Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | ANA LUÍSA LOUREIRO | ||
| Descritores: | PROCEDIMENTO CAUTELAR DE ARRESTO PROBABILIDADE DE EXISTÊNCIA DO CRÉDITO | ||
| Nº do Documento: | RP202501231163/23.5T8STS.P1 | ||
| Data do Acordão: | 01/23/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - O arresto preventivo depende, em conformidade com o disposto no art. 392.º, n.º 1, do CPC, da verificação de duas circunstâncias: a probabilidade de existência do crédito; o justo receio de perda da garantia patrimonial. II - Não resultando indiciariamente provada a existência do pretenso direito de crédito (indemnização pelo prejuízo decorrente da falta de restituição de imóvel objeto de contrato de comodato celebrado com o requerido, após interpelação deste para tal restituição), mas antes factualidade que indicia uma relação jurídica distinta – arrendamento –, falece o pressuposto da provável existência do direito de crédito. III - Ainda que fosse titular de outro direito de crédito (não alegado) emergente de relação jurídica distinta da por si configurada e alegada, não poderia ser decretado qualquer arresto de bens para garantir tal outro pretenso e indeterminado crédito (fundado em rendas vencidas e não pagas, não alegadas), por tal se traduzir numa completa distorção e violação de princípios basilares do processo civil: princípio do pedido e da contradição e proibição de decisões surpresa (art. 3.º do Cód. Proc. Civil), ónus de alegação e poderes de cognição do tribunal (art. 5.º do Cód. Proc. Civil), princípio da estabilidade da instância (arts. 260.º, 264.º e 265.º do Cód. Proc. Civil), limites da instrução e da decisão (arts. 411.º e 609.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil). | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo 1163/24.5T8STS.P1– Apelação Tribunal a quo Juízo Local Cível de Santo Tirso – Juiz 2 Recorrente(s) AA Recorrido(a/s) A... – Unipessoal, Lda. BB *** Requerimento de 14-01-2025 (ref. 409427):Atenta a junção aos autos da procuração, outorgada em 23 de abril de 2008 pelo sócio da sociedade A... Unipessoal, L.da., BB, na qual este confere ao requerido BB, entre outros, poderes para “representar a sociedade em processos judiciais e constituir mandatários judiciais para o efeito”, mostra-se regularizado o mandato judicial conferido pela sociedade requerida ao ilustre advogado subscritor da oposição ao arresto, mediante a procuração datada de 10/07/2024 junta com o requerimento de 15/07/2024 (ref. 39642767). Notifique. *** Sumário:……………………………… ……………………………… ……………………………… *** Acordam na 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:I – Relatório Identificação das partes e indicação do objeto do litígio AA intentou em 11-04-2024 procedimento cautelar de arresto contra A... – Unipessoal, Lda. e BB, peticionando «(…) o arresto dos bens móveis sitos na Rua ..., ... ..., no valor de € 6.300,00 (…)». Fundamentou tal pedido alegando que emprestou ao requerido BB o armazém 4, e que a sociedade requerida, da qual o requerido é gerente, sem o requerido consultar o requerente, se mudou para o armazém e aí começou a laborar, tendo o requente interpelado o requerido BB para lhe restituir o armazém até ao dia 31/10/2023, não tendo nem o requerido nem a sociedade requerida procedido à entrega do referido armazém, continuando a sociedade a aí laborar, estando o requerente privado de receber € 1.050,00 mensais, correspondente à renda que estaria a receber se tivesse arrendado o imóvel a um inquilino que lhe oferecia esse valor, ascendendo o seu crédito sobre os requeridos a € 6.300,00, não sendo conhecidos bens ao requerido e sendo as máquinas existentes no interior do armazém, que ‘admite estarem na esfera jurídica da sociedade requerida’, os únicos bens conhecidos. Em 20/05/2024, após produção dos meios de prova arrolados pelo requerente, foi proferida a seguinte decisão: (…) (J)ulga-se o procedimento cautelar intentado pelo Requerente AA procedente e, consequentemente, para garantia do direito de crédito no valor de € 6.300,00 (seis mil e trezentos euros), acrescido dos respetivos juros de mora, decreta-se o arresto das máquinas e demais bens móveis existentes no interior do pavilhão 4 localizado no prédio