Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
539/11.2PBMTS-ZY.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NETO DE MOURA
Descritores: ARRESTO PREVENTIVO
OPOSIÇÃO AO ARRESTO
TAXA DE JUSTIÇA
Nº do Documento: RP20140917539/11.2PBMTS-ZY.P1
Data do Acordão: 09/17/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I -No arresto preventivo em processo penal o artº 228º1 CPP ao mandar aplicar as norma do processo civil tal remissão é apenas para as respectivas normas processuais e substantivas, não abrangendo as relativas ao pagamento da taxa de justiça;
II –Atento o disposto no artº 8º RCP a admissão da oposição ao arresto preventivo não está dependente do pagamento prévio da taxa de justiça.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 539/11.2 PBMTS-ZY.P1
Recurso penal
Relator: Neto de Moura

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto

I – Relatório

Nos autos de processo comum que, sob o n.º 539/11.2 PBMTS, correm termos no 3.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal do Porto, na sequência de requerimento apresentado pelo Ministério Público, foi decretado o arresto preventivo de todos os bens que integravam o património do arguido B….
Contra essa decisão reagiu o arguido, deduzindo oposição à providência decretada.
Considerando que a oposição deduzida estava sujeita ao pagamento prévio de taxa de justiça, a Sra. Juiz de instrução ordenou a notificação do arguido/opoente para comprovar nos autos o pagamento da taxa de justiça que seria devida, acrescida da correspondente multa, sob pena de rejeição do requerimento de oposição ao arresto ordenado.
O arguido reagiu através do requerimento de que está uma reprodução a fls. 18 e segs. destes autos, no qual defende que não é devido tal pagamento, que a taxa de justiça pela oposição deduzida só será devida a final.
A Sra. Juiz de instrução proferiu, então, despacho do seguinte teor (reprodução integral):
“Conforme já foi decidido a fls. 1112 (quanto ao arguido C…) e 1113 quanto ao arguido B…, pese embora os presentes autos sejam tramitados por apenso ao procedimento criminal instaurado contra os aqui arguidos, entre outros, registado como NUIPC n.º 539/11.2PBMTS, e o art. 8.º do R.C.P. que tem por epígrafe «Taxa de justiça em processo penal (…)» estabeleça um regime próprio para o pagamento das custas no processo penal, e os arts. 513.º e 514.º do C.P.P. prescrevam que o arguido só paga taxa de justiça e encargos quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso, o certo é que o art. 228º, n.º 1 do C.P.P. determina expressamente que o arresto preventivo é decretado nos termos da lei do processo civil.
O n.º 3 da mesma norma prescreve que "A oposição ao despacho que tiver decretado arresto não possui efeito suspensivo".
E se se seguem as regras do processo civil para o decretamento do arresto, também as mesmas normas valem para a sua posterior tramitação quanto ao contraditório subsequente ao decretamento da providência nas modalidades previstas no art. 372º, n.º 1 do C.P.C., nomeadamente, o recurso (interposto pelo arguido C…, cfr. a) do nº 1) e a oposição (apresentada pelos arguidos D…, B… e E…, cfr. b) do n.º 1) e para a oportunidade do pagamento das taxas de justiça para a prática dos referidos actos processuais, nos termos da lei do processo civil - ex vi do n.º 1 do art. 228º do C.P.P.
Ora o art. 7º nº 4 do R.C.P. estipula que "A taxa de justiça devida pelos (…) procedimentos cautelares (…) é determinada de acordo com a tabela II, que faz parte integrante do presente Regulamento".
O art.º 14º nº 1 do R.C.P. prescreve ainda que "O pagamento da primeira ou única prestação da taxa de justiça, faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, devendo: b) nas entregas em suporte de papel, o interessado proceder à entrega do documento comprovativo do pagamento”.
O art. 539º do C.P.C. determina no seu nº 1 que "A taxa de justiça dos procedimentos cautelares (…) é paga (…) havendo oposição, pelo requerido".
Consequentemente, não assiste razão ao arguido B… quanto ao requerido a fls. 1291 a 1293, mantendo-se o já decidido a fls. 1113 (e a fls. 1112, quanto ao recurso interposto pelo co-arguido C…) sendo que o meio próprio para o arguido B… reagir ao despacho de fls. 1113, é o recurso e não o expediente que agora utilizou a fls. 1291 a 1293.
No caso destes autos, pese embora o teor dos despachos de fls. 1090, 1112 e 1113, os arguidos D…, B… e E…, até à presente data, não juntaram o documento comprovativo do pagamento dessa taxa de justiça, sendo que, quanto ao arguido D…, por lhe ter sido indeferido o pedido de concessão do benefício do apoio judiciário (cfr. fls. 1280), o prazo de apresentação daquele documento é o estipulado nos arts. 29º nº 5 c) da Lei nº 47/2007 de 28/8 e 570º nº 2 do C.P.C.
Tal prazo já decorreu sem que este referido arguido, tivesse comprovado o pagamento da referida taxa de justiça.
Pelo exposto, nos termos dos arts. 642° nº 2 do C.P.C., ordena-se o desentranhamento do recurso interposto pelo arguido C… a fls. 1106 a 1110 e, nos termos do art. 570.º nº 5 do mesmo Código, notifique os arguidos D… e B…, para em 10 dias, procederem ao pagamento das quantias referidas no citado art. 570º nº 5, com os limites mínimo e máximo aí assinalados”.

Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso para este Tribunal da Relação o arguido B…, com os fundamentos que explanou na respectiva motivação e que “condensou” nas seguintes “conclusões” (em transcrição integral):

1. “O presente recurso tem como o objecto toda a matéria de facto e de direito do despacho de fls. 1301 e ss.

2. O Digno Representante do Ministério Público veio requerer a fls 774 e ss dos autos, o arresto preventivo de todo o património do arguido B….

3. Sem audição prévia do arguido B…, foi o arresto a ser decretado, nos termos e com os fundamentos constantes de fls 793 e 794.

4. Notificado dessa decisão judicial, 0 arguido deduziu oposição - cfr. fls. 1008 a 1013 dos autos-.

5. Sobre a oposição deduzida, recaiu o despacho de fls 1113, o qual considerou que aquele acto processual só seria recebido caso o arguido comprovasse nos autos o pagamento da taxa do justiça devida, acrescida de multa do igual valor.

6. Notificado para liquidar esses valores, o arguido deu entrada em juízo do requerimento de fls. 1291 a 1293, sobre o qual recaiu o despacho recorrido de fls 1301 a 1303.

7. Segundo esta decisão, Tribunal de Instrução Criminal do Porto entendeu que apesar de "os arts. 513 e 514 do CPP prescreveram que o arguido só paga taxa do justiça e encargos quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso, o certo é que art.º 288° n°1 do CPP determina expressamente que o arresto preventivo é decretado nos termos da lei do processo civil.” - cit. Fl.1301 dos autos-.

8. Daí, 0 Tribunal recorrido decidiu que a este caso concreto se aplica o disposto nos artigos 7.º, n.º 4 e 14.º, n.° 1 do Regulamento das Custas Processuais.

9. Guardado o devido respeito, não é esse o entendimento do recorrente.

10. Com efeito, os artigos 513 e 514 do CPP, bem como, o artigo 8.° do Regulamento das Custas Processuais estabelece as regras quanto ao pagamento da taxa de justiça em processo penal

11. Nesse artigo, do seu n.º 1 ao n.º 8, estão delimitadas as situações processuais em que é devida taxa de justiça, nas quais não se inclui a dedução de defesa/oposição ao arresto preventivo por parte do arguido.

12. E o n.º 9, do art.º 8.º RCP acrescenta que "Nos restantes casos, a taxa de justiça é paga a final, sendo fixada pelo juiz tendo em vista a complexidade da causa, dentro dos limites fixados pela tabela III - fim de citação-.

13. É que o artigo 228.°, n.º 1, CPP, mencionado no despacho recorrido, limita-se a ditar que o arresto é decretado nos termos da lei do processo civil, ou seja, a tramitação processual é a fixada naquele código.

14. Já quanto às custas, o Regulamento tem normas próprias para o processo penal que não são suprimidas pela tramitação processual do arresto preventivo,

15. Sob pena de limitar e impedir o arguido de exercer a sua defesa, o seu contraditório.

16. Até porque, foi ordenado o arresto de todos os bens do arguido B…, nomeadamente as contas bancárias de que é titular.

17. Essa apreensão patrimonial impediu-o de poder movimentar as contas bancárias, nomeadamente de efectuar pagamentos.

18. Por força do mencionado arresto, o arguido está impossibilitado do liquidar a taxa de justiça ou qualquer outro encargo.

