Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00038206 | ||
Relator: | ANTÓNIO GAMA | ||
Descritores: | NULIDADE INSANÁVEL | ||
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Nº do Documento: | RP200506220447403 | ||
Data do Acordão: | 06/22/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC. PENAL. | ||
Decisão: | PROVIDO PARCIALMENTE. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | Se, findo o inquérito, o Mº Pº, em relação a um crime semi-público, ordena a notificação prevista no artigo 285 do CPP98, e o assistente deduz acusação particular, à qual adere o Ministério Público, ocorre a nulidade de conhecimento oficioso do artigo 119, alínea b), do referido código. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: O Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira de Azeméis decidiu, entre o mais que agora irreleva, o seguinte: No que respeita à responsabilidade penal: a) Julgar a acusação improcedente, por não provada, quanto à prática por cada um dos arguidos B..........., C............. e D............. de um crime de ofensa à integridade física e quanto ao último, ainda de um crime de dano, por que vinham acusados, em consequência do que foram absolvidos; b) Julgar as acusações públicas e particulares deduzidas nos autos contra o arguido E........... procedentes, por provadas, nos moldes demonstrados, em consequência do que foi condenado, como autor material e em concurso real, de dois crimes de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143º, n.º 1, do Cód. Penal, de três crimes de ameaça, p. e p. pelo art.º 153º, nos 1 e 2, do Cód. Penal, e de três crimes de injúria, p. e p. pelo art.º 181º, n.º 1, do mesmo diploma legal, nas seguintes penas: - 140 (cento e quarenta) dias de multa, à razão diária de € 2,50 (dois Euros e cinquenta cêntimos), por cada um dos crimes de ofensa à integridade física; - 85 (oitenta e cinco) dias de multa, à mesma razão diária, por cada um dos crimes de ameaça; - 70 (setenta) dias de multa, à mesma razão diária, por cada um dos crimes de injúria de que foram vítimas o C.......... e o D........., e 60 (sessenta) dias de multa, ainda à taxa de € 2,50 por dia, pelo crime de injúria de que foi vítima o B............ . Em cúmulo jurídico dessas penas de multa, foi o arguido condenado na pena unitária de 400 (quatrocentos) dias de multa, à razão diária de € 2,50 (dois Euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a multa global de € 1.000,00 (mil Euros). No respeitante á responsabilidade cível: a) Julgar inteiramente improcedentes, por não provados, os pedidos de indemnização civil formulados nos autos pelo arguido/demandante E........... e pelo lesado Hospital Distrital de S. João da Madeira contra os arguidos/demandados B............, C........... e D..........., em consequência do que deles foram absolvidos; b) Julgar parcialmente procedentes, por apenas parcialmente provados, os pedidos de indemnização civil deduzidos por cada um dos demandantes B........., C.......... e D.......... contra o demandado E..........., em consequência do que, foi absolvido no mais, e condenado a pagar: - ao B........., a quantia global de € 420,00 (quatrocentos e vinte Euros) pelos danos não patrimoniais que este sofreu em consequência das ameaças e das injúrias de que foi vítima, respeitando € 250,00 (duzentos e cinquenta Euros) ao primeiro crime e € 170,00 (cento e setenta Euros) ao segundo; - ao C..........., a quantia global de € 700,00 (setecentos Euros) pelos danos não patrimoniais que este sofreu em consequência das ameaças, injúrias e ofensa à integridade física de que foi vítima, respeitando € 250,00 (duzentos e cinquenta Euros) ao primeiro crime, € 170,00 (cento e setenta Euros) ao segundo crime, e € 280,00 (duzentos e oitenta Euros) ao terceiro crime; - ao D..........., a quantia global de € 700,00 (setecentos Euros) pelos danos não patrimoniais que este sofreu em consequência das ameaças, injúrias e ofensa à integridade física de que foi vítima, respeitando € 250,00 (duzentos e cinquenta Euros) ao primeiro crime, € 170,00 (cento e setenta Euros) ao segundo crime, e € 280,00 (duzentos e oitenta Euros) ao terceiro crime. Inconformado recorreu o arguido E............. alegando em síntese[Conclusões que o recorrente em patente violação do art.