Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
11315/21.0T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
CONTRATO ENTRE PARTICULAR E MUNICÍPIO
CLÁUSULA PENAL INDEMNIZATÓRIA
Nº do Documento: RP2024012211315/21.0T8PRT.P1
Data do Acordão: 01/22/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A competência do tribunal afere-se pelos “termos da pretensão do Autor (compreendidos aí os respectivos fundamentos), não importando averiguar quais deviam ser as partes e os termos dessa pretensão”.
II - Os contratos-promessa de doação devem, por maioria de razão, considerar-se excluídos do âmbito de aplicação do Código dos Contratos Públicos, ex vi artigo 4º, nº 2, alínea c) do referido código.
III - A pretensão deduzida, a título principal, da cláusula penal indemnizatória fixada pelas partes para a eventualidade de incumprimento do contrato-promessa de doação é tipicamente uma obrigação civil e cabe plenamente no âmbito de cognição dos tribunais comuns.
IV - A pretensão de condenação de um Município à construção de um aqueduto para as águas pluviais colocado na parte pública envolve a prática de atos materiais sobre coisa pública, sobre coisa de que o referido sujeito é titular exclusivo de um direito real administrativo, exorbitando a execução coerciva desta obrigação dos poderes de cognição dos tribunais comuns, competindo antes à jurisdição administrativa e fiscal a sua cognição, ex vi alínea o) do nº 1, do artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 11315/23.0T8PRT.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 11315/23.0T8PRT.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:
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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório[1]
Em 17 de junho de 2023, com referência ao Juízo Central Cível do Porto, Comarca do Porto, AA, BB e CC intentaram a presente ação contra o Município ... “ao abrigo do disposto nos artigos 37.º, n.º 1, alínea l) e m) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA)”[2]
Os autores alegam como fundamento da ação a celebração entre o réu, representado pelo presidente da Câmara Municipal ..., a autora e o Sr. DD, falecido em 30-12-2021, sendo os autores os seus únicos herdeiros, de um contrato denominado “Contrato de Promessa de Doação”, pelo qual, além do mais, a autora e o referido DD prometeram doar à Câmara Municipal ... parcelas de terreno a destacar de imóveis de que são proprietários, parcelas essas de que o Município necessita para a construção da Rotunda, Passagem desnivelada, alargamento do Nó de ... (...) e prolongamento da Via ..., sujeita a diversas condições modais acordadas entre as partes, nomeadamente, à promessa efetuada pelo segundo outorgante, na qualidade de presidente da Câmara Municipal ..., de no prazo de 24 meses a contar da assinatura do contrato, aprovar e conceder aos promitentes doadores, «(…) para além da capacidade construtiva equivalente à área dos terrenos 5 e 6 (…), ainda uma capacidade construtiva adicional nunca inferior à área de terreno prometida doar, ou seja, uma capacidade construtiva adicional de 3.639 m2, a efetuar nos ditos terrenos 5 e 6 e no terreno 2 (…)», e ainda «(…) a diligenciar junto das entidades competentes para que a capacidade construtiva nos referidos terrenos 2, 5 e 6 conste do PU de ... e ... e cuja aprovação se espera esteja concluída até 31/03/2005 (…)» e «a (…) de forma solidária com os empreiteiros e responsáveis pelos empreendimentos, a construir (…) do lado Norte (…) um aqueduto para as águas pluviais, colocado na parte pública (…)».
Para o caso de não cumprir no todo ou em parte tal prestação, o segundo outorgante comprometeu-se a «(…) pagar cada m2 de terreno doado sem a correspondente capacidade construtiva ao preço de 62,35 m2 (…)».
Alegam que o Município ... tomou posse dos referidos terrenos propriedade da autora e do referido DD, e procedeu à construção da Rotunda, Passagem desnivelada, alargamento do Nó de ... (...) e prolongamento da Via ..., mas não cumpriu a obrigação de aprovação do PU de ... e ..., não atribuiu qualquer capacidade construtiva adicional, nem pagou a importância que se havia comprometido a pagar por m2 face à impossibilidade de concessão da capacidade construtiva, nem construiu o aqueduto.
Alegam ainda que interpelaram o município réu a cumprir, por notificação efetuada na pessoa do Sr. Presidente da Câmara em 29-05-2023, com a cominação de que se considerariam definitivamente incumpridas as obrigações na falta de cumprimento no prazo fixado, nada tendo sido dito pelo réu.
