Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1378/10.3TJPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CAIMOTO JÁCOME
Descritores: INDEMNIZAÇÃO
LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Nº do Documento: RP201111071378/10.3TJPRT.P1
Data do Acordão: 11/07/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA.
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor do deduzido pedido líquido de provar o quantitativo dos danos, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal.
É que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor.
II - Só no caso de se não ter provado a existência de danos é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação.
II - Se não houver elementos para fixar a quantidade, o tribunal condenará no que vier a ser liquidado através do incidente a implementar no próprio processo da acção declarativa (arts 378º, nº 2 e 661º, nº 2, do CPC).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 1378/10.3TJPRT.P1 (932/11)- APELAÇÃO

Relator: Caimoto Jácome(1245)
Adjuntos: Macedo Domingues()
António Eleutério()

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

1-RELATÓRIO

O Ministério Público, em representação do Estado Português (Ministério da Administração Interna - Polícia de Segurança Pública), intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra B…, com os sinais dos autos, pedindo a condenação do réu no pagamento ao Estado Português da quantia de € 23.875,56, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação até integral e efectivo pagamento.
Alegou, em síntese, que, na sequência de uma rixa ocorrida no dia 11 de Setembro de 2007, pelas 22h30m, na Rua …, no …, no Porto, que envolveu cerca de 250 pessoas, acorreram ao local vários agentes da PSP, entre os quais o agente C…, devidamente fardado e que, a dada altura, o Réu, com o intuito de desferir um murro na cara do agente C…, cerrou o punho e accionou o braço com força na sua direcção, tendo atingido o agente C… no ombro, que sofreu, como consequência directa e necessária da conduta do Réu, uma luxação no ombro direito, que lhe determinou 461 dias de doença com total incapacidade para o trabalho.
Mais alegou que tais factos foram considerados pelo Comando Metropolitano da PSP do Porto como acidente de serviço e que o Estado, durante o período de incapacidade para o trabalho, continuou a pagar ao agente C… o seu vencimento, suplementos de turno e de patrulha, no montante global de € 21.482,05 e suportou as despesas hospitalares, as consultas e os exames clínicos indispensáveis efectuados ao referido agente no período de convalescença, despendendo a quantia de € 1.880,29, a que acrescem despesas no montante de € 513,22 com consultas efectuadas no Posto Clínico da PSP e com medicamentos e despesas suportadas pelo sinistrado com vista à sua recuperação cujo ressarcimento foi autorizado pela PSP, ascendendo as despesas suportadas pelo Estado, em virtude da incapacidade do agente C…, ao montante global de € 23.875,20.
Citado, o réu contestou, excepcionando (caso julgado) e impugnando, concluindo pela improcedência da acção.
O demandante replicou.
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Saneado, condensado e instruído o processo, após julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu (dispositivo):
“Face ao exposto, julga-se a presente acção procedente, por provada e, consequentemente, condena-se o Réu B… a pagar ao Estado Português (Ministério da Administração Interna – Polícia de Segurança Pública), a quantia de € 23.875,56, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação, ocorrida em 30/09/2010, até integral e efectivo pagamento.
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Custas a cargo do Réu, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido.”.

Inconformada, a autora apelou da sentença tendo, nas alegações, concluído:
1 - O Meritíssimo Juiz a quo julgou mal a matéria de facto, nomeadamente ao dar como provados os factos constantes dos pontos d), e), f) e i), da Fundamentação de Facto.
2 - Para responder deste modo à matéria de facto o Tribunal fundou a sua convicção no teor dos documentos juntos a fls. 11 e 72 a 93 e dos depoimentos das testemunhas C…, D…, E…, F…, G… e H….
3 - O Meritíssimo Juiz a quo julgou mal a matéria de facto, designadamente ao considerar provada tal matéria, pois tais meios probatórios impunham decisão diversa sobre tal matéria, nomeadamente, dos depoimentos das testemunhas F… (vide gravação áudio de 14-02-2011, de 15:26:21 a 16:42:45, Inicio 00:00:00 e fim 00:16:13), G… (vide gravação áudio de 14-02-2011, de 16:43:15 a 17:10:35, Inicio 00:00:00 e fim 00:27:19) e H… (vide gravação áudio de 11-03-2011, de 15:10:26 a 15:35:29, Inicio 00:00:00 e fim 00:24:59), resulta inequívoco que o Réu não agrediu o agente C…, outrossim, o Réu é que foi agredido pelo agente D… quando se tentava aproximar da sua mãe que estava caída no chão.
4 - As referidas testemunhas depuseram de forma clara e convincente sobre todos os factos, devendo ser considerada como não provada a factualidade dada como provada nos pontos d), e), f), e i), da Fundamentação de Facto.
