Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3791/18.9T8VNG.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA
Descritores: REJEIÇÃO DE MEIO DE PROVA
RECURSO AUTÓNOMO
QUESTÃO DE CONHECIMENTO OFICIOSO
CASO JULGADO
ACESSÃO NA POSSE
Nº do Documento: RP202404083791/18.9T8VNG.P2
Data do Acordão: 04/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A impugnação da decisão que aceitou ou rejeitou um meio de prova tem de ser feita imediatamente, ou seja, em recurso autónomo, e não, sob pena de preclusão, com o recurso da decisão final.
II - Não há nulidade da sentença que não apreciou uma questão de conhecimento oficioso, quando a mesma não foi alegada e também não resulta da factualidade apurada.
III - Não há ofensa do caso julgado (exceção ou autoridade) quando não há identidade de sujeitos: se a ré podia embargar de terceiro na execução torna-se claro que o decidido nessa execução, relativamente a si, não tem efeito de caso julgado.
IV - O direito a aceder na posse anterior, quando as mesmas – anterior e atual – são homogéneas e contínuas permite ao novo possuidor, para efeito da usucapião, aproveitar o tempo de posse do antepossuidor.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 3791/18.9T8VNG.P2

Recorrente - AA
Recorrida – BB

Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Miguel Baldaia de Morais e Ana Paula Amorim.

Acordam na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório
AA instaurou a presente ação contra BB e pediu a condenação da ré na “entrega à Autora da posse da fração indicada. Igualmente deverá condenar-se a Ré a abster-se de praticar atos que impeçam ou dificultem o uso e fruição por parte da Requerente. Mais deverá ser a Ré condenada no pagamento à Autora da quantia diária de 12,50€, a título de indemnização, contados desde a data em que tomou conhecimento da carta remetida pela A. até à entrega da fração em causa”.

Fundamentando o pretendido, veio alegar, em síntese, que, por escritura pública de 3.06.17, adquiriu a fração “IC”, destinada a arrecadação, vendida por CC e marido, sua nora e filho, os quais a tinham adquirido em hasta pública levada a cabo pelas Finanças de Gaia. Quando a autora pretendeu tomar posse da arrecadação, foi informada que uma senhora BB se afirmava proprietária da mesma e, uma vez contactada, confirmou-o, por a ter comprado a DD. Perante tal posição, a autora remeteu carta à ré, a 16.06.17, instando-a a proceder à entrega da arrecadação, mas a ré reafirmou ser a proprietária. Ora – prossegue a autora – os arrumos foram legitimamente por si adquiridos aos vendedores, que também legitimamente a adquiriram, e a fração está registada. Entretanto, requereu uma providência cautelar, tentando a entrega provisória da posse da arrecadação, mas a pretensão foi indeferida. Só que qualquer boa-fé da ré cessou quando confrontada com a aquisição por parte da nora da autora, incorrendo, por isso, no dever de indemnizar a demandante.

A ré contestou. Começa por dizer que a autora não alega alguma vez ter sido possuidora do anexo. Acrescenta que a fração “FL” foi por si comprada e, nessa ocasião, o vendedor “transmitiu-lhe” um arrumo, que só agora verificou não ser parte integrante da fração, mas a fração autónoma “CI”. Desde 2008 está na posse do arrumo, atuando na forma correspondente ao exercício do direito de propriedade, e acedeu na posse do vendedor, exercida desde 1991. Defende que a presunção do registo, de que beneficia a autora, é ilidível. Em reconvenção, pretende (após correção): “- Ser a A. condenada a reconhecer a R. como legítima proprietária da fração “IC” por a ter adquirido por usucapião; - Ser reconhecida a R. como única e legitima proprietária, com exclusão de outrem, da fração “IC” por ter adquirido o imóvel por usucapião; - Ser ordenado o cancelamento do registo de aquisição da A. na respetiva Conservatória do Registo Predial”.  

A autora respondeu ao pedido reconvencional. Defende a sua ineptidão e acrescenta que a compra feita pela ré não incluía a arrecadação, nem o vendedor poderia transmitir o que não tinha, e que a reconvinte não pode arrogar-se ter posse pública e pacífica, pois nem as Finanças tinham conhecimento dessa propriedade. A posse, a existir, era de má-fé e foi interrompida com a penhora levada a cabo pelas Finanças.

Depois de várias vicissitudes processuais (essencialmente relativas ao patrocínio da ré e à tempestividade da sua contestação), sem relevo à apreciação do objeto do recurso e após junção do procedimento cautelar instaurado pela autora, os autos prosseguiram, determinando-se o cumprimento do artigo 3.º do Código de Registo Predial.

Entretanto (fls. 59) a autora pediu o chamamento da construtora do imóvel (A..., Lda.), com vista a esclarecer a titularidade dos arrumos, o que foi indeferido. Na mesma ocasião foi dispensada a audiência prévia, e admitida a reconvenção. Por requerimento de 9.11.19, a autora recorreu do indeferimento daquele chamamento e do indeferimento da junção das atas de condomínio, recurso que subiu em separado e veio a ser julgado improcedente[1].

Foi produzida prova e, a 7.12.21, a autora requereu a prestação de declarações de parte e, a 9.12.21, o depoimento de parte da ré, ambos indeferidos por despacho de 11.01.22.  Foi interposto recurso dessa decisão, apenas admitido a 17.06.22, depois de proferida a sentença final e em simultâneo com o recurso desta interposto. Na procedência do recurso[2], o Tribunal da Relação do Porto decidiu “A - Revogar o despacho de 11.01.2022, que deve substituído por outro que, previamente, convide a Autora a indicar discriminadamente a matéria de facto alegada sobre a qual versarão as suas declarações de parte (no prazo de 10 dias) e, em seguida, efetuada aquela indicação, reabra a audiência de julgamento para a produção das ditas declarações de parte e subsequentes alegações orais, seguida da prolação de nova sentença; B - Julgar, ainda, prejudicado o conhecimento do recurso de apelação interposto pela Autora/Recorrente da sentença proferida (que fica sem efeito), nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC”.

Foram prestadas as declarações de parte em nova audiência de julgamento, e proferida (nova) sentença, que decidiu julgar “a ação da autora improcedente nos termos supra expostos e, por isso, do pedido formulado é absolvida a ré; - julga-se a reconvenção deduzida pela ré procedente e, em consequência, reconhece-se a ré como legítima proprietária da fração “IC”, destinada a arrecadação com n.º ..., no sótão da Torre “...” com entrada pelo novo arruamento sem denominação n.º ... e praceta ..., inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ..., da União de Freguesias ... e ...; - consequentemente, determina-se o cancelamento do registo de aquisição da autora na Conservatória do Registo Predial competente”.