urbano afeto a indústria sito na Rua ..., lugar ... ou ..., freguesia ..., concelho de Santo Tirso. (…). Em 27/05/2024 foi efetuado o arresto de 9 verbas existentes no interior do referido armazém, conforme Auto de Arresto na mesma data junto ao processo (ref. 460564847). Citados, os requeridos apresentaram em 15/07/2024 oposição, por impugnação, alegando que o contrato celebrado entre as partes foi um contrato de arrendamento pelo valor mensal de € 1.100,00, que os requeridos pagaram até ao mês de abril de 2024, por o requerente, em março de 2024, ter trocado as fechaduras do armazém e impedido os requeridos de acederem ao mesmo, sendo o contrato de comodato simulado, por imposição do requerente porque não queria pagar imposto. Concluem pela revogação do arresto decretado. Em 25/09/2024, após realização da audiência final, com produção dos meios de prova arrolados pelos requeridos, foi proferida decisão que revogou o arresto decretado em 20/05/2024 e, consequentemente, determinou o seu levantamento. Inconformado, o requerente interpôs recurso de apelação dessa decisão, apresentando as seguintes conclusões: 1 - Os contratos têm os seus dizeres e não podemos extrapolar o que lá está escrito. 2 - Em momento algum e em lado nenhum existe qualquer acordo com a sociedade A... sendo que a ocupação do espaço em questão pela sociedade vai contra o que está escrito. 3 - O Requerente não autorizou que a sociedade (Requerida) instalasse máquinas no imóvel, de que é possuidor. 4 - Em lado nenhum se escreveu, nem o Requerente o disse, que seria o proprietário do imóvel. 5 - São factos que não podem passar em claro, nem podem ser deturpados — não existe qualquer documento nesse sentido. 6 - De toda a forma, o Requerente continua credor de várias quantias, sendo certo que a revogação da decisão vai aumentar o seu crédito, não sendo possível ser ressarcido das mesmas (das várias quantias). 7 - Conforme consta dos autos, a A... está numa situação irregular, sendo certo que o Tribunal terá que tomar partido (emitir decisão) sobre isso. 8 - Sendo certo que não tem gerente há muitos anos. 9 - Consequentemente, não é possível que exista uma procuração que legitime a posição (postura) do Requerido, nem a mesma consta dos autos. 10 - A A... ao fixar o seu estabelecimento no espaço em causa nos autos, violou o que estava escrito e o que tinha sido acordado entre Requerente e Requerido. 11 - Será importante apurar se as quantias entregues ao Requerente o foram feitas pelo Requerido (BB) ou pela Requerida (A...), atenta a ausência de prova. 12 - Não existem provas nos autos de eventuais pagamentos de electricidade e gás, etc. previstos no documento. 13 - De igual modo, não sabemos se foi a sociedade (a Requerida) ou o Requerido que instalaram as máquinas no imóvel. Não foi produzida qualquer prova quanto a isso. 14 - Reiterando: o Requerente jamais e em lado nenhum declarou autorizar a instalação da Requerida! 15 - Quanto aos documentos (extractos bancários) apenas demonstram transferências bancárias da conta do Requerido para a conta do Requerente — nada mais, 15 e 16 16 - Não sabemos, nem temos forma de saber, a que dizem respeito tais transferências. Se pagamento de rendas, obras, electricidade ou outras coisas. 17 - Apenas podemos afirmar que o Requerente é credor e continuará a ser até que lhe paguem o que devem. 18 - A presente providência é prévia de uma cobrança de dívida. 19 - O propósito primeiro foi que o pavilhão lhe fosse entregue — o que já ocorreu. 20 - De igual modo se pretendeu terminar a devassa do espaço e que o Requerido não ocupasse espaço que não constaria do contrato — o que já aconteceu, fruto do decretamento da providência. 21 - Já sabemos todos que o Requerido não tem onde cair morto e o montante da sua reforma... 22 - O propósito será terminar com o vínculo existente entre ambos. 23 - Sabemos todos que o Requerido proporcionou a terceiro o uso da coisa. 24 - De igual modo, o Requerente teve que lançar mão da presente providência para que o imóvel lhe fosse restituído. 25 - Apesar da interpelação para a restituição, esta não ocorreu e em bom rigor não podemos dizer que o vínculo se encontrava em vigor. 