Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ANA PAULA AMORIM | ||
Descritores: | LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA PREÇO DO NEGÓCIO ESTIPULAÇÃO SUPERVENIENTE | ||
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Nº do Documento: | RP202312192176/20.1T8VFR.P1 | ||
Data do Acordão: | 12/19/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURSO IMPROCEDENTE; DECISÃO CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Das menções obrigatórias previstas no art.º 16º, nº 2, do DL nº 15/2013, não faz parte o preço do negócio subjacente ao contrato de mediação imobiliária. O que faz parte é a identificação do negócio (se é uma compra e venda ou um trespasse, por exemplo). II - O art.º 16º, nº 2, do DL nº 15/2013, de 08/02 não impõe a indicação do preço do negócio subjacente como um dos requisitos de validade do contrato de mediação imobiliária. III - Nos termos do disposto no aludido art.º 221º, nº 2, do Cód. Civil, a posterior redução do preço de venda do imóvel não estava, obrigatoriamente, sujeita à forma escrita, sendo válida a estipulação superveniente. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Mediação Imobiliária-RMF-2176/20.1T8VFR.P1 * SUMÁRIO[1] (art. 663º/7 CPC):* ……………………………… ……………………………… ……………………………… --- Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível)I. Relatório Na presente ação declarativa que segue a forma de processo comum, em que figuram como: - AUTORA: A..., Lda., pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua ..., nº ..., 1º direito, ... Oliveira de Azeméis; e - RÉU: AA, divorciado, contribuinte n.º ..., residente na Rua ..., ... R/chão, ... ..., pede a autora a condenação do réu no pagamento, à A., da quantia de €8.528,40 (oito mil quinhentos e vinte e oito euros e quarenta cêntimos), acrescida dos juros de mora à taxa legal já vencidos e vincendos, e ainda a sanção pecuniária compulsória a que alude o artº 829º-A do C. Civil. Alegou para o efeito e em síntese, que a A. exerce a atividade designada de mediação e intermediação imobiliária. A. e R. celebraram, em 26/10/2019, um contrato de angariação e mediação, assumindo a A. o compromisso de, no regime de exclusividade, promover e mediar a venda de um imóvel, pelo preço inicial de €153.000,00. Entretanto, o valor foi alterado para €147.000,00. Mais alegou que a autora promoveu a venda do imóvel, tendo efetuado visitas e apresentou compradores do imóvel pelo preço de €147.000,00, existindo ainda diligências junto do banco para que os compradores obtivessem o financiamento. Contudo, no dia 30/12/2019, o R. comunicou à A. que já não queria vender o imóvel, o que a deixou surpresa com tal situação, até por força da evolução do processo. No início do ano de 2020 o autor voltou a demonstrar interesse na venda do imóvel e contactado os compradores mantiveram interesse na compra, mas dias depois, por comunicação eletrónica, volta a não pretender vender. A partir dessa data a autora tentou contactar o réu, mas não conseguiu acabando por em fevereiro 2020 enviar uma carta a solicitar o pagamento da comissão devida pelo trabalho prestado. Em março de 2020 por comunicação eletrónica o réu denunciou o contrato de mediação. - Veio o R. contestar, pugnando pela absolvição do pedido.Alegou para o efeito e em síntese, que os compradores acabaram por efetuar outro negócio mediado pela A., pelo que esta não teve prejuízo. O R. apenas pretendia proceder à venda pelo preço de €153.000,00 e não pelos €147.000,00 apresentados, não tendo acordado qualquer diminuição do preço inicialmente acordado. - Proferiu-se despacho no qual se suscitou a exceção de competência territorial do tribunal de Vila da Feira para julgar a presente ação e convidou-se as partes a tomarem posição sobre a matéria.- As partes não se pronunciaram e proferiu-se despacho que declarou incompetente em razão do território o tribunal Vila da Feira e ordenou a remessa dos autos tribunal Vila Nova de Gaia, por ser o competente.- Realizou-se audiência prévia, porque o réu não dispensou a sua realização, com vista a obter o acordo entre as partes e por se entender que o processo reunia os elementos necessários para a sua decisão em sede de saneador.- Proferiu-se despacho saneador e considerou-se estar pendente questões de facto controvertidas que justificam a realização de julgamento.Dispensou-se o despacho a que alude o art.º 596º do CPC. - Realizou-se a audiência de julgamento.- Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve:“Face ao exposto, e com estes fundamentos, por considerar a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, o Tribunal decide: a) por força do art.º 19º, nº 2, do DL nº 15/2013, de 08/02, condenar o R. AA ao pagamento, à R. A..., Lda., da quantia de €7.205,40 (sete mil duzentos e cinco euros e quarenta cêntimos); b) a acrescer ao referido em –a)-, condenar ainda o R. AA ao pagamento, à R. A..., Lda., de juros moratórios, vencidos e vincendos, computados sobre o aludido valor de €7.205,40, à taxa anual legal aplicável aos juros civis, desde a citação e até efetivo pagamento, juros que atualmente se contabilizam à taxa anual legal de 4% (cfr. artº 805º, nº 1, 806º, nºs 1 e 2 e 559º, nº 1, todos do Cód. Civil e Portaria nº 291/03, de 08/04). c) a acrescer ao mencionado em –a)- e –b)-, condenar ainda o R. AA ao pagamento, à R. A..., Lda., da sanção pecuniária compulsória prevista no artº 829º-A, nº 4, do Cód. Civil, se esta vier a ser devida nos termos e nas condições previstas nesta disposição legal. d) absolver o R. AA da restante parte do pedido. e) indeferir a condenação da A. como litigante de má fé. f) Condenar o R. e a A. nas custas, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 20% para a A. e 80% para o R.”. - O réu AA veio interpor recurso da sentença. - Nas alegações que apresentou o apelante formulou as seguintes conclusões:1ª- Vai o presente recurso interposto da douta sentença acima identificada por, salvo o devido respeito pelo seu subscritor – que maior não pode ser - mal apreciar os factos (sendo que os factos provados e não provados contêm contradições entre si, mais esvaziando uns o que consta dos outros e sendo omitidos factos essenciais), mal analisar e avaliar as provas documental e testemunhal e mal aplicar o direito ao caso sub judice, tomando opções jurisprudenciais desajustadas ao caso concreto no tocante às normas aplicáveis, e não se pronunciando ou tirando as devidas ilações sobre efeitos jurídicos que devia mais amplamente conhecer. 2ª- Vai extensivo à reapreciação da matéria de facto, incluindo os depoimentos gravados, passando-se a reproduzir os mais pertinentes, para neles poderem ser integrados os excertos que ao diante constam. - TESTEMUNHA BB Profissão:00.00.30 “consultor imobiliário” A...:00.01.03 “é onde eu trabalho”. Sua entidade patronal:00.01.08“prestação de serviços”. Mediador do negócio em causa: 00.02.02 “Confirmo”. 00:18:30: “porque na altura era a companheira do AA”. 00:18:45: “eu coloquei (o preço de €147.000) na ficha de mediação”. 00:18:57 Mº Juiz: “quando o Senhor diz ficha de mediação a que é que se está a referir?” 00:19:00:“O contrato de mediação”. 00:19:02: Mº Juiz: “Foi o Senhor que colocou?”. 00:19:05: “Coloquei. Essa parte é um lapso, como havia aqui um elemento familiar, digamos assim, foi um lapso meu e foi, não há volta a dar, havia aqui um elo familiar entre mim e a pessoa que me levou até ao proprietário, que é a minha prima, para usar a palavra facilitei nesse campo, para mais como havia este elo familiar eu nunca ia dizer não é 153, agora é 147 e sou eu que manda aqui. Isso nunca acontece. Assumi a responsabilidade. Como havia, vou usar a expressão separação, em que o meu elo familiar deixou de existir, eu tentei fazer as coisas de modo familiar e dizer pá temos aqui que rubricar essa situação, oficializar digamos assim essa situação.” 00:29:46(se confirma mensagens do art.º 13 da contestação) 00:24:46:“Sim”. 00:25:00: Mº Juiz: “Tem que assinar o original. O Senhor quer dizer o que quer dizer com isto?” 00:25:09:“O original é o contrato de mediação”. 00:26:11: (Sobre nunca ter identificado o contrato)”eu digo o original porque nas mensagens dizem para mandar por email, tinha de ser o original, por isso é que eu digo que tinha de ser o original.” 00:27:20: (Se alguma vez deu cópia das fichas ao A.). 00:27:25: Não. - TESTEMUNHA CC 00:00:33 (Profissão) “Sou diretor de Agência”. 00:01:12 (“A... …Ld.ª”)“Sim, sou sócio”. 00:01:43 (Mº Juiz: Conhece um Senhor AA?) “Conhecer pessoalmente não”. 00:02:18 “Falei com o Senhor ao telefone e depois por email”. 00:02:58 (Motivo da desistência) “O motivo? Sim houve um motivo que teria a ver com um outro negócio paralelo que o Senhor teria, não me recordo se em Espinho, seria ali ou outra terra qualquer”. 00:16:02 (Se email do R. transcrito no artº39º da p.i. não mostra precisamente que há uma necessidade de simultaneidade entre os dois negócios)”Eu agora vi o email mas como foram duas desistências fiquei um bocado confuso. Mas se está ali escrito é aquilo.” 00:18:20 (Se tinha conhecimento de que havia a necessidade de articulação entre duas necessidades, uma venda e uma compra). 00:18:33 “Uma venda e uma compra do Sr. AA. Fiquei a conhecer através do email que me enviou. Até então, ou em telefonema que me fez na 1ª desistência. Não tenho a certeza se abordou isso, creio que sim. 00:20:41 (Mº Juiz: “A questão do abaixamento para os 147.000 euros, se existiu ou não existiu. O senhor estava presente na altura? Tudo o que o Senhor sabe foi o que lhe transmitiu o Senhor BB”). 00:20:50 “Evidente”. - TESTEMUNHA DD 00:02:42 (Preço) “Penso que rondava os 150.000 euros.” 00:05:00 (Se alguma vez reuniu com o R. ou com o R. presente)”Não, que eu me recorde não”. 00:06:09 (Se comprou outra casa)”Sim”. 00:06:10 (Se com apoio ao crédito)”Sim”. 00:06:16 (Se obtido com a ajuda da mesma imobiliária) “Sim”. TESTEMUNHA EE (Preço) 00:03:27 “Não tenho a certeza mas sei que rondava os 150.000 euros. Já não sei precisar ao certo”. Conclusão1ª: a síntese do teor do contrato de mediação imobiliária feita no facto provado 3 da douta sentença omite que “qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicada de imediato e por escrito à mediadora ” ( nº 2 da clausula 2ª que se reporta ao preço de 153 000,00 da cláusula 1ª), sendo certo que nunca é sequer aflorado na douta sentença, apesar de ser fundamental para a apreciação do mérito da causa, fundamentando uma solução jurídica oposta à adotada. 3. Na p.i., a A., mediadora imobiliária, pede comissão sobre venda não efetuada de fração autónoma propriedade do R. em prédio constituído em propriedade horizontal, bem como comissão que o banco pagaria por empréstimo que concederia para a aquisição ao interessado na compra. 4. Alega que contrato junto à p.i. como documento nº 4 tinha cláusula de exclusividade e imputa ao R. a responsabilidade por o negócio não se ter efetuado. 5. Dão-se aqui como integrados os factos dados como provados e como não provados na douta sentença posta em crise, que se encontram reproduzidos no início destas alegações. 6. Verifica-se que existem factos que não constam do elenco supra que devem ser considerados provados e factos que dele constam que não devem ser considerados provados. 7. No facto provado 3, que sintetiza o teor do contrato de mediação imobiliária, está omitida a essencial estipulação contratual constante do nº 2 da cláusula 2ª relativa ao preço de €153.000,00 referido no nº1 da mesma cláusula: “qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicada de imediato e por escrito à mediadora”. 8. Tal facto, a que a douta sentença nunca se refere, desalicerça a sua fundamentação, sendo essencial para a apreciação do mérito da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, até porque impõe de per si uma solução jurídica oposta à adotada, que com ele fica irremediavelmente desconstruída, sendo certo que consta do documento referido, pelo que deve ser aditado ao facto 3 e considerado provado. 9. Com efeito, a sua importância resulta, desde logo, de ser dada como provada no facto provado 4 uma alteração verbal do preço para €147.000,00 – o que desde já também se impugna, devendo tal facto ser considerado não provado, designadamente, porque “o Tribunal, para considerar como provados os factos presentes no número 4 dos factos provados, socorreu-se, desde logo, dos documentos juntos como doc. 5 a 10 juntos com a p. i.” – sic antepenúltimo parágrafo de fls. 15 da douta sentença. 10.É que “Esses documentos – folhas de visitas” – estão assinados pelo próprio R.. O R., na contestação, veio “impugnar os documentos”. Mas, claro, foi incapaz de afirmar, expressamente, que aquela assinatura não era dele e que tinha sido falsificada.” “E não foi capaz pelo motivo óbvio: porque ele os assinou (o que se refere, em complemento à motivação de facto produzida a propósito dos factos presentes no número 6. dos factos provados).” sic primeiro parágrafo de fls. 16 da sentença. 11ªOra, salvo o devido respeito pelo Mº Juiz a quo, nada de mais errado, como expressamente resulta dos art. 15 a 18 da contestação anteriormente reproduzidos, donde resulta que ao contrário do referido na douta sentença o réu afirmou expressamente que aquela assinatura não era dele, pelo que não pode surgir das fichas de visita qualquer “princípio” (ou “começo”) de prova que crie uma convicção que as testemunhas podem sedimentar “ ! 12ª. Devem, assim, ser dados como não provados os alegadamente factos provados 4, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13 e 16, o primeiro desde logo pela impugnação das assinaturas e os demais por nele se sustentarem. 13ª De todo o modo nunca quaisquer fichas de visita com as caraterísticas das juntas à petição inicial como documentos 5 a 10 seriam idóneas para constituir qualquer alicerce probatório de conhecimento e muito menos consentimento dos proprietários interessados nas vendas sobre alterações de preços que contenham, dado tal insusceptibilidade advir da sua finalidade (permitir às mediadoras controlar a atividade dos seus comerciais), e daí o desprezo que as fichas de visita merecem e normal desatenção e consequente ignorância do seu teor, pelos seus microscópicos carateres. 14ª- Salvo o devido respeito, sempre seria no mínimo polémico o argumento utilizado na douta sentença segundo o qual “Também a indicação por parte do R., de não reparar no preço que constava, não colhe. Uma coisa é não reparar num dos documentos. Mas 5 documentos? Assinados em dias diferentes? Ninguém acredita”. 15ª- Mais uma vez se reitera que as fichas de visita juntas à p.i. como documentos 5 a 10 não têm a assinatura do ora recorrente, mas tem-se por universalmente seguro que quantos mais documentos deste tipo se assina, menos atenção se lhes presta, tanto mais que só as letras “FICHA DE VISITA” têm tamanho grande. 16ª- Ora apelada criou os documentos com malévolo intuito que não é inédito: já o fizera com o contrato de mediação, quando alterou o preço em manuscrito que apôs no final do contrato, bem abaixo das assinaturas, como dele inequivocamente resulta, bem como do depoimento do comercial BB, de que desde já se reproduz o seguinte excerto: 00:18:45: “eu coloquei (o preço de €147.000) na ficha de mediação” 00:18:57 Mº Juiz: “quando o Senhor diz ficha de mediação a que é que se está a referir?” 00:19:00:“O contrato de mediação” 00:19:02: Mº Juiz: “Foi o Senhor que colocou?” 00:19:05: “Coloquei. Essa parte é um lapso, como havia aqui um elemento familiar, digamos assim, foi um lapso meu e foi, não há volta a dar, havia aqui um elo familiar entre mim e a pessoa que me levou até ao proprietário, que é a minha prima, para usar a palavra facilitei nesse campo, para mais como havia este elo familiar eu nunca ia dizer não é 153, agora é 147 e sou eu que manda aqui. Isso nunca acontece. Assumi a responsabilidade. Como havia, vou usar a expressão separação, em que o meu elo familiar deixou de existir, eu tentei fazer as coisas de modo familiar e dizer pá temos aqui que rubricar essa situação, oficializar digamos assim essa situação.” 00:29:46(se confirma mensagens do art.º 13 da contestação) 00:24:46:”Sim”. 00:25:00: MºJuiz: “Tem que assinar o original. O Senhor quer dizer o que quer dizer com isto?” 00:25:09:”O original é o contrato de mediação” 00:26:11: (Sobre nunca ter identificado o contrato) “eu digo o original porque nas mensagens dizem para mandar por email, tinha de ser o original, por isso é que eu digo que tinha de ser o original. Não causa portanto surpresa tal comportamento à luz do provérbio popular “cesteiro que faz um cesto…”. 