º 412º n.º 1 do Código Processo Penal não apresenta, pois num entorse interpretativo não admissível limita-se a quase repetir e reproduzir em sede de conclusões as precedentes alegações] que a pena pecuniária aplicada é elevada não tendo sido considerada a declaração/confissão do arguido que admitiu ter injuriado os ofendidos; que a pena deveria ter sido declarada suspensa; que a prova foi incorrectamente avaliada nomeadamente desvalorizando a prova produzida pela testemunha F........... em detrimento de outras o que gera a nulidade da sentença; que os arguidos D.......... e C......... deveriam ter sido condenados pelos crimes de que eram acusados; Que os valores indemnizatórios em que foi condenado são exagerados e devem ser reduzidos. Na 1ª instância o Ministério Público e os assistentes/arguidos pronunciaram-se pela improcedência do recurso. Já neste tribunal o Ex.mo Procurador Geral Adjunto foi de igual parecer, suscitando, no entanto, como questão prévia a ocorrência das nulidades insanáveis elencadas no art.º 119º n.º 1 al. b) e e) do Código Processo Penal. Cumprido o disposto no art.º 417º n.º 2 do Código Processo Penal, nada disseram recorrente e recorridos. Após os vistos realizou-se audiência não tendo sido suscitadas novas questões. Factos Provados: a) Pelas 16:00 horas do dia 01 de Março de 2002, na via pública, no ............, em ......... - Oliveira de Azeméis, junto à entrada de acesso a uma propriedade pertencente ao arguido E............, em cujo muro de vedação o mesmo se encontrava então a trabalhar, os arguidos B.......... e C........... abordaram-no e o primeiro, invocando a sua qualidade funcional de Presidente da Junta de Freguesia de ........, questionou-o acerca da licença para a execução de tal obra; b) Por causa de tal interpelação, e porque a dada altura interveio também o arguido C..........., com quem, por razões relacionadas com a utilização do caminho público de acesso a essa propriedade e à do arguido C........., o arguido E............ não se dava, este exaltou-se, gerando-se uma discussão entre todos; c) No decurso dessa discussão, e tendo entretanto ali chegado também o arguido D............, o E.......... dirigiu-se àqueles e a este dizendo “Ide-vos foder”, “não tenho medo nenhum de vós”, “eu passo isto para o nome dos meus filhos e fodo-vos a todos” e chamando-lhes “filhos da puta”; d) Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, e dirigindo-se desta feita ao C.......... e ao D.........., chamou aos mesmos “cabrões” e “ladrões” e disse-lhes “corto o pescoço a todos” e “eu estoiro-vos a cabeça”, dizendo ainda ao C.......... “não vales nada” e “és um bandido”; e) Proferiu tais palavras e expressões por várias vezes, sempre em voz alta e por forma a poder ser ouvido por todos quantos ali se encontravam; f) De seguida voltou-se para a sua esposa, ali também presente, e disse: “Vai lá para dentro com a menina que eu vou buscar a espingarda e resolvo a situação”, e fez menção de ir ao seu veículo automóvel ligeiro de mercadorias com a matrícula ..-..-NB, que ali se encontrava estacionado, encostado à entrada referida em a), mas em sentido contrário ao do trânsito; g) Em lugar disso, e continuando a insultar os co-arguidos B.........., C.......... e D........., o E.......... agarrou num tubo de ferro que de um lado termina numa ponteira e do outro lado numa pá, e que se encontrava encostado ao muro da sua propriedade, pelo exterior, e com ele agrediu o C............, desferindo-lhe uma pancada nos lábios; h) Acto contínuo agrediu o D............, que agarrara o dito ferro com o propósito de lho retirar das mãos, atingindo-o com as unhas na cara e no olho esquerdo; i) Depois de assim ser desapossado de tal objecto, o E............. contornou pela direita o veículo automóvel referido em f) e, quando estava já a passar pela frente do mesmo, junto ao muro, caiu ao chão; j) Então, o C........ e o D............ agarraram-no e seguraram-no naquela posição até que chegasse a G.N.R., entretanto chamada telefonicamente ao local pelo B...........; l) Pelas 18:54 horas do mesmo dia 1 de Março de 2002 o arguido E............ recorreu e foi assistido nos serviços de urgência do Hospital