Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1195/08.0TTPRT.P1
Nº Convencional: JTRP00043787
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
SUBORDINAÇÃO JURÍDICA
ÍNDICES DE SUBORDINAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP201004121195/08.0TTPRT.P1
Data do Acordão: 04/12/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO SOCIAL - LIVRO 100 - FLS. 290.
Área Temática: .
Sumário: I- É a subordinação jurídica que nos permite aferir da existência de um contrato de trabalho.
II- Na ausência de prova directa da subordinação jurídica recorre-se ao apuramento de factos indíces, reveladores desse elemento aferidor.
III- Constituem indícios dessa subordinação (os internos), por exemplo, o local onde a actividade é exercida, a existência de horário de trabalho, a propriedade dos instrumentos de trabalho, o tipo de remuneração, o direito a férias remuneradas, o pagamento de subsídio de férias e de Natal, o recurso a colaboradores, o regime de faltas, o regime disciplinar, a repartição do risco e a integração na organização produtiva; os externos, designadamente, a exclusividade da prestação, o tipo de imposto pago pelo prestador da actividade, a sua inscrição na Segurança Social e a sua filiação sindical.
IV- Pese embora se tenha apurado que a autora efectuou a limpeza das partes comuns de um edifício, mediante acordo verbal celebrado com o réu, que essa limpeza era efectuada 2 horas por semana, aos Sábados, e efectuava igualmente a limpeza da garagem daquele condomínio, uma vez por mês, para além das 2 horas, que prestava semanalmente, e que o réu lhe pagava mensalmente quantia que entre ambos ajustaram e que foi inicialmente de 45 euros (entre Agosto de 2000 e Dezembro de 2001), de 50 euros (entre Janeiro de 2002 a Julho de 2004) e de 60 euros (de Agosto de 2004 a Fevereiro de 2008), ignorando-se, no essencial, o modo, os termos e as demais condições concretas em que tais funções foram desempenhadas à luz dos referidos índices, não se dispõe, assim, de matéria fáctica bastante que nos permita concluir pela verificação da subordinação jurídica.
V- É ao trabalhador que compete alegar e provar a existência do contrato de trabalho, se a pretensão por ele formulada em juízo assentar naquele pressuposto (art.º 342.º n.° 1, do Código Civil), sendo que, na dúvida, a sua pretensão terá de ser julgada improcedente.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apel. 1195/08.0TTPRT.P1
(PC 1195/08.0TTPRT)
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
B……………, interpôs acção declarativa de condenação, com processo comum contra CONDOMÍNIO DO PRÉDIO SITO NA RUA ………., pedindo a condenação deste em indemnização por despedimento ilícito e demais créditos salariais, no valor de euros 2.347,50.

O réu contestou aduzindo que não celebrou com a autor qualquer contrato de trabalho, concluindo pela sua absolvição do pedido.

A autora respondeu mantendo os seus pontos de vista, que foi mandada desentranhar dos autos.

Foi proferido despacho saneador e dispensada a elaboração da base instrutória.

Realizou-se a audiência de discussão da causa, finda a qual proferida decisão sobre a matéria de facto, sem qualquer reclamação.

Proferida sentença foi a acção julgada totalmente improcedente, com a absolvição do réu do pedido.

Inconformada com esta decisão dela recorre a autora, concluindo em suma que a sentença é nula (art.º 668, n.º 1, alínea c)), pois a matéria de facto dada como provada e que fundamentou a decisão deveriam ter conduzido a decisão diversa, ou seja que a autora trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da ré. Verificou-se a subordinação jurídica, pelo que se deve concluir pela existência de um contrato de trabalho Serviço doméstico entre a autora e o réu.

O réu respondeu pugnando pela improcedência do recurso.

O Exmo. Procurador – Geral Adjunta nesta Relação emitiu parecer no sentido de que se não deve conhecer da invocada nulidade por extemporaneidade e que a apelação não merece provimento.

Recebido o recurso foram colhidos os vistos legais.

2. Matéria de Facto
Na primeira instância foram considerados provados os seguintes factos:
1. A autora efectuou a limpeza das partes comuns do edifício sito na rua …., …., …-…., em ……. (Gondomar), mediante acordo verbal celebrado como réu em Agosto de 2000.
2. A autora efectuava a referida limpeza 2 horas por semana, aos Sábados, e efectuava igualmente a limpeza da garagem daquele condomínio, uma vez por mês, para além das 2 horas que prestava semanalmente.
3. O réu pagava mensalmente à autora quantia que entre ambos ajustaram, sendo inicialmente de 45 euros (entre Agosto de 2000 e Dezembro de 2001), de 50 euros (entre Janeiro de 2002 a Julho de 2004) e de 60 euros (de Agosto de 2004 a Fevereiro de 2008).
4. No dia 23 de Fevereiro de 2008 o administrador do condomínio réu comunicou à autora que a mesma deixaria de prestar os referidos serviços de limpeza a partir dessa data, por impossibilidade de o condomínio lhe pagar essa limpeza.
5. A autora durante o período em que efectuou a referida limpeza, nunca gozou férias, nem lhe foi paga pelo réu qualquer quantia a título de subsídio de férias ou de subsídio de Natal.
6. O réu não moveu à autora qualquer procedimento disciplinar.

