Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1819/18.1T9VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULO COSTA
Descritores: REGISTO CRIMINAL
CANCELAMENTO DO REGISTO CRIMINAL
Nº do Documento: RP202309271819/18.1T9VNG.P1
Data do Acordão: 09/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA
Decisão: NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS INTERPOSTOS PELOS ARGUIDOS
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A reabilitação legal ou de direito do condenado decorrente do cancelamento definitivo do registo criminal, nos termos previstos no artigo 11.º da Lei n.º 37/2015, de 5 de maio, tem subjacente o critério da prevenção especial e a ressocialização do indivíduo, a qual se deduz do decurso de um longo espaço de tempo da vida em liberdade sem praticar novos crimes.
II - Estabelecendo a lei o cancelamento dos registos criminais e prazos perentórios para o efeito, o Tribunal não pode valorar algumas das condenações que por imperativo legal já não deviam constar do certificado do registo criminal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 1819/18.1T9VNG.P1
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia – Juiz 3

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório
No âmbito do Comum Coletivo com o número em epígrafe, a correr termos no Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia, Juiz 3, por acórdão de 16-04-2023, foi decidido:
(…)
17º- Condenar o arguido AA pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, n.º 1, do D.L. n.º 15/93, de 22.1, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão.
(…)

Recurso de AA

Objeto.
(…)
A condenação do arguido na pena de 6 anos e 6 meses é exagerada.

Da Desproporção da Pena aplicada.
(…)
Por outro lado, não poderiam os Mmos. Juízes do Tribunal “A Quo” deixar de valorar todas as demais circunstâncias que depunham em seu desfavor, mas já não os seus antecedentes criminais, por crimes da mesma natureza, em condenações em penas de prisão suspensas na sua execução, porquanto deram como provado no ponto 167º que nada consta do CRC do arguido.
E de facto considerou o tribunal a quo que a seu favor militava o facto de não ter antecedentes criminais.
Na ponderação da pena a cominar o Tribunal terá tido em consideração o tempo decorrido desde a última condenação, não ocorrendo, assim, qualquer violação dos prazos previstos no artigo 11.º do DL 37/2015, de 05.05. considerando que militava a favor do arguido não ter antecedentes criminais registados.
Não se verifica uma unanimidade de opiniões sobre os efeitos resultantes da valoração dos averbamentos constantes dos C.R.C. - Certificado do Registo Criminal ou dos Antecedentes Judiciários que se encontrem ou estejam caducos.
Artigo 11.º
Cancelamento definitivo
1 - As decisões inscritas cessam a sua vigência no registo criminal nos seguintes prazos: a) Decisões que tenham aplicado pena de prisão ou medida de segurança, com ressalva dos prazos de cancelamento previstos na Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com respeito aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5, 7 ou 10 anos sobre a extinção da pena ou medida de segurança, se a sua duração tiver sido inferior a 5 anos, entre 5 e 8 anos ou superior a 8 anos, respetivamente, e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;

Estabelecendo a lei o cancelamento dos registos criminais e prazos perentórios para o efeito, à primeira vista o Tribunal não pode valorar algumas das condenações que por imperativo legal já não deviam constar do certificado do registo criminal.
O tribunal “a quo” somente poderia eventualmente valorar os antecedentes criminais constantes do certificado de registo criminal cujo cancelamento ainda não devia ter ocorrido.
Consequentemente, por se tratar de uma verdadeira proibição de prova, está o Tribunal impedido de ter em conta as referidas condenações, pelo que tais factos devem ser retirados dos factos provados.
Em favor alinha-se, entre outros, os seguintes arestos:
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 11/05/2021 in www.dgsi.pt:
«I - O decurso de certo tempo, sem interferência de outras condenações, faz cessar a vigência das decisões inscritas no registo criminal, tal significando que as mesmas deixam de poder ser consideradas contra o condenado, independentemente de se ter ou não procedido à realização material do seu cancelamento.
II - Decorridos os prazos previstos no artigo 11.º da Lei n.º 37/2015, de 5 de maio, contados nos termos ali expressamente referidos, o condenado tem de ser considerado integralmente reabilitado e os seus antecedentes criminais, ainda que permaneçam (indevidamente) visíveis (acessíveis) no registo criminal, deverão considerar-se inexistentes, na medida em que deles se não poderá retirar nenhum efeito»
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 24/01/2023 on www.dgsi.pt:
«I. O decurso de certo tempo releva para que se possam ter em conta os antecedentes criminais registado. Decorrido o tempo previsto na lei sem interferência de outras condenações, as decisões inscritas cessam a sua vigência por caducidade.
