Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
8322/18.8T8PRT.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ISABEL SILVA
Descritores: NULIDADE POR EXCESSO DE PRONÚNCIA
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
RESPONSABILIDADE CIVIL POR FACTOS ILÍCITOS
Nº do Documento: RP202401118322/18.8T8PRZ.P2
Data do Acordão: 01/11/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A imputação a uma empresa de manutenção de elevadores (F...) de responsabilidade civil por factos ilícitos tem de ser perspetivada em função das normas de segurança impostas pelo Regulamento de Segurança dos Elevadores Elétricos (RSEE), mas dentro do quadro dos deveres de manutenção a que esteja contratualmente obrigada.
II - O RSEE considera ainda dentro das margens de segurança: (i) um desnivelamento entre a porta da cabina e a porta do patamar que não exceda 5 cm; (ii) e que o desencravamento da porta do patamar possa acontecer numa extensão máxima de 17 cm (para cima ou para baixo) do patamar.
III - Ocorrendo um sinistro dentro dessas margens de segurança, e provando-se que a F... cumpriu os seus deveres contratuais, não pode a mesma ser responsabilizada em termos de ilícito civil.
IV - Provando-se que a F... alertou o Condomínio da necessidade de reparação/substituição de peças, a ter repercussão nos desnivelamentos entre a cabina e os patamares, apresentou orçamento para o efeito, que não foi aceite pelo Condomínio, deve entender-se que empregou as providências exigidas pelas circunstâncias para evitar sinistros (art.º 493º do CC).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 8322/18.8T8PRT.P2

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I – RESENHA HISTÓRICA DO PROCESSO
1. AA instaurou ação contra A..., Lda., B..., Companhia de Seguros, SA, C..., SA e D..., Companhia de Seguros, SA, pedindo a sua condenação solidária a pagarem-lhe a quantia de 38.228,00 €, acrescida de juros moratórios, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais causados ao seu pai e, a si própria, a título do dano morte.
Alicerçou o seu pedido referindo ser filha única e universal herdeira de BB, falecido em 2016, o qual era proprietário de uma fração autónoma pertencente a um condomínio administrado pela 1ª Ré, que celebrou um contrato de seguro com a 2ª Ré; a manutenção do ascensor que serve o prédio está a cargo da 3ª Ré, que celebrou contrato de seguro de responsabilidade civil com a 4ª Ré. Em 2015 ocorreu um sinistro no ascensor, que originou a queda do pai, provocando-lhe fraturado do colo do fémur direito e motivou o seu internamento hospitalar. O sinistro foi da responsabilidade das Rés, que se recusam a pagar os danos ocorridos.
Em contestação,
(i) A Ré A... suscitou a sua própria ilegitimidade, bem como a da Autora, e impugnou a factualidade alegada.
Suscitou ainda a intervenção principal de “Condomínio do Edifício sito na Rua ..., n.º ... e ...”, da B... - Companhia de Seguros, S. A. e da E..., S. A.
(ii) A Ré B... deduziu impugnação parcial;
(iii) A Ré C... arguiu a sua ilegitimidade (quanto ao montante que excede a franquia do contrato de seguro) e impugnou motivadamente;
(iv) A Ré D... não contestou, mas juntou procuração aos autos.
À Autora foi dada oportunidade para se pronunciar sobre as exceções suscitadas, bem como sobre o pedido de intervenção principal.
Foi decidido admitir o incidente de intervenção principal provocada por deduzido pela A..., passando a intervir nos autos, como seus associados, o Condomínio do Edifício sito na rua ..., nº ... e ..., a B... – Companhia de Seguros, S.A. e a E..., SA.
Todos os Intervenientes vieram contestar, impugnando a factualidade alegada; o Condomínio ainda suscitou a sua “ilegitimidade substantiva”, a B... os limites da franquia e a E... pugnou pela irregularidade da sua citação.
No despacho saneador, a Interveniente E..., SA foi considerada parte ilegítima e absolvida da instância; a exceção de ilegitimidade suscitadas pela A... e pela C... foram julgadas improcedentes.
Definiu-se ainda o objeto do litígio e elencou-se os temas de prova, sem reclamações.
Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, condenando solidariamente a 3ª Ré C..., S. A. e a 4ª Ré D..., S.A. a pagar à Autora:
a) A quantia de € 2.787,55, acrescida de juros contados desde a data da citação e até efetivo pagamento;
b) a quantia de € 5.000, acrescida de juros contados desde a data da notificação da presente decisão e até efetivo pagamento;
c) - Absolver as restantes Rés do pedido.
Inconformadas com tal decisão, dela apelaram a C... e a D....
Por acórdão desta Relação de 08/06/2022 foi decidido «ordenar a baixa do processo à 1ª instância para se proceder em conformidade com a al. b) do nº 2 do art.º 5º do CPC quanto às caraterísticas do elevador, mormente de se tratar de um equipamento com ou sem portas de cabina».
Baixados os autos à 1ª instância, foi reaberta a audiência de julgamento e produzida a inspeção judicial ao local.
Foi então proferida nova sentença, que decidiu:
«julgo a presente ação parcialmente procedente, por provada, condenando-se solidariamente a 3ª Ré C..., S. A. e a 4ª Ré D..., S.A. a pagar à Autora AA:
a) A quantia de € 2.787,55 (dois mil, setecentos e oitenta e sete euros e cinquenta e cinco cêntimos), acrescida de juros contados desde a data da citação e até efetivo pagamento, sendo os juros devidos à taxa legal que em cada momento vigorar, através da portaria prevista no artigo 559º do Código Civil;
b) a quantia de € 5.000 (cinco mil euros), acrescida de juros contados desde a data da notificação da presente decisão e até efetivo pagamento, sendo os juros devidos à taxa legal que em cada momento vigorar, através da portaria prevista no artigo 559º do Código Civil.
Absolvem-se as restantes Rés do pedido.»

2. Na sentença foi considerada a seguinte factualidade:
1. A Autora AA é filha única de BB, nascido a .../.../1920 e falecido a 5/12/2016 no estado de viúvo, sendo sua única e universal herdeira.
2. O pai da Autora era proprietário da fração autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao 2º andar direito do imóvel sito na rua ..., ..., Porto.
3. Esse imóvel é administrado pela 1ª Ré desde FEV2015.
4. A qual celebrou um contrato de seguro com a 2ª Ré, que inclui a cobertura designada por “Responsabilidade Civil Extracontratual do Condomínio e dos Proprietários das Frações Autónomas”, com o nº de apólice ....
5. O imóvel em causa dispõe de ascensor, cuja manutenção está contratualmente a cargo da 3ª Ré que, sobre aquele, celebrou contrato de seguro de responsabilidade civil com o nº de apólice ... com a 4ª Ré.
6. No dia 27/11/2015, o pai da Autora saiu de casa, para se deslocar ao Hospital ... - Porto.
7. E entrou no ascensor, no piso da sua habitação (2º andar).
8. No rés-do-chão, abriu a porta.
9. Provado apenas que o ascensor parou no rés-do-chão com um desnível, relativamente ao pavimento do respetivo patamar, de cerca de 5 centímetros.
