Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
8590/20.5T8PRT-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA DA LUZ SEABRA
Descritores: DISPENSA OU REDUÇÃO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
PRECLUSÃO DO DIREITO
Nº do Documento: RP202510148590/20.5T8PRT-A.P1
Data do Acordão: 10/14/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: A partir do AUJ nº 1/2022, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça e publicado no DR de 3.01.2022 clarificado ficou o regime quanto ao momento processual limite para as partes requererem a dispensa e/ou redução do pagamento da taxa de justiça remanescente ao abrigo do n.º 7 do artigo 6.º do RCP, devendo tal pedido ser apresentado até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, e não após a elaboração da conta.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 8590/20.5T8PRT-A.P1
Juízo Central Cível do Porto- Juiz 1
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Sumário (elaborado pela Relatora):
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I. RELATÓRIO
1. AA e BB instauraram acção declarativa de condenação contra A..., Lda, pedindo que fosse declarada inválida a resolução do contrato de franquia levada a cabo pela ré por não haver justa causa para a sua resolução, sendo, em consequência, a ré condenada, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos com a resolução ilícita do contrato de franchising, a pagar aos autores as seguintes quantias:
a) A quantia de 152.307,09€ (artigo 245.º), a título de indemnização pelos danos patrimoniais;
b) A quantia de 365.561,00€ (artigo 229.º), a título de indemnização pelos prejuízos decorrentes para os autores da cessação antecipada do contrato celebrado entre autor e ré;
c) A quantia de 20.000,00€ (artigo 245.º), a titulo de indemnização por danos morais;
d) Juros moratórios, vencidos e vincendos, até integral pagamento, calculados sobre as indemnizações peticionadas.
Indicaram como valor da acção €536.108,55€ (quinhentos e trinta e seis mil, cento e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos).

2. No despacho saneador proferido em 30.05.2021, foi fixado o valor da acção, nos seguintes termos:
“I. Valor da acção: em face dos pedidos de natureza pecuniária formulados pela Autora, nos termos do disposto nos arts. 297º, nº 1, 299º, nº 1, e 306º, do C.P.C., fixa-se o valor da presente acção em 536.108,55€ (quinhentos e trinta e seis mil, cento e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos).”

3. Foi proferida sentença em 5.12.2023, com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julga-se a presente acção improcedente por não provada, e absolve-se a Ré do pedido.
Custas a cargo do autor.
Notifique e registe.”

4. Interposto recurso de apelação pelo Autor, veio a ser proferido Acórdão por este Tribunal da Relação do Porto em 3.06.2024, com o seguinte dispositivo:
“Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, por não provada e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida.
Custas da apelação pelo Autor apelante (artigo 527.º, nº 1 do CPCivil).”

5. Transitado o referido Acórdão e remetido ao Tribunal de 1ª Instância, em 10.02.2025 os autos foram remetidos à conta e tendo esta sido elaborada foi emitida guia para pagamento pelo Autor da importância de €10.098,00 a título de taxa de justiça não paga, que dela foi notificado em 11.02.2025.

6. Por requerimento de 28.02.2025, Ref. Citius 41755457, veio o Autor apresentar pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6º nº 7 do RCP, tendo concluído do seguinte modo:
“a) Seja deferido o presente requerimento, dispensando-se o Autor do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), atenta a reduzida complexidade do processo, a tramitação da causa e a conduta do Autor;
b) Subsidiariamente, caso assim não se entenda, seja reduzido o montante da taxa de justiça remanescente, de forma a garantir um equilíbrio justo e proporcional;
c) Em última instância, caso não sejam acolhidos os pedidos anteriores, seja autorizado o pagamento faseado do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do artigo 33.º do RCP, em 12 prestações mensais sucessivas de 841,50€ (oitocentos e quarenta e um euros e cinquenta cêntimos), com a primeira prestação a ser paga no prazo de 10 dias após a notificação do despacho de deferimento e as subsequentes na mesma data do mês correspondente, implicando a falta de pagamento de uma prestação o vencimento imediato das seguintes.”

7. Foi proferido despacho em 25.03.2025, Ref. Citius 469938963, com o seguinte teor (transcrição):
“Requerimento com a referência nº 41755457 (pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais):
É entendimento dominante na nossa Jurisprudência que "A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo". Sendo que o prazo é de 10 dias. –cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2022 (Recurso Extraordinário para Uniformização de Jurisprudência) publicado no Diário da Republica no dia 03.01.2022.
Revertendo ao caso em apreço, o Acórdão do TRP que pôs termo à presente acção foi proferido em 03.06.2024, e a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça só foi requerida em 28.02.2025, quando o prazo referido se encontra manifestamente ultrapassado.
Pelo exposto, indefere-se o requerido.”

8. Inconformado com a referida decisão, o Autor interpôs o presente recurso de apelação, no qual formulou as seguintes
CONCLUSÕES
(…)

9. Tendo sido remetidos os autos ao Tribunal da 1ª Instância para se pronunciar sobre a nulidade da decisão por omissão de pronúncia sobre o pedido subsidiário, arguida nas conclusões do presente recurso, veio a ser proferido despacho em 21.08.2025, Ref Citius 473469289, com o seguinte teor:
“O Autor através de requerimento datado de 28.02.2025, veio requerer, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, tendo tal pretensão sido indeferida.
