Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
519/22.2T8OAZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: RESPONSABILIDADE POR ACIDENTE DE VIAÇÃO
PODERES DE COGNIÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
EQUIDADE
DANO BIOLÓGICO
Nº do Documento: RP20240909519/22.2T8OAZ.P1
Data do Acordão: 09/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO
Indicações Eventuais: 5. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O Tribunal da Relação tem poderes amplos de cognição em matéria de facto e de direito, ao contrário do que sucede com o Supremo Tribunal de Justiça que apenas conhece de questões de direito, não tendo por isso base legal, em segunda instância, a orientação restritiva na sindicação do juízo de equidade de que resulta a fixação da compensação por danos não patrimoniais, devendo antes a Relação proceder à fixação autónoma da compensação devida tendo em conta todos os fatores relevantes para o efeito.
II - A compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do nº 4, do artigo 496º do Código Civil), devendo atentar-se no disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil, em ordem a uma aplicação, tanto quanto possível, uniforme do direito, assim se respeitando e realizando o princípio da igualdade.
III - Considerando, além do mais, o longo tempo de doença do lesado (quatrocentos e noventa dias), o quantum doloris de grau quatro numa escala de sete graus crescente, o dano estético de grau quatro numa escala de sete graus crescente, a repercussão das lesões nas atividades desportivas e de lazer de grau dois numa escala de sete graus crescente, a multiplicidade de tratamentos a que foi sujeito a as dores a eles inerentes, é equitativa a compensação dos danos não patrimoniais sofridos pelo lesado com a quantia de dezoito mil euros.
IV - Relevando as indicações mais recentes que o Supremo Tribunal de Justiça vem dando sobre a matéria do dano biológico e a natural evolução que as indemnizações devem ter face à erosão do poder de compra resultante da inflação, tendo o lesado quarenta e nove anos na data da alta e estando afetado de um défice funcional permanente de quatro pontos, sendo essas sequelas compatíveis com o exercício da atividade habitual mas implicando maiores esforços, julga-se equitativa a indemnização de quinze mil euros.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 519/22.2T8OAZ.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 519/22.2T8OAZ.P1 elaborado pelo relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:

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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório[1]

Em 15 de fevereiro de 2022, com referência ao Juízo Local Cível de Oliveira de Azeméis, Comarca de Aveiro, AA veio propor contra A..., S.A. ação declarativa sob forma comum, pedindo que a ré seja condenada ao pagamento ao autor da quantia global líquida de € 28 855,82, acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal, até efetivo e integral pagamento, e, bem assim, da indemnização que vier a ser fixada em consequência de ampliação do pedido ou que vier a ser liquidada posteriormente, por força dos factos alegados nos artigos 130.º a 135.º da petição inicial e, bem assim, de todas as despesas que se vierem a revelar necessárias.

Para substanciar as suas pretensões alegou, em síntese, que no dia 3 de dezembro de 2020, cerca das 13,25 horas, na freguesia ..., concelho ..., mais concretamente no entroncamento da Rua ... com a Rua ..., ocorreu um acidente de viação, no qual foram intervenientes o veículo automóvel de matrícula ..-AD-.., propriedade e conduzido por BB e o motociclo de matrícula ..-..-GZ, propriedade e conduzido pelo autor; o acidente deu-se porque o condutor do veículo automóvel não o imobilizou junto ao sinal “STOP” existente junto ao entroncamento com a via em que circulava o autor e foi obstruir a via por onde circulava o veículo do autor e a uma distância não superior a dez metros deste; o proprietário do veículo ..-AD-.. tinha a sua responsabilidade civil emergente de acidente de viação, relativamente a danos causados a terceiros, transferida para a ré mediante contrato de seguro titulado pela apólice nº...55/1; o autor, no momento da ocorrência do acidente e nos instantes que se seguiram, sofreu um enorme susto e receou pela própria vida; o autor foi transportado de ambulância para o Hospital ..., em Santa Maria da Feira, pelo INEM em plano duro e com imobilização cervical; como consequência direta e necessária do supra descrito acidente de viação, o autor sofreu vários ferimentos e lesões traumáticas; teve dores nas nádegas, joelhos, mãos, tornozelo direito e 1º dedo do pé direito; o autor teve alta hospitalar nesse mesmo dia, com indicação de repouso total, realização de tratamentos de enfermagem aos locais lesionados e observação e acompanhamento da evolução clínica; após a alta hospitalar, permaneceu de cama durante cinco dias pois tinha muitas dores que lhe impediam a locomoção, tendo realizado os tratamentos de enfermagem no Centro de Saúde ...; o autor permaneceu de baixa médica concedida pela segurança social e realizou tratamentos de fisioterapia e reabilitação, os quais lhe causavam dores e cansaço; o autor teve fratura não consolidada do osso escafóide e permanece em situação de Incapacidade Temporária Absoluta, aguardando indicação clínica para reiniciar os tratamentos de fisioterapia; o autor nasceu no dia ../../1973, sendo saudável, ágil, forte e robusto, e não sofria de qualquer aleijão, deformidade, insuficiência, incapacidade ou limitação da sua capacidade laboral ou de utilização do seu corpo; os factos supra descritos causaram-lhe e causam-lhe um profundo desgosto; não pode o autor fruir e gozar a vida como fazia até então, encontrando-se irremediavelmente atingida a sua saúde, capacidade de ter prazer, tranquilidade e bem-estar; antes do acidente o autor era uma pessoa alegre, bem disposta, sem quaisquer preconceitos; atualmente é uma pessoa abalada psicologicamente, impaciente, facilmente irritável e irascível, com o sistema nervoso alterado e revoltado com a situação que lhe foi criada pelo acidente; o autor sofreu dores muito intensas, em todas as regiões do seu corpo atingidas, dores que ainda hoje o afetam, dores que são intensas sempre que o autor tenta mobilizar a mão direita e o joelho esquerdo e sempre que movimenta ou faz força ou esforço e, invariavelmente, nas mudanças de tempo; o autor sofreu e sofrerá os efeitos perniciosos dos R.X., TACs e ressonâncias magnéticas a que foi sujeito, sofreu e sofrerá os malefícios inerentes aos medicamentos, que se viu na necessidade de ingerir, nomeadamente os analgésicos, os anti-inflamatórios e os antibióticos, sentindo tonturas, mal-estar, dores e ausência completa de forças para se movimentar, necessitando do acompanhamento de terceira pessoa durante 15 dias após o acidente; à data do acidente, o autor exercia funções de ... de 1.ª, na Sociedade B..., Lda., auferindo um vencimento médio mensal líquido base de € 1.000,00 e ainda um subsídio de alimentação de € 4,00 por dia; o autor encontra-se a receber da Segurança Social, sendo que desde a data do acidente e até fevereiro de 2022, auferiu um montante de € 13.294,21, e se estivesse no ativo, à presente data, o autor, teria auferido uma quantia não inferior a € 18.000,00; no acidente foram danificados e inutilizados os seguintes bens propriedade do autor: - blusão IXON SPRINTER PRETO e um capacete no valor global de € 329,27; telemóvel Samsung cuja reparação ascende a € 350,55; calças de ganga no valor de € 20,00; ténis no valor de € 80,00; saco tiracolo no valor de € 15,00; até ao momento, o autor suportou a quantia global de € 517,80 em despesas médicas e medicamentosas, consultas e exames efetuou várias deslocações em automóvel próprio, quer às consultas e exames em estabelecimentos hospitalares, quer à fisioterapia, quer à Junta Médica; o motociclo de marca Honda, versão.., era, como é, propriedade do autor e, em consequência do acidente, ficou danificado e para a sua reparação é necessário despender a quantia de €1.397,49; o motociclo ainda hoje se encontra por reparar – dada a recusa da ré em assumir a responsabilidade pelo sinistro – e, em consequência do sinistro, ficou impedido de circular, o que tem causado graves transtornos, pois o motociclo era, muitas vezes, por si utilizado diariamente para as suas deslocações e, principalmente, para atividades de lazer e recreio, e, quando pretende conduzir, tem que se sujeitar a empréstimos ficando a dever os inerentes favores; o veículo do autor encontra-se parqueado na Oficina SBK Motos, situada na Rua ..., em ..., a aguardar pela ordem de reparação da ré, o que importa o pagamento de € 3,15 por dia.

Citada, a ré contestou impugnando muita da matéria alegada pelo autor por desconhecimento, requerendo que o autor volte a oferecer os documentos com que instruiu a petição inicial numerados; imputa a responsabilidade pela ocorrência do sinistro ao autor, afirmando que o condutor do veículo segurado o imobilizou junto ao sinal “STOP” existente na via onde seguia e junto ao entroncamento com a rua por onde circulava o autor e só entrou nesta via depois de se assegurar que o podia fazer em segurança, tendo o acidente ocorrido em virtude de o autor circular a velocidade superior a sessenta quilómetros por hora, distraído, sem travar nem se desviar, apesar de dispor de espaço para tanto, ocorrendo o embate a mais de quinze metros do entroncamento donde provinha o veículo segurado; impugna os danos e concluiu pela total improcedência da ação.