10. O pai da Autora pôs o pé em falso e caiu desamparado no patamar,
11. Onde permaneceu imóvel durante alguns minutos,
12. Vindo a ser encontrado pela Autora, que chamou de imediato uma ambulância e que o transportou para o Hospital ... - Porto, onde era acompanhado por médico assistente.
13. Realizados os competentes e necessários exames médicos ao pai da Autora, constatou-se que, por via da queda, o mesmo havia fraturado o colo do fémur direito, o que impunha a sujeição a uma intervenção cirúrgica para colocação de prótese da anca.
14. Confrontada com o diagnóstico e respetivo tratamento, a Autora entrou em contacto com a 1ª e 3ª Ré, dando-lhes conhecimento de tudo.
15. O pai da Autora permaneceu no Hospital ..., foi intervencionado no dia 1/12/2015 e esteve internado entre os dias 27/11 e 15/12/2015, sem complicações pós-cirúrgicas.
16. Em resultado dos bens e serviços prestados no referido período, o Hospital ... apresentou ao pai da Autora uma fatura no valor de € 12.722,15.
17. As subsequentes consultas médicas, fisioterapia e enfermagem importaram no valor de € 2.147,55.
18. O pai da Autora, através de Mandatário Judicial, instou a 1ª e a 3ª Ré para que procedessem ao respetivo pagamento que, em resposta, enviaram as missivas juntas a folhas 57 verso e 58 verso e 59, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
19. A Autora procedeu ao pagamento das quantias referidas em 17).
20. O pai da Autora fraturou o colo do fémur direito.
21. E subsequentemente foi submetido a uma cirurgia para colocação de prótese ortopédica.
22. Tomou vários medicamentos para controlo da dor e problemas associados: Tramadol 100 Mg, Metaclopramida 10 Mg/ 2 MI Inj., Morfina 10 Mg, Paracetamol 1000mg e Acido Acetilsalicílico 100Mg.
23. A partir do sucedido no dia 27/11/2015 e por prescrição médica, o pai da Autora teve necessidade de acompanhamento constante e permanente, o que sucedeu até à data do seu falecimento, quer por médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, profissionais da Cruz Vermelha Portuguesa e pela própria filha, que se mudou para a residência daquele.
24. O pai da Autora adquiriu ainda uma poltrona especial, com o custo de € 640.
25. O pai da Autora era um pintor reconhecido publicamente, quer a nível nacional quer a nível internacional.
26. O pai da Autora apresentou vestígios de escoriações ao nível do cotovelo e antebraço esquerdos, incapacidade de caminhar sem auxílio e comportamento depressivo.
27. E perdeu a capacidade da pintura.
28. Provado apenas que a 3ª Ré enviou à 1ª Ré o e-mail datado de 8/9/2015, junto aos autos a folhas 62 e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
29. Provado apenas que a 3ª Ré enviou à 1ª Ré o e-mail datado de 30/11/2015, junto aos autos a folhas 61 e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
30. A 1ª Ré administrou o condomínio onde se insere a fração autónoma propriedade do pai da Autora até 30/4/2017.
31. Durante o ano de 2011 o ascensor foi alvo de uma intervenção geral pela 3ª Ré.
32. Na assembleia geral de condóminos realizada cinco meses antes dos factos em discussão nos autos a situação do(s) elevador(es) não foi discutida.
33. O contrato de seguro a que se refere o ponto 5) dos factos provados – ramo responsabilidade civil exploração (seguro obrigatório) – foi celebrado em 17/11/2013 e através do mesmo, a 3ª Ré transferiu para a 4ª Ré a sua responsabilidade civil emergente da atividade de empresa de manutenção de ascensores.
34. A 3ª Ré celebrou com o Condomínio do prédio sito na rua ..., nºs ... e ... – Porto, um contrato de manutenção simples de elevador(es), nos termos do documento apresentado a folhas 191 e seguintes e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, em vigor na data dos factos, segundo o qual se vinculou perante aquele e relativamente ao elevador aqui em causa a:
- enviar todos os meses um técnico ao local da instalação para realizar trabalhos de manutenção e inspeção, necessários à segurança e continuidade do normal funcionamento do equipamento;
- manter um registo de todas as avarias acessível à administração do condomínio (1ª Ré), sempre que solicitado;
- efetuar todos os trabalhos de lubrificação e limpeza;
- atender com a prontidão possível todas as chamadas telefónicas da 1ª Ré, por motivo de paralisação ou funcionamento deficiente;
- avisar a 1ª Ré de quaisquer reparações ou substituições que se revelem necessárias ao bom funcionamento do aparelho.
35. O elevador é propriedade do Condomínio.
36. E em caso de avaria do equipamento que implique a reparação ou substituição de peças, o serviço é efetuado mediante a apresentação prévia de um orçamento e a sua aceitação pelo Condomínio proprietário, aqui administrado pela 1ª Ré.
37. O elevador foi instalado em 1978.
38. No dia 1/10/2014, o elevador tinha sido objeto de inspeção periódica realizada pelo Instituto Eletrotécnico Português, entidade inspetora creditada pelo Instituto Português de Acreditação, I.P.
39. A 4ª Ré apresentou à 1ª Ré, em 8/9/2015, o orçamento nº ..., para modernização do elevador instalado no imóvel e, através da execução desse orçamento, a 4ª Ré propunha-se
- fornecer e instalar um novo quadro de comando;
- fornecer e instalar um sistema de controlo de velocidade por Variação de Tensão e Frequência;
- reparar o conjunto máquina/motor;
- fornecer e instalar um novo quadro parcial;
- instalar nova iluminação da casa da máquina;
- fornecer e instalar nova fechadura da casa da máquina;
- remodelar a cabina do elevador;
- montar novas botoneiras de cabina;
- montar novas botoneiras de piso;
- pintar as portas de patamar;
- remodelar a caixa do elevador;
- efetuar as verificações gerais e ensaios finais.
40. O orçamento atrás referido não foi adjudicado pelo condomínio administrado pela 1ª Ré.
41. À data do sinistro, o elevador tinha certificado de inspeção com validade até 1/10/2016.
42. Na vigência do contrato de manutenção, um técnico da 3ª Ré deslocou-se ao elevador e nunca verificou qualquer desnível que ultrapassasse os valores regulamentados entre a cabina do elevador e o patamar de qualquer um dos pisos.
43. No dia dos factos, os técnicos da 3ª Ré deslocaram-se ao local, onde realizaram testes para apuramento do sucedido e encontraram o elevador em funcionamento, com paragens corretas e sem qualquer desnível entre a cabina e os patamares.
