Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4109/23.4T8MAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JUDITE PIRES
Descritores: SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÃO DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
DANO APRECIÁVEL
Nº do Documento: RP202405094109/23.4T8MAI.P1
Data do Acordão: 05/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O decretamento da providência da suspensão de deliberação da assembleia de condóminos depende da reunião cumulativa dos seguintes requisitos:
a)- a aprovação de deliberação contrária à lei, estatutos ou contrato;
b)- a justificação da qualidade de condómino;
c)- a alegação que da execução da deliberação anulável pode decorrer dano apreciável.
II - O dano apreciável consiste num conceito indeterminado, que reclama densificação através da alegação e prova de factos dos quais possa extrair-se que a execução do deliberado no seio da pessoa colectiva acarretará um prejuízo significativo, de importância relevante, em contraposição a danos irrisórios ou insignificantes.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 4109/23.4T8MAI.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I.RELATÓRIO.

A... instaurou procedimento cautelar contra Condomínio ... pedindo que seja ordenada a suspensão da deliberação da Assembleia de Condóminos datada de 20 de Julho de 2023 e a inversão do contencioso.

Alegou, em síntese, que é proprietário da fração “JF”, que faz parte do prédio descrito na Conservatória de Registo Predial da Maia sob o nº ..., submetido ao regime da propriedade horizontal, que é composto por diversas zonas destinadas a habitação, comércio, escritórios e aparcamento público, cujo regulamento do condomínio dividiu em zonas específicas, para optimizar a respectiva gestão, que tem sido feita de forma separada desde 1999; a fração “JF” integra-se na zona G correspondente às galerias comerciais, que constituiu o seu próprio condomínio, com NIF, contas bancárias e administrador próprio.

Referiu que, em 16 de Dezembro de 2022, foi eleita uma empresa para a administração do Requerido, com intenção de se tornar administradora de todas as zonas e, na assembleia geral de 23 de Fevereiro de 2023, tentou aprovar um orçamento para todo o condomínio e todas as zonas, procurando subverter a necessidade de ser eleita como administradora em todas elas, pretendeu avocar todas as contas existentes numa só, para utilizar e movimentar por si com total autonomia e destituir as administrações das zonas sem realizar assembleias gerais parcelares; na assembleia realizada em 20 de Julho de 2023 foi aprovado o ponto 3 da ordem de trabalhos respeitante à unificação da administração do condomínio, a qual equivale à destituição das administrações parcelares, sendo que a exoneração não consta da convocatória, tornando-a ilegal; considera que não compete aos condóminos de uma zona deliberar quanto à administração de outra zona e que a existência de administração única só é possível se cada zona, em assembleia própria, assim deliberar.

Acrescentou que a unificação da administração não é compatível com a estrutura do prédio, não acautelará a defesa dos específicos interesses das diversas zonas, com necessidades diferentes, por vezes, incompatíveis, permitindo decidir temas exclusivos de outras zonas, prejudicando-as; concretiza que a administração do condomínio da zona G instaurou uma ação contra o condomínio geral pedindo o montante de € 43.578 para ressarcimento dos prejuízos com a escada rolante, tendo a administração do Requerido afirmado em assembleia geral que tal acção não tem cabimento, sendo que a unificação permitirá a desistência, prejudicando os condóminos da zona G, que também levará à confusão dos saldos das contas bancárias e dos valores de poupança e fundos comuns de reserva, beneficiando zonas com maiores problemas económico-financeiros em detrimento daquelas que têm saldos mais elevados, como é o seu caso, havendo risco de delapidação e prejuízo para os condóminos que o angariaram; referiu, ainda, que, caso se efective a exoneração da administradora eleita para a zona G, a mesma será sem justa causa e originará uma indemnização que pode ascender a € 16.200,00.

A Requerida deduziu oposição, contrapondo que o Requerente agiu em contrário ao regulamento do condomínio quando decidiu criar uma pessoa coletiva independente, à revelia dos restantes condóminos, o que não seria possível desde 2002, tendo a administração em separado provocado danos na gestão, apontando como exemplos, a acção referida pelo Requerente, custos mais avultados para gestão com cinco ou seis administrações distintas, rubricas de despesas ordinárias e honorários, despesas distintas de manutenção dos elevadores; referiu que a totalidade das frações foram convocadas para as assembleias e já em 23 de Fevereiro a maioria dos condóminos foram favoráveis à unificação, aprovada em 20 de Julho e, apesar de essa última assembleia ter terminado após essa aprovação, com necessidade de convocação de outra para apreciação dos restantes pontos da ordem de trabalhos, a maioria dos condóminos concordou e vinculou-se ao orçamento apresentado; referiu que administrações de condomínio experientes têm capacidade de gerir de forma separada o que deve ser separado, lançando a crédito da zona respectiva o que gaste a menos em despesas ordinárias, podendo também ser criado um depósito a prazo ou um reforço do fundo de reserva exclusivo e caso uma zona despenda mais do que orçamentado numa rubrica no final do exercício será obrigada a repor o desvio através de quota extra a imputar às frações que a integram ou do recurso ao fundo de reserva ou poupanças exclusivas de outros anos; alegou, também, apesar das diferentes permilagens a maioria dos condóminos, podendo, não deliberou relativamente às partes comuns das galerias, salientou as vantagens de uma única administração, designadamente, na redução dos custos, a exoneração da administração do condomínio das galerias decorre da ilegalidade da sua eleição e a sorte do processo será aquela que a maioria venha a decidir.

Suscitou o incidente de litigância de má fé por considerar que o Requerente deduz pretensão cuja falta de fundamento não ignora, alterando/omitindo factos relevantes para a melhor decisão da causa, fazendo um uso reprovável do processo para alcançar objetivo legal, relativamente ao qual foi exercido o contraditório.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Em face do exposto:

a) nos termos dos artigos 380º a 383º do Código de Processo Civil, julgando procedente a pretensão do Requerente A..., ordena a suspensão da deliberação da Assembleia de Condóminos de 20 de Julho de 2023 no que diz respeito unificação da Administração do Condomínio (ponto 3 da ordem de trabalhos identificada no ponto 22) da fundamentação de facto;

b) indefere o pedido de inversão do contencioso.

Custas a atender a final no processo principal, nos termos do artigo 539º nº 2 do Código de Processo Civil.

Registe e notifique, designadamente, para os efeitos previstos no artigo 375º do diploma em referência”.

Inconformado com tal decisão, dela interpôs o requerido recurso de apelação para esta Relação, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

(…)

O apelado apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II.OBJECTO DO RECURSO

A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, cumprirá apreciar se:

- a matéria de facto, na parte impugnada, foi incorrectamente apreciada;

- se verificam os requisitos de que depende a suspensão da deliberação da assembleia de condóminos.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

III. A. Em primeira instância foram julgados provados os seguintes factos:

1. O Requerente é um fundo de investimento imobiliário fechado cujo regulamento foi registado na Comissão de Mercados e Valores Mobiliários, sendo representado pela sociedade gestora B..., S.A. [certidão junta em 5 de Fevereiro].