Notificado para apresentar os documentos juntos com a petição inicial numerados, o autor ofereceu os documentos identificados por números.

Fixou-se o valor da causa no montante de € 28.855,82, dispensou-se a audiência prévia, proferiu-se despacho saneador tabelar, identificou-se o objeto do litígio, enunciaram-se os temas da prova, conheceu-se dos requerimentos probatórios das partes, com exceção da prova pericial requerida pelo autor e designou-se data para realização da audiência final.

Em 03 de dezembro de 2022, o autor veio requerer que o tribunal a quo se pronuncie sobre a prova pericial que requereu na petição inicial e sobre a qual não houve pronúncia judicial.

Depois de comprovar ter-lhe sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, em 02 de janeiro de 2023 o autor veio requerer a ampliação do pedido, alegando despesas de deslocação para tratamentos de fisioterapia entre os dias 15 de fevereiro de 2022 e a sua alta em 07 de abril de 2022, no montante de € 300,00, perdas salariais no período compreendido entre 15 de fevereiro de 2022 e 07 de abril de 2022 no montante de € 201,00, pedindo a condenação da ré ao pagamento da quantia líquida de € 29.356,82, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo pagamento, tudo sem prejuízo de futuras ampliações do pedido.

A ré contestou a ampliação do pedido nos mesmos termos da contestação, impugnando a documentação oferecida.

Em 11 de fevereiro de 2023 admitiu-se a prova pericial e a ampliação do pedido requeridas pelo autor.

Realizou-se a prova pericial requerida pelo autor e bem assim uma sessão da audiência final.

Em 02 de junho de 2023, perante os resultados da perícia, o autor requereu a ampliação do pedido requerendo a condenação da ré ao pagamento da indemnização de € 15.000,00 a título de IPP e mais € 3.000,00 a título de compensação por danos não patrimoniais, passando a indemnização global a pagar pela ré do montante de € 29.356,82 para €47.356,82.

A ré contestou a ampliação do pedido nos mesmos termos da contestação.

Em 22 de junho de 2023 admitiu-se a segunda ampliação do pedido requerida pelo autor, concluindo-se a audiência final em 04 de julho de 2023 com inspeção ao local.

Em 09 de outubro de 2023 foi proferida sentença[2] que terminou com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, decide-se julgar a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, condenar a Ré A..., S.A a pagar ao Autor AA a quantia de € 31.530,90 (trinta e um mil quinhentos e trinta euros e noventa cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde a citação e até integral e efectivo pagamento, a incidir sobre a quantia de € 13.825,90, e, à taxa legal de 4%, desde a presente data e até integral e efectivo pagamento a incidir sobre a quantia de € 17.705,00.

A esta quantia acresce a quantia diária de € 5,00 (cinco euros), a título de privação do uso, desde a presente data e até à data em que for liquidada a indemnização devida ao Autor para reparação do motociclo em causa nos autos.

Mais se decide absolver a Ré do demais peticionado.

Custas pelo Autor e pela Ré em função do respectivo decaimento – cfr. artigo 527º do Código de Processo Civil.

Registe e notifique.

Em 19 de outubro de 2023, inconformado com a sentença que precede, AA interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1.ª -O presente recurso visa a revogação da douta Sentença, porquanto se discorda da indemnização fixada a título de danos não patrimoniais e a título de IPP – Dano Biológico;

2.ª - No que respeita à fixação da indemnização por danos de natureza não patrimonial: atendendo à gravidade das lesões sofridas, ao período de doença, às sequelas permanentes e ao sofrimento físico e moral, temos por inteiramente justo a indemnização peticionada,, no nosso entender, por escassa a indemnização fixada pelo Tribunal recorrido, dada a dimensão dos danos.

3.ª - Entendemos, com o devido respeito, que a Mmº Juiz acabou por subvalorizar os danos assim advindos, nesta perspetiva, ao lesado, em claro e inequívoco alheamento dos dispositivos legais que regulam esta matéria, da doutrina e jurisprudência dominante e mais recente dos nossos Tribunais.

4.ª - A indemnização, porque visa oferecer ao lesado uma compensação que contrabalance o mal sofrido, deve ser significativa, e não meramente simbólica, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um grau de “compensação”, sendo fundamental, pois, a determinação do mal efectivamente sofrido por cada lesado, as suas dores e o seu sofrimento psicológico” – Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 29.10.2008, proferido no âmbito do Proc. 08P3380, pesquisado em www.dgsi.pt.

5.ª - O Autor sofreu graves danos.

Tais danos vêm devidamente plasmados nos factos dados como provados nos Autos.

E merecem, indubitavelmente, a tutela do direito.

6.ª - E não oferece hoje também dúvidas que a compensação por danos não patrimoniais – como se diz no Ac. STJ de 16.12.93 in CJ. STJ, III, 182 – deve ter um alcance significativo e não meramente simbólico, sendo tempo de acabar com miserabilismos indemnizatórios.

7.ª - O que é dizer que a verba arbitrada a este título pelo Tribunal recorrido é manifestamente escassa.

8.ª - Atento o quadro retratado nos Autos, o montante indemnizatório a atribuir ao Autor a título de danos não patrimoniais haverá de fixar-se em não menos da quantia de € 18.000,00, tal como foi peticionado.

9.ª - Ao decidir nos termos constantes da douta Sentença em recurso o Tribunal “A Quo” violou o disposto nos artºs. 494º; 496º nº. 3; 562º; 564º nºs. 1 e 2 e 566º, todos do Código Civil.

10.ª - Quanto à fixação da indemnização pela IPP que o Autor Passou a padecer: Passando à fixação da quantia devida a título de dano biológico, importa, atentar-se, nomeadamente, ao provado em 43., 50. e 64. e 65.

11.ª - Como bem se refere na sentença recorrida, o valor indemnizatório nesta espécie de danos não é diretamente determinável e quantificável, sendo necessário recorrer à equidade na determinação do quantum indemnizatório, ainda que se possa recorrer a tabelas financeiras ou matemáticas, mas apenas e só como meros auxiliares, como critério geral de orientação para a determinação equitativa do dano.

12.ª - Quanto a este dano biológico há a considerar:

- À data da consolidação médico-legal das lesões sofridas;

- A idade do autor – 47 anos à data do acidente;

- A esperança média de vida fixável nos 83 anos:

- o limite de vida ativa fixável nos 67 anos;

- o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos;

- o salário médio nacional e a necessidade de fazer esforços acrescidos para exercer essa profissão e da atividade do dia a dia;

- A progressão na carreira e os aumentos salariais daí decorrentes;

- a taxa de juro, hoje muito próxima dos 0% ou mesmo negativa.

13.ª - Considera-se que a referência para efeitos de cálculo da indemnização da incapacidade funcional em que se traduz o dano biológico não tem de ser o salário auferido pelo lesado, nem tão pouco o salário mínimo nacional, conforme tem vindo a ser entendido muitas vezes, quando o lesado não exerce atividade profissional.

14.ª - A informação estatística da base de dados Pordata, em Portugal, in www.pordata.pt indica que o ordenado base médio mensal dos trabalhadores por conta de outrem no ano em 2021 (não há valores para os anos posteriores) foi de € 1.294,10 (mil duzentos e noventa e quatro euros e dez cêntimos).

15.ª - Este valor é então um dos elementos a ponderar para o cálculo da indemnização do dano biológico;

16.ª - Assim, considerando os fatores acima indicados, consideramos justo, adequado e proporcional, a fixação da quantia de € 15.000,00 a título de dano biológico.

17.ª - Ao assim não decidir, a sentença recorrida violou, entre outras disposições legais, o disposto nos art.ºs 483.º, 562.º e 564.º do Código Civil.

A..., S.A. respondeu ao recurso pugnando pela sua total improcedência.

O recurso foi admitido como apelação, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Uma vez que o objeto do recurso tem natureza estritamente jurídica, com o acordo dos restantes membros do coletivo dispensaram-se os vistos, cumprindo apreciar e decidir de imediato.

2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil

2.1 Da compensação por danos não patrimoniais;

2.2 Da indemnização a título de dano biológico.

3. Fundamentos de facto

3.1 Factos provados


3.1.1

No dia 3 de dezembro de 2020, cerca das 13,25 horas, na freguesia ..., concelho ..., junto ao entroncamento da Rua ... com a Rua ..., ocorreu um embate, no qual foram intervenientes o veículo automóvel de matrícula ..-AD-.., propriedade e conduzido por BB, e o motociclo de matrícula ..-..-GZ, propriedade e conduzido por AA.

3.1.2

O motociclo, conduzido por AA, circulava pela Rua ..., no sentido de marcha ... – ..., pela metade direita da faixa de rodagem, atento o referido sentido de marcha.

