Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
874/21.1T8MAI-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: AGENTE DE EXECUÇÃO
REMUNERAÇÃO ADICIONAL
RELAÇÃO DE CAUSALIDADE
Nº do Documento: RP20240909874/21.1T8MAI-B.P1
Data do Acordão: 09/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL
Indicações Eventuais: 5. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A remuneração adicional do agente de execução prevista nos artigos 50º e 51º da Portaria nº 282/2013, de 29 de agosto, só é devida se se puder estabelecer uma relação de causalidade entre a atividade desenvolvida pelo agente de execução no âmbito da ação executiva e o acordo das partes que permitiu a recuperação do valor de €182.152,86.
II - Tendo-se procedido à citação prévia dos executados nos começos de abril de 2017 e sendo celebrado em 16 de novembro de 2017 acordo das partes que permitiu a recuperação do valor de €182.152,86, sem que quaisquer outros atos do agente de execução tenham sido entretanto praticados, não pode concluir-se por uma relação de causalidade entre a atividade desenvolvida pelo agente de execução no âmbito da ação executiva e o referido acordo das partes.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 874/21.1T8MAI-B.P1

Sumário do acórdão proferido nos processos nºs 874/21.1T8MAI-A.P1 e 874/21.1T8MAI-B.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:

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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório[1]

Em 11 de maio de 2021, por apenso à ação executiva para pagamento de quantia certa com o nº 874/21.1T8MAI[2], instaurada pelo Banco 1..., S.A. contra A..., S.A. e AA, AA veio deduzir oposição à referida ação executiva mediante embargos de executado, autuados sob o nº 874/21.1T8MAI-A.P1, suscitando a inexistência de título executivo, pois que o título previsto no nº 5 do artigo 721º do Código de Processo Civil apenas poderia ser usado pelo agente de execução e não por uma parte e a inexigibilidade dos valores imputados à embargante, pois o valor que é exigido à embargante refere-se, grosso modo, à remuneração adicional fixada pelo agente de execução na respetiva nota de honorários, sendo aquele computado em € 14 958,50 + IVA; a remuneração adicional exige um nexo direto entre a atividade promovida pelo agente de execução e o montante recuperado, constituindo um prémio ou recompensa pela intervenção decisiva do agente de execução no desfecho da demanda; ora, a atividade do agente de execução não se percutiu diretamente no desfecho da demanda, na medida em que aquela terminou mediante um acordo celebrado entre as partes envolvidas; foi a negociação entre as partes que permitiu alcançar a resolução do presente assunto (e a satisfação do credor-exequente) e não qualquer diligência promovida ou encetada pelo agente de execução e daí que tendo o crédito exequendo sido satisfeito através de uma composição extrajudicial, não há lugar ao pagamento de qualquer remuneração adicional; o embargante termina os embargos pedindo a extinção da ação executiva por falta de título executivo e, assim não se entendendo, pede que com fundamento na procedência da oposição seja extinta a ação executiva.

Os embargos foram liminarmente recebidos, ordenando-se a notificação do embargado para, querendo, contestar.

Notificado, o Banco 1..., S.A. contestou os embargos negando a inexistência de título executivo, como decorre do nº 1 do artigo 721º do Código de Processo Civil e, ainda que se considere que a nota de honorários em si não constitui título executivo contra o embargante, sempre a documentação oferecida com o requerimento executivo, considerada no seu conjunto, constitui título executivo composto para efeitos de execução de custas de parte e, no mais, impugnou a maior parte da factualidade alegada pelo embargante, concluindo pela total improcedência dos embargos.

Realizou-se uma infrutífera tentativa de conciliação e em 12 de novembro de 2021 dispensou-se a realização de audiência prévia, proferiu-se despacho saneador tabelar, conhecendo-se da exceção de inexistência de título executivo julgando-se a mesma improcedente, identificou-se o objeto do processo, enunciaram-se os temas da prova, admitiram-se as provas oferecidas pelas partes, fixou-se o valor da causa no montante de € 18 985,62 e designou-se dia para realização da audiência final.

Realizou-se uma sessão da audiência final e em 18 de maio de 2022 foi dado conhecimento do óbito do embargante.

Em 23 de maio de 2022 foi proferido despacho a julgar suspensa a instância, dando-se sem efeito a sessão da audiência final anteriormente designada.

Em 07 de fevereiro de 2023 foi instaurado por apenso incidente de habilitação de herdeiros[3] por causa do óbito de AA e em 22 de março de 2023 foi proferida sentença que julgou habilitadas como únicas e universais herdeiras de AA as requeridas BB, CC e DD.

Realizou-se mais uma sessão da audiência final e em 12 de outubro de 2023 foi proferida sentença[4] que julgou os embargos totalmente improcedentes, absolvendo-se o embargado do pedido.

Em 15 de novembro de 2023, inconformadas com a sentença, BB, CC e DD interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

A. Sobre o recurso da matéria de facto

1.º

O tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto constante na alínea m) do rol de factos provados – “Naqueles autos de execução [referindo-se ao processo n.º 1217/17.4T8MAI que de correu no Juízo de Execução da Maia - Juiz 1], o Sr. Agente de Execução, através do ofício datado de 28 de Agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efectuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros).”.

2.º

Tal facto nunca poderia ter sido julgado por provado, justamente porque naquela ação executiva não foi realizada qualquer penhora, nomeadamente a pertensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado junto do Centro Nacional de Pensões.

3.º

O que consta na ação executiva a propósito da pretensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado junto do Centro Nacional de Pensões é rigorosamente apenas um ficheiro PDF de uma notificação para penhora elaborada pelo agente de execução em 28 de agosto de 2018, mas que nunca foi enviada para o Centro Nacional de Pensões.

4.º

Naqueles autos de execução não existe qualquer prova de que a notificação para penhora tenha sido enviada, nem de que a mesma tenha sido entregue no Centro Nacional de Pensões.

5.º

Nunca foi elaborado qualquer auto de penhora na ação executiva, nomeadamente relativo à pretensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma do executado paga pelo Centro Nacional de Pensões.

6.º

O executado não foi notificado da realização de qualquer penhora na ação executiva, nomeadamente relativa à pretensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado junto do Centro Nacional de Pensões.