2. Existe um prédio submetido ao regime da propriedade horizontal descrito na 1ª Conservatória de Registo Predial da Maia sob o nº 1062/19961022-Maia, denominado “Edifício ...” composto por 13 pisos, sendo 10 acima da cota da soleira e 3 abaixo da mesma, situado na Avenida ..., ..., Rua ..., ..., Rua ..., ... e arruamento de nome a designar nºs 23 e 31 [documento 2 junto com o requerimento inicial].

3. A fração JF, que integra o prédio identificado em 2), é composta de estabelecimento comercial, prestação de serviços no rés-do-chão, designada por loja ..., com entrada pelos nºs ..., ..., ... e ..., com a área de 1.181,10 e permilagem 24 [documento 1 junto com o requerimento inicial].

4. A aquisição da fração identificada em 3) encontra-se registada a favor do Requerente pela Ap. ... de 11 de Janeiro de 2005 [documento 1 junto com o requerimento inicial].

5. Na fração identificada em 3) encontra-se instalado o supermercado C....

6. A constituição da propriedade horizontal do edifício identificado em 2) foi registada em 24 de Junho de 1999 [documento 2 junto com o requerimento inicial].

7. O Regulamento Geral do condomínio do edifício identificado em 2) estabeleceu, no seu artigo 2º, que as 424 frações autónomas destinadas a habitação, comércio, escritórios, arrumos e aparcamentos, eram distribuídas pelas zonas “A” a “J”, por referência aos nºs de polícia das respetivas entradas, sendo a zona “G” composta pelo conjunto de frações denominado por “...” respeitante às frações autónomas “ID” a “LA” [documentos 5 junto com o requerimento inicial e 2 junto com a oposição].

8. No artigo 14º do Regulamento identificado em 6) ficou a constar: “A Assembleia de Condóminos é o órgão colegial constituído por todos os Condóminos, com carácter deliberativo, com poderes de controlo, de aprovação e decisão final sobre todos os atos de administração das partes comuns do prédio, a ela cabendo promover a cooperação entre os Condóminos e a cooperação das atividades destes no âmbito do condomínio e as suas decisões vinculam todos os Condóminos, ainda que a ela não tenham comparecido nem se tenham feito representar, sem prejuízo do direito de impugnação previsto no Artigo 1430º do Código Civil.

Parágrafo Único: As deliberações referentes às partes comuns exclusivas a cada uma das Zonas identificadas no artigo 2º poderão ser tomadas em Assembleia especialmente convocada para o efeito e na qual apenas poderão estar presentes os Condóminos das respetivas zonas e a elas sendo aplicadas as regras infra estabelecidas quanto ao funcionamento e à convocação da Assembleia de Condóminos” [documentos 5 junto com o requerimento inicial e 2 junto com a oposição].

9. No artigo 22º nº 2 do Regulamento identificado em 6) ficou a constar “a execução das deliberações tomadas nas Assembleias referidas no parágrafo único do artigo 12º[1] fica a cargo do Administrador e de um eventual Administrador Adjunto nomeado para cada uma das zonas” [documentos 5 junto com o requerimento inicial e 2 junto com a oposição].

10. Ficou a constar do artigo 35º do Regulamento identificado em 6) que são comuns às frações “ID” a “LA” as duas portas elétricas de abertura automática, as zonas comuns de acesso às respectivas frações, dois conjuntos de instalações sanitárias, redes de telefone, gás, eletricidade, iluminação, escadas rolantes, três elevadores, instalação de som, equipamento de projeção e imagem, imagem de CCTV, instalação de ar condicionado, sala de controlo, instalação de ar condicionado, sala de controlo localizada no rés-do-chão, equipamento de sinalização e um arrumo para instalações de limpeza instalado no primeiro andar [documentos 5 junto com o requerimento inicial e 2 junto com a oposição].

11. Desde há mais de vinte anos a administração das partes comuns do edifício identificado em 2) tem sido feita zona a zona, elegendo, cada uma, administração própria.

12. A zona G constituiu o seu próprio condomínio, denominado “Condomínio ...”, com o NIF ... e conta bancária própria.

13. O condomínio identificado em 12) é actualmente gerido pela empresa D... Ld.ª.

14. No período referido em 11) as partes comuns a todas as frações foram geridas por uma administração central, com NIF ... e contas bancárias próprias.

15. A opção referida em 11) e 14) foi entendida como a melhor forma de gerir e organizar o edifício identificado em 2).

16. Em 16 de Dezembro de 2022 a empresa E... – Sociedade Unipessoal, Ld.ª foi eleita para administração do Requerido [documento 8 junto com o requerimento inicial].

17. Na assembleia realizada em 23 de Fevereiro de 2023, o representante da empresa identificada em 16) comunicou que, após a eleição, a mesma fora abordada por alguns condóminos para assumir a administração de toda a PH do edifício por ser mais benéfico e salientou a importância de ter um único administrador “no sentido de facilitar todos os processos inerentes à gestão” [documento 9 junto com o requerimento inicial].

18. Na assembleia identificada em 17) o representante de E..., Ld.ª apresentou um orçamento para todo o condomínio e todas as zonas, anunciando que existia uma redução de 8% relativamente à soma dos orçamentos do passado dos vários blocos e explicou que haveria rubricas transversais a todos e rubricas específicas por bloco e que também o fundo de reserva seria aplicado conforme o bloco não sendo usado para situações do condomínio geral [documento 9 junto com o requerimento inicial].

19. O orçamento referido em 18) não foi colocado à votação dos condóminos na referida assembleia [documento 9 junto com o requerimento inicial].

20. Na assembleia identificada em 17), invocando a eleição para administrar os blocos ..., ..., ..., Garagens (zona J) e do Condomínio Geral, o representante da E..., Ld.ª propôs que a empresa e ele próprio dispusessem de plenos poderes para, a partir de 1 de Janeiro de 2023, movimentarem todas as contas bancárias do condomínio nas cinco zonas mencionadas (depósitos à ordem, a prazo, contas poupança condomínio/contas fundos comuns de reserva e demais aplicações bancárias e financeiras, de forma a garantir que as mesmas passassem a ser movimentadas e geridas apenas pela nova administração, podendo efectuar levantamentos, depósitos, aplicações, transferências, resgates, pagamentos, abrir e fechar contas, bem como todas as demais actividades bancárias necessárias para a boa gestão do condomínio e salvaguarda dos demais numerários existentes [documento 9 junto com o requerimento inicial].

21. Na acta da assembleia ficou consignado a aprovação da proposta identificada em 20) pelos condóminos presentes e representados [documento 9 junto com o requerimento inicial].

22. A administração identificada em 16) convocou uma assembleia para 20 de Julho de 2023 com a seguinte ordem de trabalhos:

1. Nomeação do Presidente da Mesa da Assembleia e Secretário;

2. Discussão e aprovação das contas referentes ao exercício de 01.01.2020 a 31.12.2020, de 01.01.2021 a 31.12.2021 e 01.01.2022 a 31.12.2022;

3. Discussão e deliberação sobre a devida formalização da unificação da Administração do Condomínio, que ficou em falta na Ata de 16.12.2022, passando a respeitar-se o Regulamento Geral do Condomínio do Edifício ...;

4. Eleição da Administração do Condomínio para toda a Propriedade Horizontal;

5. Apresentação, discussão e aprovação do orçamento para o exercício do ano de 2023;

6. Outros assuntos de interesse geral para o Condomínio.” [documentos 10 junto com o requerimento inicial e 1 junto com a oposição].