3.1.3

AA seguia com o capacete aposto na cabeça.

3.1.4

Nas mesmas circunstâncias de tempo, o veículo ligeiro AD circulava pela Rua ..., que entronca na referida Rua ..., por onde circulava AA.

3.1.5

Ao chegar ao entroncamento com a Rua ..., por onde circulava o motociclo conduzido por AA, o condutor do veículo automóvel de matrícula AD não parou à entrada do entroncamento, desrespeitando o sinal de STOP ali e para ele existente, continuando a sua marcha, não cedeu a passagem ao motociclo, invadindo e obstruindo a metade direita da faixa de rodagem por onde circulava o motociclo conduzido por AA, cortando-lhe a sua linha de trânsito.

3.1.6

O condutor do veículo automóvel de matrícula AD conduzia distraído e desatento, não verificou se na referida Rua ... circulam outros veículos e não se certificou se podia passar a circular nessa Rua sem prejuízo para os demais.

3.1.7


O motociclo era visível ao condutor do AD.

3.1.8

A Rua ..., atento o sentido de marcha seguido pelo autor, tem, para quem vem da Rua ... e pretende aceder aquela, uma visibilidade superior a 50 metros, descrevendo-se a via em reta.

3.1.9

Perante o súbito e inesperado corte da sua linha de trânsito, o autor travou, acabando por perder o controlo do veículo, despistando-se.

3.1.10

O motociclo deslizou pela via e acabou por embater com a sua frente na parte de baixo da traseira do veículo ligeiro, na metade direita da Rua ..., atento o sentido de marcha seguido pelo autor e junto ao entroncamento suprarreferido.

3.1.11

Em consequência da conduta do condutor do AD, o motociclo e o autor foram projetados para a via.

3.1.12

O piso no local é betuminoso e encontrava-se em bom estado de conservação.

3.1.13

À saída da Rua ... e antes de entrar na Rua ... existia, à data do acidente, o sinal de STOP, o qual se depara a todos os que, como o condutor do veículo automóvel de matrícula AD, saem da Rua ... e pretendem passar a circular pela Rua ....

3.1.14

O proprietário do veículo ..-AD-.. tinha a sua responsabilidade civil emergente de acidente de viação, relativamente a danos causados a terceiros, transferida para a ré mediante a apólice nº...55/1.

3.1.15

O autor, no momento da ocorrência do acidente e nos instantes que se seguiram, sofreu um susto e receou pela sua vida, não tendo perdido a consciência.

3.1.16

O autor foi transportado de ambulância para o Hospital ..., em Santa Maria da Feira, pelo INEM, em plano duro e com imobilização cervical.

3.1.17

O autor deu entrada no Serviço de Urgências do Hospital ..., onde foi examinado.

3.1.18

Na admissão, o autor apresentava o seguinte quadro clínico e foi sujeito aos seguintes tratamentos de enfermagem:

EF: COC . ECG=15. ENS sem défices neurológicos

Apresenta múltiplas feridas abrasivas nas mãos, antebraço e cotovelo e[s]querdo, joelhos.

Extensas feridas abrasivas nas nádegas e região trocantérica bilateral, dedo pé dto e 3º dedo pé esquerdo.

Sem dismorfias ou dismetrias nos me[m]bros.

Ligeira dor à palpação do hemitórax dto, sem enfisema sc ou crepitação.

Sem dor aguda à palpação das espinhosas cervicais, dorsais e lombares.

Abdómen mole, depressível indolor à palpação.

Limpeza, desinfeção das ferias, penso com gaze gorda.


3.1.19

Por indicação clínica, o autor foi submetido a TC cerebral, com o seguinte resultado:

TC cerebral

Obtiveram-se imagens axiais desde o plano do buraco negro ao vértex, não se observando lesões traumáticas endocranianas agudas, nem traços de fratura recentes.

Sem alterações relevantes da densidade do parênquima encefálico.

Vias de circulação de liquor permeáveis.


3.1.20

Foi submetido a TC cervical, com o seguinte resultado:

TC da coluna cervical

Obtiveram-se imagens nos três planos ortogonais para estudo do segmento cervical do ráquis, não se observando traços de fratura recentes, nem coleções endocanalares seguras.

Não se identificam alterações espondilodiscais suscetíveis de comprometer a medula.


3.1.21

E ainda aos seguintes RX:

Rx dorsal, lombar, bacia, grelha costal bilateral sem fratura.

Rx joelhos, tornozelo e pé dto sem fratura.

Data

Sem intercorrências. Sem queixas de relevo.

ECG=15.HD estável.

Alimentou-se e tolerou.

Alta com ATB + AINEs.

Cuidados de penso no CS.

Explicados sinais de alarme que devem motivar reavaliação no SU.


3.1.22

Teve dores nas nádegas, joelhos, mãos, tornozelo direito e 1.º dedo do pé direito.

3.1.23

O autor teve alta hospitalar nesse mesmo dia, com indicação de repouso total, realização de tratamentos de enfermagem aos locais lesionados e observação e acompanhamento da evolução clínica.

3.1.24

O autor, após a alta hospitalar, permaneceu de cama durante cinco dias, pois tinha

muitas dores que lhe impediam a locomoção, tendo realizado os seguintes tratamentos de

enfermagem no Centro de Saúde ...:

Fenómenos de Enfermagem

Data/Hora InícioDiagnóstico de EnfermagemData/Hora Termo
2020/12/04 10:50Ferida Traumática

2020-12-21 12:13 Ferida traumática [mão]

2020-12-18 14:23 Ferida traumática [mão]

2020-12-14 11:04 Ferida traumática [mão]

2020-12-11 11:28 Ferida traumática [mão]

2020-12-10 11:45 Ferida traumática [mão]

2020-12-09 11:34 Ferida traumática [mão]

2020-12-07 11:53 Ferida traumática [mão]

2020-12-04 10:50 Ferida traumática [mão]

2021/01/11 11:37
2020/12/04 10:51Ferida Traumática

2020-12-23 08:58 Ferida traumática [nádega]

2020-12-21 12:12 Ferida traumática [nádega]

2020-12-18 14:21 Ferida traumática [nádega]

2020-12-14 11:04 Ferida traumática [nádega]

2020-12-11 11:27 Ferida traumática [nádega]

2020-12-10 11:44 Ferida traumática [nádega]

2020-12-07 11:51 Ferida traumática [nádega]

2020-12-04 10:51 Ferida traumática [nádega]

2021/01/07 12:29
2020/12/04 10:54Ferida Traumática

2021-01-11 11:29 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-30 11:35 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-23 08:59 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-21 12:12 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-18 14:22 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-14 11:03 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-11 11:27 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-10 11:44 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-09 11:34 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-07 11:51 Ferida traumática [antebraço]

2020-12-04 10:54 Ferida traumática [antebraço]

2021/01/11 11:37
2020/12/04 10:55Ferida Traumática

2021-01-04 10:29 Ferida traumática [dedo]

2020-12-23 08:59 Ferida traumática [dedo]

2020-12-21 12:13 Ferida traumática [dedo]

2020-12-18 14:22 Ferida traumática [dedo]

2020-12-14 11:03 Ferida traumática [dedo]

2020-12-11 11:28 Ferida traumática [dedo]

2020-12-10 11:45 Ferida traumática [dedo]

2020-12-09 11:34 Ferida traumática [dedo]

2020-12-07 11:52 Ferida traumática [dedo]

2020-12-04 10:55 Ferida traumática [dedo]

2021/01/07 12:29
2020/12/04 10:56Ferida Traumática

2020-12-28 10:13 Ferida traumática [joelho]

2020-12-23 09:00 Ferida traumática [joelho]

2020-12-21 12:13 Ferida traumática [joelho]

2020-12-18 14:22 Ferida traumática [joelho]

2020-12-14 11:04 Ferida traumática [joelho]

2020-12-11 11:28 Ferida traumática [joelho]

2020-12-10 11:45 Ferida traumática [joelho]

2020-12-09 11:34 Ferida traumática [joelho]

2020-12-07 11:52 Ferida traumática [joelho]

2020-12-04 10:56 Ferida traumática [joelho]

2021/01/07 12:28


3.1.25

O autor permaneceu de baixa médica concedida pela segurança social, pois ainda sentia dores e limitações, que o impossibilitavam de retomar a sua atividade profissional.

3.1.26

Por indicação clínica – da Unidade de Saúde Familiar ... - o autor realizou na Clínica ..., tratamentos de fisioterapia e reabilitação nos seguintes dias:

Tratamentos: 04, 05, 08, 09, 10, 11, 12 15, 16, 17, 18, 19, 22, 23,

24/03/2021

Tratamentos: 25, 26, 29, 30, 31, 31/03/2021, 01, 05, 06, 07, 08, 09, 12, 13, 14, 15/04/2021

Tratamentos: 05, 06, 07, 10, 11, 12, 13, 14, 17, 18, 19, 20, 21, 24, 25/05/2021


3.1.27

Os tratamentos consistiam em Ultrassonoterapia, Massagem manual, Mobilização articular passiva, técnicas especiais de Cinesiterapia, e incidiam sobre o punho direito e joelho esquerdo.