Distrital de S. João da Madeira, apresentando então escoriações na região fronto-parietal direita, equimose da pálpebra inferior esquerda, escoriação na hemiface direita e dor com limitação da mobilidade do ombro direito, bem como edema na face anterior do joelho direito com alguma limitação da sua mobilidade, lesões essas que lhe causaram dores e demandaram para a sua consolidação cento e vinte e cinco dias de doença com incapacidade total para o trabalho; m) Tal assistência importou para a referida entidade hospitalar despesas no valor global de € 37,43; n) Em consequência das lesões referidas na alínea l), após ter sido assistido no Hospital Distrital de S. João da Madeira, o E.......... ficou em regime de tratamento ambulatório e de consulta externa de ortopedia e teve de efectuar tratamentos de fisioterapia; o) Teve ainda que efectuar ecografias, radiografias e tratamentos em clínicas da especialidade, bem como tomar vários medicamentos; p) Em tais tratamentos e medicamentos o mesmo teve despesas; q) O mesmo ficou com algum dificuldade de flexão do joelho direito; r) O E............. é proprietário e vive dos rendimentos (rendas) de casas de habitação por si construídas, bem assim como da pensão de reforma que aufere, no montante mensal aproximado de € 200,00; s) Antes de 1 de Março de 2002 passava algum do seu tempo livre na caça; t) São más as relações entre ele e os seus vizinhos; u) Como consequência directa e necessária da actuação do arguido E.........., referida nas alíneas g) e h), o C............. sofreu pequenas escoriações ao nível da metade esquerda do lábio superior e traumatismo do dente incisivo superior, as quais lhe causaram dores e foram determinantes de 5 dias de doença, com igual período de incapacidade para o trabalho, e o D........... sofreu escoriações no canto interno da pálpebra inferior do olho esquerdo, na região jugal esquerda e na região naso-labial esquerda, as quais lhe causaram dores e foram determinantes de 5 dias de doença, com igual período de incapacidade para o trabalho; v) Nesse período o C............ sentia humilhação quando tinha que se apresentar publicamente com os ferimentos e tinha que explicar o sucedido; x) Em consequência das expressões que o E........... lhes dirigiu, referidas nas alíneas c), d) e f), o B........., o C............ e o D......... ficaram com medo de que aquele concretizasse as ameaças feitas e os matasse; z) Ao actuar pela forma acabada de descrever nas alíneas c) a h), fê-lo o E.......... de livre vontade e conscientemente, com o propósito de atingir a integridade física do C...... e do D.........., bem como com o propósito de ofender os mesmos e o B......... na sua honra e consideração, como de facto ofendeu, e com conhecimento que as ameaças que lhes dirigiu eram adequadas a provocar-lhes medo; aa) Era também do conhecimento do E........... que tais condutas eram proibidas e punidas por lei; bb) Em virtude das palavras e expressões que o E........... lhe dirigiu, o B........ sentiu-se envergonhado e desgostoso, sentimento esse agravado pelo facto de ser o Presidente da Junta daquela freguesia; cc) O B.........., que é casado, é Presidente da Junta de Freguesia de ..........., funções que acumula com a sua actividade profissional de industrial gráfico, como tal auferindo os vencimentos de, respectivamente, cerca de € 750,00 e de € 240,00; dd) O C............ é casado e está reformado há cerca de dois anos, com a pensão de reforma de cerca de € 381,00 mensais; por sua vez, a esposa é empregada de limpeza com o salário mensal equivalente ao mínimo nacional; ee) O D.......... é casado e é trolha de profissão, com o salário mensal aproximado de € 500,00; é com esse referido montante e com o vencimento auferido pela sua esposa enquanto empregada comercial que ambos fazem face às despesa do lar, composto ainda pelo filho de ambos, de 2 anos de idade; ff) Por sua vez, o E........... está reformado desde Julho de 2003, não exercendo a sua esposa qualquer actividade remunerada; gg) Nenhum dos arguidos tem antecedentes criminais conhecidos. Factos não provados: - Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas nas alíneas a) a d) da factualidade provada os arguidos D.......... e C.......... tenham