23. A unificação da administração do condomínio foi aprovada por maioria na assembleia realizada na data referida em 22) [documentos 10 junto com o requerimento inicial e 1 junto com a oposição].

24. A unificação da administração equivale à destituição das administrações parcelares das zonas A, B, C, G, H e J [documentos 10 junto com o requerimento inicial e 1 junto com a oposição].

25. Da ordem de trabalhos referida em 22) não constava a exoneração das administrações das zonas A, B, C, G, H e J [documentos 10 junto com o requerimento inicial e 1 junto com a oposição].

26. O Requerente não esteve presente nem representado na assembleia referida em 23), embora tenha sido convocado por carta remetida em 7 de Julho de 2023 [documentos 10 junto com o requerimento inicial e 4, 5 juntos com a oposição].

27. A proposta de unificação não foi colocada à votação separada e individualizadamente por cada grupo de condóminos por referência à zona onde se integra a respetiva fração [documentos 10 junto com o requerimento inicial e 1 junto com a oposição].

28. Em 20 de Julho de 2023, pelo menos, a zona G tinha o seu administrador próprio eleito em assembleia dos condóminos das frações que a integram, distinto do referido em 16).

29. Com a unificação, a maioria dos condóminos das 442 frações poderá decidir sobre temas referentes às partes comuns exclusivas de uma das zonas, independentemente daquela onde a respectiva fração se integre.

30. O Condomínio referido em 12) intentou, contra o Requerido, acção que corre termos sob o nº 4036/21.0T8MAI pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 43.578,90, acrescida de juros desde a citação, invocando prejuízos decorrentes de uma avaria nas escadas rolantes alegadamente causada por sucessivas infiltrações provenientes da cúpula de vidro do edifício e da sua não reparação [documentos 11 a 14 juntos com o requerimento inicial]

31. Na assembleia identificada em 17), a propósito da existência de uma administração unificada, o representante de E..., Ld.ª referiu que a acção identificada em 30) “na opinião da nova administração não tem qualquer cabimento” [documento 9 junto com o requerimento inicial].

32. A unificação da administração do condomínio pode propiciar a desistência da acção referida em 30) ou o não cumprimento da sentença após o respectivo trânsito em julgado, se tal for decidido em assembleia pela maioria dos condóminos.

33. A unificação da administração pode conduzir à confusão dos saldos das contas bancárias relativas a cada zona, assim como dos valores concretos de poupança e fundos comuns de reserva, designadamente, se as diversas contas forem encerradas com transferência dos saldos para uma única conta, como ficou a constar da deliberação do ponto 3) da ordem de trabalhos da assembleia de condóminos de 23 de Fevereiro de 2023.

34. Existe risco de utilização de saldos bancários de uma zona com fundos mais significativos a favor de zonas com maiores problemas económico-financeiros.

35. Em 31 de Maio de 2023 o condomínio referido em 12) tinha na sua conta bancária um saldo de € 104.614,12 [documento 15 junto com o requerimento inicial].

36. O orçamento aprovado para a zona G ascende a € 190.500,62, dos quais € 17.218,23 de fundo de reserva [documento 9 junto com o requerimento inicial].

37. Para a zona I (garagens) foi simulado um orçamento de € 16.280 com um fundo de reserva de € 1.628,39, para o período de 1 de Novembro de 2022 a 31 de Outubro de 2023 [documento 9 junto com o requerimento inicial].

38. O orçamento aprovado para a zona E (habitações) ascende a € 16.050, com um fundo de reserva de € 1.605,06, para o período de 1 de Novembro de 2022 a 31 de Outubro de 2023 [documento 9 junto com o requerimento inicial].

39. O orçamento aprovado para a zona D (habitações) ascende a € 14.250, com um fundo de reserva de € 1.425,03, para o período de 1 de Novembro de 2022 a 31 de Outubro de 2023 [documento 9 junto com o requerimento inicial].

40. O orçamento aprovado para a zona F (habitações) ascende a € 9.450, com um fundo de reserva de € 944,99, para o período de 1 de Novembro de 2022 a 31 de Outubro de 2023 [documento 9 junto com o requerimento inicial].

41. O orçamento proposto para o período de 1 Janeiro a 31 de Dezembro de 2023, relativamente ao Condomínio Geral, ascendia a € 19.550, com um fundo de reserva de € 1.955,01 [documento 9 junto com o requerimento inicial].

42. A assembleia referida em 23) foi encerrada antes da apreciação do ponto 5 da ordem de trabalhos [documentos 10 junto com o requerimento inicial e 1 junto com a oposição].

43. O Requerente receia que o saldo referido em 35) seja delapidado pela administração única através da movimentação da conta bancária do condomínio identificado em 12) e utilização indiscriminada para cobrir despesas de outras zonas.

44. A concretizar-se a situação referida em 43), os condóminos da zona G ficarão prejudicados.

45. As contas da administração do Requerido referentes aos anos 2020, 2021 e 2022 não foram aprovadas, equacionando-se a realização de uma auditoria [documento 10 junto com o requerimento inicial].

46. A efectivação da exoneração da administração identificada em 13), pode originar um pedido de indemnização correspondente ao valor mensal dos honorários que a mesma contava auferir durante o período para que foi eleita e outros eventuais prejuízos.

47. É possível administrar uma propriedade horizontal na sua totalidade separando, por zonas, as despesas e os saldos das contas bancárias, por forma a imputar poupanças ou excesso de gastos aos condóminos das frações que as integram.

48. A contratação unitária de serviços de limpeza, manutenção de elevadores e demais partes comuns poderá conduzir a redução de custos, o mesmo se passando relativamente a honorários da administração.

49. Na sequência de pedido de email remetido em 18 de Maio de 2023 por pessoa que se identificou como marido da proprietária das frações QU, CQ, DG do prédio identificado em 2), informando acerca da existência dos NIF ..., ... e ... e questionando, designadamente, se naquele a situação era passível de ser considerada ilegal e as respectivas consequências, o serviço nacional das pessoas coletivas respondeu que os seus procedimentos exigem que os pedidos de inscrição de condomínios de prédios sejam instruídos com cópia do respcvtivo título constitutivo da propriedade horizontal ou de certidão do registo predial que possibilite a confirmação da localização/composição, do prédio, o que não sucedia até 2002 período em que realizava as inscrições dos condomínios no Ficheiro Nacional de Pessoas Coletivas com base nas declarações do subscritores do pedido e, nesse contexto, em 28 de Setembro de 1999 e 9 de Fevereiro de 200 haviam sido atribuídos os NIPC ... e NIPC ..., correspondentes a duas das entradas, o NIPC ... que identifica corretamente o edifício e que a administração do condomínio em exercício poderia pedir a eliminação dos registos identificativos das entradas ... e ..., fazendo acompanhar o requerimento de fotocópia de acta de assembleia-geral de condóminos em que se mostre aprovada a deliberação do NIPC a ser mantido e dos NIPC's a eliminar [documento 3 junto com a oposição].