17. E não é esta habilidade de aposição manuscrita do preço 147 000,00 por baixo do contrato de mediação que apresenta em juízo do único exemplo de falta de ética na ação; a ela se junta a habilidade de se pedir também uma comissão sobre um empréstimo bancário relativo a um contrato inexistente, mas aqui bem esteve a sentença ao não satisfazer esse pedido. 18. A douta sentença refere no tocante à testemunha BB: “a testemunha foi totalmente credível pela forma firme, segura e coerente com a documentação que foi junta”. Ora, é desde logo a coerência com a documentação que foi junta (fichas de visita impugnadas e contrato adulterado) que descredibiliza a testemunha! Acresce a insistência feita pelo mesmo BB para obter a assinatura do ora recorrente no contrato de mediação, documentada nos SMS reproduzidos no art.º 13º da contestação que por comodidade igualmente se passam a reproduzir: “Sex, 03/01, 08:57 Bom dia BB Manda-me o papel por Mail que eu devolvo-te assinado Cmpts” “Tive de sair não vou estar em casa. Obrigado” “Bom dia. Tem que assinar o original. Como combinado daqui a pouco estou no seu apartamento. Cumprimentos”. “Tive de sair, não estou em casa. Vai ter de ficar para outro dia. Mande-me o papel para prévia leitura. Posteriormente enviarei por correio, para a Imobiliária. Cmpts” “Diga-me outra hora que eu vou ter consigo. Podemos marcar para outra hora”. “Para que assinar um papel se o negócio não se vai concretizar? Não assino mais nenhum papel sem prévia validação / leitura do meu advogado. Cmpts” “Qual a melhor hora hoje? Sem prévia leitura e validação do meu advogado não assino mais papel nenhum. Envie o papel por Mail para eu analisar. Obrigado”. “Mas pode-se encontrar comigo ou não? Posso claro ao final da tarde... mas reforço não assino qualquer papel sem atenta leitura e prévia validação. Por mim a partir das 19.30 estarei em casa”. “Já entendi. 19.30h estou no apartamento”. Articulando estas mensagens com a confissão do mesmo BB acima reproduzida, fica implodido o relato vertido na p.i. e completamente descredibilizada a idoneidade desta testemunha. Mas acrescenta a douta sentença que “a credibilidade da testemunha BB pode ainda ser conferida quando se confronta com o depoimento da testemunha CC, o diretor de agência e sócio da A”. 19ª- Ora. Veja-se a isenção que podem ter esta duas testemunhas: - Estão ligadas a um contrato de mediação em cuja última linha está manuscrita uma alteração de preço sem assinatura e que tentam obtê-la a posteriori tentando encobrir o óbvio fim, como dos emails supra reproduzidos se vê. - Pedem na presente ação uma comissão bancária sobre um inexistente empréstimo para compra não efetuada, sendo que já receberam do mesmo banco pela compra do imóvel para onde direcionaram os mesmos interessados - reiterando-se que neste último ponto esteve bem a douta sentença ao julgar improcedente o atinente pedido. - Ambas (comercial BB e sócio e diretor da agência CC) auferem vantagens económicas diretas e imediatas (comissões e rendimento) com a procedência da ação – e só caso ela venha a ter lugar – sendo, logo, partes interessadas nela. - A dita “consonância” resulta de estarem articuladas entre si do interesse comum que têm na causa. Reproduzem-se excertos de prova testemunhal comprovativos das profissões referidas: - TESTEMUNHA BB Profissão:00.00.30 “consultor imobiliário”. A...:00.01.03 “é onde eu trabalho”. Sua entidade patronal:00.01.08”prestação de serviços”. Mediador do negócio em causa?: 00.02.02 “Confirmo”. - TESTEMUNHA CC 00:00:33 (Profissão) “Sou diretor de Agência”. 00:01:12 (“A... …Ld.ª”) “Sim, sou sócio”. 00:01:43 (Mº Juiz: Conhece um Senhor AA?) “Conhecer pessoalmente não”. 20º- Os factos 21 a 23 bem dados como provados são também sintomáticos da errada inserção cronológica, que altera a ordem histórica: embora aparentemente refiram, como último dado temporal uma escritura de venda de 6/3/2020, o facto 23 – último facto provados traz explicitamente à luz do dia a data do cheque de sinal (21/01/2020) e, logo, do contrato promessa que os compradores DD e EE celebraram: em 21 de janeiro de 2020 a identificada DD e EE pagaram € 13 300,00 a título de sinal, através de cheque. 21. Reposto este facto na ordem cronológica, fica completamente alterado o sentido dos acontecimentos, designadamente quando comparado com a data de 04 de fevereiro de 2020 da dita carta registada constante do facto 17 dado como provado. 22. Sem que tal significância se perca como o que se passa a referir, todavia há que dizer que também o facto 17, na redação que lhe é dada, está indevidamente dado como provado, como resulta do seu confronto com o facto 18 dado como provado e do facto 6 dado como não provado que o desvertebram, da conjugação de todos resultando apenas provado que: sem que o não levantamento da carta fosse de forma intencional (como resulta do facto 6 não provado), “ o réu não procedeu ao levantamento do aviso postal dos CTT, tendo o objeto sido devolvido em 18 de fevereiro de 2020, com a indicação” objeto não reclamado” (como consta do facto 18 provado). Logo, ninguém pode saber o teor do conteúdo, ou mesmo se seguia algum conteúdo dentro do dito objeto (terminologia dos CTT) a que se vem chamando “carta”, não podendo ser dado como provado o texto referido no facto 17 dado como provado. 23. Estranhamente, ante a devolução do objeto que acaba de se relatar, a ora apelada não enviou ao ora apelante nenhum email - modo como costumava contactar o ora recorrente, como acima já se viu - com a repetição dos dizeres constantes do texto do facto 17 indevidamente dado como provado na redação que ali consta, pelo que do facto 17 apenas deve constar como provado que a autora enviou ao réu um objeto registado, com AR, datado de 04 de fevereiro de 2020. 24. Relevante do que ora se disse é que a ora recorrida só tomou o impulso supra depois da celebração do contrato promessa com o EE e mulher! 25. O facto 7 dado como não provado deve ser dado como integralmente provado, sob pena de colidir com o email dado como provado no facto 15 (antepenúltimo e penúltimo parágrafos de fls. 6 da douta sentença) onde se refere: “infelizmente surgiu um contratempo de última hora colocado pelo vendedor da fração para onde eu ia morar face a uma oferta superior de um investidor que pretende adquirir o apartamento, o vendedor alterou em alta os valores envolvidos anteriormente por nós acordados…. Provavelmente todo este recente e atualizado negócio face ao inicial acordado estará inviabilizado”. 26. Acresce que consta do antepenúltimo parágrafo de fls. 17 da sentença: “E o que a testemunha CC depôs foi que, em contacto telefónico, o R. nunca lhe disse que o seu bem imóvel estava a ser anunciado a um preço inferior ao combinado”. 27. Surpreendentemente baseia-se aqui a sentença no que o réu não disse ao telefone ao diretor da agência da Autora, CC, de acordo com as palavras deste mesmo(!), mas o que importa é que o réu também não lhe disse que o preço de € 147 000,00 era o preço combinado (porque não era) – assim incorrendo a douta sentença em inadmissível inversão do ónus da prova. 28. Acrescem à solidez da prova de que o facto 7 dado como não provado deve ser dado como provado. 28º Acrescem à solidez da prova de que o facto 7 dado como não provado deve ser dado como provado as declarações acima reproduzidas da testemunha BB no tocante ao “lapso” de ter adulterado o contrato com um criminoso acrescento. 29.E continua a douta sentença a reproduzir o depoimento do Diretor CC: “A questão seria a existência de um negócio paralelo que o R. também queria efetuar, negócio esse que se teria complicado (o R. pretendia vender a sua casa e comprar outra casa)”. 30. Passa-se a transcrever excertos mais desenvolvidos do depoimento da testemunha CC, Diretor de Agência e Sócio da apelante - TESTEMUNHA CC 00:00:33 (Profissão) “Sou diretor de Agência” 00:01:12 (“A... …Ld.ª”)”Sim, sou sócio”. 00:01:43 (Mº Juiz: Conhece um Senhor AA?) “Conhecer pessoalmente não”. 00:02:18 “Falei com o Senhor ao telefone e depois por email” 00:02:58 (Motivo da desistência) “O motivo? Sim houve um motivo que teria a ver com um outro negócio paralelo que o Senhor teria, não me recordo se em Espinho, seria ali ou outra terra qualquer”. 00:16:02 (Se email do R. transcrito no artº39º da p.i. não mostra precisamente que há uma necessidade de simultaneidade entre os dois negócios)”Eu agora vi o email mas como foram duas desistências fiquei um bocado confuso. Mas se está ali escrito é aquilo.” 00:18:20 (Se tinha conhecimento de que havia a necessidade de articulação entre duas necessidades, uma venda e uma compra). 00:18:33 “Uma venda e uma compra do Snr AA. Fiquei a conhecer através do email que me enviou. Até então, ou em telefonema que me fez na 1ª desistência? Não tenho a certeza se abordou isso, creio que sim. 00:20:41 (Mº Juiz: “A questão do abaixamento para os 147.000 euros, se existiu ou não existiu. O senhor estava presente na altura? Tudo o que o Senhor sabe foi o que lhe transmitiu o Senhor BB”). 00:20:50 “Evidente”. 31. Dúvidas, assim, não restam de que o facto 7 dado como não provado deve ser dado como integralmente provado. Ora, a douta sentença subverte o sentido e alcance da troca de emails acima transcritos, relacionando-os surpreendentemente com a avaliação do imóvel, quando resulta claramente do supra alegado e da transcrição do depoimento da testemunha BB que assim não é: - Nem é avaliação, como se diz na douta sentença; - Nem é contrato promessa, como referiu o sócio CC. - Era o contrato de mediação, como se referiu na contestação e confessou o comercial BB no excerto de depoimento gravado acima reproduzido. 32. Apreciando os factos resultantes da correção supra que devem ser considerados provados (facto 7 dado erradamente como não provado) e os que devem ser dados como não provados (factos 4, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 16 e 17 – este último apenas na redação que inclui o teor da dita “carta”- todos dados erradamente como provados). E força que destas alterações resulta que implode o pretenso alicerce fático referido na douta sentença como legitimador do recurso à prova testemunhal para sobreposição à cláusula que impõe recurso à prova testemunhal para sobreposição à cláusula que impõe que a alteração de preço seja feita por escrito, mesmo para os aderentes a esta nova corrente: Por um lado, porque não se verificam os pressupostos documentais para ela essenciais, em virtude de todos os vícios e fragilidades que inelutavelmente ferem as “fichas de visita” e, por outro lado, pela confessada adulteração do teor do contrato de mediação consistente na aposição de alteração de preço manuscrita pelo comercial BB abaixo das assinaturas e teor das mensagens por este enviadas, pedindo a assinatura do ora recorrente num documento que se recusava a identificar, só em julgamento tendo confessado tratar-se do contrato de mediação. 33ªPara além das fichas de visita, pelas suas apontadas fragilidades, – ao contrário do que se afirma na sentença! -, não terem qualquer força e credibilidade, não são indícios fortíssimos no sentido de que houve uma alteração do preço inicial”, nem consubstanciam princípio ou começo de prova que crie uma convicção que testemunhas podem sedimentar!!!não constituírem base para qualquer extrapolação em termos de passaporte para recurso à prova testemunhal (desde logo, porque, como se disse, as assinaturas foram impugnadas nos art.º 15º a 18º da contestação, ao contrário do que consta da sentença), os depoimentos não credíveis de testemunhas não isentas ( (BB e CC) - não só pelo interesse que têm na procedência da ação em termos económicos (comissões e rendimento) como pela postura em atos de “salve-se quem puder”, adulterando o contrato de mediação, tentando a posteriori nele obter uma assinatura através de mensagens que não revelam a que documento se destinam – nunca fundamentariam convicções em termos de redução do preço. De resto, a douta sentença expressamente tira ilações probatórias do que o Réu não disse ao telefone ao sócio/diretor da Autora CC, na versão deste, com o inerente esvaziar das ficções que deles dependem! 34ªNão há prova testemunhal credível que alicerce que o ora apelante procedeu à redução do preço. 35ªAs próprias testemunhas EE e DD, ambas a dizer que o preço “rondava os 150.000 euros”, a primeira a 00:03:27, e a última a 00:02:42 tendo respondido à pergunta se alguma vez teve uma reunião com o Sr. AA, ou com o Sr. AA presente (00:05:00 “Não. Que eu me recorde não” (00:05:07). IV - OMISSÃO DE PRONÚNCIA/FUNDAMENTAÇÃO A AUSÊNCIA DE DANO 36ª-Desde logo, embora liminarmente refira, a suas fls 2, o facto constante da contestação de que “os compradores acabaram por efetuar outro negócio mediado pela A., pelo que esta não teve prejuízo” - e constar dos Factos Provados 21 a 23 do aresto tal aquisição feita em 6 de Março de 2020, pelas mesmíssimas pessoas (DD e EE) referidas a fls 2, na mesma ..., com recurso a mútuo concedido pelo mesmo Banco 1... e sua mediação pela A. - não se pronuncia a douta sentença sobre os efeitos jurídicos de tal alegação e factualidade, restringindo-se a considerar irrelevante que a A., posteriormente, tenha mediado outro contrato com os mesmos compradores, sendo omissa na apreciação dos inerentes efeitos desvertebradores da decisão que profere, ausência de pronúncia/fundamentação ou vício constitui nulidade. 37. É do conhecimento geral que, por força das regras do mercado e da concorrência, qualquer mediadora imobiliária vende tantas casas quantos interessados consegue para comprar e não quantas casas tem em carteira para vender (o que desde logo é provado pelo nº1 da cláusula 2ª do contrato de mediação). 38. Assim, tendo a A. aproveitado as mesmíssimas pessoas (DD e EE) em que expressamente alicerça o pedido, para as direcionar para outra compra que mediou e foi efetuada, não perdeu a oportunidade de fazer o negócio inerente aos referidos interessados que conseguiu. De realçar que ambas estas testemunhas no tocante ao preço de venda da fração do ora recorrente referiram que “rondava os 150 000,00 euros, como se vê dos pertinentes excertos da prova gravada que se passa a reproduzir: - TESTEMUNHA DD 00:02:42 (Preço) “Penso que rondava os 150.000 euros.” 00:05:00 (Se alguma vez reuniu com o R. ou com o R. presente)”Não, que eu me recorde não”. 00:06:09 (Se comprou outra casa)”Sim”. 00:06:10 (Se com apoio ao crédito)”Sim”. 00:06:16 (Se obtido com a ajuda da mesma imobiliária) “Sim”. TESTEMUNHA EE (Preço) 00:03:27 “Não tenho a certeza mas sei que rondava os 150.000 euros. Já não sei precisar ao certo”. 40. Portanto, é manifesto que a A. não sofreu qualquer dano, sendo dogmaticamente incontroverso que qualquer indemnização pressupõe um dano, devendo constituir o ressarcimento desse dano, sendo certo que a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão, in casu inexistente. 41. Não existindo lesão, não existe lesada, nada havendo a compensar, reparar ou ressarcir, donde se conclui que a A. excede manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do direito que invoca, Revestindo a presente ação uma manifesta tentativa da A. se locupletar à custa do R. sem causa justificativa. 42. Não se está, pois, perante um exercício de um direito, mas perante um exercício de ganância da mesma. 43.Ganância esta também demonstrada pelo concomitante pedido que a ora recorrida fez do valor de uma comissão bancária relativa ao hipotético empréstimo a conceder (mas que obviamente não foi concedido) aos falados DD e EE pelo Banco 1... para aquisição da fração do réu, quando é certo que já a recebeu pela compra, com recurso ao crédito do mesmo banco a que os mesmos recorreram, da vizinha fração para a qual os direcionou, como resulta do excerto do depoimento da testemunha DD que se reproduz: - TESTEMUNHA DD 00:02:42 (Preço) “Penso que rondava os 150.000 euros.” 00:05:00 (Se alguma vez reuniu com o R. ou com o R. presente)”Não, que eu me recorde não”. 00:06:09 (Se comprou outra casa)”Sim”. 00:06:10 (Se com apoio ao crédito)”Sim”. 00:06:16 (Se obtido com a ajuda da mesma imobiliária) “Sim”. 45.De qualquer maneira, fica comprovado, pela abusiva alteração, qual o entendimento e interpretação da autora, ora apelada, sobre o sentido e alcance do teor do contrato de mediação no tocante à validade da exigência em questão, dúvidas não tendo ela de que a alteração do preço tinha obrigatoriamente de ser comunicada por escrito à mediadora – o que de resto é óbvio. Qual o entendimento e interpretação da autora, ora apelada, sobre o sentido e alcance do teor do contrato de mediação no tocante à validade da exigência em questão, dúvidas não tendo ela de que a alteração do preço tinha obrigatoriamente de ser comunicada por escrito à mediadora – o que de resto é óbvio. 