Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1595/23.6T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE SEGURO DE ACIDENTES DE TRABALHO
DIREITO AO RECEBIMENTO DO PRÉMIO
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RP202404081595/23.6T8AVR.P1
Data do Acordão: 04/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A parte do prémio de montante variável relativa a acerto do valor e, quando seja o caso, a parte do prémio correspondente a alterações ao contrato são devidas nas datas indicadas nos respetivos avisos (cfr. artigo 53.º, nº 3 da LCS).
II - Nessa situação, concatenando a citada norma com o estatuído no artigo 121.º, nº 2 do mesmo diploma legal, o prazo de prescrição de dois anos do direito ao recebimento do prémio respetivo conta-se a partir da data do vencimento constante do referido aviso.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 1595/23.6T8AVR.P1-Apelação

Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro-Juízo Local Cível de Aveiro-J2
Relator: Des. Dr. Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Dr.ª Ana Olívia Loureiro
2º Adjunto Des. Jorge Martins Ribeiro
5ª Secção
Sumário:
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I-RELATÓRIO

A autora “A...–Companhia de Seguros, S.A.” instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum, contra “B..., Lda.”, peticionando a condenação desta no pagamento da quantia de 5.939.42 €.
Para tanto alega, em síntese, que no dia 01/01/2020 celebrou com a ré um contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho-conta de outrem, na modalidade de prémio variável, por via do qual assumiu a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho sofridos pelos trabalhadores da tomadora.
O contrato de seguro estava sujeito ao pagamento de um prémio anual pela ré, de carácter variável, em função da indicação mensal dos trabalhadores da mesma e dos respetivos salários.
O prémio provisório era calculado de acordo com os salários anuais previstos no início da anuidade, devendo a ré enviar à autora as folhas dos salários pagos aos seus trabalhadores.
Após, seria efetuado o acerto entre o prémio provisório e o definitivo, sendo este calculado com base nos ordenados efetivamente pagos pela ré, aos seus trabalhadores.
No início da anuidade, ocorrido em 01-01-2020, a ré declarou que o montante previsível das remunerações anuais dos seus trabalhadores ascenderia a 81.976,92 €, tendo sido liquidado o prémio anual provisório no valor de 7.932,12 €.
No entanto, entre 01/01/2020 e 31/12/2020, a ré declarou-lhe salários no valor total de 136.296,52 €, pelo que o prémio devido era de 13.371,14 €.
Nessa sequência, efetuou o acerto entre o prémio provisório e o definitivo, emitindo e enviando à ré o recibo do prémio de acerto, no montante de 5.939,42 €, que esta última não pagou.
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Citada, a ré invocou a prescrição do direito da autora, porquanto ainda que se comece a contar a data do vencimento do acerto do prémio a partir de 31/12/2020, há muito que se mostra ultrapassado o prazo de dois anos previsto no artigo 121.º do DL 72/2008, para a autora exigir o respetivo pagamento.
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A autora pronunciou-se no sentido da improcedência da referida exceção, sustentando que o prazo de prescrição aplicável é de dois anos a contar da data de vencimento do aviso/recibo, que, no caso, é o dia 21-01-2023.
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Porque o processo continha já todos os elementos necessários à apreciação da invocada prescrição, foi proferido despacho saneador que, julgando procedente a invocada exceção perentória, absolveu a Ré do pedido.
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Não se conformando com o assim decidido veio a Autora interpor o presente recurso rematando com as seguintes conclusões:
1. O presente recurso visa submeter à apreciação do Tribunal Superior a decisão proferida pela Mmª Juiz do Tribunal a quo relativamente à procedência da exceção perentória de prescrição.
2. A Recorrente discorda dos fundamentos aduzidos pela Mmª Juiz do Tribunal a quo e, por conseguinte, da decisão proferida, por entender ter existido uma interpretação errónea do disposto no artigo 121.º, n.º 1, do DL n.º 72/2008, de 16 de abril.
