Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | ANTÓNIO JOSÉ RAMOS | ||
| Descritores: | INDEMNIZAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO DA REINTEGRAÇÃO CÁLCULO | ||
| Nº do Documento: | RP20110228442/09.6TTVFR.P1 | ||
| Data do Acordão: | 02/28/2011 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
| Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - Na determinação do montante da indemnização de antiguidade há que atender ao valor da retribuição auferida pelo trabalhador e ao grau de ilicitude do despedimento. II - Mostra-se adequada e ponderada a indemnização de 30 dias de retribuição base fixados para cálculo da indemnização por antiguidade, se o trabalhador auferir mensalmente a quantia de € 658,21 e se o despedimento foi declarado ilícito por não se reunirem os requisitos para a extinção do posto de trabalho. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Recurso de Apelação: nº 442/09.6TTVFR.P1 Reg. Nº 46 Relator: António José Ascensão Ramos 1º Adjunto: Des. Eduardo Petersen Silva 2º Adjunto: Des. José Carlos Machado da Silva Recorrente: B…, Lda. Recorrido: C…. Acordam os juízes que compõem a Secção Social deste Tribunal da Relação do Porto: 1. C…, residente na Rua …, …, …, em Santa Maria da Feira, deduziu contra B…, Lda., com sede na Rua …, ., …, em Santa Maria da Feira, a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 16.000,00 a título de retribuições, compensação pela extinção do posto de trabalho, férias, subsídio de férias e proporcionais de férias, subsídio de férias e de natal. Alegou, em síntese, que em 20 de Outubro de 1994 foi admitido ao serviço da Ré, com a categoria de “…”, mediante retribuição mensal ilíquida de 658,21 €; que, por carta datada de 09.02.2009, a Ré comunicou ao Autor a intenção de cessar o contrato de trabalho; que, por carta datada de 06.03.2009, a Ré comunicou ao Autor a decisão de extinção do seu posto de trabalho com efeitos a partir de 21 de Maio de 2009; que a Ré não pôs à sua disposição o pagamento da compensação devida pela extinção do posto de trabalho; não pagou a retribuição de Outubro de 2008, metade da retribuição de Novembro de 2008 e todas as retribuições referentes aos meses seguintes; não pagou subsídio de natal de 2008, nem férias e subsídio de férias vencidas em 01.01.2009. ________________ 2. Frustrada a audiência de partes a Ré apresentou contestação, pugnando pela improcedência parcial da acção, pedindo a sua absolvição do pedido de € 16.000,00, devendo o crédito ser reduzido para € 5 545,50 e o Autor ser condenado em multa e no pagamento de indemnização à Ré por litigância de má-fé.Alegou, em síntese, que é verdade que comunicou ao autor a sua intenção de fazer cessar o contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho, tendo procedido ao pagamento da compensação devida. No dia 1 de Abril de 2009 o autor e a ré assinaram uma declaração onde aquele declara ter acordado com a sociedade B…, Lda. prescindir da data de 21 de Maio de 2009 como data da cessação do contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho, acordando o dia 1 de Abril para deixar de prestar qualquer função na empresa B…, Lda., nada mais tendo a reclamar seja a que titulo for. A Ré apenas deve ao autor a quantia de € 5 545,50 relativa a retribuições em atraso, férias, subsídio de férias e proporcionais. ________________ 3. O Autor respondeu, dizendo que a Ré não lhe pagou a compensação devida e que assinou a declaração de 1 de Abril de 2009, mas a mesma não corresponde à sua vontade real.________________ 4. Saneado o processo, foi dispensada a fixação de matéria de facto assente e da base instrutória. ________________ 5. Procedeu-se a julgamento, com gravação da prova pessoal, tendo-se respondido à matéria de pela forma constante do despacho de fls. 39 a 44, sem reclamações deduzidas.________________ 6. Foi proferida sentença, cuja parte decisória tem o seguinte conteúdo:“Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condeno a Ré, B…, Lda., a pagar ao Autor: a) a quantia de 10.202,25 € (dez mil duzentos e dois euros e vinte e cinco cêntimos), a título de indemnização em substituição da reintegração; b) a quantia de 2.468,28 € (dois mil quatrocentos e sessenta e oito euros e vinte e oito cêntimos), relativa a férias, subsidio de férias e de natal referentes ao trabalho prestado em 2008 e proporcionais de férias, subsídio de férias e subsidio de natal. c) a quantia de 2.961,94 € (dois mil novecentos e sessenta e um euros e noventa e quatro cêntimos) a titulo de retribuições