46. E como tal nunca foi feito, a aposição pela apelada dos dizeres manuscritos na última linha do contrato “alteração preço para € 147 000,00” satisfaria desse modo ingénuo a exigência escrita no contrato, o que é manifestamente reprovável porque aquela linha não se destina a fazer de conta. Não se estranhando, assim, as já referidas insistentes tentativas do comercial da ora apelada BB para se encontrar com o ora apelante no sentido de colher a dita assinatura constantes dos SMS trocados anteriormente reproduzidos. Tal só se compreende como tentativas para obter do apelante a assinatura naquela não querida alteração, que acabou por se provar. 47. No tocante ao direito analisaremos agora “A grande controvérsia que se coloca neste processo (que) incide sobre os factos presentes no número 4 dos factos provados “ut fls. 12 da douta sentença, discutindo-se saber: - “a validade de um aditamento verbal ao contrato inicialmente celebrado; - para a prova desse aditamento verbal, que elementos probatórios são admissíveis.” 48.Passa-se a reproduzir o referido nº 4 dos factos provados, que, de resto e como acima se demonstrou, deve ser considerado não provado: “4. Pelo menos em novembro de 2019, verbalmente, os contraentes alteraram o preço de venda do imóvel inicialmente acordado para €147.000,00”. 49. A questão sub judice: Em causa está a validade de um “contrato de mediação imobiliária”, em cujo texto se identificam como contraentes, por um lado a sociedade de mediação imobiliária ora apelada e, por outro lado, o ora apelante, proprietário de uma fração autónoma de um imóvel constituído em propriedade horizontal identificado na cláusula 1ª do dito contrato. 50. A fonte do contrato, como é sabido, o texto de tal intitulado contrato não resulta de um acordo de vontades, nem é um simples contrato de adesão, mero exemplo de cláusulas contratuais gerais. 51. É um instrumento resultante de produção legislativa, sendo que o texto de tal batizado contrato obedece ao modelo de contrato de mediação imobiliária com cláusulas contratual gerais a que se refere o art.º 2º/1 da Portaria 228/2018 de 13 de agosto, em obediência ao art.º 3º do DL 102/2017 que altera a Lei 15/2013. 52. Assim as cláusulas constituem uma imposição inderrogável, que se evidencia. Consta do nº 1 da cláusula 2ª: “A mediadora” obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra pelo preço de €153.000 (cento e cinquenta e três mil euros), desenvolvendo para o efeito ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e características dos respetivos imóveis”. Consta também do nº 2 da mesma cláusula 2ª do referido contrato junto à p.i. como documento nº4: “Qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicada de imediato e por escrito à mediadora” (o que está omitido na síntese factual do facto 3, como já anteriormente se referiu). Consta da cláusula 5ª: “A remuneração só será devida se a mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato nos termos e com as exceções previstas no artº.19º da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro”. 53. Tratando-se de uma minuta do legislador e sendo certo que este também impõe o seu registo, parece seguro que este contrato não é suscetível de alteração senão nos precisos termos que a lei faz dele constar, assim, no tocante ao preço, este só poderá ser alterado por comunicação escrita feita à mediadora, sendo nula qualquer alteração verbal do preço ARTº 392º do Cód. Civil “A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja direta ou indiretamente afastada”. ARTº 393º do Cód. Civil 3- “Se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não é admitida prova testemunhal.” 4- “Também não é admitida prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força probatória plena.” ARTº 394º do Cód. Civil É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objeto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos art.º 373º a 379º quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores. 54. Da conjugação dos normativos supra resulta não ser admissível a prova testemunhal para alteração de preço fixado no contrato e isto mesmo que o teor deste não resultasse de estipulação legal insuscetível de alteração no tocante àquela cláusula. 55. Mesmo que situássemos a mesma situação contratual no quadro legal anterior à Portaria 228/2018 de 13 de agosto, em obediência ao art.º 3º do DL 102/2017 que altera a Lei 15/2013, academicamente hipotetizando que não resultava da lei, mas só do contrato, a exigência de forma escrita para a alteração do preço, 56. Verdade é que a lei não fere de nulidade ou outra invalidade qualquer estipulação contratual que o faça: bem pelo contrário, prevê essa possibilidade e dá-lhe o mesmo tratamento que daria à exigência de forma escrita! 57. Assim, mesmo que, por redução ao absurdo, se equacione que a lei não obriga a que a alteração ao preço seja feita por escrito, in casu o nº 2 da cláusula 2ª do contrato de mediação fá-lo e o artº.393º do Cod. Civil permite-o e acolhe-o. E já acima se referiu qual a denotada coincidente interpretação da A. no sentido deste acolhimento, decorrente da abusiva aposição da alteração do preço que manuscreveu na parte inferior do contrato, debaixo das assinaturas, dúvidas não restam, assim, sobre a exigência da forma escrita para a validade da alteração de preço no contrato de mediação em questão, o que de resto vem sendo doutrina e jurisprudência tradicional, como referido na douta sentença, mesmo que o seu teor não fosse imposto por Lei. 58ª -Todavia o Mº Juiz a quo perfilha diferente orientação que refere ser modernamente acolhida em douto aresto que identifica, as mesmo que se perfilhe a identificada corrente, a verdade é que não se verificam in casu os pressupostos em que a mesma assenta, como decorre dos seguintes factos anteriormente desenvolvidos: - lapso da douta sentença que refere que o ora apelante não impugnou as assinaturas das fichas de visita em que assenta o alegado, quando este o fez nos artºs 15, 16, 17 e 18 da contestação; - Ninguém detetaria a existência de um preço em documentos como os 5 a 10 juntos à p.i., mas só os visíveis dizeres “FICHAS DE VISITA” ao lado de uma fotografia do prédio, sendo os demais carateres ilegíveis, porque microscópicos, tanto mais que as visitas eram feitas à noite, depois do horário de trabalho; - por apenas se destinarem ao controle pela mediadora da atividade dos comerciais, tais fichas induzem desprezo, desatenção e consequente ignorância do seu teor; - parentesco do comercial BB com a então companheira do ora apelante gerava confiança que inibia instinto de vigilância, etc. 59. Inexiste, assim, como já se referiu, qualquer “princípio de prova que crie uma convicção que as testemunhas podem sedimentar – muito menos constituindo esse princípio de prova as fichas de visita, como se viu 60. Acresce que o acórdão referido não contempla a força imperativa decorrente do facto do dito contrato ter sido gerado e imposto por um órgão de soberania que empresta poder ao comando, mas outros factos sempre operariam tal exclusão e que, como se viu, a prova testemunhal produzida não constitui alicerce para que tenha havido alteração de preço, desde logo, dando crédito a duas testemunhas (BB e CC) que por tudo quanto acima se demonstrou não são isentas e não depuseram com isenção, não só por retirarem proveito económico direto da procedência da ação (v.g. comissões), como pelo demais que acima se alegou: relembra-se adulteração de documentos (contrato de mediação e fichas de visita), tentativa de obter do Apelante assinatura em documento cujo teor não revelam (cfr. emails acima reproduzidos) etc. 61. Ainda que a lei, por mera hipótese de raciocínio não obrigasse a que a alteração ao preço fosse feita por escrito, o contrato assim o determina. 62. Finalmente, entende o Mº Juiz “a quo” que, não constando a exigência de preço como requisito de validade do contrato de mediação imobiliária no art.º 16º/2 do DL 15/2013, a redução não escrita de preço é válida nos termos do art.º 221º/2 CC. 63. Ora, ainda que hipoteticamente se entendesse não resultar da lei a exigência de forma escrita para a alteração do preço, a verdade é que a lei não fere de nulidade ou outra invalidade qualquer cláusula que o faça. 64. Acresce que a consagração legislativa da minuta a que estão legalmente obrigadas as mediadoras imobiliárias por força da Portaria 228/2018 de 13 de agosto, em obediência ao art.º 3º do DL 102/2017, que altera a Lei 15/2013, traz um novo elemento interpretativo ao raciocínio uma vez que a minuta também é reguladora e implode a douta dedução defendida na sentença. Termina por pedir o provimento do recurso, com revogação da sentença sub censura e julgada a ação improcedente por não provada, com a consequente absolvição do R., ora apelante, dos pedidos que formulou. - A Autora veio apresentar resposta ao recurso, na qual formulou as seguintes conclusões:I. O presente recurso tem na sua génese a sentença da Meritíssimo Juiz a quo que sentença do Meritíssimo Juiz a quo que julgou parcialmente procedente por parcialmente provada a ação e em consequência decidiu: “a) condenar o R. AA ao pagamento, à R. A..., Lda., da quantia de €7.205,40 (sete mil duzentos e cinco euros e quarenta cêntimos), por força do artº 19º, nº 2, do DL nº 15/2013, de 08/02; b) acrescer ao referido em –a)-, condenar ainda o R. AA ao pagamento, à R. A..., Lda., de juros moratórios, vencidos e vincendos, computados sobre o aludido valor de €7.205,40, à taxa anual legal aplicável aos juros civis, desde a citação e até efetivo pagamento, juros que atualmente se contabilizam à taxa anual legal de 4% (cfr. art.º 805º, nº 1, 806º, nºs 1 e 2 e 559º, nº 1, todos do Cód. Civil e Portaria nº 291/03, de 08/04); c) a acrescer ao mencionado em –a)- e –b)-, condenar ainda o R. AA ao pagamento, à R. A..., Lda., da sanção pecuniária compulsória prevista no artº 829º-A, nº 4,do Cód. Civil, se esta vier a ser devida nos termos e nas condições previstas nesta disposição legal; d)absolver o R. AA da restante parte do pedido; e) indeferir a condenação da A. como litigante de má fé; f) Condenar o R. e a A. nas custas, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 20% para a A. e 80% para o R..” II. O recorrente coloca em crise a matéria de facto e insurge-se quanto à aplicação e interpretação da matéria dada como provada para a improcedência da ação. III. Parece-nos, contudo, e salvo o devido respeito por melhor entendimento, não ter qualquer razão, pelo que andou bem o douto Tribunal a quo quando concluiu pela procedência do pedido, ainda que parcial - B – (DA REJEIÇÃO DO PRESENTE RECURSO) IV. Calcorreado o recurso interposto pelo recorrente, cumpre referir que este não cumpre os ónus legalmente previstos para que possa ser admitido. V. Nessa conformidade, deverá ser negada a admissibilidade do mesmo. VI. Para que a Relação possa conhecer da apelação da decisão de facto é necessário que se verifiquem os requisitos previstos no artigo 640º do CPC. VII. Delimitado pela negativa, segundo Abrantes Geraldes, no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, Almedina, 2018, pág. 163. No mesmo sentido Francisco Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, vol. II, Almedina, 2015, pág. 463., o recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto será, total ou parcialmente, rejeitado no caso de se verificar «alguma das seguintes situações: a. Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635º, nº 4, e 641º, nº 2, al. b); b. Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a)); c. Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); d. Falta de indicação, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e. Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação». VIII. O recorrente pretende, colocar em crise o julgamento da matéria de facto e da matéria de direito por banda do Douto Tribunal a quo. IX. Sucede que, o recorrente não cumpre os pressupostos legalmente previstos para impugnação da matéria de facto, pois não indica os concretos ficheiros – isto é, os nomes dos mesmos, assim atribuídos por defeito pelo sistema “HABILUS” – onde se encontram as passagens que, segundo a sua particular visão, sustentam tal pretensão. X. O recorrente limita-se a apontar que as transcrições que alegadamente correspondem às provas produzidas em audiência de julgamento são as referentes às testemunhas que, em cada caso, identificam, indicando os minutos a que corresponde o início e fim desse depoimento. XI. A indicação do nome concreto de tais ficheiros trata-se de necessidade elementar no sentido de ficar plasmando a que faixa em concreto se refere, conforme ensina o SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA no Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 3/2012, de 8 de Março de 2012, publicado no D.R., 1.ª Série, n.º77 de 18 de Abril de 2012 e, no mesmo sentido ensina o TRIBUNAL DA RELÇÃO DE ÉVORA. XII. Além de não indicar os ficheiros onde se encontram gravados os depoimentos em causa, nas suas alegações refere que “devem ser dados como não provados os alegadamente factos provados 4, 6, 7,8, 9, 10, 11, 12, 13 e 16”. XIII. Porém, em lado algum afirma expressamente qual a concreta resposta que deveria ter sido dada pelo Tribunal recorrido, o que lhe era imposto na alínea c) do nº 1 do artigo 640º do CPC. XIV. Depreende-se apenas, através de uma operação lógico-dedutiva, que possivelmente entende que a resposta deveria ser de “não provado”. XV. Porém, a referida disposição impõe que o recorrente indique «a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas», o que não pode deixar de significar a imposição de tomar posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação. XVI. O que ora se aponta leva a que o recurso do recorrente deva ser liminarmente rejeitado, o que desde já se invoca e pede. - C - (DOS FACTOS) XVII. A grande controvérsia nos presentes autos reside o facto provado 4): “Pelo menos em novembro de 2019, verbalmente, os contraentes alteraram o preço de venda do imóvel inicialmente acordado para €147.000,00.” XVIII. Ou seja, reside em saber se o preço de EUR. 153 000,00 que constava inicialmente no contrato (Doc. n.º 4, junto aos autos) foi por acordo alterado. XIX. O recorrente entende que não resulta provado que o preço tenha sido alterado por acordo e que tal alteração teria que ser por escrito. XX. A Recorrida entende que tal facto encontra-se corretamente julgado, porquanto, os elementos probatórios invocados na douta sentença para sustentar esse facto se afiguram manifestamente suficientes – impondo-se, por isso, que o Tribunal a quo desse esse facto como provado. XXI. Para fundamentar a sua decisão o Tribunal a quo, lança mão do princípio de prova documental, com refere o acórdão do STJ de 07/02/2017, processo nº 3071/13.6TJVNF.G1.S1, integralmente disponível no sítio www.dgsi.pt.”.“o princípio de prova consistir num documento, com força e credibilidade; se documento não ser usado como facto – base de presunção judicial; reconhecer-se que se trata de uma laboração da doutrina e da jurisprudência oportunamente arredada do “jure constituto” e, em consequência, a ser tida em consonância com os artigos 9.º e 10.º do Código Civil”. XXII. O princípio de prova documental são as “folhas de visitas” (Docs 5 a 10), que foram assinadas pelo recorrente e em conjugação com o depoimento da testemunha BB, que no depoimento que prestou na audiência de julgamento do dia 19.10.2022 sistema Habilus Média Studio 20221019150906_15999767_2871624, ao minuto 00:07:26, que a instância da mandatária da recorrida referiu que explicou ao recorrente o que eram, o que constava nas fichas de visita sendo que o preço constava nas mesmas e que este as assinou. XXIII. Foi da conjugação destes elementos de prova que o Meritíssimo Juiz a quo criou a sua convicção de que houve um acordo quanto à redução do preço. XXIV. O recorrente, vem colocar em crise a sentença na medida em que impugnou na sua contestação tais documentos “folhas de visita”. XXV. Porém, a não foi capaz de “afirmar, expressamente, que aquela assinatura não era dele e que tinha sido falsificada. E não foi capaz pelo motivo óbvio: porque ele os assinou”, conforme bem refere a sentença. XXVI. Aliás o recorrente confessa ter aposto a sua assinatura: “Não contesta, contudo, se é isso que a A. pretende provar, que foram feitas visitas no final das quais, ainda em diálogo de despedida, apôs a sua assinatura em fichas apresentadas como sendo apenas destinadas a comprovar tais presenças, nunca tendo lido ou prestado atenção ao seu teor.” (art. 17.º da contestação). XXVII. É por isso que timidamente alega “não os reconhecendo como tendo sido feitos pelo seu punho, motivo por que os impugna”. XXVIII. Acresce que, a sua tímida alegação, é manifestamente insuficiente para a inversão do ónus da prova. XXIX. O nº 2 do art.