7.º

Toda a quantia que a exequente recuperou na ação executiva resultou exclusivamente da transação realizada em 17 de novembro de 2017, que extinguiu a instância executiva.

8.º

Ou seja, é absolutamente insofismável que o agente de execução elaborou a notificação para penhora (28 de agosto de 2018) já depois da transação (17 de novembro de 2017)!

9.º

Em conclusão, quanto ao recurso da matéria de facto, a sentença do tribunal a quo deverá ser revogada no que tange à alínea m) dos factos provados, no sentido em que deverá ser dado como não provado que naqueles autos de execução, o agente de execução, através do ofício datado de 28 de agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efetuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de 350.000,00 €.

10.º

A sentença recorrida padece de um irremediável erro na sua fundamentação, o que, por si, é mais do que suficiente para determinar a sua revogação in totum e substituí-la por outra que julgue a oposição à execução por embargos de executado totalmente procedente.

Sem prescindir,

B. Sobre o recurso da matéria de direito

11.º

É pacífico na jurisprudência o entendimento de que a remuneração adicional do agente de execução é ainda devida nos casos em que a transação decorra ou provenha como consequência, decorrência ou como fruto da atividade ou das diligências realizadas pelo agente de execução, isto é, se se verificar um qualquer nexo entre o trabalho desenvolvido pelo agente de execução e a liquidação do crédito exequendo.

12.º

No caso em apreço, a atividade do agente de execução foi meramente administrativa (citações postais, consultas de bases de dados de serviços públicos e pedidos de informações a entidades públicas), não tendo realizado qualquer penhora.

13.º

Nenhuma diligência praticada pelo agente de execução foi minimamente significativa para a celebração da transação, não tendo, por isso, o direito a receber qualquer remuneração adicional prevista na Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto.

14.º

Pelo que deverá expurgar-se a nota discriminativa de honorários e despesas elaborada pelo agente de execução em 29 de maio de 2017 de incorreções e, deste modo, eliminar a remuneração adicional reclamada, na quantia total de 18.618,51 €, por a mesma não lhe ser legalmente devida.

15.º

A sentença recorrida padece de um irremediável erro na aplicação do direito, designadamente do n.º 5 do artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, o que, por si, é mais que suficiente para determinar a revogação da sentença e substituí-la por outra que julgue a oposição à execução por embargos de executado totalmente procedente.

Acresce que,

16.º

A obrigação de suportar a remuneração do agente de execução tem de ser adequada e proporcional e não pode exceder aquilo que se mostrar razoável face ao envolvimento, ao esforço e ao contributo do agente de execução para o resultado do processo executivo.

17.º

O princípio da proporcionalidade, também designado de princípio da “proibição do excesso”, é o corolário do princípio da confiança inerente à ideia de Estado de Direito Democrático (cf. artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa).

18.º

A solução da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, para a remuneração variável do agente de execução permite que o seu valor escape totalmente ao controle jurisdicional da sua adequação e proporcionalidade, ao não estabelecer um limite máximo e consentir que possa atingir valores significativos, ainda que a ação executiva tenha tido uma tramitação muito simples e a atuação do agente de execução tenha sido escassa e muito pouco relevante para o desfecho da execução.

19.º

O que está em causa é a adequação desse valor àquilo que é exigível que um executado deva suportar a título de custas da execução, sendo certo que essa exigibilidade tem de ser aferida segundo critérios de razoabilidade, adequação, equidade, justa medida, de forma a concretizar uma justa distribuição dos custos de funcionamento do sistema judicial pelas pessoas que a ele recorrem, sem descurar que se trata do acesso a uma função soberana do Estado e do exercício do direito fundamental de acesso à justiça e aos tribunais.

20.º

Considerando que a ação executiva se extinguiu por transação entre a exequente e os executados, a nosso ver, o n.º 5 do artigo 50.º, em conjugação com o Anexo VIII, da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, é inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso ínsitos no princípio do Estado de Direito Democrático, consignado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa.

21.º

Em consequência, com fundamento na aludida inconstitucionalidade material, deverá ser revogada a sentença do tribunal a quo que reconheceu o direito de o agente de execução receber uma remuneração adicional de 18.618,51 € e substituí-la por outra que determine a eliminação da parcela de remuneração variável constante da nota de honorários e despesas elaborada pelo agente de execução.

O Banco 1..., S.A. respondeu ao recurso pugnando pela sua total improcedência.

Em 01 de junho de 2021, também por apenso à ação executiva para pagamento de quantia certa com o nº 874/21.1T8MAI, instaurada pelo Banco 1..., S.A. contra A..., S.A. e AA, A..., S.A. veio deduzir oposição à referida ação executiva mediante embargos de executado, autuados sob o nº 874/21.1T8MAI-B.P1 e com fundamentos idênticos aos invocados pelo executado AA.

Os embargos foram liminarmente recebidos, ordenando-se a notificação do embargado para, querendo, contestar.

Notificado, o Banco 1..., S.A. contestou os embargos negando a inexistência de título executivo, como decorre do nº 1 do artigo 721º do Código de Processo Civil e, ainda que se considere que a nota de honorários em si não constitui título executivo contra o embargante, sempre a documentação oferecida com o requerimento executivo, considerada no seu conjunto, constitui título executivo composto para efeitos de execução de custas de parte e, no mais, impugnou a maior parte da factualidade alegada pelo embargante, concluindo pela total improcedência dos embargos.

Realizou-se uma infrutífera tentativa de conciliação e em 12 de novembro de 2021 dispensou-se a realização de audiência prévia, proferiu-se despacho saneador tabelar, conhecendo-se da exceção de inexistência de título executivo julgando-se a mesma improcedente, identificou-se o objeto do processo, enunciaram-se os temas da prova, admitiram-se as provas oferecidas pelas partes, fixou-se o valor da causa no montante de € 18 985,62 e designou-se dia para realização da audiência final.

Realizou-se uma sessão da audiência final, designando-se nova data para a sua continuação.

Antes da data programada para a nova sessão da audiência final deu-se conta que apenas faltava inquirir uma testemunha, advogada, comum aos apensos A e B, com incidente de dispensa de sigilo profissional pendente e a fim de prestar depoimento, havendo toda a conveniência em que a produção de prova fosse conjunta nos dois processos, razão pela qual se deu sem efeito a continuação da audiência final.