3. A Mmª Juiz do Tribunal a quo socorreu-se das regras constantes no artigo 306º do Código Civil para determinar a data a partir da qual se inicia o prazo de prescrição.
4. Contrariamente ao entendimento sufragado pela Mmª Juiz do Tribunal a quo, o Regime Jurídico do Contrato de Seguro fornece-nos resposta quanto ao momento inicial de contagem do prazo de prescrição aplicável ao caso em discussão nos autos.
5. Entre a Recorrente e a Recorrida foi celebrado um contrato de seguro do ramo Acidentes de Trabalho - Conta de Outrem, titulado pela apólice nº ..., na modalidade “prémio variável”, através do qual foi transferida para a Recorrente a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho sofridos pelos trabalhadores da Recorrida indicados nas folhas de férias a enviar mensalmente à Recorrente.
6. No início da anuidade de 2020, a Recorrida declarou à Recorrente que seria expectável pagar aos seus trabalhadores salários no montante de € 81.976,92, declarando, no fim da anuidade, salários no montante de € 136.296,52.
7. Da leitura do artigo 53º, nº 3 em conjugação com o disposto no artigo 121º, nº 1 do DL nº 72/2008, dúvidas não restam que o prazo de prescrição de dois anos inicia-se na data de vencimento aposta no recibo de vencimento.
8. Se não fosse intenção do legislador determinar que o prazo de prescrição se inicia exclusivamente a contar da data do vencimento do prémio, então nada justificaria que o legislador determinasse outra regra quanto aos demais direitos emergentes do contrato de seguro, conforme fê-lo no nº 2 do artigo 121º do DL nº 72/2008.
9. É por demais evidente que o legislador quis diferenciar o momento inicial da contagem da prescrição do direito do segurador ao prémio dos restantes direitos emergentes do contrato de seguro.
10. Não pode a Mmª Juiz ignorar a menção expressa do legislador ao determinar no nº 3 do artigo 53º do DL nº 72/2008 que a parte do prémio de montante variável relativa a acerto do valor é devida na data indicada no respetivo aviso, nem pode ignorar a redação do nº 1 do artigo 121º do citado diploma.
11. O entendimento sufragado pela Mmª Juiz do Tribunal a quo dá abertura para que o tomador do seguro enriqueça de forma ilícita à custa da seguradora, na medida em que esta suportou o risco da atividade do tomador do seguro, pelo valor total de € 136.296,52, sendo certo que este beneficiou de um capital seguro muito superior ao inicialmente fixado no Contrato de Seguro titulado pela apólice nº ..., sem que suportasse o pagamento de qualquer contrapartida em conformidade.
12. O pagamento adicional de € 54.319,60 aos trabalhadores, sem que o valor do prémio seja proporcional aos valores efetivamente pagos pela entidade empregadora para a anuidade de 2020 a título de prémio, representa um incremento exponencial do risco suportado pela Recorrente sem que exista qualquer contrapartida.
13. A Recorrente emitiu o recibo de acerto de prémio nº ... após ter logrado confirmar todas as verbas constantes nas folhas de férias remetidas mensalmente pela Recorrida, sendo certo que apenas fê-lo quando foi possível determinar quais os valores que efetivamente foram pagos adicionalmente aos trabalhadores da Requerida.
14. O cálculo das retribuições constantes nas folhas de férias e o correspondente prémio não é feito de forma automática, nem tampouco é a Recorrente legal ou contratualmente obrigada a calcular o prémio no dia seguinte ao envio das últimas folhas de férias correspondentes a dezembro de 2020.
15. Nos termos do disposto no artigo 53º, nº 3 e 121º, nº 1 do DL nº 72/2008, não é exigido às seguradoras a emissão do recibo de acerto de prémio no momento em que têm conhecimento das últimas folhas de férias.
16. Tendo o recibo nº ... sido emitido em 03.01.2023, com data de vencimento em 23.01.2023, conforme resulta do facto provado j), o direito da Autora poderia ser exercido até 23.01.2025, pelo que o seu direito não se encontrava prescrito no momento da entrada da presente ação.
