exercício regular de atividade fora do estabelecimento, sem controlo imediato por superior hierárquico.
2 - O instrumento de regulamentação coletiva de trabalho pode prever outras situações de admissibilidade de isenção de horário de trabalho.»
«Artigo 219.º
Modalidades e efeitos de isenção de horário de trabalho
1 - As partes podem acordar numa das seguintes modalidades de isenção de horário de trabalho:
a) Não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho;
b) Possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana;
c) Observância do período normal de trabalho acordado.
2 - Na falta de estipulação das partes, aplica-se o disposto na alínea a) do número anterior.
3 - A isenção não prejudica o direito a dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, a feriado ou a descanso diário.
4 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto no número anterior.»
Sob a epígrafe «Retribuição por isenção de horário de trabalho» dispõe o artigo 265º do Código do Trabalho:
«1 - O trabalhador isento de horário de trabalho tem direito a retribuição específica, estabelecida por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou, na falta deste, não inferior a:
a) Uma hora de trabalho suplementar por dia;
b) Duas horas de trabalho suplementar por semana, quando se trate de regime de isenção de horário com observância do período normal de trabalho.
2 - O trabalhador que exerça cargo de administração ou de direcção pode renunciar à retribuição referida no número anterior.
(…)».
Não foi invocado qualquer instrumento de regulamentação coletiva que estabeleça uma retribuição específica pela isenção de horário de trabalho.
Sendo essa a exceção prevista na Lei, não há aqui que considerar o Regulamento (identificado como aprovado por despacho de 7 de agosto de 1991 do Secretário de Estado do Emprego e formação profissional com efeitos a partir de 1/1/1991) - Regulamento e Quadro de Pessoal do A...”.
Também a este respeito, assiste razão ao Apelante quando alega que “nunca um regulamento interno poderia afastar em prejuízo do trabalhador qualquer direito deste em matéria de retribuição.
Aliás, o disposto no artigo 265º do Código do Trabalho tem natureza imperativa: não havendo instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável que preveja esta matéria, são obrigatoriamente aplicáveis pelo menos os montantes previstos no seu n.º1”.
O Autor pediu que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de €4.154,73, respeitante às retribuições por isenção do horário de trabalho, devidas e não pagas, referentes ao período entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014.
Com as alterações introduzidas pela Lei nº 23/2012, de 25 de Junho (redação aplicável), o artigo 268º do Código do Trabalho dispunha:
«1 - O trabalho suplementar é pago pelo valor da retribuição horária com os seguintes acréscimos:
a) 25 % pela primeira hora ou fração desta e 37,5 % por hora ou fração subsequente, em dia útil;
(…)».
Revoga-se, também nesta parte a sentença recorrida, condenando-se a Ré a pagar ao Autor a título de retribuição por isenção de horário de trabalho, na quantia correspondente a uma horas de trabalho suplementar por semana, no período que decorreu entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014, considerando-se os acréscimos que decorrem do quadro legislativo que se consignou, a liquidar em incidente de liquidação – artigos 609º, nº2 e 358º, nº2 do Código de Processo Civil.

3.3.3. Ajudas de custo.
A este respeito, lê-se na sentença recorrida:
“Pede, também, o autor que a ré seja condenada a pagar a quantia de €34.962,84 respeitante às ajudas de custo devidas e não pagas pelas deslocações entre Porto e Braga em automóvel próprio no período de 1/7/2014 (no pedido refere 2015, mas é manifesto tratar-se de um lapso de escrita) e 12/6/2018 e as que se venham a vencer a partir de 12/6/2018 enquanto subsistir a relação de trabalho entre as partes.
Alega o autor que a ré a partir de 1/7/2014 deixou de lhe pagar as ajudas de custo que lhe pagava por força da passagem do seu posto de trabalho para Braga, sendo as mesmas devidas.
Da factualidade dada como assente resulta que no dia 19/10/2012 foi deliberada pela ré a nomeação do autor, em regime de comissão de serviço, como Diretor da agência ..., comissão essa que cessou em 30/6/2014.
Aquando dessa nomeação a ré aprovou que, caso o autor cessasse essa comissão de serviço, ficaria com a categoria de Técnico-Adjunto de Grau I, nível 4, escalão 1.
E aprovou que no exercício de funções em Braga e por razões legais o autor teria direito a receber as deslocações em viatura própria nos dias úteis do Porto para Braga e vice-versa.
