Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0332123
Nº Convencional: JTRP00036793
Relator: TELES DE MENEZES
Descritores: REGISTO DE MARCA
Nº do Documento: RP200305150332123
Data do Acordão: 05/15/2003
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: 2 J CIV PORTO
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: .
Decisão: .
Área Temática: .
Legislação Nacional: CCIV66 ART310 G.
L 23/96 DE 1996/06/26 ART1 N1 ART10 N1.
DL 240/97 DE 1997/09/18 ART3 N1 ART16 N3 D.
Sumário: I - Enquanto a prestação de serviço de telefone fixo é um serviço público que ao Estado compete assegurar ou a quem o concessione, o serviço de audiotexto (SVA) visa meros propósitos de carácter comercial, exigindo-se manifestação expressa do assinante relativamente ao acesso.
II - Assim, os créditos pela prestação dos serviços telefónicos prescrevem no prazo de 6 meses, já os citados pela prestação dos serviços de audiotexto prescrevem no prazo de 5 anos.
III - Não tendo havido manifestação expressa do assinante ao acesso dos serviços de audiotexto, inexistindo, portanto, contrato, não é este responsável por qualquer pagamento que lhe venha a ser exigido.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

PT Comunicações, S.A. intentou a presente acção com processo sumário contra Joana .........., pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de 1.905.514$00, acrescida de juros de mora vencidos, no montante de 75.000$00 e vincendos, até integral pagamento.
Invocou a prestação de serviços de telefone público pela Ré, no âmbito do contrato de prestação de serviços dessa natureza celebrado entre ambos, encontrando-se por pagar as facturas emitidas entre Dezembro de 2000 e Abril de 2001, no valor do pedido de capital formulado.
A dívida devia ter sido paga no prazo de 12 dias a contar da data da apresentação de cada factura, pelo que a Ré entrou em mora desde então.

A Ré contestou invocando a excepção de prescrição extintiva de 6 meses após a prestação dos serviços, prevista no art. 10.º da Lei 23/96, de 29.7, o que implica que as facturas de Dezembro de 2000 a Fevereiro de 2001 integrem créditos já prescritos. Invocou também a ilegitimidade da A., por esta ter celebrado contratos com os prestadores de serviços de audiotexto, que passaram a assumir os riscos de cobrança dos seus serviços sempre que o cliente da PT se recuse a efectuar de livre e espontânea vontade tal pagamento, pelo que a A. não pode vir a juízo reclamar o pagamento duma quantia cuja responsabilidade de cobrança transferiu para empresas que a Ré desconhece e a quem cabe reclamar qualquer hipotético crédito da A. sobre aquela. Invocou ainda o pagamento do crédito da A., com excepção das chamadas de valor acrescentado, cujo valor reclamado pela A. em Junho de 2001 ascendia a 1.887.661$00. Disse que não foi ela que fez as chamadas de audiotexto, desde logo por se tratar de linhas eróticas. Invocou o desconhecimento de que os serviços de audiotexto correspondiam a um serviço de valor acrescentado, não tendo sido disso informada, nem do custo por minuto, nem de que se tratava de um serviço para adultos, nem recebeu sinal indicador da contagem dos minutos, pelo que não pode ser responsabilizada pelos custos, dado que se mostram violadas as disposições contidas na al. b) do n.º 2 do art. 6.º, os n.ºs 2 e 3 do art. 9.º do DL 177/99, de 21.5, os n.ºs 1 e 2 do art. 2.º do DL 175/99, de 21.5 e o n.º 4 do art. 9.º da Lei 24/96, de 31.7. Finalmente invocou não ter solicitado expressamente à A. este tipo de serviços, nunca tendo revelado por qualquer forma a intenção de aderir e usufruir dos mesmos. Por impugnação, contrariou todos os factos articulados pela A. que se encontrem em contradição com o que foi por si alegado.

A A. respondeu, dizendo que o que a Lei 23/96 prevê no art. 10.º/1 é um prazo de prescrição de 6 meses sobre o direito de exigir o pagamento do preço do serviço telefónico, o qual se esgota com a apresentação da respectiva factura, como decorre dos n.ºs 4 e 5 do art. 9.º do DL 381-A/97, de 30.12, sendo que as facturas em causa foram enviadas à Ré antes de decorridos 6 meses sobre a data da sua emissão.
Para a prescrição do direito de crédito vigora o art. 310.º-g) do CCivil, que estabelece um prazo de 5 anos, o qual ainda não decorreu.
Por outro lado, a Lei 23/96 apenas se aplica às dívidas dos serviços públicos essenciais, nos quais se inclui o serviço fixo de telefone, mas já não o serviço de valor acrescentado, claramente excluído do âmbito de aplicação da dita lei, sendo que das facturas constam impulsos de SVA.
Relativamente aos serviços de valor acrescentado, à A. apenas cabe permitir o acesso à rede aos respectivos operadores e clientes, assegurando a cobrança destes serviços, prestados através da rede pública, por imposição legal – DL 329/90, de 23.10.
Quanto à ilegitimidade, afirmou que apenas deixou de proceder à cobrança dos valores relativos a chamadas de SVA a partir de Maio de 2001 quando tenha havido reclamação do cliente em relação à facturação, sendo as facturas anteriores a esta data.