Concluiu-se a audiência final e em 12 de outubro de 2023 foi proferida sentença[5] que julgou os embargos totalmente improcedentes, absolvendo-se a embargada do pedido.

Em 15 de novembro de 2023, inconformada com a sentença, A..., S.A. interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

A. Sobre o recurso da matéria de facto

1.º

O tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto constante na alínea m) do rol de factos provados – “Naqueles autos de execução [referindo-se ao processo n.º 1217/17.4T8MAI que de correu no Juízo de Execução da Maia - Juiz 1], o Sr. Agente de Execução, através do ofício datado de 28 de Agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efectuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros).”.

2.º

Tal facto nunca poderia ter sido julgado por provado, justamente porque naquela ação executiva não foi realizada qualquer penhora, nomeadamente a pertensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado junto do Centro Nacional de Pensões.

3.º

O que consta na ação executiva a propósito da pretensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado junto do Centro Nacional de Pensões é rigorosamente apenas um ficheiro PDF de uma notificação para penhora elaborada pelo agente de execução em 28 de agosto de 2018, mas que nunca foi enviada para o Centro Nacional de Pensões.

4.º

Naqueles autos de execução não existe qualquer prova de que a notificação para penhora tenha sido enviada, nem de que a mesma tenha sido entregue no Centro Nacional de Pensões.

5.º

Nunca foi elaborado qualquer auto de penhora na ação executiva, nomeadamente relativo à pretensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma do executado paga pelo Centro Nacional de Pensões.

6.º

O executado não foi notificado da realização de qualquer penhora na ação executiva, nomeadamente relativa à pretensa penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado junto do Centro Nacional de Pensões.

7.º

Toda a quantia que a exequente recuperou na ação executiva resultou exclusivamente da transação realizada em 17 de novembro de 2017, que extinguiu a instância executiva.

8.º

Ou seja, é absolutamente insofismável que o agente de execução elaborou a notificação para penhora (28 de agosto de 2018) já depois da transação (17 de novembro de 2017)!

9.º

Em conclusão, quanto ao recurso da matéria de facto, a sentença do tribunal a quo deverá ser revogada no que tange à alínea m) dos factos provados, no sentido em que deverá ser dado como não provado que naqueles autos de execução, o agente de execução, através do ofício datado de 28 de agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efetuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de 350.000,00 €.

10.º

A sentença recorrida padece de um irremediável erro na sua fundamentação, o que, por si, é mais do que suficiente para determinar a sua revogação in totum e substituí-la por outra que julgue a oposição à execução por embargos de executado totalmente procedente.

Sem prescindir,

B. Sobre o recurso da matéria de direito

11.º

É pacífico na jurisprudência o entendimento de que a remuneração adicional do agente de execução é ainda devida nos casos em que a transação decorra ou provenha como consequência, decorrência ou como fruto da atividade ou das diligências realizadas pelo agente de execução, isto é, se se verificar um qualquer nexo entre o trabalho desenvolvido pelo agente de execução e a liquidação do crédito exequendo.

12.º

No caso em apreço, a atividade do agente de execução foi meramente administrativa (citações postais, consultas de bases de dados de serviços públicos e pedidos de informações a entidades públicas), não tendo realizado qualquer penhora.

13.º

Nenhuma diligência praticada pelo agente de execução foi minimamente significativa para a celebração da transação, não tendo, por isso, o direito a receber qualquer remuneração adicional prevista na Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto.

14.º

Pelo que deverá expurgar-se a nota discriminativa de honorários e despesas elaborada pelo agente de execução em 29 de maio de 2017 de incorreções e, deste modo, eliminar a remuneração adicional reclamada, na quantia total de 18.618,51 €, por a mesma não lhe ser legalmente devida.

15.º

A sentença recorrida padece de um irremediável erro na aplicação do direito, designadamente do n.º 5 do artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, o que, por si, é mais que suficiente para determinar a revogação da sentença e substituí-la por outra que julgue a oposição à execução por embargos de executado totalmente procedente.

Acresce que,

16.º

A obrigação de suportar a remuneração do agente de execução tem de ser adequada e proporcional e não pode exceder aquilo que se mostrar razoável face ao envolvimento, ao esforço e ao contributo do agente de execução para o resultado do processo executivo.

17.º

O princípio da proporcionalidade, também designado de princípio da “proibição do excesso”, é o corolário do princípio da confiança inerente à ideia de Estado de Direito Democrático (cf. artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa).

18.º

A solução da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, para a remuneração variável do agente de execução permite que o seu valor escape totalmente ao controle jurisdicional da sua adequação e proporcionalidade, ao não estabelecer um limite máximo e consentir que possa atingir valores significativos, ainda que a ação executiva tenha tido uma tramitação muito simples e a atuação do agente de execução tenha sido escassa e muito pouco relevante para o desfecho da execução.

19.º

O que está em causa é a adequação desse valor àquilo que é exigível que um executado deva suportar a título de custas da execução, sendo certo que essa exigibilidade tem de ser aferida segundo critérios de razoabilidade, adequação, equidade, justa medida, de forma a concretizar uma justa distribuição dos custos de funcionamento do sistema judicial pelas pessoas que a ele recorrem, sem descurar que se trata do acesso a uma função soberana do Estado e do exercício

do direito fundamental de acesso à justiça e aos tribunais.

20.º

Considerando que a ação executiva se extinguiu por transação entre a exequente e os executados, a nosso ver, o n.º 5 do artigo 50.º, em conjugação com o Anexo VIII, da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, é inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso ínsitos no princípio do Estado de Direito Democrático, consignado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa.

21.º

Em consequência, com fundamento na aludida inconstitucionalidade material, deverá ser revogada a sentença do tribunal a quo que reconheceu o direito de o agente de execução receber uma remuneração adicional de 18.618,51 € e substituí-la por outra que determine a eliminação da parcela de remuneração variável constante da nota de honorários e despesas elaborada pelo agente de execução.

O Banco 1..., S.A. respondeu ao recurso pugnando pela sua total improcedência.

Quer no apenso A quer no apenso B os recursos foram admitidos como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Os apensos A e B foram remetidos a este Tribunal da Relação, sendo o apenso B distribuído em primeiro lugar ao relator deste acórdão e às Excelentíssimas Colegas que integram este coletivo como juízas-adjuntas.

