Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ANABELA DIAS DA SILVA | ||
Descritores: | EMBARGO DE OBRA NOVA PRESSUPOSTOS | ||
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Nº do Documento: | RP201305212862/12.0TBOAZ.P1 | ||
Data do Acordão: | 05/21/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | Na providência cautelar de ratificação de embargo de obra nova não tem o requerente de alegar e provar o justo ou fundado receio de lesão grave e de difícil reparação do direito invocado. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Apelação Processo n.º 2862/12.0 TBOAZ.P1 Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis - 3.º Juízo Cível Recorrente – B…, CRL Recorridos – C… e D… Relatora – Anabela Dias da Silva Adjuntas – Desemb. Maria do Carmo Domingues Desemb. Maria Cecília Agante Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível) I – B…, CRL, com sede em …, …, Oliveira de Azeméis, instaurou no Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis contra C… e D… a presente providência cautelar de ratificação de embargo de obra nova, pedindo que seja decretada a ratificação do embargo extrajudicial efectuado pela requerente, com efeitos retroactivos à data de 1 de Dezembro de 2012, pelas 10h10, com as respectivas consequências legais. Alegou para tanto e em síntese que é legítima proprietária do prédio urbano composto por pavilhão formado por c/v e sub-cave amplas para armazém, r/c amplo para estabelecimento com um escritório e um pequeno bar, e 1.º andar com salão polivalente, bar, sanitários, quarto de banho e sala de reuniões, sito no …, freguesia de …, concelho de Oliveira de Azeméis, descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Azeméis sob o n.º1755 e inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo matricial 621, confrontando do lado norte com caminho de servidão. Tendo em vista a construção de um prédio, a requerente procedeu a desaterro, o qual não ocorreu por completo, no lado norte, tendo aí deixado ficar uma “língua” de terra com largura superior a um metro de largura. A mencionada língua de terreno foi sendo objecto de depósito dos restos de materiais usados para a construção por parte da requerente, sendo que, por falta de recursos económicos, a obra na parte norte apenas findou em Julho de 2011, altura em que procedeu ao desaterro da referida ”língua” de terra, ficando o terreno ao nível do caminho existente. Em finais de Outubro de 2012 o requerido iniciou a construção de um muro na parcela de terreno da requente. Esse muro foi objecto de embargo extrajudicial, mas não requerida a ratificação do mesmo. Sendo que mais tarde o requerido veio a derrubar esse muro. Mas a 1 de Dezembro de 2012, pelas 09h00, os requeridos iniciaram a construção de um novo muro, este entre o primeiro muro construído em Outubro e o Edifício …. A requerente embargou a referida construção. Finalmente alega a requerente que a referida construção causará prejuízo uma vez que ”ficará impossibilitada de continuar a utilizar e fruir da respectiva parcela”, “impossibilitando o acesso à restante parte da sua propriedade”, “bem como constitui um risco, para qualquer utilizador da B…, nomeadamente crianças, uma vez quem caso o muro venha a ser concluído, cria um fosso, sem possibilidade de saída ou entrada”. * Por despacho de fls. 80 dos autos a requerente foi convidada a concretizar o “periculum in mora” que pretendia acautelar, sob pena de indeferimento liminar.* Em resposta a tal convite, veio a requerente dizer que pressupunha a desnecessidade de concretização do periculum in mora atenta a especificidade doo procedimento cautelar em questão.Todavia, acrescentou que os requeridos tencionam construir um muro com altura de 2 metros na propriedade da requerente, o que por si só consubstancia uma violação inaceitável do seu direito de propriedade e posse. Mais, a construção de tal muro criará um fosso que impossibilitará a requerente de aceder à restante parte do seu prédio. A acção que irá decidir tal litígio demorará nunca menos de 1 ano, o que é demasiado tempo sem que a requerente possa fazer uso da sua propriedade. * De seguida foi proferida decisão que nos termos dos artigos 412.