II – Do Recurso
Inconformada, a autora recorre, pretendendo: “Na ação proposta: a) Ser concedido provimento ao peticionado pela autora, por força da autoridade do caso julgado; b) Ser a ré condenada a pagar à autora todos os montantes peticionados, pelo uso da arrecadação, ou a título de indemnização, nos termos pedidos na ação proposta na 1.ª instância; c) Ser a ré condenada a entregar à autora a arrecadação, em bom estado, e abster-se de quaisquer atos que possam interferir com o pleno gozo por esta do seu direito de propriedade; d) Ser a ré/recorrida condenada ao pagamento de custas e o mais legal. Na Reconvenção: a) considerado que a decisão da Autoridade Tributaria constitui caso julgado, exceção dilatória e não deveria o tribunal ter conhecimento do pedido reconvencional. Ou, numa via paralela, Em concordância com o que foi dado por provado e elencado em “B” a “F” de FACTOS PROVADOS, seja: b) considerado que quaisquer direitos reais que a reconvinte BB pudesse deter sobre a fração em causa CADUCARAM com a venda em hasta pública; c) considerado que qualquer posse que a reconvinte detenha deve contar-se (como posse precária) a partir da interpelação efetuada para entregar as chaves à autora; d) deve a reconvenção ser julgada totalmente improcedente, por não provada a alegada posse da reconvinte; e) deve a recorrente ser totalmente absolvida na reconvenção, e mandados cancelar todos os registos pendentes sobre o imóvel em causa (arrecadação – fração IC); f) deve ser a ré-reconvinte condenada em custas e no mais legal”. Para tanto, apresentou as seguintes Conclusões:
I - Viola a sentença, o disposto em 576 i), 577 e 578 todos CPC, e 824, n.º2 CC e art. 2 do Cod. Reg.Pred. porquanto:
II - Entendeu que a reconvinte adquiriu a fração por meio do instituto da usucapião.
III - Afirma a sentença, que “No caso dos autos, provado que ficou que a autora apenas tem a seu benefício a presunção da titularidade do registo. E que a ré tem relativamente a fração em causa a posse desde que adquiriu a sua habitação, operou necessariamente em data anterior ao do registo.”
IV - O que significa que a autora “apenas” adquiriu legitimamente a fração, a qual “apenas” tinha sido vendida em hasta pública,
V - Conclui que “Resulta, a final que a autora não logrou a prova de que a fração em causa lhe pertence, tendo a ré feito a prova de que é possuidora da dita desde data anterior à do registo”.
VI - Discorrendo, estabelece que “A base de toda a nossa ordem jurídica está na usucapião e não no registo, pois que o registo tem um carácter meramente declarativo. E não sendo o registo anterior à posse apurada prevalece a presunção fundada na posse, uma vez que, se a posse e o registo tiverem igual antiguidade, deve prevalecer a presunção fundada na posse, como ressuma do suprarreferido preceito”.
VII - Decidindo que “julga-se a ação da autora improcedente nos termos supra expostos e, por isso, do pedido formulado é absolvida a ré; - julga-se a reconvenção deduzida pela ré procedente e, em consequência, reconhece-se a ré como legítima proprietária da fração “IC”, destinada a arrecadação com n.º ..., no sótão da Torre “...” com entrada pelo novo arruamento sem denominação n.º ... e praceta ..., inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ..., da União de Freguesias ... e ...; - consequentemente, determina-se o cancelamento do registo de aquisição da pela ré/reconvinte.
VIII - Resulta de factos provados que: “B) A fração referida em 1) dos Temas da Prova havia sido adquirida por CC em hasta pública, levada a cabo pelos Serviços de Finanças de V. N. de Gaia, em 23/XI/2016. C) A ré adquiriu a sua fração autónoma destinada a habitação, designada por fração “FL”, sita no rés-do-chão posterior da Torre “...” com entrada pela rua ..., ,,,, por escritura lavrada em 8/4/2008 a folhas 135 do Livro ...... do Cartório Notarial Dra. EE. D) A autora efetuou sobre a dita fração o pagamento do IMI. E) Sobre a fração em causa nos autos (tema 1)) recaiu penhora, efetuada pelas Finanças no âmbito de Pr. Executivo ... que correu termos na Repartição de Finanças de V.N. de Gaia. F) A autora, por meio de escritura pública celebrada em 3/VI/2017, adquiriu a Fração autónoma “IC”, destinada a arrecadação com n.º ..., no sótão da Torre “...” com entrada pelo novo arruamento sem denominação nº ... e Praceta ..., inscrita na matriz predial urbana art. ... Un. Freg. ... e ..., que lhe foi vendida por CC, titular do NIF ... e seu marido, FF titular do NIF ....
IX - Ou seja, a) uma aquisição legítima, documentada e registada, efetuada pela CC; b) com base numa venda em hasta pública; c) seguida por outra aquisição legítima, documentada e registada, efetuada pela autora.
X - A nossa ordem jurídica, NÃO ASSENTA na usucapião, modo de aquisição, enumerado em terceiro lugar, após o contrato e a sucessão por morte.
XI - Com todo o respeito, que muito é, entendemos que assenta na PROPRIEDADE, nos termos de art. CC 1305.
XII - Sendo que a usucapião é uma das formas de aquisição da propriedade, nos termos de art. 1316CC. A terceira, elencada nesse art.
XIII - Pois o normal era os filhos sucederem aos pais, na propriedade e posse da terra, mesmo que não procedessem ao respetivo registo.
XIV- E os contratos de compra e venda, bem como imensas permutas de terrenos, eram efetuados por documentos particulares, escritos à mão. Por vezes, por simples aperto de mão!
XV - Mas o que se transmitia, quer por via sucessória, quer por via negocial, particular (particularíssima, diríamos), era o direito de propriedade.
XVI - Pelo que, quando muito, poderíamos dizer que assenta na posse, nos termos do art. 1251CC.
XVII- Na medida em que o possuidor, “atua por forma correspondente” à posição de proprietário: ou seja, aparenta ser proprietário,
XVIII - Bastando a simples posse para o possuidor, numa primeira fase não poder ser perturbado no direito que exerce.
XIX - Podendo, inclusive, DEFENDER essa posse, nos termos de art. 1276 e segs. do Código Civil.
XX - Cabendo ao legítimo proprietário recorrer às vias judiciais, a fim de fazer valer os direitos que invocar contra um possuidor ilegítimo.
XXI - Defesa que, como decorre dos autos, a reconvinte, perante a penhora das Finanças NÃO FEZ.
XXII - Afirma sentença em FACTOS PROVADOS, “L) A ré adquiriu a fração id. em 1) a DD e mulher que a havia comprado em 1991 à construtora do prédio, arrumo sito no sótão da Torre “...” que também já vinha utilizando desde que havia adquirido a fração “FL”.
XXIII - Aqui, (por lapso?) contradiz a sentença a anterior conclusão da aquisição da arrecadação por força do instituto de usucapião. Isto porque,
XXIV – Se, aquando do negócio, a tivesse adquirido (o que não se concede) não haveria necessidade de recorrer ao instituto da usucapião: estava legitimamente adquirida.
XXV - Da mesma maneira que esta conclusão, (resposta a “L”) contradiz, frontalmente, o constante de escritura de Compra e Venda, junta pela ré, em sede de contestação.
XXVI - Aí, consta especificamente, que a ré adquiriu a sua “fração autónoma destinada a habitação, designada por fração “FL”, sita no rés-do-chão posterior da Torre “...” com entrada pela rua ..., ,,,, por escritura lavrada em 8/4/2008 a folhas 135 do Livro ...... do Cartório Notarial Dra. EE (Doc.1).
XXVII - Em sentido contrário, pois, ao que diz a própria reconvinte – arts. 5 a 8.º de contestação.
XXVIII - Sendo essa e apenas essa fração que é especificada na compra e venda.
XXIX - Contradizendo, também, diretamente, o constante de “C) “das mesmas Respostas, texto igual ao art. 34, que aqui damos por reproduzido.
XXX - Contrariando, ainda indiretamente, ou diretamente, os factos provados em B) E) e F).
XXXI- A ré afirma na mesma data, ter “comprado” a fração IC ao ante proprietário do apartamento (fração FL), tendo optado por dispensar a escritura para a aquisição desse imóvel (arrecadação).
XXXII - O ante proprietário vendedor da fração FL, por sua vez, diz que teria “comprado” à construtora, na mesma ocasião, a fração FL, por escritura pública, seguida de registo.
XXXIII - E também a fração IC, relativamente à qual, dispensou a escritura pública (e subsequente registo) - cf. Declarações de Testemunha DD, faixa 10.
XXXIV - Situação que nunca a testemunha DD regularizou, nem quando, por sua vez, “vendeu” a fração FL (e alegadamente, a fração IC também) à ré.
XXXV - Depois de terem “pago” pela fração IC, esses dois compradores, descartaram a obrigatoriedade de formalizar a compra e venda através de escritura pública, a fim de validarem a transação/transmissão para se investirem no direito de propriedade, tendo preferido o estatuto de meros possuidores sem título para um dia, quiçá, usucapirem.
XXXVI - Sendo certo e sabido que, na mesma escritura (mesmo contrato de compra(s) e venda(s) entre os mesmos outorgantes), se podem incluir vários e distintos artigos matriciais, pelo pagamento de um único ato notarial, no caso, escritura.
XXXVII - Pelo documento junto aos autos, a “A..., Lda.”, com firma reconhecida dos gerentes como tais, declara nunca ter vendido a ninguém a dita fração, muito menos oferecido/emprestado.
XXXVIII - Assim sendo, qualquer posse foi clandestina/oculta/precária/em nome de outrem, portanto inelegível para usucapir - antes da díada "corpus" e "animus" terá de haver "inversão do título da posse", e essa só poderá ocorrer com a comunicação ao proprietário de que a partir de determinado momento, o possuidor pretende possuir em nome próprio, com intenção de usucapir, sem o que, a posse sempre será precária -- "ad aeternum" art. 1265 CC.
XXXIX - No sentido da necessidade da inversão do constituto possessório, entendeu o Ac.RE, de 17-11-2016 3689/15.2T8STB-B. E1, Relator BERNARDO DOMINGUES: “III- Os que exercem a posse em nome alheio só podem adquirir o direito de propriedade se ocorrer inversão do título de posse (“interversio possessionis”) – art. 1263 d) do Código Civil – ou seja, se, a partir de certo momento, passarem a exercer o domínio, contra quem atuava como dono, com a intenção, agora, de que o oponente atua, inequivocamente, como titular daquele direito. IV - Para que a inversão por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía aconteça, importa que o detentor torne, diretamente, conhecida da pessoa em cujo nome possuía, quer judicial, quer extrajudicialmente, a sua intenção de atuar como titular do direito, sendo uma oposição categórica, traduzida em atos positivos, materiais ou jurídicos, mas inequívocos, reveladores de que o detentor quer, a partir da oposição, atuar como se tivesse sobre a coisa o direito real que, até então, considerava pertencente a outrem, e praticados na presença ou com o consentimento daquele a quem os atos se opõem.
XL - Bem como o Ac. RC 106/06.2TBFCRC1 de 17/XI/2009, Redator CECÍLIA AGANTE, entendeu que “V – A vontade concreta do detentor só releva caso tenha invertido o título de posse. VI – A inversão do título de posse (a interversio possessionis) supõe a substituição de uma posse precária, em nome de outrem, por uma posse em nome próprio (não basta que a detenção se prolongue para além do termo do título que lhe servia de base; necessário se torna que o detentor expresse diretamente junto da pessoa em nome de quem possuía a sua intenção de atuar como titular do direito). VII – Na ausência de exteriorização de uma vontade categórica de possuir em nome próprio, revelada por atos positivos de oposição ao proprietário, sobrepondo-se à aparência representada pelo arrendamento, é vedado adquirir por usucapião.”
XLI - E, igualmente, o AC RE, 7103/11.4TBSTB.E1, de 30/VI72016, Relator: ASSUNÇÃO RAIMUNDO, “- O contrato promessa não é suscetível de, só por si, transmitir a posse ao promitente-comprador. Se este obtém a entrega da coisa antes da celebração do negócio translativo, adquire, em princípio, o corpus possessório, mas não assume o animus possidendi, ficando na situação de mero detentor ou possuidor precário – art. 1253.º do Código Civil. II - O promitente-comprador investido com a tradição, nomeadamente de um imóvel objeto do contrato-promessa, goza de poderes que integram um verdadeiro direito de uso, passando a aproveitar todas as utilidades que o tal imóvel lhe pode proporcionar, mas não lhe confere o estatuto de possuidor. (Sumário da Relatora)”.
XLII - Também, por ser empresa, não pode “vender” apenas verbalmente, pois sempre teria de justificar nos Livros, e perante as Finanças, a existência daquele preço recebido.
XLIII - Igualmente é dito nesse documento que a referida firma “A..., Lda.” nunca teve conhecimento de alguém estar a usar a fração IC, bem como as outras (A firma não tinha a sua sede em nenhuma das Torres de que a fração IC faz parte, e em cada uma das Torres eram muitas as arrecadações).
XLIV - Ora, como sabemos, na Usucapião, uma das condições da publicidade (“conhecimento à vista de todos”), é precisamente dar a conhecer ao proprietário, por carta registada com A/R a intenção de inversão do título da posse, para que ele (proprietário), em determinado prazo, possa opor-se, ou simplesmente nada fazer.
XLV - Esta formalidade é obrigatória, pois estamos perante um imóvel em que já existe um trato sucessivo,
XLVI - Sendo assim, nenhuma Conservatória aceitaria a alegação de um direito sem a devida prova de como o mesmo chegou à esfera jurídica daquele que o pretende registar.
XLVII - Um prédio que já tenha um proprietário anterior, não pode apresentar hiato de documentação de uma ulterior transmissão a partir do proprietário anterior, como se se tratasse de uma res nullius, onde a aquisição seria originária e não derivada – apenas bastando animus e corpus;
XLVIII - Apresentando o trato sucessivo aquisições anteriores, qualquer aquisição ulterior terá de ser derivada, pelo que a passagem do anterior proprietário ao pretendente a usucapir, teria de ser justificada pela inversão do título da posse).
XIXL - Só a partir da data da reversão da posse, é que esta deixa de ser clandestina ou eventual, e passa a contar como posse em nome próprio, com “corpus” e “animus”, com vocação a usucapir no prazo correspondente.
L - Resultando, desta forma, que a testemunha que vendeu o apartamento (Fração FL) à ré não logra provar que tenha adquirido a fração IC (arrecadação), nem que tenha promovido a inversão do título da posse.
LI - Todavia, o mesmo construtor, através de documento bastante, e a solicitação da autora, declara nunca ter vendido, arrendado, oferecido, ou mesmo tomado conhecimento de que a arrecadação estaria a ser usada abusivamente.
LII - Nos termos de art. 2 do Cod. Reg.Pred., são sujeitos a registo: a) Os factos jurídicos que determinem a constituição, o reconhecimento, a aquisição ou a modificação dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou servidão; (...) e) e a mera posse.
LIII - Caso o referido DD tivesse, efetivamente, comprado a fração IC, estaria obrigado ao registo da aquisição, nos termos de citado art. 2. Como estaria obrigada a reconvinte, caso tivesse “adquirido” tal fração.
LIV - Neste caso, a aquisição legítima feita pela CC, em hasta pública, seguida da legítima aquisição efetuada pela autora, estão protegidas pela publicidade dada pelo registo dos negócios jurídicos, legítima e publicamente efetuados.
LV - A penhora feita pela AT incidiu sobre o imóvel, por dívidas fiscais (IMI), que nunca tinham sido pagas, nem pela construtora (proprietária), nem pelo DD (possuidor), nem pela recorrida, também possuidora.
LVI - Estes dois últimos, que, nos autos proclamaram que detinham o imóvel como propriedade sua, NUNCA o demonstraram, pagando as inerentes obrigações fiscais – que é o mais importante dever do proprietário.
LVII - Esta posição de aquisição do direito de propriedade, por força da usucapião, através duma “posse” não titulada, se acaso ainda for tolerável num hipotético lameiro no interior profundo, é inadmissível numa zona de conturbado urbanismo, como é V.N.GAIA
LVIII - Aplicando-se, aqui, forçosamente, o princípio de “non est in acta, non est in mundo”.
LIX - A penhora, mais do que coartar, interrompe qualquer direito real, tanto o direito de propriedade, quanto a posse,
LX - O que levou a que, por efeito dessa mesma penhora, já nem a construtora, nem o DD, nem a recorrida mantivessem quaisquer direitos sobre a fração IC (arrecadação),
LXI - Tendo esses direitos passado para as Finanças.
LXII - Não podendo deixar de referir que, na pendência da Execução, nomeadamente após a penhora, quem se julgasse com algum direito sobre essa fração, poderia defendê-lo,
LXIII - Nomeadamente, opondo-se à penhora, ou negociando com a AT; encontrando alguma forma de liquidar a dívida.
LXIV - Decorre do depoimento da testemunha DD, (faixa 10, m 10,00) provavelmente haveria, nessa altura um documento das Finanças na vitrine localizada no átrio do prédio.
LXV - O que constitui procedimento habitual da ATA, como acontecera em outras ocasiões.
LXV[3] - Nessa altura, a recorrida poderia e deveria interpor embargos de terceiro, já que se considerava dona desde o tempo do ante proprietário DD.
LXVI - Sendo de estranhar que o não tivesse feito, sendo que até à venda decorreu um prazo considerável.
LXVII - Como não o fez, esgotados todos os prazos, a arrecadação foi vendida em leilão eletrónico e legitimamente adquirida.
LXVIII - Foi negado à autora o recurso à intervenção provocada da construtora e do Serviço de Finanças responsável pela venda em hasta pública,
LXIX - Sendo que, a ter-se produzido tal prova, teria aquela dito que apenas vendeu a fração FL, nunca a fração IC, embora a mesma sempre estivesse legalizada.
LXX - Também foi recusado o pedido de consulta pelo tribunal, do Livro de Atas do Condomínio, no qual se poderia verificar que nunca constou que a fração IC era pagante, através do Sr. A. DD / BB, ou que um e depois a outra dela fossem proprietários.
LXXI - Não se permitiu a indicação de um responsável do referido SF de Gaia, como testemunha, nem do sócio-gerente da construtora.
LXXII - Finalmente, foi desvalorizado o documento passado pela construtora (fls. 91), cujo teor nem sequer foi reproduzido, a nosso ver, documento relevante, o qual se junta, para agilizar a apreciação do recurso.
LXIIIB[4] - Sendo que é impossível a qualquer tribunal “a anteriori”, antecipar o que poderá ser dito por testemunhas, ou verificado em documentos.
LXIVB - Na prática, a sentença rejeitou todas as provas apresentadas pela autora, além de recusar outras que a mesma solicitou,
LXVB - Tendo como consequência, não uma expropriação, que sempre implicaria indemnização,
LXVIB - Mas algo que se assemelha a um confisco, a favor da ré BB,
LXVIIB - Sem acautelar a necessidade do reembolso das quantias pagas às Finanças, pela aquisição do imóvel e IMI’s relativos ao mesmo.
LXVIIIB - Em franca violação das normas (13.º e 202 da Constituição da República,
LXXIX - Decorre de lei, que qualquer direito real que existisse sobre a coisa vendida caduca com a venda em execução, nos termos de art. 824 CC.
LXXX - Como decorre da letra da lei, Artigo 824, n.ºs 1 e 2, a “posse” que a ré pudesse deter, de boa ou MÁ-FÉ sobre os arrumos, CADUCOU, com a venda em leilão.
LXXXI - Essa caducidade é afirmada em despacho de Autoridade Tributária, Serviço de Finanças de V.N. de Gaia-1, em processo Executivo ..., datada de 9 de janeiro de 2017, junto ao procedimento cautelar e que aqui se junta de novo, a fim de agilizar a apreciação das presentes Alegações de Recurso.
LXXXII - Em segundo parágrafo determina “Ordeno ainda e com a competência que me é concedida pelo disposto no art. 260 do Código de Procedimento e do Processo Tributário, o cancelamento do registo da mesma penhora, AP. ... de 2015/09/25, bem como dos restantes direitos reais que caducam nos termos de n.º 2 de art. 824 do Código Civil do prédio acima referido e descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob a descrição o n.º ...-IC- ...”.
LXXXIII - Podendo, quando muito, dizer-se que começaria, eventualmente, um novo constituto possessório, com a interpelação da ré por parte da autora.
LXXXIV - No sentido da caducidade entendeu o Ac. STJ, em Sumário: “III - O art. 824, n.º 2 do Código Civil é perentório no sentido de que os bens são transmitidos livres dos direitos reais que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou garantia, com exceção dos que, constituídos em data anterior, produzam efeitos em relação a terceiros, independentemente do registo. “Ac. STJ de 27/V/2010, Pr. 5425/03.7TBSXL.S1, 2.ª Sec. Relator ÁLVARO RODRIGUES.
LXXXV - No presente caso, temos de realçar que a expectativa de usucapir não chegou a iniciar-se, por ausência da inversão do título da posse.
LXXXVI - Seguindo esse entendimento, ainda que a ré tivesse adquirido a propriedade por força de usucapião, teria com a venda em hasta pública, perdido esse direito real.
LXXXVII - Merecendo quanto a nós, destaque, o Ac. STJ, pelo qual “O dono da coisa perde a posse da mesma com a penhora, ainda que seja nomeado depositário. II - Com a venda judicial perda a propriedade. III - Com a venda, a propriedade e a posse transferem-se para o adquirente.” Ac. de 08/V/2001, 01A1116 N.º VI - Convencional: JSTJ00041671, relator SILVA PAIXÃO.
LXXXVIII - Termos que definem lapidarmente a situação: a “possuidora”, BB, com a venda em hasta pública perdeu qualquer posse que detivesse, por efeito de perda da propriedade.
LXXXIX - Conclui sentença que “Resulta, a final que a autora não logrou a prova de que a fração em causa lhe pertence...” Quanto a nós erradamente!
XC - A lei atual impõe a forma de escritura pública para que as transmissões de imóveis sejam válidas, seguida do competente averbamento/descrição no Registo Predial, sem outras quaisquer exigências,
XCI - Na sequência dessa exigência, a autora provou à saciedade que a fração em causa é de sua propriedade,
XCII- Para mais, provado documentalmente o trato sucessivo, avultando a declaração da própria construtora, primeira proprietária da fração em causa,
XCIII - Da qual consta que, antes da penhora efetuada pela AT, nunca vendera, arrendara, nem tinha cedido, emprestado ou permitido qualquer utilização ou uso da referida arrecadação.
XCIV - Nesse sentido, foi junta aos autos declaração da “A..., Lda.”, subscrita pelos sócios-gerentes, por mera cautela (tendo em atenção aspetos como idade avançada, ou incertezas sobre o amanhã das empresas nos tempos que correm)
XCV - Os bens imobiliários são identificados pelas respetivas cadernetas prediais (urbanas ou rústicas), e pelo seu registo predial, donde constam todas as vicissitudes (do prédio).
XCVI - Sendo que tais documentos, (que nunca foram impugnados) fazem fé pública, em qualquer ponto do país.
XCVII - A nossa “sociedade de informação” impõe que assim seja, para segurança do direitos, do comércio, da economia; daí o empenho e o esforço do Estado na implementação e aperfeiçoamento dos meios registais, pois a vida hodierna não se compadece com a hipótese de as pessoas para provarem o seu direito de propriedade terem de se valer da palavra de vizinhos, parentes, conhecidos, que nas cidades já não sabem assim tanto da vida uns dos outros, e muitas vezes, só sabem que querem “fazer um jeito” (citando Murteira Guerreiro, in – Artigo PDF Mouteira Guerreiro ,REVISTA ELECTRÓNICA DE DIREITO – OUTUBRO 2013– N.º 2 – WWW.CIJE.UP.PT/REVISTARED)
XCVIII - Tendo, além do mais, a autora, cumprido fielmente com as obrigações fiscais, na sua condição de proprietária, conf. resulta de própria sentença, em causa.
XCIX - Pagamentos de IMI, que pelo contrário, NUNCA foram efetuados pela reconvinte.
C - Mais afirma a sentença que “Havendo colisão entre a presunção fundada no registo de um direito (art. 7.º do CRP) e a presunção decorrente da posse (art. 1268 CC) com início à data do registo ou anterior a ele, prevalece esta última. Mesmo que a posse e o registo tenham a mesma antiguidade (v.g., prova-se que à data do registo havia posse, mas não se prova a posse anterior), ainda assim – em obediência à prevalência, na nossa ordem jurídica da situação real, uma vez provada, sobre a situação inscrita – prevalece a presunção possessória.”. Ora,
CI - Como decorre da força da lei, e na sequência da Jurisprudência supracitada, a posse que fosse exercida pela reconvinte, CADUCOU, com a venda em hasta pública.
CII - Pelo que, a existir posse por parte desta, teria de ser contada a partir da interpelação efetuada para que a mesma BB entregasse as chaves dos arrumos – e só no caso de concordância ou silêncio da proprietária, a aqui recorrente.
CIII - Em consequência, o raciocínio da sentença NÃO SE APLICA ao caso (demonstradas que foram as contradições entre as versões da própria ré, que, na Providência Cautelar afirma ter comprado a arrecadação, na reconvenção já afirma que o DD lhe disse para “ir usando” a dita arrecadação);
CIV - Ou seja, a posse da ré BB começou quando foi interpelada pela autora, sendo uma posse precária (sem qualquer possibilidade de haver animus possidendi, dada a oposição da proprietária), não-titulada e de MÁ-FÉ.
CV - No caso em apreço, existe uma presunção fundada no registo, que é anterior à posse, ou ao início da invocada posse, se preferirmos.
CVI - Mais concretamente, data o título constitutivo de 17 de março de 1987 - cf. Certidão Permanente, enquanto que a posse invocada teve início (a dar crédito à ré) em 2008.
CVII - O titular é o constante do título constitutivo da propriedade horizontal: a sociedade executada, “A..., Lda.”.
CVIII - Uma aquisição de posse por efeito de usucapião, num caso de propriedade horizontal, é contra legis.
CIX - Usucapião que lhes estaria vedada, por força da Lei constitutiva da Propriedade horizontal (ver Parecer do Exmo. Sr. Dr. GG junto aos autos, que aqui se dá por inteiramente reproduzido).
CX - A decisão das Finanças quanto à atribuição da propriedade à ante proprietária, CC, constitui caso julgado, nos termos de art. 577 i) CPC.
CXI - Assim é denominada a decisão, no citado despacho de AT, datado de 9 de janeiro de 2017, “Considerando que, por venda por meio de leilão eletrónico, nos presentes autos, foi adjudicado em 23 de novembro de 2016, já com trânsito em julgado, a fração autónoma designada pelas letra “IC” do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o art. ... da União de Freguesias ... e ..., concelho de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto, a CC, NIF ..., com morada fiscal com morada fiscal na Rua ..., ..., 5 Drt. Trás, ...”.
CXII - Reafirmando a condição de caso julgado, a AT conclui o despacho, mencionando que “Para efeito do cancelamento dos registos de citada penhora, passe-se certidão do presente despacho, o qual transita em julgado de imediato, ou seja, a partir desta data”.
CXIII - Essa mesma condição de caso julgado, encontra-se consignado no Ac. do STA, de 11/11/2004, tirado no proc. 046414, «a necessidade ou conveniência de se obstar à contradição de julgados é um dos fundamentos do instituto do caso julgado, seja na perspetiva da exceção do caso julgado, nos termos do p. no art. 498.º ( ) do CPC, visando evitar, na duplicação de decisões sobre idêntico objeto processual se contrarie, na decisão posterior, o sentido da decisão anterior, seja no aspeto também relevante do instituto de autoridade do caso julgado em que, fundamentalmente se visa obstar à contradição de decisão anterior transitada em julgado (Cf. ac. STJ de 26-1-94 in BMJ 4333, pg. 515 e, na doutrina, MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, in BMJ 325, pg. 17
CXIV - Será, talvez, interessante citar o entendimento, eventualmente controverso, segundo o qual “Esta necessidade de evitar as contradições de julgados, leva que em questões em que não exista a integral identidade na lei processual quanto a sujeitos, pedido e causa de pedir, possam, na decisão subsequente, ser aplicados os princípios da chamada autoridade do caso julgado - “in dissertação de Mestrado de Germana Sanhudo, Universidade do Minho.
CXV - Também o entendeu o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, II. “A autoridade do caso julgado obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão, impondo-se à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objeto de ambas as decisões” In - 06/03/2020. TCAS Processo: 1264/15.0BELRA Secção: CT Data do Acórdão: 28- 11- 2019. Relator: TÂNIA MEIRELES DA CUNHA EXCEÇÃO DILATÓRIA CXVI - Constituído o caso julgado uma exceção dilatória, nos termos de art. art. 577 i) CPC,
CXVII - E como tal, de conhecimento oficioso, nos termos de art. 578 CPC.
CXVIII - Tendo a sentença ora recorrida, o dever de se pronunciar sobre tal exceção,
CXIX - Sob pena de NULIDADE, nos termos de art. 615, n.º 1, al. d) CPC
CXX - O que deveria ter levado o tribunal a abster-se de conhecer do pedido reconvencional. Em consequência do que deverá ser
CXXI - A sentença considerada NULA, nos termos do art. 615, n.º 1. al. d), com todos os efeitos que daí decorrem.