desferido diversos murros e pontapés em várias partes do corpo do E............; - Quando o arguido E......... passava pela frente do seu carro, nas circunstâncias relatadas na alínea i) dos factos provados, o arguido B.......... lhe tenha desferido um empurrão; - Tenha sido por tal facto que o E............ caiu ao chão; - Então, em acto contínuo, o D............ e o C.......... se tenham aproximado novamente do E............ e, enquanto este estava no chão, lhe tenham desferido diversos pontapés por várias partes do corpo, designadamente no rosto, nas pernas, nos ombros, na nuca, na parte traseira do pescoço e em outras partes da cabeça; - As lesões descritas na alínea l) dos factos provados tenham sido consequência da descrita actuação do B........., do C......... e do D..........; - Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar referidas na alínea a) da factualidade provada, o D.......... tenha desferido diversas pancadas com um objecto cujas concretas características não se logrou apurar sobre o veículo identificado na alínea f), causando-lhe diversas mossas no painel lateral esquerdo; - Com esta conduta o D.......... tenha causado ao E............ um prejuízo correspondente ao valor dos estragos provocados no veículo, no valor € 233,44 (duzentos e trinta e três Euros e quarenta e quatro cêntimos); - O B.........., o C....... e o D........... tenham agido de livre vontade e conscientemente, com a intenção de causar lesões corporais ao E............; - Tenha sido também propósito do D.......... causar danos no veículo do E............., sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que agia contra a vontade do seu legitimo proprietário; - O B........., o C.......... e o D.......... soubessem que essas suas condutas eram proibidas e punidas por lei; - Em virtude das lesões referidas na alínea l) da factualidade provada o E.......... tenha estado de cama e impossibilitado de se movimentar durante pelo menos três meses; - Durante esse período não pudesse conduzir a sua viatura, sendo o seu filho quem o levava ao hospital, aos tratamentos de enfermagem, às clínicas, aos gabinetes de radiologia e ao Instituto de Medicina Legal; - Tenham sido intensas as dores sofridas pelo E.........., referidas na alínea l) dos factos provados; - Tais dores se tenham prolongado por todo o período do tratamento, o que o impedia de dormir; - Na presente data o mesmo ainda sinta dores no joelho direito e no ombro e clavícula direitos; - Não consegue fazer movimentos, nem baixar-se, nem dobra o joelho direito; - Tenha ficado com fortes limitações de movimentos no joelho direito; - Não possa fazer trabalhos que impliquem manuseamento de pesos e movimentações/dobragem do joelho direito; - Não possa fazer os trabalhos de reparação das habitações a que se alude na alínea r) dos factos provados, designadamente colocação de tijoleiras, reparação de canalizações, pinturas, etc.; - O arguido E.......... tenha deixado de poder passar algum do seu tempo livre na caça por não aguentar fazer caminhadas; - O mesmo tenha sentido vergonha e humilhação; - Por causa dos tratamentos a que teve que submeter-se em virtude dos factos relatados na alínea l) da factualidade provada, o E............. tenha suportado despesas com deslocações; - O C......... e o D........... sejam pessoas de bem, respeitadores, trabalhadores e bem considerados no meio social em que vivem, no qual estão plenamente integrados; - As dores sofridas pelo C.......... e referidas na alínea u) da factualidade provada se tenham prolongado por todo o ali mencionado período de doença; - O E........ tenha uma longa história judicial, plena de litígios com todos os vizinhos, quase todos envolvendo violência, pois é pessoa quezilenta e violenta; - Em consequência da conduta do E........, referida nas alíneas c) a g) dos factos provados, o C.......... tenha ficado perturbado, experimentado sentimentos de inibição e retracção, bem como dificuldades de concentração, não conseguindo trabalhar ou dormir bem, sentindo-se nervoso e ansioso; - Os factos praticados por aquele tenham sido bastante comentados, quer no local, por vizinhos, quer por amigos e conhecidos do C...........; - O E........... seja pessoa respeitada e considerada no meio, bem como respeitador das pessoas com quem se relaciona; - Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas na alínea f) da factualidade provada, o E............ só não tenha conseguido ir à sua carrinha buscar uma arma por ter sido impedido pela mulher e pelos co-arguidos C......... e D.......... . O Direito: Importa conhecer desde já as questões prévias suscitadas pelo Ex.mo Procurador Geral Adjunto: a ocorrência das nulidades insanáveis elencadas no art.