44. O Instituto Eletrónico Português levou a cabo vários testes aos órgãos do elevador, no dia 2/12/2015, tendo consignado no documento nº 8, que acompanha a petição inicial e cujo teor se dá aqui por reproduzido, que “Foram efetuadas diversas viagens com carga de 75 kg (peso médio de uma pessoa) e de 300 kg (peso de 4 pessoas) onde registámos diversas leituras do desnível entre soleiras e todas elas ficaram muito abaixo do valor máximo que está regulamentado (+/-5cm, art. 54º do DL 513/70 de 30/10) (valor máximo obtido 1 cm)” e que “É de salientar que, por razões não detetadas nesta peritagem, o elevador poderá parar (por anomalia) acima do valor que está regulamentado (+/- 5cm) originando assim a abertura da porta do patamar o que aumentará o desnível entre o patamar e o piso da cabina (este desnível pode ter um valor máximo de 17 cm, acima ou abaixo do patamar)”.
45. Atenta a sua idade, o elevador apresentava caraterísticas funcionais de operação inerentes à tecnologia que muitos anos antes tinha sido aplicada na sua conceção e fabrico e que impedem uma precisão de paragem idêntica àquela que existe nos elevadores atuais.
46. Em resultado de muitos anos de utilização, alguns dos componentes do elevador apresentavam desgaste.
47. A 1ª Ré, no período em que representou o condomínio, nunca comunicou aos condóminos ou à assembleia de condóminos a existência da qualquer anomalia do elevador, especificamente que tivesse por consequência provável a médio ou a longo prazo, o desnível entre a cabine e os pisos dos patamares.
48. Através de contrato de seguro titulado pela apólice nº ..., do ramo responsabilidade civil/exploração, a Interveniente B... - Companhia de Seguros assumiu a responsabilidade que lhe foi transferida pela APEGAC - Associação Portuguesa de Empresas de Gestão e Administração de Condomínios pelo pagamento das indemnizações devidas a terceiros, em consequência da responsabilidade derivada da atividade de Administração de Condomínios desenvolvida pelas empresas associadas do Tomador.
49. O elevador em questão não possui portas de cabine – facto por nós aditado, por resultar da instrução da causa, ao abrigo do disposto nos artigos 5º, nº 2 e 607º, nº 4 do Código de Processo Civil.
Factos não provados
Todos os restantes factos descritos nos articulados, bem como os aventados na instrução da causa, distintos dos considerados provados - discriminados entre os “factos provados” ou considerados na “motivação” (aqui quanto aos instrumentais) -, resultaram não provados.

3. – Inconformadas, apelaram as Rés D... e C..., nos seguintes termos:
Conclusões da apelação da D...
1. O objecto primordial do presente recurso é a veemente impugnação da decisão proferida quanto aos factos 10. e 11. dados como provados e que deveriam merecer a resposta de não provados - atento o errado julgamento dos mesmos.
2. Na verdade, nenhuma prova foi feita quanto aos factos 10. e 11., porquanto ninguém assistiu à queda, ninguém sabe os motivos da queda. Tudo o quanto foi dito foi por mera suposição e a conclusão de que a queda se ficou a dever ao desnível é contrariada pela circunstância – essa sim afirmada – de que o infeliz Sr. BB estava com ambas as pernas dentro do elevador.
3. No que às declarações de parte diz respeito (gravadas no Habillus Media Studio, no dia 14 de Outubro de 2020, nome do ficheiro áudio 20201014095738_15170945_2871489, das 09:57:37 às 11:28:29) e à credibilidade que devem merecer, importa atentar na descrição que a Autora/Apelada fez da queda na douta Petição Inicial – artigos 8.º, 16. e 17.º - e o por si declarado em pleno julgamento – minutos 07:10 a 08:30 e 48:00 a 51:30 das declarações de parte
4. Certo é que a Autora não viu a forma como o pai saiu do elevador e, muito menos, se colocou o pé em falso e se caiu desamparado.
5. De igual modo, a testemunha CC (depoimento gravado no Habillus Media Studio, no dia 14 de Outubro de 2020, nome do ficheiro áudio 20201014145858_15170945_2871489, das 14:58:59 às 15:40:41), aos minutos 1:15 a 2:00, refere que não assistiu à queda.
6. Donde, na ausência de prova directa, não poderia o Tribunal a quo ter dado como provados os factos 10. e 11.
7. Além disso, a prova produzida permite enfatizar que o que consta no facto 10. deve resultar como não provado, por via de prova indirecta e por inferência das regras da experiência comum.
8. Com efeito, conforme resulta das declarações de parte da Autora – cfr. minutos 10:15 a 10:45 e 51:30 a 52:30 – quando aquela chegou perto do pai, este estava com as pernas dentro do elevador. As duas. Do joelho para baixo.
9. A circunstância do pai da Autora estar com ambas as pernas dentro do elevador e caído permitem concluir que aquele não caiu porque colocou o pé em falso, pois que se assim fosse, o desequilíbrio seria sempre para a frente e as pernas ficariam fora do elevador – é isto que nos dizem as regras da experiência comum.
10. Ora, se ambas as pernas estavam dentro do elevador, uma coisa é certa: a queda não se ficou a dever porque o pai da Autora pôs o pé em falso e caiu desamparado no patamar, pelo que o facto 10. deve resultar não provado.
11. Já quanto ao facto 11. também nenhuma prova foi realizada, além das declarações de parte - cfr. minutos 07:10 a 08:30 das declarações de parte – pelo que deverá o facto 11. resultar como não provado
12. Ao assim decidir quanto à prova produzida, o Tribunal a quo na douta Sentença violou o preceituado nos artigos 342.º, 483º e seguintes, todos do Código Civil e, bem assim, o disposto nos artigos 411.º, 413.º e 414.º, todos do CPC.
13. Tal qual os factos se encontram dados como provados na douta sentença em crise e sempre com o devido respeito por opinião diversa, não resulta que o desnível do elevador tenha sido a causa da queda do Sr. BB, pai da Autora.
14. Dito de outro modo, não se mostra provado o nexo causal entre o desnível de cinco centímetros e a queda ocorrida.
15. Se se der como não provados os factos 10 e 11., conforme vindo de pugnar, mais resulta evidente que não resultou provado o nexo causal entre o desnível e a queda, pelo que se impõe, desde logo, a absolvição do pedido por ausência de um dos requisitos da responsabilidade aquiliana.
16. O Tribunal a quo, sem prejuízo da prova que foi produzida quanto à circunstância de o elevador não ter porta de cabine, o Tribunal a quo acaba por considerar que o elevador ou não dispunha de um mecanismo de controlo do fecho das portas das cabinas ou que se o tinha, ele não estava operativo.
17. A este propósito, o Tribunal a quo acaba por equiparar duas situações de facto (não ter sistema de controlo do fecho da porta ou ter e ele não estar operativo) quando essas duas situações de facto implicam soluções jurídicas diversas, em especial, no contexto em que a C... apenas havia celebrado um contrato de manutenção simples – cfr. facto 34. dado como provado.
18. Dito de outro modo, se o elevador não dispunha de um mecanismo de controlo do fecho das portas das cabinas tal não é imputável à empresa que celebra com o proprietário do elevador um contrato de manutenção simples.
19. Tudo isto, sem prejuízo de não ter resultado provado, antes pelo contrário, que o elevador em causa tivesse portas de cabine e, por conseguinte, não se provou que tivesse mecanismo de controlo do fecho das portas das cabinas.