5 - A Mma.ª Sra. Juiz a quo, deu como provado que “Como causa directa e necessária da conduta do Réu, sofreu o agente C… uma contusão da região do ombro direito.”;
“Foi determinado ao referido agente 461 dias de doença com total incapacidade para o trabalho.”; E “Uma vez que os factos ocorreram durante o exercício das funções do agente C…, tal foi considerado pelo Comando Metropolitano da PSP do Porto como acidente de serviço.”
6 – No entanto, do relatório do episódio de urgência, de fls… (pág. 57 do doc. 1 da PI) apenas resulta que o agente C… se queixou de dor no membro superior direito, tendo-lhe sido diagnosticada uma contusão da região do ombro direito com dificuldade na mobilização; que foi efectuado um raio-X ao MSD o qual não evidenciou qualquer fractura ou luxação.
7 - De acordo com os registos clínicos dos Serviços de Saúde da PSP (juntos a fls… - pág. 14 e seguintes do doc. 1 da PI), no dia seguinte ao dos factos (12/09/2007), o agente foi aí observado, tendo sido diagnosticada uma lesão no ombro direito, não se podendo concluir que tipo de lesão se está a referir pois que lesão é um conceito vago.
8 - No mesmo dia 12/09/2007, o agente C… sujeitou-se a exame junto do IML do Porto (junto a fls… - pág. 20 e seguintes do doc. 1 da PI), onde nada foi observado por este ter o seu MSD imobilizado em flexão.
9 - Ao ombro direito do agente C… foram realizados diversos exames médicos de diagnóstico, a saber: Raio-X (junto a fls… - pág. 17 do doc. 1 da PI); Ecografia (junto a fls… - pág. 19 do doc. 1 da PI) e Ressonância Magnética (junto a fls… - pág. 18 do doc. 1 da PI), deles não resultando qualquer lesão ou mesmo alteração, natural ou provocada, no ombro direito de C….
10 - Só a partir de 1/10/2007 (20 dias após a alegada agressão do Réu ao agente C…) é que os serviços de saúde da PSP, passam a diagnosticar uma luxação no ombro direito de C….
11 – No entanto, o Raio-X efectuado ao ombro direito do agente nos serviços de urgência do hospital no dia dos factos, não evidenciou qualquer fractura ou luxação e os exames de diagnóstico realizados, posteriormente, ao ombro direito do agente C…, nomeadamente, Raio-X; Ecografia e Ressonância Magnética, também não evidenciaram qualquer fractura ou luxação.
12 - Inexistindo qualquer outro exame complementar de diagnostico que ateste a alegada luxação diagnosticada pelos serviços de saúde da PSP e os efectuados, na sequência da alegada agressão ao agente certificam a inexistência de qualquer lesão, trauma patologia no ombro direito deste.
13 - A verificar-se uma luxação no ombro direito do agente C…, tal diagnóstico seria comprovado mediante um simples exame de Raio-X.
14 – Não ficou apurada qualquer lesão no ombro direito do agente C… como causa directa e necessária de qualquer acção do Réu, pelo que, deve ser considerada como não provada a factualidade dada como provada nos pontos i), j), o), e p), da Fundamentação de Facto.
15 - O único elemento clínico no processo que aborda tal diagnóstico é o registo clínico do episódio de urgência do Hospital ….
16 - Os serviços de saúde da PSP diagnosticaram uma luxação no ombro do agente C… e não uma contusão e foi com base nesse diagnóstico que determinaram ao agente C… 461 dias de doença.
17 - Contusão e luxação são conceitos e lesões bem distintos – como, aliás, é do conhecimento generalizado das pessoas.
18 - A considerar provado que o agente C… teve uma contusão, como se considerou, não poderia o Mmo. Juiz a quo ter considerado provado que ao agente foi determinado 461 dias de doença, pois tal determinação teve por base um diagnóstico diferente – ou seja, uma luxação, sendo o próprio Autor quem refere no art. 11.º e 12.º da sua Petição que “(…) sofreu uma luxação no ombro direito (…)” e que “A referida luxação determinou 461 dias de doença (…)”.
19 - Assim, tendo ficado provada a existência de uma simples contusão no ombro direito do agente C…, nunca poderia o Juiz a quo ter dado como provado que ao agente foi determinado 461 dias de doença – pois, não ficou provado que o agente sofreu uma luxação e esta incapacidade foi atribuída com base no diagnóstico de uma luxação.
20 - Pelo que, deve ser considerada como não provada a factualidade dada como provada nos pontos i), j), o), e p), da Fundamentação de Facto – alteração que se impõe.
21 - É patente e notório, que, in casu, não se verificam os requisitos exigidos para a efectivação de responsabilidade civil por factos ilícitos, nos termos do art. 483.º do CC.
