Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
| ||
| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | JERÓNIMO FREITAS | ||
| Descritores: | PROVIDÊNCIA CAUTELAR ARRESTO REQUISITOS JUSTIFICADO RECEIO ALEGAÇÃO DE FACTOS | ||
| Nº do Documento: | RP202011238937/20.4T8PRT-A.P1 | ||
| Data do Acordão: | 11/23/2020 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | RECURSO IMPROCEDENTE, CONFIRMADA A DECISÃO | ||
| Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - O decretamento de uma providência cautelar depende sempre da verificação de dois requisitos cumulativos: i) a verificação da aparência de um direito; ii) a demonstração do perigo de insatisfação desse direito aparente. II - A apreciação do primeiro requisito assenta num juízo de mera probabilidade ou verosimilhança. Já quanto ao segundo, a lei é mais exigente, “(..) pede-se-lhe mais alguma coisa: um juízo senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade mais forte e convincente”. III - Embora sendo uma providência cautelar nominada ou especificada na lei, a função do arresto é, tal como nas demais providências, a de obviar ao perigo na demora da declaração e execução do direito, afastando o receio de dano jurídico. E, do mesmo modo que nas demais providências cautelares, o decretamento do arresto depende sempre da verificação dos dois requisitos cumulativos: i) a verificação da aparência de um direito, que aqui se traduz na provável existência do crédito; ii) a demonstração do perigo de insatisfação desse direito aparente, neste caso, o justificado receio de perda da garantia patrimonial. IV - Não está alegada matéria da qual seja possível inferir o invocado “justificado receio”. O único facto concreto que poderia assumir relevância, ou seja, a hipoteca voluntária sobre o imóvel - cujo pedido de registo foi apresentado em 2019/10/23 - é anterior à resolução do contrato de trabalho com invocação de justa causa – a relação laboral cessou em 10 de janeiro de 2020 - e à reclamação dos alegados créditos laborais que fundamentam aquela decisão do requerente. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | APELAÇÃO nº 8937/20.4T8PRT-A.P1 SECÇÃO SOCIAL ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I.RELATÓRIO I.1 No Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Valongo, B… intentou contra “C…, SA.”, o presente procedimento cautelar de arresto, que foi distribuído ao Juiz 2, pedindo o seguinte: -“ AO ABRIGO DO DISPOSTO NO ART. 391º E SS DO CPC, E SEM PREVIA AUDIÊNCIA DA REQUERIDA, JÁ QUE APENAS COM UM MERO DOCUMENTO PARTICULAR PODERÁ TRANSMITIR GRANDE PARTE DOS BENS QUE SE PRETENDEM ACAUTELAR, SOB PENA DE SE PÔR EM RISCO SÉRIO O FIM DA PRESENTE PROVIDÊNCIA, SE DIGNE ORDENAR O ARRESTO SOBRE OS SEGUINTES BENS: 1 – Prédio urbano composto por casa de requerentes do chão, anexos e logradouro, com a área coberta de 600m2 e descoberta de 3260m2, situado na …, nº …., Freguesia de Gondomar (…), Concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Comercial de Gondomar sob o número 3062/19940829, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 12258 da União de Freguesias … (cfr. certidão do registo predial junta sob doc. 28). 2 – Veículos automóveis: 1. Matrícula ..-QZ-.., Marca: SKODA – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-….; 2. Matrícula ..-PJ-.., Marca: VW – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-….; 3. Matrícula ..-HM-.., Marca: Alfa-Romeo – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-….; 4. Matrícula ..-NR-.., Marca: NISSAN – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-….; 5. Matrícula ..-MR-.., Marca: MERCEDES-BENZ – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-….; 6. Matrícula ..-HM-.., Marca: FORD – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-….. 7. Matrícula ..-PM-.., Marca: MERCEDES-BENZ – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-…. 3. Direitos: Alternativamente, e caso o contrato de locação financeira e a transmissão da propriedade do viatura antecedentemente identificada sob o item 7 ainda não se mostre efetuado a favor da requerida, o direito da requerida no contrato de locação financeira referente ao veículo automóvel Matrícula ..-PM-.., Marca: MERCEDES-BENZ – Cód. Ac. Certidão Permanente: ….-….-….; 4 – As seguintes máquinas de trabalhar madeira: 3 Esquadrejadoras; 1 calibradora; 1 corladora;1 prensa;1 CNC de furação; 1 serra de fita; 1 desengrosso; 1 tupia; 1 molduradora; 1 compressor de ar comprimido; 3 máquinas de air less; 1 cabine de pintura com aquecedor; 1 empilhadora 5 – Cofres e respetivo conteúdo, concretamente, valores monetários e outros artigos de valor económico. 