Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | ANA VIEIRA | ||
| Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA HABITAÇÃO RENOVAÇÃO OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RP2024052338/23.0T8BAO.P1 | ||
| Data do Acordão: | 05/23/2024 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - O contrato de arrendamento urbano tem natureza formal o que implica que a declaração nele constante não possa valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respetivo documento, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 238º, nº 1, do Código Civil). II - O artigo 1096.º, n.º 1, do Código Civil, na redação dada pela Lei n.º 13/2019, de 12-02, aplica-se aos contratos de arrendamento para habitação, sucessivamente renováveis, vigentes à data da sua entrada em vigor (13-02-2019), e fixa um prazo imperativo mínimo de três anos para renovação do contrato de arrendamento. III - A oposição à renovação é um poder potestativo, e unilateral, dependente apenas da manifestação de vontade do senhorio e sua comunicação, nos termos e condições legalmente definidos, ao inquilino, devendo a manifestação ser objectiva e certa quanto ao momento visado para a produção de efeitos. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo nº 38/23.0T8BAO.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, Baião - Juízo C. Genérica Relatora: Ana Vieira 1º Adjunto Juiz Desembargador Dr. Paulo Duarte Mesquita Teixeira 2º Adjunto Juiz Desembargador Dr.ª Francisca Micaela Fonseca da Mota Vieira * Sumário ……………………………… ……………………………… ……………………………… * Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I- RELATÓRIO
AA, residente na Av. ..., ..., 6.º Esquerdo, no Porto, intentou a presente Acção de Processo Comum contra BB, e esposa CC, residentes na ..., ..., ..., em ..., Baião, peticionando a declaração de cessação de denominado contrato de arrendamento, por oposição à renovação pelo senhorio e consequentemente a condenação dos Réus a restituir o locado livre e devoluto de pessoas e bens, bem como a condenação dos Réus no pagamento ao Autor de indemnização no valor de 250,00€ mensais, contados desde Janeiro de 2023 até à entrega do prédio, acrescido de juros de mora à taxa legal. Regularmente citados os Réus deduziram contestação por excepção e por impugnação. O Autor exerceu contraditório relativamente às excepções e impugnação do valor aduzidas. Foi dispensada a realização de audiência prévia e foi proferido saneador sentença nos seguintes termos (transcrevendo-se apenas a parte relevante objecto do recurso): «… I. Relatório AA, NIf: ..., residente na Av. ..., ..., 6.º Esquerdo, no Porto, intentou a presente Acção de Processo Comum contra BB, NIF: ... e esposa CC, residentes na ..., ..., ..., em ..., Baião, peticionando a declaração de cessação de denominado contrato de arrendamento, por oposição à renovação pelo senhorio e consequentemente a condenação dos Réus a restituir o locado livre e devoluto de pessoas e bens, bem como a condenação dos Réus no pagamento ao Autor de indemnização no valor de 250,00€ mensais, contados desde Janeiro de 2023 até à entrega do prédio, acrescido de juros de mora à taxa legal. Para tanto alegou que o ante-possuidor DD, em 17.11.2008, deu de arrendamento aos Réus e estes aceitaram o prédio urbano denominado ..., sito em ..., ..., ..., ... União de freguesias ... e ..., concelho de Baião, descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ...- ... inscrito na matriz urbana respectiva sob o artigo ..., que corresponde ao antigo ..., pelo prazo de cinco anos, com início em 01.12.2008 e termo em 31.12.2013, prorrogável por três anos, e que a renda foi fixada em 250,00€ mensais. Mais alegou que no dia 06 de Dezembro de 2021, através de cartas registadas com aviso de recepção, recebidas pelos Réus, opôs-se à renovação do denominado contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 31.12.2023, porém, os Réus mantêm-se no locado. * Regularmente citados os Réus deduziram contestação por excepção e por impugnação. Por excepção os Réus pugnaram pela ineptidão da Petição Inicial, designadamente por não apresentar qualquer suporte fáctico quanto ao pedido de condenação no pagamento de indemnização a favor do Autor, mais invocando que a comunicação deste não foi tempestiva, logo não produz efeitos. Finalmente, impugnam o valor atribuído à acção. * O Autor exerceu contraditório relativamente às excepções e impugnação do valor aduzidas. * Foi dispensada a Audiência prévia, a elaboração do despacho previsto no artigo 596.º do Código de Processo Civil, e proferido convite às partes querendo formularem alegações por escrito, sendo que apenas o Autor se manifestou. * ….Em face do decidido, atenta a causa de pedir e pedido formulado pelo Autor, atender-se-á ao valor da renda correspondente a dois anos e meio, fixando-se o valor da causa em 7.500,00€ (sete mil e quinhentos euros), nos termos do disposto nos artigos 296.º, n.º 1, 298.º, n.º 1, 299.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil. Notifique. * III. Saneamento O Tribunal é competente. O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem totalmente. * Da Ineptidão da Petição Inicial …. Donde, improcede a nulidade invocada pelos Réus. ….