A recorrida respondeu ao recurso. Entende que “deverá: A) Declarar-se nulo o ato processual de apresentação de Alegações de Recurso, desacompanhado do respetivo requerimento de interposição de recurso, com os fundamentos e consequências expostos supra na Conclusão 1 desta Resposta, e sem prejuízo da verificação do cumprimento do ónus de concluir por parte da recorrente, em conformidade com o assinalado na Conclusão 2, também desta Resposta. Sem conceder, B) Ser totalmente negado provimento ao recurso, tendo também presente a situação de rejeição exposta supra na Conclusão 6 desta Resposta”. Conclui, para tanto:
A – Da Questão Prévia:
1 – Na sua peça processual que denominou de Alegações de Recurso, omitiu a recorrente o ónus de requerer a interposição de recurso, o que determina os efeitos de nulidade da referida peça processual e da sua não renovação (artigos 195, n.º 1, 637, n.º 1 e 641, n.º 1, todos do CPC, e artigo 202, do mesmo diploma), obstando-se ao conhecimento das questões na mesma peça formuladas - cfr., por interpretação extensiva, o disposto no artigo 652, n.º 1, alínea b), do CPC. Sem conceder -
B –
Do Mérito das alegações de Recurso:
2 – Cumprido que haja sido, pela recorrente, o ónus de concluir, o que se duvida (2), são as conclusões que delimitam o objeto do recurso e do que é possível conhecer pelo Tribunal “ad quem” (1) - cfr. artigo 608, n.º 2, do CPC, sendo que nas Alegações de Recurso são suscitadas, em síntese, duas ordens de questões: (1) Nulidades da sentença; – (2) Usucapião da recorrida em conflito com a aquisição derivada translativa da recorrente, com prevalência daquela – no âmbito desta última sendo ainda levantadas questões relativas à matéria de facto dada provada na sentença. Assim,
B.1 - Das Nulidades
3 - A decisão sobre a admissão de requerimentos probatórios de confissão e declarações das partes, é necessariamente tomada em momento anterior à sentença, sendo que nesta toda a prova já terá sido admitida e produzida (artigos 410 e 607, n.º 1, ambos do CPC) merecendo impugnação autónoma a decisão que rejeite meios de prova (artigo 644, n.º 2, alínea d), do CPC), pelo que a sentença não padece, por esses fundamentos, de quaisquer nulidades.
B.2 - Da Usucapião e da Aquisição Derivada
B.2.1) Questões de Facto
4 - O que na alínea L) dos Factos Provados consta, encontra-se  incindivelmente conectado à matéria de facto das alíneas M) e N) que, na sua globalidade, determinam que os caracteres da posse da aqui recorrida sejam as de não titulada (3) (artigo 1259, n.º 1, do CC), presumida de má-fé (artigo 1260, n.º 2, do CC) e pacífica (artigo 1261, n.º 1, do CC), ocorrendo que tal ausência de título para a posse decorreu do facto da aquisição em causa ter consistido numa compra e venda que não observou a forma de escritura pública (artigo 875, do CC, redação originária);
5 - É inoperante qualquer restrição ao princípio da livre admissibilidade de todos os meios probatórios, quanto à transmissão da posse sobre a coisa, apesar de realizada em execução de uma compra inválida por inobservância de forma legal (artigo 607, n.º 5, do CPC).
6 -  Não cumpre a recorrente as exigências do que prescrevem as alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 640, do CPC, pelo que deve ser rejeitado o recurso nesta parte (artigo 640, n.º 1, proémio, do CPC);
7 - A recorrente invoca preterições de meios de prova que aquela pretenderia produzir em audiência final, os quais terão sido indeferidos pelo tribunal, mas cujos despachos de indeferimento mereceriam, porventura, impugnação por via de recurso autónomo (artigo 644, n.º 2, alínea d), do CPC), a que acresce a circunstância da recorrente também não indicar, nas suas Alegações, a sua relevância para a prova ou contraprova dos factos controvertidos/factos provados, que também não identifica, nem muito menos refere o sentido que deveriam assumir caso lograsse a produção de tal prova.
B.2.1) Questões de Direito
8 - A aquisição derivada de direitos (4), nas modalidades de transmissão de direitos (aquisição derivada translativa) ou de constituição de direitos (aquisição derivada constitutiva), tem expressão nas disposições conjugadas dos artigos 408, n.º 1, 879, alínea a), e 892, 1.ª parte, 904 e 939, todos do CC;
9 - Face às regras gerais do ónus da prova, o adquirente, para fazer valer o seu direito apenas com base na aquisição derivada (4), não tem apenas de fazer prova do negócio jurídico apto à transmissão do direito, mas tem também que fazer prova de que o direito existia na pessoa do transmitente (5), e assim sucessivamente, em retrospetiva, quanto aos antecessores, o que gera um conhecido efeito de probatio diabolica e que é, em maior ou menor medida e eficácia, suprido pelos institutos do registo predial e da usucapião;
10 – Já a aquisição originária de direitos, cujo paradigma é a usucapião (prescrição aquisitiva), não depende, na sua ocorrência, de uma titularidade anterior, podendo, inclusive, operar “a non domino”, sendo que apenas depende da prática dos atos a que a lei liga o efeito jurídico de aquisição do direito (6)(7);
11 – Para a operatividade da usucapião (artigo 1287, do CC) a posse é condição necessária para que se produza o efeito aquisitivo (originário) do direito, mas não é sua condição suficiente, carecendo de ser invocada pelo interessado; (8)(9)
12 - Em conformidade com o disposto no artigo 1292, do CC, que ordena a aplicação à usucapião das regras relativas ao instituto da prescrição, resulta, de igual modo, a extinção do direito, caso este tenha, por alguma forma, existido(9);
13 – Assim, na usucapião, o possuidor vai mais além que simplesmente invocar
a sua posse e, porventura, socorrer-se da presunção de titularidade do direito que a lei lhe concede (artigo 1268, n.º 1, do CC) usando da faculdade, que deve para o efeito invocar, de adquirir o direito, mesmo contra o titular que por inação e pelo decurso do tempo o deixou prescrever (9). Assim,