A questão que se nos coloca é a de saber se o pagamento dessas ajudas de custo foi previsto para o período em que vigorasse essa comissão de serviço como Diretor da agência ... ou se tal pagamento teria também que ocorrer quando cessasse tal comissão e o autor passasse a exercer as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, nível 4, escalão 1 e se vigorava para outras posteriores comissões de serviço.
Analisado o contrato cuja cópia se encontra junta a fls. 21/22 verificamos que as partes acordaram que o autor iria desempenhar as funções de Diretor da agência ..., auferindo a retribuição mensal ilíquida de €1.000,00 e que o local da prestação do trabalho será a agência ... ou qualquer outra instalação da ré que o exercício de funções determine.
As partes acordaram ainda que “após a cessação da comissão de serviço, o trabalhador permanecerá aos serviços da A..., sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, escalação 2”.
O local de trabalho previsto nesse contrato foi, assim, a agência ..., sendo que a ré pagou ao autor, enquanto essa comissão de serviço existiu, uma verba de ajudas de custo respeitante às deslocações em viatura própria entre Porto e Braga.
Após a cessação dessa comissão e tendo o autor passado a ser trabalhador da ré com a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, escalação 2 deixou de lhe pagar esse valor. E também nada pagou a esse título quando existiu uma outra comissão de serviço posterior.
Salvaguardando o devido respeito por opinião contrária, não se nos afigura que o autor tenha direito a exigir o pagamento de qualquer montante a esse título a partir de 1/7/2014 por falta de fundamento legal para o efeito.
É que, a partir dessa data, o autor passou a ser trabalhador da ré com a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, escalação 2 e sendo o seu local de trabalho – aceite pelo mesmo – a agência ....
É certo que a ré deliberou, em 19/10/2012, pagar a autor as deslocações em viatura própria nos dias úteis do Porto para Braga e vice-versa. Mas fê-lo no mesmo ato em que deliberou a sua nomeação, em comissão de serviço, como diretor da agência .... Afigura-se-nos que essas ajudas de custo foram aprovadas para o período de tempo em que durasse essa comissão. A verdade é que após a cessação desta o autor passaria a ser trabalhador da ré e o seu local de trabalho seria a agência ..., não sendo acordado entre as partes qualquer pagamento a título de ajudas de custo.
Não existe qualquer estipulação no contrato outorgado entre as partes que confira ao autor o direito irreversível de receber qualquer ajuda de custo pelas deslocações entre Porto e Braga, cessada essa comissão de serviço.
Assim, cessada a mesma cessa também o fundamento para o pagamento de tal subsídio, sem que isso implique violação do princípio da irredutibilidade da retribuição.
Em consequência, devem improceder os pedidos formulados nas alíneas c) e d) da petição inicial.”
Refere o Apelante:
- O fundamento para o pagamento de ajudas de custo nunca reside na categoria profissional do trabalhador, e sim no facto de este ter de suportar despesas na realização da sua atividade ao serviço da entidade empregadora, nomeadamente com deslocações.
- Anteriormente à celebração do contrato de comissão de serviço, e desde a sua admissão ao serviço da Recorrida, o local de trabalho do Recorrente foi sempre o Porto, sendo legalmente legítima e fundada a sua expectativa de que, cessando o contrato de comissão de serviço celebrado para aquele cargo de Diretor da agência ... - necessariamente a desempenhar em Braga - voltaria a desempenhar a sua atividade ao serviço da Recorrida no local inicial da execução do seu contrato, uma vez que nada foi previsto no contrato de comissão de serviço para o período seguinte ao da sua cessação.
- Não acordou na alteração do seu local de trabalho para Braga após a comissão de serviço: tal local de trabalho ficou apenas definido no contrato de comissão de serviço mediante o qual o Recorrente aceitou exercer funções como Diretor da agência ... e, portanto, para o período correspondente ao exercício dessas funções.
- O facto de se ter estabelecido a atividade e categoria profissional do Recorrente quando cessasse a comissão de serviço não pode significar que a tal atividade seriam aplicáveis as restantes condições acordadas no contrato de comissão de serviço.
- Cessando a comissão de serviço, que deveria ser exercida em Braga, e não tendo o Recorrente regressado ao seu local de trabalho anterior (o Porto), é forçoso entender que a Recorrida determinou unilateralmente que o Recorrente exerceria as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2, em Braga.