** As partes têm personalidade e capacidade judiciária, são legítimas, e encontram-se devidamente representadas. Não existem nulidades, excepções processuais ou questões prévias ou incidentais que cumpra conhecer. * IV. Objecto do litígio O litígio entre as partes circunscreve-se à questão de saber se deverá ser declarada a caducidade do acordo escrito, datado de 17.11.2008, celebrado entre DD e Réus, por via de comunicação de oposição à renovação, bem como se deverão os Réus ser condenados a proceder à desocupação do imóvel objecto do referido acordo, entregando-o livre de pessoa e bens, e se deverão os Réus ser condenados no pagamento ao Autor de indemnização no valor de 250,00€ mensais, contados desde Janeiro de 2023 até à entrega do prédio, acrescido de juros de mora à taxa legal. * V. Fundamentação de facto a) Factos provados 1) Mediante denominado “Contrato de Arrendamento para habitação em período limitado (5 anos)”, celebrado em 17 de Novembro de 2008, que se dá por integralmente reproduzido, DD declarou proporcionar aos Réus BB e esposa CC, o gozo do imóvel sito em ..., ..., ..., Baião, inscrito na matriz predial sob o n.º ..., mediante o pagamento de uma renda mensal no valor de 250,00€, a pagar no primeiro dia do mês a que disser respeito. 2) Da clausula primeira do denominado “Contrato de Arrendamento para habitação em período limitado (5 anos)”, celebrado em 17 de Novembro de 2008, resulta o seguinte “O prazo de duração do arrendamento é de cinco anos, com início em 1/12/08 e com termo em 31/12/013 sendo as suas legais prorrogações de três anos, salvo regime especial, caso não seja denunciado no seu termo”. 3) O Autor remeteu escrito datado de 06 de Dezembro de 2021, aos Réus, por este recebido, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais, e do qual resulta, no mais, o seguinte: “Na qualidade de senhorio do prédio urbano denominado ..., n.º ..., sito em ..., ... ... Baião, inscrito na matriz urbana respectiva sob o artigo ..., do qual V. Ex.ª é arrendatária, venho pelo presente meio, ao abrigo do disposto no artigo 1096.º, n.º 3 do C.C. e conforme previsto na Cláusula Primeira do Contrato de Arrendamento, opor-me à renovação automática do contrato de arrendamento habitacional com prazo certo entre nós celebrado em 17.11.2008, com início em 01.12 e pelo prazo de (cinco) anos, entretanto automaticamente renovado três vezes por sucessivos e iguais períodos de 3 (três) anos. Nestes termos, e respeitando a antecedência mínima exigida, o arrendamento cessará em 31/12/2022, data em que o imóvel me deverá ser entregue livre de pessoas e bens no estado de conservação e limpeza que se encontrava à data da celebração do contrato e em que V. Exa deverá fazer a entrega das respectivas chaves”. 4) Os Réus mantêm-se no locado. 5) A presente acção entrou em juízo em 26.01.2023. * b) Factos não provados Com relevância para a boa decisão da causa inexistem factos por provar. * Os demais factos alegados não compreendidos nem na matéria de facto provada, nem não provada, constituem matéria conclusiva, de direito, ou despicienda para a boa decisão da causa (como questão relativa a titularidade do imóvel, pois estamos perante uma acção de carácter obrigacional, sendo que a falta de titularidade de imóvel não implica, desde logo, que o contrato não seja válido entre as partes, sendo que ademais tal questão não foi suscitada nos autos). * c) Motivação Os factos dados como provados resultam admitidos por acordo, e mostram-se alcandorados no teor dos documentos 2 (caderneta predial urbana), 3 (denominado contrato de arrendamento), 4 e 5, que se tratam de missivas e respectivos comprovativos de envio e avisos de recepção. Os Réus não concordam com o sentido atribuído pelo Autor a determinados factos - o que será apreciado noutra sede. Escalpelizando não concordam com a interpretação que entendem que o Autor assume do contrato dos autos, sendo que não impugnam o documento 3 (denominado contrato de arrendamento). A propósito não impugnam outros documentos juntos, que suportam a restante alegação do Autor (que por sua vez se mostra admitida), designadamente não colocam em causa a qualidade em que o Autor enviou os documentos 4 e 5, juntos com a petição inicial, daí decorrendo que reconhecem a existência de transmissão da posição contratual do lado activo no contrato dos autos. O Documento 1 cuja proveniência e autoria se desconhece, não relevou para efeitos probatórios, sendo que os efeitos que se pretendem retirar dos mesmos, pelo Autor, é apenas passível de suceder se o mesmo fosse junto em forma de certidão e teria relevância em acção de carácter real, o que no caso não sucede. * VI. Fundamentação de direito Apurada que ficou a matéria de facto com relevância para a decisão, tendo as partes ficado já identificadas, importa agora proceder ao enquadramento jurídico da factualidade considerada assente. Impõe-se, pois, aferir se e com que fundamento tem o Autor direito às pretensões por si formuladas contra os Réus nesta acção. Locação é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição (artigo 1022.º do Código Civil). A locação diz-se arrendamento quando versa sobre coisa imóvel e aluguer quando incide sobre coisa móvel (artigo 1023.º do Código Civil). Da factualidade dada como provada depreende-se, de forma inequívoca, estarmos na presença de um contrato de arrendamento, pois o acordo em causa nos autos integra todos os elementos essenciais que o caracterizam: a obrigação de uma das partes proporcionar ou conceder à outra o gozo de uma coisa imóvel; o carácter temporário desse gozo; a obrigação de pagar uma retribuição, como contrapartida do gozo – artigos 1022.