50. Na primeira semana de Agosto de 2023, o Requerido remeteu ao Requerente a acta da assembleia de 20 de Julho de 2023.

III.B. E foram julgados não provados os seguintes factos:

a) o Requerente decidiu por si criar uma pessoa coletiva independente;

b) a administração em separado tem causado custos mais avultados;

c) a gestão em conjunto tem ganhos na qualidade.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

1. Reapreciação da matéria de facto.

Não se conformando o recorrente com a decisão proferida em primeira instância que apreciou a matéria de facto, reclama desta instância o reexame da mesma.

Dispõe hoje o n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, estabelecendo o seu nº 2:

A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:

a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;

b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;

c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.

Como refere A. Abrantes Geraldes[2], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.

Importa notar que a sindicância cometida à Relação quanto ao julgamento da matéria de facto efectuado em primeira instância não poderá pôr em causa regras basilares do ordenamento jurídico português, como o princípio da livre apreciação da prova[3] e o princípio da imediação, tendo sempre presente que o tribunal de 1ª instância encontra-se em situação privilegiada para apreciar e avaliar os depoimentos prestados em audiência. O registo da prova, pelo menos nos moldes em que é processado actualmente nos nossos tribunais – mero registo fonográfico –, “não garante a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e dos quais é legítimo ao tribunal retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”[4].

Também é certo que, como em qualquer actividade humana, sempre a actuação jurisdicional comportará uma certa margem de incerteza e aleatoriedade no que concerne à decisão sobre a matéria de facto. Mas o que importa é que se minimize tanto quanto possível tal margem de erro, porquanto nesta apreciação livre o tribunal não pode desrespeitar as máximas da experiência, advindas da observação das coisas da vida, os princípios da lógica, ou as regras científicas[5].
De todo o modo, a construção da realidade fáctica submetida à discussão não se poderá efectuar de forma parcelar e desconexa, atendendo apenas a determinado meio de prova, ou a parte dele, e ignorando todos os demais, ainda que expressem realidade distinta, a menos que razões de credibilidade desacreditem estes.
Ou seja: nessa tarefa não pode o julgador conformar-se com a análise parcelar e parcial transmitida pelos litigantes, mas antes submetê-la a uma ponderação dialéctica, avaliando a força probatória do conjunto dos meios de prova destinados à demonstração da realidade submetida a debate.
Assinale-se que a construção – ou, melhor dizendo, a reconstrução, pois que é dela que se deve falar quando, como no caso, se procede à ponderação dos factos que por outros foram apreendidos e transmitidos com o filtro da interpretação própria de quem processa essa apreensão – da realidade fáctica não pode efectuar-se de forma parcelar e desconexa, antes reclamando o contributo conjunto de todos os elementos que a integram.

Quer isto dizer que a realidade surge de um conjunto coeso de factos, entre si ligados por elos de interdependência lógica e de coerência.

A realidade não se constrói apenas a partir de um depoimento isolado ou de um conjunto disperso de documentos, ainda que confirmadores de uma determinada versão factual, antes se deve conformar com um património fáctico consolidado de forma sólida, coerente, transmitido por elementos probatórios com idoneidade e aptidão suficientes a conferir-lhe indiscutível credibilidade.

Como se escreveu no acórdão da Relação de Lisboa de 21.12.2012[6], “…a verdade judicial traduz-se na correspondência entre as afirmações de facto controvertidas, relevantes e pertinentes, aduzidas pelas partes no processo e a realidade empírica, extraprocessual, que tais afirmações contemplam, revelada pelos meios de prova produzidos, de forma a lograr uma decisão oportuna do litígio. Sobre as doutrinas da verdade judicial como mera coerência persuasiva ou como correspondência com a realidade empírica, vide Michele Taruffo, La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, pag. 26-29. Quanto à configuração do objecto da prova e a sua relação com o thema probandum, vide Eduardo Gambi, A Prova Civil – Admissibilidade e relevância, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, Brasil, 2006, pag. 295 e seguintes; LLuís Muñoz Sabaté, Fundamentos de Prueba Judicial Civil L.E.C. 1/2000, J. M. Bosch Editor, Barcelona, 2001, pag. 101 e seguintes.

Por isso mesmo, a “reconstrução” cognitiva da verdade, por via judicial, não tem, nem jamais poderia ter, a finalidade exclusiva de obter uma explicação exaustiva e porventura quase irrefragável do acontecido, como sucede, de certo modo, nos domínios da verdade história ou da verdade científica, muito menos pode repousar sobre uma crença inabalável na intuição pessoal e íntima do julgador. Diversamente, tem como objectivo conseguir uma compreensão altamente provável da realidade em causa, nos limites de tempo e condições humanamente possíveis, que satisfaça a resolução justa e legítima do caso (…)”.

Entende o recorrente que foi incorrectamente apreciada a matéria dada como provada nos pontos 32, 33, 34, 43 e 46, que, no seu entender, deve ser considerada não provada.

Sustenta ainda ter ocorrido erro de julgamento ao ser julgada não provada a matéria constante das alíneas a), b) e c) dos factos dados como não provados, defendendo dever a mesma ser considerada provada.

Indicou os concretos meios probatórios em que se fundamenta para estribar decisão diversa da proferida.

Para reapreciação da matéria objecto de impugnação, ouviu-se a gravação que contém o registo das declarações/depoimentos prestados em audiência na parte que para a mesma relevam.

A decisão recorrida fundamentou o juízo positivo acerca da matéria constante do ponto 32.º dos factos provados nos seguintes meios de prova:

- “na confissão contida nos artigos 26º/47º e 39º da oposição”;

- “na missiva de envio da ata de 23.02.2023 (que integra o documento 9 junto com o requerimento inicial) onde se listam dois aspetos prejudiciais da existência de várias administrações, a saber a existência da ação identificada no ponto da fundamentação de facto com o alerta de o valor pedido na ordem dos € 50.000 poder vir a ser custeado por todos os condóminos e a deliberação de uma instalação para pontos de carregamento elétrico na garagem aprovada pela respetiva zona, colocando em causa a segurança da PH”;

- “na cópia da sentença junta em 30 de Outubro de 2023 proferida no processo nº 4036/21.0T8MAI, em 22 de Agosto de 2023, que condenou o Requerido no pagamento da quantia referida no ponto 30) da fundamentação de facto acrescida de juros à taxa legal de 4% desde 20 de Outubro de 2021 até integral cumprimento, em conjugação com o conteúdo do artigo da oposição”;

- depoimento de “AA, funcionária da sociedade D..., Ld.ª, tem a seu cargo, desde 2020, a gestão das partes comuns das galerias, esteve presente nas assembleias de Julho (à qual presidiu), Outubro e Novembro de 2023 em representação do condómino F... (frações IE, IH e JC)”.

O depoimento da indicada testemunha não permite que dele se possa extrair qualquer juízo quanto à prognose a que alude o ponto 32.º dos factos provados.

De facto, a testemunha em causa, no que aqui importa, apenas relatou ter ouvido comentários de pessoas desagradadas com a instauração da acção, mas instada a prestar esclarecimentos mais concretos, somente referiu terem sido ditas algumas coisas “não muito simpáticas”, admitindo, todavia, não conseguir objectivá-las.

Os artigos 26.º/47.º e 39.º da oposição, ao contrário do que sustenta a decisão impugnada, não comportam qualquer confissão, pelo menos com o alcance traduzido no ponto 32.º dos factos provados.

