Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
22/19.8P6PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA JOANA GRÁCIO
Descritores: DEPOIMENTO DOS ÓRGÃOS DE POLÍCIA CRIMINAL
CÂMARA DE VIGILÂNCIA
DIREITO À IMAGEM
CAUSA DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE
CAPTAÇÃO DE IMAGENS
Nº do Documento: RP2021012722/19.8P6PRT.P1
Data do Acordão: 01/27/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA (RECURSO DOS ARGUIDOS)
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Qualquer testemunha, mesmo se tiver o estatuto de órgão de polícia criminal que participou na investigação do processo, pode depor em julgamento com ocultação de identidade e distorção de som e imagem, ao abrigo da Lei de Protecção de Testemunhas (Lei 93/99, 14-07), desde que verificados os requisitos previstos nessa Lei, designadamente no seu art. 16.º, e que tenha sido cumprido o contraditório legalmente admissível.
II - A prestação de depoimento por agentes da PSP nessas condições está ainda suportada pelo disposto no art. 19.º do Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública (DL 243/2015, de 19-10), que opera mediante autorização de dispensa temporária de identificação e de codificação da identidade por parte do Director Nacional da PSP, embora este mecanismo careça ainda de regulamentação através de portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna.
III - Tendo algumas das testemunhas, agentes da PSP, prestado o seu depoimento no decurso da audiência de julgamento por videoconferência, com ocultação da identidade e distorção da imagem, após prestarem juramento perante juiz que presidiu a esse acto e acompanhou presencialmente a tal diligência, e tendo sido dada a possibilidade à Defesa dos arguidos de livremente as inquirir, ainda que tenha optado por não o fazer, mostra-se assegurada a realização do contraditório, de forma a garantir o justo equilíbrio entre as necessidades de combate ao crime e o direito de defesa.
IV - Tais depoimentos devem constituir um contributo probatório de relevo (art. 16.º, al. b), da Lei 93/99, 14-07) mas não podem fundar de modo exclusivo ou decisivo uma decisão condenatória (art. 19.º, n.º 2, do mesmo diploma legal).
V - O disposto no art. 43.º, n.º 5, do CPPenal vale apenas para os casos em que o juiz é recusado ou escusado e não também para as situações em que o pedido de recusa foi julgado improcedente, ainda que a Defesa tenha optado por não inquirir testemunhas após formular o pedido de recusa, por entender que tal diligência extravasava os limites previstos no art. 45.º, n.º 2, do CPPenal quanto aos actos que ao juiz recusado é permitido praticar.
VI - O direito à imagem é um direito com dignidade e protecção constitucional, sendo distinto do direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar, ainda que possam ser sobreponíveis, pelo que qualquer restrição daquele direito deve estar prevista na lei e limitar-se ao mínimo necessário para salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
VII - Nesta perspectiva se insere e deve ser interpretado o disposto no art. 167.º, n.º 1, do CPPenal, segundo o qual as captações e reproduções de imagens por meios fotográficos, cinematográficos ou por meio de processo electrónico de imagem só podem valer como prova dos factos se não forem ilícitas, nos termos da lei penal, isto é, nos termos do disposto no art. 199.º do CPenal.
VIII - A protecção atribuída ao direito à imagem pelo art. 79.º do CCivil permite afastar a tipicidade do crime previsto no art. 199.º do CPenal, por dispensar o consentimento do visado, nos casos em que a imagem vem enquadrada na de lugares públicos ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente, desde que inequivocamente integrada nesses contextos e deles não sobressaia ou se autonomize.
IX - A circunstância de o Código de Processo Penal nunca admitir positivamente o registo de imagem, contrariamente ao que acontece com as escutas telefónicas, revela que a regra (que salvaguarda o direito com protecção constitucional) é a da total exclusão de possibilidade de registo de imagem contra a vontade do visado e não o inverso.
X - Nesta perspectiva, o facto de uma imagem ser captada com vista à sua junção a um processo penal, ainda que ocorra num espaço público, não o torna atípico, nem essa causa se apresenta necessariamente como excludente da ilicitude;
XI - Entre as causas de justificação da ilicitude do facto típico do crime de gravação e fotografias ilícitas, permitindo a sua ponderação como meio de prova (art. 167.º do CPPenal), deparamos quer com aquelas que encontram tradicional consagração no Código Penal (como a legítima defesa ou o direito de necessidade), quer com a remissão para outras disposições permissivas do Código de Processo Penal (como os arts. 147.º, n.ºs 4 a 7, e 250.º, n.º 6), quer com as autorizações legais dispersas por diplomas avulsos (como a Lei 5/2002, de 11-01, a Lei 1/2005, de 10-01, ou a Lei 135/2014, de 08-09) que permitem a captação de imagens, admitindo-se, assim, a utilização desses elementos em sede de processo penal, como válido meio de prova, desde que as imagens sejam recolhidas de acordo com as finalidades de cada um desses regimes, impondo-se sempre essa ponderação em face da legislação específica, dos interesses em confronto e da unidade do ordenamento (direito nacional e comunitário).
XII - Se a captação de imagens por sistema de videovigilância ocorre a coberto da autorização legal e das finalidades prevista em legislação avulsa e cumpre as finalidades e pressupostos substantivos da permissão legislativa para o funcionamento do sistema de videovigilância, ainda que possa evidenciar falhas formais, como [in]existência de licença da CNPD, não se pode concluir pela ilicitude das imagens enquanto meio de prova.
XIII - Tal legislação avulsa surge como causa justificante da restrição do direito à imagem (autorização legal), restrição que se em concreto passou pelo crivo da autoridade judicial, ao ser avaliada e validada a junção aos autos de fotogramas retirados de sistemas de videovigilância em fase de instrução e depois em fase de julgamento (validação judicial), permite concluir que estes meios de prova, bem como os autos de visionamento dos mesmos, constituem meio de prova válido, já que a captação de imagens e as reproduções mecânicas desta se devem ter por lícitas para efeitos do disposto no art. 167.º do CPPenal, por ter sido justificada e, por isso, excluída a sua ilicitude.
XIV - Os OPC não beneficiam de uma autorização legal genérica, irrestrita e arbitraria para captarem imagens, ainda que para fins de investigação criminal – disposição que não existe no Código de Processo Penal –, pelo que são ilícitas as restrições ao direito à imagem por si praticados se não actuam ao abrigo de disposição legal avulsa e específica que permita essa conduta e não tenham passado pelo crivo da autorização e controlo judiciais.
XV - Mesmo nestes casos de prossecução de finalidades de investigação criminal, a restrição do direito à imagem não pode deixar de ser olhada como extraordinária e sujeita a um juízo de proporcionalidade e adequação que só um magistrado judicial pode emitir, limitações que devem, no mínimo, ser idênticas às relevantes para efeitos de escutas telefónicas e sujeitas a igual formalismo.
XVI - As fotografias realizadas pelo OPC como suporte das vigilâncias levadas a cabo em fase de investigação sem autorização e controlo judicial são ilícitas, não podendo ser ponderadas como meio de prova, nos termos do disposto no art. 167.º, n.º 1, do CPPenal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 22/19.8P6PRT.P1
Tribunal de Origem: Tribunal Judicial do Porto - Juizo Central Criminal do Porto - Juiz 2
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório
No âmbito do Processo Comum Colectivo n.º 22/19.8P6PRT, a correr termos no Juízo Central Criminal do Porto, Juiz 2, foram os recorrentes julgados e condenados, por acórdão de 01-09-2020, no qual, entre o mais, pelos Juízes que compõem o Tribunal Colectivo, foi decidido:
«1. Absolver B… da prática em coautoria material de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) por referência ao NUIPC 73/19.2PBGMR.
2. Absolver B… da prática em autoria material de um crime de detenção de Arma proibida p. e p. 86º, nº 1, d) por referência ao art.º e 3º nº2 e) da Lei nº 5/2006, de 23 de fevereiro, com as alterações respetivas.
3. Absolver B… da prática em coautoria material de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) por referência ao NUIPC 542/19.4PRPRT.
4. Condenar B… da prática em coautoria e autoria material de 6 (seis) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão por cada um de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses.
5. Condenar B… da prática em coautoria e autoria material de 8 (sete) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão por cada um de 3 (três) anos.
6. Condenar B… da prática em coautoria e autoria material de 2 (dois) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão por cada um de 3 (três) anos e 4 meses.
7. Convolar 1 crime de violência depois de subtração, em coautoria material, p. e p. pelos art.ºs 203º, 204, nº2 e) 210º, 1 e 2, b) e 211, em 1 crime de furto qualificado, em coautoria material p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) e Condenar B…, na pena de prisão de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses.
8. Operar o cumulo jurídico das penas parcelares aplicadas nos termos dos artigos 77º, e 30º, nº 1 ambos do Código Penal e Condenar o arguido B… na pena de prisão única de 8 (oito) anos.
9. Condenar C… da prática em coautoria material de 4 ( quatro) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão por cada um de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses.
10. Condenar C… da prática em coautoria material de 4 ( quatro) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão por cada um de 3 (três) anos.
11. Condenar C… da prática em coautoria material de 1 crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses.
12. Condenar C… da prática em coautoria material de 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão de 4 anos.
13. Condenar C… da prática em coautoria material de 1 crime de violência depois de subtração, p. e p. pelos art.ºs 203º, 204, nº2 e) 210º, 1 e 2, b) e 211, na pena de prisão de 4 anos e 3 (três) meses.
14. Operar o cumulo jurídico das penas parcelares aplicadas nos termos dos artigos 77º, e 30º, nº 1 ambos do Código Penal e Condenar o arguido C… na pena de prisão única de 7 (sete) anos.
15. Condenar D… da prática em coautoria material de 4 (quatro) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão por cada um de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses.
16. Condenar D… da prática em coautoria material de 6 (seis) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão por cada um de 3 (três) anos.
17. Condenar D… da prática em coautoria material de 1 crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.ºs 203, 204º, nº 2 e) na pena de prisão de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses.
18. Condenar D… da prática em coautoria material de 1 crime de violência depois de subtração, p. e p. pelos art.ºs 203º, 204, nº2 e) 210º, 1 e 2, b) e 211, na pena de prisão de 4 anos e 3 (três) meses.
19. Condenar D… da prática em autoria material de 1 crime de falsificação de documento, p. e p. artº 256º, nºs 1, al. f) e 3 do Código Penal, na pena de prisão de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses.
20. Operar o cumulo jurídico das penas parcelares aplicadas nos termos dos artigos 77º, e 30º, nº 1 ambos do Código Penal e Condenar o arguido D… na pena de prisão única de 7 (sete) anos.
21. Condenar a arguida E… pela prática em autoria material de um crime de recetação, p. e p. pelo artigo 231º, nº 1, do Código Penal, por referência aos factos assentes no NUIPC 216/19.6PFMTS, na pena de 5 (cinco) anos de prisão, a qual nos termos do artigo 50º, do Código Penal é suspensa na sua execução por (5 cinco) anos.
22. Declarar perdidos a favor do Estado os instrumentos, produtos e vantagens do crime, nos termos do artigo 109º, do Código Penal e ainda artº 110º, nº 1, als. a) e b) do mesmo diploma, todos os bens/artigos, telemóveis e dinheiro apreendidos nos autos aos arguidos uma vez que constituem tanto instrumentos como produto e vantagem dos factos ilícitos por todos cometidos; já que não exerciam atividades licitas que justifique a sua posse senão a prática de crimes contra o património a que estavam dedicados, os quais sejam: 1 (uma) mala de senhora, da marca Louis Vuitton, de cor castanha - A86;1 (um) carteira de senhora, da marca Louis Vuitton, de cor castanha, ao xadrez -A87; 1 (uma) carteira de documentos, da marca Louis Vuitton, de cor preta - A88; 1 (uma) mala de senhora, da marca Louis Vuitton, de cor castanha - A89; 1 (um) guarda joias de cor castanha (com etiqueta do EI Corte Inglês) vazio - A90; 1 (um) guarda-joias de cor castanha (revestido num tecido tipo pele de cobra) A1; 26 (vinte e seis) anéis de várias formas e cores – A2, A3, A4, A6, A7, A8, A9, Al1, A12, A13, e A15 a A30; 6 (seis) fios em metal amarelo - A47 a A52; 1 (um) colar em metal de cor prateada com pedras brilhantes – A42; 1 (um) colar com pedras de cor cinzenta - A41; 6 (seis) pulseiras de várias cores e formas - A53 a A58; 2 (dois) porta-moedas em metal de cor amarela – A43; 1 (um) dedal de cor prateada – A46; 1 (um) relógio, próprio para senhora da marca "GUESS", em metal de cor amarela – A59; 1 (um) brioche em forma de flor com várias pedras de cor vermelha – A45; 1 (um) brioche em forma de grilo - A44; 10 (dez) pares de brincos de várias formas e cores - A60 a A69; 4 (quatro) brincos de várias formas e cores - A70 a A73; 3 (três) contas de Viana, em metal de cor amarela – A74; 1 (uma) esfera em metal amarelo – A75; 9 (nove) medalhas, de várias cores e formas, próprias para ostentação em fios - A76 a A84; 1 (uma) chave de cor prateada, própria para cofre - A33; 1 (uma) navalha, em metal, com o cabo de cor amarela e a lâmina de cor prateada – A37; 1 (uma) peça, correspondente ao fecho de uma bracelete, em metal de cor prateada, com pequenas pedras na sua parte superior, de várias cores, todas elas alinhadas - A31;1 (um) botão de punho em metal de cor prateada, próprio para punho de camisa - A34; 1 (um) par de botões de punho, com pérola na sua extremidade, de cor prateada - A35; 8 (oito) colares em pérolas, de várias formas e tamanhos - A39; 3 (três) colares danificados, em pérolas, de várias formas e tamanhos - A40; 3 (três) moedas estrangeiras – A36; Várias pérolas soltas, de várias cores e tamanhos - A38; 1 (uma) caixa em forma de casa – B; 1 (uma) espada com bainha acondicionada em bolsa/estojo próprio com as inscrições LT. LOUIS W. BRUGLER U. S. NAVY USS HALEAKALA AE.25. - B16; 1 (uma) taça pequena em metal de cor prateado com duas cabeças de leão na lateral – C1; 1 (uma) rosa em metal de cor prateado - C2; 1 (um) pote em metal de cor prateado com variadas saliências e com várias pedras coloridas no topo - C3;1 (uma) pequena estatueta em metal de cor prateado em forma de elefante - C4; 1 (uma) cigarreira em metal de cor prateado - C5; 1 (uma) esferográfica em metal de cor dourado da marca "PARKER" - C8; 1 (uma) lapiseira em metal de cor dourado da marca "MONTEBLANC" - C9; 1 (uma) lapiseira em metal de cor dourado da marca "CROSS" – C10; 1 (um) baú em vidro com tampa em metal de cor prateada – C11; 1 (um) baú em madeira - C12; 1 (um) par de óculos de sol da marca "MARC JACOBS" de cor preta com uma risca branca e respetiva caixa de cor preta - C14; 1 (um) par de óculos de sol da marca "Dolce Gabana" de cor preta e respetiva caixa de cor preta da marca Prada - C15; 1 (um) par de óculos de sol sem marca de cor castanha e respetiva caixa da marca Prada de cor preta – C16; 1 (um) par de óculos de sol da marca "DOLCE & GABBANA" de cor preta com partículas dourado e respetiva caixa de cor preta - C17; 1 (um) par de óculos de sol da marca "BVLGARI" de cor cinzenta e respetiva caixa de cor preta – C18; 1 (um) par de óculos de sol da marca "CHRISTIAN DIOR" de cor dourada e hastes creme e respetiva caixa de cor branca – C20; 1 (um) par de óculos de sol da marca "CHRISTIAN DIOR" de cor creme e hastes castanhas e respetiva caixa de cor branca - C21; 1 (um) par de óculos de sol da marca "DITA" com lente de cor verde e hastes douradas sem caixa - C22; 1 (uma) caixa de cor castanha própria para óculos de sol da marca "MAUI JIM", sem óculos no interior – C23;1 (um) estojo em nylon de cor preta contendo no seu interior diversas peças de ferramenta próprias para relojoaria – C24; 1 (uma) caixa em cartão de cor preta, com a inscrição "The Ear Listens", contendo no seu interior um cabo de dados USB e um aparelho de som da marca América, em forma circular – C25; 1 (um) guarda-joias, em metal de cor prateada – C26; 1 (um) anel em metal amarelo com uma mesa em metal de cor branco, com a figura de uma mulher - C27; 1 (um) anel em metal amarelo com várias pedras de várias cores - C28.2 (duas) colheres de sobremesa, em metal de cor prateada - C3l; 2 (dois) suportes, em metal amarelo, com relevos de cor preta e branca - C33; 1 (uma) caneca, em metal, de cor prateada no seu exterior e cor amarela no seu interior, com relevos – C34; 1 (um) copo em metal de cor prateada – C35; 2 (dois) copos em metal, de cor prateada no seu exterior e cor amarela no interior com respetivas bases de cor prateada – C36; 1 (um) estojo em pele da marca "MONTEBLANC" de cor preta com 2 (duas) esferográficas e 1 (uma) lapiseira de cor preta e dourado todas da marca "MONTEBLANC" - C41; 1 (uma) peça/aplique metal de cor prateado com várias pedras coloridas - C42; 1 (uma) mala de viagem, da marca "Louis Vuitton", de cor castanha – D67;1 (uma) mala de senhora, da marca "Louis Vuitton", de cor castanha - D68; 1 (uma) mala de senhora, da marca "Louis Vuitton", de cor castanha - D69; 1 (uma) mala de senhora, sem marca, de cor azul - D70; 1 (uma) mala de viagem, da marca "Louis Vuitton", de cor castanha - D71; 1 (uma) mala a tira colo, da marca "Louis Vuitton", de cor castanha - D72; 2 (duas) pulseiras em metal de cor amarelo – D11 e D12; 3 (três) anéis em metal de cor amarelo com diversas pedras - D2, D3 e D5; 1 (um) par de brincos em metal de cor branco com diversas pedras - D29; 1 (um) relógio da marca "PULSAR", Chronograph 100M, n0430116, de cor preta com pulseira em pele preta – D1; 1 (uma) mala a tira colo, da marca "Nike", de cor preta (D52) contendo no seu interior uma meia de cor preta (D51); 3 (três) anéis em metal de cor amarelo com diversas pedras - D37, D38 e D39; 2 (dois) pingentes de cor amarela com diversas pedras - D50; 2 (duas) cruzes em metal de cor amarelo - D41 e D42; 1 (um) par de brincos em metal de cor amarelo com uma pedra - D31; 1 (um) par de brincos em metal de cor amarelo com diversas pedras – 14; 1 (um) alfinete (danificado sem mola) em metal de cor branco com diversas pedras – D28; 1 (um) fio em metal de cor amarelo com um pingente em forma de laço com diversas pedras – D17; 1 (um) fio em metal de cor amarelo com uma placa com os dizeres "TM" - D20; 1 (uma) pulseira em metal de cor amarelo com vários pingentes em forma de coração – D26; 2 (dois) fios em metal de cor amarelo - D19 e D22; 3 (três) pulseiras em metal de cor amarelo - D23, D24 e D25; 2 (dois) fios finos em metal de cor amarelo - D16 e D18; 3 (três) brincos únicos em metal de cor amarelo com diversas pedras - D32, D33 e D36; 1 (um) brinco único em metal de cor amarelo - D34; 2 (dois) pingentes em metal de cor branco com diversas pedras - D43 e D44; 5 (cinco) peças danificadas de diversos objetos em metal de cor amarelo - D45 a D49; 1 (uma) mala a tira colo, da marca Gucci - D73; 1 (uma) saca em tecido do Lidl, de cor branca - D75; 1 (uma) faca em metal prateado - D66; 1 (uma) saca em plástico do Corte Inglês - D74; 1 (uma) colher para cortar bolo em metal prateado envoltos num guardanapo em tecido de cozinha; (no interior do saco Lidl) – D60; 7 (sete) facas de peixe em metal prateado - D57; 1 (um) protótipo de fechadura da marca Lock presa a um torno aparafusado a um banco – E2; 1 (uma) caixa de cor cinzenta de marca Prada - E1; 1 (uma) balança em vidro, e respetiva caixa em papel - E3; 1 (um) bolsa preta da marca Bayer, contendo no seu interior um aparelho de duas lentes tipo lupa, da marca "Luxtec" - E4; 1 (uma) caixa contendo dois recortes em plástico de forma retangular próprio para abertura de porta – E5; 1 (um) boné de cor azul, com a inscrição alusiva a Nova Iorque - E6; 1 (um) mala de cor preta e laranja da marca "Multiplaz" contendo no seu interior um conjunto de soldar, composto por caixa e pistola, e ainda um aparelho com designação de Power – E7; 1 (uma) caixa em metal de cor vermelha, contendo no seu interior vários frascos de ácido, próprios para testar metais preciosos e uma pequena lupa - E9; 1 (uma) lupa – El0; 2 (dois) ímans - E12; 3 (três) conjuntos de chaves de várias marcas - E13; 2 (dois) pedaços de esponja - E14; 1 (um) torno de cor vermelho - E15; 1 (um) paquímetro \ medidor de precisão - E16; 1 (um) pedaço de metal em forma oval com diversos tipos de medida - E17; 1 (uma) carteira da marca "Mont Blanc", de cor preto - F2; 1 (um) cartão visa do TBC Bank n° 431571400823 9608, em nome de C… – F3; 2 (dois) cartões de memória micro SD 32 GB cada - G1; 1 (uma) bolsa preta contendo um aparelho medidor de tensão arterial com um estetoscópio – H1; 1 (uma) mala da marca "Bosch", de cor verde, contendo no interior uma rebarbadora, da marca Bosch de cor verde – i1;1 (uma) mala de cor cinza, contendo no interior um berbequim a bateria, da marca "Agojama" de cor azul, seis brocas, sete chaves de fendas e respetivo carregador - i2; 1 (uma) mala da marca "Park side", de cor preta, contendo no interior um aparelho de soldar, da marca "Park side", de cor verde - i3; 1 (uma) caixa contendo várias ferramentas, de vários tipos e tamanhos - i4; 1 (uma) mala da marca "Proxxon", de cor verde, contendo no interior um aparelho de precisão da marca "Proxxon", de cor verde, respetivo carregador e várias brocas - i5; 1 (um) aparelho de precisão da marca Proxxon, de cor verde - i6; 1 (um) estojo da marca "Bosch" X54, de cor verde, contendo um jogo de acessórios para aparafusar – i7; 1 (um) saco da marca "Stanley", de cor preta, contendo duas rebarbadoras da marca Bosch, de cor azul e quatro discos abrasivos – i8; 1 (um) esmeril, da marca "Cevik", de cor vermelha, modelo …/… - i9; 1 (um) torno da marca "Stanley", de cor amarela - il0; 1 (uma) caixa em madeira (própria para vinho do Porto) - i11;1 (uma) folha de lixa P80 - i12; 12 (doze) lâminas de cortar metal, da marca" Bosch" - i13; 4 (quatro) lâminas de corte, da marca "Craft Omat" - i14; 4 (quatro) lâminas de cortar metal, da marca "Wolfcraft" – i15; 1 (uma) gazua, em forma de "L" - i16; 1 (um) kit de massa de moldar, alusivo ao "Jurassic Worldi' - i17; 2 (dois) conjuntos de peças metálicas de cor amarela destinados à proteção de fechaduras de portas de residências - J5; 1 (um) frasco de perfume usado, de marca "Dolce & Gabana (J7) e 1 (um) frasco de Perfume usado de marca "Yves Saint Laurent" (J6). 1 (uma) mala de transporte de computadores portáteis de cor preta, de marca "Tucano" – J9; 1 (um) polo de cor vermelha, tamanho "XL", de marca "Ralph Laurent" ainda com a respetiva etiqueta – J10; 1 (uma) mala de transporte de computadores portáteis de cor preta, de marca desconhecida – J11; 1 (uma) chave de fendas com cabo de cores preta e amarela, de marca "Wiha", com medidas 2,0x12,0x200 – J12; 1 (um) alicate com cabos de cor vermelha, de marca "Knipex" – J13; 2 (duas) caixas de charutos de marca "Monte Cristo" (nº 4), uma delas fechada e selada e a outra aberta contendo apenas 4 (quatro) charutos – J14; 1 (uma) caixa de charutos de marca "Monte Cristo" (puritos) – J15; 1 (uma) caixa de charutos de marca "Partagas" – J16; 1 (um) martelo com cabo de cores cinzenta e laranja, de marca "Ferry cor" – J17; 1 (uma) raquete de tenis, de cor azul, de marca "head" MODELO "PCT TLSonic" e a respetiva bolsa de transporte de cor preta - J8; 9 (nove) chapéus de pala, estilo Cap - J23 a J31; 1 (um) frasco de perfume (usado) de marca "Christian Lacroix" - J19; 1 (um) frasco de perfume (usado) de marca "Coach New York" - J20; 1 (um) medalha em metal amarelo com a inscrição "se feliz" e - J2; 1 (um) leque em madeira e a respetiva bolsa de transporte de cor rosa - J18; 1 (um) par de óculos sem marca cor castanha – K2; 1 (uma) caixa de óculos da marca Prada - K3; 1 (um) par de óculos da marca MIU MIU - K4; 1 (um) par de óculos da marca Rayban e respetiva caixa de cor castanha - K5; 1 (um) par de óculos da marca GUCCI e bolsa da marca Chillibeans castanha – K6; 1 (uma) caixa de óculo marca Persol cor preta - K7; 1 (um) par de óculos da marca Dior e respetiva bolsa cinzenta - K8; 1 (um) par de óculos marca Michael Kors e caixa da marca Roberto Cavalli preta - K9; 1 (um) par de óculos marca Rayban com estojo da marca Multiópticas azul- Kl0; 1 (um) par de óculos da marca Marc Jacobs sem caixa – K11; 1 (um) par de óculos da marca Emporio Arnani com respetiva bolsa - Kl2; 1 (um) par de óculos da marca Emporio Armani sem bolsa – K14; 1 (um) par de óculos sem marca de cor preta e respetiva caixa da marca Chillibeans castanha – K15; 1 (uma) bolsa de óculos marca Chillibeans cor Castanha - K16; 1 (um) par de óculos marca Chillibeans com respetiva bolsa - K17; 1 (um) par de óculos marca Brazilian numa bolsa da marca Rayban preta - K18; 1 (um) bolsa de óculos de cor preta da marca NAU - K19; 1 (uma) caixa de óculos da marca Prada cor Cinza - K20; 1 (uma) medalha em metal amarelo- K23; 1 (um) guarda jóias - K21; 1 (uma) máquina Fotográfica marca Canon, modelo EOS700D, sem numero de serie visível, com lente EFS 18-135mm nº 4142022191, com mochila e carregador – K32; 6 (seis) elefantes de várias formas e cores - K25 a K30; 1 (uma) Tartaruga em metal amarelo - K24; 1 (um) relógio marca "Huawei" - K31; 1 (uma) carteira em pele de cor preta da Camel Active – L1; 1 (uma) carteira em pele de cor preta da marca Roncato - L5; 1 (um) par de óculos da marca Chillibeans danificados - L8; 1 (uma) carteira e pele de cor preta da marca Guy Laroche - L9; Dos vários cartões excecionando os que têm identificação válida que são a entregar ao seu dono, e papéis - L11; 1 (uma) carta de condução (n° 4216598821) em nome de N… os quais por falsos devem ser inultizados- L12; 1 (um) cartão de cidadão (DK088 1990) em nome de N… - L12; 1 (um) relógio da marca Ferrari, modelo Geneve 250, de cor vermelho – M8; 1 (um) relógio da marca Police, modelo Timepieces, com o n° 12416J, de cor preta – M10; 1 (um) relógio marca Vacheron Constantin 18K, com o n" 30020, com o mostrador de cor preta – M11; 1 (um) relógio da marca A. Lange&Sohne, Glashutte, com o n° 4/500 132004, com o mostrador de cor preta - M9; 1 (um) relógio da marca Diesel, com o n° DZ-1116C25l 007, com mostrador de cor preta – M1; 1 (um) relógio da marca Cartier, n° F-6668, com o mostrador de cor clara – M7; 1 (um) relógio da marca Timberland, modelo Indiglo, com o n° 75021G com mostrador de cor cinza – M2; 1 (um) relógio da marca Smimoff, com o mostrador de cor preta - M6; 1 (um) relógio da marca Raymond Weil, com o n° 8000 A948870, com o mostrador de cor amarela – M4; 1 (um) relógio da marca Bulgari, com o mostrador de cor branca - M3; 1 (um) relógio da marca Parfois, com o mostrador de cor dourada - M5; 1 (uma) pulseira de pérolas de cor branca, com uma mesa em metal amarelo e uma pedra de cor preta – M40; 1 (um) par de brincos em metal amarelo, denominados brincos de Viana - M46; 1 (uma) medalha em metal amarelo com motivo em forma de avião e um planisfério - M53; 1 (um) par de brincos de cor prata, da marca United Colors of Benneton, em forma de espiral – M48; 1 (uma) pulseira em metal amarelo com várias pérolas de vários tamanhos e cores (lilás, verde e beje) - M41; 1 (uma) aliança em metal prateado, com a inscrição Hilário 12-01-952 – M56; 1 (um) anel de cor prateada, com vários símbolos e cores (predominantemente verde e amarelo) – M49; 1 (um) fio em metal amarelo, com várias bolas da mesma cor, contendo no seu interior pérolas - M43, 1 (um) fio de cor prateada, com a inscrição Italy – M44; 1 (um) fio de cor prateada com duas argolas unidas -M45; 1 (um) crucifixo de cor prateada - M55; 1 (um) par de brincos de cor prateada em forma de L - M51; 2 (dois) anéis de cor prateada com várias pedras - M47; 1 (um) pendente de cor prateada com vários brilhantes e uma pedra de cor Cinza escura – M50; 1 (um) fio em metal de cor prateada com um pendente da mesma cor com uma pedra incrustada de cor branca – M57; 1 (um) brioche de cor prateada, com uma flor incrustada numa pedra de cor preta – M52; 1 (um) brioche de cor prateada, com uma pedra de cor preta – M54; 1 (um) relógio da marca Timex Essentials, com mostrador de cor branca -M42; 1 (um) relógio da marca Swatch, com o mostrador de cor cinzenta -M59;1 (uma) medalha de cor prateada, com duas figuras humanas -M58; 1 (um) fio de cor prateada com motivo em forma de infinito -M37; 1 (um) par de brincos de cor prateada e amarela com uma pedra de cor bege -M38; 12 (doze) brincos de várias formas, sem os respetivos pares, de vários tipos de metal (amarelo e preto) – M16 a M27; 1 (um) par de óculos de sol da marca Dolce & Gabana e respetiva caixa próprios para senhora – M39; 1 (um) porta lápis em couro de cor castanho -M60; 1 (urna) caixa em papelão, com o símbolo dos correios de Portugal – M61; 1 (uma) embalagem de grão-de-bico da marca Aliada -M62; 1 (uma) lata de grão-de-bico da marca Compal - M63; 2 (duas) embalagens de café moído da marca Delta - M64; 1 (um) relógio AUDEMARS PIGUET nº E96635 - em más condições - N4; 1 (um) relógio SWATCH IRONY - usado - N7; 1 (um) relógio MICHAL KORS PRATEADO, N°251307 - Usado - N6; 1 (um) relógio FESTINA CHRONOGRAM ALARM n° 6202, fundo preto – usado –N1; 1 (um) relógio FESTINA CHRONOGRAPH ALARM, fundo castanho, n06202 - usado – N2; 1 (um) relógio CITIZEN QUARTZ - 6010-Y56449 SA 9050913 02 QD2424 - Usado - N5; 1 (um) relógio BELL & ROSS - BR03-92-s-20843 - Usado - N3; 1 (uma) chave de fendas com cabo vermelho - O6; 1 (uma) medalha em metal amarelo - O4; 1 (um) par de óculos da marca NAU, de cor castanha – O7; 1 (uma) caneta da marca Montblanc de cor preta – O8; 5 (cinco) ímans escondidos na ótica traseira do lado esquerdo - O3, não tendo os arguidos contribuído para infirmar este juízo, pela apresentação de documentação – guia ou fatura, justificativa da sua titularidade. Acresce o veículo automóvel de matrícula estrangeira .. …..- Fiat …, que foi empregue na execução dos crimes de furto qualificado nos moldes descritos neste despacho, ao longo deste período de tempo, não podendo deixar de ser instrumento do crime, pelos arguidos utilizado, pois que a sua restituição daria azo ao seu uso por arguidos ainda não julgados na prática de outros crimes, ressalvada a possibilidade comprovada e não apenas presumida de ser de terceiro, alheio a esta prática criminosa. Quanto à arma apreendida: 1 uma navalha ponta e mola, com cabo de cor preta com o comprimento total de 22 cm, dos quais 9,9 cm constituem a lâmina que estava guardada dentro de uma caixa em cartão de cor preta – cfr. exame pericial do Núcleo de Armas e Explosivos da P.S.P. é a mesma declarada perdida a favor do Estado, de harmonia com o disposto no artº 109º, nº 1 do C.P. e 94º, nº 1 da Lei 5/2006 de 23/2.
23. Determina-se nos termos do artigo 186º, do CPP a restituição e de tudo lavrando termo, à ofendida F…, das colheres por esta reconhecidas e ainda não entregues. E ainda de 1 (um) cartão da BP nº …………….. - L3; 1 (um) cartão Maestro nº ………,.. em nome de B…. - L3; 1 (um) documento estrangeiro - L4;1 (um) cartão do Holmes Place nº ………… em nome de C… - L6. As viaturas automóveis apreendidas, com matrícula ..-….., da marca Mercedes-Benz, classe E e o veículo Mercedes, Modelo … – cor, cinzento, matrícula .. … ... com os respetivos documentos e chaves, a quem de direito, por isso a quem demonstre ter a situação por referência aos mesmos regularizada. Devendo para tal ser notificados para em 60 dias procederem ao seu levantamento, findo o qual passam a suportar os custos do seu depósito, e ao fim de 90 dias, identificados que estão os objetos e prazo de levantamento, com a cominação de não o fazendo que aqueles serão perdidos, a favor do Estado, no prazo legal a contar da notificação.
24.Julgar parcialmente por provados os pedidos cíveis nestes autos impetrados e por via do que:
a) Condenar solidariamente B…, C… e D…, a pagar a titulo de danos patrimoniais a G… e H…, (NUIPC 417/19.7PAVCD), o valor de 17.120,00€, absolvendo todos os arguidos sob julgamento do remanescente do pedido.
b) Condenar solidariamente B… e D…, a pagar a titulo de danos patrimoniais o valor de 8. 375€ acrescido de juros desde a data da notificação do pedido cível, até efetivo e integral pagamento e não patrimoniais no valor de 1.500, acrescida de juros a partir desta decisão, aos demandantes I… e J…, (NUIPC 560/19.2 PPPRT Apenso I) até efetivo e integral pagamento, absolvendo do remanescente do pedido.
25.Condenar cada um dos arguidos, nas custas criminais do processo, fixando em 4 UC de Taxa de Justiça, ficando a cargo destes os demais encargos a que a sua atividade deu causa, dando pagamento dos encargos referentes a perícias e relatórios que ainda não se mostrem com as faturas por pagar, devendo o pagamento ser considerado para efeitos de pagamento antecipado do processo (cfr. arts. 3.º, n.º 1, 8.º, n.º 9, 19.º, do RCP e Tabela III do mesmo, 2.º, n.º 3, n.º 4, da Portaria n.º 175/2011, de 28 de abril e 513.º, n.º 1 e n.º 2 e 514.º, n.º 1, do C.P.P.), sendo que as custas cíveis são a suportar na proporção do decaimento entre demandantes e demandados, respetivamente.»
*
Inconformados, os arguidos B…, C…, D… e E… interpuseram recurso do acórdão final, apresentando como fundamento do mesmo as seguintes questões:
«i) Nulidade Decorrente da Violação do Disposto nos artigos 167º e 188º, n.º 1 e 4 do C. P. Penal;
ii) Ilegalidade da Prova;
iii) Erro Notório na Apreciação da Prova – Artigo 412º do C. P. Penal;
iv) Nulidade do Reconhecimento de Objetos, pretensamente furtados, por parte dos Ofendidos;
v) Erro de Julgamento - nº 1 do artigo 410º do C. P. Penal;
vi) Da Medida da Pena Aplicada à Arguida E….»
Terminaram o recurso com a enunciação das seguintes conclusões da motivação (transcrição[1]):
«A) O presente recurso vem interposto do Acórdão proferido nos autos em referência, que condenou os ora Recorrentes, B…, pela prática de 16 crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º e 204º, nº2, al. e) do C. Penal, na pena única, de pena de 8 (oito) anos de prisão; C…, pela prática de 10 crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º e 204º, nº2, al. e) do C. Penal e 1 crime de violência depois de subtração, p.e.p. pelos artigos 203º, 204º, n.º 2, al. e), 210º, n.º 1 e 2, al. b) e 211º do Código Penal, na pena única de 7 (sete) anos de prisão; D…, pela prática de 11 crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º e 204º, nº2, al. e) do C. Penal, 1 crime de violência depois de subtração, p.e.p. pelos artigos 203º, 204º, n.º 2, al. e), 210º, n.º 1 e 2, al. b) e 211º e 1 crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256º, n.º 1, al. f) e n.º 3 do Código Penal, na pena única de 7 (sete) anos de prisão e E…, pela prática de 1 crime de receptação, p. e p. pelo artigo 231º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na execução por 5 (cinco) anos de prisão.
B Da Nulidade Decorrente da Violação do Disposto no artigo 167º e 188º, n.º 1 e 4 do C. P. Penal:
C) Como forma de garantir a defesa dos direitos, liberdades e garantias, a Constituição da República Portuguesa impõe limites à validade dos meios de prova e, na sequência dessas disposições constitucionais, a lei, no artigo 126°, n.º 3 do C. P.Penal, estabelece que: “Ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular.”
D) Por outro lado, consagra o artigo 260º da Constituição da República Portuguesa o direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada, estando no direito à imagem, implícito, designadamente, o direito de cada um a não ser fotografado ou filmado sem o seu consentimento.
E) O artigo 167º do C. P. Penal faz depender a validade da prova produzida por reproduções mecânicas da sua não ilicitude face ao disposto na lei penal, fazendo depender a sua legalidade dos requisitos consignados para os métodos de obtenção de provas, designadamente, das escutas telefónicas,
F) Razão, pela qual, não tendo a recolha de imagens dos Arguidos sido previamente autorizada por despacho do Senhor Juiz de Instrução, nem tendo sido validadas, “a posteriori”, pelo Senhor Juiz de Instrução, são nulas, não podendo ser consideradas como prova relevante nos presentes autos.
G) É o que decorre do disposto, conjugadamente, nos artigos 167º, 188º, n.º 4 e 190º do C. P. Penal.
H) Neste sentido, o Tribunal da Relação de Lisboa, pelo seu douto Acórdão de 3 de Maio de 2006, publicado em www.dgsi.pt, decidiu que: «I - São provas nulas as imagens de vídeo obtidas sem o consentimento ou conhecimento do arguido, através de câmara oculta colocada pelo assistente no seu estabelecimento de gelataria, [2] e que é o local de trabalho do arguido, e sem que estivesse afixada informação sobre a existência de meios de videovigilância e qual a sua finalidade – artºs 118º nº 3, 126º, 167º nº 1 do C.P.P., D.L. nº 267/93 de 10/8, Lei nº 67/98 de 26/10, D.L. nº 231/98 de 22/7, D.L. 263/01 de 28/9 e artºs 18º, 26º nº 1 e 32º nº 8 da C.R.P.
II – Arrolados tais meios de prova na acusação pública por crime de furto e valorados em audiência, onde foram visionadas as imagens de vídeo, é nulo todo o processado desde a acusação, inclusivé, e ulteriores termos do processo – artº 122º nº1 do C.P.P. [3].»
I) Também pelo seu Acórdão de 22-09-2009, publicado em www.dgsi.pt e citado na motivação do presente recurso, o Tribunal da Relação de Lisboa, decidiu no mesmo sentido.
J) A recolha de imagens dos Arguidos constantes dos autos de vigilância juntos a fls. 1 a 80 e 150 a 168 do Apenso A não foi previamente autorizada por despacho do Senhor Juiz de Instrução, o que tem como consequência, a nulidade de tal recolha de imagens.
K) O mesmo se diga, relativamente, ao auto de visionamento constante do Anexo A, de fls. 81 a 146 e 185 a 192, porque a recolha das imagens foi feita na via pública e não no interior do estabelecimento.
L) É o que decorre do disposto, conjugadamente, nos artigos 188º, n.º 4 e 190º do C. P. Penal.
M) Finalmente, também os fotogramas constantes de fls. 171 a 182 do Apenso A, estão feridos de nulidade, por violação do disposto nos artigos 188º, n.º 4 e 190º do C. P. Penal, no artigo 19º da Lei 58/2019 de 8 de Agosto e no artigo 31º da Lei n.º 34/2013, de 16 de Maio.
N) Decorre dos artigos 188º, n.º 4 e 190º do C. P. Penal, no artigo 19º da Lei 58/2019 de 8 de Agosto e no artigo 31º da Lei n.º 34/2013, de 16 de Maio, que as imagens recolhidas e gravadas por câmara de videovigilância não licenciadas não poderão ser consideradas provas licitas e válidas em processo penal.
O) O sistema de videovigilância instalado no interior de um estabelecimento carece de prévia autorização da CNPD e tem de obedecer aos requisitos estabelecidos nos n.ºs 18º, 19º, 20º e 21º da Lei n.º 58/2019 de 8 de Agosto.
P) Nenhuma informação existe nos autos quanto ao cumprimento de tais requisitos, razão, pela qual, é nula tal recolha de imagens dos Arguidos que, assim, não podem ser consideradas como prova relevante nos presentes autos
Q) E não existe tal informação nos autos, porque o Tribunal, não obstante ter sido requerido pela defesa dos arguidos, que o Tribunal indagasse se tais requisitos se verificaram, o mesmo, pelo seu despacho proferido na sessão da audiência de julgamento de 9 de Julho de 2020, com a referência 415858659, entendeu que tal recolha de imagens era legal e válida, independentemente de tais requisitos se terem verificado ou não.
R) O Tribunal “a quo”, com efeito, seguiu a tese de que, no caso dos crimes investigados nos presentes autos, tais formalidades não se aplicam, isto é, nos presentes autos, não estando em causa os chamados “crimes de catálogo”, não é necessária a autorização e validação das imagens por um juiz.
S) Para além disso, entendeu o Tribunal recorrido que são licitas as “fotografias obtidas por camaras fotográficas, utilizadas pela autoridade policial no âmbito das suas atribuições (cf. Art.º 55º, do CPP) isto é, em diligências de investigação e prevenção de criminalidade na via pública ou quase pública e que possam constituir um complemento da uma vigilância policial, na investigação de criminalidade participada, em vias de acontecer, em investigação, como a criminalidade patrimonial de furtos no interior de residências, onde o bem jurídico e a segurança e tranquilidade social, são colocados em perigo, pelas atuações de agentes destes crimes, que cumprirá identificar para vir a repor a vigilância de normas violadas, revestindo a utilização destes meios auxiliares da diligência rainha – a vigilância – interesse público para auxiliar a ilustrar a identidade e modo de atuação dos agentes de quem possa ter colocado em perigo aqueles interesses públicos, da vida em sociedade.»
T) Salvo o devido respeito, tal entendimento é absolutamente peregrino, pois que, se a lei, relativamente à investigação de crimes mais graves do que aqueles que estão em causa nos presentes autos, exige para que a recolha de imagens seja válida, que se verifiquem os referidos requisitos, para a investigação de crimes menos graves não pode prescindir da verificação de tais requisitos para que a recolha de imagens possa ser considerada válida.
U) Ou seja: se para os chamados crimes de “catálogo” é necessária a autorização e validação do juiz de instrução criminal (para o mais), também para os crimes menos graves (para o menos) o cumprimento de tal validação será necessária sempre que tal recolha de imagens seja feita na via pública,
V) Razão, pela qual: «Arrolados tais meios de prova na acusação pública por crime de furto e valorados em audiência, onde foram visionadas as imagens de vídeo, é nulo todo o processado desde a acusação, inclusivé, e ulteriores termos do processo – artº 122º nº1 do C.P.P» - Cfr. acórdão supra citado no n.º 3 do presente recurso.
W) Nulidade que se arguiu tempestivamente e que ora se argui, novamente, para todos os efeitos legais.
X) Da Ilegalidade da Prova Produzida:
Y) O despacho, com a referência 415818488, do Tribunal “a quo” que admitiu a inquirição das sete testemunhas, agentes da PSP, cuja identidade não foi revelada pela testemunha AE…, com ocultação de imagem e de identidade, constituiu uma flagrante e despudorada violação do disposto nos artigos 138º, n.º 3, 139º, n.º 2 “a contrario” do C. P. Penal, no artigo 16º, al. a) da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho e no artigo 32º, n.º 5 da C. R.P.
Z) Vejamos: «A protecção de testemunhas e de outros intervenientes no processo contra forma de ameaça, pressão ou intimidação, nomeadamente nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, é regulada em lei especial.» - Cfr. artigo 139º, n.º 2 do C. P. Penal.
AA) Os crimes em causa nos presentes autos são crimes de furto, de violência depois de subtração, de receptação e falsificação de documentos, os quais dizem respeito a crimes contra a propriedade, crimes contra direitos patrimoniais e crimes de falsificação.
BB) Ou seja: nos autos não estão em causa nenhum dos crimes enunciados na al. a) do artigo 16º da Lei 93/99 de 14/07,
CC) Razão, pela qual, a valoração do depoimento prestado por tais testemunhas é proibida por lei, por violar o disposto, conjugadamente, nos artigos 138º, n.º 3, 139º, n.º 2 “a contrario” do C. P. Penal, no artigo 16º, al. a) da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho e no artigo 32º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa,
DD) Razão, pela qual, é inconstitucional, materialmente, por violar o disposto em tal preceito constitucional, que consagra a estrutura acusatória do processo penal de que decorre o princípio do contraditório.
EE) O acórdão recorrido sofre do vício do erro notório na apreciação da prova.
FF) Com efeito, o Tribunal recorrido fez meras presunções de facto que não se mostram minimamente fundamentadas, ao concluir como concluiu, que os artigos apreendidos são «produto de crimes contra o património – apesar de não se ter logrado identificar os seus proprietários (que se viram desapossados contra sua vontade ) – levados a cabo pelo arguido B… e que a arguida E… quis receber e escoar para a Ucrânia …», o Tribunal “a quo” violou o princípio do “in dubio pro reo”, extravasando claramente os limites do chamado principio da livre apreciação da prova, consignado no artigo 127º do C. P. Penal que, assim violou,
GG) O que claramente decorre da simples leitura do acórdão recorrido sem necessidade de, para chegar a tal conclusão, ter em conta os depoimentos prestados nos autos.
HH) Verifica-se assim que o Tribunal “a quo”, na elaboração do acórdão recorrido, incorreu na prática do vício de erro notório na apreciação da prova, o qual se arguiu, desde já, cumprindo o disposto no artigo 410º, n.º 2, al. c) do C. P. Penal, o qual, a ser julgado provado e procedente como se espera, deverá levar esse Venerando Tribunal a decretar a nulidade do acórdão recorrido.
II) Sem conceder: Nulidade do Reconhecimento de Objectos, pretensamente Furtados, por Parte dos Ofendido.
JJ) Dispõem os artigos 148º, n.ºs 1, 2 e 3 e 147º, n.ºs 1, 2 e 4, quais as formalidades e requisitos que devem ser observados no reconhecimento de objectos.
KK) No caso do processo em referência e conforme resulta da literalidade dos próprios autos de reconhecimento dos objectos pretensamente furtados, tais requisitos não foram observados, como de seguida, na Parte iii) do presente recurso que versa sobre o “Erro no Julgamento” se demonstrará caso a caso, ou seja, relativamente a cada um dos crimes, cuja prática foi dada como provada.
LL) Do Erro de Julgamento:
MM) Antes de se passar a analisar o julgamento de facto feito pelo Tribunal “a quo”, relativamente a cada um dos factos importará ter presente o seguinte: a Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, hoje, largamente pacífica, aponta no sentido de que os elementos de prova devem ser produzidos diante do Acusado em audiência pública, tendo em vista a possibilidade do exercício do contraditório, o que deverá determinar a não admissão de depoimentos indirectos, princípio esse estruturante da produção de prova, consagrado no artigo 129º do C. P. Penal.
NN) Por outro lado, e segundo dispõe o artigo 127º do C. P. Penal, “a prova é apreciada segundo as regras de experiência e a livre convicção da entidade competente.”
OO) Sendo a apreciação da prova discricionária, o certo é que tal discricionariedade tem limites que não podem ser ultrapassados, já que a liberdade de apreciação da prova é uma liberdade condicionada pelo dever de perseguir a chamada “verdade material.”
PP) Ora, da matéria de facto provada, o Tribunal “a quo” errou na apreciação da prova, tendo, erradamente, dado como provados os factos indicados nos n.ºs 1, 2, 3, 4 e 5, designadamente, quanto aos NUIPC 30/19.9PRPRT, 73/19.2PBGMR, 514/19.9PBBRG, 981/19.0PBMTS, 315/19.4SJPRT, 365/19.0PWPRT, 512/19.2PAPVZ, 677/19.3PTLSB, 455/19.0PWPRT, 560/19.2PPPRT e 216/19.6PFMTS,
QQ) Incorrendo em erro no julgamento da matéria de facto, porque, do conjunto da prova produzida e atentas as regras da experiência comum, tal não deveria ter acontecido.
RR) O Tribunal “a quo” deu como provados os seguintes factos, que não reportou a qualquer Apenso, os factos indicados no n.º 1 a 5 do acórdão recorrido.
SS) Relativamente ao NUIPC 30/19.9PRPRT (Apenso O), deu como provados os seguintes factos: “No dia 6 de janeiro de 2019, entre as 14:30 e as 16.30 horas, dirigiram-se os arguidos B…, e D… à residência da ofendida K…, sita na Rua…, n.º …, …, Hab. … – Porto. Aí situados, após terem forçado e estroncado a fechadura da porta de entrada da residência acederam ao seu interior, percorrendo-o. Daí retiraram e levaram consigo(…)” os bens descritos em tal Acórdão,
TT) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, alínea a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto aos ora Recorrentes B… e D…, pelas seguintes razões:
UU) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 30/19.9PRPRT, o Tribunal “a quo” valorou o depoimento da ofendida K… e do Agente Principal L… “que foi responsável pela recolha, tratamento, visualização dos CD´S de camaras de videovigilâncias instaladas em prédios nas imediações e/ou contiguas das residências assaltadas, que a DIC-PSP, Porto, recolhia através do SEI…”
VV) Na fundamentação da sua decisão, o Tribunal “a quo” refere que: «Ora, o Agente Principal L…, após ter intervindo em vigilâncias aos arguidos, passou a poder identifica-los, pelo que, efetuou o visionamento dos DVD´s das camaras de videovigilâncias dos prédios vizinhos, do prédio onde se situa o apartamento da ofendida e cujas imagens estavam preservadas, como havia sido determinada por OPC ao abrigo do artigo 55º C.P.Penal, por referência a este NUIPCA 30/19.9PRPRT (Apenso O)…»
WW) Curiosamente: os factos reportam-se a 6 de Janeiro de 2019, tendo o Agente Principal, L…, iniciado as vigilâncias aos Arguidos em Fevereiro de 2019 e só após 8 meses, já depois das detenções dos Arguidos, visionou os CD´s de camaras de videovigilância instalada num estabelecimento comercial.
XX) Resulta do visionamento dos CD´s de 30.09.2019 que: “pelas 15:54:40 visualizam-se os arguidos B… e D… ou M… ou N… a circularem da direita para a esquerda, e pelas 15:57:19 da esquerda para a direita, já em direcção à residência alvo de furto, conforma fotogramas extraídos e constantes na reportagem fotográfica de fls. 25 a 30 deste apenso”Cfr. fls. 52 do Apenso O.
YY) Segundo referiu a ofendida, cujo depoimento se encontra gravado em ficheiro áudio 20200625111521_15719407_2871446, aos minutos 07:40 a 07:47, sessão de audiência de julgamento do dia 25 de Junho de 2020, saiu de casa por volta das 14:30, do dia 6 de janeiro de 2019, tendo estado ausente cerca de 1h /1h30, logo chegou a casa por volta das 16h.
ZZ) Se, no referido dia, os Arguidos, ora Recorrentes, circulassem na rua onde vive a ofendida, “pelas 15:57:19 da esquerda para a direita, já em direcção à residência alvo de furto”, tendo a ofendida chegado a casa por volta das 16h, o furto teria que ser realizado em menos de 3 minutos, o que é manifestamente insuficiente para concretizar os factos provados a pag.s 17 e 18 do Acórdão recorrido.
AAA) Por outro lado: tendo os Arguidos circulado, “pelas 15:57:19 da esquerda para a direita, já em direcção à residência alvo de furto”, após o “suposto” furto, teriam de ter passado em sentido contrário, da direita para a esquerda, o que, também não pode ter sucedido, porque tal não foi registado pela câmara,
BBB) Razão, pela qual, na falta de outra prova, em nome do princípio do “in dubio pro reo”, mal andou o Tribunal “a quo” ao condenar os Arguidos B… e D…, pela prática deste crime de furto qualificado, devendo, ao invés, tê-los absolvido.
CCC) Relativamente ao NUIPC 73/19.2PBGMR (Apenso S), deu como provado os seguintes factos: “No dia 24 de janeiro de 2019, cerca das 14:30 horas, C… e indivíduos não identificados dirigiram-se à residência da ofendida O…, sita na Avenida…, …, …. - Guimarães. Aí situados, de modo não concretamente apurado, sem causar quaisquer danos na fechadura, lograram abrir a porta que estava fechada à chave, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o. Daí retiraram e levaram consigo(…)” os bens descritos em tal Acórdão,
DDD) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
EEE) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 73/19.2PBGMR (Apenso S), o Tribunal “a quo” valorou o depoimento da ofendida, O… e do Agente Principal L… na parte em que visionou o DVD da camara de videovigilância situado no estabelecimento comercial denominado “P…”,
FFF) Tendo validado, sem reservas, o reconhecimento dos objectos, realizado pela ofendida.
GGG) Com efeito: em audiência de julgamento - sessão do dia 29 de Junho de 2020 - a ofendida, cujo depoimento se encontra gravado em ficheiro áudio n.º 20200629103704_15719407_2871446 referiu, aos minutos 09:15 a 28:30, que: «… já pelo telefone, tinham-me adiantado … o que eu teria de fazer. Quando lá cheguei-me falei com ele pessoalmente mostrou um conjunto de fotografias e objectos que estavam lá disponibilizados para identificar … foram fotografias no computador e objectos pessoais na hora …os objectos estavam numa sala … estavam dispostos num conjunto de várias mesas … … reconheci dois objectos, reconheci só dois …. Um deles por fotografia e outro estava disposto como mostrou … na mesa …que foi uns óculos de sol… …A fotografia de uma mala Burberry no computador … e o agente foi busca-la e eu reconheci-a...Eu reconheci o saco porque tinha uma carteira dentro do próprio saco transparente e os fechos … um deles não tinha a peça em pele …(24:44) … disse que eram objectos roubados para eu identificar de entre todos seu eu reconhecia algum que era meu …, muitas fotografias no computador …. mais de 50 …ordenadas por temas …vi os óculos na fotografia e depois expostos e depois ele foi buscar os dois …”
HHH) Apesar da ofendida ter confirmado o auto de reconhecimento de fls. 560 e 561 dos autos principais, depois de questionada pela Senhora Juiz Presidente do Colectivo, a verdade é que, o teor de tal documento, não reflete, ainda que minimamente, o que descreveu em Tribunal.
III) No auto de reconhecimento de objectos de fls. 560 e 561 nada é referido quanto ao reconhecimento feito por computador, antes se refere expressamente que, “juntaram-se vários objetos a reconhecer por terem com ele a maior número de semelhanças possíveis”,
JJJ) O que, das declarações da ofendida, resulta que não aconteceu, tendo a ofendida sido confrontada apenas com os objectos apreendidos e nada mais.
KKK) Ora, atento o disposto, conjugadamente nos n.ºs 2 e 3 do artigo 148º e no n.º 7 do artigo 147º do C. P. Penal, tal reconhecimento é nulo, não tendo valor como meio de prova.
LLL) O Tribunal “a quo” fundamentou a sua decisão de condenar o Arguido C… pela prática deste crime de furto qualificado no reconhecimento dos objectos apreendidos em casa dos arguidos C…, B… e E… e no depoimento do Agente Principal L… que visionou as imagens de videovigilância, o qual, é um depoimento indirecto que resulta da leitura que este Agente Principal faz do visionamento dos CD´s e nada mais!.
MMM) Ora, não pode deixar de se realçar que, os factos reportam-se a 24 de Janeiro de 2019, tendo o Agente Principal, L…, iniciado as vigilâncias aos Arguidos em Fevereiro de 2019, mas só passados 9 meses do inicio da investigação e já depois da detenção dos Arguidos visionou, em 02-10-2019, os CD´s de camaras de videovigilância instalada num estabelecimento comercial.
NNN) Desse seu visionamento dos CD´s, em 02.10.2019, resulta que: “- Pelas 14:31:02 visualiza-se o arguido C… e um INI a passarem junto da entrada do prédio onde se situa a residência alvo de furto, olhando o C… para a porta de entrada (fotogramas 1 a 5 da reportagem fotográfica que se segue); - Pelas 15:08:29 o arguido C… surge ao telemóvel em direcção à porta de entrada do prédio da residência (fotogramas 6 a 8 da reportagem fotográfica que se segue);- Pelas 15:10:03 visualiza-se o arguido C… a passar novamente junto da entrada do prédio da residência (fotogramas 9 e 10 da reportagem fotográfica que se segue) (…)
OOO) Vejamos, a ofendida em audiência de julgamento, cujo depoimento se encontra gravado em ficheiro áudio n.º 20200629103704_15719407_2871446, sessão de julgamento de 29 de Junho de 2020, referiu, aos minutos 01:19 a 02:49, que saiu de casa por volta das 15 horas e que fechou a porta às chaves,
PPP) Sendo certo que, da lista de bens subtraídos – cfr. fls. 26 a 32 do Apenso S - para além das peças em ouro, foram furtados óculos, relógios, malas, carteiras, mochilas, etc..
QQQ) Mesmo admitindo que o individuo, referenciado como sendo o Arguido, ora Recorrente, C…, foi visto pela última vez, pelas 15:10:03, a seguir o sentido oposto ao da residência da ofendida,
RRR) Significa que, o furto terá acontecido em apenas 10 minutos depois da ofendida ter saído de casa,
SSS) Tendo, para além disso, passado com as mãos nos bolsos, sem transportar consigo qualquer mala, saco de viagem, mochila ou carteira.
TTT) Ou seja: resulta das imagens que o Arguido não transportava o saco de viagem marca Burberry de cor preta (letra A85), nem o par de óculos de sol marca “Christian Dior” e respectiva caixa - Cfr fotogramas 9 e 10 – que foram reconhecidos pela ofendida,
UUU) Razão, pela qual, da análise critica da prova não se pode extrair, com a certeza que é exigida nesta fase processual, que foi o Arguido C… quem praticou este furto.
VVV) Com efeito, o julgador é livre, ao apreciar as provas, embora tal apreciação esteja “vinculada aos princípios em que se consubstancia o direito probatório e às normas da experiência comum, da lógica, regras de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório”.
WWW) “A livre convicção não pode confundir-se com a íntima convicção do julgador, impondo-lhe a lei que extraia das provas um convencimento lógico e motivado, avaliadas as provas com sentido da responsabilidade e bom senso, e valoradas segundo parâmetros da lógica do homem médio e as regras da experiência.”
XXX) Nesta conformidade, em nome do princípio do “in dubio pro reo”, mal andou o Tribunal “a quo” ao condenar o Arguido C…, pela prática deste crime de furto qualificado, o qual, ao invés, deveria ter absolvido pela alegada prática deste crime.
YYY) Relativamente ao NUIPC 514/19.9PBBRG (Apenso B), deu como provado os seguintes factos: “No dia 11 de abril de 2019, entre as 16.30 e as 18.00horas, fazendo uso do veículo automóvel .. ….. – Fiat …, de cor cinzenta, dirigiram-se os arguidos B…, C…, e D… à residência dos ofendidos Q…, esposa e filho S…, sita na Rua…, nº .., …, Braga. Aí situados, enquanto dois dos arguidos – designadamente B… – permaneceram no exterior, em missão de vigilância, por forma a garantir o sucesso das operações e a avisar os demais caso se apercebessem de algum movimento estranho susceptível de fazer perigar a sua actuação, os outros dois arguidos – B… e D…, de modo não concretamente apurado, sem causar quaisquer danos na fechadura, lograram abrir a porta que estava fechada à chave, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o, em especial, os três quartos, remexendo as gavetas de vários móveis, espalhando o seu conteúdo pelo chão. Daí retiraram e levaram consigo(…)” os bens descritos em tal Acórdão,
ZZZ) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
AAAA) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 514/19.9PBBRG (Apenso B), o Tribunal “a quo” funda-se, unicamente, no relatório de vigilância de fls. 74 a 80 do Anexo A, do qual nada resulta de concreto, conforme se pode compreender pela simples leitura do referido relatório, que o Tribunal “a quo” citou a pag.s 70 e 71 do referido acórdão.
BBBB) Com efeito, os arguidos não foram vistos a entrar no 4º andar …, do prédio com o n.º .. da Rua…, em Braga, tendo sido visto, unicamente os arguidos B… e D… a sair do prédio, mas sem que de tal auto conste qualquer referência a um eventual transporte de objectos por parte dos mesmos.
CCCC) O facto desses arguidos terem sido vistos a sair do prédio pelas 17:47 minutos do dia 11 de Abril de 2019, é, de acordo com a experiência comum e, na ausência de qualquer outra prova, insuficiente para se poder concluir que foram os arguidos C…, B… e D… quem praticou o furto no referido apartamento e quem dele furtou os objectos constantes da relação de fls. 86 dos autos principais, os quais nunca foram encontrados na posse dos arguidos.
DDDD) Note-se, para além disso, que os ofendidos, Q…, a sua mulher e o seu filho, S…, não reconheceram, pura e simplesmente, quaisquer dos objectos que lhe foram furtados, o que, aliás, consta do auto de reconhecimento de fls. 1106.
EEEE) Note-se que o ofendido, Q…, declarou peremptoriamente não ter feito qualquer reconhecimento de objectos, não obstante ter reconhecido como sua a assinatura aposta em tal auto, o que só pode levar a concluir que assinou tal auto em branco a pedido do agente principal L….
FFFF) Na verdade, em julgamento este ofendido declarou que, “quem veio fazer o reconhecimento foi a minha esposa e o meu filho … o senhor agente da PSP deu-me isto para assinar e eu assinei com toda a honestidade … o senhor agente da autoridade é que nunca deveria ter dado este documento para assinar … porque está ali um caso que é falso … ” – Cfr. o seu depoimento que se encontra gravado em ficheiro áudio n.º 20200625144936_15719407_2871446, da sessão de julgamento de 25 de Junho de 2020, aos minutos 10:20 a 19:21.
GGGG) Mais declarou que a sua mulher e o seu referido filho vieram uma única vez ao Porto para fazer o reconhecimento de objectos, mas que não identificaram nenhum dos bens, cujas imagens lhe foram mostradas no computador como sendo seus.
HHHH) Por sua vez, o filho deste ofendido, S…, ouvido na sessão de julgamento de 25 de Junho de 2020, cujo depoimento está gravado em ficheiro áudio n.º 20200625151506_15719407_2871446, declarou aos minutos 05:00 a 09:30, que: «…antes do mês de Agosto de 2019, vim eu e a minha mãe, viemos reconhecer… eu não reconhecia as peças mas trouxe a minha mãe….Estivemos na PSP do Porto, aqui no Porto … o meu pai não veio… só vim uma única vez e trouxe a minha mãe…Entrámos dentro de uma sala e foi-nos mostrados vários ficheiros num monitor de computador com vários artigos, anéis, relógios … O meu pai não veio… tinham sido objectos apreendidos …
IIII) Como pôde o Tribunal recorrido condenar os arguidos pela prática deste crime, com base no que se deixa relatado?!... Será evidente que ao tê-los condenado pela prática de tal crime errou calorosamente no julgamento de facto, razão, pela qual, deverá esse Venerando Tribunal revogar o acórdão condenatório neste segmento.
JJJJ) Relativamente ao NUIPC 981/19.0PBMTS (Apenso P) deu como provado os seguintes factos:“Em data e hora indeterminada do mês de abril de 2019, dirigiram-se os arguidos B… e C… à residência da ofendida F…, sita na Rua…, n.º …, fração …, em …. Aí situados, de modo não concretamente apurado, sem causar quaisquer danos na fechadura, lograram abrir a porta que estava fechada à chave, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o. Daí retiraram e levaram consigo(…)” os bens descritos em tal Acórdão,
KKKK) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões.
LLLL) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 981/19.0PBMTS (Apenso P), designadamente, que foram os arguidos B… e C… quem praticou o crime de furto, o Tribunal “a quo” valorou, unicamente, o reconhecimento de objectos de fls. 541 a 544,
MMMM) Os quais foram apreendidos na residência dos arguidos B…, C… e E…,
NNNN) Tendo validado, sem reservas, o reconhecimento dos objectos, realizado pela ofendida.
OOOO) Em audiência de julgamento - sessão do dia 25 de Junho de 2020 - a ofendida, F…, em depoimento gravado em ficheiro áudio n.º 2020062515546_15719407_2871446, aos minutos 08:004 a 11:29, referiu que: «…não, caninhas não havia mais… havia mais peças de prata e mais peças de faqueiro de prata … não, semelhantes não…».