- Mantendo-se o Recorrente a desempenhar, ao serviço da Recorrida, funções que implicavam que se deslocasse diariamente entre Porto e Braga, é manifesto que tinham de lhe ser pagas por esta as respetivas ajudas de custo, a partir de 01 de julho de 2014, por cada deslocação.
Concluiu, em suma:
- A sentença recorrida deverá ser revogada na parte que julgou improcedente o pedido de pagamento de ajudas de custo pelo Recorrente, sendo substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente ajudas de custo por cada dia útil de trabalho que prestou a partir de 01 de julho de 2014 (deduzidos, pois, os fins de semana, feriados e 22 dias úteis de férias em cada ano) até à data em que cessou a relação laboral que o vinculava à Ré, correspondentes a 109 km x 0,36 € por km, por cada dia útil de trabalho.
- Mesmo que se entenda que o fundamento para o pagamento de ajudas de custo no período anterior fora o desempenho da atividade pelo Recorrente em regime de comissão de serviço, sempre seria de condenar a Recorrida pagar ajudas de custo pelo menos no período compreendido entre 20 de julho o de 2016 e 10 de abril de 2017, em que o Recorrente desempenhou as funções de Coordenador da Unidade Local ..., tendo a sentença entendido que o fez em regime de comissão de serviço.
Como se salientou já, resultou provado que a partir de 1 de Abril de 2009, o Autor passou a exercer para a Ré funções de Delegado da Região Norte, na agência do Porto, sem prejuízo das respetivas deslocações em serviço a outras delegações da Ré (itens 7 e 8 dos factos provados)
E ficou provada a aceitação da alteração do local de trabalho?
Entendemos que não, tendo sido acordado tão só a atividade que o Autor passaria a exercer, após cessar a comissão de Diretor da Agência ..., prevendo-se assim a sua permanência na Ré.
Importa atender ainda a esta factualidade:
- No dia 22 de outubro de 2012, o Autor e a Ré subscreveram o “acordo de comissão de serviço” cuja cópia se encontra junta a fls. 21 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando desse acordo designadamente que:
1. O TRABALHADOR desempenhará em regime de comissão de serviço, funções de Diretor da Agência ... dependente do Administrador do pelouro (…)
2. O TRABALHADOR auferirá a retribuição mensal base correspondente ilíquida de €1.000,00 (…)
3. As partes acordam no estabelecimento do regime de isenção de horário de trabalho ao abrigo do disposto no artigo 218.º do código do Trabalho e na modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 219.º
4. (…) Após a cessação da comissão de serviço, o trabalhador permanecerá ao serviço da A..., sendo-lhe atribuída a categoria profissional de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2.
5. (…) Nos casos omissos, aplicar-se-á o disposto no Código do Trabalho e na legislação especial que o complementa ou regulamenta, bem como no Regulamento e Quadro de Pessoal e Ordens de Serviço em vigor no A.... (item 17 dos factos provados)
- Durante o tempo que durou o desempenho das funções de Diretor da Agência ..., a Ré pagou ao autor a retribuição base de €1.000,00. (item 18 dos factos provados)
- E pagou ao Autor um valor por kms percorridos de acordo com o valor pago aos trabalhadores em funções públicas. (itens 19 e 53 dos factos provados)
- No dia 31 de janeiro de 2014 a Ré comunicou ao autor que as funções de Diretor da Agência ... terminariam em 1 de abril de 2014, sendo que a cessação efetiva dessa comissão de serviço se concretizou em 30 de junho de 2014. (item 20 dos factos provados)
- Em consequência dessa cessação o autor passou a exercer as funções de Técnico Adjunto de Grau I, Nível 4, escalão 2. (item 21 dos factos provados)
- A partir dessa altura passou a auferir uma retribuição base mensal de €839,53. (item 22 dos factos provados)
- O Autor continuou a exercer a sua atividade na agência .... (item 23 dos factos provados)
- A Ré deixou de pagar ao autor esse valor por km de acordo com o valor pago aos trabalhadores em funções públicas, a partir do momento em que o mesmo passou a exercer as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2. (item 24 dos factos provados)
- No dia 11 de abril de 2017 o autor terminou as funções de Coordenador da Unidade local .... (item 35 dos factos provados)
Não tendo resultado acordada a alteração do local de trabalho, antes e tão só que a categoria do Autor passaria a ser Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2, suprimir-se o valor pago por Kms percorridos nas deslocações entre Porto e Braga, implicou uma redução da retribuição do Autor.