26 - Repetindo: foram muitas as quantias que o Requerido não pagou e que oportunamente se reclamará. Conclui pela revogação da decisão recorrida mantendo-se a decisão que havia decretado a providência. Não foi apresentada resposta às alegações do recorrente. Após os vistos legais, cumpre decidir. II – Objeto do recurso: Sendo as conclusões das alegações de recurso que – exceto quanto a questões de conhecimento oficioso – delimitam o objeto e âmbito do recurso, nos termos do disposto nos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 e n.º 2, ambos do Cód. Proc. Civil, cumpre apreciar se há erro da decisão recorrida ao considerar inexistente o direito de crédito alegado pelo requerente/apelante. Acresce a responsabilidade por custas. III – Fundamentação Fundamentação de facto É a seguinte a fundamentação de facto da sentença recorrida (tal como decidido pelo tribunal ‘a quo’): A) Factos indiciariamente provados 1. Desde 2018 que o Requerente AA tem as chaves da porta de acesso ao interior do pavilhão 4 localizado no prédio urbano afeto a indústria sito na Rua ..., lugar ... ou ..., freguesia ..., concelho de Santo Tirso, à vista de toda a gente, com a convicção de exercer um direito de propriedade. 2. A Requerida A..., UNIPESSOAL LDA tem como objeto a atividade de estamparia, afigurando-se o Requerido BB como pai do gerente da mesma. 3. Em 15 maio de 2019, o Requerente AA subscreveu um escrito com a epígrafe “Contrato de Comodato”, o qual consigna, designadamente, que: “ENTRE: PRIMEIROS OUTORGANTES: AA, divorciado, com o NIF ..., portador do Bilhete de Identidade no ... vitalício, residente na Rua ..., ... freguesia ..., Concelho de Santo Tirso, aqui na qualidade de Comodante e doravante apenas designados por Primeiro Outorgante. E, SEGUNDO OUTORGANTE: BB com o NIF ..., portador do Cartão de Cidadão... ... válido até 19/03/2028 casado, maior, residente na Rua ..., freguesia ..., Concelho de Santo Tirso, aqui na qualidade de Comodatário, e doravante apenas designado por Segundo Outorgante. É celebrado e reciprocamente aceite o presente Contrato de Comodato que se rege pelas seguintes Cláusula Primeira O Primeiro Outorgante É possuidor de parte de um pavilhão para industria, localizado na Rua ..., que será transmitida ao Primeiro Outorgante a propriedade de exatamente metade do pavilhão de construção mais recente sito na Rua ..., Sito Lugar ... ou ..., freguesia ..., Concelho de Santo Tirso, inscrito na respectiva matriz sob o artigo ..., e descrito na competente Conservatória do Registo predial sob o n o ..., titular do prédio, que se encontram em perfeitas condições de uso, e em estado de gozo imediato. Cláusula Segunda Pelo presente contrato, o Primeiro Outorgante entrega na presente data ao Segundo Outorgante o prédio identificado na cláusula primeira deste contrato, destinando-se o mesmo exclusivamente à sua utilização e uso, da sua atividade profissional, estamparia têxtil. Cláusula Terceira O contrato é celebrado pelo período de Um ano, com início no dia 15 de Maio de 2019, e termo no dia 30 de Abril de 2020, podendo, no entanto, ser sucessivamente renovado por períodos sucessivos de um ano, enquanto não for rescindido por qualquer dos outorgantes, com uma antecedência mínima de 30 (trinta dias) do termo do prazo de cada uma das renovações. Cláusula Quarta Findo o prazo estabelecido na cláusula anterior, o Segundo Outorgante obriga-se a restituir ao Primeiro Outorgante o prédio identificado na cláusula primeira do presente contrato, em boas condições de conservação e totalmente livre de pessoas e coisas. Cláusula Quinta No caso de o Segundo Outorgante não proceder à entrega do prédio emprestado, na data referida na cláusula anterior fica obrigada a pagar ao Primeiro Outorgante a título de cláusula penal a quantia de 100,00 € (cem euros), por cada dia de atraso, até à entrega do prédio objeto do presente contrato. Cláusula Sexta 1. O prédio aqui emprestado destina-se única e exclusivamente aos fins previstos na Cláusula Segunda do presente contrato, sendo-lhe vedado destinar ou aplicar o mesmo a quaisquer outros fins. Paragrafo Único: Fica a cargo do Segundo Outorgante a realização de quaisquer obras necessárias ou convenientes ao exercício da atividade, bem como a obtenção de licenças, alvarás ou autorizações, determinadas legalmente para a sua atividade. 