PPPP) Em todo o caso, resulta do reconhecimento de objectos – fls. 541 – que: “dado que a descrição indicada suscita algumas dúvidas que não permitem uma identificação cabal dos objetos, avançou-se para a efetivação do reconhecimento de objectos propriamente dita. Para tal, juntaram-se vários objetos a reconhecer por terem com ele o maior número de semelhanças possíveis”.
QQQQ) Isto é, apesar da ofendida ter confirmado o auto de reconhecimento de fls. 541 e 542 dos autos principais, depois de questionada pela Senhora Juiz Presidente do Colectivo, a verdade é que, o teor de tal documento, não reflete o que descreveu em Tribunal.
RRRR) Em julgamento, a mesma referiu que não havia objectos semelhantes aos que reconheceu e que os seus, são objectos feitos em série, sem nenhuma particularidade especifica que os identifique.
SSSS) Atento o disposto, conjugadamente, no n.ºs 2 e 3 do artigo 148º e no artigo 147º, n.º 7 do C. P. Penal, tal reconhecimento é nulo, não tendo valor como meio de prova.
TTTT) Não obstante isso, o Tribunal “a quo” fundamentou a sua decisão de condenar o Arguido C… e B… pela prática deste crime de furto qualificado, na sequência da ofendida ter reconhecido alguns objectos apreendidos na casa destes. Nada mais,
UUUU) Sendo certo que os objectos foram apreendidos cerca de 3 meses após o suposto furto.
VVVV) Salvo o devido respeito, o Tribunal “a quo” errou na apreciação da prova e violou o princípio do “in dubio pro reo”. Pois que deveria ter considerado insuficiente tal prova para condenar os Arguidos C… e B…, pela prática deste crime de furto qualificado, os quais, ao invés, deveria ter absolvido.
WWWW) Relativamente ao NUIPC 315/19.4SJPRT (Apenso G) deu como provado os seguintes factos:“No dia 4 de maio de 2019, entre as 18.30 e as 23.00 horas, dirigiu-se o arguido B… à residência dos ofendidos T… e U…, sita na Praça…, n.º …, …, no Porto. Aí situados, de modo não concretamente apurado, sem causar quaisquer danos na fechadura, logrou abrir a porta que estava fechada à chave, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o e remexendo-o. Daí retirou e levou consigo(…)” os bens descritos em tal Acórdão,
XXXX) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
YYYY) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 315/19.4SJPRT (Apenso G), designadamente, que foi o arguido B…, quem praticou o crime de furto, o Tribunal “a quo” valorou, unicamente, o reconhecimento de objectos de apreendidos à arguida E… no âmbito do Apenso E (NUIPC 216/19.6PFMTS) - fls. 39 e 43 a 48.
ZZZZ) O Tribunal “a quo” considerou ser suficiente para condenar o Arguido B… pelo crime de furo qualificado a esta residência, para além do facto do mesmo ser marido da Arguida E…, o reconhecimento de objetos de fls. 39 e 43 e 48 do Apenso E, os quais terão sido apreendidos no âmbito do processo 216/19.6PFMTS à Arguida E…,
AAAAA) O que é manifestamente insuficiente para condenar o Arguido pela prática de tal crime de furto qualificado.
BBBBB) A livre convicção do julgador deve ser devidamente fundamentada e aparecer como conclusão lógica e aceitável à luz dos critérios estabelecidos no artigo 127º do C. P. Penal.
CCCCC) A fundamentação do Tribunal “a quo” viola claramente o princípio da legalidade das provas e da livre apreciação da prova, o que resulta do próprio texto da decisão recorrida, pois que, o facto do Arguido ser casado com a Arguida E… e de a esta Arguida terem sido apreendidos bens que vieram a ser reconhecidos pelos ofendidos, T… e U…, Não pode, na ausência de outra prova, de forma segura, racional, lógica e objectiva, levar à conclusão de que foi este Arguido quem praticou o crime de furto qualificado em causa nestes autos,
DDDDD) Razão, pela qual, deveria, ao invés e na dúvida, ter sido absolvido pela alegada prática deste crime.
EEEEE) Relativamente ao NUIPC 365/19.0PWPRT (Apenso C) deu como provado os seguintes factos: “No dia 7 de maio de 2019, entre as 14.50 e as 15.50 horas, fazendo uso do veículo automóvel .. ….. – Fiat modelo “…”, de cor cinzenta, dirigiram-se os arguidos B…, (V… cujo julgamento está em separado) C…, e D… à residência dos ofendidos W… e seu filho X…, sita na Rua…, n.º … – Porto. Aí situados, os arguidos permaneceram no exterior, (…)Quando assim se encontrava, paralisado e manietado pela atuação do primeiro arguido, foi surpreendido por um segundo arguido, que surgiu sorrateiramente pela sua retaguarda, agredindo-o, atingindo-o, a soco, no sobrolho do lado esquerdo e junto ao ouvido do lado direito…
FFFFF) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
GGGGG) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 365/19.0PWPRT (Apenso C), o Tribunal “a quo” valorou o depoimento dos ofendidos, W… e do Agente Principal L… que visionou o DVD da camara de videovigilância instalados no n.º … (cfr. fls 41 do Apenso C), cujo depoimento é indirecto e resulta, apenas, do visionamento do DVD, tendo validado, sem reservas, as imagens de videovigilância,
HHHHH) Já que, apesar do ofendido X… ter estado “paralisado e manietado” de frente para um dos arguidos, não reconheceu nenhum dos Arguidos e não reconheceu nenhum objecto – cordão em ouro branco e uma chave de cofre.
IIIII) Em audiência de julgamento o ofendido, X…, cujo depoimento se encontra gravado em ficheiro áudio n.º 20200629112129_15719407_2871446, referiu, aos minutos 00:55 a 01:15 e 03:48 a 04:08, que: «…não tenho a certeza de conhecer alguém ….Eu olhei para ele e ele olhou para mim…».
JJJJJ) Tal prova desacompanhada de qualquer outra, é manifestamente insuficiente para poder criar no espírito do julgador a convicção segura de quem foram os autores dos crimes praticados nestes autos, devendo, por isso, ser os mesmos absolvidos da prática de tais crimes.
KKKKK) Relativamente ao NUIPC 512/19.2PAPVZ (Apenso Q) deu como provado os seguintes factos: “No dia 22 de maio de 2019, entre as 8.00 e as 16.00 horas, dirigiram-se os arguidos B… e C…, até à residência do ofendido Y…, sita na Rua…, nº …, …. - Póvoa de Varzim. Aí situados, os arguidos, de modo não concretamente apurado, extraíram a fechadura da porta de entrada, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o, remexendo as divisões, nomeadamente um camiseiro. Daí retiraram e levara, consigo: (…)”, os bens descritos em tal Acórdão,
LLLLL) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
MMMMM) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 512/19.2PAPVZ (Apenso Q), designadamente, que foram os arguidos B… e C… quem praticou o crime de furto, o Tribunal “a quo” valorou, unicamente, o reconhecimento de objectos de fls. 550 e 551, apreendidos na residência dos arguidos B…, C… e E…, tendo validado, sem reservas, o reconhecimento dos objectos, realizado pelo ofendido.
NNNNN) Em audiência de julgamento o ofendido referiu - depoimento gravado em ficheiro áudio n.º 20200629124725_15719407_2871446, aos minutos 01:25 a 02:15 - que: «… eu cheguei a casa estava lá os senhores agentes da PSP já lá estavam não fui eu que os chamei … porque o apartamento ao lado tinha sido assaltado também e esse senhor ao lado é que chamou a PSP porque ficam os dois no mesmo piso e quando cheguei encarei com aquela situação que o meu também tinha sido assaltado … (07:24/ 08:22) …. Tinham uma mesa grande com vários objectos … era igualzinho, era idêntico era mais pequeno ele nem me servia …ao anel que me faltou….».
OOOOO) Em todo o caso, para além do furto à casa dos vizinhos (deste ofendido) não constar dos autos, o reconhecimento de objectos foi considerado válido, não obstante o ofendido ter declarado que “o anel era idêntico, era igualzinho que que lhe faltava”,
PPPPP) O mesmo referiu que era idêntico ao dele, não apontando nenhuma particularidade especifica, para além daquele que referiu que o anel só lhe cabia no dedo mindinho.
QQQQQ) Atento o disposto, conjugadamente, nos n.ºs 2 e 3 do artigo 148º e no artigo 147º, n.º 7 do C. P. Penal, tal reconhecimento é nulo, não tendo valor como meio de prova.
RRRRR) Não obstante isso, o Tribunal “a quo” fundamentou a sua decisão de condenar o Arguido C… e B…, pela prática deste crime de furto qualificado, na sequência do ofendido ter reconhecido o anel apreendido na casa destes e nada mais.
SSSSS) Salvo o devido respeito, o Tribunal “a quo” errou na apreciação da prova e violou o princípio do “in dubio pro reo”,
TTTTT) Prova que deveria ter considerado insuficiente para condenar os Arguidos C… e B…, pela prática deste crime de furto qualificado.
UUUUU) Relativamente NUIPC 677/19.3PTLSB (Apenso T) deu como provado os seguintes factos: “No dia 25 de maio de 2019, entre as 16.30 e as 20.30 horas, dirigiu-se o arguido B…, até à residência dos ofendidos Z… e AB…, sita na Rua…, n.º …, …, em Lisboa. Aí situados, o arguido, de modo não concretamente apurado, sem causar quaisquer danos na fechadura, logrou abrir a porta, da residência, que estava fechada à chave, o qual logrou, ainda assim, abrir, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o, remexendo as divisões, nomeadamente, uma gaveta. Daí retirou e levou consigo(…)” os bens descritos em tal Acórdão,
VVVVV) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
WWWWW) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 677/19.3PTLSB (Apenso T), designadamente, que foi o arguido B…, quem praticou o crime de furto, o Tribunal “a quo” valorou, unicamente, o reconhecimento de objectos apreendidos à arguida E… no âmbito do Apenso E (NUIPC 216/19.6PFMTS).
XXXXX) Isto é, o Tribunal “a quo” considerou ser suficiente para condenar o Arguido B… pelo crime de furto qualificado a esta residência, para além do facto do mesmo ser marido da Arguida E…, o reconhecimento de relógio Rolex, apreendido, no âmbito do processo 216/19.6PFMTS, à Arguida E…,
YYYYY) O que, na ausência de qualquer outra prova, é manifestamente insuficiente para condenar o Arguido pela prática deste crime de furto qualificado.
ZZZZZ) Com efeito, a livre convicção do julgador, deve ser devidamente fundamentada e aparecer como conclusão lógica e aceitável à luz dos critérios estabelecidos no artigo 127º do C. P. Penal.
AAAAAA) A fundamentação do Tribunal “a quo” violou claramente o princípio da legalidade das provas e da livre apreciação da prova, o que resulta do próprio texto da decisão recorrida,
BBBBBB) Pois que: o facto de o Arguido ser casado com a Arguida E… e de a esta Arguida terem sido apreendidos bens que vieram a ser reconhecidos pelos ofendidos, Z… e AB…,
CCCCCC) Não pode, de forma segura, racional, lógica e obejctiva levar à conclusão de que foi este Arguido quem praticou o crime de furto qualificado em causa nestes autos, razão, pela qual, deveria, ao invés e na dúvida, ser absolvido.
DDDDDD) Relativamente NUIPC 455/19.0PWPRT (Apenso H) deu como provado os seguintes factos: “No dia 5 de junho de 2019, entre as 09.00 e as 17.20 horas, dirigiu-se o arguido B…, até à residência da ofendida AC…, sita na Rua…, n.º …, … - Porto. Aí situado, o arguido, de modo não concretamente apurado, sem causar quaisquer danos na fechadura, logrou abrir a porta da residência que estava fechada à chave, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o, remexendo as divisões, nomeadamente, uma gaveta de um armário, por debaixo de algumas roupas. Daí retirou e levou consigo(…)” os bens descritos em tal Acórdão,
EEEEEE) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
FFFFFF) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 455/19.0PWPRT (Apenso H), designadamente, que foi o arguido B…, quem praticou o crime de furto, o Tribunal “a quo” valorou, unicamente, o reconhecimento de objectos apreendidos à arguida E… no âmbito do Apenso E (NUIPC 216/19.6PFMTS).
GGGGGG) Isto é, o Tribunal “a quo” considerou ser suficiente para condenar o Arguido C… pelo crime de furto qualificado a esta residência, para além do facto do mesmo ser marido da Arguida E…, o reconhecimento de objectos apreendidos, no âmbito do processo 216/19.6PFMTS, à Arguida E…, efectuado pela ofendida AC…,
HHHHHH) O que, repete-se, na ausência de outra prova, é manifestamente insuficiente para condenar o Arguido pela prática deste crime de furto qualificado.
IIIIII) A fundamentação do Tribunal “a quo” violou claramente o princípio da legalidade das provas e da livre apreciação da prova, o que resulta do próprio texto da decisão recorrida,
JJJJJJ) Pois que: o facto do Arguido ser casado com a Arguida E… e de a esta Arguida terem sido apreendidos bens que vieram a ser reconhecidos pela ofendida AC…,
KKKKKK) Não pode, por si só, de forma segura, racional, lógica e obejctiva levar à conclusão de que foi este Arguido quem praticou o crime de furto qualificado em causa nestes autos,
LLLLLL) Razão, pela qual, o Tribunal “a quo” errou no julgamento de facto, ao considerar provado que foi o arguido B… quem praticou o furto em causa nestes autos, quando deveria, ao invés e na dúvida, tê-lo absolvido.
MMMMMM) Relativamente NUIPC 560/19.0PWPRT (Apenso H) deu como provado os seguintes factos: “No dia 15 de junho de 2019, entre as 16.00 e as 22.00 horas, dirigiram-se os arguidos B… e D… à residência dos ofendidos I… e J…, sita na Rua…, nº…, … - Porto. Aí situados, os arguidos, de modo não concretamente apurado, sem causar quaisquer danos na fechadura, lograram abrir a porta da residência que estava fechada à chave, acedendo, dessa forma, ao seu interior, percorrendo-o, remexendo as divisões, nomeadamente vários armários e gavetas.Daí retiraram e levaram consigo (…)” os bens descritos em tal Acórdão,
NNNNNN) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto ao ora Recorrente, pelas seguintes razões:
OOOOOO) Para fundamentar os factos provados neste NUIPC 560/19.2PPPRT, designadamente, que foram os arguidos, B… e D…, quem praticou o crime de furto, o Tribunal “a quo” valorou, unicamente, o reconhecimento de objectos de fls. 554 a 557, que foram apreendidos na residência dos arguidos B…, C… e E…,
PPPPPP) O que, repete-se, na ausência de outra prova, é manifestamente insuficiente para condenar o Arguido pela prática deste crime de furto qualificado.
QQQQQQ) Salvo o devido respeito, o Tribunal “a quo” errou na apreciação da prova e violou o princípio do “in dubio pro reo”, pois que deveria ter considerado insuficiente tal prova para condenar os Arguidos B… e D… pela prática deste crime de furto qualificado, os quais, ao invés, deveria ter absolvido.
RRRRRR) Relativamente ao NUIPC 216/19.6PFMTS (Apenso E) – Arguida E…, deu como provado os factos provados no n.º 5 do acórdão recorrido e que: “A arguida E…, esposa do arguido B… foi quem, recebeu das mãos dos arguidos, o produto da prática dos atos de assenhoreamento e que o escoou para o “mercado”, fazendo-o ciente da proveniência dos bens – que sabia serem o resultado da prática de factos delituosos contra o património – e com o intuito de daí retirar – para si – vantagem de conteúdo patrimonial proibida e punida por lei, no que respeita: - desde logo, recebeu E… das mãos dos arguidos os bens e artigos retirados e levados por estes que constam das relações de bens dos ofendidos, e que aqui lhe foram apreendidos (…), artigos estes que são igualmente produto de crimes contra o património – apesar de não se ter logrado identificar os seus proprietários (que destes se viram desapossados contra sua vontade) – levados a cabo pelo arguido B… [4] e que a arguida E… quis receber deste e escoar para a Ucrânia apesar de estar ciente de terem origem na prática de crimes contra o património a que este arguido se dedicava – com intuito de daí retirar, para si vantagem patrimonial – lucro- o que quis e fez de forma deliberada, livre e consciente bem sabendo que aquela conduta era proibida por lei. (…)»
SSSSSS) Que, nos termos e para os efeitos constantes do artigo 412º, n.º 3, al. a) do C. P. Penal se consideram incorrectamente dados como provados, quanto à ora Recorrente, pelas seguintes razões:
TTTTTT) Ficou provado que: “a arguida E…, apresentou-se na Esquadra de policia de Matosinhos, para saber de AD… e das várias encomendas que pretendia levar, por arrogar serem suas, e que lhe havia entregue para que AD…, as transportasse, na sua viatura, com destino à Ucrânia, dirigidas aos endereços ali apostos. … Enquanto, esta arguida, que se apresentou de mote próprio no departamento polícia, a reivindicar e a questionar pelos pacotes/ encomendas por si entregues, para transporte, ao condutor fiscalizado, no exterior estava outra pessoa que não entrou na esquadra.» - Cfr-pag.s 161 e 162 do Acórdão recorrido.
UUUUUU) Atenta as regras da experiência comum, se a arguida soubesse que a mercadoria apreendida era de proveniência ilícita não teria, certamente, de “motu proprio”, ido à esquadra reivindicar tal mercadoria, pois que, tal deslocação a faria incorrer em grave risco de ser imediatamente detida
VVVVVV) E, não se diga que o facto de ser casada com o arguido B… é suficiente para criar no espírito do julgador a convicção de que a Arguida teria que saber a proveniência desses bens.
WWWWWW) Não se subsumem na previsão do tipo subjectivo do ilícito criminal de receptação p.e p. pelo artigo 231º, n.º 1 do C. Penal, os factos dados como provados, pois que, o facto da mesma ser casada com o Arguido B…, com quem vive e de quem tem três filhos, não pode, por si só, criar no espirito do julgador a certeza de que a mesma sabia a proveniência dos bens e que, mesmo assim, quis obter vantagem patrimonial com os mesmos,
XXXXXX) Razão, pela qual e tendo em conta o que anteriormente se deixou referido quanto ao errado julgamento da matéria de facto, inelutavelmente conduzirá à revogação do acórdão recorrido e determinará a absolvição da Recorrente E… por esse Venerando Tribunal, o qual, atento o disposto no artigo 431º do C. P. Penal e porque dos autos constam todos os elementos necessários para o efeito, tem poderes para o efeito.
YYYYYY) Reapreciada que foi a valoração da prova feita pelo Tribunal recorrido, relativamente a cada um dos crimes imputados nos Apensos que se deixaram identificados, importará, à laia de conclusão, realçar que toda a prova produzida em julgamento é indirecta, o que, aliás, foi expressamente reconhecido pelo Ministério Público logo no inicio das suas alegações finais, conforme se pode comprovar pela audição das mesmas.
ZZZZZZ) Ora, não podendo o Tribunal recorrido deixar de reconhecer a natureza indirecta de todas as provas produzidas, tal deveria ter sido suficiente para que, na falta de qualquer prova directa, absolvesse os arguidos de todos os crimes que lhes são imputados na pronúncia,
AAAAAAA) Até porque, para além do Tribunal recorrido se ter valido de provas indirectas para condenar os arguidos, ainda se socorreu dos depoimentos das testemunhas que depuseram com ocultação de imagem, identidade e distorção da voz, quando, pelas razões aduzidas no recurso tempestivamente interposto do despacho que admitiu tais depoimentos, o não podia fazer sem violar a estrutura acusatória do processo penal e, consequentemente, o princípio do contraditório.
BBBBBBB) Ainda que assim não se entenda, ou seja, que o Tribunal “a quo” apreciou devidamente a prova produzida e que, ao ter condenado a Arguida pelo referido crime, não errou no julgamento da matéria de facto, o que só por mera necessidade de raciocínio se admite, sempre se dirá que a pena aplicada à mesma é excessiva, devendo ser reduzida substancialmente por esse Venerando Tribunal.
CCCCCCC) Na verdade: a Senhora Juiz recorrida deu como provado no n.º 22 da matéria de facto dada como provada, que a ora Recorrente é “uma mãe presente e atenta com os descendentes … No meio residencial … beneficia de uma imagem social positiva, não lhe sendo atribuídos quaisquer problemas interpessoais, não existindo, neste enquadramento, qualquer rejeição à sua presença naquele espaço habitacional.”
DDDDDDD) O Tribunal “ a quo” concluiu que: “- são fortes as exigências de prevenção geral porque o tipo de conduta criminal atento o alarme social capaz de causar afeta o comércio jurídico e criando degradação de relações pessoais”.
EEEEEEE) Ora, no caso dos autos, não obstante o Tribunal “a quo” ter dado como provado que a Arguida “não tem antecedentes criminais”, que “beneficia de imagem social positiva”, ainda assim, o Tribunal “a quo” aplicou à Arguida a pena máxima prevista para o tipo legal de crime de receptação!....
FFFFFFF) Isto é: não obstante as circunstâncias atenuantes, dadas como provadas, a verdade é que o Tribunal “a quo” aplicável à Arguida, pela prática do crime de receptação, p. e p. artigo 231º do C. Penal, o qual é punido com multa ou com pena de prisão até 5 anos, a pena máxima de prisão aplicada a esse crime!...
GGGGGGG) Face à circunstância da ora Recorrente ser primária, de ser uma mãe atenta, presente e cuidadosa, de ser uma pessoa estimada e bem considerada pelos seus vizinhos, ter-se-á de concluir que a pena efectivamente aplicada à mesma é manifestamente excessiva, por desproporcionada à medida da culpa e da sua personalidade,
HHHHHHH) Razão, pela qual, ainda que esse Venerando Tribunal confirme o acórdão condenatório quanto à ora Recorrente E…, o que, só por mera necessidade de raciocínio se admite, deverá revogar tal acórdão na parte em que aplicou à Arguida a pena de 5 anos de prisão, a qual, deverá substituir por outra, que não seja superior a um ano de prisão, suspensa na sua execução.
IIIIIII) O acórdão recorrido, ao condenar os ora Recorrente pela prática dos crimes de que vinham pronunciados, interpretou de forma errada o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127 do C. P. Penal, esquecendo-se, de que, na avaliação do caso, deveria prevalecer outro princípio sagrado a que o legislador deve tributo e que é o do, “in dubio pro reo”.
JJJJJJJ) Nestes termos e em conclusão, atenta a prova produzida que atrás se identificou, para os fins constantes do artigo 412.º do C. P. Penal, deverá esse Venerando Tribunal julgar em sede do presente recurso que a ora Recorrente não praticou este crime, absolvendo-a do mesmo.
KKKKKKK) Para tanto, não têm que ser renovadas quaisquer provas, sendo suficiente, para que esse Venerando Tribunal julgue, de facto, da forma ora proposta pela Recorrente, que se atenha às declarações das testemunhas acima transcritas, razão, pela qual, se deverá considerar que foi dado cumprimento ao estatuído no artigo 412.º, n.º 3 do C. P. Penal.
LLLLLLL) O acórdão recorrido ao admitir como válidas as provas obtidas mediante imagens na via pública sem que as mesmas fossem validadas por um juiz, violou o disposto, conjugadamente, nos artigos 167º, 188º, n.º 1 e 4, 190º e 126º, n.º 3 do C.P. Penal e artigos, 18º, 26º, n.º 1 , 32º, n.º 8 e 260º da Constituição da República Portuguesa,
MMMMMMM) Normas que interpretou erradamente, no sentido de não ser necessário, nos crimes em causa nos presentes autos, a validação das mesmas por um Juiz, quando as deveria ter interpretado em sentido contrário.
NNNNNNN) O acórdão recorrido ao admitir como válidas as provas obtidas mediante imagens através de sistema de videovigilância instalado em estabelecimento comercial, violou o disposto, conjugadamente, nos artigos 18º, 19º, 20º e 21º da lei n.º 58/2019, de 8 de Agosto e nos artigos 188º, n.º 1 e 190º do C.P. Penal e artigos, 18º, 26º, n.º 1 , 32º, n.º 8 e 260º da Constituição da República Portuguesa,
OOOOOOO) Normas que interpretou erradamente, no sentido de não ser necessário o licenciamento das câmaras de vídeo vigilância para que as mesmas sejam consideradas provas licitas em processo penal, quando as deveria ter interpretado em sentido contrário.
PPPPPPP) O Tribunal “a quo” violou o disposto nos artigos 138º, n.º 3, 139º, n.º 2 “a contrario” do C. P. Penal e artigo 16º, al. a) da lei n.º 93/99, de 14 de Julho e no artigo 32, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa,
QQQQQQQ) Normas que interpretou e aplicou ao caso em apreço, erradamente, no sentido de admitir que as sete testemunhas da PSP de Lisboa, fossem ouvidas com ocultação de imagem e de identidade, quando as deveria ter interpretado em sentido diferente.
RRRRRRR) Isto é: não aplicou aos autos o disposto na al.a ) do artigo 16º da lei n.º 93/99, de 14 de Julho, disposição essa que não permitiu a inquirição das referidas testemunhas com ocultação de imagem e de identidade.
SSSSSSS) O Tribunal “a quo”, violou ainda o disposto, conjugadamente, nos artigos 148º, n.ºs 1, 2 e 3 e 147º, n.ºs 1, 2 e 4 do C. P. Penal, normas que interpretou no sentido de não ser necessário que, a par dos objectos supostamente furtados, fossem colocados outros com eles parecidos e semelhantes, quando as deveria ter interpretado em sentido oposto.
TTTTTTT) Ora, o Tribunal “a quo”, no acórdão recorrido, ao condenar a ora Recorrente E… pela prática de tal crime de receptação, fez uma errada interpretação e aplicação ao caso concreto do estatuído no artigo 231º, n.º 1 do C. Penal, que, por isso, violou, bem como o disposto no artigo 127º do C. P. Penal, aplicando erradamente o princípio da livre apreciação da prova e violando o princípio do “in dubio pro reo”, ao condenar a ora Recorrente, que deveria ter absolvido.»
*
O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso apresentado pelos arguidos, pugnando pela respectiva improcedência por considerar que todas as questões suscitadas não merecem provimento, devendo ser mantido nos seus exactos termos a decisão recorrida.
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Neste Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer onde acolheu a posição do Ministério Público junto do Tribunal recorrido na resposta ao recurso, pugnando igualmente pela respectiva improcedência.
Uma vez que os recorrentes não o fizerem, aborda a possibilidade de os mesmos serem convidados, ao abrigo do disposto no art. 417.º, n.º 3, do CPPenal, a manifestar a sua posição quanto aos recursos interlocutórios pendentes.
*
Notificados destes parecer, vierem os recorrentes declarar que mantêm interesse no julgamento conjunto, com o recurso interposto da decisão final, dos três recursos intercalares por si interpostos em 15-07-2020.
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Dos recursos interlocutórios
Com datada de 15-07-2020, os arguidos B…, C…, D… e E… deram entrada no processo de três recursos relativos a questões relacionadas com a prova e sua produção.
Pelo primeiro, junto a fls. 2849 a 2856, vieram os arguidos recorrer do despacho que determinou a inquirição de testemunhas, agentes da PSP, com ocultação de imagem e de identidade.
Segundo os recorrentes tal despacho tem a referência 415748449 e em resposta ao mesmo apresentaram uma oposição em 05-07-2020 com a referência 35975856, que não foi atendida.
Pretendem que o despacho recorrido seja revogado e que tal prova não seja considerada válida.
Apresentam em abono da sua posição as seguintes conclusões da motivação (transcrição):
«A) Vem o presente recurso interposto do despacho da Senhora Juiz “a quo”, com a referência 415748449, que determinou a inquirição das testemunhas, agentes da PSP, cuja identidade não foi revelada pela testemunha AE…, com ocultação de imagem e de identidade.
B) Os advogados dos Arguidos, notificados de tal despacho, no exercício do direito ao contraditório, vieram a opor-se a que a inquirição de tais testemunhas ocorresse com ocultação da sua identidade e imagem, pelas razões constantes do seu requerimento de 5 de Julho de 2020, com a referência 35975856, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
C) Não atendendo às razões invocadas pelos Advogados dos Arguidos em tal requerimento, a Senhora Juiz, pelo despacho recorrido, determinou a inquirição de 7 testemunhas, agentes da PSP, com ocultação da sua identidade e imagem, D) O que, no entender da Defesa dos Arguidos, constituiu uma flagrante e despudorada violação do disposto nos artigos 138º, n.º 3, 139º, n.º 2 “a contrario” do C. P. Penal, no artigo 16º, al. a) da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho e no artigo 32º, n.º 5 da C. R.P.
E) O despacho em apreço é manifestamente ilegal por violar o disposto, conjugadamente, nos artigos 138º, n.º 3, 139º, n.º 2 “a contrario” do C. P. Penal, no artigo 16º, al. a) da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho e no artigo 32º, n.º 5 da C. R.P
F) E inconstitucional, materialmente, por violar o disposto no n.º 32º nº 5 da Constituição da República Portuguesa, que consagra a estrutura acusatória do processo penal de que decorre o princípio do contraditório.
G) Atento o atrás exposto, sem necessidade de mais quaisquer considerações, por serem manifestamente desnecessárias, requer-se em conclusão a V. Exas. que revoguem, pura e simplesmente, o despacho recorrido com todas as consequências legais, a primeira das quais deverá ser determinar que não seja considerada prova válida para o julgamento do caso em apreço, as declarações prestadas por tais testemunhas que depuseram com ocultação da sua identidade e imagem.»
*
O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso apresentado pelos arguidos, apontando, desde logo, lapso na indicação feita no recurso quanto à referência processual do despacho recorrido, que entende ser de 08-07-2020, com a referência 415818488, e pugnando pela respectiva improcedência por considerar que a decisão recorrida julgou com acerto e em cumprimento da lei.
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Neste Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer onde acolheu a posição do Ministério Público junto do Tribunal recorrido na resposta ao recurso, pugnando igualmente pela respectiva improcedência.
*
Pelo segundo recurso, junto a fls. 2857 a 2864, vieram os arguidos recorrer da decisão de 09-07-2020, com a referência 415858659, que, «na sequência da defesa dos Arguidos ter suscitado o incidente de recusa do tribunal (…) determinou ainda assim o prosseguimento do julgamento»[5].
Pretendem que não seja considerada para qualquer efeito a prova produzida na sessão de julgamento de 09 de Julho, apresentando em apoio da sua posição as seguintes conclusões da motivação (transcrição):
«a) O presente recurso é interposto do despacho do Tribunal “a quo” com a referência 415858659, de 9 de Julho de 2020, que, na sequência da defesa dos Arguidos ter suscitado o incidente de recusa do tribunal, nos termos e com os fundamentos que ora se dão por reproduzidos, determinou ainda assim o prosseguimento do julgamento,
b) Não obstante o protesto lavrado em acta pela defesa dos Arguidos, manifestando a sua frontal discordância com tal decisão do Tribunal Recorrido.
c) Com efeito: atentos os fundamentos do despacho ora impugnado, que se radicam, fundamentalmente, na necessidade de ser proferida decisão a curto prazo, porque os Arguidos têm direito que, a breve prazo, seja proferida tal decisão, o Tribunal recorrido “esqueceu” que foram os Arguidos que consideraram que era absolutamente imperioso que o julgamento fosse suspenso enquanto a decisão do incidente de recusa não fosse proferida.
d) Atento o disposto no artigo 43º, n.º 5 do C. P. Penal, que determina o seguinte: «5- (…) os atos praticados posteriormente só são válidos se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo.»
e) É mais do que óbvio, que a inquirição das testemunhas a que se procedeu na sessão de julgamento do passado dia 9 de Julho, por determinação do Tribunal Colectivo exarada no despacho de que ora se recorre, podia e devia ter ocorrido em sessão de julgamento a realizar, após julgado o incidente de recusa do Tribunal, porque realizada a inquirição de tais testemunhas antes do julgamento do incidente esses depoimentos são necessariamente inválidos, porque podem legalmente ser prestados após julgado o incidente de recusa.
f) Tal decisão de que ora se recorre, viola, manifestamente, o disposto no artigo 43º, n.º 5 do C. P. Penal, g) Razão, pela qual, deverá esse Venerando Tribunal revogar a decisão recorrida, de que decorrerá, consequentemente, que determine que não seja considerada relevada para qualquer efeito, a suposta prova produzida na sessão de julgamento de 9 de Julho».
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O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso apresentado pelos arguidos, pugnando pela respectiva improcedência por considerar que a decisão recorrida julgou com acerto ao concluir que o prosseguimento da audiência salvaguardou a regular acção da justiça em processo com três arguidos em prisão preventiva.
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Neste Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer onde acolheu a posição do Ministério Público junto do Tribunal recorrido na resposta ao recurso, pugnando igualmente pela respectiva improcedência.
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Por último, apresentaram os arguidos um terceiro recurso, junto a fls. 2865 a 2876, através do qual recorrem da decisão de 09-07-2020, com a referência 415858659, proferida em audiência de julgamento, onde o Tribunal a quo considerou não ser pertinente o pedido formulado pela defesa de junção aos autos dos certificados de licenciamento das câmaras que registaram as imagens juntas aos autos e em que a acusação se suporta.
Terminaram, sintetizando a sua argumentação nas seguintes conclusões da motivação (transcrição):
«A) O sistema de videovigilância carece de prévia autorização da CNPD e tem de obedecer aos requisitos estabelecidos nos n.ºs 18º, 19º, 20º e 21º da Lei n.º 58/2019 de 8 de Agosto.
B) Com efeito: segundo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, o poder de vigiar em segredo os cidadãos só pode ser tolerado na medida estritamente necessária à salvaguarda das instituições democráticas.
C) Por sua vez, o artigo 167º do C. P. Penal faz depender a validade da prova produzida por reproduções mecânicas da sua não ilicitude face ao disposto na lei penal,
D) Fazendo depender a sua legalidade dos requisitos consignados para os métodos de obtenção de provas, designadamente, das escutas telefónicas,
E) Razão, pela qual: não existindo no processo qualquer prova documental bastante de que as câmaras de videovigilância se encontram registadas,
F) Tal prova é nula, não podendo ser considerada como prova relevante nos presentes autos.
G) É o que decorre do disposto, conjugadamente, nos artigos 167º, 188º, n.º 4 e 190º do C. P. Penal na Lei 58/2019 de 8 de Agosto e no artigo 31º da Lei n.º 34/2013, de 16 de Maio e dos quais decorre que imagens recolhidas e gravadas por câmara de videovigilância não licenciadas não poderão ser consideradas provas licitas e válidas em processo penal.
H) Para o Tribunal Recorrido, o estatuído em tais artigos atrás referidos é absolutamente irrelevante para se aferir da virtualidade probatória de tais imagens!... Por isso indeferiu o requerido pela defesa dos Arguidos.
I) Mas, ao assim ter decidido, violou grosseiramente o disposto em tais disposições legais,
J) Termos em que e concluindo, se requer a V. Exas. que revoguem a decisão recorrida e que, em sua substituição, ordenem ao Tribunal recorrido que indague junto dos condomínios onde tais câmaras se encontram instaladas, se elas estão ou não licenciadas para, legalmente captarem imagens.
K) É que essa é, de facto, uma questão absolutamente fundamental para se decidir se os fotogramas juntos aos autos e captados por tais imagens, podem ou não ser prova válida nestes autos.»
*
O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso apresentado pelos arguidos, remetendo para os fundamentos aduzidos na decisão instrutória a este propósito e, por isso, pugnando pela respectiva improcedência.
*
Neste Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer onde acolheu a posição do Ministério Público junto do Tribunal recorrido na resposta ao recurso, pugnando igualmente pela respectiva improcedência.
*
II. Apreciando e decidindo:
Questões a decidir nos recursos
É pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação que apresenta que se delimita o objecto do recurso, devendo a análise a realizar pelo Tribunal ad quem circunscrever-se às questões aí suscitadas, sem prejuízo do dever de se pronunciar sobre aquelas que são de conhecimento oficioso[6].
As questões que os recorrentes colocam à apreciação deste Tribunal de recurso são as seguintes:
Recursos intercalares:
- Saber se a audição no decurso do julgamento de sete testemunhas da PSP com ocultação da identidade e da imagem deve ser considerada prova não válida, devendo, por isso, desatender-se ao teor dos respectivos depoimentos;
- Saber se deve ser considerada sem efeito a prova produzida na sessão de julgamento de 09-07-2020 após ter sido suscitado o incidente de recusa do Tribunal;
- Saber se os fotogramas juntos aos autos, retirados de câmaras de videovigilância, não podem ser considerados prova válida sem estar demonstrado o respectivo licenciamento junto da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD).
Recurso da decisão final (de acordo com a enunciação dos recorrentes):
- Nulidade da prova consistente na captação de imagens dos arguidos através de fotografias tiradas pelo OPC e de fotogramas retirados de câmaras de videovigilância.
- Ilegalidade da prova, consistente na audição de testemunhas com ocultação da identidade e imagem à margem da lei;
- Erro notório na apreciação da prova;
- Nulidade do reconhecimento de objectos;
- Erro de julgamento quanto a factos relativos aos NUIPC 30/19.9PRPRT, 73/19.2PBGMR, 514/19.9PBBRG, 981/19.0PBMTS, 315/19.4SJPRT, 365/19.0PWPRT, 512/19.2PAPVZ, 677/19.3PTLSB, 455/19.0PWPRT, 560/19.2PPPRT e 216/19.6PFMTS.
*
Apreciando.
A. Recursos intercalares
A1. Recurso que recai sobre a decisão que determinou a inquirição de testemunhas, agentes da PSP, com ocultação de identidade e de imagem.
Segundo os recorrentes, como já se enunciou, o despacho do qual recorrem tem a referência 415748449.
Como bem salientou o Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido, a indicação da referência 415748449 como sendo a correspondente ao despacho recorrido só pode ser um lapso, pois o despacho correspondente a tal referência é do seguinte teor:
«Da vista e do requerimento apresentado pelo MP notifique a defesa dos arguidos, a fim de se pronunciarem querendo, no prazo de 24horas, pela via, mais expedita, diligenciando pela comprovação da receção dos mesmos.
DN»
Este despacho é de mero expediente e através do mesmo apenas se está a determinar o cumprimento do contraditório pela Defesa perante posição do Ministério Público nos autos.
Porém, o recurso é bastante claro na oposição que faz à decisão de serem ouvidos agentes da PSP com ocultação de identidade e imagem.
Assim, o recurso só poderá ser ou do despacho de 30-06-2020 que determinou a audição das testemunhas ao abrigo do art. 19.º do DL 243/15, de 19-10, ou da decisão de 08-07-2020, proferida após o Ministério Público e a Defesa dos arguidos se ter pronunciado sobre a questão, onde o Tribunal, completando a sua fundamentação, reafirma a decisão de audição das testemunhas, argumentando agora, a par da disposição estatutária anteriormente invocada, com o disposto nos arts. 4.º, 5.º. 16.º e 19.º da Lei de Protecção de Testemunhas (Lei 93/99, de 14-10).
À semelhança do que menciona o Ministério Público na resposta ao recurso, cremos que esta última decisão será a recorrida, já que o recurso menciona a referida Lei de Protecção de Testemunhas, diploma a que não se aludiu no primeiro despacho proferido indicado e que apenas foi abordado na decisão de 08-07-2020 e depois desta.
Seja como for – apesar do lamentável equívoco e da necessidade de o Tribunal procede ao exercício antecedente (havendo sempre a alternativa mais formalista de considerar que o despacho com a referência 415748449, sendo de mero expediente, não era recorrível) –, qualquer das decisões foi proferida antes da audição das testemunhas a que respeitam (sendo o recurso posterior a esta), pelo que, para a apreciação da questão colocada será sempre relevante tudo o que foi decidido até à realização da diligência.
Vejamos, então, o que a este propósito consta dos autos:
- Na sessão de julgamento de 22-06-2020 (1.ª sessão), após audição da testemunha AE…, Chefe da PSP, a exercer funções na Divisão de Investigação Criminal (DIC) do Comando Metropolitano do Porto, e de requerimentos da Defesa e do Ministério Público a tal propósito, pelo Tribunal a quo foi determinado que a testemunha, no prazo de dois dias, identificasse as pessoas que consigo colaboraram nas vigilâncias realizadas no âmbito da investigação em causa (referência 415214472, a fls. 2651 a 2659);
- No dia 23-06-2020, a pedido do Comandante da DIC da PSP do Porto, deu entrada no processo comunicação onde era informado que os elementos que realizaram seguimentos e vigilâncias nos dias 26-02-2019, 27-02-2019, 28-02-2019, 10-04-2019, 11-04-2019 e 10-07-2019 faziam parte de uma unidade especializada do Departamento de Investigação Criminal da Direcção Nacional da PSP, sediada em Lisboa, equipa que prestou apoio operacional à DIC do Porto, desconhecendo a DIC do Porto a identidade dos elementos policiais que constituem a referida unidade. Foi salientado que os elementos policiais em questão desenvolvem uma missão de natureza sigilosa, em contextos de absoluta ocultação da sua qualidade de OPC, colocando à consideração a possibilidade do seu depoimento ser realizado por videoconferência com ocultação de imagem e identidade (referência 26084807, a fls. 2671 a 2672);
- Com data de 23-06-2020, a Senhora Juiz titular do processo proferiu o seguinte despacho (referência 415271677, a fls. 2673):
«Em face da informação carreada para os autos pela DIC do Porto, solicite à Direção Nacional da PSP-Departamento de Investigação Criminal, a identificação e autorização para a convocação dos agentes, no seu domicilio profissional, que prestaram apoio operacional à DIC- Porto, nos dias 26, 27, 28, de fevereiro, 10, e 11 de abril, e 10 de julho, todos do ano de 2019, a fim de poderem prestar depoimento atinente àquelas diligencias, carreadas para os presentes autos, a prestar por videoconferência, em Tribunal no local da área do domicilio profissional, com ocultação de imagem/identidade, e observância dos demais requisitos legais.
DN»
- Com data de 30-06-2020, deu entrada em juízo comunicação do Departamento de Investigação Criminal da Direcção Nacional da PSP com anexo onde consta a resposta ao requerido (referência 26146696, a fls. 2711 a 2712);
- Na mesma data de 30-06-2020, a Senhora Juiz titular do processo proferiu o seguinte despacho (referência 415489539, a fls. 2713):
«Na sequência do despacho proferido a 23.06.2020, veio a DIC-PSP- Lisboa indicar sete agentes da PSP da DIC – Lisboa, como intervenientes nas diligencias de vigilância realizadas nas datas indicadas no aludido despacho e realizadas nos autos. Nos termos do artigo 19º do DL 243/15, de 19.10 diligencie pela convocação e solicitação ao Tribunal da área profissional, onde exercem funções aquelas testemunhas, certificando-se da disponibilidade de ali ser realizada a diligencia por videoconferência, com prévio juramento e identificação das testemunhas, cuja prestação de depoimento será com observância daquele normativo legal, para o dia 9 de julho 2020, data concertada com os sujeitos processuais, por videoconferência a partir das 10 horas. Informe tratar-se de processo de presos a correr termos, e que esta diligencia surgiu no decorrer da produção da prova.
Mais convoque o Chefe da DIC-PSP Porto, a fim de comparecer nas instalações deste Tribunal, a fim de prestar declarações complementares, pois não foi dispensado.
DN (via urgente e expedita)»;
- Por requerimento entrado em juízo em 05-07-2020 (referência 26200925, a fls. 2741 a 2744), vieram os recorrentes, após notificação dos supramencionados despachos de 23-06-2020 (referência 415271677, a fls. 2673) e de 30-06-2020 (referência 415489539, a fls. 2713), informar que vêm exercer o contraditório, alegando que nos presentes autos não se perspectiva qualquer necessidade de protecção de testemunhas, nem tal necessidade alguma vez foi considerada pelo Tribunal em despacho devidamente fundamentado, não estando em causa criminalidade violenta ou altamente organizada ou terrorismo, nem havendo notícia de ameaças, pressões ou intimidação sobre testemunhas arroladas nos autos.
Entendem os ali requerentes (aqui recorrentes) que a adopção de tal medida de protecção só tem justificação legal quando verificada alguma das situações previstas do n.º 2 do art. 139.º do CPPenal, o que no caso não acontece.
Concluem que a decisão dada, de audição das testemunhas com ocultação de identidade e imagem, contraria aquele requisito, assim como a estrutura acusatória do processo penal e o princípio do contraditório, mostrando-se violados os arts. 138.º, n.º 3, e 139.º, n.º 2, a contrario, do CPPenal, bem como o art. 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.
Informam que, sem prejuízo de recurso que venham a interpor, recusam-se a participar activamente na audiência de julgamento agendada para inquirição de tais testemunhas;
- Com vista no processo, a 06-07-2020 (referência 415698407, a fls. 2765 a 2766), o Ministério Público pronunciou-se nessa mesma data sobre o requerimento de 05-07-2020 apresentado pelos arguidos, afirmando a legalidade da decisão de audição dos agentes da PSP nos termos indicados por ter sido expressamente invocado nesse despacho o art. 19.º do DL 243/2015, de 19-10, tendo sido igualmente determinado que as testemunhas a inquiridas fossem previamente ajuramentadas e identificadas no Tribunal a partir do qual se vier a realizar a videoconferência;
- A 07-07-2020 o Ministério Público deu entrada em juízo a aditamento à promoção antecedente (referência 26216339, a fls. 2769 a 2773), onde a dado passo escreveu o seguinte:
«O Ministério Público, em promoção datada de 6 de Julho de 2020, tomou posição propugnando pela realização das inquirições dos referidos operacionais do NAOP nos moldes determinados pelo Tribunal Colectivo.
Todavia, admitindo a possibilidade de o Tribunal eventualmente poder vir a alterar os termos em que inicialmente determinou a inquirição dos referidos operacionais, o signatário comunicou tal possibilidade ao indicado Departamento de Investigação Criminal.
Em reacção à comunicação de tal possibilidade, veio o signatário a recepcionar ofício datado de 6 de Julho de 2020, assinado pelo Exmo. Senhor Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, expondo os fundamentos para a não revelação da identidade dos sete operacionais do NAOP a inquirir por videoconferência nos autos, nos termos e ao abrigo do disposto no art.º 16.º, da Lei de Protecção de Testemunhas – Lei n.º 93/99, de 14 de Julho, dando-se aqui por integralmente reproduzido o teor do referido ofício que adiante se junta.
Como ali refere o Exmo. Senhor Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, os operacionais do NAOP desempenham missões de seguimento e vigilância, em investigações que envolvem perigo para os investigadores não só em função das características dos investigados e aos crimes por estes levados a cabo, mas também pela natureza das missões a cargo daqueles operacionais.
Igualmente salienta que para garantir a segurança das operações que habitualmente aquelas equipas desenvolvem e, acima de tudo, para garantir a segurança dos próprios operacionais, vem sendo habitualmente solicitada a sua audição em julgamento com salvaguarda da respectiva identidade, sendo o depoimento prestado sem qualquer alteração para além da ocultação da imagem do operacional a inquirir.
Vem invocado o princípio da protecção física dos operacionais envolvidos, bem como dos respectivos familiares, uma vez que o depoimento a prestar resulta de contacto directo com a criminalidade, subsistindo perigo objectivo de represálias contra a vida, contra a integridade física ou para bens patrimoniais dos próprios operacionais e dos seus familiares.
Salienta por fim o Exmo. Senhor Director Nacional da Polícia de Segurança Pública a existência de diversos exemplos internacionais de operacionais e seus familiares directamente afectados por represálias apenas concretizadas após divulgação da identidade de operacionais envolvidos em acções de investigação do foro criminal.»
Nesse requerimento, o Ministério Público considera ainda que o depoimento a prestar por estes operacionais se enquadra no âmbito da Lei de Protecção de Testemunhas (Lei 93/99, de 14-07), designadamente do seu art. 16.º, cujos requisitos entende cumpridos no caso dos autos.
Requereu, assim, que a inquirição dos sete operacionais do Núcleo de Apoio Operacional do Departamento de Investigação Criminal da PSP ocorra sem revelação das respectivas identidades e mediante videoconferência com distorção de voz e ocultação de imagem, nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 4.º, 5.º, 16.º e 19.º, n.º 1, da Lei de Protecção de Testemunhas.
Juntou o ofício remetido pelo Director Nacional da PSP;
- Com data de 07-07-2020, a Senhora Juiz titular do processo proferiu despacho (referência 415748449) onde determinou que se desse conhecimento à Defesa dos arguidos da posição do Ministério Público que antecede, quer na vista aberta no processo, quer no requerimento com aditamento, conferindo 24 horas para querendo se pronunciarem;
- A 08-07-2020, os arguidos deram entrada em juízo a requerimento (referência 26232464, a fls. 2784 a 2789) onde mais uma vez manifestaram a sua oposição à audição das testemunhas com ocultação de identidade e imagem, alegando que «[n]enhum dos crimes pelos quais se encontram pronunciados os Arguidos constam da enumeração feita pela al. a) do artigo 16 da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho, contrariamente ao sustentado pelo Senhor Procurador da República, a fls. 3 da sua promoção de 7 de Julho corrente».
Consideram que uma decisão que acolha a posição do Ministério Público ofenderá «gravemente os direitos dos Arguidos, legalmente previstos nos artigos 138º, n.º 3, 139º, n.º 2 “a contrario” do C. P. Penal, no artigo 16º, al. a) da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho e no artigo 32º, n.º 5 da C. R.P.», estando, por isso, ferido de ilegalidade e inconstitucionalidade material.
Mais uma vez informam que não «intervirão (…) na inquirição dessas testemunhas, para que se não possa concluir que acabaram por consentir que elas tenham deposto com ocultação da sua imagem e identidade»;
- Na mesma data de 08-07-2020, o Colectivo de Juízes proferiu a seguinte decisão (referência 415818488, a fls. 2791 a 2796):
«Na sequência das deliberações tomadas pelo Tribunal Coletivo, proferidas ao abrigo do nº1, do art.º 19º, do DL 243/15, de 19.10, veio a defesa dos arguidos opor-se à inquirição das testemunhas da NAOP com recurso à ocultação de imagem e identidade, através de videoconferência, mas em instalações de um Tribunal, sendo a identificação verificada por um Juiz de Direito, não obstante a imediação e oralidade ser garantida através da colocação das questões por videoconferência, pelos sujeitos processuais a NAOPS com identidades codificadas apenas para este Tribunal e demais sujeitos processuais, por referencia àquelas testemunhas, dando-se aqui por reproduzidos os argumentos ali alinhados.
Exercido o contraditório do MP em 24horas, foi dado igual prazo à defesa, uma vez que não foi apenas requerida a manutenção do decidido como ainda foi apresentado requerimento, onde por apelo à Lei de proteção de testemunhas, 93/99, de 14.07, no seu artigo 16º, e demais dispositivos da mesma, requer aquele Magistrado a tomada de depoimento a sete testemunhas da NAOP com ocultação de imagem e distorção de voz, como solicitado pelo Diretor Nacional da Policia da Segurança Pública, juntando oficio para tanto remetido.
Veio a defesa pronunciar-se pugnando pelo indeferimento do promovido.
**
Cumpre após deliberação decidir:
Em complemento com o já deliberado por este Tribunal coletivo, afigura-se ser de complementar a deliberação tomada, com os factos e os seguintes fundamentos de direito.
Na sequência da inquirição da testemunha AE… durante a sessão da audiência de julgamento realizada no dia 22 de Junho de 2020 requereu a defesa dos arguidos que o Tribunal diligenciasse no sentido de obter a identificação dos membros das equipas de vigilância policial que produziram os relatórios de vigilância indicados como meios de prova na acusação e subsequente pronúncia e, bem assim, fosse igualmente obtida a identificação dos autores das fotografias que documentam tais relatórios de vigilância.
Logo desde o inicio esta testemunha deu nota de que os efetivos da PSP que colaboravam nas diligencias, eram de si desconhecidos, tinham nomes de código e apenas através da diretoria Nacional era possível, obter autorização para que depusessem, sendo que “ab inicio” tais condições atenta a natureza da missão destes e a criminalidade em investigação, de natureza transnacional exigia medidas de proteção de imagem e distorção de voz.
Foram encetadas diligencias para satisfazer o pretendido pela defesa, mas o resultado alcançado não a satisfez, como resulta da oposição manifestada, e para onde nos remetemos.
Em face da oposição da defesa veio o Ministério Público requerer que as inquirições dos sete operacionais do Núcleo de Apoio Operacional, do Departamento de Investigação Criminal da PSP, sedeado em Lisboa, que estão designados para serem ouvidos nos autos, a realizar na sessão da audiência de julgamento do próximo dia 9 de Julho de 2020, ocorra sem revelação das respectivas identidades e mediante videoconferência com distorção de voz e ocultação de imagem, tudo nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas do art.° 16º e dos art.°s 4º e 5º ex vi art.° 19º, nº 1, da Lei de Proteção de Testemunhas, Lei nº 93/99, de 14 de Julho, com fundamento em oficio remetido pelo Exmo. Senhor Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública, que através dele pede a intervenção do MP no sentido de assim requerer, para garantir a continuação da operacionalidade destas testemunhas e salvaguarda-las na sua vida, integridade física e ainda seus familiares, atenta a criminalidade que investigam, através do recurso a este mecanismos protetivo.
Assim o Ministério Público alinha com o pedido que lhe foi remetido pelo Exmo. Senhor Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, veio requerer a diligencia de inquirição nos termos, solicitados.
Apreciando:
É uma realidade que pelo estatuto invocado na última deliberação deste Tribunal Coletivo, as testemunhas são operacionais do NAOP que desempenham missões de seguimento e vigilância, em investigações que envolvem perigo para os investigadores, não só em função das características dos investigados, dos crimes por estes levados a cabo, mas também pela natureza das missões a cargo destas testemunhas.
Estas equipas investigam por via de regra criminalidade altamente organizada, mas não só igualmente criminalidade violenta onde para além de outras vertentes se tutela a vida e a integridade física das pessoas e que seja punida com pena de prisão punida igual ou superior a oito anos.
Os arguidos pronunciados são perigosos, funcionam como um grupo, - georgiano – e onde não obstante da acusação não estar em causa a pratica por estes de um crime de associação criminosa, havemos de ponderar que estes têm imputado um plano e um “modus operandi” que transcendem na sua execução ao não se ficarem pelo limite da lesão da propriedade, vão além dela colocando em causa a integridade física, de ofendidos, quando surpreendidos em flagrante delito, que ofendem na sua integridade física, para se manterem na posse dos artigos subtraídos, daí estarem acusados também de roubo impróprio, p. e p. com pena de prisão de 3 a 15 anos, pois previstos no artigo 203º, nº2, alínea e) do artigo 204, 1 e 2 b) e 211ºdo Código Penal, isto é criminalidade violenta e até especialmente violenta, por aplicação do nº2, do artigo 139º, e nº1 al. l) do Código Penal, sendo certo que o Tribunal coletivo não está vinculado a esta qualificação jurídica.
Há arguidos acusados por dezoito crimes, onde não está apenas em causa apenas o património p. e p. pelo nº2, alínea e) do artigo 204 punida com prisão de 2 a 8 anos, mas também a violência após subtração e detenção de arma proibida.
Mostra-se invocado o princípio da proteção física dos operacionais / testemunhas envolvidas, bem como dos respetivos familiares, uma vez que o depoimento a prestar resulta de contacto direto com a criminalidade, subsistindo perigo objetivo de represálias contra a vida, contra a integridade física ou para bens patrimoniais dos próprios operacionais/testemunhas e dos seus familiares.
Na situação em apreço existe este risco potencial, pois nem todos os arguidos estão a ser julgados em simultâneo, existem arguidos não privados da liberdade, porque com paradeiro desconhecido, e existem pessoas que não se lograram identificar a operar no âmbito desta criminalidade georgiana, que atua em pequenos grupos com muita mobilidade, que não têm objecção em recorrer à violência contra a integridade física e quiçá vida, para levarem por diante os furtos no interior de residências de alta relojoaria, joalharia, dinheiro, com estudo de rotinas dos alvos a que dirigem a sua atividade, mas estes arguidos tem relações familiares e permanecem em território nacional por terem constituído família, como é o caso em relação a alguns dos arguidos.
Nos autos os arguidos presos no período da sua reclusão sofreram já medidas disciplinares por agressões à integridade física a outro(s) recluso(s), no interior do Estabelecimento Prisional, revelando a sua perigosidade e desprezo pelas regras que têm que acatar, e já todos recorreram à violência física, agressões físicas, a reclusos, lesando a integridade física daqueles, apesar de recluídos, tendo sido alvo de sanções disciplinares, revelando dificuldade no acatamento das regras vigentes, que têm que ser asseguradas no interior do E.P.
Para além do mais, os arguidos que estão a ser julgados não se abstiveram de adotar condutas para desestabilização da audiência de julgamento, que de imediato foram atalhadas.
A fim de se garantir a segurança das operações que aquelas equipas desenvolvem e, que nestes autos colaboraram, acima de tudo, para garantir a segurança dos próprios operacionais, que são policias, impõe-se ser solicitada a sua audição em julgamento com salvaguarda da respectiva identidade, sendo o depoimento prestado sem qualquer alteração para além da ocultação da imagem do operacional a inquirir.
Não desconhecemos existirem diversos exemplos internacionais de operacionais – testemunhas- e seus familiares diretamente afetados por represálias apenas pela concretização da divulgação da identidade de operacionais envolvidos em ações de investigação do foro criminal, o que o Ministério Publico invoca atento o oficio em que funda o seu requerimento.
Resulta ainda que os arguidos se mantêm em contatos com o exterior através de familiares, seus com mobilidade e que estão pronunciados por recetação dos artigos furtados, isto é, de desenvolverem um crime que acarreta a manutenção, consolidação ou perpetuidade de uma situação patrimonial anormal, decorrente de um crime anterior praticado por outrem. Isto é desenvolvem um crime parasitário dos furtos e da violência após subtração.
Em face do exposto, prescreve o art.° 16.°, da Lei de Proteção de Testemunhas que “a não revelação da identidade da testemunha pode ter lugar durante alguma ou em todas as fases do processo se estiverem reunidas cumulativamente as seguintes condições: a) O depoimento ou as declarações disserem respeito a crimes de tráfico de pessoas, de associação criminosa, de terrorismo, de terrorismo internacional ou de organizações terroristas ou, desde que puníveis com pena de prisão de máximo igualou superior a oito anos, a crimes contra a vida, contra a integridade física, contra a liberdade das pessoas, contra a liberdade ou autodeterminação sexual, de corrupção, de burla qualificada, de administração danosa que cause prejuízo superior a 10 000 unidades de conta, ou cometidos por quem fizer parte de associação criminosa no âmbito da finalidade ou atividade desta;
Como vimos a criminalidade que está a ser julgada integra-se nesta alínea como acima deixamos consignado, em virtude da agressividade dos arguidos, da violência dirigida contra a integridade física de ofendidos (e até reclusos) daí estar em causa o roubo impróprio, bem assim como das posturas que vêm sendo assumidas.
b) A testemunha, seus familiares, a pessoa que com ela viva em condições análogas às dos cônjuges ou outras pessoas que lhes sejam próximas correrem um grave perigo de atentado contra a vida, a integridade física, a liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado;
Igualmente o facto de a testemunha ser colocada em contacto com estes agentes destes crimes, que não estão a ser julgados em simultâneo, por estar um por localizar e outro pelo menos por identificar, tendo contatos com o exterior através de familiares, revela-se em concreto um perigo potencial para as testemunhas que levaram a cabo estas diligencias e que contribuíram para a sua detenção, tendo-se revelado necessária que as chefias e o nucelo do norte da DIC-PSP se expusesse por ter levado a cabo as detenções e diligencias de busca e apreensões.
Não ser fundadamente posta em dúvida a credibilidade da testemunha;
De facto, não se revelaram duvidas respeitantes à fiabilidade destes NAOP que pelas suas funções não têm interesse no desfecho da causa, pois em colaboração do núcleo da DIC-Porto, com menos meios para a investigação destes casos, sendo uma unidade apenas dirigida para este tipo de criminalidade, que tanta intranquilidade social é capaz de criar nas populações.
Sendo as testemunhas operacionais do Núcleo de Apoio Operacional, do Departamento de Investigação Criminal da PSP, não se vislumbram quaisquer fundamentos para perspetivar vir a colocar em causa a credibilidade dos seus depoimentos, ( aI. c), do citado art.º 16)
O relevo probatório dos depoimentos a prestar (aI. d), do art.° 16.°), o mesmo ficou devidamente evidenciado na sequência da inquirição das testemunhas AE… e L…, mostrando-se pedida pela defesa, e será a valorar a final nos termos desta lei, que impõe limites de valoração.
Por outo lado, prescreve o art.° 19.°nº 1, da Lei de Proteção de Testemunhas que “a testemunha a quem for concedida a medida de não revelação de identidade pode prestar depoimento ou declarações com recurso à ocultação de imagem ou à distorção da voz ou à teleconferência, nos termos do disposto nos artigos 4.ºe 5.º”.
Em face do que vimos expondo estão verificados os pressupostos ainda do art.º 4º e 5º, da Lei de proteção de testemunhas, já que como vimos são ponderosas as razões que fundam a proteção dos NAOP e o justificam e ainda porque se trata da produção de prova de crime que está a ser julgado pelo tribunal coletivo justifica a videoconferência.
Face ao exposto, delibera este Tribunal Coletivo em deferindo ainda que com outros fundamentos de facto, o requerido pelo Ministério Público permanecendo com os fundamentos estatutários, defere-se a realização das inquirições dos sete operacionais do Núcleo de Apoio Operacional, do Departamento de Investigação Criminal da PSP, sedeado em Lisboa, já identificados nos autos, a realizar na sessão da audiência de julgamento do próximo dia 9 de Julho de 2020, ocorra sem revelação das respetivas identidades e mediante videoconferência com distorção de voz e ocultação de imagem, tudo nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas do art.° 16º e dos art.°s 4º e 5º ex vi art.° 19º, nº 1, da Lei de Proteção de Testemunhas, Lei nº 93/99, de 14 de Julho, na sua versão atualizada.
Notifique comunique de imediato esta deliberação em aditamento, ao já solicitado, a fim de ser aditado como fundamento à inquirição a realizar.
Porto, ds»;
- Na sessão de julgamento de 09-07-2020 foram ouvidas nos termos indicados 6 (seis) das sete (7) testemunhas mencionadas, sendo dispensada a última.