3.1.28

O autor recorreu à consulta do Dr. CC, com vista a efetuar a sua avaliação clínica, que prescreveu a realização de vários exames aos locais lesionados.

3.1.29

A RM, efetuada em 6 de março de 2021, ao punho direito, revelou o seguinte:

RM DO PUNHO DIREITO

TÉCNICA

Realizou-se estudo por Ressonância Magnética (RM) 1,5 Tesla, com múltiplas sequências axiais, sagitais e coronais T1, T2, T2* e STIR, antes e após contraste endovenoso.

RELATÓRIO

Observa-se alteração da morfologia, estrutura e sinal do osso escafóide, individualizando-se imagem sugestiva de fratura na região média do mesmo, com os bordos alinhados e sem aparente consolidação óssea, a confirmar por TAC.

O polo proximal deste osso não evidencia colapso e tem hipossinal nas sequências de T1, suspeito de necrose avascular; no entanto, nas sequências de STIR esta porção proximal e a distal mantém ainda sinal conservado, aspecto este sugestivo de edema ósseo e com viabilidade do mesmo, uma vez que se observa vascularização mantida nas porções proximal e distal, conforme constatado nas aquisições pós-contraste.

Nos ossos adjacentes, nomeadamente no semilunar e no grande osso, que mantêm morfologia e estrutura globalmente conservada, individualiza-se focos milimétricos sugestivo de edema ósseo focal, de provável natureza contusional.

Os restantes segmentos ósseos do carpo e a extremidade distal do rádio e cúbito não aparentam alterações significativas.

O ligamento escafolunar parece íntegro, individualizando-se na região dorsal adjacente a estes ossos, ligeiro edema difuso.

Não são aparentes outras alterações valorizáveis.


3.1.30

O exame radiográfico, de 30 de março de 2021, revelou fratura do osso escafoide ao nível do seu terço médio:

Observa-se fratura do osso escafoide ao nível do seu terço médio, ainda não consolidada, sem evidência de desvio ou angulação significativas das margens de fratura.

Admite-se discreta esclerose do pólo proximal do escafoide, pouco significativa e sem alteração da morfologia óssea, aspeto que pode contudo indiciar evolução ainda incipiente para necrose proximal.

Nos restantes ossos do carpo não se detetam outras alterações significativas da morfologia ou estrutura óssea.

A articulação radiocárpica tem aspeto normal.


3.1.31

A RM realizada ao joelho esquerdo revelou o seguinte:

RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DO JOELHO ESQUERDO

INFORMAÇÃO CLÍNICA

“Estudo menisco-ligamentar. Derrame ligeiro.”

Estudo realizado com cortes sagitais, coronais e axiais, em ponderação T1, T2, T2 gradiente e com supressão de gordura em campo magnético de alta intensidade.

RELATÓRIO

Ligeira sinovite pré-rotuliana difusa.

Derrame articular de pequeno volume acumulado sobretudo no recesso subquadricipital com sinovite associada. Fina plica sinovial suprapatelar.

Ligeiras alterações de gonartrose no compartimento fémoro-tibial interno sem evidência de condropatia significativa.

O menisco interno encontra-se ligeiramente extrusado e apresenta alterações degenerativas nos dois terços posteriores onde se observa uma pequena fissura/laceração oblíqua que atinge o bordo livre do menisco.

O menisco externo não demonstra alterações relevantes da morfologia, estrutura ou sinal magnético.

Os ligamentos cruzados, o ligamento colateral interno e a porção abrangida do tendão quadricipital não demonstram lesões significativas.

Ligeiro espessamento e edema da porção posterior do ligamento colateral externo, provavelmente sequela de distensão/estiramento sem evidência de rotura.

Ligeiros sinais de tendinite/tendinose do tendão rotuliano junto à inserção tibial, sem evidência de rotura.

A rótula encontra-se centrada na tróciea femoral demonstrando discreta báscula externa. A cartilagem articular mantém-se globalmente preservada, sem evidência de condromalacia.

Retináculos patelares preservados.

Discreto quisto de Baker na vertente interna do cavado poplíteo com baixa tensão interior.

Observa-se também fina lâmina de líquido traduzindo edema inflamatório adjacente à aponevrose do músculo gémeo interno na sua vertente medial. É também visível uma pequena coleção líquida de tipo sero-hemático, subaponevrótica, na vertente anterior do mesmo músculo, medindo cerca de 24 x 17 mm de maiores diâmetros.

Não são aparentes fraturas dos segmentos esqueléticos abrangidos nem sinais de edema/contusão óssea medular.


3.1.32

O autor realizou um TC cerebral, com o seguinte resultado:

TC cerebral

Obtiveram-se imagens axiais desde o plano do buraco magno ao vértex, não se observando lesões traumáticas endocranianas agudas, nem traços de fratura recentes.

Sem alterações relevantes da densidade do parênquima encefálico.

Vias de circulação de liquor permeáveis.


3.1.33

E um TC da coluna cervical, com o seguinte resultado:

TC da coluna cervical

Obtiveram-se imagens nos três planos ortogonais para estudo do segmento cervical do ráquis, não se observando traços de fratura recentes, nem coleções endocanelares seguras.

Não se identificam alterações espondilodiscais suscetíveis de comprometer a medula.


3.1.34

Por indicação médica, o autor realizou, em 02 de junho de 2021, uma TAC ao punho direito, onde continuava visível a fratura não consolidada do terço médio do escafóide:

TAC DO PUNHO DIREITO

INFORMAÇÃO CLÍNICA “Tem RM com contraste. Fratura sem aparente consolidação do escafóide.”

TÉCNICA

Exame efetuado com técnica multicorte e com cortes ortogonais em janela óssea e de tecidos moles abrangendo o punho direito.

RELATÓRIO

Continua visível fratura não consolidada do terço médio do escafóide, de aspeto algo cominutivo mas sem evidência de desvio ou angulação significativa das margens de fratura.

O pólo proximal do escafóide apresenta ligeira esclerose difusa relativamente à sua vertente distal. Este aspeto, em conjunto com a ausência de consolidação da fratura, indicia possível evolução para osteonecrose proximal do escafóide.

Os restantes ossos do carpo estão alinhados não demonstrando alterações significativas da morfologia ou estrutura óssea, referindo-se apenas um cisto ósseo bem marginado de tipo geódico na vertente interna do osso ganchoso medindo cerca de 8mm de maior eixo.

A interlinha articular radiocárpica tem amplitude normal, com corticais ósseas íntegras. Pequena calcificação justa-articular adjacente à vertente palmar interna da epífise radial.

Não são aparentes outras lesões ósseas focais nos segmentos esqueléticos abrangidos, nomeadamente evidência de outras lesões de natureza traumática.


3.1.35

A médica de família prolongou o período de Incapacidade Temporária Absoluta,

emitindo a seguinte declaração:

Relatórios Médicos

Para os devidos efeitos declaro que o utente AA sofreu acidente de viação a 30 de dezembro de 2020. Na avaliação no SU não foram detetadas fraturas mas o doente manteve queixas de dor e limitação funcional do punho direito, pelo que se deu continuidade ao estudo, que, por sua vez, revelou fratura do osso escafoide. Encontra-se neste momento, sob tratamento de Medicina Física e Reabilitação e em consulta externa de Ortopedia no CHEV.

Por ser verdade o que acima escrevo, dato e assino.


3.1.36

Em função da fratura não consolidada do osso escafóide, o autor aguardou a decisão clínica da intervenção cirúrgica.

3.1.37

À mesma conclusão – a de manutenção da Incapacidade Temporária Absoluta – chegou a Comissão de Verificação da Segurança Social.

3.1.38

Na consulta de 30 de setembro de 2021, no Hospital ..., em Santa Maria da Feira, a Dra. DD, solicitou que o autor fosse sujeito a RX e TAC ao punho esquerdo, para programação cirúrgica.

3.1.39

Na consulta de 18 de novembro de 2021, no Hospital ..., em Santa Maria da Feira, a Dra. DD, verificou que ainda não podia decidir sobre a intervenção cirúrgica e respetiva programação, pois ainda não havia sido realizado o RX e a TAC ao punho esquerdo.

3.1.40

O autor voltou à consulta externa no Hospital ..., em Santa Maria da Feira, no dia 27 de janeiro de 2022, tendo a médica emitido o seguinte Relatório Clínico:

Sexo masculino, 48 anos

AP: HTA

Queda de moto em Dez/2020.

Traumatismo punho direito.

Fratura do corpo do escafóide que não foi diagnosticada na altura.

Evoluiu com dor e limitação da mobilidade.