2. O comodatário não poderá dar fim diverso ao prédio daquele a que o mesmo se destina, sendo ainda vedado a cedência, no todo ou em parte, onerosa ou gratuitamente sem para isso estar autorizado, dos direitos que por este contrato lhe são conferidos. Cláusula Sétima 1. A requisição dos contadores de água, energia elétrica, será da responsabilidade do Segundo Outorgante, que os poderá solicitar de imediato às entidades competentes. 2. Todos os consumos de energia elétrica, água, telefone, acesso à internet, taxas de saneamento e recolha de lixos durante a vigência do presente contrato de comodato, correm por conta do Segundo Outorgante. Cláusula Oitava O Segundo Outorgante, obriga-se sob pena de indemnização a: a) Conservar em bom estado, como actualmente se encontram as instalações industriais, luz e respectivos acessórios, ficando com o encargo das reparações necessárias, no caso de rompimento ou entupimento, relativas a deteriorações e danificações, excetuando as que se verificarem no interior das paredes. b) Manter em bom estado as paredes, pavimentos, portas, estores e vidros. Cláusula Nona O comodatário obriga-se a: a) Guardar e conservar as coisas emprestadas; b) Facultar, mediante aviso prévio ao Primeiro Outorgante o acesso e exame do prédio; c) Não aplicar a fim diverso daqueles a que as coisas se destinam; d) Não fazer do prédio uma utilização imprudente; e) Não proporcionar a terceiro o uso das coisas, excepto se o comodante autorizar expressamente por escrito; f) Avisar imediatamente o comodante, sempre que tenha conhecimento de vícios no espaço comum, ou saiba que o ameaça algum perigo ou que terceiro se arroga direitos em relação a ele, desde que o facto seja ignorado dos comodantes; g) Restituir o prédio findo o contrato.” 4. No circunstancialismo indicado em 3), o Requerente AA e o Requerido BB declararam acordar que o antedito pagaria ao Requerente a quantia mensal de €1.100,00 (mil e cem euros) com referência à utilização do sobredito pavilhão e também suportaria as respetivas despesas de eletricidade e gás. 5. No circunstancialismo mencionado em 3), o Requerente AA entregou ao Requerido BB as chaves da porta de acesso ao interior do sobredito pavilhão. 6. Na sequência do enunciado em 3) a 5), no decurso do ano de 2019, o Requerido BB instalou no sobredito pavilhão máquinas de estampagem utilizadas na atividade da predita sociedade, o que o Requerente declarou autorizar. 7. Desde o circunstancialismo mencionado em 6), a Requerida A..., UNIPESSOAL LDA fixou o seu estabelecimento empresarial no sobredito pavilhão, efetuando no mesmo a atividade de estampagem. 8. Com referência à quantia mensal de €1.100,00 (mil e cem euros) referenciada em 4), o Requerido BB efetuou, designadamente, os seguintes pagamentos: - 07/05/2020: €400,00; - 20/05/2020: €400,00; - 20/05/2020: €200,00; - 03/06/2020: €500,00; - 20/12/2020: €500,00; - 28/12/2020: €400,00; - 18/05/2021: €600,00; - 08/06/2021: €500,00; - 30/11/2021: €500,00; - 23/12/2021: €450,00; - 24/12/2021: €400,00; - 10/01/2022: €500,00; - 14/01/2022: €500,00; - 28/02/2022: €500,00; - 02/05/2022: €380,00; - 28/06/2022: €400,00; - 13/07/2022: €400,00; - 21/09/2022: €300,00; - 10/01/2023: €300,00. 9. Em 19/09/2023, o Requerente AA remeteu uma missiva sob registo postal para a residência do Requerido BB, recebida pelo mesmo em 25/09/2023, consignando: “Em virtude de não cumprimento do acordo efetuado de boa fé em 15 de maio de 2019 para cedência do armazém sito na Rua ... na freguesia ..., em que o acordado seria que todas as despesas inerentes ao bom funcionamento (eletricidade, água, etc) e melhorias efetuadas por mim no referido armazém em vosso proveito, que liquidaria um valor compensatório mensal. valor este para liquidação das despesas atrás mencionadas, que não estão a ser cumpridos como combinado. Venho por este meio dar um prazo de 10 dias para liquidação dos valores em atraso. E, como não estão reunidas as condições pré estabelecidas das condições de utilização do armazém, pela sua arrogância e falta de ética por um lado, e pelo seu desdém e desprezo que demonstra pela ajuda que dei ao longo destes anos, fica desde já avisado para que desocupe o espaço até ao dia 30 de Outubro de 2023". 