No saneador foi a A. considerada parte legítima.
Foi relegada para final a decisão da excepção de prescrição das três primeiras facturas cujo pagamento é pedido na acção.
Organizaram-se os factos assentes e a base instrutória.
Após a instrução realizou-se o julgamento e veio a ser proferida sentença que julgou procedente a excepção de prescrição e parcialmente procedente a acção, condenando-se a Ré a pagar à A. a quantia de € 13,40, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde 29.11.2001 até integral pagamento.

A A. recorreu, concluindo como segue a sua alegação:
1.º. O serviço telefónico/serviço fixo de telefone é técnica e legalmente distinto do serviço de audiotexto, são diferenciáveis, sendo certo que o prazo de prescrição que lhes é aplicável é de cinco anos – al. g) do art. 310.º do CCivil – e de dois anos – al. b) do art. 317.º do mesmo diploma – respectivamente.
2.º. A Lei 23/96, de 26.7 e o DL 381-A/97, de 30.11, são claros no sentido de considerar a prescrição do serviço fixo de telefone no prazo de cinco anos.
3.º. No caso em apreço não deve proceder a nulidade do contrato, não obstante o serviço de audiotexto não ter sido expressamente requerido, porquanto nunca a Ré manifestou outra vontade que não fosse aceder a esses serviços.
4.º. E ainda que se considere nulo, sobre a Ré deve recair a obrigação de pagar os serviços que efectivamente utilizou, de acordo com o art. 289.º do CCivil, sem recurso à Lei 24/96, que pressupõe a não utilização ou consumo dos serviços ou bens que o consumidor não solicitou – o que seguramente não se enquadra no caso em apreço – sob pena de se gerar um locupletamento indevido à custa de outrem.
Pede a revogação da sentença e a procedência integral da acção, com a consequente condenação da Ré no pedido.

A Ré contra-alegou pugnando pela confirmação do julgado.

Corridos os vistos legais cumpre decidir.

Factos provados:
1.º. A A. celebrou com a Ré um contrato de prestação de serviço fixo de telefone e respectivo uso da rede pública comutada, mediante o pagamento das tarifas legalmente fixadas, tendo-lhe sido atribuído o posto telefónico n.º ......... da rede do ........ (A).
2.º. A A. emitiu, para serem pagas pela Ré, a factura de 11.12.2000, no montante de 31.470$00, conforme doc. de fls. 5 a 20; a factura de 11.1.2001, no montante de 1.871.188$00, conforme doc. de fls. 21 a 30; a factura de 12.2.2001, no montante de 2.669$00, conforme doc. de fls.31 a 36; a factura de 12.3.2001, no montante de 2.599$00, conforme doc. de fls. 37 a 40; e a factura de 9.4.2001, no montante de 87$00, conforme doc. de fls. 41 a 44 (B).
3.º. As chamadas telefónicas facturadas pela A. foram feitas do posto telefónico referido em A) (2.º).
4.º. A utilização de serviços de valor acrescentado ou, como ora se chamam, de audiotexto, nunca foi expressamente solicitada à A. pela Ré (4.º).

As questões suscitadas pela apelante são estas:
\diferente natureza dos serviços de telefone fixo e de audiotexto (SVA);
\prazo prescricional de cada um deles;
\consequências de não ter sido expressamente requerido o serviço de audiotexto.