não pagas. * Custas por Autor e Ré na proporção do respectivo decaimento – art. 446º do Código do Processo Civil ex vi art. 1º/2/a) do Código de Processo do Trabalho.” ________________ 7. Inconformada com o assim decidido, veio a Ré interpor recurso, tendo formulado a final as seguintes conclusões:A) Na presente acção o A. veio a juízo pedir, apenas e tão só, a condenação da R. no pagamento de retribuições em atraso e outros créditos salariais e da compensação pela extinção do seu posto de trabalho. B) O Tribunal a quo, tendo apreciado a licitude da cessação do contrato de trabalho do A., e ao condenar a R. a pagar ao A. uma indemnização por antiguidade, enferma do vício de excesso de pronúncia, pois que apreciou questão que não lhe foi suscitada pelas partes e que não é de conhecimento oficioso, excedendo os poderes que são concedido pelo artº 74º do CPT. C) Ainda que se entendesse que ao apreciar a licitude do despedimento do A. o Tribunal a quo não excedeu o poderes de julgamento que lhe estão cometidos, ainda assim, não deveria a R. ter sido condenada a pagar ao A. uma indemnização por antiguidade. D) Pois que, não constando dos autos que o A. tenha manifestado optar pela indemnização em substituição da reintegração, o tribunal não podia substituir-se ao trabalhador nessa opção, pelo que na falta dessa opção só podia condenar a R. a reintegrar o A. e já não a pagar-lhe uma indemnização por antiguidade. E) Havendo lugar ao pagamento de indemnização em substituição da reintegração, o seu montante dever ser fixado em 15 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade e não em 30 dias como fez a sentença recorrida. F) Pois que tendo em conta, na graduação da ilicitude do despedimento do A., a retribuição por ele auferida (€ 658,21) e o grau de censurabilidade mínimo decorrente de não lhe ter sido colocada à disposição a compensação, se afigura adequado que o valor da retribuição para cálculo da indemnização deverá ser fixado pelo limite próximo do mínimo ou mesmo pelo mínimo dos 15 dias de retribuição. Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida na parte em que declarou ilícito o despedimento do A. e condenou a Ré a pagar-lhe a quantia de 10.202,25 € a título de indemnização em substituição da reintegração. ________________ 8. O Ex.º Sr.º Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que apelação merece parcial provimento, não devendo conhecer-se das nulidades por a sua arguição ter sido extemporânea e condenar-se a ré a reintegrar o autor no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, revogando-se, em consequência, a sentença recorrida na parte em que a condenou a pagar-lhe a quantia de € 10.202, 25 a título de indemnização em substituição da reintegração.________________ 9. O autor respondeu ao douto parecer.________________ 10. Admitido o recurso, foram colhidos os vistos legais.________________ II – Questões a DecidirDelimitado o objecto do recurso pelas conclusões do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do Código de Processo Civil aplicáveis ex vi do disposto nos artigos 1º, nº 2, al. a), e 87º do Código de Processo do Trabalho, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, temos que as questões a decidir são as seguintes: 1. Nulidade da sentença: excesso de pronúncia. 2. Reintegração e não indemnização em substituição daquela. 3. Graduação do valor da indemnização. ________________ III – FUNDAMENTOS1-Fundamentos de facto resultantes da decisão da matéria de facto proferida pela primeira instância que este tribunal mantém, porque a matéria de facto não foi impugnada e porque os elementos do processo não impõem decisão diversa, nem foi admitido documento superveniente com virtualidade para infirmar aquela decisão (artigo 712º, nº 1 do CPC): 1. A Ré é fabricante de rolhas e produtos de cortiça. 2. Admitiu o autor ao seu serviço no dia 20.10.1994, para exercer as funções de ..., sob as suas ordens, direcção e fiscalização, mediante a retribuição inicial de 81.200$00. 3. À data da cessação do contrato o Autor auferia a remuneração de € 658,21. 4. O Autor sempre cumpriu o horário de trabalho que lhe foi fixado, de 40 horas semanais. 5. O Autor foi um trabalhador assíduo, zeloso e diligente. 6. A Ré, por carta registada com aviso de recepção, datada de 09.02.2009 comunicou ao Autor a sua intenção de fazer cessar o contrato de trabalho por necessidade de extinção do posto de trabalho. 7. A Ré, por carta registada com aviso de recepção, datada de 06.03.2009 comunicou ao Autor a decisão de extinção do seu posto de trabalho, com efeitos a partir de 21.05.2009. 