3. O Direito
De acordo com o preceituado nos artigos 684.º, n.º 3 e art.º 690.º, n.º s 1 e 3, do Código de Processo Civil[1], aplicáveis ex vi do art.º 1, n.º 2, alínea a) e art.º 87.º, do Código de Processo do Trabalho, é pelas conclusões que se afere o objecto do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Assim, as questões que os recorrentes colocam à nossa apreciação são as seguintes:
1. Nulidade da sentença
2. Existência de contrato de trabalho

3. 1 Da Nulidade da sentença
Sustenta a autora que a sentença é nula nos termos do art.º 668, n.º1, alínea c), do Código de Processo Civil.
De acordo com o art.º 77.º do Código de Processo do Trabalho, as nulidades da sentença devem ser arguidas, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso.
No presente caso a autora não a arguiu a referida nulidade no local próprio, tendo-o feito somente nas alegações e conclusões de recurso. Deste modo, nos termos do citado normativo legal, não se conhece por extemporaneidade da mencionada nulidade.

3. 2 Da existência de contrato de trabalho
Pretende a autora que celebrou com o réu um contrato de trabalho.
Não tem razão.
De acordo com o art.º 1.º do DL 49.408, de 24 de Novembro de 1969, “contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta”. Noção semelhante é-nos transmitida pelo Código do Trabalho, aprovado pela Lei 99/2003, de 27 de Agosto.
Na ausência de prova directa da subordinação jurídica (susceptibilidade do empregador dar ordens e instruções ao trabalhador), elemento distintivo do contrato de trabalho, costuma recorrer-se ao apuramento factos índices da subordinação jurídica (critério indiciário tipológico).
Como é sabido e tem sido abundantemente reafirmado, constituem indícios dessa subordinação (os internos), por exemplo, o local onde a actividade é exercida, a existência de horário de trabalho, a propriedade dos instrumentos de trabalho, o tipo de remuneração, o direito a férias remuneradas, o pagamento de subsídio de férias e de Natal, o recurso a colaboradores, o regime de faltas, o regime disciplinar, a repartição do risco e a integração na organização produtiva; os externos, designadamente, a exclusividade da prestação, o tipo de imposto pago pelo prestador da actividade, a sua inscrição na Segurança Social e a sua filiação sindical.
No presente caso, embora se tenha apurado que a autora efectuou a limpeza das partes comuns do edifício supra indicado, mediante acordo verbal celebrado como réu em Agosto de 2000; que essa limpeza era efectuada 2 horas por semana, aos Sábados, e efectuava igualmente a limpeza da garagem daquele condomínio, uma vez por mês, para além das 2 horas que prestava semanalmente e que o réu pagava mensalmente à autora quantia que entre ambos ajustaram, sendo inicialmente de 45 euros (entre Agosto de 2000 e Dezembro de 2001), de 50 euros (entre Janeiro de 2002 a Julho de 2004) e de 60 euros (de Agosto de 2004 a Fevereiro de 2008) - o que revela a realização de funções de limpeza por parte da autora, que eram remuneradas - ignora-se, porém, no essencial, o modo, os termos e as condições concretas, em que tais funções, à luz dos referidos índices, eram desempenhadas, não se dispondo, assim, de matéria fáctica bastante que nos permita concluir pela verificação da subordinação jurídica.
Acresce, que é ao trabalhador que compete alegar e provar a existência do contrato de trabalho, se a pretensão por ele formulada em juízo assentar naquele pressuposto (art.º 342.º n.° 1, do Código Civil) sendo que, na dúvida, a sua pretensão terá de ser julgada improcedente.
Deste modo, porque se não pode concluir pela existência de um contrato de trabalho, apenas resta dizer que improcedem as conclusões de recurso.

4. Decisão
Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso da autora, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pela autora.

PORTO, 2010.04.12
Albertina das Dores N. Aveiro Pereira
Paula A. P. G. Leal S. Mayor de Carvalho
Luís Dias André da Silva
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[1] Serão deste diploma todas as referências normativas sem indicação de origem.
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SUMÁRIO
I. É a subordinação jurídica que nos permite aferir da existência de um contrato de trabalho.
II. Na ausência de prova directa da subordinação jurídica recorre-se ao apuramento de factos indíces, reveladores desse elemento aferidor.
III. Constituem indícios dessa subordinação (os internos), por exemplo, o local onde a actividade é exercida, a existência de horário de trabalho, a propriedade dos instrumentos de trabalho, o tipo de remuneração, o direito a férias remuneradas, o pagamento de subsídio de férias e de Natal, o recurso a colaboradores, o regime de faltas, o regime disciplinar, a repartição do risco e a integração na organização produtiva; os externos, designadamente, a exclusividade da prestação, o tipo de imposto pago pelo prestador da actividade, a sua inscrição na Segurança Social e a sua filiação sindical.
IV. Pese embora se tenha apurado que a autora efectuou a limpeza das partes comuns de um edifício, mediante acordo verbal celebrado com o réu, que essa limpeza era efectuada 2 horas por semana, aos Sábados, e efectuava igualmente a limpeza da garagem daquele condomínio, uma vez por mês, para além das 2 horas, que prestava semanalmente, e que o réu lhe pagava mensalmente quantia que entre ambos ajustaram e que foi inicialmente de 45 euros (entre Agosto de 2000 e Dezembro de 2001), de 50 euros (entre Janeiro de 2002 a Julho de 2004) e de 60 euros (de Agosto de 2004 a Fevereiro de 2008), ignorando-se, no essencial, o modo, os termos e as demais condições concretas em que tais funções foram desempenhadas à luz dos referidos índices, não se dispõe, assim, de matéria fáctica bastante que nos permita concluir pela verificação da subordinação jurídica.
V. É ao trabalhador que compete alegar e provar a existência do contrato de trabalho, se a pretensão por ele formulada em juízo assentar naquele pressuposto (art.º 342.º n.° 1, do Código Civil), sendo que, na dúvida, a sua pretensão terá de ser julgada improcedente.