A questão resume-se, pois, em saber se no caso concreto, podia ter ocorrido a audição das testemunhas nos termos indicados nas decisões de 30-06-2020 e de 08-07-2020, este em complemento do primeiro, ou se a prova assim produzida deve ser considerada inválida e de nenhum efeito, como pretendem os recorrentes.
Como se vê das duas decisões referidas, o Tribunal a quo abordou a questão por duas vias: por um lado, fazendo apelo ao Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública (DL 243/2015, de 19-10) e, por outro, remetendo para a Lei de Protecção de Testemunhas (Lei 93/99, de 14-07).
No que concerne ao primeiro diploma, resulta do disposto no seu art. 19.º que os polícias podem ser temporariamente dispensados da necessidade de revelar a sua identidade e qualidade, meios materiais e equipamentos utilizados (n.º 1) e aos polícias envolvidos em acções policiais ou em acções determinadas por autoridade judiciária competente pode ser determinado o uso de um sistema de codificação da sua identidade policial (n.º 3), sendo certo que as autorizações da dispensa temporária de identificação e da codificação referidas nos n.ºs 1 e 2 são da competência do director nacional (n.º 4).
Ora, a fls. 2774 a 2775 foi junto aos autos pelo Ministério Público, em anexo ao aditamento à promoção realizada nos autos a propósito desta matéria, uma comunicação do Director Nacional da Polícia de Segurança Pública onde é retratado o contexto de funcionamento dos operacionais do Núcleo de Apoio Operacional (NAOP), serviço integrado no Departamento de Investigação Criminal da Direcção Nacional (DIC/DN), que no caso concreto deram apoio à investigação dos autos levada a cabo pela DIC (Divisão de Investigação Criminal) do Porto.
Aí é esclarecido que «[o]s operacionais do NAOP desempenham missões de seguimento e vigilância, em investigações que envolvem especial complexidade e perigo para os investigadores, quer pelas características inerentes aos investigados e ao crime em execução, quer pela natureza da sua missão no que concerne à recolha da prova». Por tal razão, «[d]e modo a garantir a segurança das operações, e em particular a segurança dos operacionais, é habitualmente solicitada a sua audição em julgamento, salvaguardando a sua identidade» com ocultação da imagem.
Mais se acrescenta que tal actividade «envolve o contacto directo com a criminalidade organizada e de origem transnacional, subsistindo um perigo objectivo da existência de represálias contra a vida, a integridade física ou para os bens patrimoniais dos envolvidos» nas diligências de investigação, pelo que a divulgação da identidade dos operacionais do NAOP colocá-los-á em risco, bem como às suas famílias.
Por isso, é solicitada a sua audição nos termos do art. 16.º da Lei de Protecção de Testemunhas.
O que esta missiva revela, antes de tudo, é que o Director Nacional da PSP, a quem compete a autorização para dispensa temporária de identificação de policiais e utilização de sistema de codificação de identificação, não só confirma essa autorização como, preocupado com a segurança dos seus operacionais e famílias, solicita que a respectiva audição em Tribunal não coloque em causa a ocultação da identidade dos mesmos, essencial à prossecução da actividade dos referidos operacionais.
Porém, uma vez que o DL 243/2015, de 19-10, ainda aguarda por regulamentação através de portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna quanto à matéria da dispensa temporária de identificação e do respectivo sistema de codificação (n.º 3 do art. 19.º), poder-se-á equacionar se os elementos fornecidos serão suficientes para a manutenção da ocultação da identidade dos operacionais em causa, embora substancialmente a sustentem.
É aqui que entronca a segunda vertente da fundamentação da decisão aqui apreciada, isto é, o recurso à Lei de Protecção de Testemunhas.
Este diploma (Lei 93/99, de 14-07) regula a aplicação de medidas para protecção de testemunhas em processo penal quando a sua vida, integridade física ou psíquica, liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado sejam postos em perigo por causa do seu contributo para a prova dos factos que constituem objecto do processo (art. 1.º, n.º 1), entendendo-se como testemunha qualquer pessoa que, independentemente do seu estatuto face à lei processual, disponha de informação ou de conhecimento necessários à revelação, percepção ou apreciação de factos que constituam objecto do processo, de cuja utilização resulte um perigo para si ou para outrem, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo anterior (art. 2.º, al. a)).
Daqui resulta que o estatuto de OPC das testemunhas que foram ouvidas com ocultação de identidade não inibe a aplicação do diploma.
De acordo com o art. 16.º da mencionada Lei:
«A não revelação da identidade da testemunha pode ter lugar durante alguma ou em todas as fases do processo se estiverem reunidas cumulativamente as seguintes condições:
a) O depoimento ou as declarações disserem respeito a crimes de tráfico de pessoas, de associação criminosa, de terrorismo, de terrorismo internacional ou de organizações terroristas ou, desde que puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a oito anos, a crimes contra a vida, contra a integridade física, contra a liberdade das pessoas, contra a liberdade ou autodeterminação sexual, de corrupção, de burla qualificada, de administração danosa que cause prejuízo superior a 10.000 unidades de conta, ou cometidos por quem fizer parte de associação criminosa no âmbito da finalidade ou actividade desta;
b) A testemunha, seus familiares, a pessoa que com ela viva em condições análogas às dos cônjuges ou outras pessoas que lhes sejam próximas correrem um grave perigo de atentado contra a vida, a integridade física, a liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado;
c) Não ser fundadamente posta em dúvida a credibilidade da testemunha;
d) O depoimento ou as declarações constituírem um contributo probatório de relevo».