6 - Mobiliário de escritório, incluindo secretárias, cadeiras, computadores incluindo servidores, impressoras, fotocopiadoras, etc. 7 – Stocks e mercadorias, designadamente, mobiliário, rolos de tecidos, placas de aglomerado, madeiras, tintas e vernizes. Alegou, em síntese, que entre si e a requerida vigorou um contrato de trabalho, desde o dia 16 do mês de agosto de 1993 até ao dia 10 de janeiro de 2020, o qual cessou nesse dia por efeito da resolução efetuada por sua iniciativa com fundamento em justa causa. Os fundamentos para proceder à resolução contratual com justa causa, assentavam, sobretudo, na falta de pagamento ao requerente de retribuições e na diminuição da retribuição do trabalho e, consequentemente, dos descontos para a Segurança Social, com o inerente prejuízo. Como mencionado na comunicação - cuja cópia junta- a requerida não lhe pagou pontualmente diversas remunerações, das quais permanece credor, designadamente: subsídio de férias, do ano de 2017, no valor líquido de 6.894,10€; e, retribuições relativas do ano de 2018 - que discrimina-, sendo que deveria ter recebido 99.723,40€, mas tendo-lhe sido paga apenas a quantia de 39.491,90€, resultando a diferença, em valor líquido, de 60.231,50€. O incumprimento no pagamento de créditos laborais persistiu durante o ano de 2019, sendo os créditos a seu favor, correspondentes à diferença entre o valor líquido devido (65.998,10€) e o valor líquido pago (18.520,57€), no valor líquido de 47.477,53€. A falta de pagamento pontual das retribuições do requerente, dos anos de 2018 e de 2019, ascendem, no seu total, ao valor líquido de 107.709,03€, é culposa e prolongou-se por período superior a 60 dias sobre a data de vencimento das remunerações. Em julho de 2018, a entidade empregadora diminuiu a retribuição mensal do requerente designada “Vencimento”, do valor ilíquido de 4.000,00€ para 3.360,67€, e suprimiu integralmente o valor do “Premio de Assiduidade” no valor de 9.190,00€., passando a auferir um rendimento mensal líquido no valor de 2.000,00€, quando, anteriormente, recebia, líquidos, 7.123,10€. Em Julho de 2018 a requerente comunicou à Segurança Social a diminuição da retribuição mensal do requerente, com efeitos a janeiro de 2018, causando-lhe um prejuízo a título do que recebeu por subsídio de doença, relativo ao período em que esteve de baixa médica, no montante de 6.159,31€ (15.360,40€-9.201,09€). É, ainda, credor da requerida de um crédito correspondente a dias de férias não gozados dos anos de 1994 a 2019, no valor de 81.352,00€. Durante a vigência do contrato nunca lhe foi pago qualquer valor a título de subsídio de alimentação. O valor devido pela requerente, referente aos dias de trabalho que efetivamente prestou, ascende a 12.902,20€. A resolução do contrato de trabalho operada pelo requerente, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 394º do CT, confere-lhe o direito à indemnização prevista no artigo 396º do CT, que ascende, atentas a respetiva antiguidade e retribuição base, ao valor de 346.897,00€ (13.190,00€ x 26,3). A requerente não lhe pagou a retribuição correspondente aos 13 dias de trabalho prestado no mês de janeiro de 2020, devendo-lhe, a quantia, líquida de impostos, de 2.590,22€; nem lhe pagou o valor correspondente às férias e subsídio de férias vencidos em 01/01/2020, no valor, líquido de impostos de 14.246,20€; nem tão pouco os valores proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, no valor global, líquido de impostos de 7.770,66€. Os juros de mora sobre as demais quantias peticionadas têm o montante global de 27.927,48€. A requerida, após a resolução do contrato de trabalho, não procedeu ao pagamento ao requerente de qualquer crédito, vencido no passado, ou vencido por efeito da cessação do contrato. Sucede que, no final de 2019, mais precisamente em 25/10/2019, a requerida onerou o ativo mais significativo da sociedade com uma hipoteca constituída a favor do Banco D…, no valor de 600.000,00€, concretamente, o prédio urbano composto por casa de requerentes do chão, anexos e logradouro, com a área coberta de 600m2 e descoberta de 3260m2, situado na …, nº …., Freguesia de Gondomar (…), Concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Comercial de Gondomar sob o número 3062/19940829, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 12258 da União de Freguesias …. A realidade factual descrita causa ao requerente justo receio de ver desaparecer totalmente a garantia dos seus créditos, pois a requerida não é proprietária de outros bens de valor suficiente para poder garantir os créditos laborais do requerente. A oneração deste activo vem causar lesão grave e dificilmente reparável do direito do requerente porquanto dificulta, acentuadamente, a cobrança do seu crédito. Conclui defendendo estarem preenchidos os requisitos necessários para o decretamento da providência cautelar de arresto requerida. I.2 No despacho liminar, o Tribunal a quo proferiu a decisão seguinte: - «[..] Relido o requerimento inicial afigura-se, porém, que este deve ser liminarmente indeferido. Com efeito, e para que a pretensão do requerente pudesse proceder, a final sempre importaria dar resposta positiva às seguintes questões: O requerente tem, em termos de probabilidade e sobre a requerida, os créditos a que se arroga (ou, pelo menos, parte deles)? Existem factos que tornem justificado o receio de o requerente perder a garantia patrimonial do seu crédito? Efectivamente, dispõe o art. 391.