Subsidiariamente, o autor peticionou a redução ou pagamento em prestações da taxa de justiça remanescente.
Este pedido, por lapso, não foi apreciado.
Cumpre, pois, apreciar o pedido de redução ou pagamento em prestações da taxa de justiça remanescente.
O autor alega que caso não lhe seja concedida a dispensa total da taxa de justiça remanescente, ver-se-á forçado a tomar medidas drásticas para garantir o cumprimento da decisão, não tendo outra alternativa se não o congelamento dos estudos universitários da sua filha, uma vez que os encargos com propinas, alojamento e despesas associadas representam um peso significativo no orçamento familiar.
Requer, ainda, que o Tribunal não entenda ser possível a dispensa ou a redução da taxa de justiça remanescente, requer-se, que seja autorizado o seu pagamento em prestações, ao abrigo do artigo 33.º do RCP, considerando o supra-referido.
Assim, requereu que o pagamento seja efectuado nos seguintes termos:
a) Pagamento em até 12 prestações mensais sucessivas, no montante de 841,50€ (oitocentos e quarenta e um euros e cinquenta cêntimos) cada;
b) A primeira prestação deverá ser paga no prazo de 10 dias a contar da notificação do despacho de deferimento, sendo as subsequentes pagas mensalmente na mesma data do primeiro pagamento;
c) O incumprimento de uma prestação implicará o vencimento imediato das seguintes.
Na verdade, aceita-se, de acordo com as regras da experiência comum, que o pagamento da quantia € 10 098,00, de uma só vez, tem um impacto considerável na vida de um cidadão.
Porem, esse facto, só por si, não parece suficiente para sustentar uma redução do remanescente da taxa justiça, mas justifica o seu pagamento em prestações, nos termos requeridos, atento o disposto no ao abrigo do artigo 33.º do RCP.
Pelo exposto, defere-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça da seguinte forma:
a) Pagamento em até 12 prestações mensais sucessivas, no montante de 841,50€ (oitocentos e quarenta e um euros e cinquenta cêntimos) cada;
b) A primeira prestação deverá ser paga no prazo de 10 dias a contar da notificação do despacho de deferimento, sendo as subsequentes pagas mensalmente na mesma data do primeiro pagamento;
c) O incumprimento de uma prestação implicará o vencimento imediato das seguintes.
Notifique.”

10. Foram observados os Vistos.
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II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts 635º, nº 3 e 4, 639º, n.ºs 1 e 2 e 608º nº 2 do CPC- devendo o tribunal resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não estando obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, nem estando sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito- cfr. art. 5º nº 3 do CPC).
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As questões a decidir no presente recurso, em função das conclusões, são as seguintes:
1ª Questão- nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia;
2ª Questão- tempestividade do pedido de dispensa/redução do pagamento da taxa de justiça remanescente.
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III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Para a decisão a proferir relevam os factos inerentes à tramitação processual e respectivas peças processuais constantes do relatório acima elaborado.
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IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
Nulidade da decisão por omissão de pronúncia
Como resulta evidente do relatório supra, tendo o Tribunal a quo omitido inicialmente pronúncia sobre o pedido subsidiário de pagamento em prestações do remanescente da taxa de justiça, mas tendo dele conhecido posteriormente no despacho proferido em 21.08.2025, Ref Citius 473469289- no qual veio a deferir tal pedido-, supriu a nulidade suscitada pelo Apelante e deste modo tornou-se inútil o seu conhecimento, pois que de acordo com o disposto no art. 617º nº 2 do CPC considera-se tal despacho como complemento e parte integrante da decisão, ficando o recurso interposto a ter como objecto a nova decisão, cujo âmbito se manteve igual uma vez que o Apelante não usou da faculdade conferida pelo nº 3 do referido preceito legal.
Tempestividade do pedido de dispensa/redução do pagamento da taxa de justiça remanescente
Está devidamente demonstrado nos autos, e não se mostra questionado, que o Acórdão que pôs termo à presente ação foi proferido em 3.06.2024 e transitou em julgado, e tendo sido remetido o processo ao Tribunal de 1ª Instância, em 10.02.2025 os autos foram remetidos à conta, conta essa que foi elaborada e emitida guia para pagamento pelo Apelante da importância de €10.098,00 a título de taxa de justiça não paga, da qual foi notificado em 11.02.2025.
Apenas em 28.02.2025 veio o Apelante pedir a dispensa, ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça e, tal pedido foi julgado extemporâneo pelo Tribunal a quo, invocando para o efeito a jurisprudência uniformizada do AUJ 1/2022.
O Apelante defende uma das várias posições que a jurisprudência foi trilhando até então, defendendo que o pedido de dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça (na dispensa cabe o menos que é a redução) deve ser considerado tempestivo porque foi apresentado no prazo de 10 dias a contar da notificação da conta de custas, nos termos do art. 149º nº 1 do CPC, sendo esse, em seu entender, o momento em que o montante do remanescente se torna certo, líquido e exigível.