Os recorrentes, em rigor, apenas invocam que a decisão recorrida constitui uma flagrante e despudorada violação do disposto nos arts. 138.º, n.º 3, e 139.º, n.º 2, a contrario, do CPPenal, art.º 16.º, al. a), da Lei 93/99, de 14-17, e art. 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.
Mas não explicam as razões da sua alegação.
O art. 138.º, n.º 3 do CPPenal estabelece as regras sobre a inquirição, determinando que [a] inquirição deve incidir, primeiramente, sobre os elementos necessários à identificação da testemunha, sobre as suas relações de parentesco e de interesse com o arguido, o ofendido, o assistente, as partes civis e com outras testemunhas, bem como sobre quaisquer circunstâncias relevantes para avaliação da credibilidade do depoimento e [s]eguidamente, se for obrigada a juramento, deve prestá-lo, após o que depõe nos termos e dentro dos limites legais.
Por seu turno, art. 139.º do CPPenal, sob a epígrafe «Imunidades, prerrogativas e medidas especiais de protecção», para além que prever no seu n.º 1 que [t]êm aplicação em processo penal todas as imunidades e prerrogativas estabelecidas na lei quanto ao dever de testemunhar e ao modo e local de prestação dos depoimentos, salvaguarda no n.º 2 a protecção das testemunhas e de outros intervenientes no processo contra formas de ameaça, pressão ou intimidação, nomeadamente nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, remetendo para a forma como é regulada em lei especial.
Em qualquer dos casos, fica assegurada a possibilidade de realização do contraditório legalmente admissível no caso (n.º 3).