º, a contrario, e 234.º-A, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, decidiu indeferir liminarmente a petição inicial da presente providência cautelar de ratificação de embargo de obra nova. Nessa decisão consignou-se, além do mais, que: (…)Atenta a matéria invocada pela requerente na petição cautelar e, principalmente, a sua forma de alegação, conclui-se que, mesmo com a prova integral de todos os factos que constam deste articulado, jamais estarão preenchidos os requisitos legais supra referidos, designadamente que o direito de propriedade da requerente tenha sido, ou possa vir a ser, ofendido em consequência de obra imputada aos requeridos e que essa obra causa ou ameaça causar prejuízo. Na verdade, não se alcança qual o prejuízo que a requerente acarretará com a construção do referido muro. Isto porque, por um lado, a possível existência de um fosso e a criação de um potencial risco para as crianças e utilizadores da B…, tendo em conta a concreta obra - construção de um muro com a altura máxima de 2 metros (cfr. doc. de fls, 85) - não é fundamento para o decretamento da presente providência. De facto, não se vislumbra o alegado prejuízo ou periculum in mora, pois, como alegado o muro terá a dimensão de 2 metros de altura não será facilmente transponível e a existência do denominado fosso mais não é do que uma realidade tantas vezes existente - veja-se a hipótese de qualquer muro delimitador com tais dimensões confrontando por com beirais de uma casa cuja parede se situe a alguns centímetros do seu limite. A considerar-se tais situações estar-se-ia a alargar desmesuradamente o conceito de prejuízo ou periculum in mora para um âmbito que não está efectivamente abrangido pela tutela concedida pela providência cautelar em análise. Por outro lado, e conforme se alcança das fotografias juntas pela requerente a mesma não fica impossibilitada de aceder à restante parte da sua propriedade, em virtude da servidão de passagem aí existente. Não se olvida que a construção do referido muro cause incómodos à requerente. Todavia, não foram este tipo de prejuízos que se visaram acautelar com a instauração de providência cautelar. Foram alegados "danos" cuja irrelevância e minudência não justificam, em nosso entender, este procedimento excepcional e urgente. É necessária a existência de um prejuízo objectivo, efectivo, verdadeiro, real, “in natura”, grave, substancial e dificilmente reparável, o que não sucede in casu. Em consequência, sendo a pretensão de ratificação de embargo de obra nova manifestamente improcedente, deverá a petição cautelar ser liminarmente indeferida - artigo 234.º-A, n.º 1 do Código de Processo Civil -, devendo a requerente suportar as custas a que deu causa - artigos 446.º e 453.º, a contrario, ambos do Código de Processo Civil.” * Não se conformando com tal decisão, dela veio a requerente recorrer de apelação pedindo a sua revogação e substituição por outra que determine a aceitação da petição e o prosseguimento dos respectivos autos um termos legais.A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. Por requerimento datado de 6 de Dezembro de 2012, requereu a aqui Requerente a ratificação do embargo de extrajudicial de obra nova realizada a 1 de Dezembro de 2012, nos termos do artigo 412.º e seguintes do Código de Processo Civil. 2. Alegou para o efeito, que os Requeridos encontravam-se a construir um muro de aproximadamente 2 metros de altura e 18 metros de comprimento, o qual tinha sido iniciado nessa manhã, em propriedade da Requerente. 3. Que esse muro se encontrava ainda na fase inicial da sua construção, sem a realização de alicerces e vigas de sustentação, com a altera de 0,50 centímetros correspondente à sobreposição de duas fiadas de tijolos. 4. Visando os Requeridos a construção de um muro com cerca de dois metros de altura. 5. Com a construção do referido muro, os Requeridos usurpam cerca de 20m2 de propriedade da aqui Requerente. 6. Bem como impedem a utilização da restante propriedade que sobre entre o muro e o prédio da requerente de aproximadamente 20m2, uma vez que o fosso criado não permite sequer que uma pessoa lá circule atento que o muro é construído ligando duas paredes do edifício da Requerente. 