º e 1023.º, 1.ª parte, do Código Civil. * Não foi impugnada a qualidade em que o Autor dirigiu a comunicação que se deu como provada em 3), pelo que nesta sede nada cumpre apreciar, considerando-se que houve transmissão automática da posição de locador, nos termos do disposto no artigo 1057.º do Código Civil. * Nos termos do disposto no artigo 1069.º, n.º 1 do Código Civil “O contrato de arrendamento urbano deve ser celebrado por escrito”. O contrato dos autos, que se trata de negócio jurídico sujeito por lei a forma especial, mostra-se reduzido a escrito. Resulta da factualidade assente que o contrato em causa nos autos foi celebrado para produzir efeitos com início em 01.12.2008 e termo em 31.12.2013, renovável por períodos trianuais caso não fosse denunciado por alguma das partes ou seja, estamos perante um contrato com prazo certo- cf. artigos 1095.º e seguintes do Código Civil. Os Réus alegam que o contrato dos autos foi celebrado para produzir efeitos com início em 01.12.2008 e termo em 31.11.2013. Ora, nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso – cf. artigo 238.º do Código Civil. Perfilha-se o entendimento de que a exigência da forma escrita não impede a relevância de elementos informais fora de texto do documento, podendo estes ser provados mediante prova testemunhal. Contudo, no caso vertente, não estamos perante a interpretação de elementos informais. A fixação do início e termo do acordo é formal e relevante, pois daí decorrem efeitos vários, designadamente quanto à sua cessação e modalidade admitida de cessação. Portanto, incumbia aos Réus a prova de que o prazo de duração inicial do contrato dos autos era de 01.12.2008 a 31.11.2013 e não 01.12.2008 a 31.12.2013 – como se retira do elemento literal do contrato em causa, não sendo de admitir prova testemunhal – cf. artigo 393.º do Código Civil. Não resultou demonstrado, que existiu um lapso e designadamente que houve um aditamento a reconhecer e rectificar o dito lapso, pelo que a excepção invocada pelos Réus não pode proceder, pelo que se conclui que o termo do prazo inicial do contrato dos autos se verificou em 31.12.2013. Destarte, in casu, o contrato inicial (com início em 01.12.2008 e termo em 31.12.2013), renovou-se sucessivamente: de 01.01.2013 a 31.12.2016; 01.01.2017 a 31.12.2019, e; 01.01.2020 a 31.12.2022. Ocorre que em 09.12.2021, foi remetida aos Réus, para a morada que constitui o locado, missiva sob registo postal e com aviso de recepção, com o seguinte teor: “Na qualidade de senhorio do prédio urbano denominado ..., n.º ..., sito em ..., ... ... Baião, inscrito na matriz urbana respectiva sob o artigo ..., do qual V. Ex.ª é arrendatária, venho pelo presente meio, ao abrigo do disposto no artigo 1096.º, n.º 3 do C.C. e conforme previsto na Cláusula Primeira do Contrato de Arrendamento, opor-me à renovação automática do contrato de arrendamento habitacional comprazo certo entre nós celebrado em 17.11.2008, com início em 01.12 e pelo prazo de (cinco) anos, entretanto automaticamente renovado três vezes por sucessivos e iguais períodos de 3 (três) anos. Nestes termos, e respeitando a antecedência mínima exigida, o arrendamento cessará em 31/12/2022, data em que o imóvel me deverá ser entregue livre de pessoas e bens no estado de conservação e limpeza que se encontrava à data da celebração do contrato e em que V. Exa deverá fazer a entrega das respectivas chaves”. Preceitua o n.º 1 do artigo 1096.º do Código Civil que salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no artigo 1097.º do Código Civil. Nos termos do artigo 1097.º do Código Civil: “1 - O senhorio pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao arrendatário com a antecedência mínima seguinte: a) 240 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis anos; b) 120 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos; c) 60 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis meses e inferior a um ano; d) Um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, tratando se de prazo inferior a seis meses. 2 - A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao termo do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação. 3 - A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 4 - Excetua-se do número anterior a necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 1102.º e nos n.os 1, 5 e 9 do artigo 1103.º.” Ou seja, caso o senhorio não pretenda, num contrato com prazo certo, que opere a renovação automática do contrato, terá de comunicar tal oposição respeitando os prazos impostos no artigo 1097.º (cuja imperatividade resulta do disposto no artigo 1080.º do Código Civil). A antecedência da comunicação prevista no artigo em apreço reporta-se ao prazo que estiver em curso, ou seja, a título meramente exemplificativo, estando em causa um contrato de arrendamento celebrado pelo prazo de 6 ou 8 anos, renovável por períodos de um ano, a oposição à renovação pode fazer-se com antecedência de 240 dias para impedir a primeira renovação contratual, e com a antecedência de 120 dias para impedir as renovações subsequentes. A comunicação de não renovação do contrato faz-se os termos da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro (doravante NRAU). Estatui o artigo 9.