º 374.º do CC aplica-se aos casos em que a parte contra quem é apresentado o documento declara que não é, ou não sabe se a assinatura é verdadeira, mas só se a dita assinatura lhe não for imputada, por ser reputada da autoria de um terceiro. XXX. O Recorrente defende precisamente que as assinaturas são suas, pois” não contesta que apôs a sua assinatura nas folhas de visitas” e, a ser assim, segundo as regras de direito probatório material, faria prova plena do declarado – nos termos do disposto no art.º 376.º do CC –, a não ser que a Recorrida, que estava onerada com a sua ilisão, o tivessem feito e tivessem espoletado o dito incidente dos arts. 445.º, 448.º e 449.º do CPC. E não fez! donde, o documento em causa só poderia ter sido considerado genuíno. XXXI. Assim, s.m.o., bem andou o Tribunal a quo ao dar como provados os factos provados 3 e 4. XXXII. Nesta linha de raciocínio, não poderá colher a tese do recorrente sobre este assunto qualquer razão. XXXIII. Como tal devera permanecer nos factos provados. XXXIV. Ainda para sustentar esta sua alegação o recorrente lança a mãos, ainda de um outro argumento/questão: “porque é que a A. juntou à p.i. fichas de visita que o R., ora recorrente, não assinou e não juntou as fichas de visita que o mesmo apelante assinou?” XXXV. Ora, ultrapassada que está a questão sobre a genuinidade da assinatura, de onde se conclui que o recorrente assinou os documentos “fichas de visita” juntos com a PI (Doc. 5 a 10), XXXVI. O que na verdade o recorrente coloca em crise é o facto de não ter reparado no preço, conforme art. 21.º da referida peça processual “…provavelmente não daria por ela….” XXXVII. Ora, o Tribunal a quo, não acreditou e bem, pois percebeu que o mesmo não passa de uma desculpa “esfarrapada”, pois o recorrente assinou 5 documentos, 5 fichas de visitas, todas elas em dias diferentes. XXXVIII. Ora estas fichas de visitas em conjugação com o depoimento da testemunha, BB, na referida audiência de julgamento e no mesmo sistema de gravação na mesma sessão de julgamento do minuto 00:02:20 ao minuto 00:03:25, resulta que inicialmente o recorrente pretendia que o imóvel fosse vendido pelo preço, EUR. 153.000,00 e que, por isso, esse foi o valor que constava no contrato, porém, mais tarde e porque o imóvel não se vendia o mesmo foi alterado com o acordo do recorrente para os EUR. 147.000,00. XXXIX. Esta testemunha, que prestou um depoimento credível e convincente, referiu que havia um elo familiar, a prima da testemunha, que à data era companheira do recorrente, e, por esse motivo, facilitou e não formalizou a redução do preço, através de um contrato. XL. Mais tarde, quando há a quebra do elo familiar, ou seja, a separação do casal, a testemunha pretendeu formalizar a redução do preço e o recorrente “nunca quis”. conforme resulta do seu depoimento no mesmo sistema habilus do minuto 00:19:09 ao minuto 00:20:09, a instancias do Meritíssimo Juiz a quo. XLI. Explicou, ainda, que o recorrente esteve presente em todas as visitas, à exceção de uma porque estava a trabalhar, ouvindo sempre o Sr. BB a apresentar a casa aos potenciais clientes, sendo que o preço era sempre a pergunta final, com os clientes a questionarem se o preço era, ou não negociável, conforme resulta do seu depoimento sempre no mesmo sistema habilus, na mesma sessão de julgamento do minuto 00:06:04 ao minuto 00:07:07, XLII. Tal depoimento, foi coincidente com o da testemunha CC, o diretor de agência da recorrida, registado no cd de gravação áudio da audiência de julgamento do dia 19.10.2022, ficheiro 20221019155848_15999767_2871624 captado pelo sistema de gravação digital integrado, do minuto 00:07:33 ao minuto 00:10:54, que referiu que a redução do preço não foi formalizada porque havia uma relação de confiança e a determinada altura teve que entrevir, tendo telefonado ao recorrente e este nunca lhe disse que o imóvel estava a ser anunciado a um preço inferior ao combinado. XLIII. E isto não aconteceu, porque estava combinado a redução do preço, conforme resulta do depoimento da testemunha BB e em conjugação da análise dos documentos 5 a 10 “fichas de visita”. XLIV. Ora, o que sucedeu foi que havia um negócio paralelo que o recorrente também queria efetuar, compra de um imóvel para aí ir residir com a sua filha menor, negócio este que não estava dependente deste negócio e que acabou por se complicar. XLV. Tal conclusão, foi retirada pelo Tribunal a quo, pela conjugação de tudo o que já se explicou, e também pela análise do Doc. n.º 15, que está em absoluta conjugação com o depoimento da testemunha CC e BB, e que consiste num e-mail de 09/01/2020, que o recorrente envia à recorrida. XLVI. Após este e-mail verifica-se que: “A partir daí a Autora não mais conseguiu contactar com o Ré. “(artigo 41 da PI); “Apesar das várias tentativas de chamadas telefónicas.” (artigo 42 da PI); “Sempre sem resposta” (artigo 43 da PI). XLVII. Citando a douta sentença “Forma-se, assim, um núcleo probatório muito forte, que nos levam a considerar como provados os factos presentes no número 4. dos factos provados. XLVIII. Face à abundante prova o Tribunal a quo acreditou que a alteração do preço foi acordada de EUR. 153.000,00 para EUR. 147.000,00. XLIX. Nesta linha de raciocínio, não poderá colher a tese do recorrente sobre este assunto qualquer razão. L. Como tal devera permanecer nos factos provados os factos provados 3 e 4. LI. Quanto aos facto provado 5, foi confirmados pelas declarações de parte do próprio recorrente, que indicou que teria visto um placard a anunciar a venda, no local, conforme resulta do seu depoimento na audiência de julgamento do dia 19.10.2022 sistema Habilus Média Studio 20221019143648_115999767_2871624, ao minuto 00:08:46, que a instância do Ilustre mandatária do recorrente: “… eu penso que existiu um placar mas nunca mencionado os EUR. 147 000,00.” LII. E também, pela testemunha BB, na audiência de julgamento do dia 19.10.2022 sistema Habilus Média Studio 20221019150906_15999767_2871624, ao minuto 00:05.. LIII. Tal como o facto 6) que decorre das fichas de visitas (Docs 5 a 10), sendo que tais documentos conforme supra amplamente se demonstrou encontram-se assinadas pelo recorrente. LIV. Assim, tal como os factos 3, 4 e 5 dos factos provados também este facto provado 6 deverá permanecer nos factos provados. - D – (Do Direito) LV. Face à matéria de facto provada, entre a recorrida e o recorrente foi celebrado um contrato de mediação, regime de exclusividade, por um período inicial de 6 meses, prorrogável por iguais e sucessivos períodos (de seis meses, portanto,) salvo denuncia por qualquer das partes por carta registada com aviso de receção ou outro meio equivalente – cf. art. 2º da L. 15/2013 de 8 de Fevereiro. LVI. No caso que nos ocupa foi inicialmente estabelecido o preço de EUR. 153 000,00, preço este que acabou por ser reduzido para EUR. 147 000,00, por acordo verbal entre as partes. LVII. Discute-se a validade desta alteração, ou seja, se essa alteração verbal é válida. LVIII. Nos termos do art.º 16.º n.º 2 do DL nº 15/2013, não faz parte o preço do negócio subjacente ao contrato de mediação imobiliária. LIX. Provou-se que, em cumprimento do acordado no contrato de mediação imobiliária com exclusividade, com a redução do preço também acordada para os EUR. 147.000,00, a recorrida apresentou compradores ao recorrente e este negou-se a concluir o negócio. LX. Assim, não há fundamentação que sustente o recurso interposto pelo recorrente, tendo, consequentemente, que improceder o presente recurso, mantendo-se, na íntegra, a douta decisão recorrida, por esta não ter violado qualquer norma do ordenamento jurídico. Termina por pedir que se julgue improcedente o recurso. - O recurso foi admitido como recurso de apelação, com efeito suspensivo após prestação de caução pelo recorrente.- Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.- II. Fundamentação1. Delimitação do objeto do recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 639º do CPC. As questões a decidir: - nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 d) CPC; - reapreciação da decisão de facto, por omissão de factos relevantes e erro na apreciação da prova; - se a alteração do preço, por acordo verbal, determina a nulidade do contrato. - 2. Os factosCom relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância: 1. A A. exerce a atividade designada de mediação e intermediação imobiliária, ao abrigo da Licença AMI nº .... 2. O que faz através da sua sede, sita em Oliveira de Azeméis, da sua loja localizada na Rua ..., em Santa Maria da Feira, e dos seus comerciais e exerce também a atividade de intermediação de crédito, pela qual recebe uma comissão de 1% do valor do crédito, no âmbito dos processo por si apresentados. 3. Por rescrito com a epígrafe “contrato de mediação imobiliária nº ...”, datado de 26/10/2019, a A., na qualidade de mediadora e o R., na qualidade de proprietário acordaram: “- o segundo contraente é proprietário (…) do apartamento, tipo T2, usado (…) sito na Rua ... (…) ..., Concelho de Vila Nova de Gaia; - a mediadora obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra pelo preço de €153.000,00, desenvolvendo para o efeito ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e características dos respetivos imóveis; - o segundo contraente contrata a mediadora em regime de exclusividade; - a remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo pre4sente contrato, nos termos e com as exceções previstas no artº 19º da Lei nº 15/2013, de 08 de Fevereiro - o segundo contratante obriga-se a pagar à mediadora a quantia de 4% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efetivamente concretizado, acrescida de IVA (…); - o total da remuneração aquando da celebração da escritura ou conclusão do negócio visado; - o presente negócio tem uma validade de 6 meses contados a partir da data da sua celebração renovando-se automaticamente por iguais e períodos sucessivos de tempo, caso não seja denunciado por qualquer dos contratantes por carta registada com aviso de receção ou outro meio equivalente, com a antece^3encia mínima de 10 dias em relação ao seu termo”. 4. Pelo menos em novembro de 2019, verbalmente, os contraentes alteraram o preço de venda do imóvel inicialmente acordado para €147.000,00. 5. A A. promoveu a venda desse imóvel com a identificação da sua atividade e nome, e identificação de “venda” afixado na frente do imóvel, direcionada para quem passasse na rua. 6. Pelo menos no dia - 25/11/2019, a A. mostrou o imóvel à interessada FF; - 25/11/2019, a A. mostrou o imóvel ao interessado GG; - 25/11/2019, a A. mostrou o imóvel ao interessado HH; - 29/11/2019, a A. mostrou o imóvel ao interessado CC; - 03/12/2019, a A. mostrou o imóvel à interessada DD; - 12/12/2019, a A. mostrou o imóvel ao interessado II, tendo o R. estado presente nestas visitas. 7. Na sequência da visita do dia 03/12/2019, os Compradores (DD e EE) apresentaram uma proposta de compra do imóvel, pelo preço de 147.000,00 € (cento e quarenta e sete mil euros), valor que obteriam, quase na totalidade, através do recurso a processo de financiamento bancário. 8. Mediante o financiamento do valor de 132.300,00 €, correspondente a 90% do valor do negócio. 9. Ficando, tal processo, apenas dependente do resultado da avaliação ao imóvel por parte do perito avaliador do referido banco. 10. Razão pela qual, o banco solicitou acesso ao imóvel. 11. A A. transmitiu verbalmente ao R. as informações presentes nos números 7. a 10. dos factos provados. 12. Após, quando pretendia efetuar a avaliação, o R. não o permitiu (1 Provado restritivamente a matéria de facto exposta no artº 29º da p.i..) 13. Após, o R., em conversa com a A., retomou a vontade de retomar o processo de venda, o que levou a A. a contactar de novo os Compradores, dando-lhes conta desta posição do R., tendo estes mantido a intenção de compra. 14. Por email remetido pela A. ao R., datado de 07/01/2020, aquela comunicou a este “Sr. AA, O processo de crédito está aprovado, conforme já falado. Duas opções: - Assinamos o contrato promessa já, condicionado à avaliação, que é que fazemos imensas vezes; - Assinamos o contrato promessa depois da avaliação; Se não quiser assinar o contrato condicionado à avaliação, sugiro que aguarde até segunda / terça (dependendo sempre da realização da avaliação por parte do eng.º, cujos timings não controlamos) e assinar o contrato depois de conhecida a avaliação Este delay, fruto dos últimos dias, veio atrasar uma coisa que já poderia estar resolvida. Mas são coisas que acontecem. abraço”. 15. O R. respondeu à A. nos seguintes termos, por email datado de 09/01/2020: “Bom dia, Sr. CC, Realmente os delays e imprevistos dos últimos dias que refere atrasaram uma coisa que já poderia estar resolvida, são coisas que acontecem que não se conseguem controlar pois dependem de terceiros. Infelizmente, surgiu um contratempo de última hora colocado pelo vendedor da fração para o qual eu ia morar, face a uma oferta superior de um investidor que pretende adquirir o apartamento, o vendedor alterou em alta os valores envolvidos anteriormente por nós acordados. Paralelamente, deu me até ao final do dia de hoje para tomar esta decisão, acompanhando e sobrepondo a proposta do investidor. Neste contexto, uma vez que a avaliação do meu apartamento só seria possível para a próxima sexta feira (amanhã) provavelmente todo este recente e atualizado negócio face ao inicial acordado estará inviabilizado. Agradecendo desde já compreensão. Atentamente, AA “ 16. Após, o R. comunicou à A. que já não pretenderia vender o imóvel senão pelos €153.000,00 (2 Resposta restritiva ao artigo 41º da p.i..). 17. A A. enviou ao R. uma carta registada com A/R, datada de 04/02/2020, com o teor: “Ass: - Contrato de mediação imobiliária n.º ..., de 26/10/2019. - Fração autónoma designada pela letra “B”, Tipo T2, localizado no rés-do-chão direito frente do prédio sito na Rua ..., ..., R/ch dto frente, em ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia .... Exmo. Senhor, Como sabe, contratou-nos para, em regime de exclusividade, promover a venda do seu supra identificado imóvel, e, através disso, angariar comprador para o mesmo, pelo preço, inicialmente de 153.000,00€, posteriormente reduzido para 147.000,00 €. Entendemos que cumprimos todas as obrigações a que nos propusemos no âmbito do referido contrato entre nós celebrado, tendo angariado como compradores EE e DD, de que anteriormente lhe demos inteiro conhecimento, incluindo o processo de financiamento devidamente aprovado junto do banco Banco 1..., razão pela qual solicitamos que, no prazo de 10 dias, nos indique dia e hora para nos reunirmos com vista a acertar as contas dos n/ serviços. Certos da s/ atenção, Com os n/ melhores cumprimentos, A Gerência,” 18. O R. não procedeu ao levantamento do aviso postal dos CTT, tendo a carta sido devolvida em 18/02/2020 com a indicação “objeto não reclamado”. 19. Em 27/03/2020 o R. remeteu à A. um email no qual indicou “eu, AA (…) venho por este meio denunciar o fim do contrato estabelecido entre mim e A..., Lda.(…) Sendo assim, o término desta ligação contratual terá efeitos práticos a partir de 26 de Abril de 2020”. 20. A A. respondeu ao email enviando outro email datado de 30/03/2020, com o teor: “Exmo. Senhor AA, É com manifesta surpresa que recebemos este seu e-mail (em anexo). Aliás, já o tentámos contactar, por carta de 04/02/2020, que nos veio devolvida, sem que V Ex.ª nos desse qualquer explicação para tal. Na verdade, como sabe, contratou-nos para, em regime de exclusividade, promover a venda do imóvel que identifica no seu e-mail, e, através disso, angariar comprador para o mesmo, pelo preço, inicialmente de 153.000,00€, posteriormente reduzido para 147.000,00 €. Ora, entendemos que cumprimos todas as obrigações a que nos propusemos no âmbito do referido contrato entre nós celebrado, tendo angariado como compradores EE e DD, de que anteriormente lhe demos inteiro conhecimento, incluindo o processo de financiamento devidamente aprovado junto do Banco 1.... Assim, e no seguimento do teor daquela n/ carta, solicitamos que, no prazo de 10 dias, nos indique dia e hora para nos reunirmos com vista a acertar as contas dos n/ serviços. Em anexo, cópia da carta supra referida.”. 21. Em 06/03/2020, por Documento Particular Autenticado de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca, DD e marido EE adquiriram a fração autónoma designada pelas letras “AS” correspondente ao 2º andar direito frente, corpo III, com entrada pelo nº ..., destinada a habitação, com garagem na subcave, com entrada pelo nº ... do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua ..., ... e ... e Rua ...,..., ... e ... da freguesia ... do concelho de Vila Nova de Gaia, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº ... da mencionada freguesia ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artº ... da União das Freguesias ... e .... 