É certo que nos termos do disposto no artigo 260º, nº1, alínea a) do Código do Trabalho, não se consideram retribuição «As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respetivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador;».
Como nada foi previsto no contrato de comissão de serviço para o período seguinte ao da sua cessação, em termos de local de trabalho, importa considerar que no contrato inicial ficou previsto que o Autor exercia funções na agência do Porto, sem prejuízo das respetivas deslocações em serviço a outras delegações da Ré, sendo então a retribuição base ilíquida no montante de €2.100,00.
Tendo posteriormente e desde que passou a desempenhar funções de Diretor da Agência ..., a Ré pago ao Autor, para além da retribuição base de €1.000,00, um valor por kms percorridos de acordo com o valor pago aos trabalhadores em funções públicas, continuando o Autor, cessada essa comissão de serviço, a exercer a sua atividade na agência ..., exercendo as funções de Técnico-Adjunto de Grau I, Nível 4, Escalão 2, passando a retribuição base mensal a ser de €839,53, as importâncias relativas a tais deslocações frequentes devem considerar-se elemento integrante da retribuição do Autor.
Aponta o Apelante que o Tribunal não considerou provado que entre a residência do Recorrente e a agência da Recorrida em Braga a menor distância possível fosse de 54,5km, por não ter sido feita qualquer prova concreta disso nos autos, mas esta não é matéria sujeita a prova, nos termos do artigo 412º do Código de Processo Civil, pois trata-se de um facto notório, porque é do conhecimento geral.
Como referido supra, não é um facto notório, impondo-se relegar para liquidação em incidente de liquidação – artigos 609º, nº2 e 358º, nº2 do Código de Processo Civil.
Procede assim a apelação quanto ao reclamado pagamento das despesas pelos quilómetros percorridos entre a residência do Autor e a Agência ... da Ré, por cada dia útil de trabalho que prestou a partir de 01 de julho de 2014 (deduzidos os fins de semana, feriados e 22 dias úteis de férias em cada ano) até à data em que cessou a relação laboral que o vinculava à Ré, 11 de abril de 2017, a liquidar em incidente de liquidação.

3.3.4. Despesas de representação:
Alega o Apelante que peticionou que a Apelada fosse condenada a pagar-lhe o montante fixo de €518,81, a partir de 11/05/2017, até à cessação da relação de trabalho ente as partes.
Importa atender à factualidade provada:
- Enquanto trabalhador da Ré o Autor exerceu, entre 20 de julho de 2016 e 10 de abril de 2017, as funções de Coordenador da Unidade Local ..., tendo sido nomeado como Coordenador dessa Unidade local por deliberação do Conselho de Administração da Ré em reunião de 18/7/2016. (item 28 dos factos provados)
- A partir dessa data o Autor passou a exercer as funções de Coordenador da Unidade local .... (item 29 dos factos provados)
- A partir dessa data a Ré passou a pagar ao autor o montante de €518,81 mensais a título de “despesas de representação”. (item 30 dos factos provados)
- Esse montante foi sempre pago ao autor enquanto o mesmo exerceu funções de Coordenador da Unidade local .... (item 31 dos factos provados)
- Essas “despesas de representação” destinavam-se a permitir ao Autor custear os próprios gastos inerentes à dignidade da função de representação da Ré, sendo atribuídas pela Ré a cargos dirigentes. (item 32 dos factos provados)
- No dia 11 de abril de 2017 o Autor terminou as funções de Coordenador da Unidade local .... (item 35 dos factos provados)
- No mês de abril de 2017 a Ré procedeu ao pagamento ao autor do montante de €518,81 a título de “despesas de representação”. (item 38 dos factos provados)
- No mês de maio de 2017 a Ré procedeu ao desconto no vencimento do autor da quantia de €345,87 de despesas de representação e procedeu ao pagamento de €518,81 a título de “aviso prévio”. (item 39 dos factos provados)
Conclui o Apelante que também desta vez não foi celebrado entre Recorrente e Recorrida qualquer contrato de comissão de serviço para o exercício de tal cargo de Coordenador da Unidade Local ..., ao arrepio do que impõe o nº 4 do artigo 162º do Código do Trabalho, o que tem de significar que o exercício das funções de Coordenador da Unidade Local ... pelo Recorrente foi feito ao abrigo do contrato de trabalho que o vinculava à Recorrida, não tendo sido estipulado por período temporário, sendo vedado à Recorrida mudar posteriormente o Recorrente para categoria inferior sem o seu acordo.