Para que seja reconhecida razão aos recorrentes é necessário, por isso, que a lei especial de protecção de testemunhas não tenha sido cumprida ou que não tenha sido dada a possibilidade de ser exercício o contraditório.

Resulta da análise do citado art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07, que a ocultação da identidade da testemunha pode ter lugar em qualquer fase do processo, incluindo a de julgamento, desde que estejam reunidos cumulativamente os quatro requisitos previstos nas alíneas a) a d).
A decisão colegial de 08-07-2020 aborda todos estes pressupostos dando resposta fundamentada e positiva à verificação dos requisitos indicados.
Concordamos com tal apreciação, que já se deixou transcrita, pelo que conferiremos apenas sumariamente tópicos relevantes para cada um desses requisitos.
Assim, quanto à alínea a) importa relembrar que os arguidos foram submetidos a julgamento pronunciados globalmente pela prática de crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, al. e), do CPenal, violência depois da subtracção, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 203.º, n.º 1, 204.º, n.º 2, al. e), 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e 211.º, todos do CPenal, detenção de arma proibida, p e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), por referência ao art. 3.º, n.º 2, al. e), da Lei n.º 5/2006, de 23-02, falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º, n.ºs 1, al. f), e 3 do CPenal, e receptação dolosa p. e p. pelo art. 231.º, n.º 1, do CPenal.

O crime de violência depois da subtracção imputado é punido com uma pena de 3 (três) a 15 (quinze) anos de prisão e, embora inserido no capítulo dos crimes contra a propriedade, integra elementos próprios da ofensa à integridade física e à liberdade de decisão e de acção (através da ameaça, da colocação na impossibilidade de resistir e/ou da violência, sendo que esta última pode colidir igualmente com a liberdade de movimentos), bens jurídicos que encontram a devida protecção neste tipo legal, que consome outros que protegem isoladamente tais bens jurídicos[7].
Mostra-se, pois, verificado o pressuposto inscrito na alínea a) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07, concretamente a circunstância de no processo estar imputado aos arguidos crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a oito anos, respeitante a crime, para além do mais, contra a integridade física e contra a liberdade das pessoas, tendo as testemunhas participado na investigação que culminou com a imputação da prática deste e de outros crimes.
Quanto ao grave perigo de atentado contra a vida ou a integridade física dos agentes e/ou seus familiares (al. b) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07) importa realçar, como o fez o Tribunal a quo, a qualidade e especial missão destes agentes da PSP cuja identidade no âmbito da actividade criminosa grave e sensível colocará em risco sérios os bens jurídicos que se pretendem proteger com as medidas previstas no diploma.
O Tribunal a quo salientou adequadamente os reais perigos e riscos que para a integridade física dos agentes poderá decorrer da exposição da sua identidade, pelas razões expostas, designadamente quanto à dinâmica dos crimes e personalidade dos arguidos destes autos reflectidas nos factos imputados (causas intraprocessuais), mas também no respectivo comportamento no âmbito do sistema prisional, de que é dada nota.
Mas, para além desses, não se pode olvidar que no universo da criminalidade, com especial enfoque para este tipo de criminalidade que os agentes da PSP do NAOP normalmente investigam, complexa, organizada, muitas vezes transnacional, os pontos de intersecção com várias áreas da delinquência são inevitáveis, e o risco de perigo grave para a integridade física por causas externas é igualmente uma realidade.
Veja-se que a organização, planeamento e logística presentes no cometimento dos crimes dos autos não está desligada de contactos transnacionais (deslocalização de bens furtados para o estrangeiro), havendo igualmente arguidos em paradeiro desconhecido.
Mostra-se, pois, acertado o reconhecimento de que os policiais ligados à investigação pertencentes ao NAOP correriam grave perigo de atentado contra a vida ou a integridade física caso as suas identidades fossem reveladas.

Relativamente ao pressuposto de não ser, fundadamente, posta em dúvida a credibilidade da testemunha (al. c) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07), é de acolher a avaliação de credibilidade que consta da decisão de 08-07-2020.
Nem os recorrentes, em boa verdade, avançam qualquer justificação para suspeitarem da credibilidade destes agentes da PSP, operacionais que foram acreditados pelo Director Nacional da PSP, em consonância com as suas atribuições previstas no DL 243/2015, de 19-10.
Não vislumbramos, pois, razões para que seja posta em causa a credibilidade destas testemunhas e tal não foi feito, fundadamente, pelos recorrentes.

Por último, os recorrentes também não infirmaram o relevo probatório destes depoimentos (al. d) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07) e a argumentação da decisão de 08-07-2020 a este propósito confirma-a, sendo certo que foi a própria Defesa dos arguidos quem viu interesse na inquirição destes operacionais, como se realça naquela decisão.

Conforme resulta da acta de julgamento de fls. 2809 a 2820 (sessão de 09-07-2020) e do auto de diligência de fls. 2832 a 2833, e em consonância com o disposto nos arts. 4.º e 5.º da Lei 93/99, de 14-07, as testemunhas foram inquiridas por videoconferência, com ocultação de identidade e apenas com distorção de imagem, posto que a distorção de voz não foi possível por problemas técnicos.
Prestaram juramento perante juiz que presidiu a tal diligência.
A realização das inquirições nos termos descritos cumpriu os requisitos necessários previstos no diploma e assegurou a realização do contraditório, de forma a garantir o justo equilíbrio entre as necessidades de combate ao crime e o direito de defesa (art. 1.º, n.º 5, da Lei 93/99, de 14-07).
A inquirição foi, por isso, realizada, em consonância com o disposto nos arts. 139.º, n.º 2, do CPPenal (que excepciona o cumprimento do art. 138.º, n.º 3) e 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.
A Defesa dos arguidos só não se pôde inteirar das características faciais das testemunhas e do seu nome e outros elementos de identificação.
Mas o mais importante no depoimento de uma testemunha, em particular de agentes da autoridade, mais do que saber como é a sua cara ou por que nome é chamado, é perceber o que ela sabe, porque sabe e em que condições adquiriu o conhecimento dos factos.
Toda esta panóplia de informações estava à disposição da Defesa dos arguidos no sentido de poder exercer plenamente o contraditório, colocando as questões que considerasse pertinentes em face das informações que iam sendo prestadas pelas testemunhas.
O facto de a Defesa dos arguidos ter optado por não inquirir estas testemunhas é uma escolha que só a si pode ser imputada, jamais podendo atribuir-se ao Tribunal de julgamento qualquer tipo de entrave ao exercício do contraditório quanto às apontadas testemunhas.
Face ao exposto, não se reconhece razão aos recorrentes na questão colocada neste recurso interlocutório, que, por isso, deve improceder.
*
A2. Recurso que recai sobre a decisão de 09-07-2020, com a referência 415858659, que, «na sequência da defesa dos Arguidos ter suscitado o incidente de recusa do tribunal (…) determinou ainda assim o prosseguimento do julgamento».
Através deste recurso, pretendem os recorrentes que não seja considerada para qualquer efeito a prova produzida na sessão de julgamento de 09 de Julho após incidente de recusa do Colectivo de Juízes por si suscitado.
Vejamos o contexto em que foi proferida a decisão recorrida:
- No dia 09-07-2020, antes do início da sessão de julgamento designada para essa data, os arguidos, aqui recorrentes, vieram suscitar, ao abrigo do disposto nos arts. 43.º a 46.º do CPPenal, o incidente de recusa dos elementos que compunham o Colectivos de Juízes que vinha procedendo ao julgamento dos autos, fundamentando tal pedido com o comportamento daqueles elementos ao longo do julgamento, em especial da Presidente do Colectivo, comportamento que suscitava na sua perspectiva fundados receios quanto à sua imparcialidade para julgar, adoptando uma postura supletiva do Ministério Público, completando as instâncias do mesmo e desempenhando um papel claramente inquisitório.
Identificam como exemplo de tal atitude toda a tramitação e decisão proferida a propósito da audição de testemunhas com ocultação de identidade e imagem, questão que foi tratada no recurso intercalar antecedente (cf. apenso de recusa).
- No início da sessão de julgamento que decorreu no dia 09-07-2020 (referência 415858659, a fls. 2809 a 2820), a Senhora Juiz Presidente, após deliberação do Colectivo de Juízes, proferiu o seguinte despacho:
«Em face da apresentação do requerimento de recusa deste Coletivo, autue-se o mesmo por apenso a fim de, em cinco dias, este Tribunal Coletivo responder e dar-lhe a respetiva tramitação legal.-
Deliberou ainda mais o Tribunal Coletivo, que nos termos do nº 2, do art. 45º, do C.P.P. e, apesar de apresentado o requerimento de recusa das Juizes deste Tribunal Coletivo, às mesmas caberá neste momento diligenciar pela prática não só de atos urgentes no processo, como também dos necessários para assegurar a continuidade da audiência.-
Considerando o Tribunal Coletivo a natureza urgente dos presentes autos que tem arguidos presos à ordem e a necessidade da salvaguarda da prova produzida, deliberou dever continuar a audiência de discussão e julgamento procedendo ao cumprimento da ordem de trabalhos que estava agendada.-
Notifique.- »
- Na sequência desta decisão, a Defesa dos arguidos invocou a ilegalidade da inquirição de testemunhas convocadas para aquela data por ocorrer após ter sido suscitado incidente de recusa do Colectivo de Juízes;
- Seguidamente, a Senhora Juiz Presidente, após deliberação do Colectivo de Juízes, proferiu o seguinte despacho:
«Independentemente do desfecho que venha a ter o incidente de recusa e ainda os fundamentos do protesto agora lavrado, decorre dos princípios constitucionais do Estado de Direito Democrático e da proteção dos direitos fundamentais, o direito que os arguidos têm a uma decisão judicial em prazo razoável, e ainda que deverá ser efetiva e célere o exercício da ação penal.-
No conceito de atos processuais urgentes indispensáveis, inscrevem-se os que se destinam ao não prolongamento da prisão preventiva, para além do estritamente necessário, como ainda outros que visem assegurar os valores inerentes à efetividade e celeridade do exercício da ação penal, desde logo conservação de provas, tomada de depoimentos, obstando ao entorpecimento do processo, por isso, é entendimento deste Tribunal Coletivo que não obstante o recebimento do pedido de recusa que mandou autuar, cabe-lhe assegurar a continuação da audiência de discussão e julgamento, não advindo daí nenhum prejuízo para os arguidos, nem para o pleno exercício dos direitos de defesa, atenta a válvula de segurança existente no nº 5, do art.º 43º, quando à sindicância que virá a ser feita acerca da validade dos atos por este Tribunal recusado praticados.-
Em face do exposto e sem mais considerandos extraia-se não só do incidente de recusa, bem como dos requerimentos dirigidos a este Tribunal pelo Exmo Mandatário dos arguidos, dirigidos a este Tribunal, em particular a Srª Juiz Presidente e ao Sr. Procurador a fim de em virtude tão eloquente e elogioso tratamento dirigido ao Tribunal e aí vertido, virem a ser remetidos à Ordem dos Advogados a fim de apreciar a urbanidade constante dos mesmos no desenrolar da audiência de discussão e julgamento.-
DN.-»
- Antes de se dar inicio à inquirição da testemunha identificada sob o n.º 1, por ir depor através de videoconferência com ocultação de identidade e distorção de imagem, a Defesa dos arguidos arguiu a nulidade da inquirição da testemunha;
- Seguidamente, a Senhora Juiz Presidente, após deliberação do Colectivo de Juízes, proferiu o seguinte despacho:
«Ainda não foi prestado qualquer depoimento e o Tribunal renova os termos do despacho proferido no sentido do deferimento da tomada de depoimento a todas estas testemunhas pela forma que irá ser tomada nesta audiência de discussão e julgamento, o qual se entende não estar ferida de qualquer nulidade.-
Uma vez que o Tribunal já anteriormente, no início desta audiência de discussão e julgamento, tomou posição sobre a aplicabilidade do nº 2, do art. 45º, do C.P.P., na medida em que deliberou ter que praticar todos os atos necessários para assegurar a continuidade da audiência de discussão e julgamento renova-se tal despacho, sendo certo que já anteriormente admitiu a inquirição destas testemunhas ao abrigo do disposto no art. 16º da Lei de Proteção de Testemunhas, pelo que, não se encontra o ato a praticar ferido de arguida nulidade.-
Notifique.-»
- Igual tramitação seguiu-se quanto à inquirição das testemunhas n.ºs 2 a 6, sendo renovado antes do início do depoimento de cada uma o requerimento e o despacho antecedentes;
- Nessa mesma sessão de julgamento de 09-07-2020 foram ouvidas com ocultação de identidade e distorção de imagem 6 (seis) das sete (7) testemunhas mencionadas, sendo dispensada a última, tendo sido ainda complementados e concluídos os depoimentos de outras duas testemunhas, estas inquiridas presencialmente;
- Por decisão de 07-08-2020 foi julgado improcedente o pedido de recusa apresentado pelos recorrentes.

A questão que é colocada neste recurso resume-se a saber se podia o Tribunal a quo ter produzido a apontada prova após ter sido suscitado o incidente de recusa do Colectivo de Juízes que procedia ao julgamento dos autos.
Na perspectiva dos recorrentes a resposta é negativa, pois aquela prova podia ser produzida após ser julgado o incidente de recusa, sendo por isso invalida, nos termos do art. 43.º, n.º 5, do CPPenal.
Vejamos.
Estabelece o n.º 5 do art. 43.º do CPPenal que «Os actos processuais praticados por juiz recusado ou escusado até ao momento em que a recusa ou a escusa forem solicitadas só são anulados quando se verificar que deles resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo; os praticados posteriormente só são válidos se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo.»
Por seu turno, determina o n.º 2 do art. 45.º, no CPPenal que «Depois de apresentados o requerimento ou o pedido previstos no número anterior, o juiz visado pratica apenas os actos processuais urgentes ou necessários para assegurar a continuidade da audiência.»

Os recorrentes fundamentam o seu recurso fazendo apelo ao disposto no art. 43.º do CPPenal, concretamente ao seu n.º 5.
Porém, como resulta do disposto nesse preceito, o aí determinado vale apenas para as situações em que o juiz é recusado, sendo dadas orientações sobre o que fazer relativamente aos actos pelo mesmo praticados.
Sendo julgado improcedente o pedido de recusa formulado nos autos pelos recorrentes perde pertinência a questão colocada no presente recurso, uma vez que o Colectivo de Juízes que levou a cabo a produção de prova a 09-07-2020 é aquele que, por decisão de 07-08-2020, ficou legitimado a prosseguir com o julgamento do processo.
Claro que, nos termos do disposto no art. 45.º, n.º 2, do CPPenal, o juiz visado pratica apenas os actos processuais urgentes ou necessários para assegurar a continuidade da audiência.
Porém, ainda que se conclua que a prova praticada na sessão de 09-07-2020 extravasa os limites do apontado preceito, a verdade é que não há razão para o mesmo Colectivo de Juízes, cuja suspeição de imparcialidade para o julgamento não foi reconhecida, tenha de repetir um acto que já praticou.
E nem se diga que a opção da Defesa não instar as testemunhas determina essa repetição, pois, como já se referiu, foi uma opção que só pode responsabilizar a Defesa, não podendo a Justiça ser onerada com repetição de actos, com toda a sobrecarga económica e logística que isso determina em função de uma opção que a Defesa tomou, mas sem respaldo em qualquer disposição normativa.
A decisão de julgar procedente ou não o incidente de recusa não dependia, naturalmente, de a Defesa ter ou não feito uso da instância respectiva para inquirição de testemunhas.
Por isso, tal tomada de posição não determina qualquer consequência processual.
De outro modo, estaria encontrada a fórmula para, no caso de não serem acolhidas as pretensões dos requerentes nos incidentes de recusa poder, pelo menos, ser retardada a conclusão dos julgamentos (em contexto idêntico aos dos autos), com todas as consequências que isso traria, designadamente, ao nível dos prazos de prisão preventiva, sendo a prolação de decisão condenatória em 1.ª Instância, como se sabe (art. 215.º do CPPenal), um marco importante para avaliar os prazos máximos de prisão preventiva.
No caso dos autos, estamos perante um processo com alguma dimensão, com múltipla prova para avaliar, sendo que na data em que deu entrada em juízo o incidente estava agenda a inquirição de nove testemunhas.
A circunstância de haver arguidos em prisão preventiva há cerca de um ano, razão pela qual o processo tem natureza urgente, é mais do que legitimadora para que neste caso se considere urgente a conclusão da produção de prova, por forma a habilitar o Tribunal a quo o mais celeremente possível, após a decisão do incidente, sendo caso disso, a proferir a decisão final.
Caso não se viesse a confirmar, total ou parcialmente a pronúncia, os arguidos mais cedo veriam a sua situação processual modificada, assim se salvaguardando adequadamente a respectiva situação de privação de liberdade.
E caso a decisão final viesse a ser de condenação, como foi, impedia-se, como efectivamente ocorreu, o retardamento desse momento que poderia fazer perigar a situação processual dos arguidos e por via disso o efectivo exercício da acção penal pelo Estado.
Mostrou-se, pois, adequada a decisão de não paralisar a produção de prova.
Mas se, pelo contrário, se viesse a confirmar a recusa do Colectivo de Juízes a posição da Defesa estaria salvaguardada, pois, aqui, sim, com propriedade, o art. 43.º, n.º 5, 2.ª parte, levaria a considerar que os actos processuais praticados posteriormente [ao incidente de recusa] só seriam válidos se não pudessem ser repetidos utilmente e se se verificasse que deles não resultava prejuízo para a justiça da decisão do processo[8].

Em face do exposto, é, pois, de julgar improcedente o presente recurso intercalar.
*
A3. Recurso da decisão que considerou não ser pertinente o pedido formulado pela Defesa de junção aos autos dos certificados de licenciamento das câmaras que registaram as imagens juntas aos autos e em que a acusação se suporta

Através do presente recurso pretendem os recorrentes, indirectamente, pôr em causa a validade dos fotogramas juntos aos autos, retirados de câmaras de videovigilância, uma vez que não ficou demonstrado o respectivo licenciamento junto da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), diligência que o Tribunal a quo entendeu não seria pertinente.
Segundo os recorrentes, tal prova é nula, não podendo ser considerada como prova relevante nos presentes autos, como decorre do disposto, conjugadamente, nos arts. 167.º, 188.º, n.º 4, e 190,º do CPPenal, na Lei 58/2019, de 08-08, e no art. 31.º da Lei 34/2013, de 16-05.
A questão colocada neste recurso remete-nos para a temática do direito à imagem e das limitações que o mesmo pode sofrer.
Vejamos antes a tramitação dos autos que culminou na interposição do presente recurso:
- No requerimento para abertura de instrução a questão da validade desta prova foi invocada pelos arguidos, tendo tal pretensão sido indeferida no despacho de pronúncia (referência 413987024);
- Também na contestação (referência 26008942, a fls. 2519 a 2519 a 2560) que apresentaram, os arguidos, aqui recorrentes, invocaram a nulidade dos fotogramas de fls. 171 a 182 do apenso A, por violação do disposto nos arts. 188.º, n.º 4, e 190.º do CPPenal, na Lei 58/2019, de 08-08, e no art. 31.º da Lei 34/2013, de 16-05, já que o sistema de videovigilância carece de prévia autorização da CNPD e tem de obedecer aos requisitos estabelecidos nos n.ºs 18.º, 19.º, 20.º e 21.º da Lei 58/2019, de 08-08, sendo certo que nenhuma informação existe nos autos quanto ao cumprimento de tais requisitos;
- Admitida a contestação por despacho de 16-06-2020 (referência 415031990, a fls. 2576), nada foi então abordado ou decidido quanto à questão da validade dos fotogramas retirados de sistemas de videovigilância;
- Na sessão de julgamento de 09-07-2020 (conforme acta de fls. 2809 a 2820, com a referência 415858659) a Defesa dos arguidos requereu que fosse recolhida informação no sentido de se apurar se as câmaras de videovigilância de onde foram recolhidos fotogramas que constam do processo estavam licenciadas e autorizadas a captar essas imagens;
- Por decisão proferida em acta, nessa mesma sessão de julgamento, o Tribunal a quo julgou que:
«A notificação dos proprietários das câmaras de videovigilância que as têm instaladas e em funcionamento e que captaram imagens no âmbito dos presentes autos para juntarem as autorizações pelo Comissão Nacional de Protecção de Dados para sua respetiva instalação e funcionamento não assumem relevância processual penal para o âmbito destes autos e valoração das imagens concretamente captadas não constituindo assim tais licenças elementos de prova relevantes para a boa decisão da causa, pelo que se indefere o requerido, ao abrigo do disposto no art. 340º, nº 4, al.b), do C.P.P., por não contaminarem a validade dessa prova.-
Notifique.- »

É desta decisão que recorrem os arguidos, considerando que a diligência de prova requerida é essencial para se apurar se os fotogramas juntos aos autos resultantes das imagens captadas por tais câmaras podem validamente ser ponderados como meio de prova.
O chamado direito à imagem é um direito com dignidade e protecção constitucional, conforme resulta do disposto no art. 26.º, n.º 1,[9] da Lei Fundamental, estando incluído no Capítulo I do Título II da Parte I da Constituição da República Portuguesa consagrado aos Direitos, liberdades e garantias pessoais.
De acordo com o disposto no art. 18.º da Constituição da República Portuguesa os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas (n.º 1) e a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos (n.º 2).
O mesmo preceito salvaguarda ainda que as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo, nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais (n.º 3).

Sobre o direito à imagem, determina o n.º 2 do art. 26.º da Constituição da República Portuguesa que «[a] lei estabelecerá garantias efectivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.»
E em termos mais genéricos, determina o art. 32.º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa que «[s]ão nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.»

O registo de imagem que é proporcionado por sistemas de videovigilância pode contender apenas com o direito à imagem mas também com o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar.
Estes direitos são distintos, ainda que possam ser sobreponíveis, o que ocorrerá quando a captação de imagem se verificar em circunstâncias que claramente lesem a reserva de intimidade da vida privada, como, por exemplo, uma gravação contra a vontade do visado que é realizada no interior do respectivo domicílio.
Neste caso, a protecção de que pode beneficiar o titular dos direitos lesados atinge a sua máxima expressão, sendo tais imagens nulas enquanto meio de prova de acordo com o disposto no abrigo do art. 32.º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa, por violarem não só o direito à imagem mas ainda o direito à reserva da intimidade da vida privada.
Este regime mostra-se espelhado também no Código de Processo Penal, estando prevista a nulidade destas provas nos termos do art. 126.º, n.º 3, do CPPenal.
Não obstante a apontada possibilidade de zonas de intersecção entre uns e outros, é hoje inquestionável que o direito à imagem e o direito à reserva da vida privada são direitos autónomos e com protecção jurídica própria.
Esta autonomização deu os primeiros sinais com o CPenal de 1982 quando surge o crime de Gravações e fotografias ilícitas (art. 179.º), distinto dos aí previstos crimes de Divulgação de factos referentes à intimidade da vida privada (art. 178.º) e de Intromissão na vida privada (art. 180.º), todos integrados no capítulo dos crimes contra a reserva da vida privada, consolidando-se inteiramente com a Reforma de 1995 quando este ilícito foi retirado do capítulo dos crimes contra a reserva da vida privada e foi inserido no capítulo dos crimes contra outros bens jurídicos, sob o art. 199.º[10].
E porque a lei não se expressa de igual forma na protecção de uns e outros direitos, importa perceber qual a protecção que é atribuída ao direito à imagem, aquele que está em causa na questão colocada pelos recorrentes.
Qualquer restrição deste direito, porque afecta um direito constitucionalmente protegido, deve estar prevista na lei e limitar-se ao mínimo necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. Tais restrições devem, por isso, ter um carácter excepcional.
Em termos infraconstitucionais, o direito à imagem recebe, desde logo, protecção ao nível do Código Penal onde, no seu art. 199.º, se pune quem, contra vontade [presumida[11]] a) fotografar ou filmar outra pessoa, mesmo em eventos em que tenha legitimamente participado ou b) utilizar ou permitir que se utilizem fotografias ou filmes referidos na alínea anterior, mesmo que licitamente obtidos.
Também o Código Civil estabelece uma protecção própria a este direito, que consagrou no seu art. 79.º (com a epígrafe Direito à imagem), segundo o qual:
«1. O retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela; depois da morte da pessoa retratada, a autorização compete às pessoas designadas no n.º 2 do artigo 71.º, segundo a ordem nele indicada.
2. Não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou de justiça, finalidades científicas, didácticas ou culturais, ou quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente.
3. O retrato não pode, porém, ser reproduzido, exposto ou lançado no comércio, se do facto resultar prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro da pessoa retratada.»

Esta protecção permite afastar a tipicidade do crime previsto no art. 199.º do CPenal, por dispensar o consentimento do visado, nos casos em que a imagem vem enquadrada na de lugares públicos ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente. «Isto na medida em que a imagem da pessoa resulte inequivocamente integrada na “imagem” daqueles espaços ou eventos e neles se dissolva. Já será diferente à medida que o destaque concedido à imagem pessoal resultar em individualização e subtracção (não querida) ao anonimato»[12] ou quando seja relevante a “notoriedade ou o cargo” desempenhado.
A aplicação desta exclusão em sede de direito penal nunca suscitou especial controvérsia.
Como facilmente se conclui, nenhuma destes factores de atipicidade da captação de imagem tem enquadramento na situação em apreço.
No obstante o referido, repare-se que a lei penal atribui relevância à vontade presumida do visado, enquanto a lei civil limita a licitude dos comportamentos, entre o mais, ao consentimento dos visados (plano mais exigente que abarca um número menor de situações). Esta distinção demonstra, quanto a nós, que a incidência jurídica de cada um dos preceitos, sem prejuízo do conceito de unidade do ordenamento, deve realizar-se essencialmente dentro da área do direito a que respeita.
Ou seja, não pode ser uma norma pensada para área do direito civil que deve determinar os contornos da tipicidade e das causas de exclusão a ilicitude de um particular ilícito criminal.
Neste sentido, não se afigura correcta a ampliação de restrições do direito à imagem em sede de direito penal e processual penal essencialmente à luz de uma norma de carácter civil, como resulta da decisão final como se verá.
Por isso, a interpretação do art. 79.º do CCivil, na parte em que pode coincidir com áreas do direito penal e do processo penal, deve respeitar os limites que essas áreas estabeleceram nessas matérias, como adiante desenvolveremos[13].