Com tais fundamentos, peticionam:
«1. Condenar o Réu ao cumprimento das obrigações constantes das alíneas b) e d) (segunda parte) da cláusula quinta, designadamente:
a. Pagar €298.638,92, acrescido de juros á taxa legal desde a citação;
b. construir um aqueduto para as águas pluviais, colocado na parte pública;
Caso assim não se entenda,
2. Reconhecer o incumprimento definitivo do Réu e decretar a resolução judicial do contrato e, em consequência, ordenar a restituição dos terrenos cujo Réu tomou posse nos termos da cláusula sexta, ou caso não seja possível a sua restituição, condenar o Réu a indemnizar aos Autores no valor comercial dos mesmos, a determinar em sede de incidente de liquidação de sentença, acrescido de juros à taxa legal desde a citação;
3. Caso não seja esse o entendimento, sempre deverá o Réu ser condenado, a título de enriquecimento sem causa, a devolver os terrenos identificados na cláusula primeira do contrato, ou, caso tal não se mostre possível, a indemnizar os Autores no valor comercial dos mesmos, a determinar em sede de incidente de liquidação de sentença, acrescido de juros á taxa legal desde a citação.»
Em 21 de junho de 2023, além do relatório que na sua quase integralidade antes se reproduziu, escreveu-se mais o seguinte[3]:
O artigo 211.º, n.º 1, Constituição da República Portuguesa (CRP) estabelece que os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não abrangidas a outras ordens judiciais.
No mesmo sentido, o art. 80.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário
(LOSJ), estabelece que compete aos tribunais de comarca preparar e julgar os processos relativos a causas não abrangidas pela competência de outros tribunais.
Nos termos do disposto no artigo 64.º do Cód. Proc. Civil, são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.
Tendo, assim, os tribunais judiciais uma competência residual, para determinar qual o tribunal competente, importa apurar, em primeiro lugar, se a competência para julgar esta ação cabe aos tribunais administrativos.
Nos termos do n.º 3 do artigo 212.º CRP, compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.
De acordo com o art. 144.º, n.º 1, da LOSJ, aos tribunais administrativos e fiscais compete o julgamento de litígios emergentes de relações jurídicas administrativas e fiscais.
Nesse sentido, dispõe o artigo 1.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, que os tribunais da ordem administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais, nos termos compreendidos pelo âmbito de jurisdição previsto no artigo 4.º deste Estatuto.
O âmbito da jurisdição administrativa e fiscal é fixado no art. 4.º do ETAF. Na sua atual redação – emergente da última alteração, introduzida pela Lei nº 114/2019 de 12/9 −, dispõe o art. 4.º do ETAF nos seguintes termos:
«(…) 1 − Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas a:
a) Tutela de direitos fundamentais e outros direitos e interesses legalmente protegidos, no âmbito de relações jurídicas administrativas e fiscais;
b) Fiscalização da legalidade das normas e demais atos jurídicos emanados por órgãos da Administração Pública, ao abrigo de disposições de direito administrativo ou fiscal;
c) Fiscalização da legalidade de atos administrativos praticados por quaisquer órgãos do Estado ou das Regiões Autónomas não integrados na Administração Pública;
d) Fiscalização da legalidade das normas e demais atos jurídicos praticados por
quaisquer entidades, independentemente da sua natureza, no exercício de poderes públicos;
e) Validade de atos pré-contratuais e interpretação, validade e execução de contratos administrativos ou de quaisquer outros contratos celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública, por pessoas coletivas de direito público ou outras entidades adjudicantes;
f) Responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito público,
incluindo por danos resultantes do exercício das funções política, legislativa e jurisdicional, sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 4 do presente artigo;
g) Responsabilidade civil extracontratual dos titulares de órgãos, funcionários, agentes, trabalhadores e demais servidores públicos, incluindo ações de regresso;
h) Responsabilidade civil extracontratual dos demais sujeitos aos quais seja aplicável o regime específico da responsabilidade do Estado e demais pessoas coletivas de direito público;
i) Condenação à remoção de situações constituídas em via de facto, sem título que as legitime;
j) Relações jurídicas entre pessoas coletivas de direito público ou entre órgãos públicos, reguladas por disposições de direito administrativo ou fiscal;
k) Prevenção, cessação e reparação de violações a valores e bens constitucionalmente protegidos, em matéria de saúde pública, habitação, educação, ambiente, ordenamento do território, urbanismo, qualidade de vida, património cultural e bens do Estado, quando cometidas por entidades públicas;
l) Impugnações judiciais de decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo e do ilícito de mera ordenação social por violação de normas tributárias;
m) Contencioso eleitoral relativo a órgãos de pessoas coletivas de direito público para que não seja competente outro tribunal;
n) Execução da satisfação de obrigações ou respeito por limitações decorrentes de atos administrativos que não possam ser impostos coercivamente pela Administração;
o) Relações jurídicas administrativas e fiscais que não digam respeito às matérias
previstas nas alíneas anteriores.