De momento sem dor à palpação

Mobilidades limitadas do punho

Sem lesões NV

ECD: fratura aparentemente consolidada

Peço MFR

Volta após”.


3.1.41

Nesta consulta, foi decidido clinicamente que o autor reiniciasse tratamento de fisioterapia, pois a fratura encontrava-se a consolidar.

3.1.42

No dia 31 de janeiro de 2022, o autor deslocou-se a uma Junta Médica da Segurança Social, tendo sido prescrita clinicamente a continuidade da situação de Incapacidade Temporária Absoluta.

3.1.43

O autor aguardou indicação clínica para iniciar os tratamentos de fisioterapia, continuando a sujeitar-se a tratamentos médicos e medicamentosos.

3.1.44

O autor nasceu no dia ../../1973.

3.1.45

Era uma pessoa saudável, ágil, forte e robusta e não sofria de qualquer aleijão, deformidade, insuficiência, incapacidade ou limitação da sua capacidade laboral ou de utilização do seu corpo.

3.1.46

O autor sentiu e sente desgosto, lamentando-se sobre o que lhe sucedeu.

3.1.47

O autor sofreu dores em todas as regiões do seu corpo atingidas.

3.1.48

O autor ainda sente dores quando mobiliza ou faz força ou esforço com a mão direita.

3.1.49

Teve de ingerir medicamentos, nomeadamente analgésicos, anti-inflamatórios e

antibióticos.


3.1.50

Sentiu tonturas, mal-estar, dores e ausência completa de forças para se movimentar, necessitando do acompanhamento de terceira pessoa durante, pelo menos, uma semana após o acidente.

3.1.51

À data do acidente, o autor exercia funções de ... de 1.ª, auferindo um vencimento médio mensal ilíquido base de € 1.000,00, correspondente a um vencimento líquido de € 774,00, e, ainda, um subsídio de alimentação de € 4,77 por dia.

3.1.52

O autor encontra-se a receber baixa médica da Segurança Social, sendo que, desde a data do acidente e até 14 de fevereiro de 2022, auferiu um montante de € 13.294,21.

3.1.53

Se estivesse no ativo, desde a data do acidente e até 14 de fevereiro de 2022, o autor, teria auferido uma quantia não inferior a € 14.000,00.

3.1.54

Em consequência do acidente, o autor viu danificados e inutilizados os seguintes bens:

- Blusão IXON SPRINTER PRETO e um capacete no valor global de € 329,27;

- Telemóvel Samsung cuja reparação ascende a € 350,55;

- Calças de valor não concretamente apurado;

- Ténis de valor não concretamente apurado;

- Saco tiracolo de valor não concretamente apurado.


3.1.55

O autor suportou a quantia global de € 517,80 em despesas médicas e medicamentosas, consultas e exames.

3.1.56

O autor efetuou várias deslocações, a consultas e exames em estabelecimentos hospitalares, à fisioterapia, à Junta Médica, em automóvel próprio.

3.1.57

O motociclo, em consequência do acidente, ficou danificado, resultando danos nas seguintes peças:

Aro farol frente

Punho esq.

Espelho

Manete esq.

Guiador concorrência

Terminal punho completo

Tampa depósito esq. usada.

Tampa depósito dir. usada

Tampa central dir. usado

Carenagem traseira completa

Pedal mudanças

Depósito gasolina usado

Borracha pedal mudanças

Suporte pousa-pés esq. usado

Pousa-pés condutor esq.

Pisca frente

Junta tampa motor

Tampa motor

Óleo motor[[3]]


3.1.58

Para a reparação do veículo é necessário despender a quantia de € 1 397,49.

3.1.59

O motociclo ainda hoje se encontra por reparar – dada a recusa da ré em assumir a responsabilidade pelo sinistro – e, em consequência do sinistro, ficou impedido de circular.

3.1.60

O motociclo era utilizado diariamente pelo autor para as suas deslocações e para atividades de lazer e recreio.

3.1.61

O veículo do autor encontra-se parqueado na Oficina ..., situada na Rua ..., em ..., a aguardar pela ordem de reparação.

3.1.62

O autor teve alta no dia 7 de abril de 2022, data em que reiniciou a sua atividade profissional.

3.1.63

O autor realizou tratamentos de fisioterapia nos seguintes dias: 23, 24, 25 e 28 de fevereiro; 1, 2, 3, 4, 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15, 16, 17, 18, 21, 22, 23, 24, 25, 28, 29, 30 e 31 de março, 4 e 5 de abril de 2022.


3.1.64

De 15 de fevereiro a 7 de abril de 2022, o autor recebeu da Segurança Social, o montante de € 1 465,00. Se estivesse no ativo, o autor teria auferido uma quantia não inferior a €1.500,00.

3.1.65

Conforme consta do relatório pericial:

- a data da consolidação médico-legal das lesões ocorreu em 06/04/2022;

- o período de défice funcional temporário parcial e de repercussão temporária na atividade profissional total ascendeu a 490 dias;

- o quantum doloris foi fixado no grau 4 de 7;

- o défice funcional permanente, resultante do acidente, é de 4 pontos[4], sendo as sequelas compatíveis com o exercício da atividade habitual mas implicam esforços suplementares;

- o dano estético permanente, considerando as cicatrizes, foi fixado no grau 4 de 7;

- a repercussão permanente em atividades desportivas e de lazer, considerando o abandono da prática de andar de bicicleta, foi fixada no grau 2 de 7.


3.1.66

Apurou-se as seguintes lesões e sequelas advindas do sinistro:

O (A) examinado(a) apresenta as seguintes sequelas:

- Crânio: sem alterações;

- Face: sem alterações:

- Pescoço: sem alterações;

- Ráquis: sem alterações;

- Tórax: sem alterações;

- Abdómen: sem alterações;

- Períneo: sem alterações;

- Membro superior direito: Sem hipotrofia tenar. Arco de movimento do punho flexão palmar 0-70º (contralateral 0-70º), flexão dorsal 0-50º (contralateral 0-60º), desvio radial 0-30º (contralateral igual), desvio cubital 0-35º (contralateral 0-45º). Com queixas álgicas na flexão dorsal e nos desvios radial e cubital. Força muscular mantida (5/5) e simétrica. Faz pinça entre D1 e restantes dedos, vencendo resistência. Área mais avermelhada na face posterior do terço médio do braço, praticamente impercetível à distância social com limites mal definidos, com cerca de 12 cm por 6 cm de maiores dimensões, coberta por pêlo.


3.1.67

A estimativa para a reparação dos danos sofridos pelo motociclo, com a matrícula ..-..-GZ, era de um dia.

3.2 Factos não provados


3.2.1

O motociclo seguia a uma velocidade não superior a 50 Km/h.

3.2.2

A visibilidade era superior a 100 metros.

3.2.3

O corte da linha de trânsito ocorreu a uma distância não superior a 10 metros.

3.2.4

Os tratamentos demoravam, em média, 1,30 horas e eram dolorosos, sentindo-se o autor, no fim dos mesmos, dorido e cansado.

3.2.5

Antes do acidente o autor era uma pessoa alegre, bem-disposta, sem quaisquer preconceitos; atualmente é uma pessoa abalada psicologicamente, impaciente, com o sistema nervoso alterado e revoltado com a situação que lhe foi criada pelo predito acidente; tornou-se uma pessoa facilmente irritável e irascível.

3.2.6

O autor fala do acidente muitas vezes, ficando perturbado.

3.2.7

O referido em 47 [3.1.48] ocorre relativamente ao joelho esquerdo ou outras partes do corpo e nas mudanças de tempo.

3.2.8

O referido em 49. [3.1.50] verificou-se durante 15 dias após o acidente.

3.2.9

Se estivesse no ativo, desde a data do acidente e até 14 de fevereiro de 2022, o autor, teria auferido uma quantia não inferior a € 18.000,00.

3.2.10

Quando pretende conduzir, o autor tem que se sujeitar a empréstimos.

3.2.11

O parqueamento do motociclo importa o pagamento de € 3,15 por dia.

3.2.12

Se estivesse no ativo, desde 15 de fevereiro de 2022 e até 7 de abril de 2022, o autor, teria auferido uma quantia não inferior a € 1.666,00.

3.2.13

Ao chegar ao aludido entroncamento com a Rua ..., o condutor do veículo AD reduziu a velocidade e imobilizou totalmente o veículo.

3.2.14

O condutor certificou-se da inexistência de qualquer trânsito proveniente do lado esquerdo e sinalizou a sua intenção de ingressar na Rua ..., através do acionamento do sinal luminoso intermitente direito da viatura.

3.2.15

Depois de se ter certificado que não circulava qualquer tráfico rodoviário que o impedisse de nela entrar em segurança, quer proveniente do lado direito, quer proveniente do lado esquerdo, efetuou a mudança de direção à direita.

3.2.16

O condutor do ..-..-GZ seguia a uma velocidade superior a 60 Km/hora, distraído, e desatento à condução estradal, o que fez com que não o conseguisse deter, caindo e deslizando até embater no AD.

