Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1722/22.0T8GDM.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JUDITE PIRES
Descritores: FORMULAÇÃO DO PEDIDO NA PETIÇÃO INICIAL
EMPREITADA DE CONSUMO
DEFEITOS DA OBRA
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RP202404041722/22.0T8GDM.P1
Data do Acordão: 04/04/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Se, por regra, os pedidos são formulados na parte final da petição inicial, nada obsta que a sentença atenda a pretensão formulada na parte expositória desse articulado quando esta traduza clara intenção da parte em lhe conferir essa natureza.
II - No contrato de empreitada, tendo como contrapartida o preço acordado, o empreiteiro obriga-se à realização da obra, que constitui a prestação principal a seu cargo.
III - O empreiteiro deve realizar a obra em conformidade com o que foi convencionado ou projectado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou contratualmente previsto.
IV - Apresentando a obra vícios que a afectem, o dono da obra poderá exigir do empreiteiro a reparação dos defeitos, ou a realização de uma obra nova no caso de não ser possível eliminá-los, e caso não seja possível uma ou outra solução, ou recusando-as o empreiteiro, poderá, sequencialmente, obter a redução do preço ou a resolução do contrato.
V - O empreiteiro responde por todos os defeitos relativos à execução dos trabalhos ou à qualidade, forma e características dos materiais utilizados, quer quando o contrato não fixe as regras de execução, quer quando as efectivamente usadas não correspondam às aprovadas, incumbindo ao dono da obra a prova da existência dos mesmos.
VI - Tratando-se de empreitada de consumo e apresentando a obra defeitos, o consumidor pode exercer, sem ordem sequencial, qualquer dos direitos previstos no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais.
VII - À partida legítimo, se exercido de forma que ofenda manifestamente a boa fé, os bons costumes ou o seu fim social ou económico, o mesmo é dizer, o sentimento jurídico socialmente dominante, o direito torna-se ilegítimo, implicando tal ilegitimidade a paralisação dos respectivos efeitos: a parte que abusa do direito actua a coberto de um poder legal, formal, visando resultados que, clamorosamente, violam os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes, ou pelo fim económico ou social do direito.
VIII – A resolução consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado.
IX - A privação do uso de um bem pode constituir ofensa ao direito de propriedade do respectivo titular, na medida em que o seu dono fica privado do uso que lhe dava, constituindo, por isso, dano indemnizável.
X - Cabe ao lesado a prova da ofensa do direito de que, a esse título, se arroga titular, incumbindo-lhe, assim, a demonstração da privação do uso da coisa.
XI - A litigância de má fé visa punir a instrumentalização do direito processual em diversas vertentes: quando os litigantes pretendam alcançar um objectivo considerado ilegítimo pelo direito substantivo, quando a sua actuação constitua um meio de impedir a descoberta da verdade, como forma de obstruir a actividade da máquina judiciária, com a colocação de obstáculos ou com a promoção de expedientes meramente dilatórios, ou com o objectivo de impedir o trânsito em julgado da decisão e, deste modo, prejudicar a parte contrária na tutela ou na realização do direito substantivo que através da decisão lhe seja reconhecido.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1722/22.0T8GDM.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto

Juízo Local Cível de Gondomar – Juiz 2

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I.RELATÓRIO.

AA, maior, casado, natural do Brasil, com nacionalidade brasileira, portador do passaporte n.º ..., emitido em 17 de Julho de 2019 pela República Federativa do Brasil, válido até 18 de Julho de 2029, com o NIF português ..., com residência na Avenida ..., ..., ..., B, ... ..., propôs acção declarativa de condenação contra A..., LDA”, sociedade comercial por quotas com o NIPC ... e com sede na Rua ..., ... ..., peticionando que:

a) Seja reconhecido e declarado que o contrato celebrado entre as partes foi definitivamente incumprido por parte da Ré, pelo que se deverá reconhecer que a respectiva resolução por parte do Autor foi válida e operante, com todas as consequências legais daí advenientes;

Caso assim não se entenda, subsidiariamente:

b) Seja reconhecido e declarado que o contrato celebrado entre as partes foi definitivamente incumprido por parte da Ré, pelo que, por via dos presentes autos, deverá se declarada a respetiva resolução;