O Sr. Presidente do Tribunal da Relação do Porto determinou a apensação do apenso A ao apenso B, pelo que cumpre conhecer dos recursos interpostos num e noutro apenso, o que se fará num único acórdão, neste apenso B[6].

Não obstante ter sido requerida a impugnação da decisão da matéria de facto, porque a mesma não envolve a reapreciação de prova gravada, com o acordo dos restantes membros do tribunal coletivo dispensaram-se os vistos, cumprindo apreciar e decidir de imediato.

2. Questões a decidir tendo em conta os objetos dos recursos delimitado pelas recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil

2.1 Da impugnação da alínea m) dos factos provados;

2.2 Da remuneração adicional do agente de execução;

2.3 Da inconstitucionalidade material do n.º 5 do artigo 50.º, em conjugação com o Anexo VIII, da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, por violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso ínsitos no princípio do Estado de Direito Democrático, consignado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa.

3. Fundamentos

3.1 Da impugnação da alínea m) dos factos provados

As recorrentes impugnam a alínea m) dos factos provados, pretendendo que seja julgada não provada.

Assentam a sua impugnação na circunstância de não resultar da ação executiva em que foi emitida a nota discriminativa de honorários e despesas do agente de execução exequenda que haja sido efetuada uma penhora de um terço da pensão de reforma do primitivo executado, não havendo qualquer auto de penhora e nem tendo o primitivo executado sido notificado da realização de uma tal penhora.

O banco recorrido sustenta a improcedência da impugnação requerida porque não foi junta, nem foi feita qualquer prova do contrário, sendo certo tratar-se de facto impeditivo, competindo o ónus da prova do mesmo aos recorrentes; além disso, a ausência de auto de penhora ou de resposta por parte da Segurança Social não constituem meio cabal para negar a existência dessa notificação.

O ponto de facto impugnado tem o seguinte teor:

- Naqueles autos de execução [ação executiva nº 1217/17.4T8MAI que correu termos no Juízo de Execução da Maia, Juiz 1, Comarca do Porto], o Sr. Agente de Execução, através do ofício datado de 28 de agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efetuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de € 350 000,00 (trezentos e cinquenta mil euros).

Cumpre apreciar e decidir.

A impugnação requerida pelas recorrentes não envolve a reapreciação de prova gravada pelo que não se coloca a questão da observância dos ónus previstos no artigo 640º do Código de Processo Civil. Além disso, a matéria objeto de prova é necessariamente documental (veja-se o nº 1 do artigo 773º do Código de Processo Civil), pelo que são totalmente inócuas as considerações que se possam tecer sobre o teor do depoimento produzido pelo Sr. Agente de Execução, já que se trata de um meio de prova totalmente inidóneo para comprovar a realização da penhora de uma pensão de reforma.

Ao contrário do afirmado pelo recorrido esta factualidade não integra qualquer facto impeditivo, mas sim um dos factos constitutivos do direito à remuneração adicional exigida pelo Sr. Agente de Execução[7], sendo a alínea m) dos factos provados, no entender do tribunal a quo, mera concretização dos artigos 28º das contestações oferecidas pelo recorrido[8].

Debrucemo-nos agora sobre a impugnação da alínea m) dos factos provados.

A consulta da ação executiva em que alegadamente ocorreu o facto impugnado permite-nos verificar que após o despacho a ordenar a citação dos executados[9], o Sr. Agente de Execução fez no dia 28 de março de 2017 uma consulta ao Registo Nacional das Pessoas Coletivas e, na mesma data, as notas de citação dos executados; em 10 de abril de 2017 foi junto aos autos o aviso de receção referente à citação do primitivo executado e, porque citado em terceira pessoa, o Sr. Agente de Execução observou no mesmo dia o disposto no artigo 233º do Código de Processo Civil; no dia 18 de abril de 2017 foi junto aos autos o aviso de receção relativo à citação da executada; no dia 22 de maio de 2017 o Sr. Agente de Execução solicitou à Secretaria Judicial informação sobre a dedução de oposição pelos executados e em 29 de janeiro de 2018, a Secretaria Judicial informou que não havia dado entrada qualquer oposição à penhora, pelo que deveria prosseguir com a execução; no dia 20 de agosto de 2018 foram feitas consultas ao Registo Informático de execuções e foram pedidas informações à Autoridade Tributária e Aduaneira[10], à Segurança Social[11], ao Registo Automóvel relativamente aos então dois executados, à Caixa Geral de Aposentações e aos Serviços de Identificação Civil relativamente ao primitivo executado, ao registo comercial e ao registo nacional de pessoas coletivas relativamente à executada, tendo ainda sido obtidas informações do registo predial; com data de 28 de agosto de 2018 consta no autos cópia de uma notificação postal endereçada ao Centro Nacional de Pensões em que é solicitada, além do mais, a penhora de um terço da reforma líquida auferida pelo primitivo executado e até perfazer o montante de € 350.000,00; nesse mesmo dia, pelas 21:03:38, o exequente requereu ao Sr. Agente de Execução a extinção da ação executiva “porquanto a responsabilidade executada se encontra totalmente regularizada”; no dia 06 de setembro de 2018 o Sr. Agente de Execução envia nota de honorários ao exequente incluindo nela a título de remuneração adicional o valor global de € 14.958,50.

Não consta da ação executiva qualquer comprovativo de que a notificação alegadamente efetuada em 28 de agosto de 2018 se concretizou, nomeadamente aviso de receção assinado pela entidade destinatária da notificação ou uma resposta da mesma entidade e tal notificação.

Não foi elaborado qualquer auto de penhora, nem há notícia que tenha de facto havido uma qualquer penhora da pensão de reforma do executado.

Assinale-se ainda que não há qualquer comunicação do Sr. Agente de Execução ao Centro Nacional de Pensões a solicitar a não efetivação da penhora requerida na sequência do requerimento do exequente para extinção da ação executiva.

Pode causar alguma estranheza que a alegada notificação para penhora tenha a mesma data do requerimento em que o banco exequente requer a extinção da ação executiva em virtude de “a responsabilidade executada se encontra[r] totalmente regularizada”[12].