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Devidamente notificada contra-alegou a Ré concluindo pelo não provimento do recurso.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 3, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir:
a)- saber se o crédito da Autora está, ou não, prescrito.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
É a seguinte a matéria de facto que o tribunal recorrido deu como provada:
a) No dia 01-01-2020, a autora celebrou com a ré um acordo denominado “Acidentes de Trabalho–Conta de Outrem–prémio variável”, titulado pela apólice n.º ..., por via do qual assumiu a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho sofridos pelos trabalhadores da ré, indicados nas folhas de férias a enviar mensalmente àquela.
b) O acordo referido em b) estava sujeito ao pagamento de uma quantia anual pela ré, de caracter variável.
c) A quantia anual provisória a pagar pela ré era calculada de acordo com os salários anuais previstos no início da anuidade, devendo a mesma enviar à autora mensalmente as folhas dos salários pagos aos seus trabalhadores.
d) A quantia anual definitiva a pagar pela ré era calculada com base nos ordenados efetivamente pagos pela mesma aos seus trabalhadores.
e) Das condições gerais do acordo referido em a) constam, entre outras, as seguintes cláusulas:
“Artigo 13.º - Vencimento dos prémios
(…)
3. A parte do prémio de montante variável relativa a acerto do valor (…) são devidas nas datas indicadas nos respetivos avisos.”
«Artigo 24.º - Obrigações do Tomador do seguro quanto à informação relativa ao risco
Para além do previsto no capítulo II, o Tomador do seguro obriga-se:
a) A enviar ao Segurador, até ao dia 15 de cada mês, cópia das declarações de remunerações do seu pessoal remetidas à segurança Social, relativas às retribuições pagas no mês anterior (…).”
f) No dia 01-01-2020, início da anuidade, a ré declarou que o montante previsível de renumerações anuais a pagar aos seus trabalhadores seria de 81.976,92 €.
g) Com base nesse valor, a autora fixou em 7.923,12 (sete mil novecentos e vinte e três euros e doze cêntimos) o valor da quantia anual provisória a pagar pela ré.
h) A ré enviou à autora as declarações das remunerações dos seus trabalhadores referentes ao período de 01-01-2020 a 31-12-2020, sendo o montante total das mesmas de 136.296,52 €.
i) A autora fixou o valor definitivo da quantia anual a pagar pela ré em 13.371,14 €.
j) A autora efetuou o acerto da quantia anual a pagar pela ré, referente ao ano de 2020, tendo emitido e enviado à mesma o aviso/recibo n.º ..., datado de 03-01-2023, com data limite de pagamento de 23/01/2023, no montante de 5.939,42 €, relativamente ao período de 01/01/2020 a 31/12/2020.
k) A presente ação foi instaurada no dia 02/05/2023, tendo a ré sido citada em 15/05/2023.
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III. O DIREITO
Como supra se referiu é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir:
a)- saber se o crédito da Autora está, ou não, prescrito.
Como se evidencia da decisão recorrida aí se propendeu para o entendimento de que, tendo-se a Ré obrigado a enviar à autora, até ao dia 15 de cada mês, cópia das declarações de remunerações dos seus trabalhadores, referentes ao mês anterior, o que fez tal significa que, a partir do dia 16/01/2021, a autora ficou habilitada a calcular o valor total das remunerações efetivamente pagas pela ré aos seus trabalhadores, no ano de 2020 e, como tal, a calcular o prémio definitivo devido pela mesma, efetuando o correspondente acerto, razão pela qual o direito da autora a exigir o recebimento do acerto do prémio do seguro a pagar pela ré, relativo ao ano de 2020, poderia, assim, ter sido exercido a partir de 16/01/2021, inclusive, durante dois anos o qual terminou em 19/04/2023, razão pela qual quando deu entrada a ação-02-05-2023-, já o referido prazo se havia exaurido.
É contra este entendimento que se insurge a apelante para quem o referido prazo prescricional apenas ocorria em 23/01/2025.