3.2.17

O autor não travou, não se desviou (apesar de dispor de espaço para o efeito), nem empreendeu qualquer tentativa para evitar a colisão ou minorar as suas consequências.

3.2.18

O embate ocorreu a mais de 15 metros da guia do entroncamento.

3.2.19

O autor ficou clinicamente curado, sem quaisquer sequelas ou perdas de capacidade de ganho ou de rebate profissional, podendo retomar a sua atividade profissional no dia 17/12/2020.

4. Fundamentos de direito

4.1 Da compensação a título de danos não patrimoniais

O recorrente insurge-se contra a compensação arbitrada pelo tribunal recorrido a título de danos não patrimoniais, pugnando por que essa compensação seja elevada de doze mil e quinhentos para dezoito mil euros.

Para tanto, o recorrente alega que o tribunal recorrido não sopesou devidamente a gravidade dos factos relevantes para a fixação desta compensação.

Cumpre apreciar e decidir.

Antes de mais, importa sublinhar que não seguimos a orientação que se manifestou nalguns Tribunais da Relação, na senda do acórdão seminal do Supremo Tribunal de Justiça de 05 de novembro de 2009, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego no processo nº 381-2002.S1, acessível na base de dados da DGSI e no sentido de que o controlo da decisão de fixação equitativa da compensação por danos não patrimoniais se regeria pelos mesmos parâmetros que vigoram no recurso de revista, ou seja, de que o juízo de equidade deverá, “em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial, dos critérios que generalizadamente vêm sendo adoptados, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e, em última análise, o princípio da igualdade.

Na verdade, o Tribunal da Relação tem poderes amplos de cognição em matéria de facto e de direito, ao contrário do que sucede com o Supremo Tribunal de Justiça que apenas conhece de questões de direito, não tendo por isso base legal, em segunda instância, a orientação restritiva na sindicação do juízo de equidade de que resulta a fixação da compensação por danos não patrimoniais, devendo antes a Relação proceder à fixação autónoma da compensação devida tendo em conta todos os fatores relevantes para o efeito.

A compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do nº 4, do artigo 496º do Código Civil).

Também nesta vertente deve atentar-se no disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil, em ordem a uma aplicação uniforme do direito, tanto quanto possível, assim se respeitando e realizando o princípio da igualdade.

Pela sua própria natureza, os danos não patrimoniais não são passíveis de reconstituição natural e, por outro lado, nem em rigor são indemnizáveis mas apenas compensáveis pecuniariamente.

A compensação arbitrada nestes casos não é o preço da dor ou de qualquer outro bem não patrimonial, mas sim uma satisfação concedida ao lesado para minorar o seu sofrimento, paliativo que numa sociedade que deifica o dinheiro assume naturalmente esta feição.

Importa ainda não perder de vista que apenas são compensáveis os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, estando afastados do círculo dos danos indemnizáveis os simples incómodos (artigo 496º, n.º 1, do Código Civil).

Ensina o Professor Antunes Varela[5] que a “gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias do caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)”. Em nota de rodapé, na mesma página da obra citada, aludia o Ilustre Professor ao facto de Carbonnier considerar de todo aberrante a decisão judicial que concedeu a indemnização por danos morais pedida pelo dono duma écurie de course, com fundamento no desgosto que lhe causou a morte de um dos seus cavalos. Embora este exemplo não tenha na atualidade a pertinência que tinha num tempo em que os animais eram vistos exclusivamente como coisas[6], destituídos de sentimentos[7], aponta para que o sofrimento a compensar atinja um patamar mínimo de gravidade para que se torne merecedor da tutela do direito[8]. Existe como que uma tolerância ou adequação social de certo nível de incomodidade ou sofrimento e que constitui o preço que cada ser humano tem de pagar por viver em sociedade.

No caso em apreço, não se discute a compensabilidade dos danos não patrimoniais sofridos e que o recorrente ainda sofre no presente (recorde-se o ponto 3.1.48 dos factos provados) mas apenas a medida da compensação adequada.

Os factos que para este efeito se devem relevar são os seguintes:

- O autor, no momento da ocorrência do acidente e nos instantes que se seguiram, sofreu um susto e receou pela sua vida, não tendo perdido a consciência (ponto 3.1.15 dos factos provados);

- Teve dores nas nádegas, joelhos, mãos, tornozelo direito e 1.º dedo do pé direito (ponto 3.1.22 dos factos provados);

- O autor, após a alta hospitalar, permaneceu de cama durante cinco dias, pois tinha muitas dores que lhe impediam a locomoção, tendo realizado múltiplos tratamentos de enfermagem no Centro de Saúde ... (ponto 3.1.24 dos factos provados onde melhor se discriminam os diversos tratamentos e os dias em que ocorreram);

- O autor permaneceu de baixa médica concedida pela segurança social, pois ainda sentia dores e limitações, que o impossibilitavam de retomar a sua atividade profissional (ponto 3.1.25 dos factos provados);

- O autor sentiu e sente desgosto, lamentando-se sobre o que lhe sucedeu (ponto 3.1.46 dos factos provados);

- O autor sofreu dores em todas as regiões do seu corpo atingidas (ponto 3.1.47 dos factos provados);

- O autor ainda sente dores quando mobiliza ou faz força ou esforço com a mão direita (ponto 3.1.48 dos factos provados)

- Sentiu tonturas, mal-estar, dores e ausência completa de forças para se movimentar, necessitando do acompanhamento de terceira pessoa durante, pelo menos, uma semana após o acidente (ponto 3.1.50 dos factos provados);

- O período de défice funcional temporário parcial e de repercussão temporária na atividade profissional total ascendeu a 490 dias, o quantum doloris foi fixado no grau 4 de 7, o dano estético permanente, considerando as cicatrizes, foi fixado no grau 4 de 7 e a repercussão permanente em atividades desportivas e de lazer, considerando o abandono da prática de andar de bicicleta, foi fixada no grau 2 de 7 (parte do ponto 3.1.65 dos factos provados).

Devem tomar-se como referência os valores arbitrados a título de compensação por danos não patrimoniais nas seguintes decisões do Supremo Tribunal de Justiça, acessíveis nas bases de dados do IGFEJ, dada alguma similitude dos factos subjacentes a cada uma das decisões:

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06 de dezembro de 2017, proferido no processo nº 559/10.4TBVCT.G1.S1, em que se considerou que no caso de uma lesada de trinta e um anos de idade na data do acidente, afetada de um défice permanente da integridade físico-psíquica de dois pontos que sofreu traumatismo da coluna cervical, com as inerentes dores e incómodos que teve de suportar, sendo que o quantum doloris ascendeu ao grau 4, numa escala de 1 a 7, e os tratamentos a que teve de se submeter e bem assim as sequelas de que ficou a padecer, considerou-se ser de manter o montante indemnizatório fixado pela Relação por danos não patrimoniais no montante de €15.000,00;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04 de julho de 2023, no processo nº 342/19.1T8PVZ.P1.S1 em que se julgou equitativa a atribuição da quantia de € 20.000,00 para compensar um quadro de sofrimento físico e psicológico caraterizado por um quantum doloris de 3/7, repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer fixável no grau 1/7, perturbações significativas no sono e na vida sexual, perda de autonomia na realização de tarefas domésticas e na movimentação de objetos pesados, irritabilidade, desconforto constante, insegurança, baixa capacidade de atenção e concentração, baixa tolerância à frustração;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de janeiro de 2024, no processo nº 3571/21.4T8VNG.P1.S1 em que se considerou que não era desconforme com os atuais padrões indemnizatórios a compensação de € 15.000,00 por danos morais conferida a um jovem de vinte e dois anos de idade e que ficou afetado de um défice permanente da integridade físico-psíquica de três pontos, que antes do acidente era saudável e escorreito, o qual ficou com uma cicatriz de 13 cm sobre a clavícula esquerda, o que lhe causa desgosto; ficou com uma placa com 9 cm de comprimento aplicado sobre o corpo da clavícula; ficou com um dano estético de 2 em 7; suportou um quantum doloris de grau 4 numa escala de 7, em consequência das lesões e dos tratamentos a que foi submetido.

No caso dos autos, considerando toda a factualidade que antes se rememorou e destacando especialmente o longo tempo de doença do lesado (quatrocentos e noventa dias), o quantum doloris de grau quatro numa escala de sete graus crescente, o dano estético de grau quatro numa escala de sete graus crescente, a repercussão das lesões nas atividades desportivas e de lazer de grau dois numa escala de sete graus crescente, a multiplicidade de tratamentos a que foi sujeito a as dores a eles inerentes, afigura-se-nos mais ajustada a compensação de dezoito mil euros pretendida pelo recorrente, procedendo deste modo esta questão recursória.