22 - O dever de indemnizar só existe quando, cumulativamente se verifiquem os seguintes requisitos: A ilicitude do facto; A culpa; O dano e o Nexo de causalidade entre o facto e o dano sofrido pelo lesado.
23 - Da matéria dada como provada, nomeadamente a identificada sob as alíneas l) e m), resulta que foram efectuados exames ao ombro direito do agente C…, nomeadamente, exame pericial no IML, do qual resulta inequívoca a inexistência de sinais externos, Raio-X, Ecografia e Ressonância Magnética, os quais não evidenciaram qualquer fractura ou luxação, nem tão pouco contusão.
24 – Pelo que, não está, pelo menos, preenchido o requisito “Dano” do qual depende a efectivação de responsabilidade civil por factos ilícitos e consequente dever de indemnizar e não estando preenchidos todos os apontados requisitos exigidos pelo art. 483.º do CC, deverá a presente acção ser julgada totalmente improcedente por não provada.
25 - A sentença recorrida ao decidir como decidiu, violou flagrantemente, pelo menos, o disposto no artigo 483.º do Código Civil e no artigo 655.º do Código de Processo Civil.
Nestes termos, deverá ser dado provimento ao presente recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida.

Na resposta às alegações o apelado defende a manutenção do decidido.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2- FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1 e 3, do C.P.Civil.

2.1 - OS FACTOS

Nas conclusões, o recorrente insurge-se contra a decisão sobre a matéria de facto, de fls. 219-223, integrada na sentença recorrida.
Concluiu existir erro na apreciação da prova documental e testemunhal, devendo ser considerada como não provada a factualidade dada como provada nos pontos d), e), f), i), j), o) e p), da Fundamentação de Facto da decisão recorrida.
Pede a reapreciação da prova testemunhal e documental (depoimentos das testemunhas C…, D…, E…, F…, G… e H… e documentos de fls. 11 e 72 a 93).
A matéria posta em causa pelo apelante, considerada provada no tribunal a quo, relaciona-se com a agressão e as consequências físicas (dano/incapacidade laboral) da mesma.
Vejamos.
Fixada a matéria de facto, através da regra da livre apreciação das provas, consagrada no artº 655º, nº 1, do CPC, em princípio essa matéria é inalterável.
A decisão do tribunal da 1ª instância sobre a matéria de facto só pode ser alterada pela Relação nas situações previstas no artº 712º, do CPC.
Estas constituem as excepções à regra básica da imodificabilidade da decisão de facto proferida na 1ª instância.
Tendo ocorrido a gravação dos depoimentos prestados, "a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido..." - nº 2, do artº 712º, do CPC.
O recorrente cumpriu o ónus imposto nos nºs 1, e 2, parte final, do artº 685º-B, do CPC (ver artº 522º-C, do CPC).
Importa ter presente que a finalidade do citado artº 712º, do CPC, é garantir a correcção do apuramento da matéria de facto, mas tal possibilidade tem de ser feita no respeito pelas normas jurídicas e processuais adequadas.
Mesmo que o recorrente observe totalmente o que prescrevem os citados art°s 685º-B e 712°, nos 1 e 2, do CPC, a alteração da matéria de facto pela Relação só ocorrerá quando dos meios de prova indicados pelo recorrente, valorizados no conjunto global da prova produzida, se verificar que, em concreto, se revelam inequívocos no sentido por si pretendido.
O controlo da Relação sobre a convicção que se formou no tribunal a quo deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal é, reconhecidamente, mais falível que qualquer outra, e quanto à avaliação da respectiva credibilidade também o tribunal recorrido está em melhor posição para a fazer.
Quer dizer, a admissibilidade da respectiva alteração por parte do tribunal da Relação, mesmo quando exista prova gravada, funcionará, assim, apenas, nos casos para os quais não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação.
Deve aceitar-se que a convicção do julgador da 1ª instância resulta da experiência, prudência e saber daquele, sendo certo que é no contacto pessoal e directo com as provas, designadamente com a testemunhal e no depoimento de parte, que aquelas qualidades de julgador mais são necessárias, pois é com base nelas que determinado depoimento pode ou não convencer quanto à veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recai, constituindo uma das manifestações dos princípios da oralidade e da imediação, por via das quais o julgador tem a oportunidade de se aperceber da frontalidade, tibieza, lucidez, rigor e firmeza com que os depoimentos são produzidos, mesmo do confronto imediato entre os vários depoimentos, do contraditório formado pelos intervenientes, advogados e juízes, do interrogatório do advogado que a apresenta, do contraditório do outro mandatário e das dúvidas do próprio tribunal, melhor ajuizando e aquilatando desta forma da sua validade.