º 119º n.º 1 al. b) e e) do Código Processo Penal. Falta de promoção do Ministério Público. Entende o Ex.mo Procurador Geral Adjunto que no processo n.º 60/02 findo o inquérito o Ministério Público em vez de determinar o cumprimento do disposto no art.º 285º n.º 1 do Código Processo Penal, deveria ter proferido despacho de acusação ou de arquivamento, artºs 48º, 277º e 283º do Código Processo Penal. Abstendo-se o Ministério Público de exercer a acção penal, quando a lei lhe impunha a promoção oficiosa do processo, ocorre a nulidade insanável prevista na al. b) do n.º 1 do art.º 119º n.º 1 do Código Processo Penal. Conforme refere o Ex.mo Procurador Geral Adjunto no seu proficiente parecer, que aqui se vai seguir de perto, resulta do auto de denúncia do inquérito n.º 60-02, que o ofendido B........... se queixou contra E............, porque, alegadamente, depois de se ter identificado como Presidente da Junta de Freguesia e de lhe ter solicitado a licença de construção do muro que estava a edificar, foi por ele ameaçado e injuriado. Findo o inquérito, o Ministério Público deduziu acusação pelo crime de ameaças (art. 153º, n.º 1 e 2 do Código Penal) e determinou o cumprimento do disposto no art.º 285º, n.º 1 do Código Processo Penal. Na sequência desta notificação, o queixoso e assistente deduziu acusação particular pelo crime de injúria, p. e p. no art.º 181º do Código Penal, a qual foi acompanhada pelo Ministério Público. No entanto, em face do disposto nos artigos 184º e 132º, n.º2 al. j) do Código Penal, o crime de injúria era agravado e de natureza semi-pública pelo que competia ao Ministério Público deduzir acusação pelo mesmo, art.º 188º n.º 1 al. a) do Código Penal. Na verdade, o Presidente de Junta de Freguesia é membro de órgão de autarquia local, mais propriamente da Junta de Freguesia, sendo esta um órgão representativo da freguesia e esta uma das autarquias locais, artºs 2º n.º 1, 23º, n.º 1 e 2 e 38º da Lei n.º 169/99, de 18.9, actualizada pela Lei n.º 5-A/02, de 11.1 e 236º da Constituição. Sendo assim, findo o inquérito no processo n.º 60/02, em vez de determinar o cumprimento do disposto no art.º 285º n.º 1 do Código Processo Penal, o Ministério Público deveria ter proferido despacho de acusação ou de arquivamento, conforme preceituam os artºs 48º, 277º e 283º do Código Processo Penal. Abstendo-se de exercer a acção penal nos termos que a lei lhe impunha, ocorre a nulidade insanável – porque não coberta pelo trânsito da decisão final que não ocorreu [Germano Marques da Silva, Processo Penal, II pág. 79] art.º 32º n.º 1 do Código Processo Penal - prevista na al. b) do n.º 1 do art.º 119º n.º 1 do Código Processo Penal e assento n.º 1/00, de 16.12.99 DR de 6.1.00. Impõe-se, assim, a anulação do processado desses autos 60-02, a partir do despacho [incluído] em que o Ministério Público ordenou o cumprimento do disposto no art.º 285º, n.º 1 do Código Processo Penal, a fim de que, retomando-se a legalidade do processado, o Ministério Público profira despacho final [de arquivamento ou acusação, artºs 277º e 283º do Código Processo Penal]. Mas, como também salienta o Ex.mo Procurador Geral Adjunto, há outro problema que afecta o julgamento dos processos pois foram apensados para julgamento conjunto. Pelo menos dos processos 60-02 e 34-02. Vejamos: Processo n.º 34-02: O arguido E........... foi acusado pelo Ministério Público, em 3.11.03, pela prática de dois crimes de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art.º 143º do Código Penal e dois crimes de ameaça, p. e p. 153º n.º 1 e 2 do Código Penal [foi usado o disposto no art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal]. Posteriormente: A acusação particular de C..........., imputou ao arguido a prática de um crime de injúrias, p. e p. pelo art.