7. Bem como constitui um risco para a segurança dos utentes da Requerente enquanto B…, na medida em que se o muro for concluído como se encontra a ser construído, tal vai redundar na construção de um fosso, conforme resulta perceptível das fotos juntas. 8. Sendo que foram alegados e demonstrados os requisitos necessários para o decreto da providência. 9. Por despacho de 10.12.2012, veio o Meritíssimo Juiz convidar a Requerente para concretizar o periculum in mora. 10. Ao que a Requerente respondeu devidamente. 11. Por decisão de 26.12.2012, veio Meritíssimo Juiz indeferir liminarmente a Petição Inicial da Providencia por terem sido “alegados “danos” cuja irrelevância e minudência não justificam, em nosso entender, este procedimento excepcional e urgente”, mais alegando que "É necessária a existência de um prejuízo efectivo, verdadeiro, real, “in natura”, grave, substancia! e dificilmente reparável, o que sucede in casu” 12. Decisão que tomou sem sequer ouvir testemunhas, ou proceder ao julgamento da questão em sede própria. 13. Posição que a aqui Requerente não compreende e não aceita. Atentos os factos em questão. 14. Até ao presente momento, os Requeridos não prosseguiram com a referida construção. 15. Ao indeferir liminarmente a petição inicial o Tribunal "a quo” denega a realização de justiça peticionada pela Requerente, 16. Não interpretando de forma correcta o previsto e estatuído no artigo 412.º do Cod. Proc. Civil. 17. Pois não relevou os factos alegados pela Requerente, menosprezando a importância da questão. 18. Violando, com a sua interpretação, o estatuído nos artigos 2.º n.º 2 e 412.º, n.º 1 do Código de Proc. Civil e 1305.º do Código Civil. 19. Pois, uma interpretação correcta da Lei, e tendo em conta os factos alegados, pressuponham uma decisão diversa, ou seja, de prosseguimento da providência para produção de prova em sede de Audiência de Julgamento, ou mesmo o decreto imediato da mesma atenta a prova documental junta aos autos. 20. Sendo que dessa forma se faria correcta interpretação do estatuído na lei. II – Os factos relevantes para a decisão do presente recurso são os que estão enunciados no supra elaborado relatório, pelo que, por razões de economia processual, nos dispensamos de os reproduzir aqui. III – Como é sabido o objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 684.º n.º3, 684.º-B, n.º 2 e 685.º-A, todos do C.P.Civil), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida. Sendo que ao presente recurso já é aplicável o regime processual estabelecido pelo DL 303/2007, de 24.08, por respeitar a procedimento cautelar instaurado depois de 1 de Janeiro de 2008, cfr. n.º 1 do artº 11.º e art.º 12.º do citado DL. * Ora, visto o teor das alegações da apelante é questão a apreciar no presente recurso:- Saber se é aplicável ou não, à providência cautelar de ratificação de embargo de obra nova um dos requisitos do procedimento cautelar comum - o periculum in mora - ou seja, tem o requerente alegar e provar, indiciariamente, o fundado receio de que o seu direito sofrerá, se não for de imediato tutelado pela providência peticionada, lesão grave e de difícil reparação. * Como se sabe os procedimentos cautelares constituem instrumentos processuais destinados a prevenir a violação grave ou de difícil reparação de direitos, derivada da demora natural de uma decisão judicial. Representam, por isso, uma garantia de eficácia, em relação à decisão a proferir no processo principal. Decorre da necessidade desta eficácia, a urgência do processo de providência cautelar e concomitantemente, a análise apenas sumária da situação de facto, “summaria cognitio”, de forma a fazer-se um mero juízo sobre a provável existência do direito, “fumus boni juris”, e o receio justificado da necessidade da providência, de forma a evitar que o direito seja seriamente afectado ou até inutilizado “periculum in mora”. Como refere António Geraldes, in “Temas da Reforma de Processo Civil”, III Vol. pág. 35, os procedimentos cautelares “são, afinal, uma antecâmara do processo principal, possibilitando a emissão de uma decisão interina ou provisória destinada a atenuar os efeitos erosivos decorrentes da demora na resolução definitiva ou a tornar frutuosa a decisão que, porventura, seja favorável ao requerente”. O embargo de obra nova rege-se pelas disposições que lhe são próprias e subsidiariamente, ou seja, em tudo quanto não se encontre especialmente prevenido, pelas disposições aplicáveis ao procedimento cautelar comum. O que significa, como adverte Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, 3.