Ainda que a sentença violou o disposto nos artigos 119º e na alínea e) do artigo 129º do Código do Trabalho.
Por seu turno, na resposta ao parecer do Exm.º Procurador Geral Adjunto, defende a Apelada que o cargo de Coordenador não é uma categoria profissional, pelo que não se lhe ascende por progressão na carreira nem por promoção, sendo exclusivamente exercido por nomeação, em comissão de serviço, e como cargo de chefia que é, por período forçosamente limitado ao tempo em que a cada momento a Administração entenda.
Pretender que uma pessoa possa ter o direito vitalício a um lugar de chefia numa estrutura como a Fundação A..., ao arrepio dos seus Estatutos e do seu regulamento seria ilegal e abusivo.
Resultando assente que as despesas de representação estavam exclusivamente ligadas às funções de chefia, deixaram de ser devidas quando as referidas funções deixaram de ser exercidas.
Valem aqui as considerações supra efetuadas, a propósito da exigência de forma para a comissão de serviço.
Ainda assim e atento o decidido em sede de impugnação da matéria de facto, afigura-se nos que a factualidade provada não permite aferir, sem mais, ter sido alterada a categoria profissional do Autor para Coordenador da Unidade Local ..., em 20 de Julho de 2016 (item 28 dos factos provados).
Subsequentemente, com esta ponderação, acompanhamos a fundamentação da decisão recorrida, a qual temos como bastante no excerto que se transcreve:
“Quanto ao montante pago ao autor a título de despesas de representação dir-se-á o seguinte:
Tal como é mencionado no acórdão do STJ de 31/3/2009, processo 09A0556, disponível em www.dgsi.pt “As chamadas “despesas de representação”, tanto podem assumir a natureza compensatória como remuneratória, consoante correspondam à designação conceptual “tout court”, ou assuma a forma de um efetivo e constante suplemento remuneratório, indissociavelmente ligado à remuneração base de que depende, por forma regular, contínua e periódica.
Têm natureza compensatória quando são atribuídas para através delas os gestores ou diretores de institutos públicos custearem os próprios gastos inerentes à dignidade da função representativa que exercem, não podendo socorrer-se de outros meios para os cobrir, ou quando não assumam carácter de regularidade, continuidade e periodicidade.
Têm carácter remuneratório quando as efetivas despesas de representação se encontram previstas no contrato de nomeação com carácter regular, contínuo e periódico acompanhando sempre o vencimento e assim sejam consideradas pelos usos, de tal modo que não é à luz dessa atribuição que são feitos os pagamentos das efetivas despesas de representação.”
No caso em apreço, a ré é uma pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública, dotada de personalidade jurídica, com duração indeterminada, de acordo com o preceituado no art. 4.º do DL 106/2008.
Da prova testemunhal produzida resultou que os cargos de chefia exercidos na ré eram exercidos em comissão de serviço e que quem os exerce recebe mensalmente uma verba a título de “despesas de representação” que visa custear os gastos inerentes à dignidade da função de representação da ré variando o montante pago a esse título consoante a importância do cargo e a importância dos poderes de representação da ré.
Conforme é referido no Parecer da Procuradoria-Geral da República nº 109/98, de 29 de Março, in D.R., II Série, de 31/5/90, e nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 25.11.1992, processo nº 082602, e de 11.12.2003, processo nº 03A3713, “as despesas de representação não são, em princípio, vencimento, tendo natureza diferente dele, pois não se destinam a remunerar serviços prestados mas a custear encargos que o prestador dos serviços, por causa dessa prestação, tenha suportado ao representar a entidade beneficiária destes”.
“Tal abono é, no fundo, um vencimento acessório destinado a compensar os encargos sociais extraordinários que resultem normal e correspondente do exercício do cargo - desde os atos de cortesia individual, passando pelas exigências de vestuário, os gastos, enfim, que a pessoa investida no cargo tem necessariamente de fazer por causa do seu desempenho - e que se não fosse isso poderia dispensar-se de efetuar, tendo por isso o carácter de um abono indemnizatório que, como tal, deve reverter a favor de quem, estando legalmente investido no desempenho do cargo, ficou sujeito às despesas determinadas pelo exercício da função para acorrer às quais a lei o atribuiu”.