º 181º do Código Penal e outro de ameaças, p. e p. pelo art.º 153º n.º1 e 2 do Código Penal. A acusação particular de D..........., imputou ao arguido a prática de um crime de injúrias, p. e p. pelo art.º 181º do Código Penal e outro de ameaças, p. e p. pelo art.º 153º n.º1 e 2 do Código Penal. Foi designado dia para julgamento por todas estas acusações, fls. 93. Fls. 130, foi ordenada a apensação ao processo 35-02. Processo 60-02: O arguido E........... foi acusado em 4.10.02 pela prática de um crime de ameaça, p. e p. 153º n.º 2 do Código Penal. A acusação particular de D.........., imputou ao arguido a prática de um crime de injúrias, p. e p. pelo art.º 181º do Código Penal [esta acusação foi acompanhada pelo Ministério Público fls. 39]. Foram recebidas ambas as acusações fls. 47. Fls. 70, estes autos foram apensados ao 35-02. Se, como vimos, o Ministério Público aquando da dedução de acusação no processo n.º 34-02, fez uso do disposto no art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal, o certo é que, posteriormente, não tomou posição expressa sobre a competência do tribunal limitando-se a acompanhar as acusações particulares deduzidas nesse processo, nem mesmo depois da apensação do processo 60-02 se pronunciou sobre essa questão. O certo é que também ninguém suscitou a questão, nem a mesma foi conhecida oficiosamente. Sendo superveniente o conhecimento do concurso de crimes em virtude da apensação, tal como resulta do art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal, o tribunal singular só podia julgar o arguido E............. se o Ministério Público tivesse feito requerimento nesse sentido, por considerar que não lhe deveria ser aplicada, em concreto, pena superior a cinco anos de prisão. O requerimento previsto no art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal continua a ser necessário mesmo após a sua inicial utilização na acusação, sempre que, por virtude de acusação particular ou apensação de outro processo, se impute ao arguido outro crime. Se em momento anterior o Ministério Público entendeu que não devia ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a cinco anos, a imputação de outro crime impõe que a declaração do Ministério Público se renove, para que o julgamento possa ser realizado pelo tribunal singular. E que essa declaração tem que ser expressa di-lo o art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal: em requerimento. Aliás a excepcionalidade da disposição legal logo inculca que se exige uma posição expressa, ponderada e justificada, atendendo a que a sua actividade se deve pautar a critérios de estrita objectividade, art.º 53º do Código Processo Penal. De outro modo, de acordo com o que se estabelece na alínea b) do n.º 2 do art.º 14º do Código Processo Penal, compete ao tribunal colectivo julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal singular, respeitem a crimes cuja pena máxima, abstractamente aplicável, seja superior a cinco anos de prisão, mesmo quando, no caso de concurso de infracções, seja inferior o limite máximo correspondente a cada crime. E o disposto no art.º 15º Código Processo Penal reforça tal ideia quando, para efeito da determinação da pena abstractamente aplicável, manda levar em conta todas as circunstâncias que possam elevar o máximo legal da pena a aplicar no processo. Ora no caso em apreço no Processo n.º 34-02, logo após o acompanhamento das acusações particulares o Ministério Público deveria ter-se pronunciado pela aplicação do art.º 16º n.º 3, como também após as apensações, o que não ocorreu. É que, quer após as acusações particulares, quer em virtude da apensação de processos, a pena máxima abstractamente aplicável ao arguido E............, era superior a 5 anos de prisão, pelo que o julgamento do processo, dado que o Ministério Público não se socorreu do disposto no art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal, era da competência do tribunal Colectivo. Assim, ocorre também a existência da nulidade insanável prevista na al. e) do art.º 119º do Código Processo Penal, no que respeita ao julgamento do arguido E............... . Temos pois que o julgamento do arguido E............, todo o julgamento do arguido E......... independentemente do processo originário onde foi acusado, está ferido de nulidade insanável prevista na al. e) do art.