(…).»
Para aferir da competência do foro administrativo, importará, antes de mais, verificar se os direitos que os autores invocam e os factos que alegam para os fundamentar, tal como os configuram na petição inicial, emergem de uma relação jurídica administrativa ou se traduzem um litígio expressamente mencionado no n.º 1 do art. 4.º do ETAF como sendo da competência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal.
Como é referido por Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, p. 90), a competência material afere-se pelo pedido do autor e pelos fundamentos que invoca (causa de pedir), pelo que a questão da competência material e, logo, da jurisdição competente apenas terá de ser analisada à luz da(s) pretensão(ões) dos aqui autores.
São os próprios autores que – como expressamente referem no início da petição inicial − pretendem intentar uma ação administrativa, prevista no art. 37.º, n.º 1, als. l) e m) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Do teor do contrato celebrado entre o Presidente da Câmara Municipal ... e a autora e o de cujus, a quem todos os autores sucederam e cuja legitimidade ativa fundam nessa qualidade de herdeiros daquele contraente, resulta que são assumidas – nomeadamente pelo referido presidente da Câmara Municipal ..., nessa qualidade, obrigações de natureza administrativa, como seja a assunção da obrigação de aprovação e concessão de capacidade construtiva a terrenos privados como uma cláusula modal da promessa de doação de terrenos de que o Município tomou posse, e que, de acordo com o alegado pelos autores, foram efetivamente usados para a construção de infraestruturas públicas por parte do Município réu.
Não subsistem, assim, dúvidas de que se está aqui perante uma relação jurídico-administrativa, estabelecida entre o órgão executivo do Município (Câmara Municipal ...), no exercício das suas competências executivas, e particulares.
Em conformidade, sendo a competência material para conhecer desta ação da jurisdição administrativa, verifica-se a incompetência material deste tribunal para conhecer e tramitar a presente ação, o que integra a exceção dilatória de incompetência absoluta (arts. 96.º, al. a), 97.º, 98.º e 576.º, n.º 1, e art. 577.º, al. a), todos do Cód. Proc. Civil) que, nesta fase, determina o indeferimento liminar da petição inicial, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 99.º do Cód. Proc. Civil.
Pelo exposto, conhecendo oficiosamente da exceção de incompetência material deste tribunal para tramitar e conhecer da presente ação, declaro este tribunal absolutamente incompetente, em razão da matéria, para a tramitação e conhecimento da ação e, em consequência, indefiro liminarmente a petição inicial.
Custas a cargo dos autores.
Valor da ação: € 298.638,92.
Registe e notifique.
Em 12 de julho de 2023, inconformados com o despacho que precede, AA, BB e CC interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
A. Os ora Recorrentes intentaram a presente ação declarativa comum, apresentando “(…) como fundamento da ação a celebração entre o réu (representando pelo presidente da Câmara Municipal ...), a autora e o Sr. DD (que faleceu em 30-12-2021, sendo os autores os seus únicos herdeiros), de um contrato denominado ““Contrato de Promessa de Doação” – que juntam −, pelo qual, além do mais, a autora e o referido DD prometeram doar à Câmara Municipal ... parcelas de terreno a destacar de terrenos de que são proprietários, parcelas essas cuja posse a Câmara necessita para a construção da Rotunda, Passagem desnivelada, alargamento do Nó de ... (...) e prolongamento da Via ..., sujeita a diversas condições modais acordadas entre as partes, nomeadamente, à promessa efetuada pelo segundo outorgante, na qualidade de presidente da Câmara Municipal ..., de no prazo de 24 meses a contar da assinatura do contrato, aprovar e conceder aos promitentes doadores, «(…) para além da capacidade construtiva equivalente à área dos terrenos 5 e 6 (…), ainda uma capacidade construtiva adicional nunca inferior à área de terreno prometida doar, ou seja, uma capacidade construtiva adicional de 3.639 m2, a efetuar nos ditos terrenos 5 e 6 e no terreno 2 (…)», e ainda «(…) a diligenciar junto das entidades competentes para que a capacidade construtiva nos referidos terrenos 2, 5 e 6 conste do PU de ... e ... e cuja aprovação se espera esteja concluída até 31/03/2005 (…)» e «a (…) de forma solidária com os empreiteiros e responsáveis pelos empreendimentos, a construir (…) do lado Norte (…) um aqueduto para as águas pluviais, colocado na parte pública (…)».
