Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | NELSON FERNANDES | ||
Descritores: | ISENÇÃO DE CUSTAS PESSOAS COLETIVAS PRIVADAS SEM FINS LUCRATIVOS AÇÃO COMUM QUE TEM POR OBJETO INVOCADOS CRÉDITOS LABORAIS | ||
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Nº do Documento: | RP2023112722446/22.3T8PRT-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/27/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A DECISÃO | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
Legislação Nacional: | ALÍNEA F), DO N.º1, DO ARTIGO 4º DO RCP | ||
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Sumário: | I - De acordo com a alínea f), do n.º 1, do artigo 4º do RCP, as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos estão isentas de custas “quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelos respetivos estatutos ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável”. II - Atua fora das condições referidas na referida alínea uma ré, instituição particular de solidariedade social, no âmbito de uma ação comum que tem por objeto invocados créditos laborais no âmbito da relação laboral, invocados pelo autor e em que aquela surge como entidade empregadora. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Apelação / processo n.º 22446/22.3T8PRT-A.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 3 Autor: AA Ré: Santa Casa da Misericórdia ... ______ Nélson Fernandes (relator) Eugénia Pedro Rita Romeira Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório 1. AA, instaurou ação declarativa, sob a forma comum, contra Santa Casa da Misericórdia ..., pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de €42.468,21, acrescida da quantia de €5.069,51, a título de juros moratórios vencidos, bem como daqueles que se vierem a vencer até efetivo e integral pagamento. Muito em síntese, invocou que, tendo celebrado com a Ré em 01.12.1993 um contrato individual de trabalho, por via do qual se obrigou a prestar, sob as ordens da Ré, as funções correspondentes à categoria profissional de médico anestesista, contrato esse que se manteve em vigor até ao dia 04.01.2022, data em que se verificou a sua caducidade, atenta a sua passagem à situação de reformado, no entanto, diz, a Ré não lhe assegurou o pagamento de todos os créditos salariais decorrentes da execução e da cessação do contrato de trabalho e que, nessa medida, lhe são devidos, créditos esses que refere, totalizando o valor que pede a final. Na contestação que apresentou, na qual a Ré pugna a final no sentido de que seja integralmente absolvida dos pedidos contra si formulados e julgada totalmente improcedente a ação, fez constar, após, no que ao presente recurso diz respeito, o seguinte: “DA ISENÇÃO DE CUSTAS: A R. é uma IPSS (Instituição Particular de Solidariedade Social), constituída sob a forma de Irmandade da Misericórdia, nos termos do Decreto-Lei nº 119/83, de 25 de Fevereiro, está isenta de custas, ao abrigo da al. f) do n.º 1 do art. 4º do Regulamento das Custas Processuais, uma vez que através da presente acção defende os interesses e os fins que prossegue, nos termos e conforme o previsto nos seus estatutos – Doc. 19.” Com data de 30 de maio de 2023, foi proferido em 1.ª instância despacho com o teor seguinte: “Entende a ré Santa Casa da Misericórdia ... que está isenta de custas ao abrigo do disposto no artigo 4.º, f) do RCP, aprovado pelo DL 34/2008, de 26/02. Na presente acção visa o autor o recebimento de créditos laborais emergentes do contrato de trabalho que vigorou entre as partes. Dispõe o referido artigo 4.º que estão isentos de custas “As pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável”. Ora, apesar de se poder concluir, dos estatutos juntos, que a ré é uma pessoa colectiva privada sem fins lucrativos, a verdade é que, estando em causa saber se são devidos ao autor os créditos laborais que aqui reclama, não visa a ré nesta acção a prossecução de um interesse próprio, não actuando exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa os interesses que lhe são conferidos pelos estatutos, a saber a defesa dos interesses de todos os pequenos e médios empresários. De facto, como refere Salvador da Costa (“Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado”, 2009, Almedina, pág. 146) estamos perante “uma isenção de custas condicional, na medida em que só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto ou pela própria lei. Nesta perspectiva, pode parecer que esta isenção não abrange as acções que tenham por objecto obrigações ou litígios derivados de contratos que essas pessoas celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições. Todavia, se o objecto de tais acções for instrumental em relação aos fins estatutários dessas entidades, propendemos a considerar serem abrangidas pela isenção de custas em análise”. Nem se diga que as funções atribuídas ao trabalhador eram relativas ao serviço de interesse público que a ré prossegue, para se concluir que, por isso, esta acção também o é. Se assim fosse em qualquer acção movida pela ré ou contra a ré por algum trabalhador, sempre estaria a ré isenta de custas, o que, manifestamente, não cabe no escopo da previsão da referida isenção – ver, neste sentido, os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 21/01/2013 e da Relação de Guimarães de 30/06/2016 (ambos disponíveis em www.dgsi.pt). Assim, a ré não está isenta de custas, não estando abrangido pela isenção consagrada na al. f) do n.