Importa distinguir os casos em que os meios de prova, designadamente determinados documentos juntos aos autos, têm força probatória plena e aqueles em que a não têm. Neste último caso, ou seja, de meios de prova a apreciar livremente pelo julgador (v.g. documental, testemunhal, pericial), a Relação só pode valorar esses meios, e daí partir para uma alteração das respostas ao questionário/base instrutória, se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão da 1ª instância. É que só nesse caso a Relação se encontra numa posição igual à da 1ª instância para fazer uma apreciação livre (artº 655º, do CPC), o que pressupõe a possibilidade de considerar em simultâneo todas as provas produzidas.
A sindicância à convicção do julgador da 1ª instância, a realizar por este tribunal de recurso, apenas se mostra adequada quando a mesma se apresenta manifestamente contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos.
Feitas estas considerações genéricas, vejamos a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto.
Na motivação da decisão sobre a matéria de facto (fls. 221-223), a Sr.ª Juíza da 1ª instância afirma o seguinte:
A matéria de facto considerada provada resultou da convicção formada pelo Tribunal com base no teor dos documentos juntos a fls. 11 e 72 a 93 e, bem assim, no depoimento da testemunha C…, agente da PSP, o qual referiu que no mês de Setembro de 2007, estava de serviço e foi ao … auxiliar uns colegas de outra esquadra que pediram reforços, esclarecendo que havia uma contenda no local entre vários elementos, calculando que estavam presentes cerca de 300 moradores do bairro, acrescentando que estavam cerca de 20 a 25 agentes policiais no local, referindo ainda que os agentes policiais estavam a fazer um perímetro de segurança e que o Réu, que estava muito exaltado e que andava por ali, a cerca de meio metro da testemunha, deu-lhe um murro, esclarecendo a testemunha que estava atenta e que foi atingida no ombro direito, na sequência do que foi necessário manietar o Réu, referindo a testemunha que foi posteriormente ao Hospital …, onde lhe foi feito um raio-x, esclarecendo que tinha um inchaço, mas que estava tudo bem a nível de ossos, pelo que foi medicado e teve de fazer fisioterapia e bastantes infiltrações, tendo ficado impossibilitado de trabalhar cerca de 300 ou 400 dias, referindo ainda que o Estado pagou-lhe o ordenado base e, posteriormente, o restante, esclarecendo que lhe foram pagas as despesas hospitalares, exames clínicos, consultas e medicamentos; da testemunha D…, agente da PSP, o qual referiu que foi chamado ao local, ao …, por causa de uma desordem pública entre famílias, referindo ainda a testemunha que estava, na altura, devidamente fardada e que estavam no local, cerca de 200 pessoas, acrescentando que as pessoas estavam muito exaltadas, referindo ainda que estava próximo do agente C…, a cerca de 2 ou 3 metros e viu o Réu a agredir o seu colega, atingindo-o com violência no braço direito, não conseguindo precisar, no entanto, se a agressão foi perpetrada com a mão aberta ou fechada, acrescentando que logo de seguida, o seu colega C… começou a queixar-se do ombro, referindo que o Réu foi imobilizado pela própria testemunha e conduzido ao Hospital, referindo, por último, que o Réu não tinha hematoma visível; da testemunha E…, agente da PSP, o qual referiu que foi chamado ao …, esclarecendo que fazia parte do destacamento das testemunhas anteriores e que foram dar apoio a outros colegas que já se encontravam no local, acrescentando que estava muita gente presente, referindo que estava juntamente com outros agentes policiais no meio de dois grupos de moradores e que os agentes policiais começaram, inicialmente, a ser apedrejados e tiveram de fazer um perímetro de segurança, referindo que não viu o Réu a agredir o seu colega C…, tendo presenciado apenas o seu colega a queixar-se, referindo ainda que o Réu estava exaltado e que foi necessário manietá-lo, acrescentando que o Réu ofereceu bastante resistência, referindo ainda a testemunha que acompanhou o seu colega C… ao Hospital, referindo ainda que já conhecia anteriormente o referido agente C…, com o qual praticava desporto, referindo que o seu colega não se queixava anteriormente do ombro, referindo, por último, que o seu colega C… esteve de baixa médica e, desde a data dos factos, não voltou a praticar desporto; da testemunha F…, amiga de infância do Réu, a qual referiu que no dia 11 de Setembro, há 3 ou 4 anos, ocorreu uma confusão entre famílias à entrada do …, que teve início cerca das 7 horas da tarde e acabou tarde, referindo ainda que a mãe do Réu foi ver o que se passava e desmaiou, esclarecendo a testemunha que se encontrava com a mãe do Réu, referindo, por último, que o Réu tinha um corte na cabeça e foi ao Hospital …, onde levou pontos; da testemunha G…, estafeta, cunhado do Réu, o qual referiu que viu o Réu a chegar ao local, vindo do … e a passar pela polícia, acrescentando que não esteve sempre a olhar para o Réu e, por último, a testemunha H…, ajudante de cozinha, presentemente desempregada, a qual referiu que houve um desentendimento e foi chamada a polícia ao local, referindo ainda que o Réu foi ao Hospital fazer um curativo, testemunhas estas que depuseram de forma convincente sobre os factos acima referidos e cujos depoimentos foram ainda conjugados com o teor dos documentos juntos a fls. 12 a 71 e 94 e 99 a 119.