No caso em apreciação o montante pago a título de despesas de representação visava permitir ao autor custear os gastos inerentes à dignidade da função de representação da ré.
Como é evidente teremos de excluir da determinação da retribuição aquelas prestações cuja causa determinante não seja a prestação da atividade pelo trabalhador, ou a sua disponibilidade para o trabalho, mas tenham uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este.
É certo que o trabalhador goza da presunção de integrar a retribuição qualquer prestação que lhe é paga pelo empregador pois bastar-lhe-á provar a perceção duma prestação pecuniária, competindo à entidade patronal a prova da não verificação dos elementos integrantes do conceito legal de retribuição.
A verdade é que no caso em apreço, ante o que resultou provado entendemos que a ré logrou fazer a prova que as despesas de representação pagas resultam duma causa específica e perfeitamente individualizável, diversa da contrapartida do trabalho, ou da disponibilidade para o trabalho.
O pagamento das denominadas “despesas de representação” têm efetivamente uma causa específica, mais propriamente a circunstância de o trabalhador ter gastos acrescidos pelo facto de ter funções de representação da ré, sendo um dirigente, ainda que localmente, da ré, destinando-se a compensar os encargos sociais extraordinários que resultem do normal e correspondente do exercício do cargo.
Assim sendo, não integrando a remuneração mensal, as despesas de representação não podem ser tomadas em consideração para cálculo dos subsídios de férias e de Natal.
Ante todo o exposto, devem improceder os pedidos formulados nas alíneas e) a i) da petição inicial.
E isto porque não sendo procedendo o pedido do autor de o classificar com a categoria de Coordenador de Unidade não tem o mesmo qualquer direito a receber as retribuições complementares não pagas entre 11/5/2017 e 12/6/2018 e o montante de €518,81 a partir de 12/6/2018 e enquanto subsistir a relação laboral.
E não se considerando as despesas de representação qualquer retribuição as mesmas não podem ser tomadas em consideração para cálculo dos subsídios de férias e de Natal.” (sublinhado nosso)
Em suma, ainda que da factualidade assente resulte que após o Autor terminar, no dia 11 de abril de 2017, as funções de Coordenador da Unidade local ..., não resultou provado que a Ré continuasse a pagar a quantia de €518,81 que foi paga desde que exerceu tais funções, afigura-se-nos que a factualidade provada, - as “despesas de representação” destinavam-se a permitir ao Autor custear os próprios gastos inerentes à dignidade da função de representação da Ré, sendo atribuídas pela Ré a cargos dirigentes - não permite aferir que também a respeito destes montantes, ocorreu uma diminuição da retribuição, o que estaria vedado ao Empregador, nos termos previstos no artigo 129, nº1, alínea d) do Código do Trabalho.
Em consequência, improcede a apelação quanto ao reclamado pagamento, a título de diferenças salariais, a partir de 11/05/2017, até à cessação da relação de trabalho ente as partes.
Impõe-se como tal e em conformidade, revogar parcialmente a sentença recorrida.

4. Decisão:
Em conformidade, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente o recurso, revogando-se a sentença recorrida e condenando-se a Ré a pagar ao Autor:
1. A título de retribuição por isenção de horário de trabalho:
a) na quantia correspondente a duas horas de trabalho suplementar por semana, no período que decorreu entre 01 de abril de 2009 e 30 de setembro de 2012.
b) na quantia correspondente a uma horas de trabalho suplementar por semana, no período que decorreu entre 23 de outubro de 2012 e 30 de junho de 2014.
Importâncias a liquidar em incidente de liquidação.
2. A título de ajudas de custo:
No pagamento das despesas pelos Kms percorridos, entre a residência do Autor e a Agência ... da Ré, por cada dia útil de trabalho que prestou a partir de 01 de julho de 2014 (deduzidos os fins de semana, feriados e 22 dias úteis de férias em cada ano) até à data em que cessou a relação laboral que o vinculava à Ré, 10 de abril de 2017, a liquidar em incidente de liquidação.
A tais importâncias acrescem juros de mora, devidos desde a data em que cada uma das importâncias, em causa, deveria ser paga.
Confirmar no mais a decisão recorrida.
Custas da ação e da apelação pela Apelada e Apelado, na proporção do respetivo decaimento.

Porto, 15 de Janeiro de 2024
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão
Paula Leal de Carvalho