º 1 do artigo 4.º daquele diploma. Notifique-a para proceder ao pagamento da taxa de justiça em falta.” 2. Dizendo-se inconformada, apresentou a Ré requerimento de interposição de recurso, finalizando as suas alegações com as seguintes conclusões: “A. O presente recurso incide sobre o despacho proferido em 30 de Maio de 2023, pelo qual o Tribunal a quo decidiu que a Ré não está abrangida pela isenção de custas consagrada no disposto na al. f) do nº 1 do art. 4º do Regulamento das Custas Processuais (doravante RCP). B. O objecto do recurso consiste em saber se esta demanda se integra ou não na isenção subjetiva de custas processuais prevista na norma referenciada. C. De acordo com o Tribunal a quo, a ora Recorrente, pessoa colectiva privada sem fins lucrativos, sob a forma de Instituição Privada de Solidariedade Social (doravante IPSS) com utilidade pública, não actua, nestes autos, onde se discute a existência de alegados créditos laborais devidos ao Autor pelo exercício da sua actividade profissional de médico anestesista no Hospital ..., no Porto, “exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa os interesses que lhe são conferidos pelos estatutos, a saber a defesa dos interesses de todos os pequenos e médios empresários.”. D. O Hospital ... é um dos estabelecimentos da Recorrente, através do qual prossegue um dos seus fins, a saber: o da “Promoção da saúde, prevenção da doença e prestação de cuidados na perspetiva curativa, de reabilitação e reintegração, designadamente através da criação, exploração e manutenção de hospitais, unidades de cuidados continuados e paliativos, serviços de diagnóstico e terapêutica, cuidados primários de saúde e tratamentos de doenças do foro mental ou psiquiátrico e de demências, bem como aquisição e fornecimento de medicamentos e assistência medicamentosa; - Cfr. al. e) do nº 2 do art. 4º dos Estatutos da Recorrente – Doc. 19 junto com a contestação. E. Para dar cumprimento à referida finalidade de exploração e manutenção de hospitais vocacionados para a prestação de serviços de saúde à comunidade, tal como definida nos seus Estatutos, a Recorrente contratou o Autor para prestar serviços médicos. F. Integram também atribuições da Recorrente, tal como previstas nos seus Estatutos, a adopção de todas as medidas necessárias a assegurar a sustentabilidade e a manutenção do seu património de rendimento, razão pela qual também actua nesta acção - através da qual o Autor exige pagamento de quantias que sabe não lhe serem devidas - no âmbito dessas finalidades, tal como previstas na al. i) do nº 2 do art. 4º e o art. 6º dos seus Estatutos. G. Por isso e salvo melhor opinião, a decisão do Tribunal a quo viola o disposto na al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP em virtude da sua errada interpretação e aplicação aos factos. Pois, H. De acordo com a al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP, estão isentos de custas “f) As pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável;” I. Esta isenção é condicionada, uma vez que a parte isenta é responsável, a final, pelos encargos a que deu origem no processo, quando a respetiva pretensão for totalmente vencida – nº 6 do art. 4º do RCP. J. Atendendo apenas ao elemento literal do disposto na al. f) nº 1 do art. 4º do RCP, poderíamos ser levados a pensar, tal como decidido pelo Tribunal a quo, que a isenção apenas abrange as ações em que a pessoa coletiva seja demandante ou demandada e cujo objeto contenda, única e diretamente, com uma atribuição strictu sensu, tal como prevista nos seus estatutos, sem incluir as relações jurídicas contratuais que essas pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos celebram com vista a obter meios para efectivar o exercício das suas atribuições. K. Contudo, tal interpretação meramente literal e restritiva da norma, não se coaduna com os princípios interpretativos enunciados no art. 9º, n.º 1 do CC, designadamente o histórico e teleológico. L. O RCP aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008 de 26 de fevereiro, que alterou o regime de isenções previsto no Código das Custas Processuais visou reduzir, mas ao mesmo tempo uniformizar todos os casos de atribuição da isenção. M. A doutrina tem delimitado o fundamento da isenção na “ideia de estímulo ao exercício de funções públicas por particulares que, sem espírito de lucro, realizam tarefas em prol do bem comum, o que à comunidade aproveita e ao Estado incumbe facilitar” - [Salvador da Costa, Regulamento das custas processuais. Anotado e comentado (custas judiciais em geral), Almedina, Coimbra, 2012, p. 146]. N. Não podemos também deixar de ter presente que, tal como definido no artigo 160º do CC, a capacidade das pessoas colectivas abrange todos os direitos e obrigações necessários ou convenientes à prossecução dos seus fins, aí estando necessariamente incluídas todos os actos praticados (neste caso a contratação de serviços de saúde) com vista à concretização das suas finalidades. O. A al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP deve ser interpretada de modo a considerar não apenas as atribuições e fins que caibam diretamente (exclusiva e especialmente) no âmbito dos seus estatutos ou para defesa dos seus interesses, mas também as ações necessárias que, além delas, assegurem o cumprimento das referidas atribuições ou a defesa dos seus interesses. P. Ou seja, todas as acções que versem sobre relações jurídicas que estão na base da concretização da realização dos fins estatutários ou a concretização dos seus interesses por via meramente instrumental, isto é, reflexa ou indireta, enquadram-se na isenção de custas processuais prevista na al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP. Q. Neste sentido veja-se a posição doutrinal de SALVADOR COSTA e a jurisprudência mais recente, designadamente o Acórdão da Relação de Guimarães de 28 de Junho de 2018, disponível em www.dgsi.pt. Assim, R. A matéria em discussão nos autos tem por objeto o contrato de trabalho e as obrigações daí decorrentes, celebrado entre a Recorrente e o Autor - Médico, como meio necessário à prossecução do fim expressamente previsto na al. e) do n.