A matéria de facto considerada não provada resultou da circunstância de não ter sido produzida qualquer prova convincente sobre a mesma.
O depoimento da testemunha I…, médica que exerce funções na Delegação do Norte do IML, nada mais veio acrescentar, à matéria de facto à qual foi indicada, para além do que já consta dos documentos constantes dos autos, esclarecendo apenas a testemunha que os exames do IML divergem dos exames da PSP, porque o IML não teve acesso a todos os elementos e não apreciou a incapacidade para o trabalho.
O depoimento prestado pela testemunha F…, segundo o qual o Réu vinha socorrer a sua mãe e foi atirado ao chão pelo agente D…, bem como o depoimento da testemunha G…, segundo o qual a testemunha, apesar de não ter estado o tempo todo a olhar para o Réu, viu, a dada altura, os agentes da polícia a atirarem o Réu ao chão e o Réu a cair desamparado para trás, tendo a testemunha ajudado o Réu a levantar-se, referindo posteriormente a testemunha, no decurso do seu depoimento, que viu um dos agentes da polícia a meter a mão no pescoço do Réu e que este andou para trás e caiu de costas e o depoimento prestado pela testemunha H…, segundo o qual a testemunha viu os polícias a atirarem o Réu ao chão e a baterem-lhe, não se mostraram convincentes, quando conjugados tais depoimentos com o depoimento da testemunha C…, segundo o qual estava na altura uma senhora caída no chão, a cerca de 100 metros do local onde a testemunha se encontrava a fazer o perímetro de segurança e que do local onde a testemunha se encontrava, tinha-se pouca visibilidade do local onde se encontrava caída essa senhora e, bem assim, com o depoimento da testemunha D…, segundo o qual a testemunha, para manietar o Réu, colocou-lhe a mão no pescoço e fê-lo ajoelhar-se e deitar-se no solo, de barriga para baixo, esclarecendo que tal procedimento é o habitual.
Existe ainda contradição entre o depoimento da testemunha F…, segundo o qual o Réu acorreu ao local, após ter sido chamado pela irmã, para socorrer a mãe e o depoimento da testemunha C…, segundo o qual o Réu nunca se referiu à mãe, mas a uma outra pessoa que, na altura, já tinha sido detida.
Vejamos.
A prova testemunhal e documental indicada pela julgadora da 1ª instância na aludida motivação, suporta, lógica e consistentemente, o decidido no tribunal recorrido, no tocante à matéria de facto vertida na fundamentação de facto da sentença recorrida, excepto o descrito nas alíneas j) e o), como adiante se explicará.
Com efeito, ouvidos os depoimentos das testemunhas, ponderada a razão de ciência destas e respectiva credibilidade e considerada a documentação junta pelas partes, afigura-se-nos não existir fundamento para alterar o decidido na 1ª instância, no que concerne à descrita matéria de facto, excepto no que respeita ao descrito nas alíneas j) e o).
Concretamente, da aludida prova testemunhal e documental resulta, no essencial, que o réu agrediu o agente da PSP C…, no ombro direito, nos referidos dia, hora e ano, pelo modo indicado.
Porém, na decisão sobre a matéria de facto há uma obscuridade, suscitada pelo apelante, que importa esclarecer e ultrapassar.
Com efeito, na petição inicial, o demandante alega que o agente C…, em consequência da descrita agressão, sofreu uma luxação no ombro direito.
Na 1ª instância deu-se como provado que “Como causa directa e necessária da conduta do Réu, sofreu o agente C… uma contusão da região do ombro direito.”.
Ora, quer o registo clínico dos serviços de urgência do Hospital … (dia 11/09/2007), quer o exame pericial efectuado no IML, em 12/09/2007, ao agente C…, bem como os restantes exames (raio-X, ecografia e ressonância magnética, cujos relatórios, datados de 26.09.2007, se encontram juntos aos autos a fls. 18 a 20), não evidenciam a existência de luxação no ombro direito do referido agente da PSP.
Nos exames efectuados no IML, em 12/09/2007 e 18/02/2009 (perícia de avaliação do dano corporal), nada se refere sobre a existência de luxação.
Apenas os serviços clínicos da PSP diagnosticaram ao agente C… esse tipo de lesão e trataram-no como sofrendo de luxação, desconhecendo-se em que exames se basearam para tal diagnóstico.
Como se sabe, contusão e luxação são lesões, constituindo processos patológicos ou quadros clínicos diferentes.