Ainda em sede de tipicidade do art. 199.º do CPenal, questiona Manuel da Costa Andrade[14] se a tutela conferida pela norma deve sofrer uma redução vitimodogmática, no sentido em que «o comportamento censurável (porque imoral, ilícito, descuidado, etc) da vítima das gravações ou fotografias determina a perda da dignidade penal e a caducidade da própria (…) protecção jurídica.»
Esta é, no fundo, pela amplitude que foi conferida à causa de justificação, só formalmente estruturada na argumentação, a posição reflectida na decisão final recorrida, como veremos adiante quando abordarmos esta temática.
Para o insigne Autor[15], será de afastar esta construção e de procurar nas causas de justificação da ilicitude a solução para a não punibilidade, de outra forma, afirma, «mal se compreenderia que o direito, e em particular o direito penal, abandonasse as pessoas de qualquer modo envolvidas em práticas imorais ou ilícitas. A ponto de os atentados aos seus bens jurídicos, mesmo os de mais eminente dignidade, não atingirem sequer o limiar mínimo da relevância jurídico-penal (a tipicidade). (…) De resto, tal não se compaginaria com o dogma da continuidade do Estado e do direito nem com princípios basilares do Estado de direito (separação de poderes, legalidade, igualdade).»[16]
Perfilhamos inteiramente esta visão, pelo que também não será por este caminho que improcederá a pretensão dos recorrentes.

À semelhança dos diplomas indicados, igualmente o Código de Processo Penal prevê algumas limitações ao direito à imagem, rodeando-as de fortes cautelas.
Temos, assim, o art. 147.º, respeitante ao reconhecimento de pessoas, onde nos seus n.ºs 4 a 7 encontramos limitações decorrentes do uso de fotografias.
Também o art. 250.º, n.º 6, do CPPenal prevê a utilização de provas fotográficas como forma de possibilitar a identificação de suspeito.
Estes procedimentos expressamente previstos no Código de Processo Penal estão entre as exigências de polícia ou de Justiça a que se refere o art. 79.º do CCivil, expressões que não podem ser vistas como uma porta aberta (escancarada, para alguns) para todo e qualquer acto que seja praticado no âmbito ou para efeito de um processo penal.
Segundo Manuel da Costa Andrade[17], no «que concerne às “exigências de justiça”, o preceito há-de ser interpretado sem prejuízo do estatuído no art. 167º do CPP», reconhecendo que o «propósito de carrear provas para o processo penal e prosseguir a verdade material (…) não justifica a produção ou utilização das fotografias (filmes, registos videográficos) arbitrárias. Nem em relação a particulares nem em relação a autoridades; e seja qual for a gravidade do crime ou a valência da fotografia do ponto de vista da privacidade/intimidade.»
Quanto às exigências de polícia defende o mesmo Autor[18] que a justificação da ilicitude só encontra espaço num plano circunscrito à dimensão preventiva, nunca repressiva.

Entendimento diverso traduzir-se-á numa negação da natureza constitucional do direito à imagem.
Tanto é assim que noutros diplomas avulsos, onde se prevê, entre o mais, a possibilidade de captação de imagem, e a eventualidade da sua utilização no âmbito de procedimento criminal, são definidas as condições em que é possível a restrição a tal direito e a sua utilização. Entre estes contam-se a Lei 5/2002, de 11-01, que estabelece medidas de combate a criminalidade organizada e económico-financeira; a Lei 1/2005, de 10-01, que rege a utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos de utilização comum para registo de imagem e som e do sistema de vigilância rodoviária, este regulamentado pelo DL 207/2005, de 29-11, sendo aplicável ao tratamento de dados em tudo o que não se encontrar previsto na Lei 1/2005 o disposto na Lei 67/98, de 26-10 (Lei da Protecção Dados Pessoais - transpõe para a ordem jurídica portuguesa a Dir. n.º 95/46/CE, do PE e do Conselho, 24-10-95, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados), actualmente revogada pela Lei 58/2019, de 08-08 (Assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento e do Conselho, de 27-04-2016, relativo à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados); a Lei 37/2008, de 06-08 (Lei Orgânica da PJ), quanto à actuação da PJ no âmbito da sua competência de prevenção criminal, actualmente revogada e substituída pela Lei 137/2019, de 13-09; a Lei 39/2009, de 30-06, que prevê a instalação de sistema de videovigilância para combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espectáculos desportivos; ou a Lei 135/2014, de 08-09, que define o regime jurídico dos sistemas de segurança privada dos estabelecimentos de restauração e de bebidas que disponham de salas ou de espaços destinados a dança ou onde habitualmente se dance.

Fora os exemplos supramencionados, o Código de Processo Penal não apresenta outras restrições ao direito à imagem, não prevendo, por exemplo, à semelhança do que ocorre com as escutas telefónicas qualquer regime que autorize a captação de imagem contra a vontade do visado, nem estabelecendo qualquer extensão como ocorre nos termos do art. 190.º para comunicações estabelecidas por meio diferente do telefone.

A interpretação que resulta desta ausência de regulamentação não pode ser a de que o direito à imagem é livremente restringido, designadamente com base numa norma prevista no Código Civil (art. 79.º), preceito cuja leitura deve conter-se dentro dos limites já enunciados.

Pelo contrário, é por a protecção ao direito à imagem ser tão ampla que o art. 167.º do CPPenal determina que as reproduções fotográficas, cinematográficas, fonográficas ou por meio de processo electrónico e, de um modo geral, quaisquer reproduções mecânicas só valem como prova dos factos ou coisas reproduzidas se não forem ilícitas, nos termos da lei penal (n.º 1), acrescentando que não se consideram, nomeadamente, ilícitas para os efeitos previstos no número anterior as reproduções mecânicas que obedecerem ao disposto no título iii deste livro (n.º 2) isto é, o local onde encontramos a regulamentação sobre a realização de exames, revistas, buscas, apreensões, escutas telefónicas e intercepções de outras comunicações a que se estende este último regime por força do art. 189.º do CPPenal.
Ou seja, a utilização da imagem de alguém só pode ser levada a cabo como meio de prova se através da mesma, caso existisse queixa[19], não se pudesse responsabilizar alguém pela prática de crime de gravações de fotografias ilícitas, p. e p. pelo art. 199.º do CPenal, ou porque o facto em si não era ilícito (por exemplo, por o visado ser uma pessoa de grande notoriedade pública e a captação de imagem cingir-se ao contexto que aquela determinou) ou por ter ocorrido causa de exclusão da ilicitude (como a legítima defesa ou o direito de necessidade).

Resulta do que foi sendo exposto que encontramos entre as causas de justificação da ilicitude do facto típico do crime de gravação e fotografias ilícitas, permitindo a sua ponderação como meio de prova (art. 167.º do CPPenal), quer aquelas que encontram tradicional consagração no Código Penal (como a legítima defesa ou o direito de necessidade), quer a remissão para outras disposições permissivas do Código de Processo Penal (como os arts. 147.º e 250.º, a que já se aludiu), quer as autorizações legais dispersas por diplomas avulsos que permitem a captação de imagens, admitindo-se, assim, a utilização desses elementos em sede de processo penal, como válido meio de prova, desde que recolhidas de acordo com as finalidades de cada um desses regimes[20].

Do conjunto dos preceitos enunciados e dos regimes instituídos nos diplomas indicados podemos encontrar algumas linhas estruturantes.
Como regra basilar, há que considerar que o simples facto de a captação de imagem ocorrer em espaço público não legitima só por si essa acção, pois, sendo o direito à imagem um direito autónomo do direito à reserva da vida privada e tendo o mesmo consagração constitucional específica no âmbito dos direitos, liberdades e garantias, a sua restrição tem de estar legalmente prevista, independentemente de colocar ou não em causa o direito à privacidade[21].
Reafirma-se de novo que a circunstância de o Código de Processo Penal nunca admitir positivamente o registo de imagem, contrariamente ao que acontece com as escutas telefónicas, revela que a regra (que salvaguarda o direito com protecção constitucional) é a da total exclusão de possibilidade de registo de imagem contra a vontade do visado e não o inverso.
Neste sentido, Manuel da Costa Andrade[22] afirma que a formulação do art. 167.º do CPPenal «representa a consagração positivada da opção do legislador de não reconhecer à realização da justiça criminal – pese embora a sua inquestionável dignidade constitucional – a prevalência necessária para justificar os atentados à palavra ou à imagem. Assim, por desígnio tão expresso como unívoco do legislador, a prossecução das finalidades (repressivas) imanentes ao processo penal, maxime a descoberta da verdade material, não legitima a produção – por particular ou por autoridade pública – sem consentimento de gravação, fotografia ou filme. Como não legitima a sua utilização ou valoração sem consentimento em processo penal. Independentemente do seu estatuto adjectivo-processual, nomeadamente no contexto das proibições de prova (Costa Andrade, cit. 237 ss.), tanto a produção como a utilização (valoração) das gravações e fotografias configuram, no plano substantivo, expressões irredutíveis de ilicitude criminal.»[23]
Apesar do aparente carácter irredutível da posição assumida, o Autor admite que «os agentes da autoridade podem beneficiar da eficácia justificativa das derimentes gerais (…) no sentido afirmativo, mas circunscrito à dimensão preventiva[24], e nunca arbitrário como já referido.
A verdade é essas causas justificativas encontram hoje um campo muito mais alargado em sede de direito legislado, nacional e comunitário, diplomas que no seu conjunto não podem deixar de ser ponderados na avaliação das causas de exclusão da ilicitude já que integram a ordem jurídica considerada na sua totalidade (art. 31.º, n.º 1, do CPenal).

É hoje pacífico que em legislação avulsa como a supramencionada, fundada em razões de prevenção e combate a criminalidade específica, possa estar prevista a possibilidade de captação de imagem e a sua utilização como meio de prova (autorização legal), desde que cumpridas determinadas formalidades legais, designadamente validação judicial[25].
Se o regime geral fosse o da liberdade de captação de imagem por razões de investigação criminal não seria necessário que para situações onde o legislador entendeu mais premente a possibilidade de utilização destes meios de prova mais intrusivos, como a Lei 5/2002, de 11-01, que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira), a sua utilização estivesse condicionada a uma autorização judicial e limitada ao cumprimento de regras que, naquela perspectiva, não seriam necessárias para a generalidade dos casos, incluindo os mais insignificantes.
O «princípio da legalidade em matéria de métodos de obtenção de prova que conflituem com direitos, liberdades e garantias constitucionais impõem a solução inversa: apenas serão permitidos os métodos conformes à Constituição (CRP) legalmente previstos – prévia permissão legal. A que acresce a necessária ponderação de interesses, em concreto, através do controlo, ex post ou ex ante, por parte de um juiz – respeitando-se assim o princípio da judicialidade
(…)
Num Estado de Direito Democrático, herdeiro do Liberalismo/Humanismo, a verdade de um processo é aquela que se obtém através de métodos admissíveis, e não a qualquer custo. A verdade é uma só: a obtida segundo métodos válidos de prova. Por isso a investigação não deve ser temerária e não deve arriscar-se a decisão final de inquérito, e bem assim a sentença, pela utilização de um eventual método proibido.»[26]

Contra este entendimento e a leitura que comporta do art. 167.º do CPPenal encontramos a posição, cremos que isolada, de Manuel Monteiro Guedes Valente[27], que, na sequência de análise à Lei 5/2002[28], de 11-01, sustenta que «[q]uanto ao registo das imagem, o CPP já previa a sua possibilidade no art. 167.º, devendo-se para o efeito respeitar o preceituado para os meios de obtenção de prova, ex vi n.º 2 do art. 167.º do CPP, o que se nos configura desnecessária a previsão legal em um diploma avulso de um meio já previsto no CPP, sendo de realçar e valorar a sujeição de realização à autorização ou à ordem de juiz.»
Não concordamos com o sentido conferido por este Autor ao n.º 2 do art. 167.º do CPPenal, uma vez que o mesmo apenas ressalva da ilicitude as reproduções mecânicas que obedecerem ao disposto no título III do livro ressalva, aqui se incluindo as respeitantes a exames, revistas, buscas, apreensões, escutas telefónicas e intercepção de outras comunicações por via da extensão do art. 189.º do CPPenal.
Mal se compreendia que o legislador, num assunto desta natureza, com relevância constitucional, se dispusesse a adaptar à captação de imagens, enquanto meio de prova, os requisitos aplicáveis aos variados meios de obtenção de prova previstos no Livro III, assim restringindo o direito à imagem, sem determinar de forma concreta e inequívoca essa restrição e sem identificar qual o formalismo entre os vários ali previstos que se lhe aplicava.
Tal não significa que esta norma, em conjunto com muitas outras, vistas como unidade do ordenamento jurídico, não auxilie à compreensão das situações a enquadrar nas causas de exclusão de ilicitude, permitindo a valoração como válidos de meios de prova que envolvem a captação de imagens, após ponderação dos interesses em conflito.

A temática da captação de imagens através de sistema de videovigilância e da sua validade como meio de prova pode considerar-se consolidada em termos jurisprudenciais, sem evidente oposição em termos doutrinais[29], no sentido da admissão de tais elementos, mesmo quando se desconhece se o sistema se mostra autorizado pela CNPD.
Como se afirma no acórdão da Relação de Lisboa de 10-05-2016[30], «As necessidades de segurança e a racionalização de meios, através do aproveitamento de dispositivos tecnológicos em substituição de agentes de segurança, torna a videovigilância um fenómeno omnipresente em espaços públicos e privados, de tal modo que, quando nos deslocamos pelas nossas cidades ou em espaços comerciais, todos sabemos que um número infindo de olhos eletrónicos, sem rosto e estrategicamente colocados, nos vigiam em contínuo.»
Neste concreto recurso importa apenas determinar se o juízo sobre a licitude deste elemento de prova depende da demonstração nos autos da existência do resultado da diligência requerida pelos recorrentes, a saber, que fosse apurado se as câmaras de videovigilância de onde foram recolhidos os fotogramas que constam do processo estavam licenciadas e autorizadas a captar essas imagens pela CNPD.
Como bem se decidiu no aresto já mencionado, assim se consolidando jurisprudência sobre esta matéria, «[a] falta daquele parecer [favorável], porém, só por si, não torna a gravação ilícita, nos termos da lei penal, como exige o citado art. 167, nº1. (…)
Nesta parte, vem a jurisprudência entendendo que quando as filmagens estão enquadradas em lugares públicos e visem a realização de interesses públicos, designadamente prevenção criminal, existe justa causa nesse procedimento, até por exigências de eficiência da justiça, o que afasta a ilicitude da sua captação, tanto mais que não são atingidos dados sensíveis da pessoa visionada, que é vista a circular em local público».
Com efeito, a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) é a entidade nacional que exerce a autoridade de controlo nacional para efeitos do Regulamento Geral Sobre a Protecção de Dados (RGPD), isto é, Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27-04, 2016, relativo à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados[31]) e também da Lei 58/2019, de 08-08, que assegura a execução, na ordem jurídica nacional, daquele Regulamento (art. 3.º desta Lei).
E é uma entidade administrativa independente, com personalidade jurídica de direito público e poderes de autoridade, dotada de autonomia administrativa e financeira, que funciona junto da Assembleia da República (art. 4.º, n.º 1, da mesma Lei), tendo por missão controlar e fiscalizar o cumprimento do RGPD e da Lei 58/2019, de 08-08, bem como das demais disposições legais e regulamentares em matéria de protecção de dados pessoais, a fim de defender os direitos, liberdades e garantias das pessoas singulares no âmbito dos tratamentos de dados pessoais (art. 4.º, n.º 2, da mesma Lei).
Contudo, as atribuições desta entidade não conflituam com a competência dos Tribunais, conforme resulta do art. 55.º, n.º 3, do RGPD, já que «[a]s autoridades de controlo não têm competência para controlar operações de tratamento efetuadas por tribunais que atuem no exercício da sua função jurisdicional.»
A intervenção judicial que é propiciada em julgamento, através da qual é analisado e avaliado aquele específico meio de prova, confirmando ou não a sua conformidade com as finalidades da autorização legal, logo o enquadramento da captação daquelas imagens como crime de gravação ilícita ou não, são o suficiente para assegurar a garantia dos direitos do visado, tanto ou mais do que qualquer entidade administrativa de controlo.
E percebe-se que se a captação de imagens cumpre as finalidades e pressupostos substantivos da permissão legislativa para o funcionamento do sistema de videovigilância, ainda que possa evidenciar falhas formais, como [in]existência de licença, não se pode concluir pela ilicitude das imagens enquanto meio de prova.
Já a captação de imagens por sistema de videovigilância devidamente autorizado pela CNPD mas que é posteriormente desviado das finalidades para que foi autorizado e, por exemplo, filma locais não permitidos pela legislação que autoriza a sua instalação, designadamente o interior do domicílio de terceiro, o mais provável é que não poderá valer como meio de prova, por ser uma captação de imagens ilícita, não obstante o cumprimento daquela formalidade para início de funcionamento do sistema.
Por isso, a decisão recorrida não julgou incorrectamente ao considerar que aqueles elementos solicitados não eram pertinentes para a decisão nos termos e para os efeitos do disposto no art. 340.º, n.º 4, da al. b), do CPPenal.
Esta constatação não impede que se considere que uma investigação robustecida procura blindar a prova que é recolhida para o processo, evitando antecipadamente que a respectiva validade seja posta em causa, fazendo perigar por essa via todo o esforço de responsabilização criminal posto na investigação e que culmina com o julgamento e com a prolação de decisão de mérito baseada na prova produzida em julgamento que idealmente se pretende válida independentemente do resultado ser a condenação ou a absolvição de quem é julgado.
Nesta perspectiva, a investigação de um processo criminal e este próprio visto na sua globalidade só terá a ganhar se a prova apurada através de sistemas de videovigilância tiver o respaldo, sendo esse o caso, do cumprimento de formalidades legais inerentes a tais sistemas.
Não obstante tal observação, pelas razões enunciadas, é de julgar improcedente o último recurso interlocutório.
*
B. Recurso da decisão final (de acordo com a enunciação dos recorrentes)
B.1 - Nulidade da prova consistente na captação de imagens dos arguidos através de fotografias tiradas pelo OPC e de fotogramas retirados de câmaras de videovigilância.
Esta questão desenvolve a temática abordada no último dos recursos interlocutórios apreciados, com a diferença de que os recorrentes retiram dela as consequências que reputam de adequadas à violação das normas que invocam, isto é a nulidade da captação de imagens, seja pelo OPC, seja baseada em sistemas de videovigilância.
Argumentam os recorrentes que o direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada estão constitucionalmente protegidos, sendo nulas as provas consistentes nas imagens dos recorrentes, pois foram obtidas sem o seu consentimento (art. 126.º do CPPenal).
Quanto às fotografias tirados pelo OPC, alegam, foi omitida a prévia autorização por despacho judicial e a validação judicial a posteriori, à semelhança do regime existente para as escutas telefónicas, aplicável de acordo com o disposto no art. 167.º do CPPenal, encontrando-se nessa omissão de formalidades o fundamento para a nulidade deste meio de prova. Nesta situação estarão as imagens constantes dos autos de vigilância juntos a fls. 1 a 80 e 150 a 168 do apenso A.
Acrescentam que igual solução deve ser aplicada relativamente ao auto de visionamento constante do anexo A, de fls. 81 a 146 e 185 a 192 porque a recolha de imagens foi feita na via pública e não no interior do estabelecimento, como decorre do disposto nos arts. 188.º, n.º 4, e 190.º do CPPenal.
Finalmente, quanto aos fotogramas de fls. 171 a 182 do Apenso A, invocam os recorrentes que os mesmos estão feridos de nulidade, por violação do disposto nos arts. 188.º, n.º 4, e 190.º do CPPenal, nos arts. 18.º a 21.º da Lei 58/2019, de 08-08, e no art. 31.º da Lei 34/2013, de 16-05, preceitos dos quais decore que as imagens recolhidas e gravadas por câmaras de videovigilância não licenciadas e sem demonstração dos requisitos estabelecidos naqueles preceitos da Lei 58/2019 não poderão ser consideradas provas lícitas e válidas em processo penal.
Sobre esta questão pronunciou-se o Tribunal a quo, enquanto questão prévia à análise do mérito da causa nos seguintes termos:
«Como questão prévia a reapreciar e que os arguidos suscitaram na sua contestação que não se mostra dependente da produção de prova temos no ponto
I - Da Nulidade Decorrente da Violação do Disposto nos Artigos 167º e 188º, nºs 1 e 4 do C. P. Penal, nos seguintes termos: a recolha de imagens dos Arguidos constantes dos autos de vigilância juntos a fls. 1 a 80 e 150 a 168 do Apenso A do auto de visionamento constante do Anexo A, de fls. 81 a 146 e 185 a 192, porque feito na via pública, nos termos dos artigos 188º, nº 4 e 190º do C. P. Penal e da jurisprudência invocam o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22-09-2009, publicado em www.dgsi.pt. dos fotogramas constantes de fls. 171 a 182 do Apenso A, por violação do disposto nos artigos 188º, n.º 4 e 190º do C. P. Penal, na Lei 58/2019 de 8 de Agosto e no artigo 31º da Lei nº 34/2013, de 16 de Maio, invocando os requisitos estabelecidos nos nºs 18º,19º, 20º e 21º da Lei nº 58/2019 de 8 de Agosto, e o decidido pelo Tribunal da Relação de Évora pelo seu Acórdão de 08-04-2014, publicado em www.dgsi.pt.
Por invocação da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, o poder de vigiar em segredo o cidadão só pode ser tolerado na medida estritamente necessária à salvaguarda das instituições democráticas. Do disposto no art.º 167º do C. P. Penal, 188º, nº 4 e 190º do C. P. Penal.
Apreciando:
Da nulidade das imagens recolhidas nas vigilâncias juntas a fl. 1 a 80 e 150 a 168 do Apenso A, e por isso o seu visionamento a fl. 81 a 146 e 185 a 192, porque na via publica.
Do mesmo modo, a nulidade dos fotogramas de fl. 171 a 182 do Apenso A, não validados no prazo legal pelo JIC e por isso nulas, não podendo ser valoradas pelo Tribunal como meio de prova.
Não estando legalizados estes meios de prova, igualmente as provas através destes obtidas são invalidas, por nulas nos termos alegados.
O meio de obtenção de prova a que os OPC se socorreram no âmbito dos presentes autos que primeiro cabe identificar, são as camaras fotográficas e a prova as fotografias onde estão captadas imagens dos arguidos, que complementam o relato escrito da diligencia de vigilância realizada através do seu seguimento enquanto os arguidos estiveram em espaços públicos, ou a estes equiparados.
O artigo 167º, do CPP faz depender a validade da prova produzia por fotografias ou reproduções mecânicas da sua não ilicitude face ao disposto na Lei Penal. Tal quer significar que a exclusão deste meio de obtenção de prova e da prova por este obtida depende da sua configuração como um ato ilícito em função da sua previsão e integração na lei como crime que visam a tutela de direitos de personalidade como é o caso do direito à intimidade.
Ora, na lei penal é o artigo 199, º do Código Penal que tipifica o crime de gravações ou fotografias ilícitas, no seu nº 2, que não é sobreponível ao nº1, dirigido à tutela da palavra. A gravação da palavra logo que obtida “sem o consentimento” é ilícita, todavia o regime para fotografia ainda que “contra a vontade”, não. Isto é, a obtenção de fotografia ou filmagem, mesmo sem consentimento, é criminalmente atípica, sempre que exista justa causa nesse procedimento, designadamente quando estejam enquadradas em lugares públicos, visem a realização de interesses públicos ou hajam ocorrido publicamente. O único limite será sempre a inviolabilidade dos direitos humanos, e como tal a inadmissibilidade de atentados intoleráveis à liberdade, dignidade e integralidade moral. Neste sentido também tem vindo a jurisprudência a pronunciar-se cf. Ac. TRG de 2004/mar./29; ac. TRP 2005/ nov /16 (CJ V219) este último relativo a fotografias obtido por policias em locais públicos.
Igualmente numa perspetiva de unidade do sistema jurídico, no que respeita ao direito à imagem e às exceções da necessidade do seu consentimento, rege o artigo 79º, nº2, do CC, que estipula por um lado que o retrato (imagem) seja enquadrado num lugar público ou quase público e respeite a um facto de interesse público ou em situações que hajam ocorrido publicamente, situação em que o uso de camara fotográfica e da imagem fotografia não é ilícito.
Assim, por um lado entende-se por lugar público, aquele que se destina ao público, que seja um bem comum, no qual exista o direito de ir e de vir. Aqui enquadram-se os conceitos de ruas, avenidas, praças, e outros espaços de lazer, de acesso sem limitações. E ainda quase públicos, os espaços privados de acesso publico, arcadas de prédios acesso a entradas, locais de acesso sem limitações, privados, de acesso público irrestrito.
Por outro lado, exige-se que o facto retratado seja de interesse público. Ora, integram esta noção a utilização de camaras fotográficas e imagens por estas captadas, - enquanto meio de obtenção de prova e prova por aquele meio obtida, as fotografias obtidas por camaras fotográficas, utilizadas pela autoridade policial no âmbito das suas atribuições ( cf. art.º 55º, do CPP) isto é, em diligências de investigação e prevenção de criminalidade na via publica ou quase pública e que possam constituir um complemento da uma vigilância policial, na investigação de criminalidade participada, em vias de acontecer, em investigação, como a criminalidade patrimonial de furtos no interior de residências, onde o bem jurídico e a segurança e tranquilidade social, são colocados em perigo, pelas atuações de agentes destes crimes, que cumprirá identificar para vir a repor a vigência de normas violadas, revestindo a utilização destes meios auxiliares da diligência rainha – a vigilância- interesse publico para auxiliar a ilustrar a identidade e modo de atuação dos agentes de quem possa ter colocado em perigo aqueles interesses públicos, da vida em sociedade.
Assim, as vigilâncias complementadas através de camaras fotográficas com as imagens por aquelas captadas dos arguidos em locais públicos ou de acesso ao público, pela autoridade policial, no exercício da sua atividade de investigação criminal, para complementar a identificação e monotorização de agentes de crime para interesses públicos, de segurança, tranquilidade social, e reposição de normas violadas pois enquadradas na sua ação de investigação criminal, são atuações criminalmente atípicas, por não lhes estar imposto qualquer limite de uso e de captação de imagem, por não beliscarem a intromissão do direito pessoal na vida privada, nestas circunstancias concretas (cf. ac. 16.01.17. proc. 5344/06 da 5ª secção do TRL.)
Acresce, trazer à colação, que igualmente o uso pela autoridade policial de camaras fotográficas e por via delas a obtenção de imagens em lugares de acesso público não constitui qualquer crime de devassa da vida privada, (cf. art.º 192º do Cód. Penal) ou de crime de devassa por meio informático, (art.º 193º, do citado diploma), e valendo-nos, agora, do que se fez consignar no Ac. do TRP 2006/mai/31 (CJ III/210) que inteiramente sufragamos de que “mediante tais ilícitos o que se pretende abranger e tutelar é apenas “o núcleo da vida privada” e mais sensível de cada pessoa, como seja a intimidade, a sexualidade, a saúde, a vida particular e familiar mais restrita, que se pretende reservada e fora do conhecimento das outras pessoas.
Sustentam os arguidos que o uso das camaras fotografias e das imagens por estas captadas dos arguidos, estavam sujeitas a posterior validação, por parte do Juiz de Instrução Criminal, (daqui em diante JIC) no prazo de 48horas, por aplicação conjugada do artigo 188, nº 1 e 4 do CPP e ainda do artigo 6º, da Lei 5/2002 de 11.01.
O artigo 188º, do CPP estabelece as formalidades das operações das interceções telefónicas – meio este mais intrusivo de obtenção de prova, - da palavra falada- daí ter o legislador estabelecido limites à sua admissibilidade, - pois através do acesso à mesma, a pessoa escutada, sem saber, autoincrimina-se- daí a exigência da verificação dos pressupostos, da sua admissão legal no artigo 187º, do CPP. Aí se estabelece o catálogo de crimes onde aquelas podem ser realizadas, se autorizadas pelo JIC e um regime apertado do seu controlo, previsto no citado 188º, do CPP.
Neste dispositivo não está aludida a captação de imagens em espaços públicos ou quase públicos, pela autoridade policial como auxiliar ou complemento de vigilância física, no exercício de investigação policial – atos de policia- de interesse público na manutenção da segurança das populações.
A este regime comum acresce, sem o excluir, (podendo haver sobreposição), as medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira, previstas na Lei 5/2002 de 11.01, que estabelece um regime especial de recolha de prova, quebra do segredo profissional e perda de bens a favor do Estado, mas que apenas se dirige para os crimes constantes no seu artigo 1º, - (catalogo de crimes de natureza taxativa) e que são: a) Tráfico de estupefacientes, nos termos dos artigos 21,º a 23,º e 28,º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro; b) Terrorismo, organizações terroristas, terrorismo internacional e financiamento do terrorismo; c) Tráfico de armas; d) Tráfico de influência; e) Recebimento indevido de vantagem ; f) Corrupção ativa e passiva, incluindo a praticada nos sectores público e privado e no comércio internacional, bem como na atividade desportiva; g) Peculato; h) Participação económica em negócio; i) Branqueamento de capitais; j) Associação criminosa; l) Pornografia infantil e lenocínio de menores; m) Dano relativo a programas ou outros dados informáticos e a sabotagem informática, nos termos dos artigos 4.º e 5.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, e ainda o acesso ilegítimo a sistema informático, se tiver produzido um dos resultados previstos no n.º 4 do artigo 6.º daquela lei, for realizado com recurso a um dos instrumentos referidos ou integrar uma das condutas tipificadas no n.º 2 do mesmo artigo; n) Tráfico de pessoas; o) Contrafação de moeda e de títulos equiparados a moeda; p) Lenocínio; q) Contrabando; r) Tráfico e viciação de veículos furtados; para os quais se prevê meios de obtenção de prova particularmente intrusivos- desde logo colocação de câmaras ocultas em interiores de residências, espaços fechados, e anexos para captação de registo de voz e imagem, GPS em viaturas; interceções telefónicas, entre outros sem consentimento os visados, e onde a produção destes registos depende de prévia autorização ou ordem judicial, consoante os casos. E a estes registos obtidos são aplicáveis com as necessárias adaptações, as formalidades previstas no artigo 188º do CPP (cf. nº2). Isto é, o artigo 6º, sem afastar o regime dos artigos 187º a 190º do Código Penal, - podendo haver coincidência entre os crimes do catálogo previsto no artigo 1º, da citada lei, - veio permitir relativamente aos crimes do artigo 1º, da Lei 5/2002, o registo por qualquer meio da voz e da imagem, designadamente das conversas presenciais ou similares- e não apenas o telefone ou meios técnicos similares- ampliando o uso de outros meios necessários à investigação daquela concreta criminalidade elencada no artigo 1º, da citada lei, abrindo a porta aos meios de vigilância audiovisuais, num certo espaço, para estritos fins de investigação criminal,- designadamente às camaras de filmar onde fica registada a voz e a imagem- carecendo para tanto de prévia autorização ou ordem de juiz. A utilização deste meio de prova, ao abrigo da Lei 5/2002, está dependente da existência de três requisitos: autorização do juiz, a verificação de crime de catálogo, necessidade para a investigação da utilização desse meio de obtenção de prova, (não exige a indispensabilidade para a descoberta da verdade ou a impossibilidade ou difícil obtenção por outra forma, como o regime das escutas telefónicas) estando em causa a necessidade.
Este regime destina-se ao uso de determinados meios de obtenção de prova dirigidos a certa criminalidade, e as formalidades e pressupostos em que assentam o seu uso, a fim de que o meio de prova que dali resulte seja válido e possa ser valorado pelo Tribunal.
Revertendo, para o caso dos autos, temos antes de mais que esclarecer que a criminalidade em investigação, - do Código Penal: furtos p. e p. pelos artigos 203º, 204º, nº 2 al. e) furtos no interior de residência, Violência após subtração p. e p. pelo art.º 211, por referência ao art.º 210º, nº 1 e 2 b); de detenção de arma proibida, p e p. pelo art.º 86.º n.º 1, al. d), por referência ao art.º 3º, nº 2, al. e) da Lei n.º 5/2006, de 23/2 e de falsificação de documentos, p. e p. pelo art.º 256º, nºs 1.f) e nº3, do Código Penal, - não se enquadrarem estes naqueles crimes de catálogo ( p. no art.º 1, da Lei 5/2002) por isso, e desde logo, nunca, poderia a investigação socorrer-se daquela legislação - que abre a possibilidade de uso de meios mais intrusivos, do que os previstos no Código de Processo Penal, atenta a criminalidade a que se dirige- para surpreender a atividade criminosa investigada, não estando assim sujeitas a controlo pelo JIC .
Estando em causa o uso de camara(s) fotográfica(s) para captar a imagem, como auxiliares de vigilâncias, destes autos dos arguidos, em espaços públicos ou quase públicos, para servirem interesses públicos – a salvaguarda de segurança do património das pessoas,- já que é manifesto que os arguido estavam a ser investigados pela Direção de Investigação Criminal, pela eventual prática de furtos no interior a residências, e que as fotografias dos mesmos – imagens- são captadas para complemento de vigilâncias realizadas, em espaços públicos ou quase públicos, isto é, ruas, avenidas, espaços ainda que privados de acesso ao público, para auxiliar a vigilância, teremos de concluir que na íntima relação que coexiste entre o regime de admissibilidade de prova, por reproduções mecânicas (cf. epigrafe do art.º 167º) e o crime de gravação e fotografias ilícitas, - art.º 199º, do Código Penal, pode dizer-se de forma redutora, que o uso de camara fotográfica, gravação, ou fotografia que não é crime, é admissível como meio de obtenção de prova e como prova respetivamente, não estando feridas de invalidade o uso de câmara fotográfica e as imagens com estas obtidas a fl. 1 a 80 e 150 a 168 do Apenso A, e por isso o seu visionamento a fl. 81 a 146 e 185 a 192 do Anexo A., desde logo porque não estão feridas da nulidade sustentada pelos arguidos, é válida estando sujeita às regras da livre apreciação da prova (cf. 124º a 128º, do CPP).
Intimamente relacionada como a fotografia, e por isso aqui renovamos aquilo que vimos dizendo, encontra-se a reprodução mecânica das filmagens, por camaras de videovigilância instaladas, por particulares, e de que se socorre a autoridade policial para a investigação de crimes, sendo estes a fazerem o seu uso, desde logo no âmbito da investigação criminal, para identificação dos seus agentes dos crimes e do seu modo de atuar.
O artigo art.º 167, CPP ao aludir à ilicitude das reproduções nos termos da lei penal, prevê não apenas que os meios de obtenção de prova – videovigilância- como o meio de prova dele extraído-fotograma - não se enquadram na lei penal, como crime, por ainda que possam integrarem uma tipicidade objetiva de uma conduta, o ato não se revele afetado na sua ilicitude, como aquele normativo exige. Como sabemos não se esgota no preenchimento do tipo objetivo do crime, a verificação exige-se que aquela conduta seja ilícita e culposa, o que exige a ponderação de causas de justificação da gravação, (ou da fotografia) que se pretende usar como meio de prova. Na vida em sociedade o direito à imagem não pode sobrepor-se aos outros valores, que são estruturantes, da vida em sociedade, isto é, não se pode sobrepor a todo e qualquer tipo de ponderação de interesses, e a sua ilicitude está excluída pela ordem jurídico, perspetivada como um todo (cf. Ac. STJ 20/jun/2001 a conduta não é punível quando a sua ilicitude é excluída pela ordem jurídica na sua totalidade, art.º 31º, 1 e 2 do Cód. Penal, e Maia Gonçalves, Cod. Proc. Penal, anotado, 14º edição, 143/144; Ac. STJ de 9/fev/94 CJ Ac. STJ 94/2/217, vide Eduardo Correia, Direito Criminal II, 7, tudo a respeito da unidade da ordem jurídica).
Por isso, quando os bens jurídicos protegidos pelo artigo 199º, do Cód. Penal, desde logo as imagens estejam a ser instrumentalizados na ofensa de outros direitos, ou quando a não protecção concreta do direito à imagem é condição de eficácia da atuação do Estado na proteção de outros valores, situados num patamar qualitativo superior, não se perspetiva a possibilidade de afirmação de prevalência daquela proteção da imagem contra tudo e contra todos. Isto é, o comportamento do titular da imagem que no uso da mesma assume um comportamento ilícito, ou atos de execução de um facto que se irá verificar como ilícito, tal determina a perda da dignidade penal do referido, direito da ofensa, e isto porque aquela no caso concreto deixa de merecer proteção- dirigido aqueles que se colocam no lado inverso do ser social, não devem contar com a sua solidariedade- não se vislumbrando motivo para que os direitos da vítima e a eficiência da justiça penal não prevaleçam sobre os direitos de imagem de quem age de forma criminosa que a imagem retrata. A proteção acaba quando aquilo que se protege consubstancia a prática de um crime.
Invocam os arguidos no que respeita aos fotogramas de fl. 171 a 182 do Apenso A, a sua nulidade, por violação do art.º 188º, nº4, e 190º, do CPP, e ainda por violação da Lei 58/2019, de 8.08, nos seus artigos 18º, 19º, 20º, 21 e 31, voltando a invocar o art.º 6º da Lei 5/2002, de 11.01 e ainda o Tribunal dos Direitos do Homem.
Não está em julgamento um crime do catálogo ( artigo 1º) da Lei 5/2002, de 11.01, como acima já aludimos, pelo que, não estando em uso pela autoridade policial meios de combate à criminalidade organizada e económico-financeira, previstas na Lei 5/2002 de 11.01, isto é, os meios especiais aí permitidos de recolha de prova, quebra do segredo profissional e perda de bens a favor do Estado, pelo não carecem os meios nestes autos em uso de autorização nem de validação pelo Juiz de Instrução Criminal, por aplicação do nº4, do artigo 188º, do CPP, tudo à semelhança do que alinhamos para as camaras fotográficas e fotografias.
Alegam os arguidos que estado em causa camaras de videovigilância particulares, o recurso ao seu visionamento pela autoridade policial, a extração de fotogramas das imagens visionadas, pela autoridade policial, no exercício das suas funções de investigação e por causa delas, são estas invalidas por violação da Lei 58/2019, de 8.08, nos seus artigos 18º, 19º, 20º, 21 e 31 nº 4 da Lei 34/2013, de 16.05, de modo a determinar a invalidade do uso deste meio de obtenção de prova e meio de prova por este obtido, mais concretamente feridas de nulidade.
A comissão Nacional de Proteção de Dados é a autoridade nacional que tem por atribuição controlar e fiscalizar o cumprimento das disposições legais e regulamentares em matéria de protecção de dados pessoais. No entanto, já o artigo 31º, nº 4, da Lei 34/2013, de 16 de maio, que regula os sistemas de videovigilância, ressalva a proibição de utilização das imagens de videovigilância para fins processuais penais, sendo que o nº 1, do artigo 19º, da Lei 58/19, de 8.08, sob a epigrafe videovigilância remete o regime da sua utilização para a ressalva da proibição de utilização das imagens de videovigilância para fins processuais penais, previsto no nº4, do art.º 31º, da Lei 34/2013, de 16.05.
Por seu turno a jurisprudência, cf. Ac. TRP de 23.10.13, P 585/11.6TABGC.P1 considera válida a prova que assenta ( autos de visionamento e fotogramas) na gravações de imagem efetuadas por videovigilância de local público (por factos ocorridos em via pública) sem conhecimento do visionado, tendo como única finalidade a identificação do autor do crime, denunciado às autoridades, ( e na data sem prévio licenciamento pela CNPD) por neste caso existir justa causa para captação de imagens (…) e por não serem atingidos dados sensíveis da pessoa visionada e sem ser necessário o seu consentimento até olhando para as exigências de justiça, sendo inaplicável, o nº2, do artigo 199º, do CP por não integrar qualquer ilícito culposo de acordo com o mesmo e ainda o ordenamento jurídico, perspetivado na sua globalidade.
Não sendo ilícita, nos termos da lei penal, a filmagem de imagens em loca público, feita por particular, naquelas circunstancias (…) também a reprodução mecânica dessa filmagem (através da junção ao processo quer do CD contendo a dita gravação de imagens, quer da reprodução em papel de imagens dela reiteradas) é permitida, tal como decorre do art.º 167º, nº1, do CPP. No mesmo sentido se expendeu nos acórdãos do TRL de 10.05.16, e de 28.05.09, CJ XXXIV,135, na Decisão do STJ de 28.09.11, proc. 22/09.6YGLSB.S2, sendo muito outras decisões neste sentido, pelo que jurisprudencialmente haver-se-á de ter por consolidada; (i.e. TRP Ac. 23.11.11, processo 1373/08.2PSPRT.P1 e de 10/12/19 proc. 10665/15/15.3 T9PRT.P1; TRE Ac. de 3.02.10, proc. 371/06.5GBVNF.P1; e de 24.04.12, proc. 932/10.8PAOLH.EI; TRC Ac. de 2.11.11, proc. 106/09.0PAVNO.C1 e ac. de 20.09.17; TRG de 29.04.14, proc. 102/09.8GEBRG. G2.;).
Assim “mutatis mutantis” a argumentação acima alinhada, para as fotografias, é válida para os fotogramas, complementos auxiliares de vigilância e visionamento, de imagens captados por videovigilância, em locais públicos ou equiparados, existindo justa causa nesse procedimento, visando a realização de interesses públicos ou tendo ocorrido publicamente, pelo que, por esta via, estes meios de prova não estão inquinados de qualquer invalidade, desde logo da nulidade, prevista no artigo 190º, do CPP.
Por via da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no seu artigo 8º, que respeita ao Direito à imagem o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, (TEDH) , tem vindo a decidir poder haver ingerência da autoridade publica no direito à imagem da pessoa, quando esta estiver prevista na lei e constituir uma providencia que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem estar económico, do país, a defesa da ordem e a prevenção das infrações penais, a proteção da saúde ou da moral, ou a proteção dos direitos liberdades e garantias de terceiros.
Em face do exposto, o TEDH pela aplicação da legislação internacional que nos vincula, respalda o que acabamos de aqui alinhar, como fundamento para a validade dos métodos de obtenção de prova e meios de prova cuja valoração por este Tribunal, foi questionado pelos arguidos.
Nesta conformidade as imagens dos arguidos de fl. 1 a 80 e 150 a 168 do Anexo A, bem como os autos de visionamento, e os fotogramas de fl. 81 a 146 e 171 a 192 do Anexo A, não são métodos inválidos de obtenção de prova, e por isso não são nulos nos termos do art.º 190º, aqueles meios de prova através daqueles métodos obtidos, sendo outrossim válidos por respeitam os direitos fundamentais comtemplados na Constituição da República Portuguesa, nos art.º s 26º e 34º, o artigo 8º, nº 2 da CEDH e a lei ordinária no art.º 167º, do CPP os quais não carecem de ser autorizados, nem validados pelo Juiz de Instrução Criminal, pois não subordinados ao regime da Lei 5/2002, por não estar em julgamento um crime do catálogo ( artigo 1º) da Lei 5/2002, de 11.01, nem em uso os meios especiais aí permitidos de recolha de prova, quebra do segredo profissional e perda de bens a favor do Estado, pelo que não carecem os meios nestes autos em uso de autorização nem de validação pelo Juiz de Instrução Criminal, por aplicação do nº4, do artigo 188º, sendo forçoso concluir ( que tudo o que nos termos do artigo 163º, do CPP esteja subtraído à livre apreciação do julgador), que estão antes sujeitos, nos termos dos art.º 124º a 128º, do CPP à livre apreciação do Tribunal, uma vez que são meios de prova atípicos, não estando os meios de prova taxativamente previstos.
Improcedem as nulidades suscitadas pelos arguidos, no ponto I.»