Para o caso de não cumprir no todo ou em parte tal prestação, o segundo outorgante comprometeu-se a «(…) pagar cada m2 de terreno doado sem a correspondente capacidade construtiva ao preço de 62,35 m2 (…)».
Alegam que o Município ... tomou posse dos referidos terrenos propriedade da autora e do referido DD, e procedeu à construção da Rotunda, Passagem desnivelada, alargamento do Nó de ... (...) e prolongamento da Via ..., mas não cumpriu a obrigação de aprovação do PU de ... e ... e não atribuiu qualquer capacidades construtiva adicional nem pagou a importância que se havia comprometido a pagar por m2 face à impossibilidade de concessão da capacidade construtiva, nem construiu o aqueduto.
Alega ainda que interpelou o município réu a cumprir, por notificação efetuada na pessoa do Sr. Presidente da Câmara em 29-05-2023, com a cominação de que se consideraria definitivamente incumpridas as obrigações na falta de cumprimento no prazo fixado, nada tendo sido dito pelo réu.” – cfr despacho recorrido.
B. O Tribunal a quo considerou no despacho recorrido o seguinte:
“Para aferir da competência do foro administrativo, importará, antes de mais, verificar se os direitos que os autores invocam e os factos que alegam para os fundamentar, tal como os configuram na petição inicial, emergem de uma relação jurídica administrativa ou se traduzem um litígio expressamente mencionado no n.º 1 do art. 4.º do ETAF como sendo da competência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal.
Como é referido por Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, p. 90), a competência material afere-se pelo pedido do autor e pelos fundamentos que invoca (causa de pedir), pelo que a questão da competência material e, logo, da jurisdição competente apenas terá de ser analisada à luz da(s) pretensão(ões) dos aqui autores.
São os próprios autores que – como expressamente referem no início da petição inicial − pretendem intentar uma ação administrativa, prevista no art. 37.º, n.º 1, als. l) e m) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Do teor do contrato celebrado entre o Presidente da Câmara Municipal ... e a autora e o de cujus, a quem todos os autores sucederam e cuja legitimidade ativa fundam nessa qualidade de herdeiros daquele contraente, resulta que são assumidas – nomeadamente pelo referido presidente da Câmara Municipal ..., nessa qualidade, obrigações de natureza administrativa, como seja a assunção da obrigação de aprovação e concessão de capacidade construtiva a terrenos privados como uma cláusula modal da promessa de doação de terrenos de que o Município tomou posse, e que, de acordo com o alegado pelos autores, foram efetivamente usados para a construção de infraestruturas públicas por parte do Município réu.
Não subsistem, assim, dúvidas de que se está aqui perante uma relação jurídico administrativa, estabelecida entre o órgão executivo do Município (Câmara Municipal ...), no exercício das suas competências executivas, e particulares.”. (negrito e sublinhado da nossa autoria)
C. Por fim, determinou que “(…) conhecendo oficiosamente da exceção de incompetência material deste tribunal para tramitar e conhecer da presente ação, declaro este tribunal absolutamente incompetente, em razão da matéria, para a tramitação e conhecimento da ação e, em consequência, indefiro liminarmente a petição inicial.”
D. Os Recorrentes consideram que este Tribunal é materialmente competente para tramitar e conhecer da presente ação, pelo que consideram, com o devido respeito, que o Tribunal a quo cometeu um vício de violação de Lei ao ter declarado o tribunal absolutamente incompetente e ao ter indeferido liminarmente a petição inicial.
Nesse sentido,
E. Determina o artigo 211.º, n.º 1, Constituição da República Portuguesa (CRP) que os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não abrangidas a outras ordens judiciais.
F. No mesmo sentido, estabelece, o artigo 80.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ), que compete aos tribunais de comarca preparar e julgar os processos relativos a causas não abrangidas pela competência de outros tribunais.
G. Acresce que, nos termos do disposto no artigo 64.º do Código de Processo Civil, são da competência dos Tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.
H. Conclui-se, portanto, que os tribunais judiciais têm uma competência residual, pelo que se a competência material não for especialmente estabelecido a outro foro, são competentes os Tribunais Comuns.
I. Nos termos do n.º 3 do artigo 212.º CRP, compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.
J. De acordo com o artigo 144.º, n.º 1, da LOSJ, aos tribunais administrativos e fiscais compete o julgamento de litígios emergentes de relações jurídicas administrativas e fiscais.