Aquilo que resulta dos factos provados é que a A. e a Ré celebraram um contrato de prestação de serviço fixo de telefone, mas não de audiotexto, visto que a Ré nunca solicitou este expressamente à A..
Como se explica no acórdão do STJ de 9.4.2002, CJ/STJ, X, 2,12, aludindo ao DL 199/87, de 30.4 (serviço telefónico público) e à Lei 88/89, de 11.9 (telecomunicações), ao Estado compete assegurar a existência de um serviço público de telecomunicações, o qual pode ser explorado, em regime de concessão, por operadores de serviço público que, além do mais, ficam obrigados à prestação dos serviços fundamentais, nas condições definidas na lei ou em contratos de concessão.
O serviço fixo de telefone é um serviço fundamental.
O serviço público de comunicações assenta numa rede básica de telecomunicações.
Todavia, ao lado do serviço público de telecomunicações, pode haver uma rede complementar de telecomunicações, explorada pelos OSPT ou por empresas de telecomunicações complementares licenciadas.
As infra-estruturas que integram a RBT e as infra-estruturas de telecomunicações complementares constituem a RT de uso público.
Qualquer pessoa singular ou colectiva autorizada pode prestar serviços de valor acrescentado, para além dos OSPT e de empresas de TC.
Por SPVA entendem-se os que, tendo como único suporte os serviços fundamentais ou complementares, não exijam infra-estruturas de telecomunicações próprias e são diferenciáveis em relação aos próprios serviços que lhes servem de suporte.
O DL 329/90, de 23.10, regulamenta o acesso à exploração de SVA e, como resulta da Portaria 428/91, de 24.5 a prestação dos respectivos serviços tem uma perspectiva comercial.
Por isso, enquanto os preços dos serviços prestados em exclusivo por OSP são objecto de convenção (DL 207/92, de 2.10), os preços dos outros serviços são fixados pelos operadores, que devem publicitar adequadamente esses preços, bem como o conteúdo, de forma proporcionar aos potenciais utentes, de forma clara e inequívoca, a perfeita e completa identificação das respectivas condições de prestação (Portaria 160/94, de 22.3).
A Lei 23/96 estabelece regras de prestação de serviços públicos essenciais em ordem à protecção do cliente, neles se incluindo o serviço público de telefone, cujo serviço fixo veio a ser regulamentado pelo DL 240/97, de 18.9, em ordem a «uma mais eficaz protecção dos direitos dos utilizadores de um serviço fundamental» e que revogou o DL 199/87, aplicando o regulamento aos contratos anteriores.
No seu art. 1.º estabelece que «o serviço fixo de telefone é prestado aos assinantes e ao público em geral pelo OSPT nos termos previstos na Lei 88/89, no contrato de concessão, e neste regulamento».
No art. 3.º-a) estabelece que constitui direito dos assinantes o acesso aos SVA que tenham como suporte o SFT.
No art. 12.º-g) impõe ao operador o barramento selectivo de chamadas com destino aos serviços de telecomunicações complementares e aos serviços de telecomunicações de valor acrescentado.
No art. 16.º/3-d) exige-se a manifestação expressa da vontade do assinante relativamente ao acesso, ou não, aos SVA, de modo selectivo, ferindo-se com a nulidade os contratos de prestação do SFT que não contenham qualquer das cláusulas ou dos elementos previstos no art. 16.º - cfr. art. 17.º.
Assim, podemos concluir que os SVA nada têm a ver com aquilo que o Estado está obrigado a fornecer aos cidadãos, que é um serviço público de telecomunicações, que garante a prestação de serviços fundamentais.
A RBT pode também ser utilizada por qualquer pessoa credenciada para prestar SVA, podendo fazê-lo o próprio operador da RBT, mas que são prestados ao lado do serviço público de telefone fixo, esse sim um serviço público essencial.
Daí que o tratamento entre as duas qualidades de serviços não deva ter um tratamento indiferenciado, porquanto, se um assegura um interesse público essencial, o outra visa meros propósitos de carácter comercial.
Concorda-se, pois, com a apelante, quando entende que se trata de realidades distintas, a exigir diferente tratamento jurídico.