º vol., pág. 333, que: “a) Atenta a regra da especialidade, deve dar-se prioridade às normas especificamente previstas na regulamentação de cada um dos procedimentos; b) Devem ser excluídas todas as normas que não se adaptem a cada um destes procedimentos específicos; (…)”. O art.º 412.º do C.P.Civil, dispõe no seu n.º 1 que “aquele que se julgue ofendido no seu direito de propriedade, singular ou comum, em qualquer outro direito real ou pessoal de gozo ou na sua posse, em consequência de obra, trabalho ou serviço novo que lhe cause ou ameace causar prejuízo, pode requerer, dentro de 30 dias, a contar do conhecimento do facto, que a obra, trabalho ou serviço seja mandado suspender imediatamente”. O n.º 2 do mesmo normativo estatui que “o interessado pode também fazer directamente o embargo por via extrajudicial, notificando verbalmente, perante duas testemunhas, o dono da obra, ou, na sua falta, o encarregado ou quem o substituir, para a não continuar”. Resulta assim que o embargo judicial e a ratificação do embargo extrajudicial de obra nova obedecem aos seguintes requisitos, cumulativos: a) - que o requerente seja titular de um direito de propriedade, de qualquer outro direito real ou pessoal de gozo ou de posse; b) - que o requerente se julgue ofendido no seu direito em consequência de obra, trabalho ou serviço novo; c) - que a obra, trabalho ou serviço novo cause ou ameace causar prejuízos ao requerente. E para além daqueles requisitos, é ainda necessário que o requerente peça a suspensão da obra no prazo de 30 dias a contar do conhecimento da mesma. O requerente pode também fazer o embargo directamente, por via extrajudicial, notificando verbalmente, perante duas testemunhas, o dono da obra ou, na sua falta, o encarregado ou quem o substituir para a não continuar, devendo, neste caso, requerer a ratificação judicial do embargo no prazo de cinco dias, sob pena de o embargo ficar sem efeito, cfr. n.ºs 2 e 3 do citado preceito legal. A alegação e a prova da verificação desses requisitos compete ao requerente, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 342.º do C.Civil. Para isso, no entanto, deve ele que alegar e justificar de forma mesmo sumária os factos de onde deriva o seu direito e a ilicitude da actuação do requerido, indicando, de forma clara, em que consiste o seu direito, em que medida é que se julga ofendido nesse direito, que tipo de obra, trabalho ou serviço novo é que está a ser levado a efeito e que prejuízos a obra, trabalho ou serviço novo lhe causam ou ameaçam causar. Assim para que o facto ofensivo possa desencadear o mecanismo legal do embargo de obra nova é necessário que se tenha começado obra nova, que esta não esteja ainda concluída e que cause prejuízo ao direito de outrem, ou que venha a causá-lo. Ou dito de outra forma, para que proceda o embargo de obra nova, necessário é, além do mais, que a obra tenha já sido iniciada, mas não esteja ainda concluída e que consista num facto ilícito. E para se considerar iniciada a obra, é indispensável que se verifique um começo de execução material, não bastando os preparativos feitos para a realizar. O caso em apreço nos autos prende-se com a interpretação do 3.º supra referido requisito necessário ao decretamento do embargo judicial ou da ratificação de embargo extrajudicial de obra nova - que a obra, trabalho ou serviço novo cause ou ameace causar prejuízos ao requerente. A frase contida no artº 412.º n.º1 do C.P.Civil, ou seja, “que cause ou ameace causar prejuízo” serve para vincar a ideia de que o embargo é admissível, quer como meio de reacção contra prejuízo já produzido, quer como meio de prevenção contra prejuízo iminente, cfr. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil, Anotado”, pág. 65. Ora, decidir se é aplicável ou não, à providência cautelar de ratificação de embargo de obra nova um dos requisitos do procedimento cautelar comum - o periculum in mora - ou seja, se tem o requerente alegar e provar, indiciariamente, o fundado receio de que o seu direito sofrerá, se não for de imediato tutelado pela providência peticionada, lesão grave e de difícil reparação é questão que tem dividido a nossa Doutrina e Jurisprudência, tal como se afirma na decisão recorrida. Como se escreveu no Ac. da Relação do Porto de Porto, 14.10.2008 que aqui nos permitimos reproduzir, por bem expressar as diferenças de posição “Para uns: «o requisito do receio de "lesão grave e dificilmente reparável" contemplado no artigo 381.º n.º1 do CPC para as providências cautelares não especificadas não é aplicável às providências especificadas, designadamente ao embargo de obra nova … em relação a cada uma das providências especificadas, a lei prevê determinados fundamentos, respeitantes ao dano causado ao direito do requerente…; por isso, a aplicação subsidiária prevista no citado artigo 392.º n.º1 não abrange aquele fundamento; em particular com referência ao embargo de obra nova, o "prejuízo" confunde-se com a própria violação do direito do requerente ou da sua posse e a função essencial da providência é o julgamento antecipado (embora provisório), de modo a evitar-se que aquela violação perdure por período mais ou menos longo» - Ac. do STJ de 29.06.99, dgsi.pt, p. 99A48. Ou seja, o prejuízo não carece de valoração autónoma, pois de alguma forma já está ínsito na ofensa do direito, o prejuízo consiste exactamente nessa ofensa, não sendo necessário alegar a existência de perdas e danos, por o dano ser jurídico. Desde que o facto tem a feição de ilícito, porque contrário à ordem jurídica concretizada num direito de propriedade, numa posse ou fruição legal, tanto basta para que haja de considerar-se prejudicial para efeitos de embargo de obra nova - cfr. Alberto dos Reis, CPC Anotado, vol 2º, pág.63 e sgs., Moitinho de Almeida, Embargo ou Nunciação de Obra Nova, pág.30; Ac RC de 8.1.91, CJ, 1.º, 42, e Ac RE de 29.11.2001, CJ, 5.º,253. Para outros a instauração de uma providência cautelar não pode ter como fundamento apenas meros incómodos, ou meras ofensa normativas e formais, mas, antes concretas desvantagens, destruição, diminuição ou desvalor, em suma, um dano ou prejuízo objectivo, efectivo, verdadeiro, real, in natura, grave, substancial e dificilmente reparável – cfr. Batista Lopes, in Procedimentos Cautelares, p.141, cit. por A. Geraldes, Temas, 4º, 246 e Acs. da Relação de Évora de 02.12.1982 e 19.04.1990, BMJ, 324.º, 637 e 396.º,457; Ac. da Relação do Porto de 03.06.2004, dgsi.pt, p.0433091 e da Relação de Coimbra de 02.10.2007,dgsi.pt, p. 554/04”. Quanto a nós defendemos o entendimento defendido em alguns arestos de que o embargo de obra nova não pressupõe a demonstração da lesão grave ou dificilmente reparável, não sendo aplicável esse requisito exigido pelo n.º 1 do art.º 381.º, cfr. Acs. do STJ de 29.06.99 e de 9.09.2008, Acs. Relação do Porto de 9.05.2007, de 3.05.2010, de 23.02.2012 e de 19.02.2013, todos in www.dgsi.pt., Moitinho de Almeida, in “Embargo ou Nunciação de Obra Nova”, pág. 30 e Abrantes Geraldes, in obra citada, pág. 258, onde refere que “A lei prescindiu da quantificação e da qualificação dos prejuízos. Uma vez demonstrado que a actuação do requerido ofende direitos de natureza patrimonial inscritos na previsão normativa, é indiferente para efeitos de procedência dos embargos a gravidade dos danos, tendo sido afastada uma opção assente no princípio da proporcionalidade assumido no procedimento cautelar comum (artº 387º, nº2)”, citando o Ac. da Relação de Évora de 29.11.2000, in CJ, tomo 5.º, pág.253. Na verdade, o requisito da lesão grave e dificilmente reparável ao direito do requerente, ou periculum in mora, a que se reporta o n.º1 do art.º 381.º do C.P.Civil, não obstante o princípio da subsidiariedade expresso no n.º1 do art.º 392.º do C.P.Civil, deve ser excluído do procedimento cautelar de embargo (ou ratificação de embargo) de obra nova, por não se adaptar, em concreto à especificidade desde procedimento. O requisito do justo ou fundado receio de lesão grave e de difícil reparação do direito a que se refere o n.