10. Estima-se o valor locativo mensal do pavilhão indicado em 1) em cerca de €1.050,00 (mil e cinquenta euros). 11. No decurso dos primeiros meses do ano de 2023, o Requerente foi contactado por diversas pessoas não concretamente identificadas, que declararam pretender arrendar o pavilhão referenciado em 1) com efeitos a 2023 e com referência à renda mensal enunciada em 10). 12. A Requerida A..., UNIPESSOAL LDA continuou a efetivar a atividade de estampagem no antedito pavilhão até ao abril/maio de 2024. 13. Em decorrência do descrito em 12), o Requerente declarou às pessoas mencionadas em 11) que não poderia ceder o mesmo para arrendamento. 14. Estima-se o valor das máquinas enunciadas em 6) em cerca de €5.000,00 (cinco mil euros). 15. O Requerido BB está reformado, auferindo a pensão mensal de €800,63 (oitocentos euros e sessenta e três cêntimos). 16. Após o indicado em 3) a 5), a Requerida A..., UNIPESSOAL LDA depositou na Conservatória do Registo Comercial apenas as prestações de contas referentes aos anos de 2019 a 2021. 17. Com referência ao ano/exercício de 2022, a Requerida A..., UNIPESSOAL LDA não apresentou na AT a declaração de IRC. B) Factos indiciariamente não provados 18. A quantia de €1.100,00 (mil e cem euros) enunciada em 4) foi acordada entre o Requerente AA e o Requerido BB a título de compensação de obras realizadas no pavilhão pelo Requerente. 19. Nos meses de fevereiro/março de 2024, o Requerente AA trocou a fechadura da porta de acesso ao sobredito pavilhão. Análise dos factos e aplicação da lei São as seguintes as questões de direito a abordar: 1. Fundamentos do recurso 1.1. Irregularidade da sociedade requerida – falta de procuração 1.2. Requisito da provável existência do crédito. 2. Responsabilidade pelas custas 1. Fundamentos do recurso O apelante não impugnou a decisão de facto, pelo que são absolutamente inócuas as conclusões 3, 11, 12, 14, 15 e 16 do recurso, por não estar em causa qualquer reapreciação da decisão de facto – que não foi solicitada pelo apelante, também não observando o recurso interposto quaisquer dos ónus estabelecidos no art. 640.º do Cód. Proc. Civil –, antes se restringindo o âmbito do recurso à subsunção jurídica da factualidade indiciariamente provada na decisão recorrida. Assim, são apenas duas as questões passíveis de apreciação suscitadas nas conclusões das alegações de recurso. A primeira respeita à omissão de pronúncia pelo tribunal recorrido quanto à arguição da “situação irregular da sociedade requerida”, por a sociedade não ter gerente nomeado, não existindo nos autos procuração outorgada pela sociedade requerida. A segunda refere-se à arguição de que, mesmo considerando o enquadramento jurídico dos factos efetuado pelo tribunal recorrido, continua o requerente a ser credor do requerido. 1.1. Irregularidade da sociedade requerida – falta de procuração Resulta da compulsão dos autos que o apelante – que inclusive alegou inicialmente ser o requerido gerente da sociedade (requerimento de 17/04/2024, ref. 38780991) – veio, por requerimento de 18/04/2024 (ref.38794795), alegar que “após consulta da certidão do registo comercial da sociedade apurou que esta não tem qualquer gerente, estando em situação irregular”, tendo por requerimento de 26/07/2024 (ref. 39741106) reiterado que “a sociedade está numa situação irregular” pelo que “não pode ser conferido o mandato e a sociedade não pode apresentar oposição”, pelo que “deve a mesma ser considerada como não escrita uma vez que não é possível o seu desentranhamento”. Com fundamento nesta arguição da “situação irregular da sociedade” deduziu o apelante uma única pretensão processual: a ‘desconsideração’ da oposição por não poder a sociedade conferir mandato nem, consequentemente, apresentar oposição. Da tramitação da ação resulta manifesto que o tribunal recorrido considerou a oposição junta aos autos, tendo a ação tido a tramitação processualmente prevista subsequente à apresentação dessa oposição, ainda que não se tenha pronunciado expressamente sobre tal alegação da requerente para consideração da oposição como ‘não escrita’. Tal pretensão do requerente e