º 2 do art. 4º dos Estatutos. S. Ao mesmo tempo, com a acção instaurada, o Autor, com base na relação contratual laboral criada para prosseguir uma das especiais finalidades da Recorrente, visa ofender e diminuir o seu património, exigindo-lhe o pagamento de quantias que sabe não lhe serem devidas, cabendo à Recorrente adoptar todas as medidas para que tal não aconteça, tal como lhe impõe o disposto na al. i) do nº 2 do art. 4º e o art. 6º dos seus Estatutos. Por tudo isto, T. A Recorrente intervém na presente acção em defesa dos seus interesses e no âmbito dos fins que prossegue, atendendo a que se discute uma relação contratual que resultou da necessidade de execução de uma das suas principais atribuições e que pode afectar e lesar os seus interesses patrimoniais, U. Devendo, por isso, ser concedida à Recorrente a isenção de custas processuais prevista na al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP. V. O despacho recorrido interpretou, assim, erradamente o disposto na al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP, devendo, por isso, ser revogado e substituído por outro que reconheça à Recorrente o benefício da isenção de custas na presente ação. W. Ao interpretar (erradamente) o disposto na al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP no sentido de não ser aplicada a isenção de custas processuais, o despacho violou o previsto na al. e) e i) do nº 2 do art. 4º e o art. 6º dos seus Estatutos da Recorrente, o art. 9º, n.º 1 e o art. 160º do CC, bem como os artigos os artigos 63º, n.ºs 1 e 5, 65º, n.ºs 1 e 2, al. d), 67º, n.ºs 1 e 2, als. b) e h), 69º, n.º 1, 70º, 71º, n.ºs 2 e 3, 72º, n.ºs 1 e 2, 75º, n.º 2, 78º, n.º 2 e 79º, n.º 2, da CRP. NESTES TERMOS, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, ser REVOGADA a decisão consagrada no despacho recorrido, determinando-se a sua substituição por outra que reconheça à Recorrente o benefício da isenção de custas no âmbito da presente ação.” 2.1. Não constam dos autos contra-alegações. 2.2. O recurso foi admitido em 1.ª instância, como apelação, com subida imediata, em separado, e efeito meramente devolutivo. 2.3. Aquando do saneamento dos autos, foi fixado o valor da ação em 47.537,72€. 3. Nesta Relação, aberta vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto, foi emitido parecer no sentido da procedência do recurso, parecer este em relação ao qual as partes se não pronunciaram. Respeitadas as formalidades legais, cumpre decidir: II – Questões a resolver Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso – artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável “ex vi” do artigo 87º/1 do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, a única questão a decidir passa por saber se o Tribunal a quo errou na aplicação da lei, ao considerar que a Ré não está abrangida pela isenção de custas consagrada na alínea f) do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais. *** III – FundamentaçãoA) Fundamentação de facto Os factos relevantes para a decisão do recurso resultam do relatório a que se procedeu anteriormente. *** B) DiscussãoComo resulta da decisão recorrida, nessa declarou-se que a Ré não está isenta de custas, sendo que, no recurso que interpôs, para ver afastado o decidido, apresenta a Apelante como argumentos, que fez constar das conclusões que apresentou, para além do mais, designadamente o seguinte: - Foi para dar cumprimento à finalidade de exploração e manutenção de hospitais vocacionados para a prestação de serviços de saúde à comunidade, tal como definida nos seus Estatutos, que ela Recorrente contratou o Autor, para prestar serviços médicos, sendo que, integrando também as suas atribuições, tal como previstas nos seus Estatutos, a adoção de todas as medidas necessárias a assegurar a sustentabilidade e a manutenção do seu património de rendimento, aí se integra a presente ação, através da qual o Autor exige pagamento de quantias que sabe não lhe serem devidas. - A alínea f) do n.º 1 do artigo 4.º do RCP deve ser interpretada de modo a considerar não apenas as atribuições e fins que caibam diretamente (exclusiva e especialmente) no âmbito dos seus estatutos ou para defesa dos seus interesses, mas também as ações necessárias que, além delas, assegurem o cumprimento das referidas atribuições ou a defesa dos seus interesses, ou seja, aí se integram todas as ações que versem sobre relações jurídicas que estão na base da concretização da realização dos fins estatutários ou a concretização dos seus interesses por via meramente instrumental, isto é, reflexa ou indireta; - A matéria em discussão nos autos tem por objeto o contrato de trabalho e as obrigações daí decorrentes, celebrado entre a Recorrente e o Autor - Médico, como meio necessário à prossecução do fim expressamente previsto na al. e) do n.