º, n.º 1, do CPC que “O credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor.”, estabelecendo o n.º 1 do art. 392.º do mesmo Código que “O requerente do arresto deduz os factos que tornam provável a existência do crédito e justificam o receio invocado, relacionando os bens que devem ser apreendidos, com todas as indicações necessárias à realização da diligência.” (cf. também art. 47.º do CPT), isto é, constitui ónus do requerente deduzir os factos que tornam provável a existência do crédito, como aqueles que justificam o receio invocado. Relativamente ao primeiro aspecto da questão, estão alegados factos susceptíveis de neles ancorar os alegados créditos, sem embargo dessa matéria estar sujeita à realização da respectiva prova. Contudo, já não assim ao requisito do justo receio de perda da garantia patrimonial, de cuja existência cabe desde já conhecer. Da matéria de facto alegada, contende directamente com esta questão o que consta dos artigos 51.º e ss do requerimento inicial, sendo que no que toca à situação fáctica, o que consta dos art.s 51.º, 54.º e 58.º; em essência e síntese, alega o requerente que, no final de 2019, mais precisamente em 25/10/2019, a requerida onerou o ativo mais significativo da sociedade com uma hipoteca constituída a favor do Banco D…, no valor de 600.000,00€ - concretamente, o prédio urbano composto por casa de requerentes do chão, anexos e logradouro, com a área coberta de 600m2 e descoberta de 3260m2, situado na …, nº …., Freguesia de Gondomar (…), Concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Comercial de Gondomar sob o número 3062/19940829, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 12258 da União de Freguesias … – não sendo a requerida proprietária de outros bens de valor suficiente para poder garantir os créditos laborais do requerente, sucedendo que a oneração deste activo dificulta, acentuadamente, a cobrança do seu crédito, o que causa ao requerente justo receio de ver desaparecer totalmente a garantia dos seus créditos. Ora, com o devido respeito por diverso entendimento, aquelas premissas factuais – ainda que se verifiquem - não autorizam, de forma alguma, esta conclusão tirada pelo requerente. Assim, considerando a “normalidade das coisas”, e à luz da experiência comum, não se afigura, de todo – e ainda que se desse como provada toda a factualidade que a propósito o requerente alega, e com base nessa factualidade, naturalmente -, possível concluir que existe um risco muito forte de a requerida dissipar o seu património, ou ficar insolvente, ou de alguma forma ficar desprovida de bens (que tenha) susceptíveis de acautelar o pagamento do crédito a que o requerente se arroga. É certo que, como se entendeu em douto Ac. da RP de que foi Relator o Exm.º Desembargador Dr. Sousa Peixoto, o requerente não tem de provar que o requerido tenciona alienar o seu património, apenas tendo de provar que há justo receio que isso venha a acontecer – Ac. de 11/12/2000, in www.dgsi.pt/jtrp, Proc. 0011147 – mas na situação sub – Júdice, e salvo melhor opinião, o requerente não alegou quaisquer factos nos quais possamos basear, com um mínimo de objectividade, o invocado receio do requerente de que desapareça totalmente a garantia dos seus créditos. Como também se escreveu em recente acórdão do TRP (Ac. RP de 11/4/2019, Proc. 257/18.0T8AMR.P1, www.dgsi.pt), e fazendo apelo à síntese do respectivo Sumário: «I – O fundado receio ou “periculum in mora” cuja verificação é necessária para a procedência do procedimento cautelar comum tem de resultar da alegação de factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo. II – No caso, a requerente, partindo do facto de lhe ter sido pedido o pagamento de certa garantia autónoma e de ter recusado tal pagamento, após o que recebeu uma carta da requerida a conceder-lhe prazo para pagar, sob pena de instaurar a devida acção para obter o resgate de tal caução, diz temer a instauração de uma acção executiva, mais conjectura ainda que nesse processo será efectuada penhora antes da sua citação, e que essa penhora versará sobre (todos) os seus equipamentos informáticos e, com remoção dos mesmos, o que terá “efeitos catastróficos”, nomeadamente paralisará a sua actividade bancária. III – Tais alegações assentam em cenários hipotéticos, simples conjecturas alarmistas e futuristas, criados pela imaginação da requerente, sem qualquer fundamento objectivo razoavelmente configurável, pelo que razoavelmente não podem preencher o requisito do “periculum in mora”.». Este entendimento, conquanto perfilhado no âmbito do fundado receio exigido para a procedência de um procedimento cautelar comum (art. 362.