º da NRAU: “1 - Salvo disposição da lei em contrário, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, atualização da renda e obras são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção. 2 - As cartas dirigidas ao arrendatário, na falta de indicação por escrito deste em contrário, devem ser remetidas para o local arrendado. 3 - As cartas dirigidas ao senhorio devem ser remetidas para o endereço constante do contrato de arrendamento ou da sua comunicação imediatamente anterior.” Vertendo ao caso concreto foi remetida em nome do Autor, aos Réus, para a morada que constitui o locado, missiva sob registo postal e com aviso de recepção, comunicando a oposição à renovação do contrato dos autos. Donde, resultando provado que o prazo da última renovação eram igual a três anos, conclui-se que a antecedência para impedir a renovação automática in casu é de 120 dias (alínea b), n.º 1 do artigo 1097.º do Código Civil). Portanto, uma vez que estava em curso o prazo já renovado com início em 01.01.2020 a 31.12.2022, para impedir nova renovação (com início em 01.01.2023), a comunicação relativa a oposição a renovação do contrato de arrendamento deveria ocorrer antes de 31.08.2022 (120 dias). Temos, desde logo que, está cumprida a antecedência exigida pelo artigo 1097.º, n.º 1, alínea b) do Código Civil, uma vez que a carta com a comunicação referida foi remetida em Setembro de 2021. Conclui-se que a comunicação dos autos, dirigida pelo Autor aos Réus reveste-se de plena eficácia e é oponível a estes. Por outro lado, a presente acção, que entrou em Juízo no dia 26.01.2023, consubstancia iniludivelmente oposição do Autor a que os Réus, se mantenham no locado – cf. artigo 1056.º do Código Civil - pelo que interrompido está o prazo a que se alude no citado normativo legal. Assim, terá de proceder o primeiro pedido formulado pelo Autor. * Peticiona também o Autor a desocupação e entrega do locado, livre e devoluto de pessoas e bens. Ora, mostrando-se o contrato dos autos caducado cessou a relação contratual estabelecida entre as partes. Determina o artigo 1081.º, n.º 1, do Código Civil que a cessação do contrato torna imediatamente exigível, salvo se outro for o momento fixado ou acordado pelas partes, a desocupação do local e a sua entrega. Assim, tem o locador direito à restituição do prédio livre e devoluto, desde a data em que operou a oposição à renovação do contrato dos autos. Pelo exposto, deve proceder o referido pedido do Autor, condenando-se os Réus a restituir-lhe, livre de pessoas e bens, o prédio em causa. * Preceitua o artigo 1045.º, n.º 1 do Código Civil que: “1. Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida”. Assim, não tendo os Réus demonstrado que têm procedido à entrega de valores a título de rendas ou outros, como lhes incumbia, tem o locador direito desde a data em que operou a oposição à renovação do contrato dos autos, a indemnização equivalente ao valor da renda estipulada, designadamente as que se venceram no decurso da presente acção, que se iniciou a 26.01.2023. Mais tem o Autor direito a valor equivalente ao das rendas correlativas ao período em que os Réus se mantenham na disponibilidade do referido prédio, após o trânsito em julgado da presente sentença e até efectivação do despejo. * Nos termos do artigo 804.º, números 1 e 2 do Código Civil, “a simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor, sendo que o devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efetuada no tempo devido”. Quanto ao momento da constituição em mora, nos termos do disposto no artigo 805.º n.º 1 do citado diploma legal, o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir. Há, porém, mora do devedor, independentemente da interpelação se a obrigação tiver um prazo certo (artigo 805.º, n.º 2, alínea a) do Código Civil), o que sucede no que tange à obrigação de pagamento das rendas, por motivo de estar convencionado uma determinada data para pagamento dessa retribuição. Os juros devidos são os legais, de acordo com o que estabelecem os artigos 559.º, n.º 1 e 806.º, n.º 2, do Código Civil, conjugados com a Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril. Tem, pois, o Autor direito aos juros moratórios vencidos e vincendos que pediu, assim devendo proceder esta sua pretensão e sendo os Réus condenados a pagar-lhe os ditos juros, à taxa anual de 4%, contados a data de vencimento de cada uma das prestações indemnizatórias equivalentes à renda. Procede, assim, também esta pretensão do Autor. * VII. Custas Dispõe o artigo 527.º do Código de Processo Civil o seguinte: “1 - A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito. 2 - Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for”. Com base neste entendimento, mostrando-se os Réus vencidos na acção, as custas serão suportadas pelos mesmos. *** VIII. Decisão Em face ao exposto, julga-se a acção totalmente procedente por provada e, em consequência: a) Declara-se a cessação do contrato de arrendamento que tinha por objecto o imóvel sito em ..., ..., ..., Baião, inscrito na matriz predial sob o n.º ..., por oposição à renovação; b) Condenam-se os Réus BB e esposa CC, a restituir ao Autor AA o imóvel descrito em a) livre de pessoas e bens; c) Condenam-se os Réus BB e esposa CC, no pagamento solidário ao Autor AA de indemnização equivalente a renda, no valor de 250,00€ (duzentos e cinquenta euros) mensais, contados desde Janeiro de 2023 até à entrega do prédio referido em a), acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde a data de vencimento de cada uma das prestações indemnizatórias, equivalentes a renda, até integral pagamento. * Custas pelos Réus - cf. artigo 527.