K. O artigo 4º, n.º 1, al. f), do ETAF estabelece competir aos tribunais da jurisdição administrativa a apreciação de litígios que tenham por objeto “Questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objecto passível de acto administrativo, de contratos especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspectos específicos do respectivo regime substantivo, ou de contratos em que pelo menos uma das partes seja uma entidade pública ou um concessionário que actue no âmbito da concessão e que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público”
L. No caso em apreço, o contrato (documento n.º 1 junto com a petição inicial) cuja interpretação validade e/ou execução se discute nos presentes autos não integra nenhum dos mencionados casos, visto que o Município agiu sem qualquer poder de autoridade, não é um contrato passível de ato administrativo, o contrato em apreço não é regulado por normas de direito público, nem as partes expressaram submete-lo ao regime substantivo de direito público.
M. Note-se que, a circunstância de uma das condições do negócio consubstanciar a atribuição e capacidade construtiva a outros terrenos não é, quanto a nós, suficiente para atribuir a causa à jurisdição administrativa, porquanto, não está em causa a relação administrativa subjacente à realização dessa condição, pelo que não afasta a natureza estritamente privada do contrato.
N. Em suma, a Autora e o seu falecido marido celebraram um contrato com o Réu Município ..., representado pelo Senhor Presidente da Câmara, contrato esse que foi celebrado ao abrigo de normas de direito privado, não atuando o Município com poderes de autoridade pública (ius imperi), motivo pelo qual, não podendo o acordo em causa nos autos ser classificado de contrato administrativo, nem existindo legislação especial a considerar, não se enquadra em nenhuma das hipóteses que o artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, pelo que este douto Tribunal é competente em relação da matéria para apreciar o presente litígio.
O. O Tribunal a quo ao ter decidido de modo inverso, ou seja, ao ter declarado a incompetência material deste Tribunal para conhecer e tramitar a presente ação e indeferido liminarmente a petição inicial, cometeu, salvo devido respeito, vício de violação de Lei, devendo, por esse motivo, ser a sentença revogada e substituída por outra que reconheça a competência material do Tribunal a quo para conhecer e tramitar o processo, bem como, ordenar que o processo siga os demais trâmites.
Em 13 de julho de 2023, o recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo, ordenando-se a citação do réu tanto para os termos do recurso como para os termos da causa.
Citado o réu nos termos determinados no despacho que admitiu o recurso[4], não obstante a advertência quanto o termo inicial da contestação, o réu contestou.
Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, com o acordo dos restantes membros do coletivo, atendendo à circunstância de o objeto do recurso ter natureza estritamente jurídica, dispensaram-se os vistos, cumprindo apreciar e decidir de seguida.
2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil
A única questão a decidir é a da competência material do tribunal recorrido para conhecer do objeto do presente pleito.
3. Fundamentos de facto
Os factos necessários e suficientes para o conhecimento do objeto do recurso constam do relatório deste acórdão, resultam dos próprios autos que nesta vertente estritamente adjetiva têm força probatória plena, não se reproduzindo nesta sede por evidentes razões de economia e concisão processual.
4. Fundamentos de direito
Da competência material do tribunal recorrido
Os recorrentes pugnam pela revogação da decisão recorrida afirmando que a referência no início da petição inicial ao nº 1 do artigo 37º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos se deveu a mero lapso, que o contrato cuja interpretação validade e/ou execução se discute nos presentes autos não integra nenhum dos casos previstos na alínea f) do nº 1 do artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais[5], visto que o Município agiu sem qualquer poder de autoridade, não é um contrato passível de ato administrativo, o contrato em apreço não é regulado por normas de direito público, nem as partes expressaram submetê-lo ao regime substantivo de direito público e a circunstância de uma das condições do negócio consubstanciar a atribuição e capacidade construtiva a outros terrenos não é, na sua perspetiva, suficiente para atribuir a causa à jurisdição administrativa, porquanto, não está controvertida a relação administrativa subjacente à realização dessa condição, pelo que não afasta a natureza estritamente privada do contrato.
Além disso, os recorrentes confortam a sua posição jurídica com a citação dos seguintes acórdãos, acessíveis na base de dados da DGSI e ordenados cronologicamente:
- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de setembro de 2010, proferido no processo nº 2303/08.7TVLSB-A.L1.S1[6];
- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de março de 2013, proferido no processo nº 5097/05.4TVLSB.L1.S1[7];
- acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 19 de dezembro de 2013, proferido no processo nº 80/11.3TBEVR.E1[8];
- acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27 de abril de 2015, proferido no processo nº 266/14.9TBPRD-A.P1[9];
- acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13 de outubro de 2022, proferido no processo nº 820/21.2T8PFR-A.P1[10].
Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 211º da Constituição da República Portuguesa, os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais[11].