º 2 do art. 4º dos Estatutos, sendo que, ao mesmo tempo, com a ação instaurada, o Autor, com base na relação contratual laboral criada para prosseguir uma das especiais finalidades da Recorrente, visa ofender e diminuir o seu património, exigindo-lhe o pagamento de quantias que sabe não lhe serem devidas, cabendo à Recorrente adotar todas as medidas para que tal não aconteça, tal como lhe impõe o disposto na al. i) do nº 2 do art. 4º e o art. 6º dos seus Estatutos – por tudo isto, intervém na presente ação em defesa dos seus interesses e no âmbito dos fins que prossegue, atendendo a que se discute uma relação contratual que resultou da necessidade de execução de uma das suas principais atribuições e que pode afetar e lesar os seus interesses patrimoniais. - O despacho recorrido interpretou erradamente o disposto na al. f) do n.º 1 do art. 4º do RCP, violando ainda, com tal interpretação, “o previsto na al. e) e i) do nº 2 do art. 4º e o art. 6º dos seus Estatutos da Recorrente, o art. 9º, n.º 1 e o art. 160º do CC, bem como os artigos os artigos 63º, n.ºs 1 e 5, 65º, n.ºs 1 e 2, al. d), 67º, n.ºs 1 e 2, als. b) e h), 69º, n.º 1, 70º, 71º, n.ºs 2 e 3, 72º, n.ºs 1 e 2, 75º, n.º 2, 78º, n.º 2 e 79º, n.º 2, da CRP”. Conclui que deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, determinando-se a sua substituição por outra que lhe reconheça o benefício da isenção de custas no âmbito da presente ação. Não constando dos autos contra-alegações, o Exmo. Procurador Geral-Adjunto, no parecer emitido, pronuncia-se pela procedência do recurso. Apreciando, diremos o seguinte: Sobre a previsão da norma que está subjacente à questão que nos é colocada, escreveu-se no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de maio de 2023(1) o seguinte: «(…) O Supremo Tribunal de Justiça tem considerando que “Esta isenção é motivada pela ideia de estímulo ao exercício de funções públicas particulares que, sem espírito de lucro, realizam tarefas em prol do bem comum, o que à comunidade aproveita e ao Estado incumbe facilitar, pelo que lhe subjaz o desiderato de tutela do interesse público (…). Dada a sua estrutura e fins, essas associações e fundações beneficiam da isenção de custas a que se reporta este normativo nas acções relativas à defesa e promoção dos seus interesses específicos, naturalmente sob a envolvência do interesse público. É uma isenção de custas restrita, na medida em que só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo respectivo estatuto, ou pela própria lei, que coincidam com o bem comum” [1]”(2). Por sua vez, resulta do Acórdão desta Relação de 23 de janeiro de 2020(3), o que seguidamente transcrevemos: «(…) Tem-se entendido que as atribuições das pessoas coletivas são os fins, finalidades ou objetivos por elas prosseguidos, sendo as “especiais atribuições” os fins, finalidades, ou seja, os objetivos para a realização dos quais cada uma delas foi criada e que justificam a respetiva conceção e lhe confere identidade e individualidade, permitindo distingui-la das demais pessoas coletivas. Parece, assim, que a isenção apenas abrangeria as ações em que a pessoa coletiva seja demandante ou demandada e cujo objeto contenda, única e diretamente, com o núcleo mais central que justificou a sua criação, atento o princípio da especialidade que conforma e limita a respetiva capacidade jurídica (art.º 160º do Código Civil) ou, nos termos da parte final do citado art.º 4º, ações que tenham por fim (direto) a defesa dos interesses que lhes estão especialmente confiados por lei ou pelos respetivos Estatutos. Ao discutirem judicialmente os contratos que celebram com terceiros, a isenção não abrangeria aqueles em que as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos atuam fora do âmbito das suas “especiais atribuições” posto que ao celebrarem esses contratos não agem no âmbito dos fins primários ou principais para que foram criadas e que prosseguem, sequer visam defender os interesses diretos que especialmente lhes estão cometidos por lei ou pelos respetivos estatutos, antes seguem, por via indireta, a prossecução de tais interesses, com o fito de obter meios económicos que lhes permitam satisfazer os seus fins primários. Não nos parece que assim deva ser. O intérprete não pode descurar os elementos histórico e teleológico da interpretação (art.º 9º do Código Civil) e afastar, sem mais, o fundamento da isenção, a “ideia de estímulo ao exercício de funções públicas por particulares que, sem espírito de lucro, realizam tarefas em prol do bem comum, o que à comunidade aproveita e ao Estado incumbe facilitar, na defesa do interesse público”[8]. Não pode, simplesmente, postergar-se da isenção de custas todas as ações que não tenham direta ou imediatamente a ver com os fins primários ou especiais consignados no Estatuto da instituição, designadamente quando as mesmas são instrumentais da prossecução daqueles fins ou interesses primários da instituição. Como se refere no citado acórdão da Relação de Guimarães, dando exemplos: “(…) semelhante interpretação restritiva deixaria de fora dessa isenção a eventual ação de despejo que fosse intentada contra a referida IPSS, tendo por objeto o concreto local arrendado pela mesma, para aí serem confecionadas as refeições a fornecer gratuitamente aos elementos desfavorecidos e