14 - Os factos que determinam a perda posse, são os que se encontram previstos nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 1267, do CC, e nos quais se não encontra prevista a penhora, a qual, em si mesma, é insuscetível de determinar o esbulho de terceiro (10);
15 - Na espécie sob recurso, encontramo-nos perante penhora decretada pela AT (cfr. Alínea E), dos Factos Provados), mas tal em nada descaracteriza a posse, atento o disposto no artigo 103, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), que confere ao processo de execução fiscal natureza judicial, e o regime previsto nos artigos 166, n.º 1, alínea a) e 237, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que, global e implicitamente, remete para os normas substantivas da lei civil e adjetivas da lei de processo civil, no que à tutela da posse diz respeito – “ex vi” o artigo 2.º, alínea e), do CPPT (11);
16 – A caducidade do direito de deduzir de embargos de terceiro por parte do possuidor (cfr. artigo 237, n.º 3, do CPPT), não determina, por si só, a irrelevância da posse, já que esta pode, ainda assim, sobressair em sede de dedução dos meios comuns onde um terceiro em relação à execução fiscal reivindique a titularidade do direito sobre o bem penhorado, e cujo facto com efeito aquisitivo pode ter consistido na usucapião – cfr. artigo 346, do CPC, “ex vi” artigo 2.o, alínea e), do CPPT e o artigo 172, também do CPPT;
17 – Revelam-se, por isso, também totalmente improcedente o alegado quanto à aqui recorrida como terceira em relação à execução fiscal (12) identificada sob a alínea e) dos Factos Provados, nenhum impedimento obstaria a que, querendo, reivindicasse e defendesse a sua propriedade sobre a fração identificada sob a alínea 1) dos temas da prova, com fundamento na usucapião como facto aquisitivo (cfr. artigo 1316, do CC).
18 – Sendo a recorrida terceira em relação à execução fiscal identificada sob a alínea e) dos Factos Provados (12) e que, nos presentes autos, como a lei lhe faculta, em reconvenção pediu o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre a fração identificada sob a alínea 1) dos temas da prova, com fundamento na usucapião (aquisição originária) como facto aquisitivo, isto é, independentemente do trato sucessivo (ou da aquisição derivada translativa) que pudesse ser reconstituído desde a executada “A..., Lda.”, são totalmente improcedentes as conclusões da recorrente. (13)
19 – Em conclusão, a posse, que fundamenta a usucapião da recorrida, começou em 1991 com a de DD, como claramente decorre das Alíneas L), M) e N) dos Factos Provados, e com relação à qual operou a respetiva acessão; tendo presente que a posse da recorrida é não titulada e, como tal, presumida de má-fé, a prescrição aquisitiva (usucapião) da recorrida consumou-se, senão antes, pelo menos em 2011 e retroagiu a 1991, em conformidade com as disposições conjugadas dos artigos 1251, 1256, 1260, n.º 2, 1296, parte final (14) 1316, 1287 e 1288, todos do CC.
Nestes termos e nos melhores de Direito, deverá: A) Declarar-se nulo o ato processual de apresentação de Alegações de Recurso, desacompanhado do respetivo requerimento de interposição de recurso, com os fundamentos e consequências expostos supra na Conclusão 1 desta Resposta, e sem prejuízo da verificação do cumprimento do ónus de concluir por parte da recorrente, em conformidade com o assinalado na Conclusão 2, também desta Resposta. Sem conceder, B) Ser totalmente negado provimento ao recurso, tendo também presente a situação de rejeição exposta supra na Conclusão 6 desta Resposta.
____
Notas:
(1) Trata-se de jurisprudência uniforme dos nossos tribunais superiores. Veja-se, a propósito, o ponto II do Sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4-V-2021, proferido no Proc. n.º 327/14.4T8CSC.L1.S1, nos termos do qual “(...) a lei permite esta forma de elaboração do acórdão, no artigo 635, 4, do CPC, conjugado com o artigo 608, n.º 2, também do CPC, na medida em que o objeto de recurso ou o thema decidendum são apenas as conclusões do recorrente na alegação de recurso, as conclusões do recorrido na ampliação do recurso e questões de conhecimento oficioso.”