20. Com efeito, o elevador em causa era um elevador com portas de patamar.
21. E, quanto a estes, o Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos (doravante RSEE) prevê que a zona de desencravamento terá a extensão máxima 17 centímetros acima ou abaixo da soleira.
22. Assim, a segurada da aqui Apelante, cumpriu escrupulosamente as obrigações contratuais e, bem assim, as impostas pelo RSEE, não tendo resultado provada qualquer omissão ou inobservância das normas regulamentares estabelecidas.
23. Donde não se pode presumir como omissiva e muito menos ilícita e culposa a conduta da C....
24. Não só não resultou provada qualquer omissão, como da prova produzida resultou que a C... cumpriu com as obrigações contratuais que assumiu – isso mesmo resulta dos factos 34.º, 38.º, 41.º, 42.º, 43.º e 44.º dos factos dados como provados.
25. Ademais, não só a queda nada teve que ver com o desnível verificado, como, mesmo que assim se entenda, sempre resultou provado que o elevador tinha sido objecto de inspeção periódica por entidade creditada (facto 38.) e tinha certificado de inspeção com validade até 1OUT2016 (facto 41.).
26. Além disso,
42. Na vigência do contrato de manutenção, um técnico da 3ª Ré deslocou-se ao elevador e nunca verificou qualquer desnível que ultrapassasse os valores regulamentados entre a cabina do elevador e o patamar de qualquer um dos pisos.
43. No dia dos factos, os técnicos da 3ª Ré deslocaram-se ao local, onde realizaram testes para apuramento do sucedido e encontraram o elevador em funcionamento, com paragens corretas e sem qualquer desnível entre a cabina e os patamares.
27. A que acresce a circunstância de se tratar de um elevador que foi instalado em 1978 (facto 37.), atenta a sua idade, o elevador apresentava caraterísticas funcionais de operação inerentes à tecnologia que muitos anos antes tinha sido aplicada na sua conceção e fabrico e que impedem uma precisão de paragem idêntica àquela que existe nos elevadores atuais (facto 45.) e que em resultado de muitos anos de utilização, alguns dos componentes do elevador apresentavam desgaste (facto 46.)
28. Além de que a C... ainda se propôs a proceder a obras de modernização do elevador (facto. 39).
29. Isto é o mesmo que dizer que a C... empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir – cfr. n.º 2 do artigo 493.º CC – assim se afastando a presunção de culpa.
30. A admitir qualquer omissão por informidade legal no funcionamento do elevador, sempre a responsabilidade da segurada da Apelante seria solidária com a proprietária do equipamento – é o que resulta, aliás, do artigo 3.º do DL 110/1991 de 18 de Março - pelo que olvidou o Tribunal a quo em condenar, solidariamente, a proprietária do elevador.
31. O Tribunal a quo na douta Sentença violou o preceituado nos artigos 342.º, 483.º, 486.º e 493.º todos do Código Civil e interpretou erradamente o Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos (artigos 39.º, 48.º e 54.º) e o disposto no artigo 3.º do DL 110/1991 de 18 de Março.
Nestes termos, e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, julgando procedente o presente recurso e julgando de conformidade com as precedentes conclusões, será feita uma verdadeira e sã JUSTIÇA!

Conclusões da apelação da C...
A. A Douta sentença está ferida de nulidade nos termos do artigo 615 nº1 alínea d) segunda parte.
B. A ora Recorrente, na sequência de uma sentença anteriormente proferida, com a referência 424033371, no âmbito do presente processo, interpôs um anterior Recurso de Apelação, em 02/07/2021., tendo o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão com a referência 15786976, ordenado a baixa do processo à 1ª instância para que se aferisse as concretas características do elevador em causa no processo, mormente da existência ou não da porta de cabina.
C. Ficou demonstrada a inexistência de porta de cabina, tendo sido proferida nova sentença.
D. O Juiz a quo na douta sentença que ora se recorre vem alterar a matéria de facto dada como provada na sentença, com a referência 424033371, anteriormente proferida no âmbito do presente processo, sendo que tal matéria nem sequer foi objeto do recurso interposto.
E. Na primeira sentença, ficou provado que, ao longo dos anos, a Recorrente efetuou todos os serviços de manutenção exigíveis de acordo com a lei e nos termos do contrato; Não consta do processo qualquer elemento factual que relacione o desnível com qualquer omissão da Recorrente na prestação dos seus serviços de manutenção e ainda resulta demostrado/provado no processo que a Recorrente sempre cumpriu com todas as obrigações e deveres emergentes do contrato de manutenção simples e da lei.
F. Na sentença que ora se recorre, vem o Juiz a quo determinar que a ora Recorrente não fez prova de que tomou todas as precauções previstas na lei e que satisfez todas as providências adequadas para, nas circunstâncias concretas, prevenir o dano e elidir a presunção de culpa que sobre ela recai.
G. Ora, sendo que tal matéria não foi objeto de recurso, já que se tratavam de factos assentes e transitados em julgado, não cabia ao Mmo. Juiz, na sentença de que ora se recorre, pronunciar-se sobre a mesma, configurando-se tal postura como um excesso de pronúncia nos termos do artigo 615º nº 1 alínea d) 2ª parte do CPC.
H. O excesso de pronúncia tem como consequência a nulidade da sentença.
I. Pelo exposto, deve a sentença que ora se recorre ser declarada nula.
J. A ação foi instaurada pela Recorrida, com fundamento num acidente no qual o seu pai, ao abrir a porta do elevador, colocou o pé em falso e caiu no patamar do rés-do-chão (factos dados como provados nos pontos 1, 2, 6, 7, 8, 9 e 10 da douta sentença)
K. De acordo com a douta sentença a queda ficou a dever-se a um desnível de cerca de 5 centímetros relativamente ao pavimento do respetivo patamar (facto 9 da douta sentença).
L. O Tribunal a quo veio determinar que os Danos sofridos pelo pai da Autora, resultaram da sua queda, que foi provocada pelo desnivelamento da cabina do elevador, considerando estar verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual previstos no n.º1 do artigo 483º do Código Civil.
M. O Tribunal a quo entendeu que a Recorrente incorreu numa conduta omissiva e ilícita, porquanto o Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos (doravante RSEE), mais especificamente no artigo 48º, prevê a existência de um mecanismo de controlo do fecho das portas de cabina, que impede a abertura da porta de cabina quando o elevador não está nivelado com o patamar, tendo concluído que, no caso concreto tendo as portas aberto, existindo um desnível de cerca de 5 cm, ou o elevador não tinha um mecanismo de controlo do fecho das portas de cabina ou tendo-o ele não estava operativo.
N. Contudo, salvo o devido respeito, o douto tribunal fundamentou a sua convicção numa norma que não é aplicável ao caso concreto, incorrendo em erro na aplicação do direito.
O. Conforme já se referiu, no âmbito do presente processo, a Recorrida, havia já interposto recurso de uma sentença anterior proferida pelo tribunal a quo.