Por outro lado, decorre do nº 3 do artigo 212º da Constituição da República Portuguesa que compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações administrativas e fiscais[12].
À semelhança da generalidade dos pressupostos processuais (veja-se assim expressamente, a título supletivo, relativamente à legitimidade, o artigo 30º, nº 3, do atual Código de Processo Civil), a competência do tribunal afere-se pelos “termos da pretensão do Autor (compreendidos aí os respectivos fundamentos), não importando averiguar quais deviam ser as partes e os termos dessa pretensão”[13].
No caso dos autos os autores em nome próprio e na qualidade de sucessores de DD demandaram o réu Município ... pretendendo exigir deste, a título principal, o cumprimento de uma cláusula penal indemnizatória e bem assim o cumprimento de uma prestação de facto positivo acordada num contrato celebrado em 01 de abril de 2003, denominado “Contrato de Promessa de Doação”.
Nesse contrato, DD e AA prometeram doar ao Município ... determinadas parcelas de certos prédios identificadas a cor laranja em planta anexa, sujeitando essa promessa de doação a certos encargos, nos termos previstos no artigo 963º do Código Civil.
Assim, na cláusula quinta do referido contrato as partes acordaram o seguinte:
“As prometidas doações, ao abrigo do artigo 963.º do Código Civil, ficam sujeitas às seguintes cláusulas modais livremente negociadas e aceites por ambas as partes:
a) O segundo outorgante promete, no prazo máximo de 24 meses a contar da assinatura do presente contrato, aprovar e conceder aos primeiros outorgantes, para além da capacidade construtiva equivalente à área dos terrenos 5 e 6 devidamente identificados na antecedente cláusula terceira, ainda uma capacidade construtiva adicional nunca inferior à área do terreno prometido doar, ou seja, uma capacidade construtiva adicional de cerca de 3 639 m2, a efectuar nos ditos terrenos 5 e 6 e no terreno 2 referido na cláusula primeira.
b) Se o segundo outorgante não cumprir no todo ou em parte com a prestação referida na alínea anterior, compromete-se a pagar por cada m2 de terreno doado sem a correspondente capacidade construtiva ao preço de 62,35 por m2, devidamente actualizado, à data do incumprimento, com o índice de preços publicado pelo INE.
c) O segundo outorgante compromete-se a diligenciar junto das entidades competentes, para que a capacidade construtiva nos referidos terrenos 2, 5 e 6 conste do PU de ... e ... em elaboração e cuja aprovação se espera esteja concluída até 31/03/2005.
d) O segundo outorgante compromete-se ainda, de forma solidária com os empreiteiros responsáveis pelos empreendimentos, a construir nos terrenos doados muros de vedação nos novos limites das parcelas sobrantes entre os terrenos que continuam propriedade dos primeiros outorgantes e o terreno público autárquico, sendo que, no lado Norte, do acesso a ..., deverão ser construídos um aqueduto para as águas pluviais colocado na parte pública e, um muro de suporte ao talude da estrada, como melhor se explica e define a implantação na planta que constitui anexo 2 ao presente contrato e dele faz parte integrante. Na parcela A o muro de vedação a construir deverá ter no mínimo dois metros de altura em relação ao nível do terreno sobrante.”
Embora o contrato a que se tem vindo a fazer referência venha configurado como um contrato-promessa unilateral de doação, já que não se divisa no referido contrato a promessa do Município ... de aceitar a doação prometida, as partes pretenderam dar-lhe imediata execução material, acordando na cláusula sexta que o beneficiário da prometida doação toma posse das parcelas necessárias aos empreendimentos logo que seja assinado o contrato pelos seus outorgantes, podendo iniciar a respetiva construção e utilizar as áreas para os fins previstos.
Em termos normativos importa no caso em apreço ter em especial atenção o que se dispõe na alínea e) do nº 1 do artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais que prevê que compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas à validade de atos pré-contratuais e interpretação, validade e execução de contratos administrativos ou de quaisquer outros contratos celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública, por pessoas coletivas de direito público ou outras entidades adjudicantes.
Neste quadro normativo, a primeira questão a que importa responder é a seguinte: o contrato em que os autores fundam as suas pretensões é um contrato administrativo ou um contrato celebrado nos termos da contratação pública?
A parte final da interrogação que precede é de resposta expedita atento o disposto na alínea c) do nº 2, do artigo 4º do Código dos Contratos Públicos que exclui do âmbito de aplicação desse diploma, além do mais, os contratos de doação e, a nosso ver, por maioria de razão, os contratos-promessa de doação.