Como se referiu, no âmbito do recurso interlocutório respeitante à alegada necessidade de se apurar da existência de licenças emitidas pela CNPD para funcionamento de sistemas de videovigilância, foi já enunciado o quadro geral de protecção do direito à imagem, exposição que por uma questão de economia processual aqui damos por reproduzida, prosseguindo-se a análise no pressuposto dessa prévia apreciação.
E dela podemos concluir, em oposição à orientação perfilhada pelo Tribunal a quo, que o simples facto de uma captação de imagem ser usada para fins processuais penais não legitima por si só a violação do direito à imagem constitucionalmente protegido, sendo a regra a da inviolabilidade desse direito, impondo-se em concreto a necessidade de apurar se a utilização em causa se encontra abarcada por autorização legal compreendida no conjunto da unidade do ordenamento[32].
Como também já se referiu, essa autorização pode ser encontrada em legislação infraconstitucional, incluindo a legislação avulsa a que já se fez referência, ou nas clássicas causas de exclusão da ilicitude, permitindo qualquer destas vias, a confirmar-se positivamente a relevância da previsão, a valoração de imagens como válido meio de prova de acordo com o disposto no art. 167.º, n.º 1, do CPPenal, pois nessas situações o facto deixou de ser ilícito.
No caso em apreço, para efeito de apreciação da validade da prova baseada na captação de imagens devemos distinguir entre aquelas que resultaram do funcionamento de sistemas de videovigilância e as fotografias elaboradas pelas agentes da autoridade como suporte dos relatórios de vigilância, uma vez que a fonte de autorização, a existir, é diferente.
Começando pela validade ou nulidade das imagens captadas pelas câmaras dos sistemas de videovigilância, por si só ou reflectidas nos autos de visionamento respectivos também postos em causa, e aproveitando a proximidade da análise efectuada no terceiro recurso intercalar, que como se disse, aqui se tem por reproduzida e a que se dará seguimento, há que ter presente a legislação já ali mencionada.
Assim, de acordo com o Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27-04, 2016, relativo à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, temos como princípios estruturantes os de que o tratamento desses dados dever ser lícito, leal e transparente (art. 5.º, n.º 1, al. a)), devendo a recolha dos mesmos ser realizada para finalidades determinadas, explicitas e legítimas, não podendo ser tratados posteriormente de forma incompatível com essas finalidades, salvo os casos previstos na lei (art. 5.º, n.º 1, al. b)), e, por isso, os dados recolhidos devem ser adequados, pertinentes e limitados às finalidades previstas (art. 5.º, n.º 1, al. c)).
Entre os factores de licitude do tratamento encontramos, para além de outros, a necessidade para a defesa de interesses vitais do titular ou de terceiros (art. 6.º, n.º 1, al. d)); a necessidade para o exercício de funções de interesse público ou para o exercício da autoridade pública de que está investido o responsável pelo tratamento (art. 6.º, n.º 1, al. e)); e a necessidade para efeito dos interesses legítimos prosseguidos pelo responsável pelo tratamento ou por terceiros, excepto se prevalecerem os interesses ou direitos e liberdades fundamentais do titular que exijam a protecção dos dados pessoais, em especial se o titular for uma criança (art. 6.º, n.º 1, al. f)).
Encontramos aqui um amplo plano de situações onde se enquadra a defesa dos direitos patrimoniais e do direito à segurança de que são titulares os particulares detentores dos sistemas de videovigilância mas também a utilização secundária desses dados pelas autoridades públicas com atribuições no âmbito da investigação criminal[33].

Atente-se que este regulamento está vocacionado para a protecção de dados de natureza empresarial e comercial.
Por isso, do seu âmbito de aplicação é excluído o tratamento de dados pessoais efectuado por pessoas singulares no exercício de actividades exclusivamente pessoais ou domésticas (art. 2.º), embora se aplique aos responsáveis pelo tratamento e aos subcontratantes que forneçam os meios para o tratamento dos dados pessoais dessas actividades pessoais ou domésticas (considerando 18).
Por outro lado, não se aplica ao tratamento de dados efectuado directamente pelas autoridades competentes para efeitos de prevenção, investigação, detecção e repressão de infracções penais ou da execução de sanções penais, incluindo a salvaguarda e a prevenção de ameaças à segurança pública (art. 2.º), matéria que é objecto de um acto jurídico da União específico, em consonância com o dever de uniformização e conformidade jurídica global do regime de protecção de dados das pessoas singulares instituído no art. 98.º.
Nessa medida, dispõe o considerando (19) que «[o] presente regulamento não deverá, por isso, ser aplicável às atividades de tratamento para esses efeitos. Todavia, os dados pessoais tratados pelas autoridades competentes ao abrigo do presente regulamento deverão ser regulados, quando forem usados para os efeitos referidos, por um ato jurídico da União mais específico, a saber, a Diretiva (UE) 2016/680 do Parlamento Europeu e do Conselho (7). Os Estados-Membros podem confiar às autoridades competentes na aceção da Diretiva (UE) 2016/680 funções não necessariamente a executar para efeitos de prevenção, investigação, deteção e repressão de infrações penais ou da execução de sanções penais, incluindo a salvaguarda e a prevenção de ameaças à segurança pública, de modo a que o tratamento dos dados pessoais para esses outros efeitos, na medida em que se insira na esfera do direito da União, seja abrangido pelo âmbito de aplicação do presente regulamento.»

É por isso que em consonância com estas disposições o art. 23.º admite a limitação aos direitos instituídos desde que tal limitação respeite a essência dos direitos e liberdades fundamentais e constitua uma medida necessária e proporcionada numa sociedade democrática para assegurar, designadamente, a segurança pública, a prevenção, investigação, detecção ou repressão de infracções penais, ou a execução de sanções penais, incluindo a salvaguarda e a prevenção de ameaças à segurança pública ou a defesa do titular dos dados ou dos direitos e liberdades de outrem.

Concluímos assim que a protecção de dados, designadamente da imagem, não é absoluta e pode sofrer restrições em ordem à protecção de outros direitos fundamentais, desde que seja proporcional e adequada.
Neste sentido esclarece-se no considerando (4) do RGPD que: «O tratamento dos dados pessoais deverá ser concebido para servir as pessoas. O direito à proteção de dados pessoais não é absoluto; deve ser considerado em relação à sua função na sociedade e ser equilibrado com outros direitos fundamentais, em conformidade com o princípio da proporcionalidade. O presente regulamento respeita todos os direitos fundamentais e observa as liberdade e os princípios reconhecidos na Carta, consagrados nos Tratados, nomeadamente o respeito pela vida privada e familiar, pelo domicílio e pelas comunicações, a proteção dos dados pessoais, a liberdade de pensamento, de consciência e de religião, a liberdade de expressão e de informação, a liberdade de empresa, o direito à ação e a um tribunal imparcial, e a diversidade cultural, religiosa e linguística.»
Esta limitação está em perfeita consonância com o disposto no art. 18.º da Constituição da República Portuguesa.
Mas ainda se acrescenta no considerando (19) que: «Nos casos em que o tratamento de dados pessoais por organismos privados fica abrangido pelo presente regulamento, este deverá prever a possibilidade de os Estados-Membros restringirem legalmente, em determinadas condições, certas obrigações e direitos, quando tal restrição constitua medida necessária e proporcionada, numa sociedade democrática, para salvaguardar interesses específicos importantes, incluindo a segurança pública e a prevenção, investigação, deteção ou repressão de infrações penais ou a execução de sanções penais, incluindo a salvaguarda e a prevenção de ameaças à segurança pública. Tal possibilidade é importante, por exemplo, no quadro da luta contra o branqueamento de capitais ou das atividades dos laboratórios de polícia científica.»

A Lei 58/2019, de 08-08, invocada pelos recorrentes, destina-se a assegurar «a execução, na ordem jurídica nacional, do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados», pelo que a sua interpretação deve sempre balizar-se pelos princípios e limitações estruturantes desta matéria previstos no RGPD.

Nesta perspectiva o art. 2.º, n.º 1, da referida Lei prescreve que a mesma se aplica «aos tratamentos de dados pessoais realizados no território nacional, independentemente da natureza pública ou privada do responsável pelo tratamento ou do subcontratante, mesmo que o tratamento de dados pessoais seja efetuado em cumprimento de obrigações legais ou no âmbito da prossecução de missões de interesse público, aplicando-se todas as exclusões previstas no artigo 2.º do RGPD.»

O art. 19.º, n.º 1 da referida Lei que é invocado pelos recorrentes estabelece quanto a videovigilância que «[s]em prejuízo das disposições legais específicas que imponham a sua utilização, nomeadamente por razões de segurança pública, os sistemas de videovigilância cuja finalidade seja a proteção de pessoas e bens asseguram os requisitos previstos no artigo 31.º da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio, com os limites definidos no número seguinte».
E no n.º 2 define-se que:
«As câmaras não podem incidir sobre:
a) Vias públicas, propriedades limítrofes ou outros locais que não sejam do domínio exclusivo do responsável,
exceto no que seja estritamente necessário para cobrir os acessos ao imóvel;[34]
b) A zona de digitação de códigos de caixas multibanco ou outros terminais de pagamento ATM;
c) O interior de áreas reservadas a clientes ou utentes onde deva ser respeitada a privacidade, designadamente instalações sanitárias, zonas de espera e provadores de vestuário;
d) O interior de áreas reservadas aos trabalhadores, designadamente zonas de refeição, vestiários, ginásios, instalações sanitárias e zonas exclusivamente afetas ao seu descanso.
3 - Nos estabelecimentos de ensino, as câmaras de videovigilância só podem incidir sobre os perímetros externos e locais de acesso, e ainda sobre espaços cujos bens e equipamentos requeiram especial proteção, como laboratórios ou salas de informática.
4 - Nos casos em que é admitida a videovigilância, é proibida a captação de som, exceto no período em que as instalações vigiadas estejam encerradas ou mediante autorização prévia da CNPD.»

Compulsando as imagens dos fotogramas juntos aos autos cuja nulidade vem invocada, verificamos que as mesmas dão total cumprimento ao disposto na citada alínea a), apenas estando visível uma zona muitíssimo limitada da via pública estritamente necessária a cobrir o acesso aos imóveis, em situação totalmente compatível com a finalidade de protecção de pessoas e bens a que se destinam estes equipamentos.
Nenhuma das demais situações previstas na norma tem correspondência com a situação dos autos.
Por outro lado, o art. 31.º da Lei 34/2013, de 16-05, diploma que estabelece o regime do exercício da actividade de segurança privada e procede à primeira alteração à Lei 49/2008, de 27-08 (Lei de Organização da Investigação Criminal), aplicável nos termos do citado art. 19.º, n.º 1, da Lei 58/2019, de 08-08, também invocado pelos recorrentes, estabelece as formalidades a que deve obedecer a utilização de sistemas de vigilância por câmaras de vídeo.
Mas estas formalidades, ou menor, a sua falta, como já se referiu, não determinam por si só a ilicitude da gravação.
É necessário encontrar o equilíbrio entre os direitos e interesses em confronto, todos constitucionalmente protegidos, e perceber se as imagens captadas se enquadram dentro dos princípios e limites fixados pela legislação comunitária, pela constituição e pela legislação infraconstitucional.
No caso em apreço, a resposta não pode deixar de ser afirmativa, no sentido do respeito por aqueles parâmetros legais, uma vez que estamos perante a captação de imagens que não podem constituir surpresa ou deslealdade para com os visados – pois sabemos hoje que a via pública, designadamente junto de acessos a residências ou estabelecimentos comerciais é fortemente controlada por este tipo de sistemas de vigilância –; a captação das imagens é lícita pois restringiu-se ao mínimo necessário à protecção e segurança de bens e pessoas dentro das finalidades para as quais se destinava o sistema, mostrando-se aleatória e não especificamente dirigida aos arguidos dos autos, as imagens forma captadas na via pública ou no interior de espaços privados onde estão instalados os sistemas; não respeitam ao núcleo restrito da intimidade dos visados e a sua utilização, ponderando os interesses em confronto, a gravidade das condutas para as quais se pretende a sua utilização, que podemos enquadrar dentro do mesmo plano de prevenção e protecção de pessoas e bens subjacente às finalidades previstas na lei, mostra-se necessária, adequada e proporcional ao alcance desses fins.
Ou seja, a legislação a que se fez referência surge como causa justificante da restrição do direito à imagem (autorização legal), restrição que passou pelo crivo da autoridade judicial, ao ser avaliada e validada em fase de instrução e depois em fase de julgamento (validação judicial), tudo levando a concluir que estes meios de prova, resultantes dos fotogramas retirados dos sistemas de videovigilância e, nessa sequência, dos autos de visionamento que constam do anexo A, constituem meio de prova válido já que a captação de imagens e as reproduções mecânicas desta se devem ter por lícitas para efeitos do disposto no art. 167.º do CPPenal, por ter sido justificada e, por isso, excluída a sua ilicitude.
Tal como afirma João Gouveia de Caires[35], nestes casos a «captação de elementos relevantes do crime foi um mero acaso e não uma intencional investigação através de meios de prevenção. A finalidade do sistema não é subvertida pela utilização meramente pontual».
Acresce que «o controlo ex-post por via da junção aos autos, determinada pela autoridade judiciária responsável pela fase processual em causa, e a possibilidade do juízo (judicial) de ponderação de interesses (em concreto), acautelam os fins da investigação compatíveis as exigências de prevenção»[36].

A jurisprudência tem perfilhado de forma praticamente pacífica este entendimento, mencionando-se a título meramente exemplificativo as seguintes decisões:
• Supremo Tribunal de Justiça de 28-092011, Proc. n.º 22/09.6YGLSB.S2, acessível in www.dgsi.pt;
• Relação de Évora de 24-04-2012, Proc. n.º 932/10.8PAOLH.E1, acessível in www.dgsi.pt;
• Relação de Coimbra de 10-10-2012, Proc. n.º 19/11.6TAPBL.C1, acessível in www.dgsi.pt;
• Relação do Porto de 23-01-2013, Proc. n.º 932/07.5TAVRL.P1, acessível in www.dgsi.pt;
• Relação de Guimarães de 19-10-2015, CJ XL, Tomo IV, pág. 306;
• Relação de Lisboa de 10-05-2016, Proc. n.º 12/14.7SHLSB.L1.L1-5, acessível in www.dgsi.pt;
• Relação de Coimbra de 20-09-2017, Proc. n.º 167/15.3PBVFX.C1, acessível in www.dgsi.pt; e
• Relação do Porto de 10-12-2019, Proc. n.º 10665/15.3T9PRT.P1, acessível in www.dgsi.pt.

Em face de tudo o que vem exposto, deve improceder a apreciada pretensão dos recorrentes no que concerne à questão dos fotogramas.

Já o registo de imagem efectuado pelo OPC sem autorização judicial prévia e sem controlo judicial posterior conduz-nos a outro patamar da questão.
É que nestes casos, como aconteceu no dos autos, faltará muito mais do que nas situações apreciadas relativas aos sistemas de videovigilância, onde encontramos à partida uma autorização legal.
Em casos como o que ora se aprecia, como vimos, não temos uma autorização legal genérica para que os OPC em geral, indiscriminadamente, arbitrariamente e sem limites, violem direitos constitucionalmente protegidos e captem imagens de suspeitos ou arguidos alvo das suas investigações.
É certo que o art. 4.º, n.º 3, da Lei 37/2008, de 06-08, e actualmente o mesmo artigo e número do DL 137/2019, de 13-09, que revogou aquele primeiro diploma, prevêem que a Polícia Judiciária, em matéria de prevenção e detecção criminal, possa, nas vigilâncias que realiza, recorrer a todos os meios e técnicas de registo de som e de imagem, bem como a revistas e buscas, nos termos do disposto no Código de Processo Penal e legislação complementar.
Mas esta é uma norma genérica, dirigida à Polícia Judiciária (os diplomas respeitam à orgânica da Polícia Judiciária) e não à Polícia de Segurança Pública, entidade que levou a cabo a investigação destes autos e para a qual não se prevê idêntica disposição.
Veja-se que esta entidade até justificou perante o Ministério Público que, em cumprimento da Lei 5/2002, de 11-01, precisava de recolher imagens e som (cf. fls. 3 a 5).
Porém, nem os autos se situam no âmbito de aplicação deste diploma, como resulta desde logo dos crimes de catálogo enunciados no art. 1.º desta Lei, circunstância que não é contravertida nestes autos, nem, a ter-se hipoteticamente por correcta a aplicação de tal diploma, lhes foi dado o seguimento que se impunha de acordo com o disposto no seu art. 6.º, n.º 2, obtendo-se a prévia autorização judicial e dando-se cumprimentos às formalidades previstas no art. 188.º do CPPenal ex vi art. 6.º, n.º 3, do referido diploma legal.
Assim, à míngua de disposição do Código de Processo Penal que admitisse expressamente a captação de imagens para os fins de investigação subjacentes à actuação do OPC que a realizou – disposição que, face à coerência e unidade do ordenamento, nunca poderia admitir a restrição do direito à imagem em moldes menos exigentes do que os que vemos nos arts. 187.º e 188.º para as escutas telefónicas ou em diplomas avulsos como a referida Lei 5/2002, de 11-01, no mínimo com prévia autorização judicial e posterior controlo judicial[37] – ou de qualquer outra disposição em legislação avulsa que permitisse ao OPC a captação de imagens nestas condições, a conduta é ilícita.
E contrariamente ao afirmado pelo Tribunal a quo na decisão recorrida a violação do direito à imagem é muito mais intrusiva do que a violação do direito à palavra. É que enquanto esta permite identificar uma conversa, um diálogo, embora sem identificar a autoria – informação à qual se chega pela conjugação de outros factores – a violação do direito à imagem pode permitir a identificação individual daquela pessoa em concreto, o núcleo mais pessoal de cada um de nós enquanto seres humanos.
Não é por acaso que o RGPD no seu considerando (51) destaca a protecção da imagem e não a da palavra, pois a primeira pode ser equiparada em algumas situações a dados biométricos, observando a este propósito que «[m]erecem proteção específica os dados pessoais que sejam, pela sua natureza, especialmente sensíveis do ponto de vista dos direitos e liberdades fundamentais, dado que o contexto do tratamento desses dados poderá implicar riscos significativos para os direitos e liberdades fundamentais. Deverão incluir-se neste caso os dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, não implicando o uso do termo «origem racial» no presente regulamento que a União aceite teorias que procuram determinar a existência de diferentes raças humanas. O tratamento de fotografias não deverá ser considerado sistematicamente um tratamento de categorias especiais de dados pessoais, uma vez que são apenas abrangidas pela definição de dados biométricos quando forem processadas por meios técnicos específicos que permitam a identificação inequívoca ou a autenticação de uma pessoa singular. Tais dados pessoais não deverão ser objeto de tratamento, salvo se essa operação for autorizada em casos específicos definidos no presente regulamento, tendo em conta que o direito dos Estados-Membros pode estabelecer disposições de proteção de dados específicas, a fim de adaptar a aplicação das regras do presente regulamento para dar cumprimento a uma obrigação legal, para o exercício de funções de interesse público ou para o exercício da autoridade pública de que está investido o responsável pelo tratamento.»

Mas a causa de justificação da ilicitude, ou até a atipicidade como se afirma no acórdão recorrido, não pode de forma alguma ser generalizada, no sentido de que basta qualquer tipo de investigação criminal para permitir a violação do direito, constitucionalmente protegido, à imagem. Nesta perspectiva, de ausência de balizas para que as autoridades de investigação violem o direito à imagem, estaria aberta a porta para que alguém pudesse ver esse direito lesado para se investigar uma injúria ou um estalo na cara, ao sabor do empenho do investigador.
Ainda nestes casos, de investigação criminal, a restrição do direito à imagem não pode deixar de ser olhada como extraordinária e sujeita a um juízo de proporcionalidade e adequação que só um magistrado judicial pode emitir, limitações que, como se referiu, devem, no mínimo, ser idênticas às relevantes para efeitos de escutas telefónicas e sujeitas a igual formalismo.