P. Nesse recurso, foi alegado entre outros que o elevador em causa não possuía porta de cabina.
Q. Tendo o Recurso sido admitido, decidiu o Tribunal da Relação que o processo baixasse à 1ª instância, para que se aferisse quanto às caraterísticas do elevador, mormente de se tratar de um equipamento com ou sem portas de cabina, considerando que esse facto seria importante para a boa decisão da causa já que as imposições legais de segurança dependem das caraterísticas do elevador.
R. Dando seguimento ao acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, foi dado como provado, na douta sentença que ora se recorre, que o elevador não possui portas de cabina, mas sim portas de patamar (facto 49 da douta sentença).
S. Perante a adição do novo facto, seria expectável que o Tribunal a quo, conformasse o normativo aplicável às características do elevador, o que não se verificou.
T. Mesmo tendo sido dado como provado que o elevador não possui portas de cabina, o Mmo. Juiz a quo, decidiu aplicar o normativo relativo aos elevadores com portas de cabina, ou seja, o artigo 48.º do RSEE sob a epígrafe “«Contrôle» do fecho das portas da cabina dos ascensores”.
U. A mencionada norma legal, que constitui fundamento jurídico da decisão do tribunal a quo, devia ter sido interpretada como âmbito de aplicação restrito a elevadores com portas de cabina, não sendo aplicável a elevadores sem portas de cabina, como é o caso do elevador dos presentes autos.
V. Assim, considera a Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter aplicado o artigo 46º do RSEE, com a epígrafe “cabina sem portas” e, em concreto, em termos de matéria de desnivelamento, o artigo 39º, nº1, alínea c) e n.º 2 do RSEE, sob a epígrafe “Encravamento das portas de patamar”.
W. De acordo com os supramencionados preceitos legais, os elevadores sem portas de cabina encontram-se em conformidade com a lei, e que para este tipo de elevadores, a lei prevê e permite a abertura/desencravamento das portas de patamar quando a cabina do elevador entra na zona de desencravamento, sendo esta zona de 17 (dezassete) centímetros acima e 17 (dezassete) centímetros a baixo da soleira das portas de patamar.
X. Assim, no que respeita aos elevadores com portas de patamar, as portas de patamar poderão abrir, quando a cabina do elevador se situe na zona de desencravamento, sendo esta zona 17 (dezassete) centímetros acima e 17 (dezassete) centímetros abaixo da soleira das portas de patamar.
Y. Dispõe o artigo 486º do Código Civil que as omissões só geram responsabilidade civil se, correndo os demais pressupostos, o dever jurídico da prática do ato omitido resultar diretamente da lei ou de negócio.
Z. Tendo ficado provado, no facto 9, que no caso em concreto o elevador parou com um desnível de cerca de 5 centímetros, permitindo o RSEE a abertura das portas nos 17 (dezassete) centímetros acima e 17 dezassete ( centímetros) abaixo das soleiras das portas de patamar, não se verifica qualquer inconformidade legal no funcionamento do equipamento (ilicitude), nem se constata qualquer conduta omissiva na prestação de serviços de manutenção da Recorrente (facto voluntário), já que não existe qualquer elemento factual ou probatório que relacione o acidente com qualquer omissão da Recorrente na prestação dos seus serviços de manutenção.
AA. Ademais, cumpre elucidar que o artigo 54º da RSEE, determina que quando a cabina de um elevador estacionar num patamar, a diferença de nível entre a soleira da cabina e a soleira da porta de patamar não deverá exceder 5 centímetros, “requisito” que foi cumprido no âmbito do presente processo.
BB. Portanto, ainda que o elevador tivesse porta de cabina, que não tem como ficou provado, o desnível dado como provado pelo Tribunal a quo ainda se situava dentro do desnível permitido por lei, assim se afastando a ilicitude.
CC. Deste modo, tendo a Recorrente cumprido com todas as obrigações contratuais e não se verificando qualquer inconformidade legal no funcionamento do equipamento, não é possível concluir-se que tenha havido uma conduta omissiva e ilícita por parte do Recorrente nos termos e para os efeitos dos artigos 483º e 486º do Código Civil.
Termos em que, e sempre com o douto suprimento de V.Exas., Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, por via deste, ser a douta sentença ora recorrida declarada nula e substituída por uma decisão que absolva a Recorrente da quantia peticionada.

4. Não houve contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO
5. O objeto do recurso é delimitado pelas questões suscitadas nas conclusões dos recorrentes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: art.º 615º nº 1 al. d) e e), ex vi do art.º 666º, 635º nº 4 e 639º nº 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC).
As apelações suscitam as seguintes questões:
● Nulidade da sentença por excesso de pronúncia;
● Reapreciação da matéria de facto;
● Erro de julgamento na subsunção dos factos ao direito.

5.1. Nulidade da sentença por excesso de pronúncia (suscitada pela C...)
Prescreve o art.º 615º do CPC: 1 - É nula a sentença quando: (…) d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
O exato conteúdo do que sejam as questões a resolver foi objeto de abundante tratamento doutrinal [1] e jurisprudencial [2], havendo neste momento um consenso no sentido de que não se devem confundir as questões a resolver propriamente ditas com as razões ou argumentos, de facto ou de direito, invocadas pelas partes, para sustentar a solução que defendem a propósito de cada questão a resolver.
Alberto dos Reis, a propósito de qual o critério de reconhecimento do que se deve entender por questão a resolver, pondera: «as questões suscitadas pelas partes só podem ser devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeitos), qual o objecto dela (pedido), mas também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado». [3]
«As “questões” a apreciar reportam-se aos assuntos juridicamente relevantes, pontos essenciais de facto ou direito em que as partes fundamentam as suas pretensões». [4]
Como resulta do relatório, os presentes autos foram já objeto duma 1ª sentença, julgada parcialmente procedente.
Em recurso dessa sentença foi decidida a reabertura da audiência de julgamento para se apurarem as caraterísticas do elevador, designadamente se se tratava de um equipamento com ou sem portas de cabina.
Entende a Recorrente que o Mmo. Juíz aproveitou a sentença para alterar a matéria de facto que havia sido dada como provada na sentença anterior e que não foi objeto do recurso anterior.
No entanto, ao compaginar ambas as sentenças, os segmentos que a Recorrente aponta como dissonantes não respeitam a factos, mas sim à motivação/fundamentação.
Na verdade, a factualidade provada e não provada é exatamente igual em ambas as sentenças, com exceção do facto provado nº 49, agora aditado, em conformidade com o ordenado no acórdão, “O elevador em questão não possui portas de cabine”.
Ora, a fundamentação duma sentença, seja ao nível do facto, seja da matéria de direito, não constitui uma questão para efeitos do art.º
Numa sentença, o juiz terá de conhecer o facto e o direito, mas não é obrigado a respeitar o mesmo raciocínio ou as mesmas palavras que usou anteriormente.
De qualquer forma, em situações como a presente, de reenvio dos autos para complementar a matéria de facto, pode até acontecer ser necessário alterar a matéria de facto para além do determinado pelo Tribunal superior.
Tal está até expressamente contemplado no art.º 662º nº 3 al. c) do CPC: se for determinada a ampliação da matéria de facto, a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições.