Cumulativamente com ambos os pedidos subsidiários deduzidos sob as letras a) e b), requer que:

c) Seja a Ré condenada a restituir ao Autor a quantia de € 6.050,00 (seis mil e cinquenta euros), paga por este à Ré a título de cumprimento do contrato celebrado entre as partes, por efeito da resolução deste;

d) Seja a Ré condenada a restituir o Autor da quantia global de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), correspondente aos danos de privação de uso sofridos pelo Autor, provocados pelo incumprimento contratual por parte da Ré;

e) Seja a Ré condenada a restituir o Autor da quantia global de € 1.452,63 (mil quatrocentos e cinquenta e dois euros e sessenta e três cêntimos), correspondente às despesas suportadas por este na sequência do incumprimento contratual por parte da Ré;

f) Seja a Ré condenada a pagar ao Autor juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal aplicável, até efectivo e integral pagamento de todas as prestações pecuniárias cuja condenação da Ré supra se requer.

Alega, para tanto e em suma, que celebrou com a R. um contrato verbal de empreitada, tendo por objecto a instalação de uma estrutura ou guarda em vidro, a instalar no seu terraço.

Ficou acordado que o Autor pagaria à Ré a quantia de € 3.945,00 aquando do início dos trabalhos e € 3.000,00 com a sua conclusão, num valor global de € 6.945,00, que, para além de incluir IVA, inclui igualmente o preço de outros serviços prestados pela Ré ao Autor, tais como a aplicação de uma tela de proteção contra o sol a instalar numa estrutura pré-existente e um serviço de desentupimento de lavandaria e cozinha.

E que a obra estaria concluída até finais do mês de Julho de 2021.

O A. procedeu ao pagamento da quantia acordada.

Porém, na madrugada do dia 02/10/2021 para o dia 03/10/2021, cerca de um mês após a instalação da guarda de vidro por parte da Ré, a mesma viria a colapsar, cedendo ao seu próprio peso e à força do vento.

O que, no entender do A., evidenciou uma enorme falha de segurança na aludida estrutura.

Cerca de um mês depois, na madrugada do dia 01/11/2021 para o dia 02/11/2021, mantendo-se a estrutura no mesmo exacto estado em que ficou desde o primeiro incidente, em 03/10/2021, por total inactividade da Ré, que nada fez para a reparar, e tendo apenas decorrido cerca de dois meses após a sua instalação, a estrutura em referência viria a colapsar uma vez mais,  cedendo pela segunda vez ao seu próprio peso e à força do vento.

Em ambos os dias que a estrutura colapsou, as rajadas de vento que se fizeram sentir no terraço nem sequer tiveram uma intensidade extraordinária, imprevisível e, muito menos, incontrolável.

Desta segunda vez, deu-se a fragmentação de diversas partes da estrutura montada pela Ré, incluindo alguns vidros e partes de suporte, bem assim como de partes integrantes do murete/platibanda e pavimento do terraço.

Algumas “folhas” de vidro acabaram por tombar, ainda mais, para o lado de dentro do terraço, num ângulo de cerca de 180 graus, e outras desprenderam-se, caíram no chão e quebraram-se.

O A. denunciou ambas as situações à R. quando se apercebeu das mesmas.

Porém, a Ré não apenas se recusou a fazê-lo – não reconhecendo a existência de defeitos –, como insistiu na tese de que a resolução da situação se faria tão simplesmente através da aplicação de uma determinada peça (cuja identificação constitui uma incógnita para o Autor), a qual alegadamente reforçaria a estrutura montada.

Solução preconizada que seria, no entender do A., tecnicamente errada, negando-se a R. a efectuar a desmontagem de toda a estrutura.

Refere ainda que a Ré nem sequer tinha a capacidade legal necessária para executar este tipo de obra, sendo que, conforme o Autor viria a descobrir, até ao mês de dezembro de 2021, a Ré não estava habilitada pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC) para realizar obras particulares.

O que levou o A. a proceder à resolução do contrato, por carta remetida através dos seus mandatários, face à perda de interesse e confiança do A. na R.

Para além da restituição do valor pago, pretende o A. ser ressarcido da privação do uso do terraço, em montante que computa em € 2.500, bem como dos custos com a obtenção de dois relatórios de peritagem, no valor de € 307,5 e € 492 e com a contratação de empresa para proceder à desmontagem e levantamento da estrutura, com o que despendeu € 653,13.