Com efeito, o artigo 39.º apenas refere que “A E... ao ser administração de toda a propriedade horizontal, passa a ter todas as condições para defender da melhor forma o superior interesse do condomínio e dos Condóminos. O interesse da maioria prevalece pelo que a desistência ou continuidade da ação dependerá da vontade da maioria dos condóminos, e nunca da Administração”, enquanto nos demais artigos se alega a reposição da legalidade, em conformidade com o Regulamento do Condomínio, com a exoneração da administradora da zona G. matéria esta irrelevante face ao que consta do ponto 32.º dos factos provados.

Ora, sabendo-se que o órgão deliberativo do condomínio é a assembleia de condóminos, cabendo apenas à administração a execução das deliberações daquele órgão, o referido artigo 39.º limita-se a dar expressão à referida realidade,

Dos documentos indicados também não se retira objectivamente a existência do risco que a unificação da administração possa propiciar relativamente à identificada acção, eventualidade que, de resto, sempre poderia ocorrer, independentemente daquela unificação.

Deve, pois, entender-se que, não tendo sido produzida prova bastante para confirmação do que se alega no ponto 32.º dos factos provados, terá de se considerar não provado o referido segmento decisório.

Quanto aos pontos 33.º, 34.º, 36.º e 43.º dos factos provados – a sentença recorrida fundamentou a decisão quanto a este segmento nos seguintes meios de prova:

- “na cópia da ata da assembleia extraordinária realizada a 9 de Outubro de 2023, junta durante a sessão da audiência final de 10 de Novembro de 2023, em particular as dúvidas manifestadas pelos condóminos” – ponto 33.º;

- nos depoimentos das testemunhas “BB, empresário e colaborador da empresa G..., conhece o Requerente há 20 anos (em cuja fração tem instalado o Supermercado C...), assim como o edifício em causa e o Requerido, tem participado em Assembleias de Condomínio em representação do condómino H... [proprietário das frações HD, IF, JD, JN, JO, JT e JU) e chegou a presidir a uma em 2002/2004” e AA – pontos 33.º, 34.º e 46.º.

A acta da assembleia extraordinária de 9 de Outubro de 2023 espelha, como dela constam, as dúvidas suscitadas por alguns dos condóminos presentes quanto aos benefícios que possam resultar da unificação da administração e as reservas também por eles manifestadas no decorrer da mesma assembleia quanto à referida unificação, designadamente pela confusão dos saldos das contas bancárias que a mesma pode gerar.

A factualidade vertida nos indicados segmentos decisórios encontra, efectivamente, confirmação nos depoimentos das mencionadas testemunhas:

- A testemunha BB que, em representação do condómino H..., tem participado em assembleias de condomínio, forneceu detalhados esclarecimentos acerca da organização do edifício constituído em propriedade horizontal, referindo-se à administração individual por zonas e práticas e procedimentos por ela adoptados, afirmando ser esta forma de organização a mais adequada aos interesses específicos e diferenciados de cada zona, que tem o seu próprio orçamento, conta bancária e fundo de reserva aprovado em assembleia constituída apenas pelos condóminos proprietários das fracções que integram as respectivas zonas.

Tendo assistido à assembleia de 23 de Fevereiro de 2023, narrou os acontecimentos ocorridos enquanto nela esteve presente, referindo, nomeadamente, a posição manifestada pelo representante da Gestão Eficiente acerca das vantagens da unificação proposta a debate, com a eleição de uma única administração para todo o condomínio e o propósito de avocação de todas as contas bancárias.

Precisou que os condóminos de cada zona sempre elegeram a sua própria administração, sem qualquer interferência da administração geral, aludindo ainda à inexistência de deliberação específica da assembleia da zona das galerias e aos inconvenientes decorrentes da interferência de condóminos de outras zonas na gestão das partes comuns das galerias.

Fez ainda referência ao receio sentido pelos condóminos das galerias que o saldo das contas destas seja transferido, vindo estas a suportar encargos que lhes são alheios, concretizando os motivos desse receio.

- A testemunha AA, funcionária da sociedade D..., Lda., tem, desde o ano de 2020, a gestão das partes comuns das galerias, tendo estado presente nas três assembleias realizadas no ano de 2023.

Explicou que, dada a distinção de interesses, a administração das diversas zonas do edifício sempre ocorreu de forma individual, com uma administração geral para as partes comuns que integram todas as fracções.

Esclareceu a orgânica da gestão do condomínio, precisando que as galerias possuem NIF próprio, assim como contabilidade organizada, referindo que, relativamente à unificação da administração, a Gestão Eficiente nunca mostrou abertura para que a questão fosse discutida em assembleias próprias de cada zona com gestão individualizada, nem para previamente definir como serão as contas bancárias geridas, sendo que os informações por ela prestadas são pouco esclarecedoras e díspares, muitas vezes entre si contraditórias, nomeadamente quanto à existência ou não de conta única ou fundo de reserva.

Aludiu ainda, concretizando, a diversos transtornos que a unificação trará às diversas zonas, colidindo com os interesses específicos dos respectivos condóminos, especificando que, em caso de destituição ilegal da sua entidade patronal, enquanto administradora, poderia levar à exigência dos honorários – € 1.100,00/mês – até ao final do período do mandato.

Sustenta o recorrente que a sentença recorrida desvalorizou o depoimento da testemunha CC e também as actas das assembleias.

Basta, porém, atentar no elenco dos factos provados e na respectiva motivação para constatar que os referidos meios de prova foram devidamente valorados positivamente para fundamentar outros pontos concretos da matéria de facto. No que concerne aos pontos acima indicados, cuja apreciação em primeira instância o recorrente questiona, aqueles meios probatórios não revelaram virtualidade bastante para, em confronto com outros, tidos por relevantes, infirmar a matéria dada como provada.

Relativamente à matéria constante das alíneas a, b) e c) julgada não provada: a decisão recorrida sustenta que “Não foi produzida qualquer prova relativamente à matéria que ficou a constar das alíneas b) e c) dos factos não provados”.

Assim é, efectivamente.

O depoimento da testemunha CC, único meio probatório convocado pelo recorrente para, a propósito da matéria em causa, sustentar decisão diversa da proferida em primeira instância, limitando-se a transmitir, desacompanhado de outros meios de prova, o que constitui opinião sua – e naturalmente condicionada pelo papel que neste concreto contexto desempenha enquanto funcionária da empresa Gestão Eficiente, Lda., que liderou todo o procedimento relativo à unificação da administração do condomínio – não revela virtualidade bastante para comprovação da matéria elencada nas alíneas b) e c).

Quanto à alínea a), tal como bem refere a decisão recorrida, “existe manifesta confusão do Requerido porquanto não foi o Requerente, como condómino, que decidiu criar a pessoa coletiva correspondente ao condomínio, pois tal decorreu necessariamente, de deliberação apresentada em assembleia dos condóminos das frações que integram a zona G”.

Assim, em conclusão, à excepção do decidido quanto ao ponto 32.º dos factos provados – supra alterado para não provado -, improcede o recurso relativo à impugnação da matéria de facto, cuja decisão, nesta parte, permanece inalterada.