º/1 do CPC), é perfeitamente transponível para a análise do problema de que ora nos ocupamos e, reportando ao caso dos autos, dir-se-á que – ante o quadro factual invocado pelo requerente – tanto é legítimo figurar a hipótese que coloca em 55.º do requerimento inicial, como a hipótese de o financiamento, e a inerente oneração do imóvel (a que alude nos art.s 51.º e 52.º), ter viabilizado financeiramente a requerida e proporcionar-lhe condições para honrar as suas dívidas, inclusive com o requerente. Aliás, no primeiro acórdão do TRP trazido à colação pelo requerente (3994/08.4TBVLG-C.P1), e também por referência às palavras do respectivo sumário, sustentou-se igualmente que: “(…) II - A existência do “justo receio” deverá resultar da interpretação de factos ou circunstâncias objectivas e concretas, não relevando para tanto as suspeitas tidas pelo credor, ou uma situação de medo em que este tenha caído fundada tão só numa análise subjectiva da vivência do devedor. III - Os factos ou as circunstâncias objectivas que possam integrar o conceito de “justo receio de perda da garantia patrimonial” hão-de ter surgido em momento posterior ao negócio de onde emerge o crédito, ou pelo menos, hão-de se ter revelado só nessa ocasião.” www.dgsi.pt Ora, para além de, como já deixamos dito, não vislumbrarmos no caso, sequer alegados, esses “factos ou circunstâncias objectivas e concretas”, como o crédito mais volumoso (indemnização pela resolução do contrato com invocada justa causa; € 346.897,00), a existir, constituiu-se posteriormente à invocada oneração de património. E quanto ao segundo dos arestos que o requerente citou em abono na sua tese, e salvo melhor opinião, trata de situação em que, ao que nos parece da sua consulta (em www.dgsi.pt) parece ter por base um acervo factual mais vasto que o também configurado nestes autos. Afigura-se a factualidade alegada pelo requerente é, senão inócua, pelo menos francamente insuficiente para o pretendido fim pois que, como sumariou em douto acórdão do TRC: “(…) III - O fundamento de qualquer arresto não pode residir tão só no não pagamento - ou mesmo, no não pagamento assumido e reiterado; assim como não se pode bastar com a existência de outros credores; e tão pouco, também, com uma presumida avaliação de insolvência por parte da devedora. IV - Fundamental é, além de tudo o mais, que objectivamente (ou seja, segundo os critérios do senso comum), se possa surpreender uma conduta desviante das regras de boa-fé que razoavelmente todo o credor teve por verificados, também, por banda da sua contra-parte, quer nos preliminares, quer na formação, quer no cumprimento dos respectivos contratos (nos termos dos artºs 227º nº1 e 762º nº2 do C.Civil). V - Essas condutas, em regra, traduzem-se em factos de fuga ou receio de fuga do devedor: ocultação, dissipação ou sonegação de bens, ou o razoável receio da ocorrência de tal; ou, mesmo, uma gestão ruinosa que gritantemente altere todo o equilíbrio patrimonial, económico-financeiro sob cuja estrutura se negociou.” Em suma, entendemos que, manifestamente, não está alegada matéria da qual seja possível inferir o invocado “justificado receio”. Pelo exposto, e ao abrigo do disposto no art. 590.º/1 do CPC (ex vi do art. 1.º/2 a) do CPT), decide-se indeferir liminarmente o requerimento inicial. Custas pelo requerente. Fixo à causa o valor de € 614.448,20. Notifique. (..)». I.3 Inconformado com esta decisão o requerente interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram finalizadas com as conclusões seguintes: ……………………………… ……………………………… ……………………………… I.4 Não foram apresentadas contra-alegações. I.5 O Ministério Público junto desta Relação teve visto nos autos, para os efeitos do art.º 87.º3 do CPT, mas não emitiu parecer na consideração de o mesmo não ser devido por se tratar de questão eminentemente processual. I.6 Foram colhidos os vistos legais e determinou-se a inscrição do processo em tabela para ser submetido a julgamento. I.7 Delimitação do objecto do recurso Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 640.