22. Tal compra foi efetuada com recurso a mútuo concedido pelo Banco 1... S. A., tendo sido mediada pela A.. 23. Mais ficou descrito no doc. particular que “o imóvel é vendido pelo preço de Euros: 132.000,00 (…) que os primeiros outorgantes já receberam e que dão quitação, cujo valor foi pago: o montante de 113.050,00 através de cheque (…); o valor de 5.650,00 através de cheque número (…) emitido na data de hoje, sobre o Banco 2... (…) e o valor remanescente de 13.300,00 pago, a título de sinal, através do cheque (…) emitido em 21/01/2020”. - b) Factos Não Provados1. Para publicitar o imóvel, a A. fez publicidade na sua página na internet, acessível através do endereço www.A....pt. 2. E, de igual modo, inseriu na sua base de dados, de onde resultou a impressão de folhas A4 com identificação do imóvel para venda e afixação nas vitrines e carteira de imóveis na sua sede e na loja. 3. Os factos presentes no número 12 dos factos provados ocorreram no dia 30/12/2019. 4. No momento indicado no número 12. dos factos provados o R., expressamente, comunicou à A. que já não queria vender o imóvel. 5. Os factos presentes no número 13 dos factos provados ocorreram no dia 07/01/2020. 6. O R. não recebeu o aviso de levantamento da carta mencionada no número 17. Dos factos provados e não foi levantar a carta de forma intencional. 7. O R. sempre comunicou, desde o início, à A. e com ela acordou como essencial para o contrato que celebrou com ela, que o apartamento seria vendido pelo preço de €153.000,00 (cento e cinquenta e três mil euros), concomitantemente e na dependência da compra de outro apartamento próximo da praia, para onde se mudaria. 8. Os factos indicados no número 4. dos factos provados ocorreram em 20/11/2019. - 3. O direito- Nulidade da sentença - Nas conclusões de recurso, sob os pontos 36 a 38, o apelante suscita a nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 d) CPC, por considerar que na sentença não se tomou posição sobre a questão que foi colocada na contestação a respeito da ausência de prejuízo, por parte da autora. Na posição defendida pelo réu, a autora acabou por formalizar um contrato de compra e venda com os compradores interessados na compra da fração objeto do contrato de mediação, pelo que nenhum prejuízo sofreu. A omissão de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar ou o conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento constitui um dos fundamentos de nulidade da sentença, previsto art.º 615º/1 d) CPC. Constitui um vício relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento” – art.º 608º/2 CPC. Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito, que o juiz na sentença: deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. A respeito do conceito “questões que devesse apreciar” refere ANSELMO DE CASTRO que deve “ser entendida em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das exceções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da nulidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado às partes sob os aspetos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão”[2]. LEBRE DE FREITAS por sua vez tem a respeito de tal matéria uma visão algo distinta, pois considera que devendo: “o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art.º 660º/2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado”[3]. Para melhor precisar o seu entendimento remete para o estudo do Professor ALBERTO DOS REIS cuja passagem se transcreve: “Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação “não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (art.º 511º/1), as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 664º) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas”[4]. Seguindo os ensinamentos dos ilustres Professores, atendendo ao regime processual vigente, afigura-se-nos ser esta a interpretação que melhor reflete a natureza da atividade do juiz na apreciação e decisão do mérito das questões que lhe são colocadas, pois o juiz não se encontra vinculado às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas. Resulta desta interpretação que a sentença não padece de nulidade porque não analisou um certo segmento jurídico que a parte apresentou, desde que fundadamente tenha analisado as questões colocadas e aplicado o direito. No caso concreto, na sentença, o juiz tomou posição sobre a alegação do apelante na contestação, a respeito da ausência de prejuízo por parte da autora. Isso mesmo refere o apelante no ponto 36 das conclusões de recurso, quando observa que a sentença limitou-se a “considerar irrelevante que a autora, posteriormente, tenha mediado outro contrato com os mesmos compradores”. Na sentença escreveu-se, o que se passa a transcrever: “Ao R. é imputável a não conclusão do negócio. Não se provou a versão do R. de que existia um qualquer condicionamento do contrato de mediação imobiliária ao facto do R. encontrar, primeiro, outra casa. Por conseguinte, a A. é credora, do R., da remuneração acordada, tal com peticionou. É irrelevante, para o caso, que a A., posteriormente, tenha mediado outro contrato com os mesmos compradores (cfr. número 22. dos factos provados). A sua remuneração é devida, pelo R., de acordo com o cumprimento deste contrato específico. Por conseguinte, sendo o negócio de €147.000,00 e tendo a A. direito a uma remuneração correspondente a 4% (mais IVA) – cfr. número 3. dos factos provados – a A. tem direito a receber €5.880,00 mais IVA a 23%, ou seja €7.232,40”. Inserindo o excerto da sentença no seu contexto, percebe-se que a questão foi apreciada pelo juiz do tribunal “a quo”, com um sentido com o qual o apelante não concorda. Acresce que mesmo que assim não se entenda sempre seria de referir que não estava o juiz vinculado ao segmento interpretativo defendido pelo réu na contestação, no sentido de aferir se a autora sofreu ou não prejuízo, porque conheceu da questão e não estar, sobre este aspeto, vinculado aos argumentos de direito apresentados pelo réu. Conclui-se que a sentença não padece do vício apontado e os fundamentos alegados não preenchem a invocada nulidade. Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 36 a 38, revelando-se a sentença válida e regular. - - Reapreciação da decisão de facto -Nas conclusões de recurso, sob os pontos 1 a 35, 39 a 46, 58 a 60, o apelante impugna a decisão de facto, com fundamento em erro na apreciação da prova e omissão de factos relevantes para a decisão da questão de direito, pretendendo a sua ampliação. Passando a apreciar da ampliação da decisão de facto. Nos termos do art. 666º/2 c) CPC mostrando-se indispensável ampliar a matéria de facto, deve o tribunal da Relação alterar a decisão da matéria de facto, se a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Não sendo possível fazer uso de tal faculdade, deve o tribunal anular a decisão. A ampliação da matéria de facto mostra-se indispensável, quando se tenham omitido dos temas da prova factos alegados pelas partes que se revelam essenciais para a resolução do litígio, na medida em que assegurem enquadramento jurídico diverso do suposto pelo juiz do tribunal “a quo”[5]. Os factos essenciais são aqueles que permitem individualizar a situação jurídica alegada na ação ou na exceção. Os factos complementares são aqueles que são indispensáveis à procedência dessa ação ou exceção, mas não integram o núcleo essencial da situação jurídica alegada pela parte. Ambos integram a categoria de factos principais porque são necessários à procedência da ação ou exceção, por contraposição aos factos instrumentais, probatórios ou acessórios que são aqueles que indiciam os factos essenciais e que podem ser utilizados para a prova indiciária destes últimos[6]. Em conformidade com o critério legal, a ampliação da matéria de facto tem de ser indispensável, o que significa que cumpre atender às várias soluções plausíveis de direito, o enquadramento jurídico em face do objeto do recurso e ainda, com a possível intervenção e interpretação do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do art. 682º/3 CPC. Nas conclusões de recurso, sob os pontos 1 a 8, pretende o apelante que na redação do ponto 3 se consigne o nº2 da cláusula 2ª do contrato, com a seguinte redação: -“qualquer alteração do preço fixado no número anterior deverá ser comunicada de imediato e por escrito à mediadora”. Com efeito, na contestação o réu/apelante alegou: Art.34º: “De todo o modo, consta do texto do nº2 da cláusula 2ª do contrato de mediação imobiliária – que, de resto, decalca o modelo da Portaria nº 228/2018 – que “qualquer alteração ao preço fixado deverá ser comunicada de imediato e por escrito à mediadora””. Não extraiu qualquer efeito jurídico de tal alegação. Não constitui um facto essencial no contexto da matéria em litígio, sendo por isso irrelevante, porque a questão controvertida prende-se com a existência, ou não, de um acordo verbal celebrado entre o mediador e o réu, de alteração do preço e por outro lado, se tal acordo, a existir é válido. Conclui-se ponderando as várias soluções plausíveis de direito que a alegação de tal matéria não justifica a ampliação da decisão de facto, por não constituir um facto essencial. Improcedem nesta parte as conclusões de recurso. - Passando à reapreciação da decisão de facto, com fundamento em erro na apreciação da prova.A apelada defende a rejeição do recurso, quanto a tal questão (pontos IV a XVI das conclusões de resposta ao recurso), por entender que não se mostram reunidos os pressupostos de ordem formal. Considera que o apelante omitiu a indicação dos ficheiros que correspondem aos excertos dos depoimentos que transcreveu e não indica a decisão alternativa que sugere. Passando à apreciação da verificação dos pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto. O art. 640º CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos: “1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3. […]” O presente regime veio concretizar a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expresso a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova[7]. Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar - delimitar o objeto do recurso -, motivar o seu recurso com indicação dos meios de prova que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação. Ponderando os critérios adiantados pelo Supremo Tribunal de Justiça na interpretação dos ónus de impugnação, podemos alinhar as seguintes conclusões. A cominação da rejeição do recurso, prevista para a falta das especificações quanto à matéria das alíneas a), b), e c) do n.º 1, não funciona, automaticamente, devendo o Tribunal convidar o recorrente, desde logo, a suprir a falta de especificação daqueles elementos ou a sua deficiente indicação (Ac. STJ 26 de maio de 2015, Proc. 1426/08.7TCSNT.L1.S1, www.dgsi.pt). O ónus de impugnação não “pode ser exponenciado a um nível tal que praticamente determine a reprodução, ainda que sintética, nas conclusões do recurso, de tudo quanto a esse respeito já tenha sido alegado. Nem o cumprimento desse ónus pode redundar na adoção de entendimentos formais do processo por parte dos Tribunais da Relação, e que, na prática, se traduzem na recusa de reapreciação da matéria de facto, maxime da audição dos depoimentos prestados em audiência, coartando à parte Recorrente o direito de ver apreciada e, quiçá, modificada a decisão da matéria de facto, com a eventual alteração da subsunção jurídica (Ac. STJ 03.03.2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1.S1 www.dgsi.pt.) Por outro lado, as conclusões visam delimitar o objeto do recurso e por isso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso (STJ 03.03.2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1.S1, www.dgsi.pt). Fundando-se a impugnação da decisão da matéria de facto na prova gravada a lei prevê como ónus do impugnante, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, que indique com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes. Considera-se que a indicação do início e termo dos depoimentos gravados não viola o comando legal que impõe que o recorrente indique com exatidão as passagens da gravação onde constam os meios de prova aí registados (Ac. STJ 08.11.2016, Proc. 2002/12.5TBBCL.G1.S1, www.dgsi.pt). De igual modo, se considera preenchido o ónus de impugnação quando nas alegações e nas conclusões, se identifica os concretos pontos de facto que se têm como mal julgados, se indica os meios de prova que deveriam ter conduzido a um resultado probatório diverso e se transcreve parte dos depoimentos (Ac. STJ 01.10.2015 Proc. 6626/09.0TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt ) Considera, por sua vez, ABRANTES GERALDES, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, que a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se, em alguma das seguintes situações: “a) falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto ( art. 635º/4 e 641º/1 b)); b) falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art.º 640º/1 a) CPC); c) falta de especificação na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito); d) falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e) falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”[8]. Está subjacente a esta interpretação, que tem sido adotada na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça[9], a ideia que uma interpretação restritiva dos pressupostos pode constituir uma violação ao princípio da proporcionalidade com a consequente denegação da reapreciação da decisão de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou espírito do legislador. No caso concreto, realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e o apelante veio impugnar a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos de facto impugnados, prova a reapreciar e decisão que sugere, o que fez nas conclusões e na motivação (pontos 09, 12, 23, 28 das conclusões de recurso). Quanto à prova a reapreciar, para além da indicação que consta das conclusões de recurso, na motivação do recurso o apelante transcreveu as passagens relevantes dos respetivos depoimentos, fazendo menção do dia e do concreto momento (indicação dos minutos) em que foi realizada a gravação do depoimento que considerou relevante para sustentar a impugnação da decisão. Porém, em relação aos pontos 4, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 13 e 16 dos factos provados, cuja decisão impugna, não indicou os meios de prova a reapreciar no sentido de demonstrar em que consiste o erro na respetiva reapreciação. Com efeito, nas conclusões de recurso sob o ponto 12, refere: “-Devem, assim, ser dados como não provados os alegadamente factos provados 4, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13 e 16, o primeiro desde logo pela impugnação das assinaturas e os demais por nele se sustentarem”. Existe autonomia entre o ponto 4 dos factos provados e os demais, porque no ponto 4 trata-se de apurar se existiu acordo no sentido de alterar o preço de venda e nos demais está em causa saber quem foi o comprador interessado e procedimentos que se seguiram junto da instituição bancária no sentido de conceder o crédito, factos estes que em grande parte resultam de prova documental e até se encontram admitidos por acordo nos articulados (cfr. art. 12º a 40º da petição e art. 37º da contestação). Refira-se, ainda, que o apelante não indica nas conclusões, nem na motivação do recurso os concretos meios de prova que justificavam decisão distinta. Conclui-se, assim, que apenas estão reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto, em relação aos pontos 4 e 17 dos factos provados e ponto 7 dos factos julgados não provados. A questão que a apelada coloca prende-se com a apreciação do mérito, ou seja, da efetiva relevância dos depoimentos e até na parte que se mostra transcrita, para a alteração da decisão. A desconformidade ou insuficiência da prova indicada não justifica a rejeição da reapreciação, pois apenas a omissão de prova nas conclusões e na motivação do recurso, têm como consequência a rejeição do recurso e tal situação não se verifica no caso concreto quanto aos pontos 4 e 17 dos factos provados e 7 dos factos julgados não provados. Nos termos do art. 640º/1/2 do CPC consideram-se reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto, quanto aos pontos 4 e 17 dos factos provados e ponto 7 dos factos julgados não provados, rejeitando-se o recurso em relação aos demais factos impugnados. - Nos termos do art. 662º/1 CPC a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto:“[…]se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. A respeito da gravação da prova e sua reapreciação cumpre considerar, como refere ABRANTES GERALDES, que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, “tem autonomia decisória”. Isto significa que deve fazer uma apreciação crítica das provas que motivaram a nova decisão, de acordo especificando, tal como o tribunal de 1ª instância, os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador[10]. Nessa apreciação, cumpre ainda, ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados. Decorre deste regime que o Tribunal da Relação tem acesso direto à gravação oportunamente efetuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações, o que constitui uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade suscetíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais[11]. Cumpre ainda considerar a respeito da reapreciação da prova, em particular quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos das testemunhas, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no art. 396º CC e art. 607º/5, 1ª parte CPC. Como bem ensinou ALBERTO DOS REIS: “ […] prova […] livre, quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei”[12]. Daí impor-se ao julgador o dever de fundamentação das respostas à matéria de facto – factos provados e factos não provados (art.