A resposta à primeira parte da interrogação acima formulada não é tão expedita, mas ainda assim, visto o disposto no nº 1 do artigo 280º do Código dos Contratos Públicos, não parece que a promessa de doação em que os autores fundam as suas pretensões possa ser qualificada como um contrato administrativo.
De facto, não resulta do Código dos Contratos Públicos, de outra lei ou da vontade das partes que o referido negócio seja qualificado como contrato administrativo ou que esteja submetido a um regime substantivo de direito público (alínea a) do nº 1 do artigo 280º do Código dos Contratos Públicos).
Além disso, a aludida promessa não tem um objeto passível de ato administrativo e de um qualquer contrato sobre o exercício de poderes públicos (alínea b) do nº 1 do artigo 280º do Código dos Contratos Públicos).
Também não resulta que o aludido contrato confira ao co-contratante direitos especiais sobre coisas públicas ou o exercício de funções dos órgãos do contraente público (alínea c) do nº 1 do artigo 280º do Código dos Contratos Públicos).
Finalmente, não se trata de contrato que a lei submeta, bem pelo contrário, ou que admita que seja submetido a um procedimento de formação regulado por normas de direito público e em que a prestação do co-contratante possa condicionar ou substituir, de forma relevante, a realização das atribuições do contraente público (alínea d) do nº 1 do artigo 280º do Código dos Contratos Públicos).
Assim, deste ponto de vista, não está preenchido qualquer fator de atribuição à jurisdição administrativa de competência material para conhecer do caso objeto destes autos.
A nosso ver, a exigência pelos autores, a título principal, da cláusula penal indemnizatória fixada pelas partes para a eventualidade de incumprimento do contrato-promessa de doação é tipicamente uma obrigação civil e cabe plenamente no âmbito de cognição dos tribunais comuns. Igualmente sucede com as pretensões resolutivas, restitutórias, indemnizatórias e bem assim com a pretensão de restituição com base em enriquecimento sem justa causa deduzidas pelos autores a título subsidiário.
No entanto, já a pretensão deduzida a título principal de condenação do Município réu à construção de um aqueduto para as águas pluviais colocado na parte pública suscita dúvidas na medida em que a prestação de facto positivo assumida pelo réu Município ... envolve a prática de atos materiais sobre coisa pública, sobre coisa de que o referido sujeito é titular exclusivo de um direito real administrativo[14].
Na medida em que o eventual cumprimento coercivo desta prestação de facto positivo envolve a prática de atos materiais sobre coisa pública, podendo além disso, o conflito entre as partes desenvolver-se na concreta implantação da obra que o Município ... se obrigou a executar, obra que certamente assume natureza defensiva dos imóveis dos autores mas que também deve satisfazer interesses públicos, afigura-se-nos que a execução coerciva desta obrigação exorbita dos poderes de cognição dos tribunais comuns, competindo antes à jurisdição administrativa e fiscal a sua cognição, ex vi alínea o) do nº 1, do artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Importa ainda esclarecer que esta pretensão de condenação do réu Município tem plena autonomia, não podendo por isso ser reconduzida a uma questão prejudicial como previsto no nº 1 do artigo 92º do Código de Processo Civil.
Aqui chegados, estamos em condições de afirmar a competência material dos tribunais comuns para conhecimento das pretensões deduzidas pelos autores a título principal e subsidiário, com exceção da pretensão formulada a título principal de construção de um aqueduto para as águas pluviais colocado na parte pública e para a qual, pelas razões antes expostas, falece, a nosso ver, a competência material à jurisdição comum.
Procede assim parcialmente o recurso, sendo as custas do mesmo da responsabilidade dos recorrentes na medida em que na parte em que o recurso procedeu não houve contra-alegações, tirando os autores proveito da apelação e na parte em que o recurso improcedeu os autores decaíram (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
5. Dispositivo
Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por AA, BB e CC em 12 de julho de 2023 e, em consequência, em revogar parcialmente o despacho recorrido proferido em 21 de junho de 2023 na parte em que declinou a competência material dos tribunais comuns para conhecimento das pretensões deduzidas pelos autores a título principal e subsidiário, com exceção da pretensão formulada a título principal de construção de um aqueduto para as águas pluviais colocado na parte pública e cuja incompetência em razão da matéria se confirma.
Custas a cargo dos recorrentes, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso.
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O presente acórdão compõe-se de dezasseis páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.

Porto, 22 de janeiro de 2024
Carlos Gil
Fátima Andrade
Eugénia Cunha
______________
[1] Segue-se, com alterações, o relatório da decisão recorrida.