19. Por outro lado, o arguido goza do direito de ser ouvido pelo T.I.Criminal sempre que devam tomar decisões que pessoalmente o afectem — art.º 61, n.º 1, al. b) do C.P.P.-

20. e a decisão de se apoderarem da totalidade do seu património, independentemente do momento de aquisição, valor ou natureza, afecta e muito o arguido,

21. o qual, apresentou a sua versão dos factos e indicou a prova recair sobre a essa matéria.

22. A decisão recorrida violou, não só o art.º 8.º do regulamento das Custas Processuais, mas também, os artigos 513.º, 514.º e 61, n.º 1, al.b) do C.P.Penal.

23. A 30 de Junho de 2014 — doc.1 -, foi deferido o pedido de protecção jurídica requerido pelo arguido a 9 de Junho de 2014.

24. Pelo que, nos termos dos arts. 513, 514 do CPP e art.º 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais deverá a decisão recorrida, ser revogada e, em consequência, ser aceite a oposição deduzida ao arresto, sem a condenação das multas aplicadas”.
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Admitido o recurso (qualificado, no despacho proferido a fls. 1364, reproduzido a fls. 32 destes autos, como de apelação), o Ministério Público no tribunal recorrido respondeu à respectiva motivação, concluindo que merece provimento e por isso deve ser revogada a decisão recorrida.
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Já nesta instância, na intervenção a que alude o artigo 416.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer em que, secundando a posição do magistrado do Ministério Público na primeira instância, pronuncia-se pelo provimento do recurso.
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Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, mas não houve resposta do recorrente.
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Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II - Fundamentação
É geralmente aceite que são as conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.º, n.º 1, e 417.º, n.º 3, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj)[1] e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso.
Nas conclusões que formulou e que ficaram reproduzidas supra, o recorrente - no que parece ser uma crítica dirigida à decisão - faz notar que o arresto foi decretado sem a sua audição prévia (conclusão 3.ª), apesar do direito, que lhe é conferido pelo artigo 61.º, n.º 1, al. b), do Cód.Proc.Penal, de ser ouvido sempre que sejam tomadas decisões que pessoalmente o afectem (conclusão 19.ª).
No entanto, como observa o Ex.mo PGA no seu parecer, essa não é uma questão que possa ser considerada como integrando o objecto do presente recurso, pela simples razão de que o arguido não recorreu da decisão que decretou o arresto.
Como é sabido, nos procedimentos cautelares, a regra é a audição do requerido (que é citado para deduzir oposição) antes de ser proferida decisão sobre a providência (366.º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Proc. Civil).
No entanto, há procedimentos cautelares especificados (como acontece com o arresto) em que a providência requerida é decretada (verificados os respectivos pressupostos, naturalmente) sem audição prévia do requerido, sendo o contraditório exercido em momento posterior.
Nesses casos (providência cautelar decretada sem a sua audição prévia), o requerido pode reagir contra ela por um dos seguintes meios alternativos:
● mediante recurso, nos termos gerais, do despacho que a decretou;
● deduzindo oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova susceptíveis de infirmar os fundamentos da anterior decisão ou determinar a sua redução (artigo 372.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil).
É na oposição deduzida ou no recurso que for interposto que poderá ter cabimento suscitar a questão da sua audição prévia e não é por estarmos no âmbito do processo penal que a situação muda de figura.
Ora, o recurso que aqui se aprecia foi interposto, não da decisão que decretou o arresto, mas do despacho que determinou que, pela oposição deduzida, o arguido teria de pagar taxa de justiça e os acréscimos previstos no artigo 570.º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil.
Assim, a única questão a apreciar e decidir consiste em saber se a admissão da oposição deduzida contra o arresto está dependente da autoliquidação e pagamento prévio de taxa de justiça.
No despacho impugnado considerou-se que, se o arresto é “decretado nos termos da lei do processo civil” (artigo 228.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal), também o contraditório subsequente ao decretamento dessa providência, em qualquer das referidas modalidades, segue as mesmas regras.