Acontece que, tal como bem se referenciou na decisão recorrida, no AUJ nº 1/2022, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça e publicado no DR de 3.01.2022 clarificado ficou o regime a aplicar quanto ao timing do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, cuja admissibilidade está prevista no art. 6º nº 7 do Regulamento das Custas Processuais (RCP).
Tal aresto incidiu precisamente sobre a questão de saber qual o momento processual limite para as partes requererem a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente ao abrigo do n.º 7 do artigo 6.º do RCP.
Nesse aresto ficou uniformizada a seguinte jurisprudência:
A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo.
A argumentação utilizada pelo Apelante nas suas conclusões de recurso foi toda ela, de forma exemplar e exaustiva, refutada no referido AUJ 1/2022 e como tal, até por uma questão de honestidade intelectual, tomamos a liberdade de convocar a sua fundamentação, na qual nos revemos, e onde se mostra justificada a posição sustentada naquele aresto de que, (…) “São várias as razões que suportam e justificam a posição que aqui sustentamos, de que o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça deve ter lugar (aí vingando o respectivo efeito preclusivo) até ao trânsito em julgado da decisão final do processo (nunca após a elaboração da conta - nem, sequer, entre o trânsito e a feitura da conta).
Passaremos a enunciar as razões que se nos afiguram nucleares e que respondem directamente aos motivos de discordância da posição aqui sustentada pelo Apelante:
“1 - Logo com a notificação da decisão final (que pôs termo ao processo), as partes ficam conhecedoras de que o juiz não fez uso do poder de dispensa do pagamento do remanescente da taxa. E, como tal, ficam logo cientes de que tal remanescente da taxa vai ser considerado na conta de custas e que terão de suportar. Daí que, querendo, devam agir prontamente a requerer aquela dispensa (ou redução) de pagamento.
Situação mais evidente quando representadas por profissionais do foro, que, ao receberem notificação da decisão que ponha termo ao processo, ficam na disponibilidade de todas as condições para antever o que lhes será exigido a título de remanescente da taxa de justiça, pois que conhecem o valor do processo, as taxas pagas e a possibilidade de ser aplicado ao caso a previsão ínsita no artigo 6.º, n.º 7 do RCP.
Pelo que, não se nos afigura correto afirmar-se que só após a elaboração da conta é que as partes ficam a conhecer o valor exacto dos montantes em causa e que só nessa altura se apercebem da sua eventual exorbitância.
Ou seja, fixado o valor da acção em montante que vá além dos (euro)275.000 e não sendo dispensado, oficiosamente pelo juiz, na sentença, o pagamento, total ou parcial, do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP, a parte condenada em custas e quando da notificação da decisão final, fica a saber que tem de pagar o remanescente da taxa de justiça, ou seja, fica a dispor de todos os elementos que lhe permitem conhecer qual a taxa de taxa de justiça que será então devida e que será incluída na conta de custas, pois essa taxa de justiça tem, necessariamente, por referência o valor da ação e a tabela I-A anexa ao RCP (cfr parte final do n.º 1 do artigo 6.º do RCP).
Assim, portanto, fixado que seja o valor da causa e transitada em julgado a decisão sobre a responsabilidade pelas custas, fica logo fixado o valor das custas que o tribunal atribuiu às partes, sendo manifesto que não é na conta que se atribui ou decide a taxa de justiça, pois a mesma taxa emerge com clareza da referida Tabela Anexa ao RCP (por cada fracção de (euro)25.000 acima dos (euro) 275.000, são devidos 3 Ucs.), o que o mesmo é dizer que o seu valor é determinado por uma mera operação aritmética(38).”
Deste modo, falecem os argumentos do Apelante de que antes da notificação da conta de custas o valor do remanescente é meramente hipotético, que não se encontra fixado de forma definitiva e exigível, desconhecendo-se o montante exacto do tributo, porquanto com a notificação da sentença final as partes estão na posse de todos os elementos para conhecer o valor do remanescente da taxa de justiça que lhes vai ser exigida e com ele não concordando podem apresentar pedido de dispensa ou redução.
Tal entendimento não compromete a justiça material, nem transforma a taxa de justiça numa barreira ao acesso ao direito porquanto a parte tem a possibilidade de pedir a dispensa, ou mesmo a redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça invocando as circunstâncias legalmente previstas para o efeito no art. 6º nº 7 do RCP, desde que o faça até ao trânsito em julgado da decisão final do processo.
Se a parte considera que o montante é desproporcionado, não correspondendo à complexidade e aos actos praticados no processo, tem a possibilidade de requerer a sua dispensa ou redução, mas para isso tem de o fazer em tempo útil, não depois de elaborada a conta, conta essa que será obrigatoriamente elaborada em conformidade com a sentença final quanto a custas, e que espelhará o valor total da taxa de justiça caso a parte não tenha solicitado previamente ao juiz que a altere, dispensando ou reduzindo o valor a pagar a esse título.