apelante sempre estaria votada ao insucesso: ainda que houvesse base legal (que o requerente/apelante não indica qual seja, nem se vislumbra existir) para a pretendida consideração da oposição apresentada pela sociedade requerida como ‘não escrita’, sempre subsistiria a necessidade de consideração da oposição, já que a mesma também foi deduzida pelo requerido BB. Da compulsão da certidão do registo comercial da sociedade A..., Unipessoal, L.da., cuja junção ao processo foi oficiosamente determinada pelo tribunal recorrido (despacho de 17/05/2024, ref. 460145604), resulta que o sócio da mesma é BB e que tal sócio, nomeado gerente por deliberação de 27 de fevereiro de 2008 (registo efetuado pela Ap. ... de ...), renunciou à gerência em 8 de abril de 2008 (registo efetuado pela Ap. ... de ...), não constando da referida certidão registo de nomeação de novo gerente. Contrariamente ao que a apelante parece entender, a falta de nomeação de gerente não torna ‘impossível’ a constituição pela sociedade de mandatário judicial, nem a apresentação pela sociedade requerida de oposição ao arresto decretado. Faltando o gerente é o sócio que assume os poderes de gerência (arts. 253.º e 270.º-G do Cód. das Sociedades Comerciais), podendo, por conseguinte, outorgar procuração a conferir mandato judicial em representação da sociedade. No caso em análise, sendo certo que existia uma irregularidade do mandato conferido pela sociedade ao ilustre advogado subscritor da oposição – por a procuração junta em nome da sociedade estar subscrita pelo requerido, que não é o sócio nem gerente desta –, a mesma já foi sanada, na sequência do despacho de 09/01/2025 proferido neste tribunal de recurso, conforme já decidido preliminarmente a este Acórdão, face à junção da procuração outorgada pelo sócio da sociedade a conferir poderes de representação da sociedade ao requerido BB, que outorgou a procuração de 15/07/2024 a conferir, em representação da sociedade, mandato judicial ao ilustre advogado subscritor da oposição ao arresto nessa mesma data apresentada. 1.2. Requisito da provável existência do crédito. O arresto, enquanto procedimento cautelar especificado, visa afastar o perigo de demora da decisão a proferir (ou já proferida caso em que se destina a garantir o pagamento do crédito já existente) na ação de que é dependência, nos termos do art. 364.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil. Assim (sem prejuízo dos casos de inversão do contencioso), a decisão a proferir não constitui uma apreciação ou juízo definitivo da existência do direito mas uma decisão provisória fundada numa averiguação perfunctória da existência desse direito, destinada a garantir a efetividade do direito de crédito acautelado. O arresto preventivo depende, em conformidade com o disposto no art. 392.º, n.º 1, do CPC, da verificação de duas circunstâncias: a probabilidade de existência do crédito; o justo receio de perda da garantia patrimonial. No que concerne à probabilidade de existência do crédito, exige-se que exista um "fumus boni iuris", ou seja, que se possa afirmar como verosímil ou provável o direito de crédito cuja efetividade se pretende acautelar através do arresto requerido. Quanto ao primeiro requisito – probabilidade de existência do crédito –, o requerente invocou ser titular de um crédito de € 6.300,00 sobre os requeridos, depreendendo-se suficientemente da alegação efetuada no requerimento inicial, completada pelos esclarecimentos prestados em 17/04/2024 (ref. 38780991), que tal crédito corresponde ao valor mensal da renda de € 1.050,00 que o requerente alega ter deixado de obter, por se ter visto impedido de arrendar o imóvel (emprestado ao requerido e ocupado pela sociedade), em consequência da não restituição do imóvel pelo requerido e manutenção da sua ocupação pela sociedade, apesar de o requerente ter interpelado o requerido para desocupar o imóvel que lhe havia emprestado gratuitamente até 31/10/2023, ascendendo o referido crédito de € 6.300,00 ao referido valor de € 1.1050,00 multiplicado por 6 meses (novembro e dezembro de 2023; janeiro a abril de 2024), contabilizados a partir da data em que devia ter sido efetuada a restituição exigida e até à propositura, em