A luxação é bem mais grave e exigente, no modo e tempo de cura, do que uma contusão.
Na decisão sobre a matéria de facto afirma a julgadora da 1ª instância que “Não resultaram provados quaisquer outros factos, com relevância para a decisão a proferir (…).”.
Nenhuma referência fez à muito relevante matéria, alegada pelo autor, no sentido de que o agente C… sofreu, em consequência, directa e necessária, da agressão, uma luxação e não uma contusão, com um longo período de incapacidade.
Na respectiva motivação, a julgadora a quo refere que “O depoimento da testemunha I…, médica que exerce funções na Delegação do Norte do IML, nada mais veio acrescentar, à matéria de facto à qual foi indicada, para além do que já consta dos documentos constantes dos autos, esclarecendo apenas a testemunha que os exames do IML divergem dos exames da PSP, porque o IML não teve acesso a todos os elementos e não apreciou a incapacidade para o trabalho”.
No entanto, a nosso ver, quem teria de explicar a existência de luxação são os médicos que prestam, ou prestaram, serviço para a PSP e que subscrevem os documentos de fls. 60 e seguintes (exames médicos directos) e não foram indicados pelas partes, designadamente pelo autor, nos meios de prova.
Tem, pois, razão o apelante quando conclui que:
- Inexiste qualquer outro exame complementar de diagnóstico que ateste a alegada luxação no ombro direito do referido agente, patologia diagnosticada pelos serviços de saúde da PSP;
- Os serviços de saúde da PSP diagnosticaram uma luxação no ombro do agente C… e não uma contusão e foi com base nesse diagnóstico que determinaram ao agente C… 461 dias de doença.
Na verdade, pode aceitar-se que uma luxação demore mais de 400 dias a ser debelada ou tratada, mas já não se compreende que, por regra, uma contusão necessite de 400 ou mais dias, para tratamento e cura.
A nosso ver, o que ficou provado é, apenas, que o agente C… foi acompanhado pelo serviço de saúde da PSP em consultas regulares, as quais se realizaram em 12/09/2007, 1/10/2007, 10/12/2007, 7/01/2008, 11/02/2008, 10/03/2008, 9/05/2008, 3/07/2008, 7/11/2008, 11/11/2008 e 1/07/2009, tendo sido determinado ao referido agente, com base naquela patologia, 461 dias de doença com total incapacidade para o trabalho.
Mas esse período de doença e incapacidade resultam, e só se compreendem, de uma luxação no ombro direito do agente C…, detectada pelos clínicos da PSP, mas, a nosso ver, não provada, pelo menos como consequência directa e necessária da agressão provocada pelo réu.
Entre 12/09/2007 e 01/10/2007, pode o agente C… ter sofrido outra lesão que lhe causasse, essa sim, luxação do ombro direito.
Não sabemos, mas perante o descrito quadro clínico (diversos exames e diagnósticos) nada impede que se conjecture sobre o que se passou após a comprovada agressão de que foi vítima o agente C…, no referido dia e hora.
A dúvida permanece, devendo, por isso, apelar-se ao estatuído no artº 516º, do CPC.
A prova testemunhal e pericial é livremente apreciada pelo tribunal (arts. 396º, do CC, e 591º e 655º, do CPC).
Como é bom de ver, o que está em causa é o apuramento, inequívoco, do nexo causal entre a agressão, a doença (lesão) e incapacidade laboral.
Deste modo, tendo presente o que se deixou expendido a propósito da apreciação da prova, na 2ª instância, aceita-se, pois, a convicção (positiva/restritiva e negativa) da julgadora da 1ª instância, a que aderimos, que serviu de base à decisão sobre a matéria de facto, sendo esta consonante com as regras da experiência e da lógica, no que concerne à matéria de facto descrita nas diversas alíneas fundamentação de facto, excepto no que respeita ao vertido nas alíneas j) e o), justificando-se alteração destas (artº 712º, nº 1, al. a), do CPC).
Temos, pois, como assente seguinte matéria de facto:
a) No dia 11 de Setembro de 2007, pelas 22h30m, ocorreu uma rixa na Rua …, no …, no Porto, na sequência da qual se juntaram, no local, cerca de 250 pessoas.
b) Acorreram ao local vários agentes da PSP, a fim de restabelecerem a ordem pública.
c) Entre os vários agentes encontrava-se C…, que tal como os demais, se apresentava devidamente fardado.
d) A dada altura o Réu, com o intuito de desferir um murro na cara do agente C…, cerrou o punho e accionou o braço com força na sua direcção.
e) O agente C…, ao aperceber-se da intenção do Réu, desviou o rosto, com o intuito de evitar a investida daquele.
f) Não obstante, foi o referido agente atingido no ombro com o punho cerrado do Réu.