Quanto à argumentação relativa ao facto de a ausência de referência na decisão final sobre a dispensa constituir uma omissão e não corresponder a uma recusa implícita, voltamo-nos a socorrer da fundamentação do referido AUJ, do qual se pode ler o seguinte:
“2 - Sendo que se o juiz nada disse é porque entendeu que nada devia dizer sobre esta matéria, porque os pressupostos para a concessão de tal dispensa não estavam preenchidos.
Como bem refere o cit. ac. do STJ de 03.10.2017 (proc. 473/12), "Da mesma forma que o juiz do processo estava em condições de saber qual era o montante da taxa remanescente, e se nada decidiu em contrário então só podemos concluir que foi porque entendeu que não se justificava a dispensa ou redução do pagamento" - destaque nosso.
Ou, como se diz no Ac. STJ de 13.07.2017 (proc. 669/10.8/BGRD-B.C1.S1), "«A dispensa do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do art. 6.º, n.º 7, do RCP, decorre de uma decisão constitutiva proferida pelo juiz, podendo naturalmente inferir-se - se nada se disser sobre esta matéria na parte da sentença atinente à responsabilidade pelas custas - que os pressupostos de que dependeria tal dispensa não se consideraram verificados, sendo consequentemente previsível para a parte, total ou parcialmente vencida, que a conta de custas a elaborar não contemplará seguramente essa dispensa».
Ou seja, apenas se justifica que a ponderação a que alude o n.º 6 do artigo 7.º do RCP seja feita ex officio caso o juiz esteja convencido de que há fundamento bastante para dispensar o pagamento. Entendendo o juiz que tal dispensa não se justifica, a sua pronúncia quanto a custas limita-se ao habitual, sem qualquer ponderação, sendo, então, o remanescente da taxa de justiça considerado na conta a final.
3 - Daí que, perante a constatada omissão do juiz, às partes não resta senão reagir por via da reforma da decisão quanto a custas ou, sendo possível, do recurso. Pedido esse de reforma que deve ser feito no prazo de 10 dias contado da notificação da sentença ou acórdão (art. 149.º n.º 1 do C.P.C.), seguido de contraditório (art. 149.º n.º 2 do C.P.C.) e decisão (art. 617.º n.º 6, 1.ª parte, do C.P.C.) de que não cabe recurso (art. 617.º n.º 6, 2.ª parte, do C.P.C.)(39).
4 - E, como escreve SALVADOR DA COSTA(40), "passado o prazo de recurso ou de pedido de reforma da decisão judicial quanto a custas, as partes não podem, na reclamação da conta, impugnar, por exemplo, o vício daquela decisão, incluindo a sua desconformidade com a Constituição ou com algum dos princípios nela consignados"(41).
5 - Não tendo as partes reagido nos sobreditos termos, a decisão quanto a custas transita e, como tal, torna-se imutável, sem que possa jamais ser alterada, seja oficiosamente, seja por iniciativa das partes ou a solicitação do Ministério Público (ut art. 619.º, n.º 1 do CPC).
6 - Sendo a elaboração da conta sem a redução ou dispensa do pagamento da taxa de justiça, afinal, mera consequência do incumprimento do ónus que se ajusta ao comportamento da parte, ao não requerer atempadamente tal dispensa. Pois que nada mais haverá a fazer: se a parte não apresentou, atempadamente, o pedido de dispensa, a conta tem, forçosamente, de ser elaborada nos termos gerais decorrentes da tabela legal, incluindo, portanto, o remanescente da taxa de justiça a pagar.
7 - Assim, a conta é - tem de ser - elaborada, após o trânsito (no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da decisão final - artigo 29.º, n.º 1, do RCJ), em conformidade com a decisão final que for proferida nos autos (isto é, "de harmonia com o julgado em última instância, abrangendo as custas da acção, dos incidentes, dos procedimentos e dos recursos", ut artigo 30.º, n.º 1 do RCP), como tal, contendo o remanescente da taxa de justiça devida.
8 - Se as partes não reclamaram da eventual omissão do juiz quanto à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, sibi imputet, tendo de arcar com as inerentes consequências, mais não sendo o acto de elaboração da conta do que um acto material, sem qualquer conteúdo decisório, nos termos e nos limites que estão definidos e impostos por lei quando a mesma disponha em concreto sobre o valor da taxa a pagar, ou resultando tais limites da lei e da decisão jurisdicional, quando a lei permite ao juiz a fixação de uma taxa variável como forma de dar cumprimento aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, como é o caso previsto no artigo 6.º, n.º 7 do RCP.
(…) No momento da elaboração da conta e consequente notificação às partes para o respectivo pagamento, já estão definitivamente fixadas as responsabilidades em matéria de custas.
20 - Assim, também não há nulidade da decisão no caso de o juiz não conhecer ex officio da dispensa do pagamento da taxa de justiça.