8. Nesta carta a Ré comunica ao Autor que “sem prejuízo dos créditos emergentes da sua prestação de trabalho, vencidos à data da cessação do respectivo contrato, bem como dos demais complementos que por direito lhe couberem será colocado nos escritórios da empresa à sua disposição o montante de € 9.214,94 relativos à compensação que lhe é devida nos termos legais.” 9. A Ré não pôs à disposição do Autor a compensação devida pela extinção do posto de trabalho. 10. A Ré pagou as retribuições ao Autor até Outubro de 2008 e metade da retribuição de Novembro de 2008, deixando de pagar as seguintes. 11. Não pagou o subsídio de natal de 2008. 12. Não pagou retribuição e subsídio de férias vencido em 01.01.2009. 13. No dia 01.04.2009 Autor e Ré assinaram uma declaração “C… (…) declara ter acordado com a sociedade “B…, Lda.” (…) prescindir da data de 21 de Maio de 2009 como data da cessação do contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho, acordando o dia 1 de Abril para deixar de prestar qualquer função na empresa (…) nada mais tendo a reclamar seja a que titulo for.”. 14. O Autor assinou a declaração que antecede porque quis que a Ré prescindisse da sua presença nas suas instalações, porque não lhe dava trabalho. 15. A Ré escreveu na declaração a frase “nada mais tendo a reclamar seja a que titulo for” e o Autor não se apercebeu dela ao assinar a carta. 16. A Ré sabe que o Autor não queria prescindir dos seus direitos. 17. O Autor, por carta registada com aviso de recepção, expedida a 04.04.2009 comunicou à Ré que “na declaração de 1 de Abril de 2009, ao subscreve-la não me apercebi da frase que constitui uma acção em que se diz “nada mais tenho a reclamar seja a que titulo for”. Entendo que esta frase só está escrita pela força do hábito de escrever declarações de quitação, o que não é o caso. (…) comunico que só aceito a cessação dos efeitos do despedimento por extinção do posto de trabalho, sob a condição de receber todos os meus direitos e créditos, (…), designadamente a compensação.” ________________ 2. De Direito.Feita esta enumeração, e delimitado como está o objecto do recurso pelas conclusões das alegações dos recorrentes, passaremos a apreciar as questões a decidir. 2.1.Nulidade da sentença A Ré veio nas alegações de recurso invocar a nulidade da sentença, dizendo que o Tribunal a quo, tendo apreciado a licitude da cessação do contrato de trabalho do A., e ao condenar a R. a pagar ao A. uma indemnização por antiguidade, enferma do vício de excesso de pronúncia, pois que apreciou questão que não lhe foi suscitada pelas partes e que não é de conhecimento oficioso, excedendo os poderes que são concedido pelo artº 74º do CPT. A nulidade invocada está consagrada no artigo 668, nº 1, alínea d) do CPC. De acordo com tal normativo: “ É nula a sentença: a) […]; b) […]; c) […]; d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) […]; “ Acontece que, a arguição não teve lugar no requerimento de interposição do recurso da forma imposta pelo artigo 77º, nº 1, do CPT – expressa e separadamente (“a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso”). A referida norma do CPT encontra a sua razão de ser na circunstância da arguição das nulidades serem, em primeira linha, dirigidas à apreciação pelo juiz pelo tribunal da 1ª instância e para que o possa fazer. Radica no “princípio da economia e celeridade processuais para permitir ao tribunal que proferiu a decisão a possibilidade de suprir a arguida nulidade”[1]. O Acórdão do Tribunal Constitucional nº 304/2005, DR, II Série, de 05.08.2005 confirma esta doutrina: em processo do trabalho, o requerimento de interposição de recurso e a motivação deste, no caso de arguição de nulidades da sentença, deve ter duas partes, a primeira dirigida ao juiz da 1ª instância contendo essa arguição e a segunda (motivação do recurso) dirigida aos juízes do tribunal para o qual se recorre. Por conseguinte, reconhecendo a razão do Ex. Mº Procurador-Geral Adjunto, no seu parecer, ao levantar essa questão, uma vez que o procedimento utilizado pela ré apelante, para a arguição da nulidade da sentença, não está de acordo com o legalmente exigido em processo de trabalho, não se conhecerá da mencionada nulidade uma vez que, não tendo sido dado cumprimento ao estabelecido no art. 77º, nº 1, do CPT, a sua arguição é extemporânea. ________________ 2.2. Comecemos, agora, por analisar a questão da reintegração e não da indemnização em substituição daquela.Alega a Recorrente