Passemos à análise do prazo prescricional.
A Lei 23/96, de 26.6 tem como escopo a protecção do utilizador de qualquer dos bens ou serviços públicos nela enumerados, a saber, a água, a electricidade, o gás ou o telefone – cfr. art. 1.º/1.
Sobre a prescrição estabelece no seu art. 10.º/1 que «o direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação».
Anteriormente à publicação da mencionada lei, tinha-se por assente que os créditos pela prestação dos serviços telefónicos prescreviam no prazo de cinco anos, de acordo com o disposto na alínea g) do art. 310.º do CCivil.
As razões justificativas das prescrições de curto prazo, no dizer de Baptista Machado, RLJ, 117.º-205/206, só podem estar na tutela da segurança do sujeito passivo da relação jurídica (fala o artigo em causa da prescrição do art. 150.º do CCom., mas refere-se expressamente às prescrições de curto prazo do art. 310.º).
A prescrição de cinco anos do mencionado preceito é de natureza extintiva, desde logo por contraposição ao art. 312.º, que fala das prescrições presuntivas, confinando-as à subsecção com ele iniciada.
O mesmo entendimento tem Calvão da Silva, RLJ, 132.º-151, ao dizer que a prescrição quinquenal do art. 310.º é extintiva ou liberatória, na esteira de Pires de Lima e Antunes Varela, CCivil Anot..
Esta prescrição extingue a obrigação, no sentido de que, decorridos os cinco anos, o devedor pode opor ao credor que o accione a excepção peremptória da prescrição, pelo que, se quiser cumprir passado esse lapso de tempo, fá-lo não porque a isso esteja obrigado, mas no cumprimento de uma obrigação natural, que apenas corresponde a um dever de justiça – art. 402.º do CCivil – autor e local citados.
Pessoa Jorge, Obrigações, II, 1968-1969, 38, dá como exemplo típico de obrigações naturais do tipo obrigações jurídicas imperfeitas, a obrigação prescrita e o caso previsto na parte final do art. 566.º do CCom..
Com a entrada em vigor da Lei 23/96, a prescrição extintiva quinquenal do art. 310.º passou a ser de seis meses, no que à prestação de serviços básicos se refere, por força do seu art. 10.º/1, supra transcrito.
Não colhe a posição da apelante de que o prazo do art. 10.º/1 apenas é aplicável à apresentação da factura ao devedor, mas não já à propositura da acção.
O art. 306.º/1 do CCivil dispõe que «o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido».
As contas pela prestação dos serviços de serviços da rede fixa de telecomunicações são apresentadas mensalmente ao devedor.
Por isso, Calvão da Silva afirma que o art. 10.º/1 deve ler-se:
«O direito de exigir judicialmente o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação mensal, data da exigibilidade da obrigação e da possibilidade de exercício do direito» - pág. 155.
O envio da factura para se proceder ao pagamento no prazo nela estipulado é uma mera interpelação para pagamento, que faz incorrer o devedor em mora, nos termos do art. 805.º do CCivil, mas não interrompe a prescrição, conforme resulta do art. 323.º/1.
Assim ensina Pessoa Jorge, obra citada, I, 679, afirmando que «a interpelação extrajudicial feita pelo credor ao devedor, embora seja relevante e eficaz no que toca ao vencimento da dívida, não produz o efeito interruptivo da prescrição».
E a fls. 666-667 refere que «o art. 304.º, ao estabelecer os efeitos da prescrição, dispõe no n.º 1 que “completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, de qualquer modo, ao exercício do direito prescrito”.
Deste preceito parece resultar que o devedor (se de obrigação se trata), uma vez decorrido o prazo prescricional (e é esse o significado da frase inicial “completada a prescrição”), passa a dispor de uma causa de justificação permanente: pode sempre recusar o cumprimento da obrigação».
E diz a fls. 668, que o art. 304.º/2 parece ressaltar a intenção do legislador de consagrar a posição doutrinal anterior de jure constituendo, de a prescrição operar a transformação da obrigação civil em obrigação natural.
Assim, tratando-se de obrigações, o princípio geral é o de o prazo prescricional começar a correr a partir do momento em que a obrigação se torna exigível em sentido fraco, porquanto, se a obrigação, para se vencer, carece de interpelação, a prescrição conta-se a partir do momento em que o credor podia interpelar, sendo a partir desse momento que é legítimo falar de inércia do devedor – fls. 673-674.
Ora, atentas as datas da prestação dos serviços essenciais da rede fixa de telecomunicações e a introdução da acção de cumprimento em juízo, decorreu, relativamente a esses serviços essenciais o, prazo prescricional, podendo a devedora invocar eficazmente a prescrição.
Na verdade, não ocorreu, nem sequer foi invocado, qualquer facto interruptivo, nomeadamente o reconhecimento da dívida, o qual deve ser efectuado perante o titular do direito por aquele contra quem o mesmo direito pode ser exercido – art. 325.º/1.
Sendo certo que a interrupção decorrente do exercício do crédito tem de fazer-se através de acto de carácter judicial, nos termos do art. 323.º - fls. 678.
Podemos, pois, assentar em que os créditos por prestação de serviços essenciais da rede fixa de telecomunicações que foram considerados prescritos na sentença se encontram, efectivamente, prescritos.