Por isso, face ao disposto nos artigos 7.º, n.º 4, 14.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais (RCP) e 439.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, o arrestado/opoente teria de liquidar e pagar taxa de justiça com a oposição deduzida.
Em contraponto, o arguido/recorrente entende (no que é acompanhado pelo Ministério Público na primeira instância e pelo Ex.mo PGA) que é nos artigos 513.º e 514.º do Cód. Proc. Penal e 8.º do RCP que devem ser buscadas as regras sobre o pagamento de taxa de justiça aplicáveis ao caso, ou seja, a taxa de justiça é paga a final (n.º 9 do citado artigo 8.º do RCP), pois que o artigo 228.°, n.º 1, do Cód. Proc. Penal “limita-se a ditar que o arresto é decretado nos termos da lei do processo civil, ou seja, a tramitação processual é a fixada naquele código” (conclusões 10.ª e 13.ª).
É sem qualquer reserva que aceitamos que à tramitação subsequente ao decretamento do arresto (em que o arrestado pode exercer o contraditório) se aplicam as normas que a lei processual civil estabelece para este procedimento cautelar.
Mas, note-se bem, o que o artigo 228.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal determina é que o decretamento do arresto se faça “nos termos da lei do processo civil”, não se afigurando legítima uma interpretação extensiva que advogue a aplicação de normas sobre custas, em especial, sobre a oportunidade do pagamento da taxa de justiça, que não sejam aquelas que a lei contempla para o processo penal.
A circunstância de o procedimento cautelar de arresto correr por apenso não faz com que se autonomize da causa principal e, no caso, esse procedimento é dependência de uma causa crime, não de uma causa cível.
A fundamentação da decisão recorrida revela essa patente fragilidade: dá por adquirido aquilo [a aplicação ao procedimento cautelar de arresto das normas sobre pagamento de taxa de justiça próprias do processo civil, designadamente as contidas nos invocados artigos 7.º, n.º 4, e 14.º, n.º 1, do RCP, com o consequente afastamento do normativo que o RCP (artigo 8.º) estabelece para o processo penal] que está bem longe de ser o entendimento dominante.
Aliás, na jurisprudência, tem larga prevalência o entendimento contrário, como se colhe, entre outros, do acórdão desta Relação, de 18.05.2011 (Des. Joaquim Gomes), acessível em www.dgsi.pt, de que destacamos o seguinte trecho:
“A autoliquidação da taxa de justiça pela formulação do P.I.C., pesem embora os propósitos de uniformização do RCP, o mesmo continuou a distinguir a fixação da taxa de justiça devida em geral [6.º], relativamente a outros processos ou fases processuais [7.º e 8.º], bem como aos actos avulsos [9.º]. No caso da taxa de justiça devida em processo penal enumerou taxativamente os casos de autoliquidação e prévio pagamento, os quais estão expressamente previstos no seu art. 8.º, reconduzindo os mesmos à constituição de assistente [8.º, n.º 1] à abertura de instrução [8.º, n.º 2] e mais nada. Por sua vez, estipulou como regra geral que “Nos restantes casos, a taxa de justiça é paga a final, sendo fixada pelo juiz tendo em vista a complexidade da causa, dentro dos limites fixados pela tabela III” [8.º, n.º 5]. Por outro lado, o modo de pagamento dessa taxa de justiça encontra-se regulado pelo art. 13.º do RCP, sendo paga nos termos fixados pelo Código de Processo Civil [447.º, n.º 2 e 447.º-A do C. P. Civil], designadamente em função do respectivo impulso processual, estando a oportunidade desse pagamento, quando seja devida a taxa de justiça prévia, prevista no subsequente art. 14.º, n.º 1 e 2 do mesmo RCP. Isto significa que, como de resto já sucedida anteriormente na vigência do CCJ, que não há lugar ao pagamento prévio de taxa de justiça “Nas acções cíveis declarativas e arresto processados conjuntamente com a acção penal” [29.º, n.º 3, al. f) CCJ], atenta a autonomia do processo penal em relação ao processo civil [Ac. R. P. de 2011/Abr./04, em www.dgsi.pt].
Do acórdão da Relação de Coimbra de 12.10.2011 (processo n.º 410/11.8TBGRD-A.C1; Des. Jorge Jacob], disponível no mesmo sítio, respigámos a seguinte passagem:
“Da interpretação conjunta dos preceitos incluídos neste artigo 8.º (do RCP) resulta com linear clareza terem sido taxativamente enumerados todos os casos de autoliquidação de taxa de justiça e de prévio pagamento. Todas as situações que impliquem pagamento de taxa de justiça e que não estejam expressamente contempladas, caem sob a alçada do n.º 5, implicando o pagamento de montante variável, a fixar pelo juiz, a final, em função da complexidade da causa e dentro dos limites fixados na Tabela III anexa ao Regulamento”, concluindo no sentido de que, não beneficiando o demandante da isenção prevista na al. m) do art. 4.º do RCP e tratando-se de pedido de valor superior a 20UC, “a taxa de justiça correspondente será fixada a final, dentro dos limites legais, sendo a correspondente responsabilidade determinada segundo as regras do processo civil, por expressa imposição do art. 523.º do CPP, apenas podendo ser exigido o respectivo pagamento após o trânsito em julgado da decisão que a impuser”. E adjunge: “De resto, acompanhamos a posição que vem expressa no Ac. da Relação do Porto de 06/04/2011 …, de que os casos em que se exige o prévio pagamento de taxa de justiça como condição de validade da prática de actos processuais deve estar claramente regulamentada, não podendo ser deduzida “a contrario” pelo intérprete a partir de outras normas, como as que se referem à dispensa de prévio pagamento de taxa de justiça”[2].
Pode dizer-se que, em processo penal, a taxa de justiça, quando devida, é, por regra, paga a final. Excepcionalmente (nas duas mencionadas situações) é autoliquidada e paga com a prática do acto processual a ela sujeito.
A polémica em torno desta questão do pagamento da taxa de justiça em processo penal surgiu a propósito do pedido de indemnização civil deduzido em processo penal, mas está bem de ver que o problema coloca-se em relação a qualquer providência cível que nele for enxertada.
Quando o pedido de indemnização civil apresentado em processo penal tem um valor inferior a 20 UC, quer o demandante, quer o arguido demandado estão isentos de custas (que, como é sabido, abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte), nos termos do disposto no artigo 4.º, n.º 1, al. n), do RCP.
Que saibamos, nunca se pôs em causa que a dedução de pedido de indemnização civil em processo penal cujo valor seja igual ou superior a 20 UC (tal como o pedido de uma providência de natureza cível, seja de um arresto, seja de prestação de caução económica) está sujeita a tributação[3].
De acordo com uma tese jurisprudencial (minoritária), pela qual parece alinhar a decisão recorrida, não contendo o art.º 8.º do RCP qualquer referência ao pedido de indemnização cível deduzido em processo penal, sendo a Tabela III anexa, no que a tal concerne, omissa, seria aplicável o respectivo regime geral, pelo que a taxa de justiça seria determinada em função do valor do pedido indemnizatório em causa e do indicado na Tabela I-A anexa ao RCP e seria paga, em regra, integralmente e de uma só vez, até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, nos termos do disposto nos artigos 6.º, n.º 1, e 14.º, n.º 1, do RCP.
Para os defensores desta tese, a bondade de tal entendimento teria sido reforçada com as alterações introduzidas ao RCP pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, que agora, no seu artigo 15.º, dispõe o seguinte:
1 – Ficam dispensados do pagamento prévio de taxa de justiça:
a) ….
d) O demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respectivo valor seja igual ou superior a 20 UC”.
Argumenta-se que, se o legislador considerou necessário consagrar expressamente que o demandante e o arguido demandado ficam dispensados do pagamento prévio de taxa de justiça, é porque essa dispensa não decorria do (então), n.º 5 do artigo 8.º do RCP e, por argumento “a contrario”, que continua sujeito ao pagamento prévio de taxa de justiça o demandado não arguido que apresenta contestação.
No entanto, é geralmente reconhecido que este tipo de argumento é bastante falível, não pode ser decisivo quando se busca o sentido de uma norma ou conjunto normativo e, no caso, é perfeitamente reversível.
Como, certeiramente, se aduz no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 12.09.2011 (processo n.º 176/10.9TAGMR-A.G1, de que foi relatora a Desembargadora Maria Luísa Arantes, que aqui intervém como adjunta), “se o legislador pretendesse que no processo penal fosse autoliquidada a taxa de justiça pela dedução do pedido de indemnização civil, tê-lo-ia dito expressamente, como o fez para os casos de constituição de assistente e abertura da instrução requerida pelo assistente (art. 8.º n.os 1 e 2, do RCP)”.