Poder-se-ia pensar na verificação de nulidade por omissão de pronúncia (artºs 615.º, n.º 1, d) e parte final do n.º 2 do artigo 608.º, ambos do NCPC), já que a matéria da dispensa é de conhecimento oficioso - nulidade esta, porém, que sempre teria se ser arguida no prazo legal e perante o tribunal que cometeu a falta, ou nas alegações de recurso, havendo-o.
Porém, não se vislumbra que o não conhecimento ex officio da dispensa do pagamento da taxa de justiça possa integrar essa nulidade, visto que a nulidade por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixe de apreciar qualquer questão que tenha sido expressamente suscitada pelas partes. E, obviamente, proferindo o juiz decisão sobre custas, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 do CPC (que é o momento próprio para o fazer), já está a fazer um julgamento expresso quanto a custas (designadamente, quanto ao pagamento do remanescente da taxa de justiça), pois sabe bem que faltando a ponderação referida na 2.ª parte do n.º 7.º do artigo 6.º do RCP, será aplicado o regime regra estabelecido na 1.ª parte do mesmo preceito («... o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final»).
Como se não pode falar em "nulidade" da decisão quando o juiz, tendo nela ponderado sobre a aplicabilidade ou não ao caso do estatuído no artigo 6.º, n.º 7 do R.C.P., na mesma não veio a explicitar o resultado dessa "ponderação", pois então teríamos "erro de julgamento", que apenas podia ser corrigido por via de recurso ordinário da decisão condenatória final.”
Defende ainda o Apelante que o art. 6º nº 7 do RCP não fixa qualquer prazo preclusivo para a apresentação do pedido de dispensa, e a esse argumento responde também o citado AUJ, do seguinte modo:
(…)” é certo que o artigo 6, maxime o n.º 7, do RCP não prevê, expressamente, o momento em que as partes podem requerer ao juiz a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça - o que leva alguma jurisprudência a defender que tal dispensa pode ser requerida após a elaboração da conta (até porque - dizem - falando a norma em "dispensar o pagamento", "só se pode dispensar de pagar o que se mostrar liquidado").
Porém, feita uma adequada interpretação da norma, chegamos à conclusão de que da mesma resulta que a decisão do juiz - ainda que oficiosa - deve ser anterior à elaboração da conta a final, para que nesta possa ser, ou não, considerado e incluído o remanescente da taxa de justiça.
Efectivamente, aqueles que referem que "só se pode dispensar de pagar o que se mostrar liquidado", têm como assente a prévia necessidade de liquidação. Pressuposto que não se verifica, bastando atentar, v.g., no facto de não ser necessário haver liquidação para o pagamento da taxa de justiça, visto as partes pagarem a taxa de justiça considerando apenas o valor da acção e sem qualquer liquidação da secretaria.
Além disso, a redação do preceito sob apreciação (n.º 7 do artigo 6.º do RCP) - "[...] o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se...") é, de todo, compatível com o entendimento ou sentido que aqui afirmamos, não gerando qualquer desconformidade que suporte a afirmação de um caráter surpreendente do resultado interpretativo.
Como bem observa o Conselheiro LOPES DO REGO no, atrás citado, Ac. do STJ de 13.07.2017 (proc. 669/10), se a lei diz que o remanescente (ou seja, o valor da taxa de justiça que correspondente à diferença entre 275.000 euros e o efetivo valor da causa para efeito de determinação da taxa) deve ser considerado na conta final, se não for determinada a dispensa do seu pagamento, está a dizer que essa dispensa tem de ocorrer antes da conta final.
Ainda sobre este "argumento", em prol da posição aqui sustentada, escreveu-se no Ac. do STJ de 03.10.2017 (proc. 473/12.9TVLSB.C.L1.S1 - JOSÉ RAÍNHO):
"... o teor literal do n.º 7 do art. 6.º do RCP aponta claramente para a bondade da interpretação que se orienta no sentido de que o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem que ser formulado pela parte (caso o não tenha feito anteriormente o juiz) em momento anterior à elaboração da conta de custas. E como nos ensina Oliveira Ascensão (O Direito. Introdução e Teoria Geral, p. 350), aliás em concordância com o que dispõe o n.º 2 do art. 9.º do CCivil, "A letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação". E, de outro lado, diferente interpretação deste normativo levaria a sufragar a prática de atos (a feitura de uma conta final, a sua notificação e, eventualmente, até mesmo algum pagamento entretanto feito) que teriam depois que ser destruídos, logo estaríamos perante a prática de atos inúteis, quando o que é certo é que a lei os proíbe (v. art. 130.º do CPCivil). Mais: outra interpretação levaria ao absurdo da dispensa do pagamento poder ser equacionada sem qualquer limitação temporal (não se argumente com o prazo para reclamar da conta, pois que não é disso que se trata, além de que o exercício da oficiosidade que existe nesta matéria sempre independeria de qualquer prazo), inclusivamente quando estivesse já a correr execução para pagamento da taxa de justiça a dispensar.»(49).
Assim, também o princípio da economia e utilidade dos actos processuais, a que se reporta o artigo 130.º do CPC, aponta para que a decisão sobre a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tenha lugar aquando da pronúncia do juiz quanto à condenação em custas (artigo 527.º, n.º 1 do CPC), ou, sendo aí omitida, na sequência de requerimento de reforma dessa decisão quanto a custas ou do recurso da decisão que condene em custas(50).