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho], a questão colocada para apreciação pelo recorrente consiste em saber se o tribunal a quo errou o julgamento ao indeferir liminarmente o requerimento inicial da presente providência cautelar de arresto, dado o apelante ter alegado “(..) outros factos relevantes para a apreciação do justo receio de perda da garantia patrimonial que a decisão proferida pelo tribunal a quo desconsiderou totalmente” [conclusão C]. FUNDAMENTAÇÃO II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO Os factos relevantes para a decisão do recurso são os que constam do relatório, acrescido do que se passa a consignar: - Na certidão Permanente – junta pelo requerente - relativa ao Prédio urbano, registado a favor de C1…, LDª, composto rés-do-chão, anexos e logradouro, com a área coberta de 600m2 e descoberta de 3260m2, situado na …, nº …., Freguesia de Gondomar (…), Concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Comercial de Gondomar sob o número 3062/19940829, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 12258 da União de Freguesias …, sob a AP. 1090 de 2019/10/23, consta o registo de Hipoteca Voluntária, apresentado em 2019/10/23, inicialmente “provisório por natureza” e convertido em definitivo pela AP. 3832 de 2019/10/25, para garantia do “CAPITAL: 600.000,00 Euros” e “MONTANTE MÁXIMO ASSEGURADO: 858.000,00 Euros”, sendo sujeito activo o BANCO D…, S.A. e sujeito passivo aquela sociedade, mencionando-se como “FUNDAMENTO”, o seguinte: -“(..) garantia do bom pagamento e liquidação de todas e quaisquer obrigações e/ou responsabilidades assumidas e/ou a assumir pela sociedade devedora, junto do Banco, por valores descontados e/ou adiantados e/ou por garantias bancárias prestados e/ou a prestar em nome e a solicitação da mesma sociedade e, designadamente, para garantia de responsabilidades emergentes do desconto de letras e/ou de livranças, créditos documentários à importação, remessas documentárias à exportação, financiamentos externos à exportação, de mútuos, de aberturas de crédito simples e/ou em conta corrente, de contratos de locação financeira mobiliária e/ou imobiliária, de factoring, de gestão de pagamentos a fornecedores, de descobertos na conta de depósitos à ordem, de acordo de regularização de responsabilidades/dívidas, da subscrição de cheques, prestação de fianças e avales. JURO ANUAL: 10% acrescido de 3% no caso de mora. DESPESAS: 24.000,00 Euros». II.2 MOTIVAÇÃO DE DIREITO O Apelante insurge-se contra a decisão do tribunal a quo que indeferiu liminarmente a requerida providência cautelar de arresto, na consideração de “manifestamente, não est[ar] alegada matéria da qual seja possível inferir o invocado “justificado receio”, defendendo, no essencial que alegou outros factos relevantes para a apreciação do justo receio de perda da garantia patrimonial, os quais foram desconsiderados “totalmente” na decisão. II.2.1 Como contributo prévio para a apreciação da questão nuclear, afigura-se-nos adequado deixar umas breves notas sobre os procedimento cautelares e, especificamente, o de arresto. Conforme dispõe o n.º 1 do art.º 32.º do CPT, “Aos procedimentos cautelares aplica-se o regime estabelecido no Código de Processo Civil para o procedimento cautelar comum”, com as especialidades de seguida enunciadas na mesma disposição. A função jurisdicional da providência cautelar é antecipar e preparar uma providência ulterior, que há-de definir, em termos definitivos, a relação jurídica litigiosa. Por isso estatui o art.º 364.º n.º1, do CPC que “Excepto se for decretada a inversão do contencioso, o procedimento cautelar é dependência da causa que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente da acção declarativa ou executiva”. O que justifica o procedimento cautelar é o chamado periculum in mora. Como elucida o Professor José Alberto dos Reis, “Há casos em que a formação lenta e demorada da decisão definitiva expõe o presumido titular do direito a riscos sérios de dano jurídico; para afastar estes riscos, para eliminar o dano, admite-se a emanação duma providência provisória ou interina, destinada a durar somente enquanto não se elabora e profere o julgamento definitivo” [Código de Processo Civil anotado, Vol. I, 3.ª Edição – Reimpressão, Coimbra Editora, 1982, pp. 623/624]. Dai usar dizer-se que o procedimento cautelar tem por fim obviar ao perigo na demora da declaração e execução do direito, afastando o receio de dano jurídico. O n.º1 do art.º 362.º do CPC, com a epígrafe “Âmbito das providências cautelares não especificadas”, determina que “[S]empre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência, conservatória ou antecipatória, concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado”. Resulta dessa norma que o decretamento de uma providência cautelar depende sempre da verificação de dois requisitos cumulativos: i) a verificação da aparência de um direito; ii) a demonstração do perigo de insatisfação desse direito aparente. A apreciação do primeiro requisito assenta num juízo de mera probabilidade ou verosimilhança. Já quanto ao segundo, a lei é mais exigente, “(..) pede-se-lhe mais alguma coisa: um juízo senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade mais forte e convincente” [Prof. J. Alberto dos Reis, op.cit., pp.621]. O decretamento da providência apenas alcança uma composição provisória do conflito de interesses, assente no fumus iuris e no periculum in mora que tenham sido sumariamente demonstrados. A solução definitiva há-de resultar da causa de que é dependente o procedimento, isto é, que tem por fundamento o direito que se pretende acautelar através da providência. O direito que se pretende acautelar deve ser um direito do requerente, ao qual corresponda o correspectivo dever da parte contrária. Embora sendo uma providência cautelar nominada ou especificada na lei, a função do arresto é, tal como nas demais providências, a de obviar ao perigo na demora da declaração e execução do direito, afastando o receio de dano jurídico. Como decorre do princípio geral estatuído no n.