g) Tais factos foram objecto do processo-crime n.º 523/07.0PUPRT, que correu termos nos Juízos Criminais do Porto, no qual B… foi acusado da prática do crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art.º 143.º, n.º1 e 2, do Código Penal, conforme documentos juntos a fls. 11 e 72 a 93 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
h) No âmbito do referido processo, foi deduzido pedido de indemnização civil e foi proferida sentença, já transitada em julgado, que absolveu o aqui Réu da prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples p.p. pelo art. 143.º, n.º 1 e 2 do Código Penal e julgou improcedente, por não provado, o pedido de indemnização Civil formulado por C… e, em consequência absolveu o ora Réu do pedido.
i) Em consequência directa e necessária da conduta do Réu, o agente C… sentiu uma dor no ombro, pelo que se dirigiu ao serviço de urgência do Hospital …, nesta cidade, pelas 23h04m, a fim de receber tratamento médico.
j) Como causa directa e necessária da conduta do Réu, sofreu o agente C… uma lesão na região do ombro direito que determinou ao referido agente vários dias de doença, com total incapacidade para o trabalho.
l) A 12.09.2007 C… sujeitou-se a exame pericial no IML, constando do respectivo relatório pericial e relativamente às lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento, a inexistência de sinais externos e a imobilização do membro superior direito em flexão.
m) Foram realizados exames médicos ao ombro direito de C…, nomeadamente, raio-X, ecografia e ressonância magnética, cujos relatórios, datados de 26.09.2007, se encontram juntos aos autos a fls. 18 a 20 e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
n) O agente C… foi acompanhado pelo serviço de saúde da PSP em consultas regulares, as quais se realizaram em 12/09/2007, 1/10/2007, 10/12/2007, 7/01/2008, 11/02/2008, 10/03/2008, 9/05/2008, 3/07/2008, 7/11/2008, 11/11/2008 e 1/07/2009.
o) Foi determinado ao referido agente, pelo serviço de saúde da PSP, 461 dias de doença com total incapacidade para o trabalho, com base no diagnóstico, feito em 01/10/2007, de luxação no ombro direito.
p) Uma vez que os factos ocorreram durante o exercício das funções do agente C…, tal foi considerado pelo Comando Metropolitano da PSP do Porto como acidente de serviço.
q) Durante o período de incapacidade para o trabalho o Estado continuou a pagar ao agente C… o seu vencimento, suplementos de turno e de patrulha, no montante global de € 21.482,05:
a) € 18.663,85 relativos a vencimentos pagos, incluindo subsídios de natal, férias, refeição, fardamento e suplemento de forças de segurança.
b) € 2.818,20 relativos a suplemento de turno e patrulha.
r) O Estado suportou ainda as despesas hospitalares, as consultas e os exames clínicos indispensáveis efectuados ao referido agente no período de convalescença, despendendo a quantia de € 1.880,29.
s) A essas quantias acrescem ainda despesas no montante de € 513,22:
- com consultas efectuadas no Posto Clínico da PSP, no montante de € 118,58 ;
- com medicamentos no montante de € 89,27 e
- despesas suportadas pelo sinistrado com vista à sua recuperação cujo ressarcimento foi autorizado pelas PSP, no montante de € 305,37.
t) As despesas suportadas pelo Estado em virtude da incapacidade do agente C… ascendem ao montante global de € 23.875,56.
u) O Réu deu entrada no Hospital …, onde foi assistido, apresentando hematoma, sem ferida, na região parietal e tonturas, tendo-lhe sido diagnosticado traumatismo craniano encefálico leve, com perda de conhecimento.

2.2 – O DIREITO

Tal como referido, e bem, na fundamentação da sentença recorrida, “assiste ao Estado Português (Ministério da Administração Interna – Polícia de Segurança Pública), representado pelo Ministério Público, sub-rogado nos direitos do lesado, o direito de reclamar o pagamento das quantias pagas, recorrendo para o efeito à culpa do lesante, efectiva ou presumida, tendo o Autor, in casu, imputado a culpa pela produção da lesão sofrida pelo agente C… que o incapacitou temporariamente para o trabalho, ao Réu B….” (ver a legislação bem como o acórdão do STJ, de 22/06/2005, citados no aresto da 1ª instância.
Como se sabe, os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, geradora da obrigação de indemnização, são: o facto (danoso), a ilicitude, a culpa, o prejuízo sofrido pelo lesado e o nexo de causalidade entre aquele facto e o prejuízo – artº 483º, nº 1, e 487º, nº 2, do CC, e A. Varela, Das Obrigações em geral, 9ª ed., vol. I, pág. 543 e segs., e 7ª ed., vol. II, pág. 94, M. J. Almeida Costa, Direito das Obrigações, 7ª ed., p. 483 e segs., e I. Galvão Teles, Direito das Obrigações, 7ª ed., p. 331 e segs.).
