Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | PELAYO GONÇALVES | ||
Descritores: | RECLAMAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP | ||
Data do Acordão: | 10/30/2002 | ||
Votação: | 1 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECLAMAÇÃO. | ||
Decisão: | DEFERIDO. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | |||
Reclamações: | Rec. 147 1876/02 – 3ª Sec. Na …ª Vara Cível da Comarca do Porto, na ….ª Secção, nos autos de execução que nela pende termos sob o nº. ….-A/00, intentada pelo Banco B……., S.A, contra B……. Ldª, veio o primeiro requerer, ao abrigo do disposto no art. 837º-A, nº.1 do C.P.C., que a executada viesse aos autos “indicar que bens penhoráveis possui”. Tal requerimento foi deferido por despacho de fls. 18 (deste apenso a que respeitará a numeração que se cite), sob a cominação do nº.2 do mesmo preceito – “de ser considerado litigante de má fé”, se não prestasse tais elementos. Deste despacho interpôs recurso a Executada, que no seu entender deveria ser processado como de agravo, com efeito suspensivo por a sua execução imediata ser susceptível de causar prejuízo irreparável ou de difícil reparação. Porém, o Mm. Juiz não recebeu tal recurso por o despacho que tinha por objecto ser de mero expediente e, por isso, insusceptível de recurso, invocando o disposto no art. 679º do C.P.C. Não se conformou a Executada com este despacho de rejeição de recurso e dele reclamou para a Presidência do Tribunal da Relação da área, ao abrigo do disposto no art. 688º do C.P.C. Recebida tal reclamação foi-nos dirigida a alegação a expor as razões que justificam o recebimento do recurso nos seguintes termos: Por despacho proferido em 23.05.2002, foi a executada, ora Reclamante, notificada para, “ao abrigo do disposto no nº.1 do artigo 837º-A do C.P.C.”, “vir aos autos indicar que bens penhoráveis possui” (cfr. requerimento da Exequente), “sob cominação do artigo 837º-A, nº.2 do C.P.C.” (cfr. douto despacho acima referido); A executada interpôs, por requerimento, entrado em 07 de Junho de 2002, recurso de agravo do acima referido despacho; A exequente, naturalmente, defendeu, por requerimento de 28.06.2002, a posição de inadmissibilidade do recurso; Por douto despacho de fls. 138, foi negada a admissão do recurso interposto, por se tratar de um despacho de mero expediente “sem intervir no conflito de interesses entre as partes”. Ora, salvo o devido respeito, não tem razão o Mm. Juiz “a quo”. Na verdade, a interpretação que da disposição do artigo 837º-A do C.P.C. se faz no despacho recorrido é claramente inconstitucional. Com efeito, aceitar que é possível obrigar a pessoa do executado – de qualquer executado – a revelar em processo executivo factos e circunstâncias da sua vida privada atenta contra elementares direitos fundamentais da pessoa jurídica. Basta atentar na hipótese de se tratar de situações cobertas por sigilo: haverá quem defenda que o executado deve revelar essas situações? Estará um advogado, executado em processo, obrigado, sob pena de ser condenado como litigante de má fé, a revelar a existência de um crédito de que disponha sobre um cliente, decerto bem penhorável – quando lhe é vedado revelar a identidade dos seus clientes? Parece claro que o artigo 837º A não pode Ter essa, mas uma outra interpretação: o Executado tem o dever de cooperar quando se trate de situações processualmente adquiridas (por exemplo: o exequente nomeia um bem à penhora, pedindo-se ao executado que indique o seu paradeiro). É evidente que há que ponderar aqui – o que o douto despacho recorrido não fez – em termos de proporcionalidade, a relação entre o direito à reserva da intimidade da vida privada e os interesses e direitos e direitos da contraparte - estão aí os limites às diligências a que se refere o artigo 837º-A (cfr. artigo 6º da Lei nº.33/95 - Lei da autorização de revisão do Código de Processo Civil – de 18 de Agosto). O douto despacho de fls. 138 é, assim, recorrível uma vez que a interpretação que faz do artigo 837º -A do CPC não é a interpretação correcta, enfermando, ainda, essa interpretação de inconstitucionalidade.” O exequente contra - alegou pugnando pelo indeferimento da reclamação e manutenção do despacho reclamado. DECIDINDO: A questão que nos é posta reduz-se ao conceito de despacho de mero expediente, fundamento único do não recebimento do recurso, em nada se aludindo a despacho produzido no uso de um poder discricionário. Nos termos do art. 156º do C.P.C. “Os despachos de mero expediente destinam-se a prover o andamento regular do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes, consideram-se proferidos no uso legal de um poder discricionário os despachos que decidam matérias confiadas ao prudente arbítrio do julgador”. Apenas nos interessa o primeiro conceito de despacho de mero expediente, já que foi com base nele que o Mm. Juiz não admitiu o recurso. Na decisão do Sr. Presidente da Relação de Lisboa, publicada na CJ, ano IV, T.2, pág. 585, entendeu-se que “são despachos de mero expediente os que, não decidindo de qualquer questão de forma ou de fundo, se destinam fundamentalmente a regular o andamento do processo.” Para o Prof. Alberto dos Reis se do acto do juiz “causar a uma das partes prejuízo decisivo, é evidente que o despacho recorrido não entra na classe de mero expediente – Com. ao Cód. Proc. Civil, Vol. II, pág. 152. No caso dos autos trata-se de uma ordem dada a uma das partes, a executada, para dizer quais os seus bens penhoráveis. E o fim, como é evidente, será penhorar os bens que indique. Ora, o conhecimento o deferimento do requerimento do Exequente, para que se cumprisse o citado art. 837º-A, não se trata simplesmente a regular o andamento do processo e do seu deferimento, como o foi, e decida de uma questão de fundo, o conhecimento de bens para penhora, para obtenção do fim pretendido com a acção, o pagamento do crédito em dívida. Acresce que a Reclamante invoca a inconstitucionalidade do preceito que se mandou cumprir, violador do art. 26º da C.R.P. E sobre a aplicação e interpretação do invocado art. 837º-A do CPC, entre outros, foi proferido douto acórdão desta relação, de 26/06/01, in www.DGSI, nº convencional RP20010626010989. Donde, se não tratar de despacho de mero expediente, mas de despacho que afecta a situação e, por isso, os interesses de uma das partes, a quem assiste o direito de se opor a tal medida. Temos, pois, por certo que o despacho em causa não é de mero expediente nos termos definidos no art. 156º e não admissível de recurso, nos termos do art. 679º, ambos do CPC. *** Nestes termos, sem necessidade de maior fundamentação, por escusada, DEFIRO a presente reclamação devendo o Mm. Juiz substituir o seu despacho por outro que receba o recurso como é de Lei. Custas pelo Reclamado dado ter deduzido oposição em que ficou vencido. Porto, 30 de Outubro de 2002 O Vice-Presidente da Relação Rui Fernando da Silva Pelayo Gonçalves | ||
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Decisão Texto Integral: |