º 1 do art.º 601.º do CC. “Pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor susceptíveis de penhora (.)]. Vindo depois o art.º 619.º n.º1, também do CC, estatuir que “O credor que tenha justo receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor, nos termos da lei do processo”. Na lei processual, para onde nos remete aquela disposição, sobre o arresto regem os artigos 391.º e seguintes do C. P. Civil. O n.º 1 daquele art.º 391.º, reproduz integralmente aquela disposição de direito substantivo, acima transcrita. E, o n.º 2, diz-nos que “[O] arresto consiste numa apreensão judicial de bens, à qual são aplicáveis as disposições relativas à penhora, em tudo o que não contrariar o preceituado nesta secção”. Por conseguinte, o arresto consiste num meio de conservação da garantia patrimonial dos credores, que se concretiza através duma providência cautelar antecipatória da penhora, na medida em que os bens arrestados são convertidos em penhora (art.º 846.º do C. P. Civil), ao qual são aplicáveis genericamente as disposições relativas à penhora (art.º 391.º n.º 2, do CPC). E, como decorre do n.º 1 do art.º 619.º do CC e do n.º1 do art.º 391.º do CPC, conjugados como n.º1 do art.º 392.º, do CPC, repete-se, do mesmo modo que nas demais providências cautelares, o decretamento do arresto depende sempre da verificação dos dois requisitos cumulativos: i) a verificação da aparência de um direito, que aqui se traduz na provável existência do crédito; ii) a demonstração do perigo de insatisfação desse direito aparente, neste caso, o justificado receio de perda da garantia patrimonial. II.2.2 Revertendo ao caso sustenta o recorrente que alegou outros factos relevantes para a apreciação do justo receio de perda da garantia patrimonial, os quais foram desconsiderados “totalmente” na decisão recorrida, nomeadamente: - que a recorrida diminuiu unilateralmente a retribuição do recorrente no ano de 2018; - que o apelante é credor de retribuições salariais desde o ano de 2017; - que após a constituição da alegada hipoteca (outubro 2019) nenhum crédito laboral foi pago ao apelante; - que o apelante fez cessar o contrato com fundamento, entre outros, no não pagamento de créditos laborais; - que após a cessação do contrato (janeiro de 2020) nenhum crédito foi pago ao apelante pela recorrida, não obstante a referida constituição de hipoteca. Como resulta do que se expôs no ponto anterior, cabia ao recorrente deduzir os factos que justificam o receio de perda da garantia patrimonial dos créditos laborais que invoca deter sobre a requerida, sendo necessário, para que o arresto possa ser decretado, que dos mesmos resulte “um juízo senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade mais forte e convincente” [Prof. J. Alberto dos Reis, op. cit., pp.621]. Afirma-se, desde já, que não lhe assiste razão quando defende que observou esse ónus. Os factos que vem invocar não têm relevo para aferir da existência de justificado receio de perda da garantia patrimonial, antes interessando e tendo desempenhado essa função para verificação do outro requisito da providência, nomeadamente, da aparência de um direito, que aqui se traduz na provável existência dos créditos laborais reclamados. De resto, com o devido respeito, o requerente está a querer reinterpretar o seu requerimento, pois retira-se que teve essa noção, dado ter alegado todos aqueles factos na parte sob o título “Da provável existência do direito do requerente”, que compreende os artigos 1 a 45. É certo que na segunda parte do articulado, encimada pelo título “Do periculum in mora”, que abrange os artigos 46 a 61, começa por deixar afirmações conclusivas, extraídas daquelas alegações, mas fá-lo em jeito de enquadramento para circunstanciar o facto que, na sua perspectiva, sustenta a existência do justificado receio de perda de garantia patrimonial para satisfação dos créditos reclamados. Assim resulta dos artigos 46 a 50, começando o recorrente por dizer que “[A] requerida, como decorre do supra alegado, incumpre a obrigação de pagamento pontual da retribuição do requerente desde, pelo menos, 2017, com maior incidência e gravidade nos anos de 2018 e de 201”, para