II. Decorridos que sejam os prazos previstos na lei, contados nos termos ali expressamente referidos, o condenado tem de ser considerado integralmente reabilitado e os seus antecedentes criminais, ainda que permaneçam (indevidamente) visíveis (acessíveis) no registo criminal, independentemente de se ter ou não procedido à realização material do seu cancelamento, deverão considerar-se inexistentes, na medida em que deles se não poderá retirar nenhum efeito».
Acórdão do T.R.C. - Tribunal da Relação de Coimbra de 02/03/2022 in www.dgsi.pt:
«I – A consideração de um certificado de registo criminal que contemple decisões que, nos termos legais, dele já não deveriam constar, constitui uma verdadeira proibição de prova.
II – Verificando-se que o tribunal violou essa proibição de valoração de prova, daí resultará a necessidade de repensar e, eventualmente, reformular, quer a escolha quer a medida da pena em que o arguido foi condenado, expurgando da respectiva fundamentação todas as decisões inscritas no certificado de registo criminal cujos prazos de vigência já tenham cessado»
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 24/01/2023 in www.dgsi.pt:
«I. O decurso de certo tempo releva para que se possam ter em conta os antecedentes criminais registado. Decorrido o tempo previsto na lei sem interferência de outras condenações, as decisões inscritas cessam a sua vigência por caducidade.
II. Decorridos que sejam os prazos previstos na lei, contados nos termos ali expressamente referidos, o condenado tem de ser considerado integralmente reabilitado e os seus antecedentes criminais, ainda que permaneçam (indevidamente) visíveis (acessíveis) no registo criminal, independentemente de se ter ou não procedido à realização material do seu cancelamento, deverão considerar-se inexistentes, na medida em que deles se não poderá retirar nenhum efeito».
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 10/01/2023 in www.dgsi.pt:
«Pese embora na sentença do processo sumário a enunciação dos factos provados e não provados se baste com a sua indicação “sumária”, a narração factual acolhida na decisão recorrida é manifestamente insuficiente, desde logo por não revelar se as condenações em causa (que provadas foram dadas com alicerce no certificado do registo criminal do arguido junto aos autos) deveriam ou não deste certificado constar, mormente por legalmente se impor o seu cancelamento (nos termos do artigo 11º, da Lei nº 37/2015, de 05/05) e, neste caso, estar vedado terem influência na determinação da medida da pena, não se podendo delas retirar qualquer efeito – cfr., por todos, o Ac. R. de Évora de 27/09/2022, Proc. nº 570/20.7GBLLE.E1, que pode ser lido em www.dgsi.pt.
Importa em relação a cada condenação a menção dos elementos relativos ao crime ou crimes, data de cometimento, pena aplicada, datas da respetiva condenação e do trânsito em julgado da sentença ou acórdão, por fundamental para a dosimetria da pena.
Porém, a não descrição destes elementos não implica a nulidade da pena acessória aplicada, como almeja o recorrente, mas a nulidade da sentença, nos termos do artigo 379º, nº 1, alínea a), in fine, cumprindo ao julgador da 1ª instância a reparação desta enfermidade
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 21/09/2021 in www.dgsi.pt:
«Independentemente de constarem da acusação, os antecedentes criminais, por princípio e por força do artigo 71.º, n.º 2, alínea e) do CP, deverão ser conduzidos aos factos provados, por tal matéria interessar à boa decisão da causa. Não o poderão ser, contudo, quando as penas já tiverem caducado, pois nesse caso as decisões inscritas no registo criminal cessam a sua vigência, ou seja, são dele apagadas como se nunca tivessem existido.
Por outras palavras, a lei ordena o cancelamento do registo em certas circunstâncias e quando estas se verifiquem, o arguido tem de ser considerado reabilitado, encontrando-se vedado ao Tribunal a quo valorar esses antecedentes criminais».
Acórdão do T.R.P. - Tribunal da Relação do Porto de 10/02/2021 divulgado via S.I.M.P. pela P.G.R.P.:
«Não podem ser valorados para efeitos da escolha e determinação da medida da pena os registos de decisões condenatórias constantes do certificado de registo criminal que, nos termos do artigo 11º, n 1 – a), b) e g), nº 2 e nº 3 da Lei 37/2015, de 5 de Maio, devam considerar-se definitivamente cancelados».