que não deveria ter sido condenada a pagar ao A. uma indemnização por antiguidade, pois, não constando dos autos que o A. tenha optado pela indemnização em substituição da reintegração, o tribunal não podia substituir-se ao trabalhador nessa opção, pelo que na falta dessa opção só podia condenar a R. a reintegrar o A. e já não a pagar-lhe uma indemnização por antiguidade. Vejamos se assim é. O Tribunal considerou que não tendo a cessação do contrato sido precedida de processo disciplinar e não se mostrando reunidos os requisitos do despedimento individual por extinção de postos de trabalho, deverá concluir-se que o despedimento foi ilícito (art. 429º/a) e 402º do Código do Trabalho), pelo que condenou a Ré a pagar ao autor a quantia de € 10.202,25 a título de indemnização em substituição da reintegração. Para resolução desta questão devemos atender aos seguintes normativos: Artigo 436.º 1 - Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: Efeitos da Ilicitude a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, causados; b) A reintegrá-lo no seu posto de trabalho sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. 2 - No caso de ter sido impugnado o despedimento com base em invalidade do procedimento disciplinar, este pode ser reaberto até ao termo do prazo para contestar, iniciando-se o prazo interrompido nos termos do n.º 4 do artigo 411.º, não se aplicando, no entanto, este regime mais do que uma vez. Artigo 438.º 1 - O trabalhador pode optar pela reintegração na empresa até à sentença do tribunal. Reintegração 2 - Em caso de microempresa ou relativamente a trabalhador que ocupe cargo de administração ou de direcção, o empregador pode opor-se à reintegração se justificar que o regresso do trabalhador é gravemente prejudicial e perturbador para a prossecução da actividade empresarial. 3 - O fundamento invocado pelo empregador é apreciado pelo tribunal. 4 - O disposto no n.º 2 não se aplica sempre que a ilicitude do despedimento se fundar em motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso, bem como quando o juiz considere que o fundamento justificativo da oposição à reintegração foi culposamente criado pelo empregador. Artigo 439.º 1 - Em substituição da reintegração pode o trabalhador optar por uma indemnização, cabendo ao tribunal fixar o montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 429.º Indemnização em Substituição da Reintegração 2 - Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial. 3 - A indemnização prevista no n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades. 4 - Caso a oposição à reintegração nos termos do n.º 2 do artigo anterior seja julgada procedente, a indemnização prevista no n.º 1 deste artigo é calculada entre 30 e 60 dias nos termos estabelecidos nos números anteriores. 5 - Sendo a oposição à reintegração julgada procedente, a indemnização prevista no número anterior não pode ser inferior a seis meses de retribuição base e diuturnidades. Sobre esta problemática reproduzimos aqui parcialmente o Acórdão desta Relação de 07/10/2008[2]: “Tem-se entendido que declarado ilícito o despedimento, tudo se passa como se não tivesse existido a emissão de qualquer vontade extintiva por parte do empregador, pelo que tudo se resume a fazer continuar a executar o contrato de trabalho cuja existência foi posta em causa. A restauração natural da situação anterior à declaração de despedimento implica isso mesmo. Daí o direito a que sejam indemnizados todos os danos patrimoniais e não patrimoniais e o direito à reintegração, na tentativa de repor o statu quo ante. Assim, proposta a acção de impugnação do despedimento, deve o A., para além do mais, formular na petição inicial o pedido de declaração de ilicitude do despedimento – pedido de simples apreciação – e de reintegração na empresa ou de indemnização de antiguidade – pedido de condenação – fazendo imediatamente a opção por uma delas, ou formulando o pedido em alternativa [ambos na petição inicial] e reservando a opção para momento posterior, mas sempre até à decisão do Tribunal de 1.ª instância[3]. Já para outros, a declaração de ilicitude proferida na acção de impugnação do despedimento acarreta a destruição do despedimento, com efeitos retroactivos à data em que foi declarado, o que faz renascer o contrato de trabalho na sua plenitude, pelo que se o trabalhador apenas pedir a declaração de ilicitude na petição inicial, o Tribunal deve condenar na reintegração, apenas o podendo fazer na indemnização de antiguidade, caso tal opção venha a ser manifestada até à data da sentença da 1.