º n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, sem prejuízo de benefício de apoio judiciário. Registe e notifique - artigo 153.º, n.º 4, e 253.º do Código de Processo Civil…»(sic). * Inconformados com a predita decisão, vieram os réus interpor o presente recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir de imediato, nos autos e com efeito suspensivo. Os réus com o requerimento de interposição do recurso apresentaram alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: «… Conclusões: 1-) O contrato de arrendamento em causa nos autos foi celebrado por cinco anos, com início em 1/12/2008. 2-) Ao ser celebrado por cinco anos, necessariamente temos de concluir que o seu termo foi em 30/11/2013. 3-) Aceitar-se que o contrato de arrendamento teve início em 01/12/2008 e termo em 31/12/2013, seria aceitar que o contrato não teria a duração de 5 anos, mas sim de 5 anos e 1 mês. 4-) O texto do contrato é claro, cinco anos. Logo, a tese dos Recorrentes tem correspondência no texto do contrato, mas não só, tem igualmente correspondência na prática jurídica. Ninguém celebra um contrato de arrendamento por cinco anos e um mês, mas é prática corrente a celebração de contratos de arrendamento por cinco anos. 5-) Do elemento literal do contrato, também se retira que o contrato é de cinco anos. A Cláusula Primeira é bem clara, “o prazo de duração do arrendamento é de cinco anos…”, assim como o próprio título do contrato, “Contrato de Arrendamento para Habitação em Período limitado (5 anos). 6-) Parece mais razoável o entendimento que o termo do contrato escrito à mão seja um lapso e não a vontade das partes, pois as partes contratantes escolheram expressamente um formulário de contrato de cinco anos. 7-) Entendem assim os Recorrentes, que o contrato de arrendamento em causa nos autos é de cinco anos, com início em 1/12/2008 e termo inicial em 30/12/2013. 8-) Considerando que a carta enviada pelo Recorrido aos Recorrentes a comunicar a intenção de não renovar o contrato, informa também os Recorrentes que considera o contrato cessado no dia 31/12/2022, necessariamente, termos de concluir que a comunicação do Recorrido, declara o contrato terminado para data distinta – daquela em que operaria a renovação automática do mesmo. 9-) Entendem os Recorrentes que a comunicação do Recorrido, embora efectuada no prazo a que alude o artigo 1097, nº1, alínea b-) do Código Civil, por ter declarado o contrato terminado para data distinta, posterior, daquela em que operaria a renovação automática da mesma, não impede a renovação do prazo do contrato de arrendamento. 10-) Deve o recurso ter provimento, sendo a douta sentença revogada e substituída por outra que considera que o contrato do arrendamento teve o seu início em 1/12/2008 e o seu termo inicial em30/11/2013 e que, consequentemente, em 1/12/2022, se renovou por mais um ano assim se fazendo a habitual Justiça….». * Os autores juntaram contra-alegações nas quais em resumo pugnam pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida. * Nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre decidir. *** II- DO MÉRITO DO RECURSO 1. Definição do objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1]. Porque assim, atendendo á estrutura das conclusões das alegações apresentadas pelos apelantes, resulta que a questão a analisar ´traduz-se em determinar se a oposição à renovação do contrato de arrendamento objecto destes autos é (in) válida. *** III- FUNDAMENTOS DE FACTO
Nesse contexto, cumpre referir que a sentença recorrida consignou a seguinte matéria de facto: «… 1) Mediante denominado “Contrato de Arrendamento para habitação em período limitado (5 anos)”, celebrado em 17 de Novembro de 2008, que se dá por integralmente reproduzido, DD declarou proporcionar aos Réus BB e esposa CC, o gozo do imóvel sito em ..., ..., ..., Baião, inscrito na matriz predial sob o n.º ..., mediante o pagamento de uma renda mensal no valor de 250,00€, a pagar no primeiro dia do mês a que disser respeito. 2) Da clausula primeira do denominado “Contrato de Arrendamento para habitação em período limitado (5 anos)”, celebrado em 17 de Novembro de 2008, resulta o seguinte “O prazo de duração do arrendamento é de cinco anos, com início em 1/12/08 e com termo em 31/12/013 sendo as suas legais prorrogações de três anos, salvo regime especial, caso não seja denunciado no seu termo”. 3) O Autor remeteu escrito datado de 06 de Dezembro de 2021, aos Réus, por este recebido, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais, e do qual resulta, no mais, o seguinte: “Na qualidade de senhorio do prédio urbano denominado ..., n.º ..., sito em ..., ... ... Baião, inscrito na matriz urbana respectiva sob o artigo ..., do qual V. Ex.ª é arrendatária, venho pelo presente meio, ao abrigo do disposto no artigo 1096.º, n.º 3 do C.C. e conforme previsto na Cláusula Primeira do Contrato de Arrendamento, opor-me à renovação automática do contrato de arrendamento habitacional com prazo certo entre nós celebrado em 17.11.2008, com início em 01.12 e pelo prazo de (cinco) anos, entretanto automaticamente renovado três vezes por sucessivos e iguais períodos de 3 (três) anos. Nestes termos, e respeitando a antecedência mínima exigida, o arrendamento cessará em 31/12/2022, data em que o imóvel me deverá ser entregue livre de pessoas e bens no estado de conservação e limpeza que se encontrava à data da celebração do contrato e em que V. Exa deverá fazer a entrega das respectivas chaves”. 4) Os Réus mantêm-se no locado. 5) A presente acção entrou em juízo em 26.01.2023…» * IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO
Nesta fase cumpre analisar o mérito da sentença, na vertente da fundamentação de direito, analisando em resumo se a sentença deveria ser alterada conforme pugnam o recorrentes. Invocam os recorrentes que o objecto do recurso traduz-se na questão da análise da renovação do contrato de arrendamento, sendo que o mesmo foi celebrado por cinco anos com início a 1/12/2008. Referem que o contrato ao ser celebrado por cinco anos, com início em 1/12/2008, que o seu termo foi em 30/11/2013. Impugnam o entendimento versado na sentença de que aceitar-se que o contrato de arrendamento teve início em 01/12/2008 e termo em 31/12/2013, porque tal seria aceitar que o contrato não teria a duração de 5 anos, mas sim de 5 anos e 1 mês. Consideram que o texto do contrato é de claro e indica que o prazo é de 5 anos e do seu elemento literal retira-se que o prazo é de 5 anos (de resto referem que na prática jurídica, ninguém celebra um contrato de arrendamento por cinco anos e um mês, mas sim é pratica corrente celebrarem contratos por 5 anos). Alegam que parece mais razoável o entendimento que o termo do contrato escrito à mão seja um lapso e não a vontade das partes, pois as partes contratantes escolheram expressamente um formulário de contrato de cinco anos. Assim, entendem os Recorrentes, que o contrato de arrendamento em causa nos autos é de cinco anos, com início em 1/12/2008 e termo inicial em 30/11/2013. E que a carta enviada pelo Recorrido aos Recorrentes a comunicar a intenção de não renovar o contrato, informa também os Recorrentes que considera o contrato cessado no dia 31/12/2022, necessariamente, teremos de concluir que a comunicação do Recorrido, declara o contrato terminado para data distinta – daquela em que operaria a renovação automática do mesmo. Alegam os apelantes que a comunicação do Recorrido, embora efectuada no prazo a que alude o artigo 1097, nº1, alínea b-) do Código Civil, por ter declarado o contrato terminado para data distinta, posterior, daquela em que operaria a renovação automática da mesma, não impede a renovação do prazo do contrato de arrendamento. Considerando os Recorrentes, convencidos que estavam que tinham celebrado um contrato de arrendamento por cinco anos e não por cinco anos e um mês, perante a comunicação que lhes foi enviada pelo Recorrido, concluíram forçosamente, que este dava o contrato por findo em 31/12/2022. Concluem assim que a comunicação dirigida aos Recorrentes, não pode produzir os efeitos pretendidos pelo Recorrido, porque o mesmo não comunicou aos Recorrentes a sua oposição à renovação do contrato em 1 de Dezembro de 2022, como estava obrigado, mas sim a comunicação de que o contrato cessaria em 31/12/2022 e que esta comunicação levou os Recorrentes a concluir que o contrato se tinha renovado em 1/12/2022, por mais um ano.
Verifica-se que os apelantes não deduziram impugnação quanto á matéria de facto, sendo que consta fixado que:«.. Da clausula primeira do denominado “Contrato de Arrendamento para habitação em período limitado (5 anos)”, celebrado em 17 de Novembro de 2008, resulta o seguinte “O prazo de duração do arrendamento é de cinco anos, com início em 1/12/08 e com termo em 31/12/013 sendo as suas legais prorrogações de três anos, salvo regime especial, caso não seja denunciado no seu termo”.». Verifica-se que o impresso do contrato de arrendamento tem escrito em «Contrato de Arrendamento para habitação em período limitado (5 anos)». E que na primeira clausula desse contrato está pré-impresso que «O prazo de duração do arrendamento é de cinco anos com início em… e com termo em…., sendo as suas legais prorrogações de três anos,…caso não seja denunciado no seu termo.». Mas que nessa clausula pré-inscrita a letra de «maquina» consta inscrito manualmente que o inicio do contrato é em 1-12-08 e o termo é em «31/12/013». No que concerne á interpretação negocial e tal como refere Henrich Ewald Hôrster, in A Parte Geral do Código Civil Português, pág. 507 e ss, tendo-se tornado eficaz ou tendo sido concluído o contrato podem existir dúvidas quanto ao seu conteúdo ou alcance. A interpretação parte de elementos objectivos para obter, através deles, como finalidade o elemento subjectivo na medida em que isso é possível. Quanto aos negócios formais determina o artigo 238 do CCivil que em princípio a declaração negocial não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento (sem prejuízo da excepção do artigo 238 nº2 do CCivil). Noutros termos a regra do artigo 236 do CCivil estabelece que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal colocado na posição do real destinatário possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se não poder contar com ele em termos razoáveis. A interpretação dos contratos é uma tarefa que, se por vezes parece simples, e até desnecessária, não pode todavia dispensar-se, porque muitas vezes, e como bem salienta, Galvão Telles (Manual