Assim, tudo sopesado, a nossa convicção probatória diverge radicalmente da do tribunal recorrido, inexistindo prova documental que comprove que o Sr. Agente de Execução, através do ofício datado de 28 de agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efetuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros).

Aliás, se bem se atentar na nota discriminativa de honorários e despesas apresentada pelo Sr. Agente de Execução ao exequente e que serve de título exequendo na ação executiva a que os embargos de executado estão apensados, constata-se que essa remuneração adicional foi calculada considerando que ainda não se havia efetivado a primeira penhora[13].

Por isso, a alínea m) dos factos provados deve passar para os factos não provados, procedendo a impugnação da decisão da matéria de facto requerida pelas recorrentes.

Além disso, por ser relevante para a boa decisão da causa, deve contextualizar-se a alínea c) dos factos provados[14], fazendo aí constar que o envio da nota discriminativa de honorários e despesas do Agente de Execução ocorreu depois da comunicação de 28 de agosto de 2018, em que o exequente requereu ao Sr. Agente de Execução a extinção da ação executiva “porquanto a responsabilidade executada se encontra totalmente regularizada.”

3.2 Fundamentos de facto exarados na sentença recorrida com a alteração decorrente da procedência da impugnação da decisão da matéria de facto

3.2.1 Factos provados


3.2.1.1

O ora exequente intentou contra os ora executados a ação executiva que, sob o nº 1217/17.4T8MAI, correu termos por este Juízo de Execução[15], no âmbito da qual o aí e ora exequente e os aí e ora executados outorgaram acordo de pagamento, tendo o Sr. Agente de Execução, por decisão datada de 18 de fevereiro de 2020 procedido à extinção da execução nos termos do disposto nos artigos 721º, nº 3 e 849º, do Código de Processo Civil.

3.2.1.2

Do acordo de pagamento outorgando [outorgado] entre exequente e executados nos autos de processo de execução nº 1217/17.4T8MAI, datado de 16 de novembro de 2027 [aliás 2017], consta o seguinte:

Assunto: pagamento parcial da dívida exequenda do processo nº 1217/17.4T8MAI. Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Execução da Maia, Juiz 1

A..., S.A. (…) ora representada por AA, na qualidade de Administrador Único, com poderes para o acto (…)

E

AA (…)

Considerando que:

A) No Tribunal judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução da Maia, Juiz 1, sob o processo nº 1217/17.4T8MAI, corre termos acção executiva para pagamento de quantia certa movida pelo Banco 1..., S.A. contra a A... e AA, na qual é peticionado o pagamento do montante de € 349.482,55 (trezentos e quarenta e nove e mil quatrocentos e oitenta e dois euros e cinquenta e cinco cêntimos), correspondente ao montante e titulado pela livrança que constitui o título executivo (…);

B) O Banco 1..., S.A. está disposto a aceitar o pagamento parcial da livrança de valor facial de (…).

Vêm pelo presente declarar que se obrigam, qualquer um dos dois, a:

1) Pagar a quantia de € 182.152,86 (cento e oitenta e dois mil cento e cinquenta e dois euros e oitenta e seis cêntimos) através de cheque bancário à ordem do Banco 1..., S.A., correspondente à soma dos seguintes montantes, apurados a 16 de Novembro de 2017:

(…)

Totalidade dos FEES Advogados – 24.600,00 €.

(…)

Total a pagar – 182.152,86 €.

2. Suportar as despesas e custas judiciais decorrentes do processo mencionado no considerando A)[”].


3.2.1.3

Naqueles autos de execução, depois da comunicação de 28 de agosto de 2018 em que o exequente requereu ao Sr. Agente de Execução a extinção da ação executiva “porquanto a responsabilidade executada se encontra totalmente regularizada”, o Sr. Agente de Execução enviou ao exequente o ofício datado de 6 de setembro de 2018, contendo a nota discriminativa e justificativa de despesas e honorários, requerendo o pagamento do respetivo valor no prazo de 10 dias.

3.2.1.4

Naqueles autos de execução, o Sr. Agente de Execução, através do ofício datado de 18 de fevereiro de 2020, notificou os executados da decisão com a mesma data, da qual consta o seguinte:

Requerimento do Exequente de 04/02/2020

Nos termos do nº 1 do art. 721º do C.P.C., os honorários devidos ao Agente de Execução e o reembolso das despesas por ele efectuadas, são suportados pelo exequente, podendo este reclamar o seu reembolso ao executado nos casos em que não seja possível

aplicar o disposto no art. 541º do C.P.C..

A nota de honorários do Agente de Execução foi notificada ao exequente em 06/09/2018 e 25/09/2018, não tendo a mesma sido à data e no prazo legal objecto de reclamação, pelo que se constituiu título executivo perante o exequente, conforme dispõe o nº 5 do art. 721º do C.P.C.

Assim, entende-se de todo como extemporâneo o requerimento do exequente acima referido, sem prejuízo do direito que a este assistirá de reclamar perante o executado as custas de parte a que tiver direito.”.


3.2.1.5

Naqueles autos de execução, o Sr. Agente de Execução, com o ofício datado de 18 de fevereiro de 2020, notificou os executados da comunicação do exequente a Agente de Execução datada de 4 de fevereiro de 2020, contendo o acordo de pagamento e através da qual o exequente comunicou o seguinte:

vem informar V/ Exa. que, no âmbito das negociações levadas a cabo com os Executados, os mesmos declararam responsabilizar-se pelas despesas e custas judiciais decorrentes do presente processo judicial, conforme declaração que se anexa.

Pelo exposto, requer a V/ Exa. se digne notificar os executados para procederem ao pagamento da conta, em conformidade com a declaração que subscreveram.”.


3.2.1.6

No dia 28 de agosto de 2020, o exequente procedeu ao pagamento ao Sr. Agente de Execução da quantia de € 18 618,51 (dezoito mil e seiscentos e dezoito euros e cinquenta e um cents) referente à nota discriminativa e justificativa de despesas e honorários.

3.2.1.7

O exequente enviou a cada um dos executados cartas registadas datadas de 31 de agosto de 2020, solicitando o pagamento no prazo de 10 dias da quantia de € 18 618,51 (dezoito mil e seiscentos e dezoito euros e cinquenta e um cents) referente ao valor dos honorários que pagou ao Agente de Execução, sob pena de avançar com a cobrança judicial de tal valor, cartas que os executados receberam.