ª instância. É que o efeito regra – a consequência natural, o regime tutelar supletivo ou a solução legal supletiva, como dizem outros – da declaração de ilicitude é a reintegração, como decorre da lei e a opção pela indemnização não pode ser tomada pelo Tribunal ou pelo empregador, pois é um direito do trabalhador[4]. Trata-se de entendimento antigo[4]. Na verdade, "...Não havendo opção até à data da sentença deve admitir-se que o trabalhador pretende a reintegração, pois é essa a consequência que, em primeiro lugar, resulta da lei..."[6], ou "... Se este [o trabalhador] nada disser, chegado o momento de proferir a sentença, o juiz não tem outro caminho que não seja o de condenar o empregador na reintegração..."[7] ou, ainda, "... a ausência de escolha expressa é tida, pelo legislador, como uma opção tácita no sentido da reintegração[8].” Ora, sendo assim, não tendo sido deduzido o pedido de reintegração ou de indemnização na parte da petição inicial reservada à formulação do pedido propriamente dito, à luz deste segundo entendimento, que é a nosso ver o correcto, o Tribunal a quo deveria, à primeira vista, ter condenado na reintegração no posto de trabalho. Porém, temos que ter em conta que o Autor formulou na petição inicial um pedido de condenação da Ré a pagar-lhe a quantia global de € 16.000,00 a título de retribuições, compensação pela extinção do posto de trabalho, férias, subsídio de férias e proporcionais de férias, subsídio de férias e de natal. No âmbito desse pedido global está englobado o pedido relacionado com a compensação devida à luz dos artigos 401º e 404, ambos do Código do Trabalho de 2003. Esta compensação devida pela extinção do posto de trabalho corresponde, em certos termos, à indemnização em substituição da reintegração prevista no artigo 443º. Como se refere no acórdão do STJ de 16/12/2010[9] “A petição inicial constitui um acto processual da parte, dirigido ao tribunal, que encerra declarações de vontade do respectivo autor. Não estando, ao menos quanto à narração, sujeita a fórmulas especificamente fixadas, as declarações em causa estão, como quaisquer outras, sujeitas a interpretação, embora tendo sempre presente a sua natureza e fins em razão do processo.” A vontade do autor terá que ser fixada em conformidade com os critérios estabelecidos no n.º 1 do artº. 236.º e 238.º, ambos do Código Civil. Determina o artº. 236, n.º 1, do Código Civil que "A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele". Acolhe este preceito a denominada doutrina objectivista da "teoria da impressão do destinatário": a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria; mas, de acordo com o n.º 2, do mesmo preceito legal, sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é esta que prevalece, ainda que haja divergência entre ela e a declarada, resultante da aplicação da teoria do destinatário[10]. Como sublinham os Prof. Pires de Lima e Antunes Varela[11], "A normalidade do declaratário, que a lei toma como padrão, exprime-se não só na capacidade para entender o texto ou conteúdo da declaração, mas também na diligência para recolher todos os elementos que, coadjuvando a declaração, auxiliem a descoberta da vontade real do declarante". Ou, no dizer do Prof. Mota Pinto[12], "Releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do destinatário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer". O pedido é o que se pretende com a instauração da acção, extraindo-se o mesmo da interpretação lógico-sistemática da petição inicial. Ora, tendo em conta o teor da petição inicial, os factos alegados e o pedido formulado, entendemos que a vontade real do Autor foi pretender ser indemnizado pela cessação do contrato de trabalho em virtude da invocação, por parte da sua entidade patronal, da extinção do posto de trabalho. E, como a acção foi proposta no sentido de se estar perante um processo de extinção do posto de trabalho, que o autor não pôs em questão, nunca o autor teve em mente a sua reintegração, não trazendo à colação a questão de ter que optar por algo que já tinha ao fim e ao cabo formulado – a compensação. E, se dúvidas existissem sobre a vontade real do autor nesta questão, as mesmas foram dissipadas com o teor da resposta do mesmo ao douto parecer do Sr.