Acórdão do T.R.C. - Tribunal da Relação de Coimbra de 13/09/2017 in www.dgsi.pt:
«1 – O cancelamento dos registos é uma imposição legal. A lei (n.º 57/1998 e, depois, a n.º 37/2015) veio a ser inequívoca ao determinar o cancelamento dos registos criminais por decurso de determinados prazos sobre a data da extinção das penas sem que o arguido volte a delinquir.
2 – O CRC visa dar conhecimento ao tribunal e informação ao processo, sobre o passado criminal do arguido, e se a lei ordena o cancelamento do registo, nessas circunstâncias o arguido tem de ser considerado reabilitado.
3 – Um certificado do registo criminal que certifique decisões que, nos termos legais, dele já não deveriam constar, implica uma verdadeira proibição de valoração de prova, estando vedado ao Tribunal ter em conta tais decisões.
4 – Apesar de o cancelamento não ter sido averbado, o mesmo deve produzir efeitos ipso facto, ou seja, desde a extinção efetiva da pena, independentemente do seu registo/averbamento no CRC.».
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 10/05/2016 in www.dgsi.pt:
I. A lei (n.º 57/1998 e, depois, a n.º 37/2015) é inequívoca ao determinar o cancelamento dos registos criminais por decurso de determinados prazos sobre a data da extinção das penas sem que o arguido tenha delinquido nesses prazos.
II. O “cancelamento dos registos” significa que as sentenças canceladas se consideram extintas no plano jurídico, não se lhes ligando quaisquer efeitos, designadamente quanto à medida da pena.
III. Uma vez verificada a hipótese determina o cancelamento, o registo da condenação deixa de poder ser considerado contra o arguido, assim sucedendo independentemente da circunstância de se ter ou não procedido prontamente à real efetivação do cancelamento.
IV. O aproveitamento judicial de informação que por inoperância do sistema se mantenha no CRC é ilegal, e viola ainda o princípio constitucional da igualdade, pois permite distinguir um arguido de um outro que, nas mesmas condições, tenha o CRC devidamente “limpo”.
V. Se o CRC visa informar o tribunal do passado criminal do condenado, e se a lei ordenou o cancelamento dos registos, o arguido tem de ser considerado integralmente reabilitado e os seus antecedentes criminais que indevidamente permaneçam “ativos”, são de tratar como inexistentes e de nenhum efeito.
VI. Também ao sistema de registo preside a intenção de restringir a estigmatização social do delinquente e o conteúdo dos certificados de registo criminal limita-se ao que é verdadeiramente essencial ao processo e ao direito penal conhecer».
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 27/04/2021 in www.dgsi.pt:
«Os factos criminosos, em análise no presente recurso, ocorreram em 20-8-2020 e tendo as penas de multa referentes a processos anteriores consideradas extintas, respectivamente, em 15-6-2012 e 1-8-2014, conforme consta do respectivo CRC, verificam-se os pressupostos da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º da citada Lei da Identificação Criminal, pelo que tais decisões já cessaram a sua vigência no registo criminal.
As mesmas devem manter-se em ficheiro informático próprio, distinto do CRC, durante um período de três anos, mas apenas para os efeitos previstos no mencionado n.º 6, do art.º 11.º (reposição de registo indevidamente cancelado ou retirado), e findo aquele prazo máximo são canceladas de forma irrevogável. É, pois, óbvio, que os aludidos antecedentes criminais, consignados, ainda (apesar do decurso do prazo de cinco anos), no CRC, não poderem ser consideradas.
Um certificado do registo criminal que certifique decisões que, nos termos legais, dele já não deveriam constar, implica uma verdadeira proibição de valoração de prova, estando vedado ao Tribunal ter em conta tais decisões».
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 27/04/2021 in www.dgsi.pt:
«Após o cancelamento definitivo de uma condenação no registo criminal, não pode tal condenação ser considerada em processo criminal para nenhum efeito».
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 21/09/2021 in www.dgsi.pt:
«Independentemente de constarem da acusação, os antecedentes criminais, por princípio e por força do artigo 71.º, n.º 2, alínea e) do CP, deverão ser conduzidos aos factos provados, por tal matéria interessar à boa decisão da causa. Não o poderão ser, contudo, quando as penas já tiverem caducado, pois nesse caso as decisões inscritas no registo criminal cessam a sua vigência, ou seja, são dele apagadas como se nunca tivessem existido.