concluir, naquele último, reafirmando que “(..) a requerida não procedeu ao pagamento ao requerente de qualquer valor”. O facto que o requerente alega, apresentando-o como fulcral para sustentar o justificado receio de perda de garantia patrimonial para satisfação dos créditos reclamados, só surge em seguida, através da alegação seguinte: -[51] Sucede que, no final de 2019, mais precisamente em 25/10/2019, a requerida onerou o ativo mais significativo da sociedade com uma hipoteca constituída a favor do Banco D…, no valor de 600.000,00€, concretamente, o prédio urbano composto por casa de requerentes do chão, anexos e logradouro, com a área coberta de 600m2 e descoberta de 3260m2, situado na …, nº …., Freguesia de Gondomar (…), Concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Comercial de Gondomar sob o número 3062/19940829, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 12258 da União de Freguesias … – doc. 28. Com efeito, a relevância atribuída a esse facto é afirmada nos artigos seguintes [52 a 56], alegando o requerente que a requerida “(..) notificada da resolução do contrato de trabalho do requerente, em 13/01/2020, menos de dois meses depois de a requerida se ter financiado, manteve a situação de total inadimplemento perante o requerido”, para defender que tal lhe “causa (..) justo receio de ver desaparecer totalmente a garantia dos seus créditos”, e que não sendo “ proprietária de outros bens de valor suficiente para poder garantir os créditos laborais do requerente”, “A oneração deste activo vem causar lesão grave e dificilmente reparável do direito do requerente porquanto dificulta, acentuadamente, a cobrança do seu crédito”. Ora, lendo com a devida atenção a fundamentação do tribunal a quo, dela resulta com clareza que foi precisamente essa a interpretação que fez do requerimento inicial. Senão atente-se no extracto seguinte: -«Da matéria de facto alegada, contende directamente com esta questão o que consta dos artigos 51.º e ss do requerimento inicial, sendo que no que toca à situação fáctica, o que consta dos art.s 51.º, 54.º e 58.º; em essência e síntese, alega o requerente que, no final de 2019, mais precisamente em 25/10/2019, a requerida onerou o ativo mais significativo da sociedade com uma hipoteca constituída a favor do Banco D…, no valor de 600.000,00€ - concretamente, o prédio urbano composto por casa de requerentes do chão, anexos e logradouro, com a área coberta de 600m2 e descoberta de 3260m2, situado na …, nº …., Freguesia de Gondomar (…), Concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Comercial de Gondomar sob o número 3062/19940829, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 12258 da União de Freguesias … – não sendo a requerida proprietária de outros bens de valor suficiente para poder garantir os créditos laborais do requerente, sucedendo que a oneração deste activo dificulta, acentuadamente, a cobrança do seu crédito, o que causa ao requerente justo receio de ver desaparecer totalmente a garantia dos seus créditos». Por conseguinte, o recorrente não tem razão ao vir sustentar que o Tribunal a quo desconsiderou factos relevantes que foram alegados. Acresce dizer, que atenta essa factualidade alegada, acompanha-se o Tribunal a quo no entendimento de que «(..) considerando a “normalidade das coisas”, e à luz da experiência comum, não se afigura, de todo – e ainda que se desse como provada toda a factualidade que a propósito o requerente alega, e com base nessa factualidade, naturalmente -, possível concluir que existe um risco muito forte de a requerida dissipar o seu património, ou ficar insolvente, ou de alguma forma ficar desprovida de bens (que tenha) susceptíveis de acautelar o pagamento do crédito a que o requerente se arroga”, assente na consideração de que “(..) o requerente não alegou quaisquer factos nos quais possamos basear, com um mínimo de objectividade, o invocado receio do requerente de que desapareça totalmente a garantia dos seus créditos”. Mais adiante, refere-se ainda na decisão recorrida que “para além de, como já deixamos dito, não vislumbrarmos no caso, sequer alegados, esses “factos ou circunstâncias objectivas e concretas”, como o crédito mais volumoso (indemnização pela resolução do contrato com invocada justa causa; € 346.897,00), a existir, constituiu-se posteriormente à invocada oneração de património”. O recorrente reconhece que “(..) o crédito mais volumoso (indemnização reclamada pela resolução do contrato com invocação de justa causa no valo de €346.897,00), constituiu-se posteriormente à invocada oneração do património”, mas vem contrapor que este “(..) fundamento só se constituiria como fundamento relevante se os demais créditos invocados pelo requerente fossem de insignificante grandeza face àquele e face ao património empresarial, o que não sucede”, dado que “(..) os créditos