º Procurador-Geral Adjunto, no qual manifesta a sua vontade de ser indemnizado. Assim sendo, deve ter-se como correcta a interpretação dada pela sentença recorrida ao assumir, de forma implícita, que o Autor optou pela indemnização em substituição da sua reintegração. ________________ 2.3. Apreciemos agora a questão do quantum indemnizatório, ou seja, saber se o montante indemnizatório deve ser modificado, fixando-se, como é pretendido pela Recorrente, em 15 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção.A sentença recorrida considerou adequado fixar a base de cálculo da indemnização em 30 dias de retribuição base, tendo conta a respectiva remuneração e o circunstancialismo que determinou a cessação do contrato. A recorrente entende que tal indemnização deve ter por cálculo apenas 15 dias de retribuição base. Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, causados; b) A reintegrá-lo no seu posto de trabalho sem prejuízo da sua categoria e antiguidade (art. 436º, nº 1, alíneas a) e b) do CT). Além do mais, o trabalhador tem, ainda, direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal (art. 437º, nº 1 do CT). Da importância aludida deduz-se o montante das retribuições respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até trinta dias antes da data da propositura da acção, se esta não for proposta nos trinta dias subsequentes ao despedimento (nº 2). Em substituição da reintegração pode o trabalhador optar por uma indemnização, cabendo ao tribunal fixar o montante, entre quinze e quarenta e cinco dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 429º (art. 439º, nº 1 do CT). Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial (nº 2). A indemnização não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades (nº 3). O autor foi admitido ao serviço da ré em 20 de Outubro de 1994. O autor auferia € 658,21 de vencimento mensal. No que tange à graduação do número de dias de retribuição a atender por cada ano, uma vez que a moldura legal se encontra fixada entre 15 e 45 dias, devemos atender ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 429º. Quanto ao critério da retribuição, entendem uns que ele não constitui verdadeiramente nenhuma indicação, sendo irrelevante enquanto tal, enquanto outros opinam no sentido de que ela deve ser tomada na razão inversa da sua grandeza, isto é, quanto menor for a retribuição auferida pelo trabalhador, maior deve ser o número de dias a atender no cálculo da indemnização e quanto maior for a retribuição auferida, menor deverá ser o número de dias a graduar entre os 15 e 45, de modo que um trabalhador que aufira uma retribuição próxima do nível do salário mínimo deverá ser contemplado com uma indemnização calculada com base num número de dias perto do máximo. Cremos que esta segunda interpretação, a de dar relevo ao montante da retribuição auferida, deverá ser a seguida, pois algum sentido há-de ter o critério, sendo certo que na interpretação das normas sempre teremos de atender à presunção constante do artigo 9.º do Código Civil. Quanto ao critério da ilicitude teremos de convir que a situação não melhora significativamente. Na verdade, dizer-se que a indemnização se fixa de acordo com o grau da ilicitude do despedimento e remeter-nos para as 3 hipóteses em que ele se pode compaginar – ausência de procedimento disciplinar, invocação de motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos e improcedência da justa causa – representando algo mais que o critério da retribuição, não é completamente esclarecedor. De qualquer modo, embora haja quem refira que tais hipóteses são mais causas da ilicitude do que elementos para determinar o respectivo grau, tem-se entendido que será mais grave um despedimento fundado em motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos do que outro por falta ou vício do procedimento disciplinar, que a um despedimento declarado ilícito por inexistência ou improcedência da justa causa deverá corresponder uma indemnização graduada a meio da moldura legal ou que deve ser graduada pelo máximo do número de dias a indemnização correspondente a um despedimento em que o empregador, consciente disso mesmo, invocou motivos falsos para sustentar a sua decisão rescisória. Aliás, entendem – de lege ferenda – outros autores que, apesar dos referidos critérios da retribuição e do grau de ilicitude, a outros se poderia atender, como sejam a idade, as habilitações e a experiência e o currículo profissionais Seja como for, certo é que na determinação do montante da indemnização de antiguidade há que atender ao critério da retribuição auferida pelo trabalhador e ao grau de ilicitude do despedimento, como se referiu. Analisando os factos provados, verificamos que o Autor auferia a retribuição base de € 658,21 e que