3.2.1.8

Os executados pagaram à exequente a quantia de € 182 152,86 (cento e oitenta e dois mil e cento e cinquenta e dois euros [e oitenta e seis cents]).

3.2.1.9

O executado nunca recebeu qualquer comunicação por parte do Agente de Execução ou do Tribunal, notificando-o a pagar qualquer valor referente a honorários.

3.2.1.10

Da nota discriminativa de honorários e despesas do Agente de Execução, o valor de € 14 958,50 (catorze mil e novecentos e cinquenta e oito euros e cinquenta cents) + IVA[16], é referente a remuneração adicional.

3.2.1.11

Naqueles autos de execução, houve citação prévia dos executados[17].

3.2.1.12

No acordo entre o exequente e os executados não ficou consignado ou por qualquer forma limitado o valor que os executados se responsabilizavam a pagar nos termos do acordo por conta de custas e despesas judiciais.

3.2.1.13

Tendo os executados concordado com o pagamento das despesas e honorários com o [ao?] Agente de Execução.

3.2.2 Factos não provados


3.2.2.1

Que no momento da outorga do acordo, o valor das despesas e honorários do Sr. Agente de Execução não fosse conhecido por parte dos executados, ou que aquele valor não tivesse sido concretizado no âmbito daquele acordo por ainda não ser conhecido.

3.2.2.2

Que a executada estivesse convencida que terminando o processo por acordo entre todos os envolvidos, o montante a liquidar a título de despesas e encargos com o processo sempre seria um valor reduzido, referente a pequenos custos com expedições por correio, economato, eventuais deslocações e reuniões havidas pelo Agente de Execução.

3.2.2.3

Que a executada tivesse criado essa convicção em virtude de ter ficado a constar do acordo que teria de pagar cerca de € 25 000,00 (vinte e cinco mil euros) Advogados (“fees de Advogados”), ou que tivesse ficado convencida que o pagamento a Advogados esgotaria qualquer outro valor relativo a despesas com o processo.

3.2.2.4

Que a executada apenas com a instauração da presente ação executiva tivesse sido surpreendida com a existência daquele valor de €18.618,51 (dezoito mil e seiscentos e dezoito euros e cinquenta e um cents).

3.2.2.5

Que naqueles autos de execução, o Sr. Agente de Execução, através do ofício datado de 28 de agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efetuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de €350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros).

4. Fundamentos de direito

4.1 Da remuneração adicional do agente de execução

As recorrentes sustentam que a remuneração adicional ao Sr. Agente de Execução não é devida já que “a atividade do agente de execução foi meramente administrativa (citações postais, consultas de bases de dados de serviços públicos e pedidos de informações a entidades públicas), não tendo realizado qualquer penhora” e ainda porque “[n]enhuma diligência praticada pelo agente de execução foi minimamente significativa para a celebração da transação, não tendo, por isso, o direito a receber qualquer remuneração adicional prevista na Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto.”

Na decisão recorrida, fundamentou-se essencialmente a improcedência dos embargos no que respeita à remuneração adicional nos seguintes termos:

Assim sendo, conforme resulta do disposto no referido art. 50º, da Portaria nº 282/2013, de 29 de Agosto, desde que haja valor recuperado ou garantido a remuneração adicional é sempre devida, excepto nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que haja lugar à citação prévia do executado e este efectuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução, conforme resulta do nº 12, da mesma disposição legal.

E por isso, desde que haja valor recuperado ou garantido, a remuneração adicional é devida, ainda que a extinção da execução decorra de acto individual do devedor (pagamento voluntário), de acto conjunto de credor e devedor (acordo de pagamento) ou mesmo de um acto do próprio credor (desistência da execução).

Ora, conforme resulta apurado, naqueles autos de execução nº 1217/17.4T8MAI, o Sr. Agente de Execução, através do ofício datado de 28 de Agosto de 2018, dirigido ao Centro Nacional de Pensões, efectuou a penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros), conforme resulta da resposta ao artigo 28º, da contestação.

Deste modo, esta actividade processual foi levada a cabo pelo Sr. Agente de Execução em data anterior àquela em que lhe foi comunicado, pelo exequente, que as partes haviam chegado a acordo de pagamento, o que apenas ocorreu no dia 4 de Fevereiro de 2020.

Deste modo, face à penhora de 1/3 (um terço) da pensão de reforma auferida pelo executado AA, até ao montante de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros), havendo valor garantido, o Sr. Agente de Execução tinha direito à remuneração adicional que fez verter na respectiva nota discriminativa de honorários e despesas.

E por isso, pode concluir-se que a actividade do Sr. Agente de Execução foi determinante para a outorga do acordo de pagamento.

Cumpre apreciar e decidir.

Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 50º da Portaria nº 282/2013 de 29 de agosto, “[s]em prejuízo do disposto nos n.ºs 2 a 4, o agente de execução tem direito a ser remunerado pela tramitação dos processos, atos praticados ou procedimentos realizados de acordo com os valores fixados na tabela do anexo VII da presente portaria, os quais incluem a realização dos atos necessários com os limites nela previstos.”

“Nos processos executivos para pagamento de quantia certa, no termo do processo é devida ao agente de execução uma remuneração adicional, que varia em função:
a) Do valor recuperado ou garantido;
b) Do momento processual em que o montante foi recuperado ou garantido;
c) Da existência, ou não, de garantia real sobre os bens penhorados ou a penhorar” (nº 5 do artigo 50º da Portaria nº 282/2013 de 29 de agosto).

“Para os efeitos do presente artigo, entende-se por:
a) «Valor recuperado» o valor do dinheiro restituído, entregue, o do produto da venda, o da adjudicação ou o dos rendimentos consignados, pelo agente de execução ao exequente ou pelo executado ou terceiro ao exequente;
b) «Valor garantido» o valor dos bens penhorados ou o da caução prestada pelo executado, ou por terceiro ao exequente, com o limite dos créditos exequendos, bem como o valor a recuperar por via de acordo de pagamento em prestações ou de acordo global” (nº 6 do artigo 50º da Portaria nº 282/2013 de 29 de agosto).