Vemos, assim, que no caso dos autos a análise da questão por via das causas de justificação da ilicitude falece logo de início por não existir qualquer autorização legal que permita a conduta pelo OPC de captação de imagens do arguido.
Mas ainda que existisse tal disposição, a mesma certamente não impedia que a actuação do OPC ao fotografar os arguidos nos termos realizados continuasse a não estar justificada à luz dos princípios da proporcionalidade e adequação, posto que executada sem autorização judicial prévia – a possibilidade deste despacho permitiria, naturalmente, a valoração dos interesses a ponderar, eventualmente até com autorização da recolha de imagens, que não é uma prática assim já tão rara, dada a complexidade crescente da actividade criminal – e o posterior controlo judicial, em consonância e coerência com a unidade do ordenamento relativamente a outros direitos fundamentais e mesmo relativamente ao direito à imagem no quadro de legislação avulsa.
Esta leitura mostra-se coincidente com a posição da doutrina que foi sendo exposta ao longo desta decisão sobre esta temática.
A título de exemplo, veja-se João Gouveia de Caires no texto mencionado na nota-de-rodapé n.º 21[38], que responde, categoricamente, não à possibilidade de realização de fotografias nas condições ocorridas nos autos, explicando que «[a] exigência é dupla: permissão normativa pela Ordem Jurídica e prévia autorização judicial (devidamente fundamentada).»[39]
Nestes casos «[a] captura da imagem (…) não é fruto do mero acaso, com que todos lidamos, admitimos e partilhamos no “risco da vida em sociedade”», impondo-se sempre a ponderação «de que modo é que o recurso em tempo útil aos meios (lícitos) processuais adequados poderia acautelar de modo aceitável os fins e interesses de terceiros ou da investigação. Fora da exclusão da ilicitude deverão ficar todos os casos em que se demonstre haver aquela possibilidade de recurso, em tempo útil, aos meios lícitos[40].
Também Carlos Rodrigues de Almeida[41] considera ilícita a captação de imagens realizada pelas autoridades policiais nestes termos.
Saliente-se ainda que a Directiva (UE) 2016/680 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27-04-2016, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas autoridades competentes para efeitos de prevenção, investigação, detecção ou repressão de infracções penais ou execução de sanções penais, e à livre circulação desses dados, também não prescinde de quase todos os princípios que o RGPD inscreveu como orientadores da protecção de dados, princípio a que já se aludiu, exigindo-se também aqui um tratamento lícito e leal, uma recolha de dados para finalidades determinadas, explícitas e legítimas, e o seu tratamento de forma adequada, pertinente e limitada ao mínimo necessário relativamente às finalidades para as quais são tratados e nunca de modo incompatível com essas finalidades.
Também por esta via, em concordância com as exigências constitucionais, a ausência de autorização legal e de controlo judicial, de forma prévia, através de autorização, e posteriormente à captação de imagens, para garantir a permanente legalidade da restrição do direito à imagem, é evidente a impossibilidade de recurso às apontadas fotografias como meio de prova.

Assim, é inquestionável que as fotografias realizadas pelo OPC como suporte das vigilâncias levadas a cabo em fase de investigação, porque realizadas de forma ilícita, sem verificação de causas de exclusão da ilicitude, não podem ser ponderadas como meio de prova, nos termos do disposto no art. 167.º, n.º 1, do CPPenal.
Impõe-se, em consonância com esta constatação, que o Tribunal a quo reformule a fundamentação do acórdão no estritamente necessário à respectiva reparação, retirando de entre os meios de prova ponderados na decisão recorrida as fotografias que acompanham os autos de vigilância e que constam de fls. 1 a 14, 17 a 80 e 151 a 168 do anexo A.
Esta decisão não invalida (i) nem as vigilâncias realizadas, (ii) nem os relatórios que as descrevem no que concerne ao relato escrito dos mesmos, uma vez que as fotografias que acompanham e apoiam os relatórios de vigilância apenas serviram para corroborar a narração da dinâmica dos acontecimentos observados e descritos, (iii) nem o depoimento dos agentes que as produziram e dos demais que participaram nas vigilâncias e presenciaram os factos relatados nos autos de vigilância. Apenas os depoimentos prestados com base na exclusiva observação das fotografias tiradas pelo OPC e não no testemunho directo dos acontecimentos se mostram, mas apenas nessa específica parcela, igualmente feridos da invalidade que afectou as fotografias como meio de prova, não podendo ser valorados pelo Tribunal a quo nessa parte.
Assim, neste segmento do recurso é de conceder provimento aos recorrentes.
*
B.2Ilegalidade da prova, consistente na audição de testemunhas com ocultação da identidade e imagem à margem da lei
Esta questão já foi em bom rigor colocada no 1.º recurso interlocutório que foi apreciado.
Os recorrentes não apresentaram diferentes argumentos.
Este Tribunal da Relação do Porto decidiu quanto àquele recurso o seguinte[42]:
«A questão resume-se, pois, em saber se no caso concreto, podia ter ocorrido a audição das testemunhas nos termos indicados nas decisões de 30-06-2020 e de 08-07-2020, este em complemento do primeiro, ou se a prova assim produzida deve ser considerada inválida e de nenhum efeito, como pretendem os recorrentes.
Como se vê das duas decisões referidas, o Tribunal a quo abordou a questão por duas vias: por um lado, fazendo apelo ao Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública (DL 243/2015, de 19-10) e, por outro, remetendo para a Lei de Protecção de Testemunhas (Lei 93/99, de 14-07).
No que concerne ao primeiro diploma, resulta do disposto no seu art. 19.º que os polícias podem ser temporariamente dispensados da necessidade de revelar a sua identidade e qualidade, meios materiais e equipamentos utilizados (n.º 1) e aos polícias envolvidos em acções policiais ou em acções determinadas por autoridade judiciária competente pode ser determinado o uso de um sistema de codificação da sua identidade policial (n.º 3), sendo certo que as autorizações da dispensa temporária de identificação e da codificação referidas nos n.ºs 1 e 2 são da competência do director nacional (n.º 4).
Ora, a fls. 2774 a 2775 foi junto aos autos pelo Ministério Público, em anexo ao aditamento à promoção realizada nos autos a propósito desta matéria, uma comunicação do Director Nacional da Polícia de Segurança Pública onde é retratado o contexto de funcionamento dos operacionais do Núcleo de Apoio Operacional (NAOP), serviço integrado no Departamento de Investigação Criminal da Direcção Nacional (DIC/DN), que no caso concreto deram apoio à investigação dos autos levada a cabo pela DIC (Divisão de Investigação Criminal) do Porto.
Aí é esclarecido que «[o]s operacionais do NAOP desempenham missões de seguimento e vigilância, em investigações que envolvem especial complexidade e perigo para os investigadores, quer pelas características inerentes aos investigados e ao crime em execução, quer pela natureza da sua missão no que concerne à recolha da prova». Por tal razão, «[d]e modo a garantir a segurança das operações, e em particular a segurança dos operacionais, é habitualmente solicitada a sua audição em julgamento, salvaguardando a sua identidade» com ocultação da imagem.
Mais se acrescenta que tal actividade «envolve o contacto directo com a criminalidade organizada e de origem transnacional, subsistindo um perigo objectivo da existência de represálias contra a vida, a integridade física ou para os bens patrimoniais dos envolvidos» nas diligências de investigação, pelo que a divulgação da identidade dos operacionais do NAOP colocá-los-á em risco, bem como às suas famílias.
Por isso, é solicitada a sua audição nos termos do art. 16.º da Lei de Protecção de Testemunhas.
O que esta missiva revela, antes de tudo, é que o Director Nacional da PSP, a quem compete a autorização para dispensa temporária de identificação de policiais e utilização de sistema de codificação de identificação, não só confirma essa autorização como, preocupado com a segurança dos seus operacionais e famílias, solicita que a respectiva audição em Tribunal não coloque em causa a ocultação da identidade dos mesmos, essencial à prossecução da actividade dos referidos operacionais.
Porém, uma vez que o DL 243/2015, de 19-10, ainda aguarda por regulamentação, através de portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna, quanto à matéria da dispensa temporária de identificação e do respectivo sistema de codificação (n.º 3 do art. 19.º), poder-se-á equacionar se os elementos fornecidos serão suficientes para a manutenção da ocultação da identidade dos operacionais em causa, embora substancialmente a sustentem.
É aqui que entronca a segunda vertente da fundamentação da decisão aqui apreciada, isto é, o recurso à Lei de Protecção de Testemunhas.
Este diploma (Lei 93/99, de 14-07) regula a aplicação de medidas para protecção de testemunhas em processo penal quando a sua vida, integridade física ou psíquica, liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado sejam postos em perigo por causa do seu contributo para a prova dos factos que constituem objecto do processo (art. 1.º, n.º 1), entendendo-se como testemunha qualquer pessoa que, independentemente do seu estatuto face à lei processual, disponha de informação ou de conhecimento necessários à revelação, percepção ou apreciação de factos que constituam objecto do processo, de cuja utilização resulte um perigo para si ou para outrem, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo anterior (art. 2.º, al. a)).
Daqui resulta que o estatuto de OPC das testemunhas que foram ouvidas com ocultação de identidade não inibe a aplicação do diploma.
De acordo com o art. 16.º da mencionada Lei:
«A não revelação da identidade da testemunha pode ter lugar durante alguma ou em todas as fases do processo se estiverem reunidas cumulativamente as seguintes condições:
a) O depoimento ou as declarações disserem respeito a crimes de tráfico de pessoas, de associação criminosa, de terrorismo, de terrorismo internacional ou de organizações terroristas ou, desde que puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a oito anos, a crimes contra a vida, contra a integridade física, contra a liberdade das pessoas, contra a liberdade ou autodeterminação sexual, de corrupção, de burla qualificada, de administração danosa que cause prejuízo superior a 10 000 unidades de conta, ou cometidos por quem fizer parte de associação criminosa no âmbito da finalidade ou actividade desta;
b) A testemunha, seus familiares, a pessoa que com ela viva em condições análogas às dos cônjuges ou outras pessoas que lhes sejam próximas correrem um grave perigo de atentado contra a vida, a integridade física, a liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado;
c) Não ser fundadamente posta em dúvida a credibilidade da testemunha;
d) O depoimento ou as declarações constituírem um contributo probatório de relevo».

Os recorrentes, em rigor, apenas invocam que a decisão recorrida constitui uma flagrante e despudorada violação do disposto nos arts. 138.º, n.º 3, e 139.º, n.º 2, a contrario, do CPPenal, art.º 16.º, al. a), da Lei 93/99, de 14-17, e art. 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.
Mas não explicam as razões da sua alegação.
O art. 138.º, n.º 3 do CPPenal estabelece as regras sobre a inquirição, determinando que [a] inquirição deve incidir, primeiramente, sobre os elementos necessários à identificação da testemunha, sobre as suas relações de parentesco e de interesse com o arguido, o ofendido, o assistente, as partes civis e com outras testemunhas, bem como sobre quaisquer circunstâncias relevantes para avaliação da credibilidade do depoimento e [s]eguidamente, se for obrigada a juramento, deve prestá-lo, após o que depõe nos termos e dentro dos limites legais.
Por seu turno, art. 139.º do CPPenal, sob a epígrafe «Imunidades, prerrogativas e medidas especiais de protecção», para além que prever no seu n.º 1 que [t]êm aplicação em processo penal todas as imunidades e prerrogativas estabelecidas na lei quanto ao dever de testemunhar e ao modo e local de prestação dos depoimentos, salvaguarda no n.º 2 a protecção das testemunhas e de outros intervenientes no processo contra formas de ameaça, pressão ou intimidação, nomeadamente nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, remetendo para a forma como é regulada em lei especial.
Em qualquer dos casos, fica assegurada a possibilidade de realização do contraditório legalmente admissível no caso (n.º 3).

Para que seja reconhecida razão aos recorrentes é necessário, por isso, que a lei especial de protecção de testemunhas não tenha sido cumprida ou que não tenha sido dada a possibilidade de ser exercício o contraditório.

Resulta da análise do citado art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07, que a ocultação da identidade da testemunha pode ter lugar em qualquer fase do processo, incluindo a de julgamento, desde que estejam reunidos cumulativamente os quatro requisitos previstos nas alíneas a) a d).
A decisão colegial de 08-07-2020 aborda todos estes pressupostos dando resposta fundamentada e positiva à verificação dos requisitos indicados.
Concordamos com tal apreciação, que já se deixou transcrita, pelo que conferiremos apenas sumariamente tópicos relevantes para cada um desses requisitos.
Assim, quanto à alínea a) importa relembrar que os arguidos foram submetidos a julgamento pronunciados globalmente pela prática de crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, al. e), do CPenal, violência depois da subtracção, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 203.º, n.º 1, 204.º, n.º 2, al. e), 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e 211.º, todos do CPenal, detenção de arma proibida, p e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), por referência ao art. 3.º, n.º 2, al. e), da Lei n.º 5/2006, de 23-02, falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º, n.ºs 1, al. f), e 3 do CPenal, e receptação dolosa p. e p. pelo art. 231.º, n.º 1, do CPenal.

O crime de violência depois da subtracção imputado é punido com uma pena de 3 (três) a 15 (quinze) anos de prisão e, embora inserido no capítulo dos crimes contra a propriedade, integra elementos próprios da ofensa à integridade física e à liberdade de decisão e de acção (através da ameaça, da colocação na impossibilidade de resistir e/ou da violência, sendo que esta última pode colidir igualmente com a liberdade de movimentos), bens jurídicos que encontram a devida protecção neste tipo legal, que consome outros que protegem isoladamente tais bens jurídicos[43].
Mostra-se, pois, verificado o pressuposto inscrito na alínea a) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07, concretamente a circunstância de no processo estar imputado aos arguidos crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a oito anos, respeitante a crime, para além do mais, contra a integridade física e contra a liberdade das pessoas, tendo as testemunhas participado na investigação que culminou com a imputação da prática deste e de outros crimes.
Quanto ao grave perigo de atentado contra a vida ou a integridade física dos agentes e/ou seus familiares (al. b) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07) importa realçar, como o fez o Tribunal a quo, a qualidade e especial missão destes agentes da PSP cuja identidade no âmbito da actividade criminosa grave e sensível colocará em risco sérios os bens jurídicos que se pretendem proteger com as medidas previstas no diploma.
O Tribunal a quo salientou adequadamente os reais perigos e riscos que para a integridade física dos agentes poderá decorrer da exposição da sua identidade, pelas razões expostas, designadamente quanto à dinâmica dos crimes e personalidade dos arguidos destes autos reflectidas nos factos imputados (causas intraprocessuais), mas também no respectivo comportamento no âmbito do sistema prisional, de que é dada nota.
Mas, para além desses, não se pode olvidar que no universo da criminalidade, com especial enfoque para este tipo de criminalidade que os agentes da PSP do NAOP normalmente investigam, complexa, organizada, muitas vezes transnacional, os pontos de intersecção com várias áreas da delinquência são inevitáveis, e o risco de perigo grave para a integridade física por causas externas é igualmente uma realidade.
Veja-se que a organização, planeamento e logística presentes no cometimento dos crimes dos autos não está desligada de contactos transnacionais (deslocalização de bens furtados para o estrangeiro), havendo igualmente arguidos em paradeiro desconhecido.
Mostra-se, pois, acertado o reconhecimento de que os policiais ligados à investigação pertencentes ao NAOP correriam grave perigo de atentado contra a vida ou a integridade física caso as suas identidades fossem reveladas.

Relativamente ao pressuposto de não ser, fundadamente, posta em dúvida a credibilidade da testemunha (al. c) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07), é de acolher a avaliação de credibilidade que consta da decisão de 08-07-2020.
Nem os recorrentes, em boa verdade, avançam qualquer justificação para suspeitarem da credibilidade destes agentes da PSP, operacionais que foram acreditados pelo Director Nacional da PSP, em consonância com as suas atribuições previstas no DL 243/2015, de 19-10.
Não vislumbramos, pois, razões para que seja posta em causa a credibilidade destas testemunhas e tal não foi feito, fundadamente, pelos recorrentes.

Por último, os recorrentes também não infirmaram o relevo probatório destes depoimentos (al. d) do art. 16.º da Lei 93/99, de 14-07) e a argumentação da decisão de 08-07-2020 a este propósito confirma-a, sendo certo que foi a própria Defesa dos arguidos quem viu interesse na inquirição destes operacionais, como se realça naquela decisão.

Conforme resulta da acta de julgamento de fls. 2809 a 2820 (sessão de 09-07-2020) e do auto de diligência de fls. 2832 a 2833, e em consonância com o disposto nos arts. 4.º e 5.º da Lei 93/99, de 14-07, as testemunhas foram inquiridas por videoconferência, com ocultação de identidade e apenas com distorção de imagem, posto que distorção de voz não foi possível por problemas técnicos.
Prestaram juramento perante juiz que presidiu a tal diligência.
A realização das inquirições nos termos descritos cumpriu os requisitos necessários previstos no diploma e assegurou a realização do contraditório, de forma a garantir o justo equilíbrio entre as necessidades de combate ao crime e o direito de defesa (art. 1.º, n.º 5, da Lei 93/99, de 14-07).
A inquirição foi, por isso, realizada, em consonância com o disposto nos arts. 139.º, n.º 2, do CPPenal (que excepciona o cumprimento do art. 138.º, n.º 3) e 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.
A Defesa dos arguidos só não se pôde inteirar das características faciais das testemunhas e do seu nome e outros elementos de identificação.
Mas o mais importante no depoimento de uma testemunha, em particular de agentes da autoridade, mais do que saber como é a sua cara ou por que nome é chamado, é perceber o que ela sabe, porque sabe e em que condições adquiriu o conhecimento dos factos.
Toda esta panóplia de informações estava à disposição da Defesa dos arguidos no sentido de poder exercer plenamente o contraditório, colocando as questões que considerasse pertinentes em face das informações que iam sendo prestadas pelas testemunhas.
O facto de a Defesa dos arguidos ter optado por não inquirir estas testemunhas é uma escolha que só a si pode ser imputada, jamais podendo atribuir-se ao Tribunal de julgamento qualquer tipo de entrave ao exercício do contraditório quanto às apontadas testemunhas.
Face ao exposto, não se reconhece razão aos recorrentes na questão colocada neste recurso interlocutório, que, por isso, deve improceder.»

Acolhemos e reproduzimos também aqui esta mesma argumentação, a que pouco temos a acrescentar.
Na verdade, de acordo com a argumentação expendida, a prova resultante dos depoimentos das indicadas testemunhas, por ter ocorrido em cumprimento dos pressupostos legais e não ter beliscado o direito ao contraditório dos arguidos, é perfeitamente legal e, por isso, válida.
Acresce que nos termos do n.º 2 do art. 19.º da Lei 93/99, de 14-07, «[n]enhuma decisão condenatória poderá fundar-se, exclusivamente, ou de modo decisivo, no depoimento ou nas declarações produzidas por uma ou mais testemunhas cuja identidade não foi revelada.»
Ora, a decisão recorrida até revela que o Tribunal a quo segmentou a respectiva motivação de forma a deixar bem visível que estes depoimentos não fundamentaram de forma exclusiva ou preponderante a decisão de condenação.
Nestes termos, nenhuma invalidade ou limitação recai sobre os mencionados depoimentos, sendo de julgar improcedente esta parte do recurso.
*
Entre as questões suscitadas relativas à validade dos meios de prova resta apreciar a da nulidade dos reconhecimentos de objectos.
Contudo, pela forma como está estruturada a alegação dos recorrentes, em parte com recurso à prova produzida em audiência de julgamento, designadamente depoimentos dos ofendidos que os recorrentes consideram incompatíveis com o teor dos autos de reconhecimento, e também pela forma como a decisão recorrida dá resposta a esta matéria, igualmente com concatenação de vários elementos de prova, incluindo as declarações dos ofendidos, mas não só, não pode este Tribunal de recurso dar resposta cabal a esta questão sem recorrer, para além do mais, aos apontados elementos de prova e à análise da fundamentação que sustenta a decisão recorrida.
Considerando que a fundamentação da decisão terá de ser reformulada não se mostra adequada a apreciação de tal questão com recurso à fundamentação que conta actualmente dos autos.
O conhecimento desta questão e das demais suscitadas respeitantes ao mérito da causa, pelas mesmas razões, fica prejudicado.
*
III. Decisão:
Face ao exposto, acordam os Juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em:
a) - Negar provimento ao recurso interlocutório interposto pelos arguidos da decisão que determinou a inquirição de agentes da PSP com ocultação da identidade e da imagem;
b) - Negar provimento ao recurso interlocutório interposto pelos arguidos da decisão que determinou o prosseguimento do julgamento após ter sido suscitado o incidente de recusa;
c) - Negar provimento ao recurso interlocutório interposto pelos arguidos da decisão que entendeu não pertinente a junção aos autos dos certificados de licenciamento de câmaras que registaram imagens de videoconferência;
d) - Negar (parcial) provimento ao recurso interposto pelos arguidos do acórdão final quanto às questões da nulidade da prova consistente nos fotogramas retirados de câmaras de videovigilância e da ilegalidade da prova consistente na audição de testemunhas com ocultação da identidade e da imagem;
e) - Conceder (parcial) provimento ao recurso interposto pelos arguidos do acórdão final quanto à questão da nulidade da prova consistente na captação de imagens dos arguidos através de fotografias tiradas por agentes da PSP e, em consequência:
e1) - Reconhecer a impossibilidade de valoração de tais fotografias como meio de prova;
e2) - Determinar a baixa dos autos à 1.ª Instância para que seja reformulada a fundamentação do acórdão recorrido de acordo com o estritamente necessário à desconsideração deste meio de prova na determinação da convicção do Tribunal, nos termos supramencionados;
f) - Considerar prejudicado, por força do decido em e), o conhecimento das demais questões do recurso do acórdão final.
Custas pelos recorrentes quanto aos recursos intercalares, fixando-se em 4 UC a taxa de justiça devida por cada um dos arguidos por cada um dos recursos (arts. 513.º, n.ºs. 1 e 3, do CPPenal e 8.º, n.º 9, do RCP e Tabela III anexa).
Sem tributação quanto ao recurso do acórdão final (art. 513.º, n.º 1, do CPPenal).

Porto, 27 de Janeiro de 2021
(Texto elaborado e integralmente revisto pela relatora, sendo as assinaturas autógrafas substituídas pelas electrónicas apostas no topo esquerdo da primeira página)
Maria Joana Grácio
Paulo Costa
______________
[1] As notas-de-rodapé apresentam diferente numeração por terem sido inseridas no texto do acórdão.
[2] Sublinhado nosso.
[3] Sublinhado nosso.
[4] Sublinhado nosso.
[5] Sublinhado acrescentado nesta decisão para realçar o tema colocado à apreciação do Tribunal de recurso.
[6] É o que resulta do disposto nos arts. 412.º e 417.º do CPPenal. Neste sentido, entre muitos outros, acórdãos do STJ de 29-01-2015, Proc. n.º 91/14.7YFLSB.S1 - 5.ª Secção, e de 30-06-2016, Proc. n.º 370/13.0PEVFX.L1.S1 - 5.ª Secção.
[7] Cf. Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, Coimbra Editora, 1999, anotações aos arts. 210.º e 211.º.
[8] Neste sentido, vejam-se entre outros, o acórdão da Relação de Coimbra de 03-02-2016, proferido no âmbito do Proc. n.º 136/12.5TASEI.C1, acessível in www.dgsi.pt, segundo o qual:
«I - A mera apresentação do requerimento não deve ter o efeito imediato de suspender a normal tramitação do processo.
II - Não obstante o recebimento do pedido de recusa, o juiz recusado deve ordenar o prosseguimento dos autos, com a realização do debate instrutório no qual foi deduzido o incidente e respectiva decisão, pois é a melhor forma de defender o interesse da vítima e a própria tramitação normal do processo.
III - Os interesses de quem requereu a recusa serão sempre assegurados e estarão acautelados pela possibilidade de anulação até dos próprios actos praticados até ao momento em que é pedida a recusa se deles resultar prejuízo para a justiça da decisão do processo.
IV - Se o incidente for julgado procedente, os actos serão anulados nos termos referidos e a pretensão do arguido é satisfeita.»
E o acórdão da Relação do Porto de 13-06-2018, proferido no âmbito do Proc. n.º 406/15.0GAVFR-B.P1, acessível in www.dgsi.pt, onde se afirma:
«I - A mera apresentação do requerimento de recusa do juiz não deve, de per se, determinar a suspensão da tramitação do processo.
II - O juiz deve realizar, não apenas os actos processuais urgentes, como também, os necessários para assegurar a continuidade da audiência.
III - Assim, iniciada a inquirição da testemunha, ofendida em crime de violência doméstica, a 25JAN, que continuou na sessão de 2FEV e designada a sua continuação para 8FEV, se a 7FEV da entrada em juízo o requerimento de recusa do juiz apresentado pelo arguido, quando restavam 24 dias para se atingir os 30 previstos no artigo 328.º/6 C P Penal, o prosseguimento da inquirição da testemunha, na conciliação do seu próprio e pessoal interesse com o da tramitação normal do processo, não acarreta prejuízo algum para o arguido.
IV - Na hipótese de proceder o incidente de recusa, os actos são inválidos, se devidamente arguida a sua nulidade e, assim, a pretensão do arguido é deferida.
V - Na hipótese de não proceder, os actos são válidos e o processo prossegue os seus trâmites normais.»
[9] Este artigo, com a epígrafe “Outros direitos pessoais”, estabelece no seu n.º 1 que «A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação.»
[10] Neste sentido, Manuel da Costa Andrade, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, anotação ao art. 199.º, págs. 817 a 845.
Igual posição assume Mário Ferreira Monte no texto “O registo de voz e de imagem no âmbito do combate à criminalidade organizada e económico-financeira: Lei n.º 5/2020, de 11 de Janeiro”, in Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira / Centro de Estudos Judiciários, Coimbra Editora, 2004, págs. 79 a 90
[11] Segundo Manuel da Costa Andrade, ob. cit., «[p]ara a conduta ser típica bastará que contrarie a vontade presumida do portador concreto do direito à imagem».
[12] Manuel da Costa Andrade, ob. cit..
[13] Neste sentido, Carlos Rodrigues de Almeida, no texto “O Registo de Voz e de Imagem – Notas ao artigo 6.ª da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro”, in Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira, Centro de Estudos Judiciários, Coimbra Editora, 2004, págs. 107 a 117.
[14] Ob. cit..
[15] Ob. cit..
[16] Também Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, 2.ª Edição, anotação 2. ao art. 167.º, pág. 450, elenca as reproduções feitas ao abrigo de causas de justificação entre as provas que podem ser valoradas, identificando neste enquadramento, que rejeita a redução teleológica do tipo do art. 199.º do CPPenal, a posição de Costa Andrade, a que já aludimos.
Assumindo posição formalmente idêntica, aceitando como causas de exclusão da ilicitude os actos e diligências levados a cabo no âmbito do Código de Processo Penal, com vista à descoberta da verdade material, ou seja, verdadeiros actos de investigação, encontramos a posição dos Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto, in Código de Processo Penal, Comentários e notas práticas, Coimbra Editora, 2009, anotação ao art. 167.º, pág. 432, embora sem desenvolvimento no sentido de se perceber se essa exclusão é geral ou casuística, de acordo com o contexto e relevância de cada situação, como defendo Costa Andrade, que rejeita claramente as situação de captação de imagem arbitrárias.
[17] Ob. cit..
[18] Ob. cit..
[19] Resulta do disposto no art. 198.º do CPenal que estamos perante um crime semi-público.
[20] Esta posição é defendida por João Gouveia de Caires no texto “O registo de som e imagem e as escutas ambientais, in Direito da Investigação Criminal e da Prova, com a coordenação de Maria Fernanda Palma, Augusto Silva Dias, Paulo de Sousa Mendes e Carlota Almeida, Almedina, 2014, págs. 273 a 298”, concretamente págs. 283, 284, 286 e 287.
[21] Veja-se o texto “O regime processual especial aplicável ao crime organizado (económico-financeiro): âmbito de aplicação da Lei 5/2002, de 11 de Janeiro, o regime do sigilo bancário e do registo de voz e imagem” de João Gouveia de Caires, in Direito Penal Económico e Financeiro - Conferências do curso de pós-graduação de aperfeiçoamento com a coordenação de Maria Fernanda Palma, Augusto Silva Dias e Paulo de Sousa Mendes, Coimbra Editora, 1.ª edição, Agosto de 2012, págs. 453 a 547, onde tal posição é defendida (págs. 528 e 530).
[22] Ob. cit..
[23] Também José Damião da Cunha, in Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira, A Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro de 2002, O registo de Voz e Imagem (Art. 6.º - Breves notas sobre uma norma “fortuita”), Universidade Católica Editora, Fevereiro de 2017, págs. 103 a 111, defende que não se pode inverter o sentido da lei, pugnando-se pela não existência do “direito ao crime” para justificar a licitude do meio, que assim veria a sua natureza de acto lícito ou ilícito variar consoante o resultado, isto é, se se provasse ou não o crime a demonstrar.
[24] Cf. Manuel da Costa Andrade, ob. cit..
[25] No mesmo sentido, veja-se também de João Gouveia de Caires o texto “O registo de som e imagem e as escutas ambientais, in Direito da Investigação Criminal e da Prova, com a coordenação de Maria Fernanda Palma, Augusto Silva Dias, Paulo de Sousa Mendes e Carlota Almeida, Almedina, 2014, págs. 273 a 298”.
[26] Cf. João Gouveia de Caires, ob. cit., págs. 275 e 278.
[27] In Processo Penal, Tomo I, Almedina, 2.ª edição, pág. 496.
[28] Diploma que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira e prevê a possibilidade e condições de registo de imagem.
[29] Veja-se Francisco Marcolino de Jesus in Os Meios de Obtenção da Prova em Processo Penal, Almedina, 2.ª edição, págs. 120 a 124, onde é apresentada uma resenha da jurisprudência existente perante o quadro legal da videovigilância.
[30] Proferido no âmbito do Proc. n.º 12/14.7SHLSB.L1.L1-5, relatado por Vieira Lamim, acessível in www.dgsi.pt.
[31] Este Regulamento revogou a Diretiva 95/46/CE respeitante a esta matéria.
[32] Acolhendo igualmente este sentido omissivo, mas não permissivo, da lei em sentido geral e designadamente do Código de Processo Penal, com ressalva da legislação avulsa, como a Lei 5/2002, de 11-01, que surge em resposta a esse vazio legal quanto à possibilidade de restringir o direito à imagem, veja-se José Damião da Cunha, in Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira, A Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro de 2002, O registo de Voz e Imagem (Art. 6.º - Breves notas sobre uma norma “fortuita”), Universidade Católica Editora, Fevereiro de 2017, págs. 103 a 111.
[33] Cf. art. 1.º da Lei 49/2008, de 27-08 (Lei de Organização da Investigação Criminal), que define este actividade como o conjunto de diligências que, nos termos da lei processual penal, se destinam a averiguar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a sua responsabilidade e descobrir e recolher as provas, no âmbito do processo.
[34] Realce a negro da autoria da relatora, para salientar o segmento do preceito que demonstra a conformidade legal.
[35] Cf. o texto “O registo de som e imagem e as escutas ambientais, in Direito da Investigação Criminal e da Prova, com a coordenação de Maria Fernanda Palma, Augusto Silva Dias, Paulo de Sousa Mendes e Carlota Almeida, Almedina, 2014, págs. 273 a 298”, concretamente pág. 287.
[36] Ibidem.
[37] Assim o entende também Manuel da Costa Andrade, ob. cit..
[38] Págs. 528, 529, 532 e 533.
[39] Vide ainda do mesmo Autor igual posição no texto “O registo de som e imagem e as escutas ambientai”, in Direito da Investigação Criminal e da Prova, com a coordenação de Maria Fernanda Palma, Augusto Silva Dias, Paulo de Sousa Mendes e Carlota Almeida, Almedina, 2014, págs. 273 a 298, onde reafirma esta posição.
[40] Ibidem.
[41] Posição assumida e explicada com argumentação coerente com a adoptada nesta decisão no texto “O Registo de Voz e de Imagem – Notas ao artigo 6.ª da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro”, in Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira, Centro de Estudos Judiciários, Coimbra Editora, 2004, págs. 107 a 117.
[42] A nota-de-rodapé assumiu diferente numeração ao ser reproduzida, inserindo-se na sequência das demais constantes desta decisão.
[43] Cf. Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, Coimbra Editora, 1999, anotações aos arts. 210.º e 211.º.