Que dizer?
Antes de mais, importa começar por dizer que o instituto da prescrição tem o seu fundamento, como decorre dos ensinamentos do Mestre Manuel A. Domingues de Andrade[1], “na negligência do titular do direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei. Negligência que faz presumir ter ele querido renunciar ao direito, ou pelo menos o torna (o titular) indigno de proteção jurídica (dormientibus non succurrit jus)”.
Já para António Menezes Cordeiro, são dois os fundamentos do instituto da prescrição:-fundamento atinente ao devedor, e de ordem geral. Quanto ao primeiro “a prescrição visa, essencialmente, relevá-lo de prova” e, quanto ao segundo ele “(…) relevaria de razões atinentes à paz jurídica e à segurança”.[2]
Definindo-a, diz o Mestre João de Castro Mentes[3], que “a prescrição é a atribuição a uma pessoa, em face da qual correu um decurso de tempo de inacção dum seu credor, ou de posse do bem, do direito de invocar a seu favor esse decurso para considerar extinta a dívida ou transformada a posse em propriedade”.
Isto dito, antes da Reforma da LCS-DL n.º 72/2008, de 16 de abril-era no âmbito da alínea g) do artigo 310.º do Código Civil, a par de outras prestações típicas, que se inseriam os prémios de seguros.
Hoje, a LCS veio estabelecer uma disposição especial relativa ao prazo de prescrição dos prémios de seguro, estabelecendo o prazo de dois anos para o efeito (121.º, n.º 1 da LCS), e definindo no nº 2 o prazo de prescrição de cinco anos, para os restantes direitos emergentes do contrato de seguro, contados da data em que o titular teve conhecimento do direito, sem prejuízo da prescrição ordinária a contar do facto que lhe deu causa.
Respigando o quadro factual supra descrito dele decorre o seguinte:
“- Ente autora e a ré foi celebrado um contrato de seguro, do ramo acidentes de trabalho por conta de outrem, por via do qual aquela assumiu a responsabilidade pelos acidentes de trabalho sofridos pelos trabalhadores desta–a) dos factos provados;
- O contrato foi celebrado sob a modalidade de prémio variável, sendo paga uma quantia provisória pela ré, no início da anuidade, com base nas remunerações que previsivelmente esta pagaria aos seus trabalhadores–b) e c) dos factos provados;
- O prémio definitivo seria determinado no fim da anuidade, com base nos salários efetivamente pagos pela ré aos seus trabalhadores, constantes das declarações de remunerações enviadas mensalmente à autora, até ao dia 15 do mês seguinte a que respeitasse–d) e e) dos factos provados;
- No dia 01-01-2020, início da anuidade, a ré declarou que o montante previsível de renumerações anuais a pagar aos seus trabalhadores seria de 81.976,92 €-f) dos factos provados;
- Com base nesse valor, a autora fixou em 7.923,12 o valor do prémio provisório a pagar pela ré–g) dos factos provados;
- A ré enviou à autora as declarações das remunerações dos seus trabalhadores referentes ao período de 01-01-2020 a 31-12-2020, sendo o montante total das mesmas de 136.296,52 €-h) dos factos provados.
- Nessa sequência, a autora fixou o valor definitivo da quantia anual a pagar pela ré em 13.371,14 € e efetuou o respetivo acerto, por referência ao valor provisório, tendo emitido e enviado à tomadora o aviso/recibo n.º ..., datado de 03-01-2023, com data limite de pagamento de 23-01-2023, no montante de 5.939,42 €, relativamente ao período de 01-01-2020 a 31-12-2020–i) e j) dos factos provados”.
A questão que agora se coloca é de saber se o direito da autora a exigir da ré o pagamento do acerto do prémio se encontra, ou não, prescrito.
Nos termos do disposto no artigo 121.º, n.º 1, do DL n.º 72/2008, de 16 de abril
1 - O direito do segurador ao prémio prescreve no prazo de dois anos a contar da data do seu vencimento.