15 - E a unidade do sistema jurídico também cauciona a posição aqui defendida.
Com efeito, nos termos do artigo 9.º, n.º 1 do Código Civil, "a interpretação não deve cingir-se à letra da lei", impondo-se, nesta interpretação, ter "sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico".
A taxa de justiça (que corresponde a um montante devido pelo impulso processual e que, como dito, é fixada em função do valor e complexidade da causa) é, em princípio, paga em uma ou duas prestações (cf. n.os 1 e 2 do artigo 14.º do RCP), prevendo-se expressamente que "nas causas de valor superior a (euros) 275.000, o montante da taxa de justiça é considerado na conta a final" (artigo 6.º, n.º 7 do RCP), salvo ocorrendo a dispensa ali prevista.
Ora, não havendo tal dispensa, obviamente que o pagamento da taxa remanescente obedece à decisão final que pôs termo ao processo - sendo que esta decisão que ponha termo ao processo "é a constante da sentença final, ainda que susceptível de recurso"(51).
Assim, a adequada interpretação daquele preceito deverá ser no sentido de que a consideração (ou não) do montante do remanescente da taxa na conta a final, já pressupõe que haja decisão sobre se deve (ou não) ser pago esse remanescente, nos termos do mesmo n.º 7 do artigo 6.º e, consequentemente, que as partes tenham suscitado, atempadamente, ao tribunal a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, o que podem fazer em qualquer altura dos autos, logo que considerem que estes fornecem os elementos necessários à ponderação exigida ao juiz pela norma em causa.”
(…) Efectivamente (e percutindo), aquando do trânsito em julgado da decisão e subsequente e imediata remessa dos autos à conta, fica definitivamente assente a responsabilidade por custas, não podendo a conta deixar de reflectir a dispensa, ou não, do pagamento do remanescente da taxa de justiça, conforme tenha ou não sido atempadamente decidida pelo juiz - isto é, até àquele trânsito em julgado da decisão.
Por outro lado - como se observa no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 11.12.2018 (proc. 1268/14.9TVLSB-A.L1.S2 - PINTO DE ALMEIDA) -, «... a parte dispõe de um prazo indiscutivelmente razoável para exercer a faculdade de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça (que se exprime através de uma declaração que não carece de fundamentação complexa - v., in casu, fls. 78): desde a prolação da decisão final até ao respetivo trânsito em julgado, ou seja, e por referência ao processo civil, nunca menos do que quinze dias (artigo 638.º, n.º 1, do CPC). A este propósito [...], não é correto afirmar-se que só após a notificação da conta a parte tem conhecimento dos montantes eventualmente excessivos que lhe são imputados a título de taxa de justiça. Na verdade, pelo menos após a prolação da decisão final, a parte dispõe de todos os dados de facto necessários ao exato conhecimento prévio das quantias em causa: sabe o valor da causa, a repartição das custas e o valor da taxa de justiça previsto na tabela I do RCP, por referência ao valor da ação. Assim, ressalvada a ocorrência de situações anómalas excecionais [...], a parte não pode afirmar-se surpreendida pelo valor da taxa de justiça refletido na conta: esta joga com dados quantitativos à partida conhecidos»(53).”
Concluiu-se no mencionado AUJ 1/2022 que “(…) a concessão, ou não, da dispensa/redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem de constar da decisão final transitada, trânsito este que se nos afigura como o terminus ad quem (limite até o qual) para a petição e apreciação daquela dispensa.
A partir daí (desse trânsito em julgado da decisão), esgotaram-se as possibilidades de requerer e apreciar a matéria.”
Da jurisprudência uniformizada no AUJ 1/2022, supra citado, apenas poderíamos divergir caso se concluísse pela inconstitucionalidade da interpretação nela afirmada, hipótese também colocada pelo Apelante, a qual, porém, foi devidamente arredada no douto aresto, pelas razões que aqui se reproduzem e que pela assertividade e clareza mais uma vez acompanhamos, não se vislumbrando a violação de princípios constitucionalmente protegidos:
“Da Constitucionalidade da Posição Seguida
A possibilidade concedida ao juiz de dispensar o pagamento de taxa de justiça remanescente em ações de valor tributário superior a (euro) 275 000,00 foi introduzida para fazer face à inconstitucionalidade material de que padecia o regime então em vigor, o qual permitia que fossem impostas às partes custas de valor absolutamente desproporcionado, sem qualquer correspondência com o serviço de administração da justiça prestado, podendo assumir montantes tais que as pessoas se viam compelidas a afastarem-se dos tribunais, num atropelo do direito de acesso à justiça.