Por outras palavras, a lei ordena o cancelamento do registo em certas circunstâncias e quando estas se verifiquem, o arguido tem de ser considerado reabilitado, encontrando-se vedado ao Tribunal a quo valorar esses antecedentes criminais».
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 21/02/2017 in www.dgsi.pt:
«1. O cancelamento dos registos no CRC é uma imposição legal.
2. Uma vez verificada a hipótese contemplada na previsão da norma que determina o cancelamento, o registo da condenação deixa de poder ser considerado, a qualquer título, contra o arguido, assim sucedendo independentemente da circunstância de se ter ou não procedido prontamente à real efectivação desse cancelamento.
3. Qualquer aproveitamento judicial de uma informação que só por anomalias do sistema se mantém no CRC, além de ilegal, viola o princípio constitucional da igualdade ao permitir distinguir esse arguido de um outro cujo CRC, nas mesmas condições, se encontra devidamente “limpo”.
4. Se o CRC visa dar conhecimento ao tribunal (informação ao processo) sobre o passado criminal do arguido, e se a lei ordena o cancelamento do registo, o arguido tem de ser considerado, para todos os efeitos, inteiramente reabilitado».
Acórdão do T.R.G. - Tribunal da Relação de Guimarães de 11/03/2019 in www.dgsi.pt:
«I) O certificado de registo criminal está sujeito aos princípios gerais do direito processual penal onde o cancelamento para fins judiciais constitui verdadeira proibição de prova.
II) Verificando-se uma situação como a dos autos em que decisões inscritas no CRC haviam cessado a sua vigência por terem caducado, uma vez que nos cinco anos posteriores à extinção daquelas penas não ocorreu qualquer outra condenação, impõe-se considerar que o registo dessas condenações não produza quaisquer efeitos designadamente quanto à medida da concreta pena a aplicar».
Acórdão do T.R.L. - Tribunal da Relação de Lisboa de 24/09/2020 in www.dgsi.pt:
«I – Há erro notório na apreciação da prova se o tribunal dá como provadas condenações constantes do Certificado do Registo Criminal, junto aos autos, que dele já não deviam constar».
Acórdão do T.R.E. - Tribunal da Relação de Évora de 23/03/2021 in www.dgsi.pt:
«1 - Dando-se como provado que o arguido regista antecedentes criminais, no caso de as penas em que foi condenado terem sido declaradas extintas, a omissão, na sentença, das datas da extinção de tais penas, por se tratar de um elemento decisivo para aquilatar se as condenações anteriormente sofridas pelo arguido podem ou não ser consideradas e valoradas, atento o disposto no artigo 11º da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio, integra o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto no artigo 410º, n.º 2, al. a), do CPP, que é de conhecimento oficioso e pode ser sanado pelo Tribunal da Relação, dado que dispõe dos elementos necessários para o efeito (cf. artigos 426º, n.º 1 e 431º, n.º 1, al. a), ambos do CPP), na medida em que as datas da extinção daquelas penas constam do CRC do arguido junto aos autos.
2 - A reabilitação legal ou de direito do ex-condenado decorrente do cancelamento definitivo do registo criminal, nos termos previstos no artigo 11º da Lei n.º 37/2015, tem subjacente o critério da prevenção especial e a ressocialização do individuo, a qual se deduz do «decurso de um longo espaço de tempo da vida em liberdade sem praticar novos crimes».
Assim sendo, estando em causa num determinado processo a prática de crime no decurso do período de cinco anos subsequentes à extinção de uma pena de multa por que o arguido foi condenado noutro processo, não pode operar o cancelamento definitivo dessa condenação, nos termos previstos no artigo 11º, n.º 1, al. b), da Lei n.º 37/2015, sob pena de violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da CRP.
A previsão do n.º 6 do artigo 11º da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio – que dispõe que «As decisões cuja vigência haja cessado são mantidas em ficheiro informático próprio durante um período máximo de três anos, o qual apenas pode ser acedido pelos serviços de identificação criminal para efeito de reposição de registo indevidamente cancelado ou retirado, e findo aquele prazo máximo são canceladas de forma irrevogável» – tem em vista acautelar situações como a supra referida.