º 607º/4 CPC). Esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão. É através dos fundamentos constantes do despacho em que se respondeu à matéria da base instrutória que este Tribunal vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância[13]. Por outro lado, porque se mantêm vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados[14]. Atenta a posição expressa na doutrina e na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos, deve considerar os meios de prova indicados pelas partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido[15]. Ponderando estes aspetos e procedendo á audição dos registos gravados no sistema Citius, face aos argumentos apresentados pelo apelante, tendo presente o segmento da sentença que se pronunciou sobre a fundamentação da matéria de facto, verifica-se que a decisão de facto não merece censura pelos motivos que se passam a expor. - - Ponto 4 dos factos provados -Na petição a Autora alegou: “2º-A No seguimento desse contacto, A. e R. acordaram e celebraram[…] 4º Pelo preço, inicialmente previsto, de 153.000,00 € (cento e cinquenta e três mil euros) - mesmo doc. 4º-A Entretanto alterado para 147.000,00€ (cento e quarenta e sete mil euros) - docs 4 a 10”. Julgou-se provado: 4. Pelo menos em novembro de 2019, verbalmente, os contraentes alteraram o preço de venda do imóvel inicialmente acordado para €147.000,00. Na fundamentação da decisão considerou-se: “Mas a grande controvérsia que se coloca neste processo incide sobre os factos presentes no número 4. dos factos provados. Por regra, a apreciação dos factos antecede a apreciação jurídica. Todavia, neste caso, estamos perante uma exceção. Vejamos. É incontroverso que entre a A. e o R. foi celebrado um contrato de mediação imobiliária. O contrato de mediação imobiliária está regulamentado no DL nº 15/2013, de 08/02. E nos termos do disposto no artº 16º, nº 1, do diploma, este contrato tem de ser reduzido a escrito. O que aqui, agora, se discute é saber: - a validade de um aditamento verbal ao contrato inicialmente celebrado; - para a prova desse aditamento verbal, que elementos probatórios são admissíveis. A primeira das questões é matéria puramente de direito e será analisada infra, na apreciação jurídica. A segunda questão envolve uma questão jurídica com reflexos nos elementos probatórios. É por isso que terá de ser analisada neste momento. Vejamos. O artº 392º do Cód. Civil dispõe que “A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja direta ou indiretamente afastada”. Já do artº 393º, nºs 1 e 2, do Cód. Civil decorre que “1. Se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não é admitida prova testemunhal. 2. Também não é admitida prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força probatória plena”. Temos aqui uma primeira limitação a admissibilidade da prova testemunhal. Para o que nos interessa neste processo, o artº 394º, nº 1, do Cód. Civil dispõe que “1. É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objeto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos artigos 373.º a 379.º, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores”. Repare-se que, em todos estes casos, não estamos a cuidar da validade das estipulações. Estamos apenas a cuidar da admissibilidade do uso de determinados elementos de prova (a prova testemunhal) para a convicção de que tais estipulações adicionais ou acessórias ocorreram. Nos termos do disposto no artº 363º, nºs 1 e 2, do Cód. Civil “Os documentos escritos podem ser autênticos ou particulares. 2. Autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de atividade que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública; todos os outros documentos são particulares”. Descendo ao caso concreto, o contrato de mediação imobiliária assinado pelas partes trata-se de um documento particular, tendo em consideração os critérios enunciados no supra transcrito artº 363º, nº 2, do Cód. Civil. Ora, chegados aqui, cumpre questionar: será admissível a produção de prova testemunhal para comprovar uma estipulação verbal posterior ao contrato de mediação imobiliária? No sentido literal, tal como decorre do artº 394º, nº 1, do Cód. Civil, não seria. E é esta a posição da doutrina tradicional (3-neste sentido, Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra, 4ª edição, p. 344). Contudo, na jurisprudência mais recente, vem-se admitindo a prova testemunhal, desde que exista um princípio de prova documental. Como refere o STJ em acórdão de 07/02/2017 “o princípio de prova consistir num documento, com força e credibilidade; se documento não ser usado como facto – base de presunção judicial; reconhecer-se que se trata de uma laboração da doutrina e da jurisprudência oportunamente arredada do “jure constituto” e, em consequência, a ser tida em consonância com os artigos 9.º e 10.º do Código Civil”(4-acórdão do STJ de 07/02/2017, processo nº 3071/13.6TJVNF.G1.S1, integralmente disponível no sítio www.dgsi.pt.). É também esta a nossa posição. Como se menciona no aludido acórdão “a doutrina e a jurisprudência, inspiradas nos argumentos do Autor da 1.ª proposta (por sua vez seguindo os coevos Códigos Civis Italiano e Francês) e receando a rigidez do preceito, admitem que se utilize prova testemunhal desde que, a montante, surja um “princípio” (ou “começo”) de prova que crie uma convicção que as testemunhas podem sedimentar”. Ora é o que sucede neste processo. Assim, no contrato de mediação imobiliária, as partes estipularam que o imóvel seria vendido pelo preço de €153.000,00. Os documentos juntos como doc. nºs 5 a 10 à p.i., com a assinatura do próprio R., demonstram que a A. efetuou visitas ao imóvel promovendo-o ao preço de €147.000,00. De onde é que provém esta alteração ao preço de venda? Existe assim um princípio de prova que vai para além da mera prova testemunhal que se possa produzir. Pelo que se admite a prova testemunhal para efeito de verificar se existiu, ou não, uma estipulação verbal superveniente ao documento inicial, que reduziu o preço de venda do imóvel a €147.000,00. A este propósito, o Tribunal, para considerar como provados os factos presentes no número 4. dos factos provados socorreu-se, desde logo, dos documentos juntos como doc. 5 a 10 juntos com a p.i.. Demonstra-se, através desses documentos, que a A. efetuou visitas ao imóvel, promovendo-o ao preço de €147.000,00. Esses documentos – folhas de visitas – estão assinados pelo próprio R.. O R., na contestação, veio “impugnar os documentos”. Mas, claro, foi incapaz de afirmar, expressamente, que aquela assinatura não era dele e que tinha sido falsificada. E não foi capaz pelo motivo óbvio: porque ele os assinou (o que se refere, em complemento à motivação de facto supra produzida a propósito dos factos presentes no número 6. dos factos provados). Também a indicação, por parte do R., de não reparar no preço que constava, não colhe. Uma coisa é não reparar num dos documentos. Mas 5 documentos? Assinados em dias diferentes? Ninguém acredita. Por isso, logo à partida, aqueles documentos são indícios fortíssimos no sentido de que houve uma alteração do preço inicial. E esta alteração, verbal, foi depois explicada pela testemunha BB, que foi o comercial da A. que, materialmente, inicialmente contactou com o Réu. Este explicou, a este propósito, em síntese, que, antes de assinarem o contrato de mediação aconselha o cliente a um determinado valor de venda do imóvel. O R. pretendia 153.000,00 pela venda do imóvel e, por isso, foi esse o valor fixado no contrato. Passado mais ou menos um mês reduziram o preço da venda para €147.000 euros, tudo em consonância e com a vontade do R., que queria vender o imóvel rapidamente. Após reduzir o preço, os contactos surgiram rapidamente. Nem todos surtiram em visitas. A procura pelo imóvel foi totalmente diferente. O R. teve presente em todas as visitas, menos numa, em que foi em horário de trabalho. Nas visitas, o proprietário (o R.) ouvia-o a apresentar a casa aos potenciais clientes. O preço era sempre a pergunta final, com os clientes a questionarem se o preço era, ou não, negociável. o R. estava presente quando o preço era falado e nunca afirmou que existiria um lapso no preço de €147.000,00. Depois, o próprio R. assinou vários documentos de visitas. A testemunha foi totalmente credível pela forma firme, segura e coerente com a documentação que foi junta (doc.s 5 a 10 junta com a p.i.). A credibilidade da testemunha BB pode ainda ser conferida quando se confronta com o depoimento da testemunha CC, o diretor de agência da A.. Assim, explicou a testemunha BB que, quando surgiram as primeiras complicações com o negócio (o R. não permitiu que se fizesse a avaliação), ele fez intervir o seu diretor de agência, a testemunha CC. E o que a testemunha CC depôs foi que, em contacto telefónico, o R. nunca lhe disse que o seu bem imóvel estava a ser anunciado a um preço inferior ao combinado. A questão seria a existência de um negócio paralelo que o R. também queria efetuar, que não estava dependente deste negócio entre a A. e o R., negócio esse que se teria complicado (o R. pretendia vender a sua casa e comprar outra casa). Este depoimento da testemunha CC é também ele credível pela forma firme e segura como foi prestado, mas igualmente porque está em total consonância com os factos presentes no número 15. dos factos provados. Repare-se que o R. não diz que o problema foi “estarem a tentar vender o bem abaixo de €153.000,00”. Nada disso. O problema que o R. enuncia em 07/01/2020 é o seguinte “Infelizmente, surgiu um contratempo de última hora colocado pelo vendedor da fração para o qual eu ia morar, face a uma oferta superior de um investidor que pretende adquirir o apartamento, o vendedor alterou em alta os valores envolvidos anteriormente por nós acordados”. Agora percebe-se. O R. e BB acordam verbalmente a descida do preço de venda do imóvel do R.. Entretanto, surgem problemas com a casa para onde o R. se pretendia mudar. E o R. começou a hesitar na venda da sua própria casa, pois corria o risco de vender a sua e não comprar a que pretendia. Forma-se, assim, um núcleo probatório muito forte, que nos levam a considerar como provados os factos presentes no número 4. dos factos provados. O Tribunal não acreditou, em face destes elementos, na versão dos factos indicada nas declarações prestadas pelo R.. As mensagens trocadas pelo R. com BB (juntas na contestação) nada provam em contrário. Provam apenas que BB pretendia encontrar com o R.. Do depoimento de BB percebe-se. BB explicou que tinha relações familiares com a companheira do R. e que, por isso mesmo, facilitou e não fez o R. assinar, por escrito, a alteração do preço. Quando começou a ver que existia a hipótese do R. vir a colocar entraves no negócio, então queria agendar uma reunião. Mas o R. nem compareceu. Nada disto invalida as nossas conclusões. A alteração verbal do preço existiu mesmo. O que não se sabe é a data exata em que os contraentes acordaram a alteração verbal do contrato. Sabe-se que terá sido em Novembro de 2019 (até porque as visitas já refletem essa alteração), mas não se sabe a data exata (cfr. número 8. dos factos não provados)”. Sugere a apelante que se julgue a matéria do ponto 4 “não provada”. Para sustentar a alteração transcreve excertos dos depoimentos das testemunhas BB, CC, EE e DD, que se mostram irrelevantes para demonstrar o erro na apreciação da prova. Questiona o juízo de avaliação da prova, mas não indica o concreto erro na sua apreciação. Por outro lado, defende que não pode ser atribuído o valor de princípio de prova às “Fichas de Visita”, porque na contestação o apelante impugnou a assinatura que consta de tais documentos. Cumpre-nos referir que a apreciação crítica da prova tal como consta da fundamentação na sentença não merece censura, porque reflete o que as testemunhas vieram transmitir ao tribunal, como se pode confirmar com a audição da gravação através do sistema Citius e por isso, dispensamo-nos de reproduzir o seus depoimentos. A apreciação da prova testemunhal respeita o critério legal (art.º 394º/1 CC), sustentada na doutrina e jurisprudência atual. Com efeito, questionando-se da admissibilidade de prova testemunhal para prova da alteração do preço previamente estipulado no contrato escrito, concluiu-se por admitir tal meio de prova, por existir um princípio de prova escrita as “Fichas de Visita” assinadas pelo apelante-réu. Prevê o art.º 394º/1 CC: 1. É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objeto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos artigos 373.º a 379.º, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores”. A existência de pactos contrários ou adicionais ao conteúdo de documentos suscita, em primeiro lugar, a questão da sua validade ou eficácia. Apenas quando essas convenções possam ser consideradas válidas (art.º 221º e 222º CC) justificar-se-á analisar quais os meios de prova que podem ser convocados para fazer prova dos mesmos. Sendo válidas é inadmissível a respetiva prova por testemunhas. O motivo que levou o legislador a estabelecer a restrição de prova do art.º 394º/1 CC, prende-se com a “falibilidade da prova testemunhal, na maior segurança que oferece a prova por documento e no facto de a experiência mostrar que a adoção de forma escrita visa a integralidade do ato, cobrindo-o na totalidade”[16]. A doutrina nacional[17] seguindo os argumentos de VAZ SERRA[18] vem defendendo que a restrição do nº1 do art.º 394º CC não veda a possibilidade de prova com base num princípio de prova escrita contextualizada ou complementada por prova testemunhal ou por presunção judicial. Tal conciliação passa pela admissão da prova testemunhal quando convocada para complementar prova escrita que possa valer como um princípio de prova da estipulação contratual posterior. O começo da prova por escrito obedece a três requisitos: um escrito, proveniente daquele a quem é oposto, que torne verosímil o facto alegado. Pode ser constituído por um só escrito ou por vários, mesmo que não subscrito. O escrito deve ser proveniente daquele contra quem a ação é dirigida ou do seu representante, que torne verosímil o facto alegado. Deve emanar daquele a quem é oposto, não de um terceiro. A letra ou assinatura desse escrito devem ser previamente reconhecidas ou verificadas; enquanto não é verificado, o escrito discutido não pode servir de começo de prova porque não se sabe de quem emana. Será de admitir o escrito que não seja do punho da contraparte (ou seu procurador) mas que tenha sido criado com a sua participação, v.g., auto que contenha respostas da parte a interrogatório formal. Não é necessário que o escrito esteja dirigido à parte que o exibe. O escrito deve tornar verosímil o facto alegado. Entre o facto indicado pelo escrito e aquele que deveria ser objeto de prova testemunhal, deve existir um nexo lógico tal que confira ao último um relevante fumus de credibilidade. Esse nexo lógico não corresponde a um simples momento inferencial de uma argumentação presuntiva, mas deve ser entendido como dado instrumental de um convencimento probabilístico, que o juiz pode firmar com uma razoável correlação lógica entre o conteúdo do escrito e o facto controverso[19]. No caso presente, as “Fichas de Visita”, documentos juntos com a petição, foram considerados como princípio de prova escrita, porque apesar de conterem um texto processado pela autora, no qual se indica o preço de venda do imóvel como sendo € 147.000,00, contêm a assinatura do réu. Argumenta o apelante que na contestação impugnou a assinatura que consta das “Fichas de Visita”. Contudo, dos art.