abril de 2024, da providência cautelar de arresto: 6 meses x € 1.050,00 = € 6.300,00. Atenta a factualidade alegada pelo requerente como fundamento do invocado crédito, este emerge do incumprimento, pelo requerido, da obrigação de restituição do imóvel que o requerente lhe emprestou para ser usado pelo mesmo, de forma gratuita. A causa de pedir, tal como foi configurada pelo requerente, consistiu na alegação do concreto dano da perda de obtenção de proveitos decorrentes da impossibilidade de arrendamento do imóvel a terceiro em consequência do incumprimento pelo requerido BB da obrigação de restituição de imóvel objeto de contrato de comodato celebrado com o requerente, sem estipulação de prazo, sendo fundamento da pretensa responsabilidade da sociedade requerida a manutenção, pela mesma, da ocupação ilícita do referido espaço a partir da data em que foi exigida ao requerido a restituição do imóvel (arts. 1129.º, 1135.º, 1137.º, n.º 2, 762.º e 798.º, e arts. 483.º e 562.º a 564.º, todos do Cód. Civil). Ora, da factualidade apurada não resulta indiciariamente provado contrato de comodato invocado pelo requerente; o que se indicia é, antes, uma ocupação lícita do imóvel, fundada num contrato de arrendamento não rescindido, alegado pelos requeridos na oposição deduzida. Ou seja, o requerente fundou a causa de pedir do pretenso crédito na alegação da celebração com o requerido de um contrato de comodato e do incumprimento pelo requerido da obrigação de restituição do imóvel entregue, sendo o incumprimento dessa obrigação de restituição o facto gerador dos danos cujo direito de indemnização constitui o crédito alegado; o que emerge dos factos provados indicia a existência de uma relação jurídica distinta – arrendamento – que não suporta a afirmação do direito de crédito de € 6.300,00 alegado, referente ao prejuízo sofrido pelo requerente com a ocupação ilícita do referido armazém. Ainda que o requerente pudesse, eventualmente, ser titular de um qualquer outro direito de crédito (aqui não alegado), não pode obviamente obter neste procedimento cautelar qualquer arresto de bens para garantir tal outro qualquer pretenso e indeterminado crédito (fundado em rendas vencidas e não pagas, não alegadas), distinto do direito de crédito que alegou neste procedimento e fundado numa relação jurídica distinta da que aqui alegou, ainda que as partes dessa outra relação jurídica possam ser as mesmas. Tal traduzir-se-ia numa completa distorção e violação de princípios basilares do processo civil: princípio do pedido e da contradição e proibição de decisões surpresa (art. 3.º do Cód. Proc. Civil), ónus de alegação e poderes de cognição do tribunal (art. 5.º do Cód. Proc. Civil), princípio da estabilidade da instância (arts. 260.º, 264.º e 265.º do Cód. Proc. Civil), limites da instrução e da decisão (arts. 411.º e 609.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil). Concluímos, deste modo, pela inexistência do invocado direito de crédito de € 6.300,00 do requerente – seja por rendas vencidas e não pagas, de resto, não alegadas (e que integram uma causa de pedir distinta da que fundamenta o direito de crédito alegado pelo requerente); seja pelo prejuízo decorrente da impossibilidade de arrendar o imóvel por força da ocupação ilícita do imóvel (uma vez que o que se indica é uma ocupação lícita do imóvel). Em conformidade, falecendo o preenchimento do primeiro dos pressupostos de que depende o decretamento da providência cautelar de arresto, é de confirmar a decisão recorrida, improcedendo a apelação. 2. Responsabilidade pelas custas A decisão sobre custas da apelação, quando se mostrem previamente liquidadas as taxas de justiça que sejam devidas, tende a repercutir-se apenas na reclamação de custas de parte (art. 25.º do Reg. Custas Processuais). A responsabilidade pelas custas da apelação cabe ao apelante, por ter ficado vencido (art. 527.º do Cód. Proc. Civil). IV – Dispositivo Pelo exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão apelada. Custas a cargo do apelante, por ter ficado vencido (art. 527.º do Cód. Proc. Civil). * Notifique.*** Porto, 23/1/2025(data constante da assinatura eletrónica) Ana Luísa Loureiro Isabel Rebelo Ferreira João Venade |