3 - Ao dar como provada a condenação sofrida pelo arguido e ao valorar o respetivo CRC, na parte referente a essa condenação, verificando-se o fundamento que impõe, obrigatoriamente, a cessação da vigência no registo criminal da inscrição dessa decisão, nos termos previstos no artigo 11º, n.º 1, alíneas b) e g), da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio, o tribunal a quo valorou prova que lhe estava vedado valorar, em violação do disposto na citada norma legal.
4 - Ainda que se reconheça poderem existir situações em que a incorreta valoração do CRC poderá integrar o erro notório na apreciação da prova, entendemos que a indevida valoração do CRC relativamente a decisões condenatórias que dele constam quando, por imposição legal, dele já não deviam constar, não integra o vício do erro notório na apreciação da prova, antes implica uma proibição de prova. Com efeito, sendo o cancelamento definitivo da inscrição das decisões condenatórias no registo criminal, pelo decurso dos prazos previstos no artigo 11º da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio, sobre a data da extinção da pena, sem que o arguido volte a delinquir, uma imposição legal, verificados que sejam esses pressupostos e ainda que não tenha havido lugar ao efetivo cancelamento daquelas decisões condenatórias, continuando as mesmas a constar, indevidamente, do CRC, tal acarreta uma verdadeira proibição de valoração de prova, estando vedado ao Tribunal ter em conta tais decisões condenatórias.».
Acórdão do T.R.P. - Tribunal da Relação do Porto de 22/06/2022 in www.dgsi.pt:
«O artº 11º da Lei n.º 37/2015, de 05 de Maio ao impor como condição de cancelamento do CRC que “entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;”, e não exigindo que não tenha ocorrido a prática de novo crime, abrange na sua previsão a efetivação de cúmulo jurídico das penas parcelares que transforma a condenação em pena única, pois apenas esta pena pode vir a ser declarada cumprida ou extinta e não qualquer uma das penas parcelares, e é a partir da data desse cumprimento da pena que se conta o prazo de 5, 7 ou 10 anos para o cancelamento do registo criminal».
Ora, o cancelamento definitivo do registo criminal ocorre após o decurso do prazo, ininterrupto, previsto no artigo 11º da Lei nº 37/2015, de 5 de maio (5, 7 ou 10 anos), conforme a medida concreta da pena pelo qual o cidadão foi condenado se, entretanto, não for novamente condenado por crime de qualquer natureza.
Aquelas condenações devendo estar apagadas do registo, não deviam sequer ter sido mencionadas na ponderação da concreta medida da pena.
Contudo e não obstante isso, no caso em apreço, considerando a gravidade do ilícito cometido pelo arguido afigura-se-nos inequívoco que o arguido revela uma personalidade com tendência desviante.
Uma qualquer outra pena que não fosse uma pena de prisão efetiva, não satisfará minimamente essas finalidades da pena nem será proporcional às exigências da culpa e à satisfação das necessidades gerais de prevenção.
Na verdade, as necessidades de prevenção geral mostram-se acentuadas, considerando a natureza do ilícito pelo qual o arguido foi condenado e pela quantidade diária de crimes desta natureza que são cometidos.
Também as exigências de prevenção especial, no caso em apreço, embora não se nos afigurando demasiado elevadas atenta a ausência de antecedentes criminais registados, não podemos ignorar que já no seu passado teve, por situações de idêntica natureza, contacto com o sistema judicial e que tal não o demoveu de práticas futuras semelhantes, o que revela uma personalidade pouco resiliente à prática do crime.
No caso em apreço, em face da gravidade do crime de tráfico cometido, considerando o dolo direto e intenso com que atuou, o alarme social causado com a sua atuação na comunidade em geral, justifica-se a pena fixado pelo tribunal a quo.
Por tudo o exposto, entendemos que a pena aplicada mostra-se justa e adequada não havendo qualquer reparo a efetuar à Decisão Recorrida que assim deverá ser mantida.
(…)
Decisão:
Face ao exposto, acordam os Juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos BB, CC, DD, EE, AA, FF, GG e HH.

(…)

Porto, 27 de setembro de 2023
(Texto elaborado e integralmente revisto pelo relator, sendo as assinaturas autógrafas substituídas pelas eletrónicas apostas no topo esquerdo da primeira página)
Paulo Costa
Paula Guerreiro
Luís Coimbra