Competia ao autor (arts. 342º, nº 1, do CC) a prova dos factos integradores dos aludidos pressupostos.
Face à matéria de facto apurada, não se afigura seguro afirmar, como se faz na decisão recorrida, que “Em consequência directa e necessária da conduta do Réu, sofreu o agente C… uma contusão da região do ombro direito, tendo-lhe sido determinado 461 dias de doença com total incapacidade para o trabalho”.
O que se prova, no que concerne, é que:
- Como causa directa e necessária da conduta do Réu, sofreu o agente C… uma lesão na região do ombro direito que determinou ao referido agente vários dias de doença, com total incapacidade para o trabalho;
- O agente C… foi acompanhado pelo serviço de saúde da PSP em consultas regulares, as quais se realizaram em 12/09/2007, 1/10/2007, 10/12/2007, 7/01/2008, 11/02/2008, 10/03/2008, 9/05/2008, 3/07/2008, 7/11/2008, 11/11/2008 e 1/07/2009;
- Foi determinado ao referido agente, pelo serviço de saúde da PSP, 461 dias de doença, com total incapacidade para o trabalho, com base no diagnóstico, feito em 01/10/2007, de luxação no ombro direito.
Ora, como predito na fundamentação de facto, esse período de doença e incapacidade estabelecidos pelo serviço de saúde da PSP, resultam, e só se compreendem, de uma luxação no ombro direito do agente C…, detectada pelos clínicos da PSP, mas, a nosso ver, não provada, pelo menos como consequência directa e necessária da agressão provocada pelo réu.
Entre 12/09/2007 e 01/10/2007, pode o agente C… ter sofrido outra lesão que lhe causasse, essa sim, luxação do ombro direito.
De seguro temos apenas que, como causa directa e necessária da conduta do Réu, sofreu o agente C… uma lesão na região do ombro direito que determinou ao referido agente vários dias de doença, com total incapacidade para o trabalho, tendo o Estado, durante o período de incapacidade para o trabalho, continuado a pagar ao agente C… o seu vencimento, suplementos de turno e de patrulha.
Na verdade, não sabemos ao certo quantos foram os dias de incapacidade laboral do agente C…, originados pela agressão perpetrada pelo réu e consequente lesão sofrida por aquele, nem as quantias pagas pelo Estado ao seu funcionário, nesse período de tempo.
Quer dizer, o autor prova todos os mencionados pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, geradora da obrigação de indemnização.
Porém, no que concerne ao dano, verifica-se que o mesmo não ficou quantificado.
Importa, assim, cumprir o estatuído no nº 2, do artº 661º, do CPC.
Quando se relega para liquidação o apuramento do valor a receber pelo credor, tal significa, desde logo, que o Tribunal reconheceu a existência de um direito de crédito, que só não foi quantificado, ou seja, liquidado em montante certo, por não haver elementos para determinar o respectivo “quantum”, ou porque o Autor formulou pedido ilíquido, ou genérico.
Sempre que o tribunal verificar o dano, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, cumpre-lhe relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação.
Mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor do deduzido pedido líquido de provar o quantitativo dos danos, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal.
É que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor.
Só no caso de se não ter provado a existência de danos é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação.
Se não houver elementos para fixar a quantidade, o tribunal condenará no que vier a ser liquidado através do incidente a implementar no próprio processo da acção declarativa (arts 378º, nº 2 e 661º, nº 2, do CPC).
No caso vertente está assente que a esfera jurídica e patrimonial do autor recorrido ficou afectada negativamente (o Estado, durante o período de incapacidade para o trabalho, não concretamente determinado, continuou a pagar ao agente C… o seu vencimento, suplementos de turno e de patrulha).
Procedem, assim, na medida do expendido, o concluído na alegação do recurso.

3- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em:
a) Julgar parcialmente procedente o recurso de apelação, revogando-se a decisão recorrida na parte em que condena o “Réu B… a pagar ao Estado Português (Ministério da Administração Interna – Polícia de Segurança Pública), a quantia de € 23.875, 56, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação, ocorrida em 30/09/2010, até integral e efectivo pagamento.
b) Julgar parcialmente procedente a acção, condenando-se o Réu a pagar ao Autor uma indemnização na quantia que se vier a liquidar no respectivo incidente de liquidação.
Custas da apelação por Apelante e Apelado, na proporção de 2/10 e 8/10, respectivamente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido ao Apelante.
Custas da acção pelo Autor e pelo Réu, na proporção dos respectivos decaimentos, fixando-se, até apuramento final após a mencionada liquidação no respectivo incidente de liquidação, na proporção de 80% para o Autor e de 20% para o Réu.

Porto, 07/11/2011
Manuel José Caimoto Jácome
Carlos Alberto Macedo Domingues
António Eleutério Brandão Valente de Almeida