4.2 Da indemnização a título de dano biológico

O recorrente pede a elevação da indemnização arbitrada a título de dano biológico de dez mil para quinze mil euros, argumentando para tanto que esse dano deve computar-se com referência ao salário médio mensal que, de acordo com a Pordata, era no montante de €1.294,10 em 2021.

Cumpre apreciar e decidir.

Não obstante a figura do dano biológico ser no domínio da responsabilidade por facto ilícito, normalmente resultante de acidente de viação[9], daquelas que mais desencontros jurisprudenciais tem suscitado, a tal ponto que o nosso Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão ainda não muito distante no tempo[10], em sede de apreciação do preenchimento dos requisitos de admissibilidade do recurso de revista excecional, refere que “[a]cresce que surgiu, de há anos para cá, a figura do “dano biológico” cujas dúvidas começam na conceptualização, continuando no capítulo referente à autonomização ou não relativamente às parcelas que tradicionalmente se fixavam”, julga-se que ainda se revela de interesse prático no enquadramento de certos casos, como sucede precisamente na hipótese dos autos.

Na situação em apreço, é manifesto que a incapacidade parcial geral que afeta o autor não tem qualquer projeção negativa nos ganhos que poderá auferir[11], não envolve uma redução nos seus rendimentos, implicando antes esforços suplementares para o exercício da sua atividade profissional e pessoal.

Sempre que a afetação no uso do corpo pelo sinistrado envolve maior esforço no desenvolvimento da atividade profissional, tem-se considerado verificar-se dano biológico enquanto dano patrimonial a ressarcir de acordo com a equidade[12].

O esforço acrescido traduz-se em força de trabalho aplicada para manter um certo desempenho profissional e pessoal e, sob este prisma, é passível de avaliação pecuniária[13].

Além disso, este maior esforço conduz a um maior desgaste da pessoa e a uma previsível redução das prestações profissionais e pessoais em momento anterior ao que sucederia caso não se tivessem verificado as limitações físicas determinantes de esforços acrescidos na execução da atividade laboral e pessoal.

As limitações que o autor apresenta, com o aumento da idade e de acordo com as regras da experiência comum, irão tendo um impacto maior na sua qualidade de vida, dada a natural redução das capacidades em geral de qualquer pessoa com o simples passar do tempo.

No entanto, o enquadramento do caso no denominado dano biológico não significa que a determinação da indemnização devida se deva realizar com aplicação da Portaria nº 377/2008, de 26 de maio, com as alterações introduzidas pela Portaria nº 679/2009, de 25 de junho. De facto, a Portaria nº 377/2008, de 26 de maio surgiu para regulamentação do nº 5, do artigo 39º, do decreto-lei nº 291/2007, de 21 de agosto. A previsão legal que se acaba de citar disciplina a proposta razoável para regularização dos sinistros que envolvam danos corporais[14], não tendo qualquer propósito uniformizador dos valores indemnizatórios por danos corporais no espaço da União Europeia. Por isso, como tem sido jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça, os critérios vertidos na aludida portaria têm o seu âmbito de aplicação confinado à fase extrajudicial de resolução do sinistro, não se impondo ao julgador que em processo contencioso procede, além do mais, à determinação das indemnizações por danos corporais devidas por causa de sinistro automóvel[15].

Em sede de dano biológico, finda a vida ativa, o fator rendimento continua a ter o seu relevo[16], desde logo porque a reforma não implica qualquer proibição de desenvolver trabalho remunerado e, claro está, serão as qualificações e a natureza do trabalho desenvolvido os fatores decisivos na determinação do valor da força de trabalho.

A determinação do montante indemnizatório devido pela perda ou afetação da capacidade de ganho é sempre uma operação melindrosa e é-o tanto mais quanto maior é o horizonte temporal a ter em conta e a maior ou menor instabilidade da situação envolvente[17].

O melindre da operação de quantificação deste dano aumenta nos casos em que em que essa afetação não tem projeção direta na remuneração do lesado, como sucede no caso dos autos, contendendo apenas com o acréscimo de esforço no desenvolvimento da atividade profissional habitual e com o inerente desgaste que isso implica.

Em ordem a imprimir uma maior objetividade na fixação dos montantes indemnizatórios, dando execução ao imperativo de justiça e legal de uma tendencial aplicação uniforme do direito (artigo 8º, nº 3, do Código Civil), alguma jurisprudência tem-se mostrado favorável à adoção de critérios matemáticos[18], ainda que sempre subordinados às regras da equidade (veja-se o nº 3 do artigo 566º do Código Civil)[19] e tendo em consideração casos análogos anteriormente decididos.

Neste contexto, as tabelas financeiras, tal como as tabelas constantes das Portarias nº 377/2008, de 26 de maio e nº 679/2009, de 25 de junho, podem servir de indicador[20], contribuindo[21] para reduzir o subjetivismo na determinação da indemnização a arbitrar[22].

O uso do salário médio como elemento orientador na determinação do dano biológico, como pretende o recorrente, a nosso ver justifica-se nos casos em que o lesado ainda não entrou na vida ativa ou quando pelo menos ainda não tem um percurso profissional estabilizado[23].

No caso dos autos, no momento do acidente o lesado tinha já quarenta e sete anos, tendo quarenta e nove anos na data da consolidação das lesões, tudo apontando no sentido de ter uma carreira profissional estabilizada. Por isso, entende-se que neste caso se devem aplicar os valores líquidos auferidos pelo lesado, já que a indemnização não está sujeita ao pagamento de IRS.

Os princípios fundamentais adotados pelo Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria, resumidos na citação[24] constante do acórdão de 05 de julho de 2007, no processo nº 07A1734, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira, acessível no site da DGSI, são os seguintes:

1ª) A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida;

2ª) No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso normal das coisas, é razoável;

3ª) As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade;

4ª) Deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte;

5ª) Deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia [[25]];

6ª) Deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de sensivelmente 73 anos[[26]], e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos oitenta)”.

No caso em apreço, afigura-se-nos que a indemnização a arbitrar a título de dano biológico, tendo em conta o défice funcional permanente do autor de 4 pontos, sendo as sequelas compatíveis com o exercício da atividade habitual mas implicando maiores esforços, há de ser encontrada entre o máximo obtido pelo critério matemático simples correspondente à capitalização da redução patrimonial no período da esperança de vida que o lesado teria e o patamar fornecido pelas tabelas financeiras, tendo em conta a mesma esperança de vida, ou seja, varia entre €14.196,5208 (€ 489,5352 x 29 anos) e €10.693,592932176 (coeficiente de 21,84438 x €489,5352)[27]. Estes valores devem ser majorados nos seus patamares mínimo e máximo, dado que foi aplicado um rendimento líquido auferido na data do acidente e que a alta ocorreu mais de um ano depois.

Tudo sopesado, ponderando ainda, em termos comparativos, as indicações mais recentes que o Supremo Tribunal de Justiça vem dando sobre a matéria em casos de gravidade superior mas comparável com o caso dos autos[28] e a natural evolução que as indemnizações devem ter face à erosão do poder de compra resultante da inflação, julga-se mais adequada e equitativa a quantia de quinze mil euros peticionada pelo recorrente.

Pelo exposto, procede também esta questão recursória devendo a indemnização pelo dano biológico fixar-se no montante de quinze mil euros.

Atenta a procedência total do recurso, as custas do mesmo são da responsabilidade da recorrida (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

5. Dispositivo

Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar procedente o recurso de apelação interposto por AA e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida proferida em 09 de outubro de 2023, nos segmentos impugnados, fixando a compensação por danos não patrimoniais no montante de dezoito mil euros e a indemnização por dano biológico no montante de quinze mil euros, mantendo-se no mais intocada a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrida, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso.


***


O presente acórdão compõe-se de trinta e cinco páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.