em perigo da sociedade, assim como não seriam abrangidas pela isenção as ações de despejo instaurada contra uma IPSS a quem, nos termos dos respetivos estatutos, competisse apoiar as famílias, mediante a criação de creches e estabelecimentos de ensino, não obstante essa concreta ação de despejo que lhe foi movida ter por objeto o concreto local onde a referida IPSS instalou a creche e/ou o estabelecimento de ensino que criou com vista à prossecução desse seu fim estatutário, pelo que o absurdo seria manifesto”. Por isso se vem entendendo que “aquela isenção deverá abranger igualmente as ações em que o respetivo objeto contenda com a satisfação dos fins especiais que, em função dos respetivos estatutos, incumbe à pessoa coletiva privada, sem fins lucrativos, demandada ou demandante, prosseguir ou em que estas prosseguem a defesa dos interesses especiais que lhe são conferidos por lei ou por esses estatutos, mas em que esses fins ou interesses são prosseguidos por via meramente instrumental, isto é reflexa ou indireta”. Vimos já que Salvador da Costa aponta neste sentido quando escreve: “(…) Nesta perspectiva, pode parecer que esta isenção não abrange as acções que tenham por objecto obrigações ou litígios derivados de contratos que essas pessoas celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições. Todavia, se o objecto de tais acções for instrumental em relação aos fins estatutários dessas entidades, propendemos a considerar serem abrangidas pela isenção de custas em análise. (…). Importante é encontrar os limites da instrumentalidade. Nem todas as ações podem ser consideradas instrumentais para efeitos de isenção de custas das IPSS, sob pena de frustrarmos a intenção do legislador da reforma do regime de custas de 2008 quando, sob o art.º 4º, al. f), do Regulamento das Custas Processuais, restringiu a isenção que o anterior Código das Custas Judiciais previa então para as Instituições Particulares de Solidariedade Social (art.º 2º, nº 1, al. c)). Facilmente se enquadraria nos pressupostos necessários à atuação da isenção, todo o tipo de ações por elas instauradas ou em que fossem demandadas, inutilizando o caráter limitado da isenção prescrita pelo enunciado art. 4º, n.º 1, al. f), do Regulamento das Custas Processuais, e acabaria por se adotar o sistema de isenção subjetiva tout court que no precedente Código das Custas Judiciais o legislador estabelecia a favor das IPSS, agora em violação da lei. Cientes que as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos nem sempre prosseguem, indireta e instrumentalmente, as atribuições e interesses que diretamente lhes cabe, somos do entendimento de que, com vista a operar ou não a referida isenção, importará, caso a caso, verificar se o assunto em discussão na ação tem por objeto relações jurídicas estabelecidas pela pessoa coletiva com terceiros com vista à prossecução das atribuições (isto é, fins) especiais que lhe estão cometidos pelos respetivos estatutos, por serem uma “decorrência natural” do seu atuar na concretização desses fins e/ou interesses, quer por traduzirem a concretização desses fins e/ou interesses, quer por serem necessárias à concretização dos mesmos.[9] Estariam, por isso, abrangidas pela isenção, por exemplo, aa ações que tenham por objeto contratos tendo em vista a aquisição de bens ou serviços necessários ao funcionamento da creche e/ou estabelecimentos de ensino da IPSS, sem os quais estas não possam funcionar ou não possam funcionar adequadamente. Foi assim que no referido acórdão da Relação de Guimarães de 2018 se considerou abrangida pela isenção de custas de uma IPSS uma ação fundada no incumprimento de um contrato de locação financeira que a instituição celebrou com terceiro no alegado incumprimento desse contrato por parte desta, incumprimento esse que terá conferido à IPSS o direito potestativo a resolver esse contrato. (…) Já não se enquadram na isenção as ações que tenham por objeto impugnar as coimas ambientais que foram aplicadas a uma pessoa coletiva sem fins lucrativos, se os interesses subjacentes à proteção dessas contraordenações não constam diretamente dos seus estatutos ou da lei.[10] E também se decidiu já que não estão abrangidas pela isenção, ações que tenham por objeto contratos de arrendamento de espaços ou a aquisição de bens com vista à realização de uma festa com o objetivo de angariar fundos por uma IPSS, ainda que esses fundos se destinem a ser utilizados na atividade estatutária que a IPSS prossegue, atento o caráter instrumental com que é realizada essa festa e com que, consequentemente, foram celebrados esses contratos em discussão na ação em face dos fins estatutários e dos interesses prosseguidos pela pessoa coletiva em causa.[11] Releva essencialmente um critério casuístico que permita concluir que, apesar de um determinado contrato não visar satisfazer diretamente os interesses estatutários prosseguidos pela apelante, as obrigações decorrentes desse contrato e que são trazidas à discussão no processo, são necessárias à concretização desses interesses e, por conseguinte, se encontram preenchidos os pressupostos legais enunciados no art.º 4º, n.