Como referido no Ac. da Relação de Lisboa de 28.04.2016(63), «O facto de a lei permitir, atualmente, o referido movimento corretor do valor das custas, poderá fundamentar um juízo de constitucionalidade da lei quanto a esta questão, como, por exemplo, se decidiu no acórdão do STA, de 20.10.2015, processo 0468/15. Mais, existem decisões jurisprudenciais que defendem que, tendo o tribunal rejeitado a reclamação da conta de custas consubstanciada em extemporâneo requerimento de dispensa do pagamento de taxa de justiça remanescente, a aludida questão de inconstitucionalidade nem sequer se põe (vide STA, acórdão de 29.10.2014, processo 0547/14; Relação de Lisboa, de 15.10.2015, processo 6431-09.3TVLSB-A.L1-6)».
Assim, o artigo 6.º do RCP, na redacção consagrada pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, que lhe aditou o n.º 7, não viola normas ou princípios constitucionais.
Isso mesmo é explicado, de forma assaz expressiva, no aludido Acórdão do STA, de 20/10/2015, (proc. n.º 0468/15)(64).
A questão sob apreciação, como é óbvio, tem mera incidência adjectiva, em especial, no que toca ao momento processual em que a redução ou dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça pode ser pedida ou concedida. E sabemos bem que o legislador dispõe de ampla margem de liberdade na concreta modelação do processo, não estando vedada a imposição de ónus processuais às partes. Sem prejuízo, naturalmente, de que os regimes adjectivos que consagrem tais ónus devem revelar-se "funcionalmente adequados, não podendo o legislador criar obstáculos que dificultem arbitrariamente ou de forma desproporcionada o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva"(65).
Embora a discussão que se encontra na jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a incidência da taxa de justiça tenha passado, essencialmente, pelos critérios de fixação do respectivo montante (cf., inter alios, os Acórdãos n.os 352/91, 1182/96, 521/99, 349/2002, 708/2005, 227/2007, 255/2007, 471/2007, 301/2009, 266/2010, 421/13, 604/13, 179/14, 844/14 e 361/2015), o TC teve, porém, oportunidade de se pronunciar directamente sobre a questão da (in)constitucionalidade do n.º 7 do artigo 6.º do RCP), decidindo no Ac. 527/16 «Não julgar inconstitucional a norma extraída do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, introduzida pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, na interpretação segundo a qual é extemporâneo o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça apresentado no processo, pela parte que dele pretende beneficiar, após a elaboração da conta de custas»(66).
Ou seja, a posição aqui sustentada relativamente à interpretação do n.º 6 do artigo 7.º do RCP, não padece de qualquer inconstitucionalidade, seja por violação do princípio da proporcionalidade, seja do princípio do direito de acesso à justiça (note-se que o direito de acesso aos tribunais não compreende um direito a litigar gratuitamente, sendo legítimo ao legislador impor o pagamento dos serviços prestados pelos tribunais(67) e do direito de tutela jurisdicional efectiva.
Da mesma forma, o Tribunal Constitucional tem entendido, de forma uniforme, que a reclamação da conta não é meio adequado a fazer valer uma isenção, pois que tal meio processual se destina apenas a reagir à elaboração irregular da conta, não sendo esse o caso quando ela se mostra conforme à decisão condenatória, transitada em julgado, e à lei(68), raciocínio este que, por identidade de razão, vale para o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
O Tribunal Constitucional também tem referido que "(...) ressalvada a ocorrência de situações anómalas excecionais [...], a parte não pode afirmar-se surpreendida pelo valor da taxa de justiça refletido na conta: esta joga com dados quantitativos à partida conhecidos." (cf. Ac. de 04.10.2016 - proc. n.º 113/16)(69).
Ao que acresce que a Constituição da República não proíbe a existência de prazos preclusivos para o exercício de direitos. Bem pelo contrário: conforme se refere no Ac. do TC n.º 527/2016, "é evidente o interesse na fixação de um momento preclusivo para o exercício da faculdade de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça [...]"(70).
Sendo que o Tribunal Constitucional já afirmou em diversas ocasiões os termos em que é admissível a imposição de ónus processuais associados a efeitos preclusivos, questão que se insere, desde logo, no âmbito do artigo 20.º, n.º 4, da Constituição.
Isso mesmo se vê nos Acórdãos do TC n.os 275/99, 620/13, 774/14, 442/2015, 277/16 e 96/16(71).
Como se escreveu no Ac. do STA de 20.10.2015 (proc. 0468/15), a propósito do aditamento daquele n.º 7 do artigo 6.º do RCP, «se antes do aditamento se poderia colocar a questão da constitucionalidade do referido art. 6.º tal deixou de se verificar já que não se pode falar de inconstitucionalidade apenas porque a parte deixou decorrer o prazo e meio adequado para fazer valer um direito que a lei lhe concedia.
É certo que, como resulta dos artigos 18.º e 20.º da CRP o "processo tem de ser equitativo e propiciar uma tutela plena, efetiva e em tempo útil, dos concretos direitos, liberdades e garantias pessoais, sobre os quais exista litígio ou simplesmente ameaça dele" e "também há de ser o adequado para a obtenção da específica tutela que decorre da titularidade dos específicos direitos, liberdades ou garantias pessoais que estejam em causa."(Acórdão do Tribunal Constitucional 178/2007).