(2) Duvida-se, com efeito, que a recorrente tenha verdadeiramente cumprido o ónus de concluir, atento o manifesto excesso que cometeu, em matéria de Conclusões, nas suas Alegações de Recurso. Cfr., a propósito, o Acórdão da Relação do Porto de 9-XI-2020, documento n.º RP2020110918625/18.5T8PRT.P1 , in DGSI.
(3) Na lição do Código Civil Anotado, Volume III, dos Professores Pires de Lima e Antunes Varela, com a colaboração do Professor Henrique Mesquita, página 19, 2.ª Edição Revista e Atualizada, Coimbra, 1987, “Se o ato é nulo por vício de forma, como se, por exemplo, se compra um prédio por escrito particular, ou verbalmente a posse que daí deriva não é titulada.”
(4) Na lição do Professor Manuel de Andrade, in Teoria Geral da Relação Jurídica, Volume II, Coimbra, 1987 (7.ª reimpressão), página 14, “A aquisição derivada pressupõe um direito do anterior titular (o mesmo ou outro mais amplo (1), ao menos como regra geral). Funda-se ou filia-se na existência dele.” Como, outrossim, se afigura evidente, são de excluir desta espécie os casos de aquisição de coisa futura ou indeterminada (artigo 408, n.º 2, do CC), da venda de bens de existência ou titularidade incerta (artigo 881.o, do CC) e da venda de bens alheios como bens futuros (artigo 893, do CC). Por último, como é também sabido, o sistema adotado pelo legislador no Código Civil de 1966 para a aquisição derivada de direitos reais sobre os bens, é acompanhado da solução quanto à transmissão do risco, prevista no artigo 796, n.º 1, do CC.
(5) Na mesma lição do Professor Manuel de Andrade, in ob cit. na nota (4), página 18, “Sabemos já que na aquisição derivada a existência do direito do adquirente, e portanto, a validade da aquisição, depende do direito do transmitente, direito que, mediante a aquisição, se extingue ou fica limitado ou comprimido.” Por outro lado, é neste exato contexto de supressio da probatio diabolica que se percebe, no âmbito do conflito de presunções de propriedade que a posse e o registo facultam - e que o artigo 1268, n.º 1, do CC, adequadamente, soluciona - que a usucapião vai para além da posse e do registo.
(6) Na lição do Professor Manuel de Andrade, idem, página 18, “Ao passo que na aquisição originária a existência do direito do adquirente não depende de qualquer direito de um titular anterior, podendo até faltar em absoluto esse titular.” (...)
” Na aquisição originária a amplitude do direito adquirido só depende da extensão dos atos de onde resulta a aquisição (facto ou título aquisitivo). Esta doutrina quanto à prescrição aquisitiva, exprime-a a máxima “tantum possessum quantum praescriptum”.