“O cálculo da remuneração adicional efetua-se nos termos previstos na tabela do anexo VIII da presente portaria, sem prejuízo do disposto nos números seguintes” (nº 9 do artigo 50º da Portaria nº 282/2013 de 29 de agosto).

Sublinhe-se ainda que esta remuneração adicional é devida mesmo nos casos em que as partes celebram acordo para pagamento em prestações (veja-se a parte final do nº 1 do artigo 51º da Portaria nº 282/2013 de 29 de agosto).

Finalmente, no anexo VIII da Portaria nº 282/2013 de 29 de agosto, epigrafado “Remuneração adicional”, “Valor sujeito a IVA à taxa legal em vigor”, antes da tabela propriamente dita, consta que “[o] valor da remuneração adicional do agente de execução destinado a premiar a eficácia e eficiência da recuperação ou garantia de créditos na execução nos termos do artigos 50.º é calculado com base nas taxas marginais constantes da tabela abaixo, as quais variam em função do momento processual em que o valor foi recuperado ou garantido e da existência, ou não, de garantia real sobre os bens penhorados ou a penhorar.”

A questão da remuneração adicional ao Agente de Execução tem dado origem a uma abundante produção jurisprudencial e para exemplificar indicam-se apenas dois dos mais recentes acórdãos que incidiram sobre essa problemática, ambos acessíveis na base de dados do IGFEJ: acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11 de abril de 2024 proferido no processo nº 2278/20.4T8LLE-F.E1; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23 de maio de 2024, proferido no processo nº 4772/19.0T8FNG.L1-6.

A nosso ver, na linha da orientação jurisprudencial que se nos afigura dominante, para que o Agente de Execução tenha direito a remuneração adicional exige-se que pelo menos a sua atividade tenha contribuído para a recuperação do valor ou para o valor garantido.

No caso dos autos, tendo procedido a impugnação da decisão da matéria de facto, os atos praticados pelo Sr. Agente de Execução reduzem-se às citações prévias aos executados e a pesquisas para identificação de bens penhoráveis (em 20 de agosto de 2018, muitos meses depois da celebração da transação entre as partes), não tendo sido realizada qualquer penhora.

É possível estabelecer uma relação de causalidade entre a citação prévia dos executados e a celebração em 16 de novembro de 2017 de acordo entre o exequente e os executados que foi causa da posterior extinção da ação executiva?

Considerando que a citação prévia dos executados ocorreu nos começos de abril de 2017 e que o acordo entre as partes se verificou volvidos cerca de sete meses, sem que entretanto tenham sido praticados quaisquer atos pelo Sr. Agente de Execução, não cremos que se possa estabelecer um nexo de causalidade entre a atividade até então desenvolvida pelo Sr. Agente de Execução e o referido acordo que permitiu a recuperação do montante de € 182 152,86.

Neste contexto, o ora recorrido deveria ter reclamado da nota discriminativa de honorários e despesas que lhe foi remetida pelo Sr. Agente de Execução questionando a legalidade da inclusão nos honorários de uma remuneração adicional.

Procedendo ao pagamento do valor liquidado nessa nota discriminativa, o recorrido pagou além do que devia, pois não era devida remuneração adicional, por causa da falta de causalidade entre a escassa atividade desenvolvida pelo Sr. Agente de Execução e a recuperação do valor por acordo entre o exequente e os executados.

Sublinhe-se que os ora recorrentes não tiveram anteriormente a oportunidade de questionar a legalidade da nota discriminativa de honorários e despesas do Sr. Agente de Execução, pois dela não foram notificados. Daí que possam sindicar nestes autos se o montante pago pelo recorrido foi ou não bem pago.

Assim, face ao exposto, a execução deve reduzir-se ao valor de € 313,65 (€ 255,00 x 23% = € 58,65; € 255,00 + € 58,65 = € 313,65), acrescido de juros contados sobre tal montante à taxa supletiva legal que neste momento é de 4% ao ano, desde 28 de agosto de 2020 até efetivo e integral pagamento e imposto de selo contado sobre os juros à taxa de 4%, procedendo parcialmente os embargos.

A procedência dos embargos na parte referente à questão da remuneração adicional ao Sr. Agente de Execução determina que fique prejudicado o conhecimento da questão que havia sido equacionada para ser conhecida de seguida.

As custas dos recursos e dos embargos são, respetivamente, da responsabilidade de recorrentes e recorrido e embargantes e embargado, na exata proporção do decaimento (artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).

5. Dispositivo

Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar parcialmente procedente os recursos de apelação interpostos por BB, CC e DD, na qualidade de sucessoras de AA no apenso A e por A..., S.A., neste apenso e, em consequência, alteram-se os fundamentos de facto nos termos antes enunciados e revogam-se parcialmente as decisões recorridas proferidas em 12 de outubro de 2023 nos apensos A e neste apenso B, prosseguindo a ação executiva para pagamento da quantia de trezentos e treze euros e sessenta e cinco cents, acrescida de juros contados sobre tal montante à taxa supletiva legal que neste momento é de 4% ao ano, desde 28 de agosto de 2020 até efetivo e integral pagamento e imposto de selo contado sobre os juros à taxa de 4%, absolvendo-se os executados do restante peticionado pelo Banco 1..., S.A..

Custas dos embargos e dos recursos a cargo de embargantes e embargado e recorrentes e recorrido na exata proporção do decaimento, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, às taxas de justiça dos recursos.


***


O presente acórdão compõe-se de vinte e uma páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.