2. Da aplicação do Direito aos factos apurados.

O direito fundamental de acesso aos tribunais, constitucionalmente consagrado, incorporando o direito de acção, e o princípio da sua efectiva tutela judicial, é garantido quer em relação à violação efectiva de direitos subjectivos, quer quando esteja iminente ou haja perigo de lesão desses mesmos direitos[7].

De tal forma que se pode concluir que a cada direito corresponde uma acção ou uma providência destinada ao seu reconhecimento, mas igualmente à prevenção da sua violação ou a conferir efeito útil a tal reconhecimento.

Neste contexto, o princípio da efectiva tutela judicial pressupõe a composição provisória da situação controvertida antes da decisão definitiva, de molde a prevenir a violação de direitos e/ou a assegurar a utilidade da decisão que os haja reconhecido, tarefa prosseguida através de procedimentos cautelares, de natureza urgente, cuja especificidade visa a garantia desses objectivos.

Pode-se, assim, afirmar que a “tutela processual provisória decorrente das decisões provisórias e cautelares é instrumental perante as situações jurídicas decorrentes do direito substantivo, porque o direito processual é meio de tutela dessas situações. A composição provisória realizada através da providência cautelar não deixa de se incluir nessa instrumentalidade, porque também ela serve os fins gerais de garantia que são prosseguidos pela tutela jurisdicional (…).

A composição provisória que a providência cautelar torna disponível pode visar uma de três finalidades: aquela composição pode justificar-se pela necessidade de garantir um direito, de definir uma regulação provisória ou de antecipar a tutela requerida. Sempre que a tutela provisória se legitime pela exigência de garantir um direito, deve tomar-se uma providência que garanta a utilidade da composição definitiva, quer dizer, uma providência de garantia”[8].

Como afirma Abrantes Geraldes[9], os procedimentos cautelares “… são uma antecâmara do processo principal, possibilitando a emissão de uma decisão interina ou provisória destinada a atenuar os efeitos erosivos decorrentes da demora na resolução definitiva ou a tornar frutuosa a decisão que, porventura, seja favorável ao requerente”.

Segundo DD[10], através dos procedimentos cautelares a lei pretendeu “«seguir uma linha média entre dois interesses conflituantes: o de uma justiça pronta, mas com o risco de ser precipitada; e o de uma justiça cauta e ponderada, mas com o risco de ser platónica, por chegar a destempo».

São características comuns das providências cautelares: a provisoriedade, a instrumentalidade e a sumario cognitio.

A primeira daquelas características emana da circunstância da providência cautelar prosseguir uma tutela distinta da facultada pela acção principal, de que é dependente, e pela necessidade de a substituir pela tutela que vier a ser definida por essa acção. O objecto da providência não é o direito acautelado, mas a garantia desse direito, a regulação provisória da situação ou a antecipação da tutela requerida.

É objectivo primário do procedimento cautelar evitar a lesão grave ou dificilmente reparável de um direito em resultado da demora na composição definitiva do litígio. Visa obviar ao periculum in mora. A sua verificação constitui pressuposto de qualquer procedimento cautelar: inexistindo, este será indeferido ou não decretado.

Como, a propósito deste requisito, escreveu Lucinda Dias da Silva[11], “…o ”periculum in mora” corresponde ao pressuposto característico dos processos cautelares, dado nele se sintetizar a fonte primária de probabilidade de dano que preside à concepção da tutela cautelar, por sua vez justificativa das especificidades próprias deste tipo de processos (…).

O perigo em causa assume, porém, uma tripla particularidade, na medida em que a sua caracterização impõe que, cumulativamente, se considerem a sua fonte, o seu grau e o seu objecto.

Tratar-se-á, respectivamente, de perigo decorrente do decurso do tempo processual da acção principal (fonte), que se reflicta negativamente, de forma grave e dificilmente reparável (grau) no efeito útil de tal acção (objecto)”.

E acrescenta ainda a mesma autora: “À semelhança do que acontece relativamente ao requisito “fumus boni iuris”, também quanto ao “periculum in mora” se nos afigura não ter o tribunal de estar absolutamente certo de que a actual situação de perigo se converterá

 em dano (ou seja, de que haverá dano, caso não se decrete a providência cautelar), o que se revelaria de verificação impossível, dado tratar-se de uma circunstância de verificação futura, relativamente à qual se podem formular apenas juízos de prognose”

No caso em apreço, o requerente A..., enquanto proprietário da fração “JF” que faz parte do prédio descrito na Conservatória de Registo Predial da Maia sob o nº ..., submetido ao regime da propriedade horizontal, instaurou procedimento cautelar contra Condomínio ..., pedindo que seja ordenada a suspensão da deliberação da Assembleia de Condóminos realizada no dia 20 de Julho de 2023.

A suspensão das deliberações da assembleia de condóminos constitui procedimento cautelar especificado ao qual, por força do disposto no artigo 383.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, se aplica o regime processual definido nos artigos 380.º a 383.º do referido diploma.

De acordo com n.º 1 do primeiro daqueles preceitos, “Se alguma associação ou sociedade, seja qual for a sua espécie, tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa execução pode causar dano apreciável”.

O decretamento da providência em causa depende, assim, da reunião cumulativa dos seguintes requisitos:

a)- a aprovação de deliberação contrária à lei, estatutos ou contrato;

b)- a justificação da qualidade de condómino;

c)- a alegação que da execução da deliberação anulável pode decorrer dano apreciável.

Segundo Lebre de Freitas[12], “os factos de que resulta a ilegalidade da deliberação e os que integram a possibilidade da produção de dano apreciável constituem a causa de pedir do pedido cautelar de suspensão. A prova de uns e outros deve ser oferecida com a petição inicial (artigos 303º, nº 1 e 384º, nº 3), bastando, quanto à ilegalidade, a prova sumária correspondente ao fumus boni juris (...)”.

Como se referiu já, o requerente é proprietário da fração “JF”, que faz parte do prédio descrito na Conservatória de Registo Predial da Maia sob o nº ..., submetido ao regime da propriedade horizontal.

O mesmo, apesar de regularmente convocado, não esteve presente, nem se fez representar, na assembleia de condóminos realizada a 20 de Julho de 2023, na qual foi aprovada a deliberação cuja suspensão requer por via cautelar.

Mostra-se, deste modo, comprovada a sua qualidade de condómino e assegurada a sua legitimidade activa para a instauração da providência cautelar.

O segundo requisito exige que a aprovação da deliberação seja contrária à lei, estatutos ou contrato.

A deliberação de condóminos cuja suspensão é reclamada pelo requerente, ora recorrido, afigura-se, de forma indiscutível, contrária aos estatutos, tal como concluiu a sentença impugnada que, de forma fundamentada e exaustiva, procedeu à análise do mencionado pressuposto.

Recorde-se o que, a propósito, refere aquela sentença, em cujos argumentos plenamente nos revemos: “O edifício em questão tem a particularidade de ser constituído por 424 frações, divididas em dez zonas distintas, identificadas pelas letras A a J, respeitantes, separadamente, a habitação, comércio, escritórios, arrumos e aparcamentos, organizadas por referência aos nºs de polícia das respetivas entradas, integrando a fração pertencente ao Requerente a zona “G”, que é composta pelo conjunto formado pelas frações autónomas “ID” a “LA”, denominado por “...”.