º 1, al. f), do Regulamento das Custas Processuais, que conferem à apelante a isenção de custas aí prevista. (…)» Concordamos com o entendimento que se extrai do Acórdão citado, incluindo no sentido de que deve relevar essencialmente um critério casuístico que permita concluir que, apesar de um determinado contrato não visar satisfazer diretamente os interesses estatutários prosseguidos pela parte que na ação invoca a isenção que se analisa, as obrigações que decorram desse contrato e que são trazidas à discussão no processo sejam necessárias à concretização desses interesses, em termos de se encontrarem preenchidos, por conseguinte, os pressupostos legais que se encontram enunciados no artigo 4.º, n.º 1, alínea f), do Regulamento das Custas Processuais, que conferem a isenção de custas aí prevista. Sendo assim, importando então apurar se tais pressupostos se verificam no caso que analisamos, a nossa resposta é negativa, pois que, admitindo-se que outro possa ser o entendimento, assim o indicado pela Recorrente e ainda pelo Ministério Público no parecer que emitiu – em que se incluem as referências Jurisprudenciais que se invocam –, com a natural salvaguarda do respeito devido por tais posições, entendemos, porém, que a solução mais ajustada é a que foi seguida no Acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, assim de 3 de outubro de 2022(4), em que, incidindo sobre situação que entendemos envolver contornos similares com a presente ação, se fez constar o seguinte (transcrição): «(…) Como fundamentação bastante transcrevemos o texto do acórdão da Relação de Lisboa de 22.03.2017 (Relatora Desembargadora Celina Nóbrega, in www.dgsi.pt): ‘Estabelece o artigo 4º nº 1 al.f) do RCP que estão isentos de custas “As pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos, quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável”. Sobre esta alínea, escreve Salvador da Costa, in “Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado”, pags.143 e 146 “Prevê a alínea f) do nº 1 as pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou em defesa dos interesses que lhe estejam especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou nos termos da legislação que lhes seja aplicável e estatui que gozam de isenção de custas. (…) A isenção em apreço é motivada pela ideia de estímulo ao exercício de funções públicas por particulares que, sem espírito de lucro, realizam tarefas em prol do bem comum, o que à comunidade aproveita e ao Estado incumbe facilitar. Trata-se, porém, de uma isenção subjetiva de custas que aproveita às referidas pessoas coletivas, condicionada às circunstâncias de não terem fins lucrativos e de atuarem no âmbito das suas especiais competências ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos. (…) Mas trata-se de uma isenção de custas condicional, na medida em que só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto ou pela própria lei. Nesta perspetiva, pode parecer que esta isenção não abrange as ações que tenham por objeto obrigações ou litígios derivados de contratos que essas pessoas celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições. Todavia, se o objeto de tais ações for instrumental em relação aos fins estatutários dessas entidades, propendemos a considerar serem abrangidas pela isenção de custas. Esta isenção está, porém, limitada pelo que se prescreve nos nºs 5 e 6 deste artigo” Atenta a sua pertinência para a questão, chamamos à colação o que se escreve no sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10.09.2013, in www.dgsi.pt: “As especiais atribuições das pessoas coletivas são os fins ou as finalidades para a realização das quais foi formada a pessoa coletiva e que lhe conferem identidade e que as distinguem de outras pessoas no mundo das pessoas coletivas”. (…) E de acordo com o mesmo aresto, cujo entendimento perfilhamos, “O artigo 4º do RCP estabelece o elenco e o regime de isenções de custas processuais. O n.º 1 prevê as isenções subjetivas. Note-se que não se trata de isenções subjetivas puras, visto que não são estabelecidas exclusivamente em função das entidades que são partes nos processos. O n.º 1 isenta certas entidades do pagamento das custas, mas condiciona a isenção à natureza das questões, dos direitos e dos interesses ou da relação material que é objeto do processo. O n.º 2 prevê, por seu turno, as isenções objetivas, ou seja, os processos que não estão sujeitos a custas. Constitui um desvio à regra geral enunciada no artigo 1º, n.º 1 do RCP, segundo a qual “todos os processos estão sujeitos a custas…”. Considerando a dicotomia acabada de fazer, a alínea f) do n.º 1 do artigo 4º estabelece uma isenção subjetiva de custas. Isenção que é estabelecida a favor das “pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos”. (…) Sucede que, nos termos da citada alínea, as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos estão isentas de custas “quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelos respetivos estatutos ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável”. Vê-se da norma acabada de transcrever que o benefício da isenção é reconhecido às pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos desde que: 1.-Actuem, no processo, exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições; ou 2.-Actuem, no processo, “para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelos respetivos estatutos ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável”. Qualquer atuação no processo fora destas condições não beneficia da isenção de custas. O que está em causa no presente recurso é saber se a ré atua no presente processo “exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições. (…) Como é sabido, a toda a constituição de pessoas coletivas preside um fim [artigos 167º, n.