(7) A propósito do efeito aquisitivo da usucapião, o disposto no artigo 1287, do CC, deve conjugar-se, como é óbvio, com o disposto no artigo 1316, do mesmo Diploma.
(8) Quanto ao instituto da usucapião enquanto forma paradigmática, expressa no direito positivo português, de aquisição originária de direitos e da respetiva autonomia face à posse, ensinam, de forma lapidar, os Professores Pires de Lima, Antunes Varela, com a colaboração do Professor Henrique Mesquita, in ob cit na nota (3), página 65, anotação 6, “É de notar, ainda, que o legislador, ao contrário do que se passava com o Código Civil de 1867, não diz que pela posse se adquirem direitos, mas sim que a posse faculta ao possuidor a sua aquisição. A nova redação provém do facto de a usucapião, para ser eficaz, necessitar de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público.” Claramente se reforça, por força desta doutrina, a natureza potestativa da usucapião.
(9) A este propósito, também ensinam os Professores Pires de Lima, Antunes Varela, com a colaboração do Professor Henrique Mesquita, in ob cit na nota (3), págs. 70-71, anotação 2, “ Pelo Código de Seabra, havia algumas disposições (arts.505.o a 516.o) que eram comuns à prescrição extintiva e à chamada prescrição aquisitiva (usucapião). O Código novo deu autonomia aos dois institutos e regulou- os em lugares distintos. Mas não deixou de reconhecer que há, com efeito, disposições que podem e devem ser aplicadas em qualquer dos casos, já que em ambas as situações há de comum alguma coisa: trata-se sempre da repercussão que o decurso do tempo pode ter na alteração de situações jurídicas, extinguindo direitos, por um lado, e criando-os, por outro.”.
(10) É justamente por isso que os embargos de terceiro, enquanto meio de tutela da posse, podem ter uma dupla natureza de manutenção (prevenção) ou de restituição, como claramente decorre dos artigos 342, 347 e 350, todos do CPC. A este propósito os Professores Pires de Lima, Antunes Varela, com a colaboração do Professor Henrique Mesquita, in ob cit na nota (3), página 61, anotação 2, referem que “ Os termos do artigo 1285.o assim como os do artigo 1037.º do Código de Processo Civil, não deixam dúvidas sobre a questão de saber se, independentemente dos embargos, os possuidores podem, para a defesa da sua posse contra atos judiciais, servir-se das ações de manutenção ou de restituição reguladas no artigo 1278.º”. Por sua vez, o Mestre Alberto dos Reis, in Processos Especiais, Volume I – Reimpressão, Coimbra (1982), depois de aludir à evolução história dos embargos de terceiro, da configuração inicial de incidente a verdadeira ação possessória, dos Código de Processo de 1876 para o de 1939 (Págs. 399-400), refere, ainda de forma mais clara e expressiva, o que passa a transcrever-se: “Os dois textos põem em plena luz a função dos embargos de terceiro. Servem: a) Ou para fazer restituir o embargante à posse de que foi privado por determinada diligência judicial (art. 1036.º); b) Ou para obstar a que o embargante seja esbulhado da sua posse em consequência de diligência judicial já ordenada (art. 1039.º). No 1.º caso têm a fisionomia de verdadeira ação de restituição de posse. No segundo, apresentam-se com o aspeto de ação possessória de prevenção.”
(11) Sem prejuízo do que acaba de expor-se, fica ressalvado, no entanto, que o regime da tramitação processual dos embargos de terceiro deduzidos em processo de execução fiscal, se rege pelas regras relativas à oposição em execução fiscal (artigo 167, do CPPT).
(12) Como refere o Mestre Alberto dos Reis, in ob. cit. na nota (10), pág. 413, “Em suma, o embargante tem a posição de terceiro, desde que nem a sentença nem o ato jurídico constituem para ele fonte de obrigação”. Na espécie dos autos, a penhora está decretada em processo de execução fiscal, sendo que em relação a este os títulos executivos que lhe servem de base são os enumerados no artigo 162, alíneas a) a d), do CPPT, sendo que a recorrida não figura como executada na identificada sob a alínea e) dos factos provados.
(13) V. o exposto supra nas notas (4), (5), (6), (7), (8) e (9).
(14) De notar que em conformidade com o teor da Alínea N) dos Factos Provados, configura-se que não deverá operar a presunção de má-fé a que alude o artigo 1260, n.º 2, do CC, não obstante ser não titulada a posse da recorrida e do respetivo antecessor DD, já que este último publicamente iniciou a sua posse sobre arrumo que consta da alínea 1) dos temas da prova, na convicção de que este lhe pertencia. Deste modo, a alusão ao prazo de 20 anos (artigo 1296, parte final, do CC), encontra, em bom rigor, apenas justificação em razões que derivam de cautela de patrocínio.

O recurso foi recebido nos termos legais e os autos correram Vistos. Sem prejuízo do que se dirá em sede de questões “prévias”, o objeto do recurso, atentas as conclusões da apelante, traduz-se em saber a) Se a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia relativamente à exceção do caso julgado e b) Se efetivamente ocorre a exceção do caso julgado ou, pelo menos, a autoridade do caso julgado; em saber c) Se a sentença deve ser revogada, porquanto a autora adquiriu legitimamente a fração “IC”, aquisição que registou e prevalece sobre a eventual posse da ré e d) Se a reconvenção deve improceder, porquanto a ré perdeu a posse com a penhora e não pode adquirir a fração autónoma por usucapião.

III – Fundamentação
Previamente, importa apreciar as “questões prévias” que se seguem.

1 – Na resposta ao recurso, a recorrida suscita a questão de o apelante não ter, em rigor, interposto recurso ou, pelo menos, tê-lo feito de forma inválida, o que acarretaria a nulidade do requerimento de interposição. Sem razão bastante, porém. É certo que o apelante, dirigindo-se, ainda assim, ao tribunal recorrido, não esclarece a vontade de recorrer nem a natureza e os efeitos do recurso pretendido (o que vem a fazer, posteriormente em novo requerimento de correção ao anterior), mas, isso sim, dirige-se imediatamente ao Tribunal da Relação e prossegue a sua peça com as alegações e respetivas conclusões. Qualquer vício formal há de apreciar-se atendendo aos seus efeitos processuais, sob pena de um rigorosíssimo formalismo inquinar a possibilidade e a precedência do conhecimento da causa (recurso). No caso presente, o requerimento é inteligível, quer ao tribunal (que recebeu efetivamente o recurso, e sem qualquer reparo), quer à parte contrária, a recorrida; por isso, a irregularidade mostra-se irrelevante e, verdadeiramente, não constitui qualquer nulidade, como decorre do disposto na parte final do artigo 195, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC).

2 – Nas suas conclusões, afirma a apelante que junta aos autos documentos – e concretamente a declaração escrita da construtora do imóvel – que já se mostram juntos. Embora seja uma técnica discutível quando o recurso sobe nos próprios autos, pouco vemos a acrescentar, uma vez que, não obstante a intenção manifestada, não decorre dos autos que a (re)junção haja sido feita. Trata-se de questão que, por isso, se desvalorizou em si mesma.

3 – Com as alegações, a apelante junta um parecer. É legítima essa junção, como decorre do disposto no artigo 651, n.º 2 do CPC.