º 119º do Código Processo Penal, porque foi efectuado pelo tribunal singular quando devia ter sido levado a cabo pelo tribunal colectivo, já que o Ministério Público não se prevaleceu da faculdade prevista no art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal. Acresce que no processo 60-02, em que também é arguido E..........., como o Ministério Público se absteve de exercer a acção penal nos termos que a lei lhe impunha, a nulidade insanável prevista na al. b) do n.º 1 do art.º 119º n.º 1 do Código Processo Penal e assento n.º 1/00, de 16.12.99 DR de 6.1.00, é mais extensa abrangendo a própria acusação. Juntamente com os processos 60-02 e 34-02, acabados de referir, também se realizou o julgamento do processo 35-04, ao qual aqueles foram apensados, pelo que se impõe indagar se os preditos vícios nele se repercutem. No processo 35-02, foram acusados os arguidos B........... [um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. no art.º 143º do Código Penal], C........... [um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. no art.º 143º do Código Penal] e D.......... [um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. no art.º 143º do Código Penal e um crime de dano simples art.º 212º do Código Penal] sendo ofendido o E..........; nos processos em que o E........... é arguido são ofendidos B.........., C........... e D............ Como na acusação, fls. 50, expressamente o Ministério Público convocou o art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal para requerer o julgamento em tribunal singular, resulta que competente para o julgamento deste processo é o tribunal singular. Como há uma pluralidade de arguidos e de processos, a circunstância de o julgamento dos outros processos e do outro arguido, após apensação ao processo 35-02, ter sido realizado pelo tribunal singular, quando deveria ter sido realizado pelo tribunal colectivo, não contamina a decisão recorrida na parte respeitante a este processo, pois os ilícitos imputados aos arguidos mantêm-se os originários, não tendo sido acrescentados por acusação particular ou em consequência de apensação. Daí que este processo fique imune às alegadas nulidades que em nada o afectam, art.º 122º n.º 1 do Código Processo Penal, solução imposta pela consideração do princípio da economia processual. É que no julgamento da matéria destes autos, considerando a acusação deduzida contra os arguidos, foram escrupulosamente respeitadas as regras da competência. Do exposto resulta, quanto aos processos 34-02 e 60-02, que procede a questão prévia suscitada o Ex.mo Procurador Geral Adjunto; quanto ao processo 35-02 impõe-se conhecer do recurso interposto pelo assistente, pois, recordamos, nessa parte foi decidido julgar a acusação improcedente, por não provada, quanto à prática por cada um dos arguidos B.........., C............ e D.......... de um crime de ofensa à integridade física e quanto ao último, ainda de um crime de dano, em consequência do que foram absolvidos. A crítica do recorrente, na veste de assistente, é a de que o C....... e o D............ deveriam ter sido condenados pela prática do crime de ofensas corporais, consistente em terem agarrado e segurado o E.........., pelo que a sentença violou o disposto no art.º 143º do Código Penal além de ter incorrido em nulidade, pois absolvendo os arguidos da prática deste facto e dando-o provado incorre na nulidade do disposto no art.º 668º, n.º 1, als. c.) e d9 do Código de Processo Civil. Depois, sustenta o recorrente, a sentença fez incorrecta aplicação da lei aos factos ao absolver os arguidos D....... e C........... dos pedidos de indemnização contra eles deduzidos. Cumpre liminarmente lembrar ao recorrente que na elaboração do actual Código Processo Penal esteve presente o propósito de estabelecer uma regulamentação total e autónoma do respectivo processo, tornando-o mais independente do processo civil. Isto é notório ao longo de todo o Código Processo Penal e atinge a sua máxima expressão em matéria de recursos. Na verdade, o Código Processo Penal contém, no tocante aos recursos, uma regulamentação completa e exaustiva, que não sofre de qualquer lacuna no que diz respeito aos respectivos fundamentos, art.