Regularmente citada, contestou a Ré, por impugnação.

Refuta que houvesse qualquer acordo quanto à data de conclusão da obra.

Afirma que o A. sempre soube que iria contratar um terceiro para executar e colocar a referida estrutura de vidro e que esta não “colapsou”, mas alguns vidros deslocaram-se, por força dos ventos ocorridos na madrugada de 2 para 3 de Outubro de 2021.

De imediato, a Ré contactou a empresa que havia efectuado o serviço, que se deslocou ao local.

Aí, combinou com o A. a colocação de peças para reforçar a estrutura.

Diz ainda que foi colocado perfil AV 13 da Sosoares em toda a extensão do terraço, na cor 7016, com vidro Laminado 6+6 e passamão que cobre toda a extensão do terraço e usados pelo menos cerca de 30 parafusos (devido ao peso da estrutura, muitos parafusos foram arrancados aquando da queda existindo alguns no chão interior e outros caíram para o lado exterior do prédio).

Em muitos locais a furação apanhava “ferro”, pelo que se optou por uma furação menos profunda, mas reforçada com bucha química, pelo que os parafusos de 70mm eram no entender do Sr. BB, que procedeu à colocação, adequados.

Respondeu à missiva do A., através da qual procedeu à resolução do contrato, por carta de 14/12/2021, na qual se mostra disponível para reparar os defeitos existentes.

Enjeita qualquer responsabilidade no pagamento dos relatórios de peritagem, bem como custo com a empresa que levou a cabo a desmontagem e levantamento da estrutura.

Por despacho de 14/11/2022 (refª 442005187)[1], foi facultada ao A. a possibilidade de se pronunciar quanto à matéria de excepção invocada.

O A. respondeu ao convite, através de requerimento de 29/11/2022 (refª 34015185), cuja argumentação se dá aqui por reproduzida.

Foi proferido despacho saneador, no qual se entendeu, de harmonia com o artigo 597.º do CPC, não ser necessária a realização de audiência prévia ou fixação de objecto do litígio e temas da prova.

Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Nestes termos e pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente, por parcialmente

provada, a presente acção e, em consequência:

a) Reconhece-se e declara-se que o contrato celebrado entre as partes foi definitivamente incumprido por parte da Ré A..., LDA., sendo a resolução por parte do Autor AA válida e operante, com todas as consequências legais daí advenientes;

b) Condena-se a Ré a restituir ao Autor a quantia de € 6.050,00 (seis mil e cinquenta euros), paga por este à Ré a título de cumprimento do contrato celebrado entre as partes;

c) Condena-se a Ré a pagar ao A. indemnização no valor de € 653,13 (seiscentos e cinquenta e três euros e treze cêntimos), a título de danos patrimoniais;

d) Às quantias referidas nas als. b) e c) acrescerão juros, vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor para as operações civis, contados desde a citação, até efectivo e integral pagamento;

e) Condena-se ainda a Ré a indemnizar o Autor pelos danos referidos no ponto 44 da factualidade provada, cujo quantitativo deverá ser apurado em incidente de liquidação (artigos 358.º a 361.º e 609.º, n.º 2, do CPC).

f) Absolve-se a Ré do demais peticionado pelo Autor;

Custas por A. e R., na proporção do respectivo decaimento (artigo 527.º do CPC)”.

 Não se conformando com o decidido, interpôs a Ré recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:

“1. Pretende a recorrente desde logo com o presente recurso e atento o vertido no art.º 640º do CPC pôr em causa a matéria de facto que foi considerada como provada e a que foi considerada como não provada.

2. Ora da decisão da matéria de facto resultam que deveriam ter sido dados como não provados determinados factos que foram considerados provados, nomeadamente os descritos nos pontos 13, 14, 16, 17, 20, 21, 24, 25, 26, 27, 33 e 44 dos factos provados e que factos não provados deveriam ser considerados como provados nomeadamente os referidos nas alíneas f) g), h), i) e j) dos factos não provados, com base no depoimento de parte e declarações de parte do A., da prova testemunhal carreada para os autos e dos documentos juntos bem como do principio do ónus da prova que cabe a cada uma das partes.