4 – Na resposta ao recurso, a apelada sustenta que a apelante não impugna, ou não impugna validamente, a decisão relativa à matéria de facto, pois não cumpre o ónus previsto no artigo 640 do CPC. A recorrida tem razão, embora nos pareça que suscita uma questão que as conclusões da apelante – legalmente definidoras do objeto do recurso – sequer colocam. Efetivamente, o recurso respeitante à decisão relativa à matéria de facto terá necessariamente de ter conclusões das quais se retire e concretize essa vontade de impugnação, sendo que, sob pena de rejeição liminar, as conclusões terão de ter os “concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados”[5]. No caso presente, lidas as extensas conclusões da apelante, não descortinamos que ponto de facto se pretende alterar ou sequer que outros se pretendiam, concretamente, aditar, sendo certo que a apelante também não enuncia essa vontade de recorrer da decisão relativa à matéria de facto. Assim, e verdadeiramente, não há recurso da decisão relativa à matéria de facto, carecendo de cabimento a questão suscitada pela recorrida.

5 – Ligando-se à matéria de facto – e ainda que não represente, como se adiantou, impugnação da mesma – a apelante suscita em vários passos das suas conclusões, a sua inconformidade com a não aceitação, no tribunal recorrido, de alguns meios de prova, ao mesmo tempo que se insurge contra a inadmissão do chamamento da construtura do edifício. Tais alegações são, nesta sede e momento processual, inócuas. Com efeito, a apelante recorreu (como se dá conta no relatório) de todos os indeferimentos que achou recorríveis, tendo, aliás, obtido vencimento em uma das apelações. Se doutros – que não se veem, mas admitem em tese – não recorreu, devia tê-lo feito, mas com oportunidade: A admissão ou rejeição de qualquer articulado ou meio de prova implica recurso autónomo e imediato, como esclarece o artigo 644, n.º 2, alínea d) do CPC.

Feita a pronúncia sobre as precedentes questões prévias e delas concluindo-se, além do mais, que não se mostra impugnada a decisão relativa à matéria de facto, prosseguimos.                     

III.I – Fundamentação de facto
Factos Provados
A - Correu termos entre as partes a providência cautelar, apensa como Apenso A.
B - A fração referida em 1) dos temas da prova[6] havia sido adquirida por CC em hasta pública, levada a cabo pelos Serviços de Finanças de V.N. de Gaia, em 23.11.2016.
C - A ré adquiriu a sua fração autónoma “FL”, destinada a habitação, sita no rés-do-chão posterior da Torre “...” com entrada pela rua ..., ,,,, por escritura lavrada a 8.4.2008 a folhas 135 do Livro ...... do Cartório Notarial Dra. EE.
D - A autora efetuou sobre a dita fração [“IC”[7]] o pagamento do IMI.
E - Sobre a fração [“IC”] recaiu penhora, efetuada pelas Finanças no âmbito de P. Executivo ..., que correu termos na Repartição de Finanças de V.N. de Gaia.
F - A autora, por meio de escritura pública celebrada em 3.6.2017, adquiriu a fração autónoma “IC”, destinada a arrecadação com n.º ..., no sótão da Torre “...”, com entrada pelo novo arruamento sem denominação n.º ... e praceta ..., inscrita na matriz predial urbana, art. ... - União Freguesias ... e ..., que lhe foi vendida por CC e seu marido FF.
G - A ré não permitiu à autora o acesso e uso da arrecadação [fração “IC”].
H - A autora interpelou a ré, em 16.6.2017, por carta com A/R, instando-a a proceder à entrega pacífica da arrecadação, nomeadamente: 1) retirando todos objetos que lá se encontrassem; 2) deixando a porta apenas encostada; 3) entregando a chave na Administração do Condomínio ou retirando o canhão/fechadura.
I - E, por mais que uma vez, por telefone.
J - Ao que a ré respondeu, mediante mensagem eletrónica datada de 22.6.2017, reafirmando o que já tinha dito: era proprietária e tinha adquirido a um DD, recusando a entrega da arrecadação.
K - A autora esteve e está, desde sempre, privada do uso e fruição da referida fração, não lhe tem acesso, não tem a chave e não coloca lá os seus pertences.
L - A ré adquiriu a fração identificada em 1) [“IC”] a DD e mulher que a havia comprado em 1991 à construtora do prédio, o arrumo sito no sótão da torre
“C” que também já vinha utilizando desde que havia adquirido a fração “FL”.
M - Desde abril de 2008 que a ré sempre lá colocou os seus pertences, nomeadamente guardando lá coisas, pagando a luz e o respetivo condomínio, na convicção de estar a utilizar o referido anexo como se de coisa sua se tratasse.
N -  Desde 31.01.1991 que o antepossuidor da ré, DD, ocupou o arrumo, convencido de que o mesmo lhe pertencia, colocando lá os seus pertences e pagando a luz e o respetivo condomínio referente a esta fração e em 2008 transmitiu-o à ré da mesma forma como o tinha adquirido, convencido que de seu se tratava.

Factos não provados
- Relativamente ao facto provado em F): respetivamente nora e filho da requerente;
- Na propriedade horizontal, é parte da fração autónoma identificada como fração “CI”.

III.II – Fundamentação de Direito
Da nulidade da sentença e do caso julgado
Na sua petição, não invoca a recorrente a existência de qualquer caso julgado (exceção ou autoridade). Em resposta à contestação/reconvenção, e se bem vemos, volta a não o fazer. Logo, ainda que a ofensa do caso julgado seja uma questão de conhecimento oficioso, não pode imputar-se à decisão recorrida a violação da obrigação de pronúncia quando a questão não foi colocada e os factos não revelam a sua existência. Outro entendimento levaria a que, em cada sentença, o tribunal de pronunciasse sobre todas as (inúmeras) questões de conhecimento oficioso, ainda que para – quase sempre – ter de dizer que as mesmas não ocorrem.

Tanto basta para concluirmos que a sentença não violou o disposto no artigo 615, n.º 1, alínea d) do CPC, ou seja, não ocorre a nulidade invocada pela apelante.

Mas sendo a ofensa ao caso julgado de conhecimento oficioso, e tendo sido suscitada em sede de recurso, importa acrescentar que, em nosso entender, ela revela-se totalmente improcedente, seja na perspetiva de autoridade do caso julgado (também referida pela recorrente) seja enquanto exceção (expressamente invocada). Totalmente improcedente, porque a decisão em causa, fundada no disposto no artigo 824 do Código Civil (CC) não tem qualquer efeito em relação à ré. Note-se que é a própria recorrente quem sustenta que a recorrida devia ter embargado de terceiro, ou seja, a decisão das Finanças nunca poderia ter o sentido dado pela apelante, desde logo, mas suficientemente, por falta de identidade de sujeitos.

Não há, manifestamente, qualquer ofensa ao caso julgado.

Prosseguindo. Para melhor compreensão da ação e do recurso, narramos, topicamente, os factos que resultam dos autos:
- A construtora edificou um prédio e constituiu-o em propriedade horizontal (1987).
- Em 1991, DD comprou a fração FL (rés do chão);
- Na mesma ocasião temporal, o referido DD começou a usar (pagando a luz e o respetivo condomínio) uns arrumos.
- Os arrumos constituem a fração IC.
- Em 2008, o referido DD vendeu à ré a fração FL.
- Desde essa data a ré passou a usar (pagando a luz e o condomínio) os arrumos que constituem a fração IC.
- Entretanto, depois da aquisição pela ré, a fração IC foi penhorada pelo serviço de Finanças, por dívidas da construtura e veio a ser vendida (2016) a CC, que a autora identifica como sua nora.
- A autora comprou a fração IC (arrumo) à referida CC em junho de 2017 e, deparando-se com a sua utilização pela ré, instou esta a entregar-lha.
- A ré não entregou a fração IC à autora, invocado ser proprietária da mesma e a haver adquirido ao referido DD.

As questões relevantes – e ainda por elucidar – quer da ação, quer do recurso, prende-se com a posse e seus efeitos, relativamente à fração autónoma, conjugada com a aquisição e registo da propriedade dessa fração.

Refere a apelante, nas suas primeiras conclusões (X e XII), depois de descrever o decidido na sentença (conclusões II a IX) que a “nossa ordem jurídica, NÃO ASSENTA na usucapião, modo de aquisição, enumerado em terceiro lugar, após o contrato e a sucessão por morte”, mas “assenta na PROPRIEDADE, nos termos de art. CC 1305. Sendo que a usucapião é uma das formas de aquisição da propriedade, nos termos de art. 1316 CC. A terceira, elencada nesse art.”. Salvo o devido respeito, a apelante confunde o modo de aquisição com o direito adquirido, o que é, naturalmente, coisa distinta. O “adquirido”, nos termos do artigo 1316 do CC é o direito de propriedade; os modos de adquirir, segundo o mesmo preceito, são o contrato, a sucessão por morte, a usucapião, a ocupação, a acessão e os demais modos previstos na lei. Aliás, o citado preceito inicia a secção I do capítulo (II) que tem como epígrafe, precisamente a “Aquisição da propriedade”. Por outro lado, o preceito não estabelece qualquer prioridade, desde logo porque os modos de aquisição nem sempre estão em confronto entre si e, todos considerados, necessariamente o não estão. Diga-se, em acrescento, que havendo conflito entre a aquisição registada, esta só prevalece sobre a posse se o registo dela foi anterior ao início da posse – artigo 1268, n.º 1 do CC.