º1 do art.º 381.º do C.P.Civil, e que genericamente vigora para todos os procedimentos cautelares comuns, pressupõe a ocorrência de um fundado receio de prejuízos reais e certos, resultante de uma avaliação objectiva e ponderada da realidade, e tem como correlativo, no que concerne ao procedimento cautelar de embargo (ou ratificação de embargo) de obra nova no facto de causar ou ameaçar causar prejuízo, já que este prejuízo se confunde com a própria violação do direito de propriedade do requerente ou da sua posse e a função essencial da providência é o julgamento antecipado (embora provisório), de modo a evitar-se que aquela violação perdure por período mais ou menos longo; a maior exigência prevista no artigo 381.º n.º 1 justifica-se na medida em que se trata de norma em branco quanto à natureza da providência” cfr. Ac. STJ de 29.06.99, in www.dgsi.pt. Sendo que como se vem entendendo prejuízo abrange toda e qualquer violação do direito de propriedade, embora desta violação possa não resultar um prejuízo, propriamente dito. E assim sendo, bastará a ilicitude do facto, ou seja, que este ofenda o direito de propriedade, a posse ou a fruição, pois que o prejuízo consiste exactamente nessa ofensa. Trata-se de dano jurídico, ou seja, de um dano derivado, pura e simplesmente, da violação do direito de propriedade, da posse ou da fruição de outrem. Destarte, no procedimento cautelar de cuidamos nestes autos, não tem o requerente de qualificar e quantificar os prejuízos, isto é, alegar e provar o justo ou fundado receio de lesão grave e de difícil reparação do direito, ao invés do que sucede nos procedimentos cautelares comuns, bastando-lhe alegar e provar a lesão do seu direito de propriedade ou a posse (ilicitude) pela realização de uma obra material, o que implica necessariamente o prejuízo, pois que afecta ou pode afectar a possibilidade de plena fruição do bem. * No caso dos autos, alega a requerente que os requeridos estão a construir um muro, com cerca de 2 metros de altura e 18 metros de comprimento e que o estão a erigir dentro do seu prédio, ocupando cerca de cerca de 20 m2 de propriedade da requerente. Desta forma alega a requerente a prática pelos requeridos de um acto ilícito que viola o seu (da requerente) direito de propriedade. Ou dito de outra forma estando alegado que o muro ocupa parte do prédio da requerente está invocado o prejuízo derivado da violação do direito de propriedade desta e a que se reporta o n.º1 do art.º 412.º do C.P.Civil. Está assim alegado que aquela obra causa prejuízo à requerente, pois que desde logo a concretização do muro impede-a de fruir plenamente o seu imóvel, uma vez que os requeridos com o dito muro estão a usurpar cerca de 20 m2 de área do mesmo, apropriando-se, assim, da mesma. A decisão recorrida indeferiu liminarmente o pedido de ratificação do embargo de obra nova por considerar que não estavam preenchidos os requisitos legais necessários ao decretamento da providência, designadamente que o direito de propriedade da requerente tenha sido ou possa vir a ser ofendido em consequência de obra imputada aos requeridos e que essa obra causa ou ameaça causar prejuízo. Concretamente, por se ter aí considerado que a lesão sofrida pela requerente não apresentava cariz irreparável ou de muito difícil reparação, pelo que não se vislumbrou qual o prejuízo que para a requerente acarretava a construção do referido muro. Ora, tendo nós concluído que é absolutamente estranha à providência cautelar em apreço a exigência do justo ou fundado receio de lesão grave e de difícil reparação do direito, há que dar razão à requerente/apelante ordenando-se a aceitação da petição inicial e o prosseguimento dos ulteriores termos da providência. Procedem as respectivas conclusões da apelante. IV – Pelo exposto acordam os Juízes desta secção cível em julgar a presente apelação procedente, revogando a decisão recorrida e ordenando que se aceite da petição inicial e que os autos prosseguiam os seus ulteriores termos. Custas pela parte vencida a final. Porto, 2013.05.21 Anabela Dias da Silva Maria do Carmo Domingues Maria Cecília de Oliveira Agante dos Reis Pancas |