Mas nem por isso deixa o legislador ordinário de ter uma margem de ponderação constitutiva sobre o modo como deve ser "desenhado" o figurino processual adequado à efetivação jurisdicional da tutela própria dos específicos direitos ou interesses legalmente protegidos.
Se o legislador estipulou certas regras para dar resposta a certas exigências específicas de direitos até de matriz constitucional a proteger não pode defender-se, sem mais, que os mesmos deviam ser salvaguardados por outros mecanismos ou interpretações que não constam de uma interpretação legal dos preceitos, apenas para dar uma maior tutela dos direitos do que a já consagrada, quando esta é suficiente e adequada à proteção dos mesmos.
Na verdade, não é pelo facto de se discordar do mecanismo que o legislador encontrou como o meio mais adequado para fazer valer um direito que deixa de ocorrer a tutela efetiva do mesmo, que se negue o acesso à justiça ou se introduza um sistema desproporcionado.
Ora, a possibilidade consagrada pelos preceitos em causa de, em sede de pedido de reforma da decisão de custas, fazer adequar a taxa de justiça concreta a pagar ao processado permite a efetivação daqueles princípios constitucionais.
A tutela efetiva e o acesso à justiça realizaram-se e mostram-se efetivados no caso e não saem beliscados pelo facto do titular do direito não ter usado tempestivamente dos meios adequados a fazer valer o direito em causa quando existiam os mecanismos legais para o efetivar.»(72).
Há que ver, sim, é se há uma particular dificuldade na satisfação do ónus de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça em momento anterior ao trânsito em julgado da decisão (portanto, em momento anterior ao da elaboração da conta que se segue, por regra, a esse trânsito).
Obviamente (como e pelas razões que vimos apontando) que se não vislumbra essa dificuldade.
E, na senda do já referido, o Tribunal Constitucional (cf. Ac. 527/2016) igualmente reforça que «a gravidade da consequência do incumprimento do ónus - que consiste na elaboração da conta sem a redução ou dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça - é ajustada ao comportamento omitido. Não se vê, aliás, que pudesse ser outra: se a parte não deduziu o pedido correspondente, a conta é elaborada nos termos gerais decorrentes da tabela legal.
Não se trata, [...], de um resultado implícito, "não discernível" a partir do texto da lei. Desde logo, a própria redação do preceito ("[...] o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se...") - independentemente da melhor interpretação no plano infraconstitucional, aspeto do qual, insiste-se, não cabe cuidar - é indubitavelmente compatível com o sentido afirmado na decisão recorrida, não gerando qualquer desconformidade que suporte a afirmação de um caráter surpreendente do resultado interpretativo.».
E acrescenta: «Ademais, pela aplicação da norma em causa, a parte não fica impedida de "[...] sindicar a legalidade do ato de liquidação operado pela secretaria" nem se vê privada de "[...] questionar a adequação das quantias efetivamente liquidadas às concretas especificidades do processo", como vem alegado pela Recorrente. Na verdade, se a conta não refletir adequadamente a condenação que a suporta ou não calcular corretamente o valor da taxa de justiça previsto na tabela legal, a parte pode dela reclamar nos termos do artigo 31.º do RCP. Simplesmente, o valor da taxa de justiça correto, para estes efeitos, será considerado na íntegra caso a parte não tenha, em tempo, deduzido o pedido de dispensa ou redução respetivo.»(73).
Assim, portanto, as partes não podem dizer que ficaram surpreendidas ao serem confrontadas, na conta, com a obrigação de pagar o remanescente da taxa de justiça, pois (como referido) tiveram tempo mais que razoável para requerer a dispensa de pagamento desse remanescente: até ao trânsito em julgado da decisão.”
Poderíamos ter optado por simplesmente dar aqui por integralmente reproduzida a fundamentação do AUJ 1/2022, que como vimos refuta a argumentação recursiva, no entanto, consideramos que deste modo, apesar das longas citações, clarificada fica a opção jurisprudencial que afastou as razões invocadas no presente recurso e que eram acolhidas até então por alguma jurisprudência, posição essa que foi a defendida pelo Apelante mas da qual dissentimos, confirmando-se assim o sentido da decisão recorrida.
Em suma, os fundamentos subjacentes ao pedido de dispensa ou redução de pagamento do remanescente da taxa de justiça apresentado pelo Apelante não podem ser apreciados uma vez que tal pedido não foi apresentado atempadamente, tendo ficado precludido tal direito.
Relativamente ao pedido subsidiário de pagamento em prestações, admitido pelo art. 33º do RCP, atempadamente apresentado, uma vez que o Tribunal o concedeu na exacta medida do que havia sido peticionado pelo Apelante, contra ele não se tendo insurgido, nada mais há a decidir.
*
V. DECISÃO:
Em razão do antes exposto, decide-se julgar improcedente o presente recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo Apelante, que ficou vencido.
Notifique.

Porto, 14 de Outubro de 2025
Maria da Luz Seabra
João Ramos Lopes
Pinto dos Santos

(O presente Acórdão não segue na sua redação o Novo Acordo Ortográfico)