[2] Nos termos do art. 37.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, “Seguem a forma da ação administrativa, com a tramitação regulada no capítulo III do presente título, os processos que tenham por objeto litígios cuja apreciação se inscreva no âmbito da competência dos tribunais administrativos e que nem neste Código, nem em legislação avulsa sejam objeto de regulação especial, designadamente: (…) l) Interpretação, validade ou execução de contratos; m) A restituição do enriquecimento sem causa, incluindo a repetição do indevido”.
[3] Despacho notificado aos autores mediante expediente eletrónico elaborado em 22 de junho de 2023.
[4] Ou seja, nos termos conjugados dos artigos 641º, nº 7 e segunda parte do nº 1 do artigo 569º, ambos do Código de Processo Civil.
[5] Na verdade, os recorrentes citam a alínea f) do nº 1 do artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, na redação introduzida pela Lei nº 107-D/2003 de 19 de fevereiro, não atentando que à data da propositura da ação esse normativo já não vigorava, dispondo a alínea e) do nº 1 do artigo 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais que compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto a “[v]alidade de atos pré-contratuais e interpretação, validade e execução de contratos administrativos ou de quaisquer outros contratos celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública, por pessoas coletivas de direito público ou outras entidades adjudicantes”.
[6] Neste caso uma sociedade comercial, na qualidade de promitente compradora demandou a Rede Ferroviária Nacional – Refer, E.P., na qualidade de promitente vendedora, pedindo a execução específica do contrato-promessa ou em alternativa, a devolver o dobro o sinal que prestou.
[7] Neste caso, uma sociedade comercial doadora de bem imóvel a um Município para certa finalidade vem pedir a anulação do negócio em virtude de não ter sido observada a finalidade acordada para o bem doado, ou se assim não se entender, a resolução do negócio e em qualquer caso, a condenação do donatário à restituição do bem doado ou, não sendo possível a restituição, a condenação do donatário ao pagamento de uma indemnização correspondente ao valor atual do bem doado.
[8] Nesta situação, um Município que vendeu um lote para certa finalidade e subordinado a uma condição resolutiva vem pedir a resolução do contrato por incumprimento da referida condição.
[9] Trata-se de embargos a uma acção executiva para pagamento de quantia certa instaurada por sociedade comercial para haver cláusula penal estabelecida em contrato de permuta celebrado com um Município.
[10] Está em causa uma ação instaurada por pessoas singulares contra um Município em que se pede a execução específica de contrato de permuta e bem assim se deduzem diversas pretensões indemnizatórias decorrentes da violação de obrigações resultantes do aludido contrato.
[11] Esta previsão é replicada, em geral, no nº 1 do artigo 40º da Lei nº 62/2013 de 26 de agosto e, no que respeita a jurisdição cível, pelo artigo 64º do Código de Processo Civil.
[12] Esta previsão constitucional é replicada e concretizada no nº 1 do artigo 1º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei nº 13/2002 de 19 de fevereiro, com as sucessivas alterações de que foi alvo.
[13] Citação extraída da obra intitulada “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora 1979, da autoria de Manuel A. Domingues de Andrade, com a colaboração do Professor Antunes Varela, nova edição revista e actualizada pelo Dr. Herculano Esteves, página 91. O trecho de que foi extraída a citação é do seguinte teor: “A competência do tribunal – ensina Redenti [neste ponto vem a nota de rodapé (1), com o seguinte conteúdo: “II, pág. 109, sendo a obra em causa o Diritto processuale civile (reimpressão da 2.ª edição)] – «afere-se pelo quid disputatum (quid decidendum, em antítese com aquilo que será mais tarde o quid decisum)»; é o que tradicionalmente se costuma exprimir dizendo que a competência se determina pelo pedido do Autor. E o que está certo para os elementos objectivos da acção está certo ainda para a pessoa dos litigantes. A competência do tribunal não depende, pois, da legitimidade das partes nem da procedência da acção [neste ponto vem a nota de rodapé (2) com o seguinte conteúdo: “Nem ainda da personalidade judiciária dos pleiteantes: cfr. O artigo 86.º, n.º 2 (aonde fala das sucursais, agências, filiais ou delegações de pessoas colectivas), em confronto com o artigo 7.º; cfr. Também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22-V-1951 (Bol., 25.º, pág. 306).]. É ponto a resolver de acordo com a identidade das partes e com os termos da pretensão do Autor (compreendidos aí os respectivos fundamentos), não importando averiguar quais deviam ser as partes e os termos dessa pretensão.”
[14] Sobre esta figura veja-se “O Domínio Público, o Critério e o Regime Jurídico da Dominialidade”, Ana Raquel Gonçalves Moniz, Almedina 2005, páginas 368 a 371