O artigo 53.º, n.º 3, do mesmo diploma, estatui que:
(…)
3 - A parte do prémio de montante variável relativa a acerto do valor e, quando seja o caso, a parte do prémio correspondente a alterações ao contrato são devidas nas datas indicadas nos respetivos avisos.
A Portaria n.º 256/2011, de 05 de julho, que aprova a parte uniforme das condições gerais da apólice de seguro obrigatório de acidentes de trabalho para trabalhadores por conta de outrem, bem como as respetivas condições especiais uniformes, reproduz o teor desse normativo legal, no seu artigo 13.º, n.º 3.
Da leitura concatenada do artigo 53.º, nº 3 em conjugação com o disposto no artigo 121.º, nº 1 do DL nº 72/2008, dúvidas não restam que o prazo de prescrição de dois anos se inicia a partir da data indicada no aviso de pagamento, quando se trate de parte do prémio de montante variável relativa a acerto do valor, como era o caso.
Se assim não fosse, isto é, se não fosse intenção do legislador determinar que o prazo de prescrição se inicia exclusivamente a contar da data do vencimento do prémio (neste caso do aviso de pagamento), então nada justificaria que o legislador determinasse outra regra prescricional quanto aos demais direitos emergentes do contrato de seguro, como ressalta no nº 2 do mesmo inciso.
Com efeito, no nº 2 do artigo 121.º encontra-se expressamente fixado que o prazo de cinco anos, relativamente aos demais direitos, conta-se a partir da data em que o titular teve conhecimento, contrariamente ao disposto no nº 1 da citada norma, ou seja, é por demais evidente que o legislador quis diferenciar o momento inicial da contagem da prescrição do direito do segurador ao prémio dos restantes direitos emergentes do contrato de seguro. Se assim não fosse, a redação de ambos os normativos seria a mesma.
É verdade que, a tese defendida pela Mmª Juiz do Tribunal a quo, ao determinar que o momento inicial da prescrição ocorre no fim da anuidade, porquanto, nessa data é que a Recorrente se encontra em condições para analisar os salários efetivamente pagos, se aproxima do estabelecido no citado artigo 121.º, nº 1 do DL nº 72/2008.
Acontece que, a par disso, não se pode ignorar a menção expressa do legislador ao determinar no nº 3 do artigo 53.º do DL nº 72/2008 que a parte do prémio de montante variável relativa a acerto do valor é devida na data indicada no respetivo aviso, como também se não pode ignorar a redação do nº 1 do artigo 121º do citado diploma.
Como assim, o tribunal recorrido não tinha de recorrer às regras do CCivil (artigo 306.º) para determinar o momento inicial da contagem do prazo de prescrição, bastando-se com a leitura do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, acima exposto.
Ora, tendo o recibo (aviso) nº ... sido emitido em 03/01/2023, com data de vencimento em 23/01/2023, conforme resulta do facto provado j), o direito da Autora poderia ser exercido até 23/01/2025, pelo que o seu direito não se encontrava prescrito no momento da entrada da presente ação.
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Procedem, assim, as conclusões formuladas pela apelante e, com elas, o respetivo recurso.
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IV-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente, por provada e, consequentemente, revogando-se a decisão recorrida devem os autos ter a subsequente tramitação processual se outra causa a isso não obstar.
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Custas da apelação pela Ré apelada (artigo 527.º, nº 1 do CPCivil).
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Porto, 08/04/2024
Manuel Domingos Fernandes
Ana Olívia Loureiro
Jorge Martins Ribeiro
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[1] In Teoria Geral da Relação Jurídica, Facto Jurídico, em especial Negócio Jurídico, vol. II, Coimbra, 1983, págs. 445 e 446.
[2] In Tratado de Direito Civil, vol. V, 2011 (reimpressão), Almedina, Coimbra, Almedina, 159 e segs.
[3] In Direito Civil, III, 1979, Lições dadas ao ano de 1978-1979, pág. 794.