A posse, definida no artigo 1251 do CC, quer se siga uma conceção subjetivista ou objetivista[8], “não poderá naturalmente prescindir de um controlo material sobre a coisa, de modo a que a mesma esteja na esfera de influência de alguém com exclusão de todos os demais – o corpus[9]. O artigo 1252, n.º 2 do mesmo diploma acrescenta que quem exerce o pode de facto presume-se possuidor e, nesse mesmo sentido, já o AUJ de 14.05.96 esclarecia que “Podem adquirir por usucapião, se a presunção de posse não for ilidida, os que exercem o poder de facto sobre a coisa”.

No caso presente, a autora nunca esteve na posse do bem (arrumo) comprado à compradora que o adquiriu em processo de execução fiscal; tanto assim é que, como a própria alega, instou a ré, utilizadora do referido a arrumo, a entregar-lho. A ré, por sua vez – e tal resulta dos factos provados – estava na posse dessa fração autónoma (“IC”), desde que adquiriu a (outra) fração ao anterior proprietário. Contrariamente ao que sustenta a apelante, a penhora levada a cabo pelo Serviço de Finanças não implicou a perda de posse por parte da ré, desde logo porque –  e não resulta minimamente dos autos – o bem não foi apreendido: recorde-se que a posse é um poder de facto. Irreleva, por outro lado, que a ré não tenha embargado de terceiro, pois tal inação não altera o poder de facto que vinha exercendo sobre a coisa.

A autora comprou a quem comprou anteriormente em execução, mas o disposto no artigo 824 do CC, não altera a propriedade do bem vendido: desonera-o de ónus e encargos, aceitando ou dando por adquirido que o bem é propriedade do executado, mas saber quem é o proprietário não se resolve ao nível desse normativo, mas no confronto entre o registo de aquisição e a posse.

No caso presente a ré estava na posse do arrumo desde 2008 e o anterior possuidor estava na posse do arrumo desde 1991. O registo da compra pela autora é posterior ao início da posse da ré, e muito posterior ao início da posse do anterior possuidor.

Como não houve perda de posse a questão que se coloca, e releva, é a de saber se a ré podia adquirir por usucapião, já que, como decorre do disposto no artigo 1287 do CC, “A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua atual”, no caso presente, o direito de propriedade.

“Salvo disposição da lei em contrário” remete-nos para a questão colocada pela recorrente e especialmente vincada no parecer que junta e que se prende com a possibilidade de constituir uma fração autónoma por usucapião. Efetivamente, a apelante remete para o parecer que juntou e, por ele, sustenta a prevalência da aquisição da fração em sede de processo executivo – aquisição feita pela sua nora, que posteriormente vendeu a fração à apelante – sobre a aquisição, por via possessória (usucapião), pela recorrida. Defende-se, efetivamente, que tendo sido constituída a propriedade horizontal em 1987, só nessa data “nasceu” a fração e foi – e quando foi - registada; por isso a posse da ré, mesmo acedendo à do vendedor (que comprou à construtora em 1991) é posterior ao registo (da constituição da propriedade horizontal).

Admitindo não ser possível constituir uma fração autónoma por usucapião, por respeito às normas imperativas que regulam a propriedade horizontal, não há que confundir a constituição da propriedade horizontal com a venda ou início de posse de uma fração já constituída, uma fração autónoma. Nesse sentido, e salvo o devido respeito, a questão não se coloca – ou, pelo menos, não se resolve – nos termos colocados. O anterior proprietário da fração, adquiriu-a à construtora e não registou a compra (comprou, aliás, outra fração que, entendendo incluir os arrumos – fração aqui em causa -, passou a possuir, uma e outra). É certo que a venda em processo executivo equivale à venda pelo executado (a construtora), mas não estamos perante a incompatibilidade solucionada pelo artigo 291 do CC, que pressupõe um conflito de registos (de aquisição da fração, não de registo de constituição da propriedade horizontal). Não havendo esse conflito, mas conflito de propriedade (saber quem é o dono: quem adquiriu na execução e registou ou quem adquiriu ao construtor e não registou) a solução há de encontra-se nos efeitos da posse e na sua prevalência sobre o registo.

A solução legalmente imposta faz com que prevaleça a posse, se mais antiga que o registo de aquisição.

Resta dizer que não se acompanha o entendimento de alguns autores[10] no sentido de o invocante da usucapião só poder usar a sua posse ou, melhor dito, o seu tempo de posse, pois tal entendimento, salvo melhor saber, desvirtua a natureza da acessão na posse e a possibilidade de, através dela, poder haver usucapião.

No caso presente, à posse da ré, iniciada em 2008, acresce o tempo de posse do anterior possuidor, iniciado em 1991, uma vez que as posses são homogéneas e contínuas, e já decorreram mais de quinze anos – mesmo mais de vinte anos –, tempo necessário à usucapião nos casos de falta de registo de título de aquisição, de falta deste e de falta registo da mera posse – artigo 1296 do CC.

Por tudo, a ação tinha de ser julgada improcedente, como o foi, e a reconvenção procedente. Em conformidade, atento o decaimento, as custas do recurso são devidas pela recorrente.

IV – Dispositivo
Pelo exposto, acorda-se na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto em julgar o recurso improcedente e, em conformidade, confirma-se a decisão proferida em primeira instância.

Custas pela recorrente.

Porto, 8.04.2024
José Eusébio Almeida
Miguel Baldaia de Morais
Ana Paula Amorim
_______________
[1] Conforme acórdão de 23.03.2020, em que foi Relatora a Sra. Desembargadora Ana Paula Amorim, aqui 2.ª Adjunta, e com o seguinte sumário: “I. Os incidentes de intervenção de terceiros, previstos nos art. 311.º a 324.º CPC, estão estruturados na base dos vários tipos de interesse na intervenção e das várias ligações entre esses interesses no confronto com a relação material controvertida desenvolvida em juízo entre as partes primitivas. II. Recai sobre o requerente o ónus de alegação do interesse como fundamento da legitimidade do interveniente. III. Se o documento estiver em poder de terceiro, a parte requer que o possuidor seja notificado para o entregar na secretaria, dentro do prazo que for fixado, sendo aplicável a este caso o disposto no art. 429.º, conforme decorre do art. 432.º/1 CPC. IV. Nesse requerimento, a parte deve identificar, tanto quanto possível, o documento e especificar os factos que com ele pretende provar, dado que a notificação da parte ou de terceiro só será ordenada se esses factos tiverem interesse para a decisão da causa, nos termos do art. 429.º/2 CPC”.
[2] Decidido por acórdão de 14.12.2022 [Relator, Desembargador Jorge Seabra] com o seguinte sumário: “I. As declarações de parte são um meio de prova voluntário e de natureza potestativa, como decorre da sua previsão no artigo 466.º, do Código de Processo Civil. II. Por conseguinte, o juiz do processo não pode fazer qualquer pré-juízo sobre a utilidade (ou credibilidade) de tal meio de prova oferecido pela parte interessada e, assim, rejeitar liminarmente esse meio de prova, salvo se o mesmo for oferecido de forma extemporânea. III. Não indicando a parte interessada, em termos discriminados, a matéria de facto sobre a qual versarão as suas declarações de parte, o juiz deve convidar a mesma a fazer essa indicação em prazo a fixar, ao abrigo dos poderes/deveres de gestão e colaboração previstos nos artigos 6.º, n.º 2 e 7.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (CPC). IV. O depoimento de parte da parte contrária só pode ser formulado nos articulados da acção e na audiência prévia, se a mesma tiver lugar, não sendo aplicável às partes a regra do n.º 1 do artigo 452.º do CPC, que atribui apenas ao juiz a prerrogativa de, por sua própria iniciativa (e não por sugestão ou requerimento da parte), ouvir em depoimento as partes em qualquer fase do processo. V. Sendo rejeitado um meio de prova e sendo de imediato (como tem de ser) interposto
recurso de apelação ao abrigo do preceituado no artigo 644.º n.º 2, alínea d), do CPC, é estrito dever do juiz do processo conhecer da interposição do recurso e admiti-lo (se for o caso), sendo ilegal a sua retenção durante cerca de 5 meses e até ao momento em que o juiz admite o recurso da própria sentença entretanto proferida e a coberto de uma alegada conveniência na decisão conjunta dos dois recursos”.
[3] Mantemos a numeração da conclusão, aqui repetida, acrescentando a letra “A”.
[4] Mantemos a numeração constante das conclusões do recurso, adicionando, nas repetidas, a letra “B”.
[5] António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª Edição Atualizada, Almedina, 2022, pág. 201.
[6] Fração “IC” (arrumos).
[7] Clarificamos, em sede de recurso a identificação da fração aqui em causa, porquanto não há qualquer dúvida quanto a essa identificação, e o próprio dispositivo da sentença o clarifica, reconhecendo a ré (reconvinte) como proprietária da fração “IC”.
[8] A distinção parece hoje esbatida, e sem real efeito prático. Tenha-se presente a lição de Orlando de Carvalho (Direito das Coisas, coordenação: Francisco Liberal Fernandes, Maria Raquel Guimarães, Maria Regina Redinha, Coimbra Editora, 2012, págs. 266/267) que, defendendo enquadrar-se o direito português “no sistema subjetivo, como já acontecia no Código Civil de 1867”, não deixa de esclarecer que “não existe corpus sem animus nem animus sem corpus”.
[9] Armando Triunfante, Comentário ao Código Civil – Direito das Coisas, Universidade Católica Editora, 2021, pág. 20.
[10] Cf. Armando Triunfante, Comentário... cit., págs. 35/36 e Pedro Eiró/Miguel do Carmo Mota, Comentário... cit., págs. 97/98.