Dos Contratos em Geral, pág.355 a 361), o conteúdo das declarações não é bem amadurecido nos espíritos dos pactuantes. De acordo ainda com os ensinamentos deste autor, a determinação da vontade negocial tem de ser feita segundo um critério objectivista da teoria da interpretação do destinatário - mais concretamente a teoria da impressão do destinatário -, que determina que a declaração deve interpretar-se como a interpretaria uma pessoa de qualidades médias, colocada na real situação em que se encontrava aquele a quem a declaração foi feita. Paralelamente, o intérprete não deve preocupar-se com o interesse das partes, mas sim com a sua intenção. Seguindo os ensinamentos de Menezes Cordeiro in Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, pág. 546 e ss, resulta que a doutrina actual encara a interpretação do negócio jurídico como algo de essencialmente objectivo, sendo que o seu ponto de incidência não é o seu ponto interior, mas sim sobre um comportamento significativo. Segundo este autor a primeira directriz legal apela para a denominada teoria da impressão do declaratário, a declaração vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante (artigo 236 do Ccivil), apelando-se a uma interpretação objectiva ou normativa mas capaz de ter em conta as particularidades concretas. A segunda directriz legal parece exceptuar do horizonte da impressão do destinatário, o que não lhe possa ser imputado, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele. A terceira directriz diz que sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante é de acordo com aquela que vale a declaração emitida (artigo 236 nº2 do CCIvil). Portanto resulta que o direito Português consagra uma teoria objectivista da interpretação, baseada na impressão do declaratário e mitigada em termos negativos, pela possibilidade de imputar a declaração a quem a tenha feito e pela tutela da confiança. Mas no caso do contrato de arrendamento estamos perante um contrato de natureza formal e nessa medida nos termos do artigo 238 do CCivil, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha o mínimo de correspondência no texto do respectivo contato ainda que imperfeitamente expresso. Neste caso resulta manifesto que as partes acordaram de forma expressa e objectiva que a data do termo era 31-12-2022 e não 30-11-2013, e nesta medida é essa a data a ter em conta (sendo irrelevante se a prática jurídica celebra ou não contratos com 5 anos e um mês ou outro prazo). E parafraseado Larenz (in Derecho Civil, Parte General, pág. 455), o ordenamento jurídico não tem motivo para impor às partes um significado da declaração diferente daquele que ambas lhe derem. Pelo exposto, resulta que o contrato inicial (com início em 01.12.2008 e termo em 31.12.2013), renovou-se sucessivamente: de 01.01.2013 a 31.12.2016; 01.01.2017 a 31.12.2019, e; 01.01.2020 a 31.12.2022. Em 06.12.2021 o autor remeteu aos Réus, uma carta com o seguinte teor: « “Na qualidade de senhorio do prédio urbano denominado ..., n.º ..., sito em ..., ... ... Baião, .. do qual V. Ex.ª é arrendatária, venho pelo presente meio, ao abrigo do disposto no artigo 1096.º, n.º 3 do C.C. e conforme previsto na Cláusula Primeira do Contrato de Arrendamento, opor-me à renovação automática do contrato de arrendamento habitacional com prazo certo entre nós celebrado em 17.11.2008, com início em 01.12 e pelo prazo de (cinco) anos, entretanto automaticamente renovado três vezes por sucessivos e iguais períodos de 3 (três) anos. Nestes termos, e respeitando a antecedência mínima exigida, o arrendamento cessará em 31/12/2022, data em que o imóvel me deverá ser entregue livre de pessoas e bens no estado de conservação e limpeza que se encontrava à data da celebração do contrato e em que V. Exa deverá fazer a entrega das respectivas chaves”. No presente processo está em causa um contrato de arrendamento habitacional de duração determinada, celebrado pelo prazo de cinco anos, tendo-se acordado na renovação automática pelo período de 3 anos. O regime legal da cessação deste contrato veio a ser objeto de alteração com a publicação da Lei 13/2019 de 12.02 que entrou em vigor a 13.02.2019. O preambulo da Lei n.º 13/2019, de 12-02, estabelece medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, a reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger arrendatários em situação de especial fragilidade. Porque se trata de norma que contende com o “conteúdo de relações jurídicas abstraindo dos factos que lhes deram origem” (artigo 12 nº2 do CCivil), as alterações legais relativamente ao prazo de oposição à renovação aplicam-se também aos contratos celebrados em data anterior à entrada em vigor da lei. Está assente que a lei aplicável à matéria da cessação contratual, é o regime constante da lei 13/2019 de 12.02. Estabelece o 1096 nº1 do CCivil na redacção da Lei 13/2019 de 12/2, que: «1 - Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no número seguinte». A análise deste normativo é controvertida na doutrina e na jurisprudência. Sobre a interpretação deste normativo estamos a seguir o entendimento de Maria Olinda Garcia (in “Alterações em matéria de Arrendamento Urbano introduzidas pela Lei n.º 12/2019 e pela Lei n.