Outra particularidade reside na circunstância de cada zona ter partes comuns específicas ou privativas, sendo as das ... formadas por: duas portas elétricas de abertura automática, zonas comuns de acesso às respetivas frações, dois conjuntos de instalações sanitárias, redes de telefone, gás, eletricidade, iluminação, escadas rolantes, três elevadores, instalação de som, equipamento de projeção e imagem, imagem de CCTV, instalação de ar condicionado, sala de controlo, instalação de ar condicionado, sala de controlo localizada no rés-do-chão, equipamento de sinalização e um arrumo para instalações de limpeza instalado no primeiro andar.

Sensível às especificidades de cada zona, o Regulamento do Condomínio prevê, no parágrafo único do artigo 14º que “as deliberações referentes às partes comuns exclusivas a cada uma das Zonas (…) poderão ser tomadas em Assembleia especialmente convocada para o efeito e na qual apenas poderão estar presentes os Condóminos das respetivas zonas”, mandando aplicar-lhe as regras de funcionamento e de convocação da Assembleia de Condóminos.

Por sua vez, o artigo 22º nº 2 do mesmo Regulamento prevê que a execução das deliberações tomadas nas Assembleias de cada zona “fica a cargo do Administrador e de um eventual Administrador Adjunto nomeado para cada uma das zonas”.

A propriedade horizontal do edifício em causa foi registada em 24 de Junho de 1999 e durante mais de vinte anos as citadas disposições do Regulamento foram interpretadas no sentido de colocar a cargo de concretas administrações, individualizas e separadas por zona, a gestão das partes comuns “particulares”, para executar as deliberações tomadas nas assembleias com participação exclusiva dos condóminos titulares das frações de cada zona, deixando a gestão residual das partes comuns a todas as zonas para uma administração do “condomínio geral”.

Assim, até à deliberação de unificação tomada na assembleia de 20 de Julho de 2023, o papel do Requerido era mínimo, já que as suas funções estavam circunscritas à gestão das partes comuns enumeradas no artigo 1.421 nº 1 alíneas a) e b) do Código Civil, por exclusão de partes, pois as partes comuns privativas de cada zona estavam sob a esfera das respetivas assembleias e dos órgãos de administração que as mesmas elegiam.

Temos, pois, que a deliberação de 20 de Julho de 2023 constituiu um corte radical com o modo como a gestão das partes comuns foi efetivada ao longo de mais de 20 anos, modo esse entendido, até então, como a melhor forma de gerir e organizar o edifício.

Decorre claramente do parágrafo único do artigo 14º do Regulamento que os condóminos de cada zona têm a faculdade de realizar assembleias para deliberar assuntos alusivos a interesses específicos da mesma, relacionados com as partes comuns privativas, sem interferências dos condóminos das restantes zonas. Trata-se da consagração de um direito potestativo que integra a esfera jurídica dos proprietários das frações que se integram em cada zona e, como tal, a opção de convocar essas assembleias e definir a respetiva ordem de trabalhos, é algo que lhes compete decidir, em exclusivo, deliberando em conformidade.

A finalidade desse preceito do Regulamento prende-se com a atribuição de autonomia a cada zona, por forma a preservar os interesses específicos dos proprietários das respetivas frações na gestão das partes comuns que lhes estão afetas e impedir interferências dos demais, ou seja, evitar o sacrifício desses interesses específicos pela prevalência do interesse da maioria dos condóminos em função da permilagem relativa por referência às 424 frações.

Quanto à execução dessas deliberações, o artigo 22º nº 2 prevê duas possibilidades, a saber, estar o Administrador eleito pela maioria dos 424 proprietários obrigado a pôr em prática o que tiver sido decidido quanto às partes comuns privativas de cada zona na respetiva assembleia ou a nomeação de Administrador Adjunto para cada zona, depreendendo-se do artigo 14º parágrafo único que essa opção faz parte do leque dos poderes inerentes ao direito potestativo de convocar e realizar assembleias “parcelares”.

Se nos debruçarmos sobre o elenco das partes comuns das “...”, verificamos que existem componentes que são específicas da sua utilização pública, como é o caso das duas portas elétricas de abertura automática, dos dois conjuntos de instalações sanitárias, escadas rolantes para além dos três elevadores, instalação de som, equipamento de projeção e imagem, imagem de CCTV, instalação de ar condicionado, existência de uma sala de controlo e de um arrumo para instalações de limpeza, bem como equipamento de sinalização, que poderiam justificar-se, em parte, para a zona dos escritórios devido ao acesso do público, mas já não para as habitações, dado que a frequência dos espaços comuns pressupõe a utilização pelos proprietários ou residentes das frações e de terceiros com a sua autorização, vg, visitantes, empregados domésticos ou de manutenção.

De igual forma, existem interesses específicos da zona G como a definição do horário de funcionamento, dos sistemas de segurança/vigilância, mormente, de frequência de limpeza e manutenção de equipamentos, etc.

A deliberação relativa à unificação da administração do condomínio, ou melhor, relativa à unicidade da administração para a toda a propriedade horizontal, desrespeita a autonomia que o Regulamento estipulou para cada zona, particularmente, por impor a vontade da maioria em matérias da exclusiva competência dos proprietários das frações que as integram, designadamente, a própria unicidade de gestão.

Na verdade, o respeito pelo Regulamento impunha que esse assunto/ponto da ordem de trabalhos fosse previamente objeto de deliberação das assembleias de cada zona ou, estando incluído na ordem de trabalhos em sede de assembleia geral com participação ampla, aberta a todos os 424 condóminos, como sucedeu, fosse colocado à votação por zona, o que não sucedeu.

Aliás, é manifesto que a filosofia inerente à unificação da administração visa a imposição da vontade da maioria, sendo exemplo disso o modo como foi abordado o assunto da pendência do processo nº 4036/21.0T8MAI, respeitante a ação intentada contra o Requerido para ressarcimento dos prejuízos decorrentes da avaria das escadas rolantes das “...” em consequência de infiltrações através da cúpula de vidro do edifício, correspondente a uma parte comum geral: o representante da empresa eleita para administrar a zonas D, E, F e J e, finalmente, o Condomínio Geral, teve a veleidade de afirmar que uma tal ação não tinha cabimento [...]”.

Resta, finalmente, indagar se se mostra preenchido o último requisito: dano apreciável decorrente da execução da deliberação cuja suspensão é peticionada pelo requerente, aqui recorrido.

Como esclarece Abrantes Geraldes[13], a expressão dano apreciável “integra um conceito indeterminado, carecido de densificação através da alegação e prova de factos dos quais possa extrair-se que a execução do deliberado no seio da pessoa colectiva acarretará um prejuízo significativo, de importância relevante, muito longe dos danos irrisórios ou insignificantes, embora sem se confundir com as situações de irrecuperabilidade ou de grave danosidade”.

Segundo Lobo Xavier[14], o dano apreciável “não é toda e qualquer possibilidade de prejuízo que a deliberação, ou a sua execução, em si mesmas comportem, mas sim a possibilidade de prejuízos imputáveis à demora do processo de anulação. Não faria sentido que o legislador desse relevo, para efeitos da concessão da providência à eventualidade de danos diferentes dos originados pelo retardamento da sentença naquela acção proferida”.