Porto, 09 de setembro de 2024

Carlos Gil

Fátima Andrade

Ana Paula Amorim


___________________________
[1] Segue-se, com alterações, o relatório da decisão recorrida.
[2] Do requerimento executivo destacam-se as seguintes passagens: “Título Executivo: Nota de honorários e despesas AE Factos: Por decisão do Agente de Execução de 18.02.2020 ( doc. 1 que se junta e se dá por integralmente reproduzido), já transitada em julgado, foi determinada a extinção da instância nos termos do disposto nos artigos 721, n.º 3 e 849.º, ambos do Código de Processo Civil, na sequência da celebração de um acordo entre o Exequente e Executados, respectivamente, no âmbito do processo que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do porto, Juízo de Execução, Juiz 1, com o n.º de processo 1217/17.4T8MAI. Nos termos do acordo (doc. 2 que se junta e se dá por integralmente reproduzido), celebrado em 16.11.2017, mais concretamente no considerando 2) os executados declararam: “Suportar as despesas e custas judiciais decorrentes do processo judicial mencionado no considerando A”. Sucede que, interpelados os Executados da conta final de honorários ( doc. 3 que se junta e se dá por integralmente reproduzido ) do Agente de Execução os mesmos não procederam ao pagamento, conforme haviam declarado no acordo de 16.11.2017. Nesse sentido, o Agente de Execução notificou o Banco 1..., S.A. para proceder ao pagamento da nota discriminativa de honorários, tendo o aqui Exequente procedido à sua liquidação em 28.08.2020 (conforme cópia do comprovativo de pagamento que se junta como doc. 4 e se dá por integralmente reproduzido). Nos termos do disposto no artigo 721º, n.º 1 do Código de Processo Civil “Os honorários devidos ao agente de execução e o reembolso das despesas por ele efectuadas, bem como os débitos a terceiros a que a venda executiva dê origem, são suportados pelo exequente, podendo este reclamar o seu reembolso ao executado nos casos em que não seja possível aplicar o disposto no artigo 541º”. Dispõe ainda o n.º 5 do artigo 721.º do CPC que: “A nota discriminativa de honorários e despesas do agente de execução da qual não se tenha reclamado, acompanhada da sua notificação pelo agente de execução ao interveniente processual perante o qual se pretende reclamar o pagamento, constitui o título executivo. Com efeito, e apesar do Banco 1..., S.A. ter interpelado os executados com vista ao reembolso da referida conta final no montante de € 18.618,51 (dezoito mil, seiscentos e dezoito euros e cinquenta e um cêntimos) os executados nada pagaram, conforme cartas enviadas que se juntam como docs 5 e 6 e se dão por integralmente reproduzidas. O crédito é certo, líquido e exigível e está devidamente titulado.
[3] Apenso C.
[4] Notificada às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 13 de outubro de 2023.
[5] Notificada às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 13 de outubro de 2023.
[6] Sublinhe-se que os recursos interpostos num e noutro apenso, com exceção da identidade do recorrente, são idênticos, até nos lapsos ortográficos, tal como idênticas são as sentenças impugnadas em cada um dos apensos. Por isso, as questões a decidir neste acórdão, tal como os fundamentos de facto e de direito dizem respeito aos apensos A e B.
[7] Na realidade, se bem se atentar na Tabela que consta do anexo VII da Portaria nº 282/2013 de 29 de agosto verifica-se que o legislador distingue três momentos para a fixação da remuneração adicional: antes da primeira penhora, após a penhora e antes da venda e após a venda. Quanto mais cedo se verificar a recuperação ou a garantia do valor, maior é a remuneração adicional. Se porventura o Sr. Agente de Execução não tem calculado a remuneração adicional tendo em conta os valores fixados antes da primeira penhora, a impugnação das recorrentes seria contrária aos seus interesses, pois implicaria um maior montante da remuneração adicional.
[8] Os artigos 28º das contestações oferecidas pelo embargado em cada um dos embargos de executado têm o seguinte conteúdo: “No que se refere ao valor pago pelo exequente ao Sr. Agente de Execução por conta da nota de honorários do mesmo, o mesmo era totalmente devido uma vez que foram desenvolvidas diversas diligências pelo Sr. AE que possibilitaram a celebração do acordo entre as partes.” Atente-se que aqui se afirma a relevância das diligências desenvolvidas pelo Sr. Agente de Execução para a celebração do acordo entre as partes e não que tais diligências tenham permitido o efetivo embolso daquilo que os executados se obrigaram a pagar ao exequente. O estranho nesta alegação é que uma alegada notificação datada de 28 de agosto de 2018 possa ter sido relevante para a celebração de uma transação celebrada em 16 de novembro de 2017...
[9] Notificado ao Sr. Agente de Execução no próprio dia (28 de março de 2017).
[10] Destas informações resultou a titularidade de quatro bens imóveis da executada e de um bem imóvel do executado.
[11] Destas informações resultou que o primitivo executado seria titular de uma pensão de velhice, do regime geral, desde 06 de junho de 2003.
[12] Contudo, a remuneração adicional é mais elevada se a recuperação do valor ocorrer antes da primeira penhora, pelo que deste ponto de vista, o Sr. Agente de Execução não tem qualquer interesse na realização de uma notificação para penhora, com subsequente penhora.
[13] De facto, na nota discriminativa de honorários e despesas, considerando o valor recuperado antes da primeira penhora até 160 unidades de conta (€102,00 x 160 = € 16.320,00; € 16.320,00 x 10% = €1.632,00), liquidou-se a remuneração adicional em €1.632,00 e na parte remanescente, considerando-se o remanescente do crédito exequendo (€349.482,55 - € 16.320,00 = € 333.162,55) e não o valor efetivamente recuperado de € 165.832,86 (€182.152,86 - €16.320,00 = €165.832,86) e a efetivação dessa recuperação antes da primeira penhora, liquidou-se essa remuneração adicional no montante de €13.326,50, valor que corresponde a 4% do montante de € 333.162,55 (€333.162,55 x 4% = €13.326,502). Considerando o valor efetivamente recuperado na parte que excede as cento e sessenta unidades de conta, essa remuneração adicional reduz-se ao montante de € 6.633,3144, € 6.633,31, por arredondamento.
[14] Aliás, se não existisse um requerimento desse teor, não se entenderia com que fundamento o Sr. Agente de Execução remeteria ao exequente uma nota discriminativa de honorários e despesas.
[15] A ação executiva foi instaurada em 02 de março de 2017.
[16] O que totaliza € 18.398,955 (€ 14.958,50 x 23% = € 3 440,455; €14.958,50 + €3.440,455 = €18.398,955).
[17] A citação prévia do primitivo executado, como anteriormente se viu, ocorreu no dia 03 de abril de 2017, enquanto a citação prévia da executada sociedade, fazendo fé na indicação do Sr. Agente de Execução (na cópia do aviso de receção não é legível qualquer data, nem sequer dos carimbos dos CTT), ocorreu em 04 de abril de 2017.