de natureza laboral, expurgados da mencionada indemnização, acumulados ao longo dos anos, se cifram em 267.551,00€”. Nessa base, defende que “(..) considerando a normalidade das coisas e, justamente, à luz da experiência comum, verifica-se um risco sério de a recorrida ficar desprovida de património suscetível de responder pelos créditos do recorrente”, posto que “[O] que se esperaria do comportamento de um devedor, num plano da normalidade, tendo presentes os deveres de lealdade, de correção e de probidade da respetiva conduta, seria que honrasse as suas dívidas ou que procurasse honrá-las”. Esta construção não merece acolhimento, acompanhando-se toda a fundamentação do Tribunal a quo, acima transcrita e para a qual se remete, na consideração de se mostrar correcta, certeira, clara e suficiente para sustentar aquela afirmação e a decisão final. O facto da requerida não pagar os alegados créditos laborais, desde logo, os que o requerente defende terem-se acumulado ao longo dos anos, não significa necessariamente que aquela esteja a querer furtar-se ao cumprimento dos seus deveres de entidade empregadora. Essa afirmação do recorrente parte necessariamente do pressuposto de que o direito a esses alegados créditos lhe assiste, mas mais do que isso, implicitamente está a ter como inquestionável que a requerida tem essa noção, ou seja, admite-o, mas que rejeita o cumprimento. Pode ser que assim seja, mas o certo é não há qualquer facto alegado que permita sequer considerar essa hipótese. Veja-se que o requerente vem invocar ser detentor de alegados créditos que se foram vencendo sucessivamente, ano após ano, desde o início da relação laboral, em 1993, como são o caso dos relativos a subsídio de alimentação e férias não gozadas, não tendo alegado sequer que alguma vez os tenha reclamado perante a requerida. O mesmo é de dizer quanto à alegada fala de pagamento pontual das retribuições do requerente, referentes aos anos de 2018 e de 2019, alegadamente resultante de uma diminuição unilateral do valor da retribuição, sendo de notar que para além de ter perdurado por dois anos, o valor em divida é substancialmente superior ao que lhe foi pago nesse período, o que na normalidade das coisas motivaria uma reacção do trabalhador a mais curto prazo, isto é, mais imediata. Portanto, no rigor das coisas, face ao que foi alegado apenas se retira que a requerida só foi confrontada com a reclamação dos alegados créditos através da comunicação da resolução do contrato de trabalho com justa causa e, logo, não pode excluir-se a hipótese daquela sempre ter estado convicta de que cumpriu os seus deveres de entidade empregadora. E, se assim é, não tem cabimento fazer aquela afirmação sem uma base sólida, a sugerir que a requerida, pese embora até se ter financiado “em outubro de 2019 e até janeiro de 2020 não pagou qualquer dos créditos laborais em dívida ao recorrente”, para concluir, que é “plenamente fundado o receio de perda de garantia patrimonial do recorrente” [conclusões finais M, N e O]. Por último, como assinala o Tribunal a quo, no acórdão desta Relação de 12-06-2009 [Proc.º 3994/08.4TBVLG-C.P1, Desembargadora Anabela Dias da Silva, disponível em www.dgsi.pt], aresto invocado pelo requerente, mas sem atender a tudo o ai afirmado ou, pelo menos, sem fazer a sua correcta aplicação, do respectivo sumário consta igualmente o seguinte: “I- (…) II - A existência do “justo receio” deverá resultar da interpretação de factos ou circunstâncias objectivas e concretas, não relevando para tanto as suspeitas tidas pelo credor, ou uma situação de medo em que este tenha caído fundada tão só numa análise subjectiva da vivência do devedor. III - Os factos ou as circunstâncias objectivas que possam integrar o conceito de “justo receio de perda da garantia patrimonial” hão-de ter surgido em momento posterior ao negócio de onde emerge o crédito, ou pelo menos, hão-de se ter revelado só nessa ocasião.”. Concordando-se com este entendimento e aplicando-o ao caso em apreço, há que concluir, tal como bem entendeu o Tribunal a quo, que «manifestamente, não está alegada matéria da qual seja possível inferir o invocado “justificado receio”. Na verdade, o único facto concreto que poderia assumir relevância, em concreto, a hipoteca voluntária sobre o imóvel - cujo pedido de registo foi apresentado em 2019/10/23 - é anterior à resolução do contrato de trabalho com invocação de justa causa – a relação laboral cessou em 10 de janeiro de 2020 - e à reclamação dos alegados créditos laborais que fundamentam aquela decisão do requerente. Concluindo, improcede o recurso. III. DECISÃO Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente, confirmando a decisão recorrida. Custas a cargo do autor, atento o decaimento (art.º 527.º2, CPC). Porto, 23 de Novembro de 2020 Jerónimo Freitas Nelson Fernandes Teresa Sá Lopes |