o despedimento foi declarado ilícito por não se reunirem os requisitos para a extinção do posto de trabalho. Considerando o critério da retribuição, uma vez que a retribuição base auferida é de montante não muito superior ao salário mínimo nacional, deverá a indemnização ser fixada atendendo a um número de dias um pouco superior ao do limite médio da moldura legal. Já considerando o critério da ilicitude do despedimento, resultando ela da falta de requisitos do despedimento por extinção do posto de trabalho, temos que nos afastar do limite máximo, pois ele está reservado para as situações mais gravosas, como sejam os despedimentos com invocação de motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos ou com invocação de factos, não provados, que integrem crimes, por exemplo, e andar também pelo limite médio. Ora, ponderando os factos atendíveis de acordo com os referidos critérios legais vigentes, entendemos que os 30 de retribuição base dias fixados para cálculo da indemnização por antiguidade, se mostram adequados e ponderados, pelo que nada há que alterar. Improcedem, assim, as conclusões de recurso, também quanto a este aspecto. ________________ As custas do recurso ficam a cargo da Ré/recorrente (artigo 446º do CPC).________________ III. Decisão.Em face do exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento à apelação, assim mantendo a sentença impugnada. Condenam a Ré/recorrente no pagamento das respectivas custas. Porto, 28 de Fevereiro de 2011 António José da Ascensão Ramos Eduardo Petersen Silva José Carlos Dinis Machado da Silva ____________________ [1] v., por todos, Ac. da Secção Social desta Relação de 20-2-2006, in www.dgsi.pt, proc. nº 0515705 e jurisprudência ali citada e Acórdão do STJ 27/05/2010; processo 467/06.3TTCBR.C1.S1, in www.dgsi.pt. [2] Apelação nº 5795/07 – 1ª Sec, consultável em http://www.trp.pt/jurisprudenciasocial/social07_5795.html. [3] Cfr. Pedro Romano Martinez e outros, in Código do Trabalho Anotado, 2003, pág. 634, nota III e Pedro Romano Martinez, in Do Direito de o Empregador se Opor à Reintegração de um Trabalhador Ilicitamente Despedido, Estudos Jurídicos em Homenagem ao Professor António Motta Veiga, 2007, págs. 267 e segs [4] Cfr. Júlio Manuel Vieira Gomes, in Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, 2007, págs. 1025 e 1026 [5] Cfr., para uma visão global da questão, Paula Barbosa, in Da ilicitude do despedimento por justa causa e suas consequências legais, aafdl, Lisboa, 2007, págs. 53 e segs., nomeadamente.] [6] Cfr. Carlos Alberto Lourenço Morais Antunes e Amadeu Francisco Ribeiro Guerra, in Despedimentos e Outras Formas de Cessação do Contrato de Trabalho, 1984, pág. 198. [7] Cfr. Pedro Furtado Martins, in Despedimento Ilícito, Reintegração na Empresa e Dever de Ocupação Efectiva, "Direito e Justiça" - Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa - Suplemento, 1992, pág. 145.] [8] ..."[ Cfr. João Leal Amado, in Os efeitos do despedimento ilícito (sobre os artigos 436.ºa 440.º do Contrato de Trabalho), Revista do Ministério Público, n.º 105, 2006, pág. 29. [9] Processo nº 942/04.4TBMGR.C1.S1, www.dgsi.pt. [10] Cfr. acórdão do STJ de 11.11.92, BMJ 421-364. [11] Código Civil Anotado, Coimbra editora, Vol. I, 3.ª edição, pág. 223. [12] Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 3.ª edição, pág. 447-448 _____________________ Sumário I – A arguição das nulidades da sentença deve ter lugar no requerimento de interposição do recurso da forma imposta pelo artigo 77º, nº 1, do CPT – expressa e separadamente, sob pena de a sua arguição ser extemporânea. II – A petição inicial constitui um acto processual da parte, dirigido ao tribunal, que encerra declarações de vontade do respectivo autor. III – A vontade do autor terá que ser fixada em conformidade com os critérios estabelecidos no n.º 1 do artº. 236.º e 238.º, do CC. IV – O pedido é o que se pretende com a instauração da acção, extraindo-se o mesmo da interpretação lógico-sistemática da petição inicial. V – Na determinação do montante da indemnização de antiguidade há que atender ao critério da retribuição auferida pelo trabalhador e ao grau de ilicitude do despedimento, como se referiu. VI – Assim, mostra-se adequada e ponderada a indemnização de 30 dias de retribuição base fixados para cálculo da indemnização por antiguidade, se o trabalhador auferir mensalmente a quantia de € 658,21 o despedimento foi declarado ilícito por não se reunirem os requisitos para a extinção do posto de trabalho. António José da Ascensão Ramos |