Mas, a filosofia que presidiu ao estabelecimento deste prazo prescricional liberatório para os serviços ditos fundamentais, que correspondem a um dever do Estado perante os cidadãos, não tem aplicação aos serviços meramente comerciais que são os de audiotexto – SVA.
Trata-se de realidades diferentes, paralelas, sem o escopo que norteia o fornecimento dos primeiros e, consequentemente, fora do âmbito do art. 10.º/1 da Lei 23/96.
Mas, se não cabem na previsão do mencionado preceito, por via da diferente natureza da prestação, que se não pode incluir nos serviços básicos essenciais, não deixam de ser serviços de telecomunicações (de valor acrescentado), que têm como suporte o SFT, mas para os quais se exige a celebração de um acordo paralelo entre o fornecedor e o utente.
E nesse medida, não há razão para os excluir, quanto à prescrição, do âmbito de aplicação da norma que, anteriormente à publicação da Lei 23/96, se tinha como assente abranger, nessa esfera, os serviços telefónicos, a alínea g) do art. 310.º do CCivil.
Continua a ser um prazo liberatório, uma prescrição extintiva, mas de cinco anos.
O que nos leva a admitir, com a apelante, que os créditos pela prestação dos serviços de audiotexto se não encontrava prescrito quando a acção foi proposta.
Leva-nos, esta consideração, a alterar a sentença proferida?
A resposta afigura-se-nos dever ser negativa.
É que resultou provado que a utilização de serviços de valor acrescentado ou, como ora se chamam, de audiotexto, nunca foi expressamente solicitada à A. pela Ré – resposta ao quesito 4.º.
Como resulta do art. 3.º/1 do DL 240/97, constituem direitos do assinante, parte no contrato celebrado com o operador para o acesso e utilização do SFT, para além de aceder a este, aceder aos serviços de telecomunicações de valor acrescentado que tenham como suporte o SFT (trata-se de um direito novo, não previsto nos anteriores dispositivos legais).
Todavia, para aceder aos SVA, o assinante dos SFT tem de manifestar expressamente a sua vontade, de modo selectivo – art. 16.º/3-d) do diploma atrás citado.
Neste caso a A. não obteve o acordo da Ré para o fornecimento dos SVA, pelo que lhe não pode impor os resultados de uma utilização que ela não manifestou desejar.
Como se refere no acórdão da RC de 22.5.2002, CJ, XXVII, 3,20, nem sequer basta uma afirmação de vontade de aderir genericamente a serviços de valor acrescentado, sendo preciso que se diga qual ou quais os serviços de valor acrescentado, de entre os oferecidos pelo operador, aos quais se adere.
Subjaz a esta exigência uma preocupação de defesa do consumidor enquanto tal, que a Lei 24/96, de 31.7, no seu art. 2.º define como todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional.
Por isso que o n.º 4 do art. 9.º o exime da obrigação de pagamento de bens ou serviços que não tenha prévia e expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constitua cumprimento de contrato válido.
A lógica desta exigência de clarificação dos termos e das obrigações decorrentes de um contrato desta natureza tem a ver com a protecção do consumidor, neste particular dos serviços prestados através do telefone mas com tarifas diferenciadas dos serviços básicos com os quais coabitam, para que, inadvertidamente, sem ter aderido ao fornecimento dos mesmos expressamente, se veja na contingência de ter de pagar contas astronómicas, porque alguém do seu agregado familiar, por exemplo, se serviu de um produto que não fora solicitado.
O oferecimento do serviço sem a vontade expressa e selectivamente manifestada do cliente viola os princípios da boa fé a que o fornecedor está obrigado, de acordo com o art. 3.º da Lei 23/96.
É que, como adianta o ac. da RC citado, pág. 21, estes serviços são inteiramente dissociáveis do próprio SFT, como resulta do preâmbulo do DL 177/99, de 21.5, ao dizer que «a especial natureza de que se revestem estes serviços é determinante da fixação de um regime autónomo e diferenciado do fixado para os serviços de telecomunicações de uso público que lhes servem de suporte». E também do art. 1.º/2 do DL 175/99 de 21.5, que regula a publicidade nos serviços de audiotexto, definindo-os como «os que se suportam no serviço fixo de telefone ou em serviços telefónicos móveis e que são destes diferenciáveis em razão do seu conteúdo e natureza específicos».
Aceitar-se que a Ré devia pagar por serviços que não contratou iria contra todas as regras atrás enunciadas, designadamente as de defesa do consumidor.
Inexistindo contrato, por não ter havido acordo de vontades, sequer mesmo com prejuízo das regras exigentíssimas mencionadas, cuja postergação acarretaria a sua nulidade, não há que falar desta, pelo que não é devido qualquer pagamento da Ré à A. pelos serviços de audiotexto constantes das facturas que fundamentam a causa de pedir e o pedido nesta acção.

Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente e confirma-se a sentença, embora por motivos não totalmente coincidentes.

Custas pela apelante.

Porto, 15 de Maio de 2003
Trajano A. Seabra Teles de Menezes e Melo
Mário Manuel Baptista Fernandes
Manuel Dias Ramos Pereira Ramalho