De qualquer forma, no caso presente não se extravasou a matéria de facto, tendo-se o tribunal movido nos estritos limites ordenados pelo acórdão desta Relação.
Quanto à fundamentação de direito, resulta para nós claro que alguma mudança haveria de se operar, pois que o Tribunal superior o considerou relevante.
Na verdade, face ao facto que lhe foi ordenado aditar, o Tribunal de 1ª instância não poderia deixar de se lhe referir e dele retirar as ilações tidas por pertinentes.
Concluindo, não se verifica excesso de pronúncia.

5.2. Reapreciação da matéria de facto (suscitada pela D...)
Quanto aos factos provados 10 e 11 (que se pretende sejam tidos por não provados)
A sindicância da matéria de facto implica uma visão global e concertada da prova produzida, não se compaginando com meros segmentos deste ou daquele meio de prova, desgarrados do respetivo contexto.
O julgador deve obediência a princípios de prova plasmados na lei e será em função deles e das regras da experiência que irá formar a sua convicção sobre a matéria de facto que se lhe depara.
As regras da experiência são um conceito aberto, que faz apelo a padrões de normalidade, àquilo que acontece na grande maioria dos casos, no sentido de que em circunstâncias idênticas o ser humano tende a ter um comportamento idêntico.
A verdade processual pode não coincidir com a verdade material, mas deve aspirar-se e procurar-se um alto grau de probabilidade ou, pelo menos, que nesse juízo de probabilidade o facto tido por provado se afigure mais consentâneo com a realidade do que a realidade inversa.
Nessa operação racional, crítica e dialética, não pode deixar de se formular juízos de relação entre factos, as ditas presunções judiciais, no sentido de que uns consubstanciam a possibilidade de afirmação da existência de outros.
Como refere Manuel de Andrade [5], «A prova não é certeza lógica, mas tão-só um alto grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida (certeza histórico-empírica)».
Em concreto, considera a Recorrente que ninguém presenciou o sinistro, pelo que tais factos não podiam ser tidos por provados.
Sucede que não é estritamente necessário que exista uma prova direta, podendo o tribunal socorrer-se de meios de prova indireta, de indícios/contra-indícios [6] e de presunções judiciais.
Também se nos afigura não ser de entrar em preciosismos de linguagem sobre se o pai da Autora “pôs o pé em falso”, se “tropeçou”, se “esbarrou”, etc.
De toda a relevância, pensamos, seria apurar a existência (ou não) do desnível, qual a sua medida e se o pai da Autora tropeçou (ou, por qualquer forma, perdeu o equilíbrio) em resultado desse desnível.
No facto provado 9 (não questionado) dá-se nota que ascensor parou no rés-do-chão com um desnível, relativamente ao pavimento do respetivo patamar, de cerca de 5 centímetros. Sabemos que o pai da Autora tinha 95 anos na altura; no relatório do médico-assistente junto com a PI refere-se que o Sr. se deslocava com as limitações próprias da idade e já tinha alguns problemas de visão.
Desta conjugação de factos pode inferir-se que o pai da Autora tenha tropeçado no desnível ou posto “o pé em falso” (que normalmente tem o sentido de virar o pé para fora).
Ninguém falou em tonturas, desmaio ou qualquer outra causa de perda de equilíbrio.
Ainda em termos de elementos objetivos/documentais (não impugnados), resulta do Relatório do Instituto Eletrónico Português (doc. 8) que não foram detetadas quaisquer anomalias técnicas, que explicassem o sucedido.
Também na participação do acidente efetuada pela C... à CM... (doc. 10) se dá nota «Os nossos técnicos deslocaram-se de imediato à instalação, tendo verificado ser causa primária do acidente a ocorrência da paragem desnivelada à descida.»
A estes factos-índice acresce o depoimento da testemunha CC que se deparou com o pai da Autora estendido no chão do patamar do rés-do-chão, tendo visto que nessa altura o elevador apresentava um desnível “equivalente aos seus quatro dedos”; o mesmo aconteceu com a Autora que, ouvindo o estrondo da queda e vindo ao patamar do rés-do-chão, ainda viu o pai no chão.
Não percebemos a ilação tirada pela Recorrente quanto ao facto de a Autora ter dito que o pai ainda “estava com as duas pernas dentro do elevador, do joelho para baixo”. Quem tropeça num desnível com que não contava, ou “põe o pé em falso”, cai para a frente, mas não significa que seja “projetado” de modo o ficar completamente fora do elevador; não se esqueça que o movimento normal é proceder-se concomitantemente ao empurrar da porta para a abrir e dar-se o movimento ao pé, normalmente sem se olhar para baixo, porque não se conta com um desnível entre a cabine e o patamar.
A avaliação efetuada em 1ª instância é consentânea com as regras da lógica e da racionalidade, pelo que se mantém os factos provados 10 e 11.

5.3. Erro de julgamento na subsunção dos factos ao direito (suscitada pela D... e pela C...)
§ 1º - Normas legais aplicáveis ao caso
Atenta a “idade” do elevador, é aqui aplicável o Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos (RSEE), aprovado pelo Decreto n.º 513/1970, de 30 de outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto Regulamentar n.º 13/1980 de 16 de maio, aplicável por força do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 110/1991, de 18 de março.
O M.mº Juiz serviu-se do art.º 48º nº 1 do RSEE, que dispõe: “Os ascensores de cabina com portas serão dotados de dispositivos eléctricos de contrôle do fecho das portas da cabina e a estes será aplicável o disposto nos n.os 2, 3 e 4 do artigo 40.º sobre dispositivos eléctricos de contrôle do fecho das portas de patamar”.
E considerou então que «o elevador ou não possuía sistema de controlo de fecho da porta ou, se o tinha, não se achava em condições de funcionamento de modo a impedir a abertura da porta enquanto a cabina não estivesse nivelada com a plataforma de saída».
Entendem as Recorrentes não ser esta a norma aplicável.
E consideramos assistir-lhe razão.
Na verdade, o RSEE distingue entre elevadores de “cabina com portas” e “cabina sem portas” (comentário ao ponto 12 do art.º 3º).
No caso, provou-se que o elevador era de cabina sem portas. Ou seja, existiam apenas as portas de patamar. Donde não pode ser o art.º 48º a fundamentar a decisão, dado que o mesmo regula especificamente para o controle do fecho das portas da cabina.
Por fim, há ainda que chamar à colação o Decreto-Lei n.º 320/2002, de 28 de dezembro, que estabelece o regime de manutenção e inspeção de ascensores após a sua entrada em serviço.
Nos termos do seu art.º 3º:
● os elevadores são obrigatoriamente sujeitos a manutenção regular, a qual é assegurada por uma empresa de manutenção de ascensores (F...), que assumirá a responsabilidade criminal e civil pelos acidentes causados pela deficiente manutenção das instalações ou pelo incumprimento das normas aplicáveis.
● o proprietário da instalação é responsável solidariamente, sem prejuízo da transferência da responsabilidade para uma entidade seguradora.