Porto, 09 de setembro de 2024

Carlos Gil

Fernanda Almeida

Eugénia Cunha


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[1] Segue-se, com alterações, o relatório da decisão recorrida.
[2] Notificada às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 12 de outubro de 2023.
[3] Só com muita imaginação o óleo do motor pode ser considerado uma peça de um veículo.
[4] Por lapso, o tribunal recorrido tinha escrito 4%, sendo inequívoco pelo exame do relatório pericial que o défice funcional permanente foi fixado em pontos, lapso que oficiosamente se corrigiu.
[5] In Das Obrigações em Geral, Vol I, 6ª edição, Almedina 1989, página 576.
[6] A Lei nº 8/2017, de 03 de março, alterou o Código Civil e de acordo com o disposto no artigo 201º-B deste diploma legal, os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica em virtude da sua natureza.
[7] A propósito do estatuto jurídico dos animais, numa conceção atualizada, veja-se, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, 2.ª edição revista e atualizada, Universidade Católica Portuguesa 2023, páginas 536 a 539, anotação 4 ao artigo 201.º-C do Código Civil.
[8] Escreve o Professor Antunes Varela, no mesmo local: “Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.”
[9] E com claro predomínio de lesados jovens ou de pessoas em idade ativa.
[10] Referimo-nos ao acórdão de 05 de maio de 2016, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro João Bernardo, no processo nº 2242/09.4TBBCL.G2.S1, acessível no site da DGSI.
[11] Isso mesmo sucede nas pequenas incapacidades permanentes parciais laborais resultantes de acidente de trabalho, sem que tal contenda com a atribuição de pensão por acidente de trabalho e com a manutenção do salário até então auferido.
[12] Neste sentido vejam-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, acessíveis na base de dados do IGFEJ: de 19 de maio de 2009, proferido no processo nº 298/06.0TBSJM.S1; de 19 de dezembro de 2015, proferido no processo nº 99/12.7TCGMR.G1.S1.
[13] No entanto, deve reconhecer-se que é muito difícil a valoração da intensidade da atividade laboral e nem todos os setores profissionais permitem uma avaliação fiável em termos de produtividade, ao menos em prazos pouco dilatados.
[14] Esse propósito é inequívoco no penúltimo parágrafo do preâmbulo da Portaria nº 377/2008, no qual se escreveu: “Por último, importa frisar que o objectivo da portaria não é a fixação definitiva de valores indemnizatórios mas, nos termos do nº 3 do artigo 39.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, o estabelecimento de um conjunto de regras e princípios que permita agilizar a apresentação de propostas razoáveis, possibilitando ainda que a autoridade de supervisão possa avaliar, com grande objectividade, a razoabilidade das propostas apresentadas.
[15] Neste sentido, vejam-se: o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04 de junho de 2015, proferido no processo nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de abril de 2022, proferido no processo nº 96/18.9T8PVZ.P1.S1, ambos acessíveis no site do IGFEJ.
[16] O nível de rendimentos na vida ativa e consequentes descontos para a Segurança Social ou a Caixa Geral de Aposentações reflete-se no montante da pensão de reforma, pelo que o termo da vida ativa não envolve qualquer igualdade de rendimentos entre todos os que nos mais diversos setores deixaram a vida ativa.
[17] A nosso ver, a forma mais correta de reduzir a álea envolvida nestas operações seria a de impor a fixação da indemnização sob forma de renda mensal, em vez de apenas permitir, como hoje sucede, esta modalidade de reparação do dano, fazendo-a depender da vontade do credor (artigo 567º do Código Civil). Na verdade, o lesado tanto pode viver muito menos ou muito mais do que a esperança média de vida, pode ser vítima de outros factos danosos e, em sentido inverso, pode beneficiar de novos meios de tratamento que alterem a sua situação clínica e a sua incapacidade. De todo o modo, cremos que as próprias seguradoras não estariam interessadas num sistema de indemnização sob forma de renda, dados os custos administrativos que isso implicaria num horizonte temporal indefinido.
[18] Uma operação matemática expedita para encontrar um valor nestes casos consiste no apuramento da perda de rendimento ficcionada correspondente ao número de anos tidos em conta. No caso dos autos, anualmente, o lesado teria uma perda anual ficcionada de €  (€ 774,00 + [5,77 x 21 dias úteis] = € 874,17 – salário auferido na data do acidente – x 14 meses= € 12 238,38; € 12 238,38 x 0,04 = € 489,5352, correspondendo a tal valor, no período de vinte e nove anos, coincidente com o termo da esperança de vida para os homens (78 anos, fazendo fé no Instituto Nacional de Estatística) o capital de € 14 196,5208 (€ 489,5352 x 29 anos = € 14 196,5208). Este valor é bruto e não entra em consideração com a natureza frutífera do capital. Importa sublinhar que estes valores foram obtidos tendo em conta o rendimento líquido do lesado no momento do acidente (veja-se o ponto 3.1.51 dos factos provados). No entanto, porque desde o acidente até à consolidação das lesões o lesado é indemnizado em sede de incapacidade temporária, o que seria desejável era saber o valor do salário no momento da alta. O período de afetação da incapacidade parcial geral tem o seu começo na data da alta, no caso concreto em 07 de abril de 2022 (ponto 3.1.62 dos factos provados) até à esperança média de vida que nos homens é de setenta e oito anos, por arredondamento, ou seja, vinte e nove anos, pois que na data da alta o lesado tinha quarenta e nove anos.
[19] Neste sentido veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de janeiro de 2023, proferido no processo nº 5986/18.6T8LRS.L1.S1, acessível no site da DGSI.
[20] Neste sentido se orientam o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de março de 2012, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Sérgio Poças, no processo nº 184/04.9TBARC.P2.S1, relativamente a uma hipótese qualificada como de dano biológico e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de março de 2012, relatado pelo então Sr. Juiz Desembargador Jorge Leal, no processo nº 4129/06.3TBSXL.L2-2, ambos acessíveis no site da DGSI.
[21] Era desejável que se tivesse apurado o valor do salário do lesado no montante da alta. Na falta deste elemento, ter-se-á que considerar que os valores obtidos ficam sempre um pouco aquém dos que se obteriam utilizando os rendimentos obtidos na data da alta pois que é lícito presumir que durante o longo período de doença algum aumento da remuneração terá havido.
[22] Aplicando as tabelas financeiras da autoria de Manuel Ferreira de Sá Ribeiro, editadas pela Universidade Católica Portuguesa, Lisboa 1981, a uma taxa de 2 % (ver página 22, terceira coluna a contar da direita), para um período temporal de 29 anos, o coeficiente é de 21,84438 que multiplicado pela perda anual de €489,5352, totaliza € 10.693,592932176. Este valor, se estivesse em causa uma perda efetiva de rendimentos deveria ser tomado como patamar inferior da indemnização a arbitrar porque pondera já a disponibilidade imediata do capital. Além disso, como se pondera no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de abril de 2018, proferido no processo nº 196/11.6TCGMR.G2.S1 e acessível no site da DGSI, mesmo que assim não fora, na atual conjuntura de fracos ou até de nulos rendimentos dos capitais em aplicações seguras deve até admitir-se não se justificar qualquer redução.
[23] Admite-se que o uso do salário médio conduz a uma tendencial igualdade na fixação do dano biológico. Se esta igualdade é desejável quando está em causa apenas o ressarcimento da funcionalidade do corpo nas atividades da vida diária, não parece que seja justa quando, como sucede no caso dos autos, se repercute na penosidade da atividade profissional e se traduz num maior desgaste do lesado ao longo dos anos.
[24] Informa o Sr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira que a citação é extraída do acórdão de 22 de março de 2007 de que foi relator, proferido na Revista nº 499/07, decisão a que não conseguimos aceder por via eletrónica.
[25] No momento presente, sobre esta problemática, importa ter presente a advertência contida no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de abril de 2018, proferido no processo nº 196/11.6TCGMR.G2.S1 e acessível no site da DGSI. Na atualidade, à baixa rentabilidade do capital em aplicações conservadoras associa-se uma elevada inflação e um contexto de guerra na Europa como não se vivia desde a segunda guerra mundial, já que a guerra nos balcãs teve um impacto mais limitado do que está a ter a guerra na Ucrânia.
[26] A esperança de vida para as mulheres, fazendo fé nos dados constantes da Pordata, em 2023, situava-se nos oitenta e três anos e sete meses e a dos homens em setenta e oito anos e quatro meses.
[27] Considerando os rendimentos líquidos, como nos parece correto, pelas razões expostas no acórdão proferido no processo nº 17/11.0TVPRT.P1, em 15 de setembro de 2014, por nós relatado e no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de setembro de 2019, proferido no processo nº 2706/17.6T8BRG.G1.S1, ambos acessíveis no site do IGFEJ.
[28] Relevam-se para o efeito os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, todos acessíveis na base de dados do IGFEJ: de 04 de julho de 2023, proferido no processo nº 342/19.1T8PVZ.P1.S1 (lesada, de 45 anos de idade na data do acidente, que à data do acidente exercia a profissão de Country Manager Portugal auferindo um salário líquido mensal de € 2.859,19, que ficou com um défice funcional permanente da integridade física de 4 pontos, que lhe diminui a capacidade física e de ganho embora seja compatível com o exercício da sua atividade profissional, padecendo de dores que lhe dificultam o descanso, o que lhe causa dificuldades de concentração, raciocínio e memorização, tornando penosa a realização de longas viagens de carro que são frequentes no exercício da sua profissão, tendo sido arbitrada indemnização de € 35.000,00 a título de dano biológico); de 16 de novembro de 2023, proferido no processo nº 1019/21.3T8PTL.G1.S1 (lesado com 49 anos na data do acidente, que no exercício da sua profissão de eletricista auferia em média mensalmente €838,62, com défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos, compatível com a atividade profissional habitual, mas implicando esforços suplementares, nomeadamente a pegar pesos com mais de 30 kg ou conduzir longas distâncias sem paragens (aguentando apenas meia hora de viagem), dores, perdas de tempo e ajudas de terceiras pessoas, sendo arbitrada indemnização a título de dano biológico no montante de € 20.000,00).