º 410º do Código Processo Penal. Assim, não pode deixar de concluir-se que inexiste, neste capítulo, caso omisso em processo penal (cfr. art. 4º) que justifique a aplicação do disposto no art. 668º, nº1 al. c.) e d) do C.P.C.. O Código Processo Penal regula autonomamente esses alegados vícios no art.º 410º n.º 2 al. b) e no art.º 379º n.º1 al. c.). Da não condenação dos referidos arguidos faz o recorrente derivar, como face e reverso da mesma realidade, as aludidas nulidades. Ora lendo a factualidade apurada não se vislumbra esse alegado vício de contradição. Improcede também a outra crítica do recorrente: a factualidade apurada nem sequer configura uma conduta penalmente típica. Ora sem conduta sequer típica debalde a procura dos demais pressupostos de que depende uma pena. Porém sempre se dirá que se verifica outra circunstância que inviabiliza, por si só, a pretensão do recorrente: não se apurou no apurado comportamento dos arguidos o elemento subjectivo, a intenção de ofender o corpo ou a saúde do assistente. Neste contexto, não merece censura quer a decisão proferida, quer em sede penal, quer, também, em sede de responsabilidade civil. Do exposto se concluiu que: Quando findo o inquérito o Ministério Público ordena o cumprimento do disposto no art.º 285º n.º 1 do Código Processo Penal, quando deveria ter proferido despacho de acusação ou de arquivamento, conforme preceituam os artºs 48º, 277º e 283º do Código Processo Penal, abstém-se de exercer a acção penal ocorrendo nulidade insanável prevista na al. b) do n.º 1 do art.º 119º n.º 1 do Código Processo Penal e assento n.º 1/00, de 16.12.99 DR de 6.1.00. A realização do julgamento pelo Tribunal Singular quando devia ter intervindo o Tribunal colectivo gera nulidade apenas sanável com o trânsito em julgado, art.º 119º al. e) e 32º n.º 1 do Código Processo Penal. Quando se procede ao julgamento de uma pluralidade de processos, de diferentes arguidos mas que se encontram apensados, a anulação do julgamento e respectiva decisão proferida no processo principal – porque o julgamento foi realizado Tribunal Singular quando devia ter intervindo o Tribunal colectivo – deve ser restringida apenas a determinados processos, aqueles para cujo julgamento era competente apenas o tribunal colectivo, mantendo-se válidos o julgamento e a decisão quanto a outros, v.g. processos apensados de outros arguidos, para cujo julgamento era competente o tribunal singular, desde que não se mostrem afectados por esse vício. A declaração por parte do Ministério Público, nos termos do art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal, quando subsequente à acusação, de que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a cinco anos, tem que ser expressa - em requerimento - e deve ser justificada, atendendo a que o Ministério Público na sua actividade se deve pautar por critérios de estrita objectividade, art.º 53º do Código Processo Penal. Decisão: Julga-se parcialmente improcedente o recurso mantendo-se intocada a decisão absolutória na parte respeitante ao processo 35-02. No mais decide-se o seguinte: No processo 60-02, anula-se o processado a partir do despacho [incluído] em que o Ministério Público ordenou o cumprimento do disposto no art.º 285º, n.º 1 do Código Processo Penal, a fim de que retomando-se a legalidade do processado o Ministério Público profira despacho final atinente [de arquivamento ou acusação, artºs 277º e 283º do Código Processo Penal]. No processo 34-02, anula-se o julgamento levado a cabo pelo tribunal singular, quando devia ter sido efectuado pelo tribunal colectivo, já que o Ministério Público não se prevaleceu, subsequentemente, da faculdade prevista no art.º 16º n.º 3 do Código Processo Penal [Esta decisão, como a todas as luzes nos parece evidente, não obsta a que o Ministério Público, se assim entender, possa fazer o requerimento a que alude o art.º 16ºn.º 3 do Código Processo Penal]. Custas pelo assistente E.........., fixando-se a taxa de justiça em 5 UC. Porto 22 de Junho de 2005 António Gama Ferreira Ramos Luís Eduardo Branco de Almeida Gominho José do nascimento Adriano Arlindo Manuel Teixeira Pinto |