● para efeitos de responsabilidade criminal ou civil, presume-se que os contratos de manutenção integram sempre os requisitos mínimos estabelecidos para o respetivo tipo.

§ 2º - Pressupostos da responsabilidade civil
A Autora estribou a sua pretensão na responsabilidade civil por factos ilícitos considerando que o sinistro se ficou a dever à falta de manutenção do elevador: art.º 483º do Código Civil (CC).
Sobre a Autora incumbia o ónus de provar (art.º 342º nº 1 e 487º nº 1 do CC) os factos consubstanciadores dos seguintes pressupostos: uma conduta ilícita, a sua imputação ao agente a título de culpa e a existência de danos, causados ou decorrentes dessa conduta.
No caso, a conduta é omissiva (falta de manutenção do elevador): art.º 486º CC.
Quanto à ilicitude, traduz-se ela na ofensa de direitos de terceiro ou na violação de disposições legais (normas legais e/ou regulamentares, bem como princípios gerais ou regras de ordem técnica e de prudência comum) destinadas a proteger interesses alheios.
O Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos integra disposições legais destinadas a proteger interesses alheios.
Vejamos então se à Ré pode ser imputada alguma omissão dos seus deveres de manutenção contratualmente assumidos (a conduta por ação ou omissão como 1º pressuposto da responsabilidade civil). [7]
Ficou provado que existiu um desnivelamento, “o ascensor parou no rés-do-chão com um desnível, relativamente ao pavimento do respetivo patamar, de cerca de 5 centímetros”.
Esse desnivelamento está dentro dos padrões legais de segurança consignados no art.º 54º do RSEE: “Quando a cabina estacionar num patamar, a diferença de nível entre a soleira da cabina e a soleira da porta de patamar não deverá exceder 5 cm, qualquer que seja a carga da cabina até ao valor máximo admissível”.
Assim, há que concluir que o elevador obedecia às condições de funcionamento prescritas legalmente.
Porém, a Autora considerou que perante esse desnivelamento deveria ter funcionado o encravamento automático das portas, nos termos do art.º 39º do Decreto n.º 513/70 de 30 de outubro, alterado pelo Decreto Regulamentar n.º 13/80, de 16 de maio. E como esse sistema de trancagem das portas não funcionou, isso deve-se à deficiente manutenção da Ré C....
Para o controle do encravamento e do fecho das portas de patamar regulam os art.º 39º e 40º do RSEE nos seguintes termos:
● As portas de patamar possuirão dispositivos elétricos de controle de encravamento por forma a que todas as portas de patamar se encontrem permanentemente encravadas, à exceção da porta do patamar onde a cabina estiver estacionada e que a cabina não possa iniciar o movimento sem estarem encravadas todas as portas de patamar;
● Admite-se o desencravamento da porta do patamar de destino da cabina logo que a soleira da cabina entre na zona de desencravamento desse patamar;
● A zona de desencravamento terá a extensão máxima de 2 cm x 30 cm ou 2 cm x 17 cm, conforme as portas tiverem ou não, respetivamente, movimento automático.
O encravamento é definido como o sistema eletro-mecânico que em determinadas condições aferrolha (encrava) uma porta fechada e a mantém aferrolhada (encravada), impossibilitando a sua abertura sem meios especiais (art.º 3º nº 11 RSEE) e a zona de desencravamento como o espaço abaixo e acima da soleira da porta de patamar, centrado nesta soleira, onde deve encontrar-se a soleira da cabina logo que a porta de patamar correspondente é desencravada (art.º 3º nº 28 RSEE).
Daqui resulta que o RSEE prevê e permite o desencravamento das portas de patamar quando a cabina do elevador entra na zona de desencravamento, sendo esta zona 17 centímetros acima e 17 centímetros abaixo da soleira das portas de patamar.
Num elevador, as pessoas deslocam-se entre os vários patamares dentro duma cabina, que se desloca numa caixa que tem no seu extremo inferior um poço.
O sistema de encravamento automático das portas é um dispositivo de segurança dos elevadores que impossibilita a abertura de todas as portas de acesso exceto aquela do andar onde a cabine está parada. Em termos simples, serve principalmente para que uma porta de patamar não possa ser aberta se a cabina não estiver nesse patamar, assim se impedindo que as pessoas possam cair na caixa ou no poço.
Num movimento normal, espera-se que quando se abre a porta da cabina, ela esteja nivelada com a porta do patamar. No entanto, e porque é apodítico que as máquinas também falham, podem acontecer alguns desníveis, mas que ainda são considerados legalmente como dentro das normas de segurança.
Assim, no que toca ao desnivelamento entre a porta da cabina e a porta do patamar, a lei considera estar ainda nas margens de segurança exigidas:
● quando a diferença de nível entre a soleira da cabina e a soleira da porta de patamar não exceda 5 cm (art.º 54º RSEE);
● e que o desencravamento da porta do patamar possa acontecer numa extensão máxima de 17 cm (para cima ou para baixo) do patamar [art.º 39º nº 1 al. c) e nº 2 RSEE].
A ser assim, e face à factualidade apurada, também não é possível concluir que o elevador estava a funcionar deficientemente. Na verdade, se o desnível foi de cerca de 5 cm e se o desencravamento da porta podia operar numa zona de 17 cm relativamente à soleira do patamar, no caso o elevador ainda funcionava dentro das margens de segurança.
Esmiuçando um pouco mais, e para o que aqui interessa, ficou provado que o contrato entre a Ré e o Condomínio era um contrato de manutenção simples, que lhe impunha:
● enviar todos os meses um técnico ao local da instalação para realizar trabalhos de manutenção e inspeção, necessários à segurança e continuidade do normal funcionamento do equipamento;
● avisar a 1ª Ré de quaisquer reparações ou substituições que se revelem necessárias ao bom funcionamento do aparelho.
● em caso de avaria do equipamento que implicasse a reparação ou substituição de peças, o serviço seria efetuado mediante a apresentação prévia de um orçamento e a sua aceitação pelo Condomínio proprietário.
Essas obrigações foram cumpridas pela Ré, já que se provou que na vigência do contrato de manutenção, os técnicos da Ré nunca verificaram qualquer desnível que ultrapassasse os valores regulamentados entre a cabina do elevador e o patamar de qualquer um dos pisos.
O sinistro aconteceu em 27/11/2015 e o elevador tinha certificado de inspeção com validade até 1/10/2016.
E, no próprio dia dos factos, os técnicos da Ré deslocaram-se ao local, onde realizaram testes para apuramento do sucedido e encontraram o elevador em funcionamento, com paragens corretas e sem qualquer desnível entre a cabina e os patamares.