º 1 e 186º, n.º 1, ambos do Código Civil]. Como escreve António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo III, Pessoas, 2ª Edição, 2007, Almedina, página 628, o fim tende a “ser considerado o seu fator fundamental”, pois é o fim da pessoa coletiva que vai determinar: “a sua idoneidade e, sendo o caso, o seu reconhecimento”; “a sua capacidade, em função do princípio da especialidade”; “o eventual reconhecimento da utilidade pública”; “o tipo de atuação requerido aos titulares dos seus órgãos”; as coordenadas de interpretação dos estatutos”. Ora, as atribuições de uma pessoa coletiva são precisamente os fins ou as finalidades por ela prosseguidas. As especiais atribuições são os fins ou as finalidades para a realização das quais foi formada a pessoa coletiva e que lhe conferem identidade e que as distinguem de outras pessoas no mundo das pessoas coletivas. É com este sentido, por exemplo, que o artigo 51º, n.º 1, alínea a), e n.º 2 da Lei n.º 24/2012, de 9 de Julho, que aprovou a Lei-Quadro das Fundações, fala das “atribuições” das fundações públicas. Logo, as atribuições da ré são as finalidades que ela prossegue; as especiais atribuições são as finalidades que levaram à sua formação; são os objetivos que lhe conferem identidade e que concorrem para a distinguir de outras pessoas coletivas. (…) Uma das linhas de orientação da reforma das custas processuais efetuada pelo RPC aprovado pelo Decreto-lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro consistiu na “reavaliação do sistema de isenção de custas”. Com o novo regime procurou-se, para utilizarmos as palavras do preâmbulo do diploma atrás citado, “proceder-se a uma drástica redução das isenções, identificando-se os vários casos de normas dispersas que atribuem o benefício da isenção de custas para, mediante uma rigorosa avaliação da necessidade de manutenção do mesmo, passar a regular-se de modo unificado todos os casos de isenções”. Ora, em relação às instituições particulares de segurança social, basta compararmos o regime anterior ao RCP com o regime saído deste Regulamento para se concluir que houve uma redução do âmbito da isenção de custas. Com efeito, no domínio do Código das Custas Judiciais anterior ao RCP [Código das Custas Judiciais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro de 2003], estava prevista expressamente a isenção de custas para as instituições particulares de solidariedade social [artigo 2º, n.º 1, alínea c)]. E estava prevista sem quaisquer condições. E assim, qualquer que fosse a questão que estivesse em discussão no processo, as instituições particulares de segurança social estavam isentas de custas. Na passagem do CCJ para o RCP, a lei, além de integrar a isenção de custas em benefício das IPSS nas isenções previstas para pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos, deixou de definir a isenção de custas destas pessoas em função de um critério exclusivamente subjetivo. A isenção das custas passou a estar dependente da relação do objeto do litígio com as “especiais atribuições” da pessoa coletiva ou com “a defesa dos interesses que lhe são especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável”. Foi por objeto do litígio não respeitar às “especiais atribuições” da pessoa coletiva que: 1.-O acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21 de Janeiro de 2013, publicado no sítio www.dgsi.pt, proferido no processo n.º 1140/11.6TTMTS decidiu que a isenção de custas prevista na alínea f), do n.º 1 do artigo 4º do Regulamento das Custas processuais não abrangia as ações declarativas emergentes de contrato de trabalho interpostas contra uma IPSS com vista ao reconhecimento de créditos decorrentes da relação laboral que existiu entre ela e uma trabalhadora (A.) 2.-O acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13-12-2011, proferido no processo n.º 68/08.1TTCBR, publicado no mesmo sítio, decidiu que a isenção prevista na alínea f), do n.º 1 do artigo 4º do RCP estava condicionada à atuação no âmbito das especiais atribuições da pessoa coletiva em causa ou da defesa dos seus interesses estatutários, pelo que a isenção “só funcionava em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto ou pela lei” (ídem) e que não cabiam, assim, na previsão normativa “as ações que tenham por objeto obrigações ou litígios derivados de contratos que essas pessoas celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições”. 3.-O acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28-12-2012 proferido no processo n.º 3892/11.4TBPTM publicado no mesmo sítio decidiu que a isenção não se verificava quando, em concreto, a Instituição pretende impugnar as coimas que lhe foram aplicadas pela prática de contra-ordenações ambientais, se os interesses subjacentes à proteção dessas contra-ordenações não constam dos seus estatutos ou da lei. E foi por o objeto do litígio não estar relacionado com “a defesa dos interesses que lhe são especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável” que o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 14-03-2013, no processo n.º 01166/12, uniformizou a jurisprudência no sentido de que “de acordo com as disposições articuladas das alíneas f) e h) do artigo 4º do Regulamento das Custas Processuais e do artigo 310º/3 do Regime do Contrato de Trabalho na Função Pública, aprovado pela Lei nº 59/2008, de 11 de Setembro, os sindicatos, quando litigam em defesa coletiva dos direitos individuais dos seus associados, só estão isentos de custas se prestarem serviço jurídico gratuito ao trabalhador e se o rendimento ilíquido deste não for superior a 200 UC.”’ (…) (…) o objeto da presente ação versa sobre um litígio relativamente a um contrato que a Ré celebrou, como qualquer outra pessoa jurídica celebra, do que decorre que, no âmbito da presente ação, a Recorrente está a atuar como qualquer pessoa jurídica atuaria, caso tivesse celebrado um contrato de trabalho ou de outra natureza com a Autora e por ela fosse demandada, não resultando a sua atuação do âmbito exclusivo das suas atribuições, ou da defesa dos seus interesses fixados pelo estatuto ou pela lei. Assim, entendemos que, perante o objeto do presente processo e não obstante a natureza da Ré, resulta claro que a mesma não atua, nem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições que estão expressas no respetivo estatuto, nem está em juízo em defesa dos interesses que lhe estão por esse mesmo estatuto, ou por lei, especialmente conferidos, sendo certo, também, que o objeto desta ação não se traduz num meio instrumental em relação aos seus fins estatutários; discutem-se obrigações insuscetíveis de bulir com as finalidades que a Ré prossegue e com “os objetivos que lhe conferem e que concorrem para a distinguir de outras pessoas coletivas”.» Na consideração de que o antes se expôs, incluindo no Aresto imediatamente antes citado, a respeito da relação entre o que é objeto do litígio e a previsão da norma invocada, que aqui acompanhamos, em termos de responder já a todos os argumentos da Recorrente em contrário – lembrando-se que nesse, como afinal na ação em que se insere o recurso que agora apreciamos, o objeto da ação versava sobre um litígio relativamente a um contrato de trabalho que a aí ré celebrou, mas tal como uma qualquer outra pessoa jurídica o poderia celebrar –, aplicando os legais critérios ao caso, consideramos que, no âmbito da presente ação, está a Ré / aqui recorrente a atuar, afinal, em situação similar àquela em que qualquer pessoa jurídica atuaria, no caso de tivesse celebrado um contrato de trabalho ou de outra natureza com o Autor e por ele fosse demandada, não resultando, com tal enquadramento, a sua atuação do âmbito exclusivo das suas atribuições, ou da defesa dos seus interesses fixados pelo estatuto ou pela lei. Ou seja, perante o objeto do presente processo e não obstante a natureza da Ré, entendemos que a mesma não atua, nem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições que estão expressas no respetivo estatuto, nem está em juízo em defesa dos interesses que lhe estão por esse mesmo estatuto, ou por lei, especialmente conferidos, sendo certo, também, como no acórdão citado também se refere, que o objeto desta ação não se traduz num meio instrumental em relação aos seus fins estatutários: “discutem-se obrigações insuscetíveis de bulir com as finalidades que a Ré prossegue e com “os objetivos que lhe conferem e que concorrem para a distinguir de outras pessoas coletivas”. Como se refere na decisão recorrida, no que ao caso importa, não se pode dizer que as funções atribuídas ao trabalhador eram relativas ao serviço de interesse público que a Ré prossegue, para se concluir que, por isso, esta ação também o é. Por último, invocando a Recorrente, nas suas conclusões, mas que reproduz afinal tudo o que foi referido no corpo das alegações, que ao interpretar o disposto na al. f) do nº 1 do art. 4º do RCP no sentido de não ser aplicada a isenção de custas processuais, o despacho “violou (…) os artigos os artigos 63º, n.ºs 1 e 5, 65º, n.ºs 1 e 2, al. d), 67º, n.ºs 1 e 2, als. b) e h), 69º, n.º 1, 70º, 71º, n.ºs 2 e 3, 72º, n.ºs 1 e 2, 75º, n.º 2, 78º, n.º 2 e 79º, n.º 2, da CRP”, importa dizer, nada mais acrescentando ou esclarecendo a Recorrente, assim em termos de se perceberem quais os argumentos que justificariam tão singela invocação, que outras considerações da nossa parte não se justificam. Na verdade, não cuidou a Recorrente, no que à referida invocação diz respeito, de apresentar qualquer efetivo argumento jurídico tendente a demonstrar a razão por que a interpretação afirmada no despacho recorrido violaria os normativos constitucionais que refere, ou seja, no sentido de explicar a razão por que tais preceitos constitucionais imporiam decisão diversa, assim aquela que defende no presente recurso. Concluindo, sem necessidade de outras considerações, improcede o presente recurso. Por decaimento, a responsabilidade pelas custas impende sobre a Recorrente (artigo 527.º do CPC). * Sumário – a que alude o artigo 663º, nº 7, do CPC, da responsabilidade exclusiva do relator:……………………………… ……………………………… ……………………………… *** IV - DECISÃONos termos expostos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em declarar improcedente o recurso. Custas pela Recorrente. Porto, 27 de novembro de 2023 (assinado digitalmente) Nelson FernandesEugénia Pedro Rita Romeira ____________ (1) Revista n.º 1572/21.1T8CVL-C.S1, Relator Conselheiro Nuno Manuel Pinto Oliveira, disponível para consulta em www.dgsi.pt. (2) “Cf. designadamente o acórdão do STJ 28 de Maio de 2015 — processo n.º 6495/12.2TBBRG.G1-A.S1 — citando Salvador da Costa.” (3) Relator Desembargador Filipe Caroço, também in www.dgsi.pt. (4) Processo nº 3501/21.3T8MAI-A.P1, ao que se sabe não publicado. |