º 16º, 17º, 18º da contestação resulta o contrário, como se pode constatar pela sua leitura: “16º Sendo o R. o proprietário da casa, compete-lhe dizer que não se revê nesses grafismos que aparentemente a A. lhe pretende atribuir, não os reconhecendo como tendo sido feitos pelo seu punho, motivo por que os impugna. 17º Não contesta contudo, se é isso que a A. pretende provar, que foram feitas visitas no final das quais, ainda em diálogo de despedida, apôs a sua assinatura em fichas apresentadas como sendo apenas destinadas a comprovar tais presenças, nunca tendo lido ou prestado atenção ao seu teor. 18º Dessas fichas nunca foram dadas cópias ao R.” Acresce, que atenta a previsão do art.º 574º/1/3 CPC o réu deve tomar posição definida sobre os factos e se declara que não sabe se determinado facto é real, a declaração equivale a confissão, quando se trate de facto pessoal ou de que deva ter conhecimento. A forma como o réu se insurge contra a alegação da autora apenas permite dar como assente o facto em causa, ou seja, que as assinaturas apostas nas “fichas de visita” juntas com a petição são da autoria do réu. O réu começa por negar um facto que depois aceita, reconhecendo como sua a assinatura das “fichas de visita”. Mas não bastando, em declarações de parte, o réu admitiu que esteve presente em todas as visitas, exceto numa, tendo comparecido a namorada e quando esteve presente acompanhou os interessados na visita à sua fração e assinou as fichas de visita que lhe foram apresentadas pelo agente imobiliário no local. Das declarações prestadas pelo réu resulta, ainda, em sintonia com o alegado na contestação, que as fichas de visita eram “meras folhas de presença e não atendeu ao preço que ali estava indicado”. Desta afirmação podemos extrair que as “fichas de visita” não constituíam meros documentos de presença e que nas mesmas constava um preço de venda do imóvel. Desta forma, é de concluir que as assinaturas apostas nos documentos são da autoria do réu, não merecendo censura o juízo crítico quanto ao relevo probatório de tais documentos, tal como consta da fundamentação da decisão. Estes documentos têm o valor de princípio de prova, porque dos mesmos consta o preço de venda que resulta do acordo verbal de alteração do preço, acordo celebrado entre a testemunha BB, em representação da autora, o réu/apelante e a namorada deste. O depoimento da testemunha BB em confronto com os depoimentos das testemunhas DD e EE e os documentos juntos aos autos – fichas de visita, teor do contrato de mediação e comunicação eletrónica transcrita no ponto 15 dos factos provados – justificam o relevo probatório do depoimento da testemunha BB no sentido de julgar provada a estipulação contratual de alteração do preço. De significativo no depoimento das testemunhas DD e EE resulta a confirmação do depoimento da testemunha BB, a respeito da forma como se processava a visita à fração pretendida vender. A testemunha DD referiu que quando fez a visita ao apartamento, “o preço indicado rondava os € 150.000,00 e é possível que fosse um pouco menos”. Referiu, ainda, que na visita à casa, o réu esteve presente e acompanhou a visita. A compra não se concretizou porque segundo informação prestada, o réu “desistiu da venda”. A testemunha EE, marido da anterior testemunha e que a acompanhou na visita ao imóvel, referiu que visitou o imóvel com o BB e o proprietário. Na visita “foi discutido o preço da venda, que rondava os € 150.000,00”. Referiu, ainda, que agendado o contrato-promessa, por duas vezes, o proprietário desistiu. “Havia ali uma situação pessoal e não querida vender, isto da primeira vez; da segunda vez não foi dada justificação”. Considera-se, aliás, significativo no sentido de reforçar a credibilidade do depoimento da testemunha, o documento junto com a petição e transcrito no ponto 15 dos factos provados, porque tal documento constitui uma comunicação eletrónica do réu dirigida à autora no qual revela ter conhecimento das diligências que se estão a promover para a concretização do financiamento da compra, mas também do motivo pelo qual o réu vem desistir da venda da sua fração. Com efeito, em tal comunicação o réu refere apenas que o negócio não se pode realizar, porque a compra de uma outra casa pelo réu não se consegue concretizar. Se a causa da desistência estivesse associada ao preço de venda do imóvel, seria legítimo e normal que o réu nessa comunicação eletrónica indicasse como causa de desistência a não aceitação do preço indicado para a celebração do contrato de venda da sua fração. Não há qualquer comunicação escrita em que se revele tal insatisfação ou divergência de entendimento. Também não se pode atender aos argumentos apresentados sob o ponto 19 das conclusões de recurso. Considera o apelante que as testemunhas BB e CC não vieram depor com isenção, porque “estão ligadas a um contrato de mediação em cuja última linha está manuscrita uma alteração de preço sem assinatura e que tentam obtê-la a posteriori tentando encobrir o óbvio fim, como dos emails supra reproduzidos se vê”. Decorre do depoimento da testemunha BB que foi o próprio que inseriu no contrato a cláusula com a alteração do preço. O acordo com alteração do preço, firmado de forma verbal, decorre da relação de confiança que se estabeleceu entre as partes devido ao facto da namorada do réu ser prima da testemunha. Aliás, o próprio réu admitiu nas declarações de parte que foi através da sua namorada que contactou a imobiliária autora. Pelo facto da relação de namoro entre o réu e a prima da testemunha ter terminado, referiu a testemunha BB, que sentiu necessidade de formalizar o acordo celebrado e é nessa sequência que surgem as comunicações por “SMS” transcritas no ponto 18 das conclusões de recurso, para agendar uma data para o réu assinar a cláusula de alteração do preço. A sinceridade com que a testemunha depôs sobre os factos e as circunstâncias em que os mesmos ocorreram justificam a credibilidade que foi reconhecida ao seu depoimento. Argumenta, ainda, o apelante que a autora veio formular o pedido de condenação no pagamento de “uma comissão bancária sobre um inexistente empréstimo para compra não efetuada, sendo que já receberam do mesmo banco pela compra do imóvel para onde direcionaram os mesmos interessados”. Dado que tal pretensão foi julgada improcedente, como reconhece o apelante, nenhum efeito se pode extrair de tal circunstância, sendo certo que tal pedido não estava relacionado com o concreto contrato de mediação imobiliária, mas com outro contrato paralelo celebrado entre a autora e a instituição bancária. Refere, por fim, que a testemunha BB, agente imobiliário e a testemunha CC, sócio e diretor de agência na autora auferem vantagens económicas diretas e imediatas (comissões e rendimento) com a procedência da ação sendo, logo, partes interessadas nela. Revelando os depoimentos consonância, devido ao interesse comum que têm na causa. Nada se provou nesse sentido, nem o apelante em sede de julgamento suscitou o incidente de contradita (art. 521º CPC), com vista a abalar a credibilidade dos depoimentos. Contudo, sempre será de referir que figura como parte na ação a Autora A..., Lda e as testemunhas são, respetivamente, prestador de serviços e funcionário, que certamente recebem as suas remunerações pelos serviços prestados. As testemunhas não figuram como parte na ação. Refira-se, ainda, que o interesse das testemunhas na discussão da causa, pelo facto de prestarem serviço para a autora não é só por si determinante, para retirar credibilidade aos depoimentos. A testemunha é um terceiro em face da relação jurídica processual, ainda que não perante a relação jurídica material ou os interesses que no processo se discutem[20]. Daqui se conclui, que o interesse na causa, só por si, não desvaloriza o depoimento da testemunha, nem impede a sua audição nessa qualidade. O interesse da testemunha na causa releva como um dos fatores a ter em conta na apreciação do seu depoimento, mas que no caso concreto não retira o relevo probatório que lhe foi atribuído. Refira-se, por fim, que estando em causa também a apreciação do incidente de litigância de má-fé, nada impedia a produção de prova testemunhal para apreciação dos fundamentos do incidente. Em conclusão, a prova indicada pelo apelante não justifica a alteração da decisão do ponto 4., que como tal se mantém como facto provado. - - Ponto 17 dos factos provados -Na petição sob o art. 44º a autora alegou o que se julgou provado sob o ponto 17 dos factos provados, com o seguinte teor: 17. A A. enviou ao R. uma carta registada com A/R, datada de 04/02/2020, com o teor: “Ass: - Contrato de mediação imobiliária n.º ..., de 26/10/2019. - Fração autónoma designada pela letra “B”, Tipo T2, localizado no rés-do-chão direito frente do prédio sito na Rua ..., ..., R/ch dto frente, em ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia .... Exmo. Senhor, Como sabe, contratou-nos para, em regime de exclusividade, promover a venda do seu supra identificado imóvel, e, através disso, angariar comprador para o mesmo, pelo preço, inicialmente de 153.000,00€, posteriormente reduzido para 147.000,00 €. Entendemos que cumprimos todas as obrigações a que nos propusemos no âmbito do referido contrato entre nós celebrado, tendo angariado como compradores EE e DD, de que anteriormente lhe demos inteiro conhecimento, incluindo o processo de financiamento devidamente aprovado junto do banco Banco 1..., razão pela qual solicitamos que, no prazo de 10 dias, nos indique dia e hora para nos reunirmos com vista a acertar as contas dos n/ serviços. Certos da s/ atenção, Com os n/ melhores cumprimentos, A Gerência,” Na fundamentação da decisão ponderou-se, o que se passa a transcrever: “Os factos presentes nos números 17., 18. e 20. dos factos provados decorre dos doc.s nºs 14 e 16 juntos à p.i.. […]” O apelante considera que da conjugação do facto provado sob o ponto 18, com o facto não provado sob o ponto 6, apenas se pode dar como provado que “a autora enviou ao réu um objeto registado, com AR, datado de 04 de fevereiro de 2020”. A conjugação dos factos apontados não justifica a resposta sugerida, nem demonstra qualquer contradição que cumpra suprir. Está comprovado o envio da carta e a sua devolução, sendo certo que a experiência comum apenas permite considerar que com o envio de um envelope no seu interior segue uma carta e no caso concreto, não foi produzida prova que demonstre o contrário. Acresce que o réu tomou conhecimento via mail do conteúdo da carta, antes da propositura desta ação, como decorre do ponto 20 dos factos provados, matéria que não foi impugnada pelo apelante. Em 30 de março de 2020 a autora remeteu ao réu um email, contendo como anexo a carta em causa. Conclui-se que a decisão não merece censura e por isso se mantém. - - Ponto 7 dos factos julgados não provados -Na contestação o réu alegou: - art.º 4º: Com efeito, o que o R. sempre pretendeu e comunicou desde o início à A. e com ela acordou como essencial para o contrato que celebrou com ela, foi a concomitante venda do seu apartamento pelo preço de €153.000,00 (cento e cinquenta e três mil euros) e a compra de outro apartamento próximo da praia, para onde se mudaria. - art.º 5º: A indissociabilidade e inerente simultaneidade de ambos os negócios era fundamental, tal como o preço referido. Julgou-se não provado: 7. O R. sempre comunicou, desde o início, à A. e com ela acordou como essencial para o contrato que celebrou com ela, que o apartamento seria vendido pelo preço de €153.000,00 (cento e cinquenta e três mil euros), concomitantemente e na dependência da compra de outro apartamento próximo da praia, para onde se mudaria. Na fundamentação da decisão considerou-se, como se passa a transcrever: “A outra grande controvérsia deste processo incide sobre os factos presentes no número 7. dos factos não provados. O R. veio afirmar que as partes teriam condicionado a venda do seu imóvel à possibilidade de aquisição, por parte do R., de um outro imóvel, para onde se mudaria. Até pode ter sido essa a vontade do R.. Mas nenhuma prova bastante foi produzida nesse sentido. Em primeiro lugar, trata-se de uma estipulação contemporânea ao próprio contrato. Inexistindo qualquer princípio de prova documental, por força do disposto no artº 393º do Cód. Civil não é permitida a produção nem de prova testemunhal, nem de prova por declarações. Logo, inexistido outra prova, estes factos teriam de se considerar imediatamente como não provados. Mas mesmo que se admitisse a prova testemunhal ou por declarações de parte, o Tribunal iria considerar esses factos como não provados. O R. afirma-o nas declarações prestadas em julgamento. Mas não merece a mínima credibilidade. Efetivamente, se não era a A. quem iria mediar o “outro negócio” como é que ela poderia condicionar a venda daquele imóvel a um outro negócio sobre o qual não tinha nenhum controlo? Não faz o menor sentido. E muito mais fariam sentido os depoimentos de BB e CC, no sentido de que o seu negócio (o que decorria do contrato de mediação celebrado) não estar dependente de qualquer outro negócio. Em todo o caso, a questão nem se coloca: como não é admissível, a este propósito, a prova testemunhal ou documental, nada se pode provar a este respeito. O que não significa, repete-se, que o R. não estivesse mesmo com esse intuito. Mas uma coisa é ter essa intenção (vender a sua casa e comprar outra). E outra bem diferente é, formalmente, perante o agente imobiliário, condicionar a venda da sua casa à compra de outra casa. Algo que não constava do contrato. Pelo que se consideram estes factos como não provados. A testemunha JJ, vizinho do R., nada de útil veio trazer ao processo, limitando-se a afirmar que trocou de apartamento com o R. e que, acontecia raramente, mas às vezes as cartas de um iam ter á casa do outro. Embora, neste caso, não confirmou que tal tivesse sucedido. A testemunha KK, colega de trabalho do R., o que sabia era que este estava á procura de casa para perto da praia de Espinho. Nada de útil se pôde extrair deste depoimento. A testemunha LL, também colega de trabalho do R., desconhecia os contornos do contrato do R. com a A., apenas sabendo que o R. pretendia vender a sua casa e comprar outra. Nada de relevante, porque não é, sequer, isso que está em causa. A testemunha MM, também colega de trabalho do R. desconhecia os contornos do contrato do R. com a A., apenas sabendo que o R. pretendia vender a sua casa e comprar outra. Nada de relevante, porque não é, sequer, isso que está em causa”. Sugere o apelante que se julgue provada a matéria do ponto 7 dos factos julgados não provados. Sustenta a alteração na comunicação eletrónica transcrita no ponto 15 dos factos provados e ainda, no depoimento das testemunhas CC e BB. A testemunha CC a este respeito referiu que uma cláusula desta natureza a existir, teria que constar do contrato formalizado entre as partes, como observações. A testemunha contudo, referiu desconhecer se tal proposta chegou a ser formulada ao mediador. Afirmou com conhecimento direto dos factos que a desistência do negócio que estava em curso ocorre porque o réu informou a autora, através de email, que a venda estaria dependente da aquisição de uma nova habitação e este negócio não se concretizou. Por sua vez, a testemunha BB referiu que o réu apenas transmitiu à testemunha a vontade de vender a casa onde residia e com esse propósito foi celebrado o contrato de mediação. Esclareceu que no seu entender condicionar a venda da casa à aquisição de uma nova casa tornaria inviável a celebração do negócio de venda. A comunicação eletrónica referida pelo apelante apenas permite confirmar que o réu não logrou celebrar um negócio que estaria em curso. De tal documento não resulta que existisse qualquer relação de dependência entre o cumprimento do contrato de mediação e a celebração de um outro contrato de compra pelo réu. Nenhuma outra prova foi produzida que justificasse a alteração pretendida. Com efeito, as testemunhas indicadas pelo apelante nada revelaram saber sobre a matéria. Confirmaram, apenas, aquela que era a vontade manifestada pelo réu em conversas esporádicas, no sentido de adquirir uma casa perto do mar. As testemunhas nada revelaram saber dos termos em que o apelante celebrou o contrato de mediação ou se celebrou contrato de mediação imobiliária. Conclui-se que a decisão não merece censura e como tal se mantém. Em síntese, a decisão de facto não merece censura. Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 1 a 35, 39, 42 a 46, 58 a 60. - - Do Contrato de Mediação Imobiliária -Nos pontos 40, 41, 47 a 57 e 60 a 64 o apelante insurge-se contra o segmento da sentença que julgou válida a estipulação contratual verbal de alteração do preço e válido o contrato celebrado. O contrato em causa foi qualificado na sentença como contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade. Tal enquadramento jurídico não vem questionado pelo apelante e no contexto dos factos apurados tal qualificação não merece censura, sendo ao abrigo de tal regime jurídico, típico, na redação vigente à data da celebração do contrato - Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro e com as alterações introduzidas pelo DL 102/2017 de 23 de agosto, na parte em que sejam aplicáveis -, que se deve apreciar se existe incumprimento contratual, por facto imputável ao réu. O contrato de mediação imobiliária consiste “na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis” (art. 2º/1 Lei 15/2013 de 08 de fevereiro, cuja redação se mantém a mesma apesar das alterações introduzidas pelo DL 102/2017 de 23 de agosto). Prevê-se, ainda, nº 2 do citado preceito que a atividade de mediação imobiliária consubstancia-se também no desenvolvimento das seguintes ações: a) Prospeção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes; b) Promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões”. Refere-se, ainda, no nº 4 que: “As empresas de mediação imobiliária podem ainda prestar serviços que não estejam legalmente atribuídos em exclusivo a outras profissões, de obtenção de documentação e de informação necessários à concretização dos negócios objeto dos contratos de mediação imobiliária que celebrem”. O contrato de mediação comporta em si três elementos distintivos: a convenção expressa ou tácita de mediação, a atividade pontual e independente de intermediação e a onerosidade. A convenção entre mediador e solicitante consiste no acordo “entre mediador e solicitante no sentido de o primeiro servir de intermediário num ou mais contratos a celebrar pelo último com terceiros, preparando e aproximando as respetivas partes”[21]. Porém, convencionado o regime de exclusividade, nos termos do art. 19º/2 do citado diploma, sendo o contrato celebrado com o proprietário do imóvel, a remuneração da mediadora não depende do evento futuro e incerto constituído pela celebração do contrato visado, quando este evento não se concretize por causa imputável ao cliente[22]. Como observa HIGINA ORVALHO CASTELO: “[a] remuneração da mediadora depende aqui quase unicamente do cumprimento da sua obrigação e do sucesso desta”. E apreciando o ónus da prova, refere: “provando a mediadora que efetuou com sucesso a sua prestação [obtenção de um interessado que satisfaz o interesse do credor], poderá o cliente eximir-se à remuneração mediante a prova de que o contrato não se concretizou por causa que não lhe é imputável[…]”[23]. A norma do art.º 19º/2 Lei 15/2013 de 08 de fevereiro obriga o proprietário cliente a pagar a remuneração desde que, durante a vigência do contrato, o mediador lhe apresente um real interessado e o contrato não se concretize apenas por facto imputável ao cliente. Neste sentido, entre outros, podem consultar-se os Ac. STJ 12 de abril de 2023, Proc. 11768/19.0T8LSB.L1.S1, Ac. STJ 22 de abril de 2021, Proc. 2952/19.8T8LSB.L1.S1 e Ac. STJ 19 de junho de 2019, Proc. 7439/16.8T8STB.E1.S1, todos acessíveis em www.dgsi.pt.. Perante tal enquadramento jurídico, o réu-apelante questionou a validade do contrato [em nosso entender ignorando os efeitos da nulidade e da obrigação de liquidação como efeito da declaração de nulidade – art. 289º CC], porque em momento posterior à celebração do contrato as partes acordaram de forma verbal na alteração do preço. Considerou-se na sentença que o contrato é válido. Cumpre ter presente os fundamentos da decisão, que se passam a transcrever: “Neste caso, o contrato de mediação imobiliária celebrado tinha a forma escrita (cfr. número 3. dos factos provados). O preço de venda do imóvel que a A., inicialmente, deveria promover, seria de €153.000,00. Sucede que, após a celebração do contrato de mediação, a A. e o R. acordaram, verbalmente, que o preço a anunciar seria de €147.000,00 (cfr. número 4. dos factos provados). Discute-se agora a validade desta alteração ao contrato inicialmente firmado, por via meramente verbal. Estipula o artº 221º do Cód. Civil que “1. As estipulações verbais acessórias anteriores ao documento legalmente exigido para a declaração negocial, ou contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a razão determinante da forma lhes não seja aplicável e se prove que correspondem à vontade do autor da declaração. 2. As estipulações posteriores ao documento só estão sujeitas à forma legal prescrita para a declaração se as razões da exigência especial da lei lhes forem aplicáveis”. Neste caso, como se mencionou, o contrato exige a forma escrita – cfr. artº 16º, nº 1, do citado DL nº 15/2013, de 08/02. Ora, das menções obrigatórias previstas no artº 16º, nº 2, do DL nº 15/2013, não faz parte o preço do negócio subjacente ao contrato de mediação imobiliária. O que faz parte é a identificação do negócio (se é uma compra e venda, se é um trespasse, etc.). Da interpretação que fazemos, o artº 16º, nº 2, do DL nº 15/2013, de 08/02 não impõe a indicação do preço do negócio subjacente como um dos requisitos de validade do contrato de mediação imobiliária. Por conseguinte, nos termos do disposto no aludido artº 221º, nº 2, do Cód. Civil, a posterior redução do preço de venda do imóvel não estava, obrigatoriamente, sujeita à forma escrita. Pelo que, a estipulação superveniente, é perfeitamente válida. Ainda que assim não se entenda – e se interprete a indicação do preço do negócio subjacente como requisito essencial do contrato – então, ainda assim, esse incumprimento do requisito de forma não poderia ser levado em consideração, sob pena de violação flagrante do princípio da boa fé (cfr. art.º 334º do Cód. Civil). O R., que acorda verbalmente o abaixamento do preço de venda do seu imóvel e acompanha visitas feitas por potenciais compradores, não poderia depois invocar a nulidade da alteração contratual. Mas nem sequer é esse o nosso entendimento. Temos para nós que a alteração ao contrato inicialmente celebrado, com redução do preço da venda, é perfeitamente válida, nos termos do disposto no art.º 221º, nº 2, do Cód. Civil, por não se exigir a forma escrita na parte da fixação do preço (cfr. artº 16º, nº 2, do DL nº 15/2013, de 08/02, à contrário)”. A interpretação dos factos tal como consta da sentença respeita o critério legal. Argumenta o apelante que “a consagração legislativa da minuta a que estão legalmente obrigadas as mediadoras imobiliárias por força da Portaria 228/2018 de 13 de agosto em obediência ao art. 3º do DL 102/2017 traz um novo elemento interpretativo”. O apelante não refere em que medida tais preceitos justificam interpretação distinta daquela que consta da sentença. A Portaria pela sua natureza (ato regulamentar) prevê a forma do contrato, mas não dispõe sobre as condições de validade do contrato. A Portaria em causa rege e regula a forma dos contratos de mediação imobiliária sujeitos ao regime das Cláusulas Contratuais Gerais. Considere-se o objeto do diploma, tal como previsto no art.º 1º da citada Portaria: “A presente portaria aprova o modelo de contrato de mediação imobiliária com cláusulas contratuais gerais, a que se refere o artigo 3.º do Decreto -Lei n.º 102/2017, de 23 de agosto, que altera o artigo 16.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, o qual consta em anexo e dela faz parte integrante”. O art.º 3º do DL 102/2017 de 23 de agosto veio introduzir alterações ao art.º 16º da Lei 15/2013 de 08 de fevereiro, nos seguintes termos: «Artigo 16.º Contrato de mediação imobiliária 1 — [...]. 2 — [...]. 3 — [...]. 4 — Os modelos de contratos com cláusulas contratuais gerais de mediação imobiliária só podem ser utilizados pela empresa após aprovação prévia dos respetivos projetos pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I. P.). 5 — Para a aprovação prévia prevista no número anterior, a empresa submete o projeto de modelo de contrato ao IMPIC, I. P., por via preferencialmente eletrónica. 6 — Sempre que a empresa utilize o modelo de contrato com cláusulas contratuais gerais aprovado por portaria dos membros do Governo das áreas da justiça, do imobiliário e da defesa do consumidor, está dispensada da aprovação prévia prevista no n.º 4, devendo depositar o modelo de contrato, por via preferencialmente eletrónica, junto do IMPIC, I. P. 7 — O incumprimento do disposto nos n.os 1, 2, 4 e 6 determina a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação. 8 — (Anterior n.º 6.) 9 — Quando, por motivo de indisponibilidade técnica, não for possível o cumprimento do disposto nos n.os 5 e 6, pode ser utilizado qualquer outro meio legalmente admissível”. O apelante não alegou que o contrato em causa estava subordinado a tal regime, sendo por isso de afastar a sua aplicação a respeito da formalização do contrato. Conclui-se que não merece censura o segmento da decisão quando considera válido o contrato, apesar da alteração introduzida, por acordo verbal, na cláusula que estipula o preço. - Nos pontos 40 e 41 das conclusões de recurso o apelante considera que a autora agiu com abuso de direito ao reclamar o pagamento da comissão, por entender que não existindo lesão nada cumpre reparar ou ressarcir.O abuso de direito, nos termos do art.º 334º CC, consiste no exercício ilegítimo de um direito. Considera-se ilegítimo o exercício de um direito “quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA referem que: “[a] nota típica do abuso do direito reside, por conseguinte, na utilização do poder contido na estrutura do direito para a prossecução de um interesse que exorbita do fim próprio do direito ou do contexto em que ele deve ser exercido”[24]. ALMEIDA COSTA refere a este respeito que: “exige-se, um abuso nítido: o titular do direito deve ter excedido manifestamente esses limites impostos ao seu exercício[25]. Para apurar se as partes envolvidas no negócio agiram segundo os ditames da boa-fé cumpre ao juiz considerar: “as exigências fundamentais da ética jurídica, que se exprimem na virtude de manter a palavra e a confiança, de cada uma das partes proceder honesta e lealmente, segundo uma consciência razoável, para com a outra parte, interessando as valorações do círculo social considerado, que determinam expectativas dos sujeitos jurídicos”. De igual modo, “não se pode esquecer o conteúdo do princípio da boa fé objetivado pela vivência social, a finalidade intentada com a sua consagração e utilização, assim como a estrutura da hipótese em apreço”[26]. Com base no abuso de direito, o lesado pode “requerer o exercício moderado, equilibrado, lógico, racional do direito que a lei confere a outrem; o que não pode é, com base no instituto, requerer que o direito não seja reconhecido ao titular, que este seja inteiramente despojado dele”[27]. Na situação presente, a autora reclama o pagamento da comissão com fundamento no art. 19º /2 da Lei 15/2013 de 08 de fevereiro. Celebrado o contrato de mediação imobiliária com o proprietário do prédio, em regime de exclusividade, assiste à empresa mediadora o direito a reclamar o pagamento da comissão, quando se verifica o incumprimento do contrato por facto imputável ao cliente da empresa mediadora. A autora veio exercer um direito com tutela legal, sendo certo que o apelante não se insurge contra o segmento da sentença que considerou imputável ao réu o incumprimento do contrato. Com efeito, provou-se que os compradores da fração que pertence em propriedade ao réu/apelante acabaram por adquirir outra fração através da mediação da autora (cfr. pontos 21, 22, 23 factos provados). Esse outro contrato que foi celebrado entre a autora e terceiros, não dispensa o réu do cumprimento das obrigações contratuais e tal situação apenas vem a verificar-se pelo facto do réu se recusar a cumprir o contrato, porque desistiu da venda do seu imóvel. O réu não logrou provar que o incumprimento não lhe era imputável, sendo seu tal ónus (art. 342º/2 CC). Conclui-se que sendo legítimo o exercício do direito, por parte da autora, não se justifica paralisar o seu exercício, com fundamento em abuso de direito. Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso, sob os pontos 40 e 41 e 47 a 57 e 60 a 64. - Nos termos do art. 527º CPC as custas são suportadas pelo apelante.- III. Decisão:Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e nessa conformidade: - julgar improcedente a reapreciação da decisão de facto; - confirmar a sentença. - Custas a cargo do apelante.* Porto, 19 de dezembro de 2023(processei, revi e inseri no processo eletrónico – art. 131º, 132º/2 CPC) Assinado de forma digital por Ana Paula AmorimFátima Almeida Augusto de Carvalho ____________________ [1] Texto escrito conforme o Novo Acordo Ortográfico de 1990. [2] ANSELMO DE CASTRO Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Coimbra, Almedina, 1982, pag. 142. [3] JOSÉ LEBRE DE FREITAS, A. MONTALVÃO MACHADO E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, pag. 704. [4] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra, Coimbra Editora Lim, 1984, pag. 143. No mesmo sentido pode ainda ler-se o ANTUNES VARELA et al Manual de Processo Civil, 2ª edição, revista e atualizada, Coimbra Editora, Limitada, Coimbra, 1985, pag.688. [5] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2013, pag. 240 [6] MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, Lisboa, Lex, 1997, pag. 77. MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, ob. cit., pag. 78. JOSÉ LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, vol I, Coimbra, Coimbra Editora, 1999, pag. 467-468. [7] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, Julho, 2013, pag. 126. [8] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil-Recursos nos Processos Especiais e Recursos no Processo do Trabalho, 7ª Edição Atualizada, Almedina, Coimbra, 2022, pag. 200-201 [9] Cfr. Ac. STJ 29 de outubro de 2015, Proc. 233/09 e Ac. STJ 19 de fevereiro de 2015, Proc. 299/05, ambos acessíveis em www.dgsi.pt [10] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos em Processo Civil, 7ª edição atualizada, Coimbra, Almedina, 2022, pag. 334-335 [11] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, Coimbra, Almedina, Janeiro 2000, 3ª ed. revista e ampliada pag.272. [12] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, vol IV, Coimbra Editora, Coimbra, pág. 569. [13] Ac. Rel. Guimarães 20.04.2005 - www.dgsi.pt. [14] Ac. Rel. Porto de 19 de setembro de 2000, CJ XXV, 4, 186; Ac. Rel. Porto 12 de dezembro de 2002, Proc. 0230722, www.dgsi.pt [15] ANTÓNIO DOS SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos em Processo Civil – Novo Regime, Coimbra, Almedina, Setembro 2008, 2ª ed. revista e atualizada pág. 299 e Ac. STJ 20.09.2007 CJSTJ, XV, III, 58, Ac STJ 28.02.2008 CJSTJXVI, I, 126, Ac. STJ 03.11.2009 – Proc. 3931/03.2TVPRT.S1; Ac. STJ 01.07.2010 – Proc. 4740/04.7 TBVFX-A.L1.S1 ( ambos em www.dgsi.pt). [16] LUÍS CARVALHO FERNANDES, coord. e JOSÉ BRANDÃO PROENÇA, coord., COMENTÁRIO AO CÓDIGO CIVIL, - Parte Geral, Universidade Católica Editora, Unipessoal, Lisboa, setembro 2014, pág. 891 [17] LUÍS CARVALHO FERNANDES, coord. e JOSÉ BRANDÃO PROENÇA, coord.COMENTÁRIO AO CÓDIGO CIVIL, - Parte Geral, ob. cit., pag. 891 [18] VAZ SERRA, PROVAS – Direito Probatório Material, BMJ 112, pág. 215-216, 218-224 [19] VAZ SERRA, PROVAS – Direito Probatório Material, BMJ 112, pág. 219-224 [20] JOSÉ LEBRE DE FREITAS A Ação Declarativa Comum – Á Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, setembro 2013, pág. 279. [21] JOSÉ A. ENGRÁCIA ANTUNES Direito dos Contratos Comerciais, Coimbra, Edições Almedina, SA, maio 2014, pág. 460 [22] Cfr. HIGINA ORVALHO CASTELO O contrato de mediação, Almedina, Coimbra, dezembro, 2014, pág. 431 [23] HIGINA ORVALHO CASTELO O contrato de mediação, ob. cit., pág. 432 [24] PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª Edição Revista e Atualizada, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora- grupo Wolters Kluwer, 2011, pág. 298. [25] MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA Direito das Obrigações, 9ª edição, Coimbra, Almedina, 2001, pág. 75. [26] MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA Direito das Obrigações, ob. cit., pág. 104-105. [27] PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA Código Civil Anotado, vol. I, ob. cit., pág. 300. |