Também o Instituto Eletrónico Português levou a cabo vários testes aos órgãos do elevador, no dia 2/12/2015, tendo consignado no relatório o seguinte: “Foram efetuadas diversas viagens com carga de 75 kg (peso médio de uma pessoa) e de 300 kg (peso de 4 pessoas) onde registámos diversas leituras do desnível entre soleiras e todas elas ficaram muito abaixo do valor máximo que está regulamentado (+/-5cm, art.º 54º do DL 513/70 de 30/10) (valor máximo obtido 1 cm)” e que “É de salientar que, por razões não detetadas nesta peritagem, o elevador poderá parar (por anomalia) acima do valor que está regulamentado (+/- 5cm) originando assim a abertura da porta do patamar o que aumentará o desnível entre o patamar e o piso da cabina (este desnível pode ter um valor máximo de 17 cm, acima ou abaixo do patamar)”.
Consta ainda desse relatório que não foram detetadas anomalias nos “dispositivos de encravamento”.
De tudo isto se conclui que não é possível imputar à Ré Recorrente C... uma qualquer omissão das suas obrigações de manutenção do elevador.
E, a ser assim, falha o 1º requisito da responsabilidade civil, a conduta por ação ou omissão (art.º 483º do CC).
E o mesmo se diga no caso de uma imputação à luz do art.º 493º do CC, sendo aqui de entender que a Ré conseguiu demonstrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias para evitar danos como o aqui em causa.
Na verdade, ficou provado que
● o elevador foi instalado em 1978
● que apresentava caraterísticas funcionais de operação inerentes à tecnologia que muitos anos antes tinha sido aplicada na sua conceção e fabrico e que impedem uma precisão de paragem idêntica àquela que existe nos elevadores atuais.
● em resultado de muitos anos de utilização, alguns dos componentes do elevador apresentavam desgaste.
Ora, cerca de 2 meses antes do sinistro (08/09/2015), a Ré apresentou ao Condomínio um orçamento para modernização do elevador, em que se propunha: fornecer e instalar um novo quadro de comando; fornecer e instalar um sistema de controlo de velocidade por Variação de Tensão e Frequência; reparar o conjunto máquina/motor; fornecer e instalar um novo quadro parcial; instalar nova iluminação da casa da máquina; fornecer e instalar nova fechadura da casa da máquina; remodelar a cabina do elevador; montar novas botoneiras de cabina; montar novas botoneiras de piso; pintar as portas de patamar; remodelar a caixa do elevador; efetuar as verificações gerais e ensaios finais.
E, no e-mail que enviou com o orçamento, mais referia a Ré: «De referir que com a execução destes trabalhos garantiremos uma excelente precisão de paragem ao piso, evitando assim desagradáveis desníveis na paragem que poderão dar origem a quedas à entrada e à saída do elevador, motivadas pelo facto deste elevador funcionar a uma velocidade.».
O Condomínio não aceitou.
Também no relatório pericial do Instituto Eletrónico Português se aconselhava: «(…) para salvaguardar a segurança dos utilizadores bem como melhorar a comodidade da viagem, aconselha-se a modernização (substituição) do quadro de comando (que inclui a renovação de toda a instalação elétrica (…)».
Tudo o que implicasse reparação ou substituição de peças não estava incluído no contrato da Ré. A Ré alertou o Condomínio da necessidade de reparação/substituição de peças, a ter repercussão nos desnivelamentos entre a cabina e os patamares. Apresentou orçamento para o efeito.
Donde, a conclusão de ter a Ré empregado as providências exigidas pelas circunstâncias para evitar sinistros como o aqui em causa.
Não é, pois, possível imputar à Recorrente C... a omissão de algum dos deveres de manutenção do elevador a que estivesse contratualmente obrigada, nem a violação de qualquer norma de segurança imposta pelo RSEE.
Os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos são de verificação cumulativa. Assim, faltando a conduta/ação/omissão, torna-se desnecessária a abordagem dos demais pressupostos.
Nessa medida, impõe-se a sua absolvição do pedido.

§ 3º - A responsabilidade da D... advém-lhe do contrato de seguro mediante o qual assumiu a responsabilidade da C.... Assim, sua responsabilidade existirá apenas, e na exata medida, em que se verificarem os pressupostos da obrigação de indemnizar relativamente à C....
Tendo-se concluído pela inexistência dessa obrigação a cargo da C..., a mesma solução se impõe para a D....

6. SUMARIANDO (art.º 663º nº 7 do CPC)
………………………………
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III. DECISÃO
7. Pelo que fica exposto, acorda-se nesta secção cível da Relação do Porto em revogar a sentença recorrida, decidindo-se agora absolver dos pedidos as Rés C..., Unipessoal Lda e D..., SA.
Custas a cargo da Autora, face ao decaimento.

Porto, 11 de janeiro de 2024
Isabel Silva
João Venade
Paulo Duarte Teixeira
___________________
[1] Cf. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, pág. 143; Rodrigues Bastos, in “Notas ao Código de Processo Civil”, 1969, vol. III, pág. 228.
[2] Cf., entre muitos, acórdãos do STJ, de 06.01.977 (BMJ, 263º, 187), de 05.06.985 (Ac. Dout., 289º, 94), de 11.11.987 (BMJ, 371º, 374) e de 27.01.993 (BMJ, 423º, 444).
[3] Obra citada, pág. 53.
[4] Acórdão do STJ, de 16.04.2013 (processo 2449/08.1TBFAF.G1.S1), disponível em www.dgsi.pt/, sítio a atender nos demais arestos que vierem a ser citados sem outra menção de origem.
[5] In “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, pág. 191/192.
No mesmo sentido, Vaz Serra, “Provas (Direito Probatório Material)”, BMJ, nº 110, págs. 80, nota (29): «As provas não têm forçosamente que criar no espírito do Juiz uma absoluta certeza acerca dos factos a provar, certeza essa que seria impossível ou geralmente impossível: o que elas devem é determinar um grau de probabilidade tão elevado que baste para as necessidades da vida».
E, ainda, José Lebre de Freitas, “Introdução ao Processo Civil”, 3ª edição, 2013, Coimbra Editora, pág. 200: «No âmbito do princípio da livre apreciação da prova, não é exigível que a convicção do julgador sobre a realidade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma absoluta certeza, raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança, que o necessário recurso às presunções judiciais (arts. 349 e 351 CC) por natureza implica, mas que não dispensa a máxima investigação para atingir, nesse juízo, o máximo de segurança.»
[6] «XVII - (...) Porém, quando o indício mesmo isolado é veemente, embora único, e eventualmente assente apenas na máxima da experiência o mesmo será suficiente para formar a convicção sobre o facto.
XVIII - Os indícios devem ser concordantes, ou seja, devem conjugar-se entre si, de maneira a produzir um todo coerente e natural, no qual cada facto indiciário tome a sua respectiva colocação quanto ao tempo, ao lugar e demais circunstâncias.
XX - Por igual forma deve estar afastada a existência de contra indícios pois que tal existência cria uma situação de desarmonia que faz perder a clareza e poder de convicção ao quadro global da prova indiciária.» - in acórdão do STJ, de 09.02.2012, processo 233/08.1PBGDM.P3.S1.
[7] Na al. b) do art.º 2º do Decreto-Lei n.º 320/2002, de 28 de dezembro define-se “manutenção” como o conjunto de operações de verificação, conservação e reparação efetuadas com a finalidade de manter uma instalação em boas condições de segurança e funcionamento.