º 13/2019”, in revista Julgar online, março de 2019, pág. 11-12, disponível em http://julgar.pt/wp-content/uploads/2019/03/20190305-JULGAR-Altera%C3%A7%C3%B5es-em-mat%C3%A9ra-de-arrendamento-Leis-12_2019-e-13_2019-Maria-Olinda-Garcia.pdf), que considera que as partes poderão convencionar que o contrato não se renova no final do prazo inicial (o qual tem de ser de, pelo menos, um ano) e assim o contrato caducará, assim, verificado esse termo. E considera que o legislador, ao estabelecer o prazo de 3 anos para a renovação, caso o prazo de renovação seja inferior, estabeleceu imperativamente um prazo mínimo de renovação de 3 anos. Assim, considera que o contrato só não terá duração mínima de 3 anos se o arrendatário se opuser à renovação do contrato no final do primeiro ou do segundo ano de vigência. Se as partes não convencionarem a exclusão da renovação, o senhorio só poderá impedir que o contrato tenha uma duração inferior a 3 anos na hipótese do n.º 4 do artigo 1097.º, ou seja, em casos de necessidade da habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em primeiro grau. Neste sentido, e para outros desenvolvimentos vide a seguinte jurisprudência a titulo exemplificativo (disponível na DGSI): - Ac do STJ Processo: 3966/21.3T8GDM.P1.S1 , Relator: JORGE LEAL, Data do Acórdão: 20-09-2023 Sumário : Na sequência da alteração introduzida ao n.º 1 do art.º 1096.º do Código Civil pela Lei n.º 13/2019, de 12.02, os contratos de arrendamento habitacionais, com prazo certo, quando renováveis, estão sujeitos à renovação pelo prazo mínimo de três anos; - Ac da RP Processo: 944/22.9T8VCD.P1, Relator: ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA, Data do Acórdão: 15-06-2023, sumário: «..V - O n.º 1 do artigo 1096.º do Código Civil, na redacção da Lei n.º 13/2019, de 12 de Fevereiro, fixa um prazo imperativo mínimo de três anos de renovação do contrato, pelo que as partes de um contrato de arrendamento para habitação com prazo certo podem acordar a sua não renovação, mas se acordarem a renovação não podem estipular que esta ocorra por prazo inferior a três anos.»; - Ac da RP Processo: 328/23.1YLPRT.P1 Relator: PAULO DIAS DA SILVA, data 12-10-2023, Sumário: I - A oposição à renovação é um direito potestativo que depende apenas da vontade de quem emite a declaração, sem precisar de invocar qualquer justificação e só opera para futuro. Como única condicionante, impõe-se-lhe apenas que respeite o período de aviso consignado na lei ou no contrato. II - Dispondo a nova redacção do artigo 1096.º, do Código Civil, introduzida pela Lei 13/2019 de 12.2, sobre o conteúdo da relação jurídica do arrendamento, e abstraindo a mesma do facto que lhe deu origem, é de concluir que a situação se enquadra na 2.ª parte do artigo 12.º do Código Civil, sendo a nova redacção aplicável às relações já constituídas e que subsistam à data da sua entrada em vigor. III - A expressão “salvo estipulação em contrário”, contida no nº 1 do artigo 1096º do Código Civil, deve ser interpretada como reportando-se apenas à possibilidade de as partes afastarem a renovação automática do contrato, e já não a de poderem contratar períodos diferentes de renovação. Assim, não havendo oposição válida e eficaz, os contratos de arrendamento para habitação renovam-se por mínimos de 3 anos, ou por período superior, caso o período de duração do contrato seja superior a 3 anos. IV - Assim, o artigo 1096.º, n.º 1, do Código Civil, na nova redacção introduzida pela Lei 13/2019, de 12.2, fixa um prazo de renovação mínimo de três anos, de natureza imperativa não podendo as partes convencionar um prazo de renovação inferior.”
Portanto, consideramos que a alteração introduzida ao artigo 1096.º, n.º 1, do Código Civil, tem natureza imperativa e não supletiva. Assim, tendo as partes acordado na renovação do contrato de arrendamento, a renovação ocorre automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior. Portanto, nos termos do artigo 1096 nº1 do CCivil, as partes têm liberdade para fixar a não renovação do contrato, mas caso estabeleçam a sua renovação, imperativamente a mesma terá de ser por um período de 3 anos, caso seja inferior.
No caso dos autos verifica-se, no entanto que as partes estipularam que a renovação ocorreria por um período de 3 anos. Estando demonstrado que o prazo da última última renovação eram igual a três anos, conclui-se que a antecedência para impedir a renovação automática no caso é de 120 dias (alínea b), n.º 1 do artigo 1097.º do Código Civil). Assim, e tal como se refere na sentença recorrida, o autor cumpriu a antecedência prevista no artigo 1097 nº1, b) do CCivil, dado que enviou a carta a comunicar a oposição á renovação em Dezembro de 2021 ( estava em curso o prazo já renovado com início em 01.01.2020 a 31.12.2022, para impedir nova renovação (com início em 01.01.2023), a comunicação relativa a oposição a renovação do contrato de arrendamento deveria ocorrer antes de 31.08.2022 (120 dias). Acresce que a comunicação do recorrido, não declara o contrato terminado para data distinta daquela em que operaria a renovação automática do mesmo dado que as partes acordaram expressamente no contrato que o mesmo teria o seu termo a 31-12-2013 e na carta consta a data de 31-12-2022 que é a do termo dessa renovação. Pelo exposto, e quanto á fundamentação jurídica, conclui-se que o presente recurso de apelação terá, por conseguinte, de improceder na sua totalidade. *** V- DISPOSITIVO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida. Custas a cargo dos apelantes (art. 527º, nºs 1 e 2). |