Não ignorando o legislador que existiam divergências na jurisprudência sobre esse ponto e que o entendimento dominante é no sentido de que não há lugar ao pagamento prévio de taxa de justiça nas acções e providências de natureza cível enxertadas em processo penal, tendo alterado (pela citada Lei n.º 7/2012) o artigo 8.º do RCP, se pretendesse inverter essa situação, certamente teria introduzido nesse preceito uma alteração de forma a consagrar a obrigação de autoliquidar a taxa de justiça nesses casos.
Não foi essa a opção do legislador, o que permite pensar que não pretendeu alterar o statu quo existente.
Como se pode ler no preâmbulo do Dec. Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, “a taxa de justiça é (…) o valor que cada interveniente deve prestar, por cada processo, como contrapartida pela prestação de um serviço”.
Por isso que, não beneficiando de apoio judiciário nem de isenção de custas, as partes nas acções cíveis e os sujeitos processuais (arguido, assistente, demandante e demandado) no processo penal, têm de pagar taxa de justiça.
Mas importa não confundir a responsabilidade por custas e a oportunidade do pagamento da taxa de justiça, que tanto pode ser exigido a final (no caso do arguido em processo penal, a taxa de justiça é paga quando houver condenação em primeira instância e decaimento total em qualquer recurso) como de início, ou melhor, como condição de validade/admissibilidade da prática do acto a ela (taxa de justiça) sujeito.
Por expressa remissão do artigo 523.º do Cód. Proc. Penal, à responsabilidade por custas relativas ao pedido de indemnização civil são aplicáveis as normas do processo civil, o que é dizer que, via de regra, paga as custas a parte que a elas houver dado causa, ou seja, a parte vencida, na proporção em que o for (artigo 527.º do Cód. Proc. Civil), remissão que, no entanto, não é extensiva às normas de processo civil que exigem a autoliquidação e a apresentação do comprovativo do prévio pagamento de taxa de justiça.
Se na definição dos pressupostos em que assenta a obrigação de indemnizar (ou o correspondente direito a indemnização) e dos critérios de fixação do quantum de indemnização, rege a lei civil, no que tange à tramitação do pedido de indemnização civil, são as regras do processo penal que prevalecem, falando-se em independência substantiva e dependência processual da acção cível relativamente ao processo penal (cfr. Ac. STJ, de 15.09.2010, disponível em www.dgsi-pt/jstj, e a abundante jurisprudência nele citada).
No caso de arresto preventivo em processo penal, já vimos que o artigo 228.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal manda aplicar as normas do processo civil, mas não é demais repetir e frisar que tal remissão é, apenas, para as normas (processuais e substantivas) sobre o arresto, não sendo legítimo estender a remissão às normas sobre o pagamento de taxa de justiça.
Como bem faz notar o Ministério Público na sua resposta, há que ter bem presente que o requerido/arrestado é, também, arguido, a quem é constitucionalmente garantido o direito a ser presumido inocente e o direito ao contraditório e é à luz desse estatuto e dessas garantias que têm de ser interpretadas as normas sobre o pagamento da taxa de justiça.
O RCP contém um preceito legal (o artigo 8.º) que regula o pagamento da taxa de justiça em processo penal, prevendo duas situações (constituição como assistente e requerimento de abertura de instrução pelo assistente) em que há lugar a autoliquidação e pagamento prévio de taxa de justiça e uma norma (n.º 9), de cariz residual, que nos diz que, em todos os outros casos, a taxa de justiça é paga a final.
Não descortinamos nenhuma razão válida para, neste caso, afastar essas regras, pelo que a decisão recorrida não pode manter-se.

IIIDispositivo
Em face do exposto, acordam os juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em conceder provimento ao recurso interposto por B… e, em consequência, revogar a decisão recorrida, que, na ausência de quaisquer outros obstáculos, será substituída por outra que admita a oposição deduzida contra o arresto decretado.
Sem tributação.
(Processado e revisto pelo primeiro signatário, que rubrica as restantes folhas).

Porto, 17-09-2014
Neto de Moura
Maria Luísa Arantes
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[1] Cfr., ainda, o acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ n.º 7/95, de 19.10.95, DR, I-A, de 28.12.1995.
[2] No mesmo sentido, os acórdãos da Relação de Coimbra, de 01.02.2012 e de 10.10.2012, acessíveis em www.dgsi.pt.
[3] Discutia-se, isso sim, se o Instituto da Segurança Social, I.P. beneficiava de isenção de custas relativamente ao pedido de indemnização em que era ofendido/lesado em crimes como a fraude e o abuso de confiança contra a Segurança Social.