Defende o acórdão da Relação de Évora de 26.09.2019[15] que “O dano apreciável é o dano visível, de aparente dignidade, estimável, mas não o dano irreparável, insuscetível de compensação, já que não se exige que estejam evidenciados danos irreparáveis e de difícil reparação, como sucede no procedimento cautelar comum”.

Por outro lado, “se bem que a lei não exija a verificação (ou apenas a aparência) de um dano irreparável, não dispensa, porém, a verificação de danos, antes se impõe ao requerente o ónus de convencer o Tribunal de que a suspensão da deliberação é condição essencial para impedir a verificação de tal dano”[16].

Tal como refere o acórdão da Relação do Porto de 7.10.2021[17], “O risco de dano apreciável é o risco de prejuízos significativos, para cuja demonstração não bastam meras hipóteses, possibilidades, previsões ou suposições, e são necessários factos que, analisados com objectividade, revelem ou indiciem o perigo das consequências que se querem evitar”.

Sendo esse dano, por regra, patrimonial, não se exclui a possibilidade de danos de outra natureza, provocados na esfera jurídica do requerente ou da sociedade, poderem fundamentar a suspensão social que esteja na sua origem[18].

O risco de dano, que deve ter-se por “apreciável”, mostra-se suficientemente indiciado nos autos.

Com a deliberada unificação da administração para todo o condomínio, haverá, com o encerramento de contas e transferência dos saldos existentes para uma única conta, fundados riscos de confusão dos saldos bancários e dos fundos comuns de reserva até então afectos a cada zona, deixando desprotegidos os interesses específicos das zonas que deles eram titulares.

Por outro lado, porque essa unificação implica a eleição de uma administração única para todo o edifício constituído em propriedade horizontal – o que, de resto, veio a ocorrer na assembleia extraordinária de condóminos realizada a 9.10.2023, conforme acta respectiva junta aos autos -, daí resultará a exoneração dos administradores eleitos para cada uma das zonas antes de cumprido o respectivo mandato, com acréscimo de encargos daí resultantes.

Assim, como refere a decisão impugnada, “Quanto ao dano na execução imediata da deliberação em causa, temos a confusão dos saldos das contas bancárias relativas a cada zona, dos valores concretos de poupança e fundos comuns de reserva, se as diversas contas forem encerradas com transferência dos saldos para uma única conta, como ficou a constar da deliberação do ponto 3) da ordem de trabalhos da assembleia de condóminos de 23 de Fevereiro de 2023.

De notar que os condóminos da zona G, nos quais o Requerente se inclui, têm contribuído para que a conta de depósito dos fundos destinados à gestão das partes comuns que lhe dizem respeito seja dotada de um saldo confortável, que era de € 104.614,12, por referência a 31 de Maio de 2023, o que, em caso de transferência, para uma conta única cria o risco de utilização do mesmo a favor de uma zona com problemas económico-financeiros ou mesmo deficitária.

Com efeito, atenta a discrepância do valor dos orçamentos, que ascende a € 190.500,62, para as “...” e que oscila entre um mínimo de € 9.450 e um máximo de € 16.050 para as habitações das zonas F e E, respetivamente, assim como a discrepância dos fundos de reserva de € 17.218,23 para a zona G e de € 944,99 para a zona F, associada ao facto de, não obstante a eleição de uma nova administração em 16 Dezembro de 2022 e a previsão de apreciação e votação do orçamento na assembleia de 23 de Fevereiro de 2023, não ter chegado a ser objeto de deliberação em 20 de Julho de 2023, gera forte receio de delapidação daquele saldo de € 104.614,12 mediante a utilização indiscriminada para cobrir despesas das partes comuns de outras zonas ou mesmo das partes comuns transversais a todo o edifício, com claro prejuízo para os condóminos da zona G e, como tal, do Requerente.

Acresce que a unificação da administração implica a eleição de um único administrador e a exoneração das administrações individuais eleitas pelas assembleias competentes para o efeito, no caso, a sociedade D... Ld.ª, situação que redundará na revogação do contrato de mandato e, como tal, fazendo incorrer o mandante na obrigação de indemnização prevista no artigo 1.172º alínea c) do Código Civil, tudo configurando um dano apreciável”.

Concluindo-se estarem reunidos todos os requisitos necessários ao decretamento da providência instaurada pelo requerente, com a consequente suspensão da deliberação da assembleia de condóminos realizada a 20 de Julho de 2023, especificamente no que respeita à unificação da administração do condomínio, improcede o recurso, com a consequente confirmação da sentença recorrida.


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Síntese conclusiva:

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Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação, na improcedência do recurso, em confirmar a decisão recorrida.
Custas: pelo apelante - artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

Notifique.


Porto, 9.05.2024

Acórdão processado informaticamente e revisto pela primeira signatária.
Judite Pires
Ernesto Nascimento
Isabel Ferreira
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[1] Trata-se de manifesto lapso na identificação na medida em que o artigo 12º não contém qualquer parágrafo único, o que sucede no que diz respeito ao artigo 14º.
[2] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[3] Artigos 396º do C.C. e 607º, nº5 do Novo Código de Processo Civil.
[4] Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, 1997, pág. 258. Cfr. ainda, o Acórdão Relação de Coimbra de 11.03.2003, C.J., Ano XXVIII, T.V., pág. 63 e o Ac. do STJ de 20.09.2005, proferido no processo 05A2007, www.dgsi.pt, podendo extrair-se deste último: “De salientar a este propósito, como se faz no acórdão recorrido, que o controlo de facto em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Na verdade, a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im) parcialidade, serenidade, "olhares de súplica" para alguns dos presentes, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos (sobre a comunicação interpessoal, RICCI BOTTI/BRUNA ZANI, A Comunicação como Processo Social, Editorial Estampa, Lisboa, 1997)”.
[5] Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil”, Vol. 3º, pág. 173 e L. Freitas, “Introdução ao Processo Civil”, 1ª Ed., pág. 15 7.
[6] Processo nº 5797/04.2TVLSB.L1-7, l1-7, www.dgsi.pt.
[7] Cf. artigo 20º da CRP e 2º, nº2 do Código de Processo Civil.
[8] Acórdão da Relação de Coimbra, 08.04.2000, processo nº 285/07.1TBMIR.C1, www.dgsi.pt.
[9] “Temas da Reforma do Processo Civil”, Almedina, III vol., pág. 35.
[10] Noções Elementares de Processo Civil, reimpressão, 1993, página 10.
[11] “Processo Cautelar Comum”, pág. 144 e segs.
[12] Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2001, pág. 91.
[13] Temas Da Reforma Do Processo Civil, IV Volume, Almedina, 2001, pág. 88.
[14] O conteúdo da providência de suspensão de deliberações sociais, RDES, ano XXII, pág. 215.
[15] Processo n.º 432/19.0T8PTM.E1, www.dgsi.pt.
[16] Acórdão da Relação de Lisboa de 28.05.2013, processo n.º 304/13.2TVLSB.L1-1, www.dgsi.pt.
[17] Processo n.º 517/21.3T8AMT.P1, www.dgsi.pt
[18] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. IV, 2ª ed., pág. 94.