3. Desde logo e com base no depoimento e declarações de parte do Autor parecenos evidente que os factos não provados nas alíneas h), i) e j) terão que ser considerados como provados.

4. Na verdade, o Autor reconhece de forma expressa que a colocação da estrutura de vidro aqui em causa foi efectuada por um terceiro (que não a aqui Ré A...) e reconhece nos whatsapp juntos pelo mesmo na sua petição inicial que a responsabilidade dos pretensos “defeitos “ seriam desse terceiro e não da A....

5. Basta atentar nas mensagens do Autor para o Sr. CC e que estão juntas com a petição inicial sob Doc. 8 e cujos excertos mais relevantes estão descritos nas presentes alegações de recurso para as quais se remetem.

6. É evidente e consta das mensagens juntas pelo próprio A. e que o mesmo sem qualquer credibilidade procurou justificar no seu depoimento que o A. sempre soube que a execução e colocação da estrutura em vidro seria executada por um terceiro e que sempre eximiu a aqui Ré de qualquer responsabilidade no que sucedeu com a referida guarda de vidro.

7. Assim com base no depoimento e declarações de parte do Autor e nas mensagens de whatsapp juntas sob Doc. 8 na petição inicial é forçoso concluir que os factos descritos nas alíneas h) , i) e j) dos factos não provados terão, ao invés, que ser considerados provados.

8. Também com base nestes elementos de prova o facto do ponto 16 e 17 dos factos provados terá que ser considerado como não provado.

9. Já do depoimentos das testemunhas DD e EE em momento algum se inferem os factos descritos minuciosamente no ponto 33 dos factos provados.

10. Mesmo dando de barato que as testemunhas remetem para os relatórios por si elaborados, será que o Tribunal poderia considerar provada uma matéria de natureza tão técnica apenas e só com base em “relatórios” pedidos pelos advogados do Autor (palavras deste no seu depoimento) e que foram pagos pele Autor?

11. Cabendo o ónus da prova dos defeitos ao Autor não teria o mesmo que ter recorrido a uma prova pericial que atestasse os factos por si alegados, nomeadamente os constantes do ponto 33 dos factos provados?

12. De notar que o Srs. DD e EE foram ouvidos como testemunhas, testemunhas essas que admitiram que o relatório que efectuaram foi pedido pelo A. e pago por este.

13. Salvo melhor opinião, os factos alegados pelo A. só poderiam ser provados através de uma perícia, em que fosse nomeado alguém idóneo e competente na matéria em causa e sujeitos aos especiais requisitos impostos nos artigos 467º a 473º do CPC.

14. Citando acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26/10/2020 no Processo 258/18.9T8PNF-A.P1 : “ - A prova pericial, com a especificidade de ter  mediação de uma pessoa - o Perito – para a demonstração do facto, consiste na perceção ou apreciação de factos pelo perito/s chamado a os percecionar (com os órgãos dos sentidos) e/ou a os valorar (à luz dos seus especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos), conhecimentos esses que, não fazendo parte da cultura geral e da experiência comum, se presumem não detidos pelo julgador. “

15. A se entender que numa matéria eminentemente técnica é possível uma condenação apenas com prova testemunhal paga por uma das partes, está aberto o descrédito e a violação flagrante do principio da verdade material!

16. Entende assim a recorrente que o facto constante do ponto 33 dos factos provados, estando apenas alicerçado em prova testemunhal paga pelo A. não deve ser considerada como idónea e suficiente para provar factos que exigem especiais conhecimentos técnicos, existindo por isso uma flagrante violação do vertido no artigo 467º do CPC.

17. Do depoimento da testemunha CC, resulta reforçado o depoimento de parte e declarações de parte do A. e das mensagens por ele enviadas no sentido de que os factos constantes das alíneas h), i) e j) dos factos não provados terão que ser considerados como provados.

18. E por outro lado, do depoimento desta testemunha também resulta claro que os factos constantes dos pontos 13, 14, 16 e 17 dos factos provados terão que ser considerados como não provados.

19. E do depoimento da testemunha BB (responsável pela colocação da estrutura de vidro) resulta claro que o mesmo infirma o depoimento e os relatórios das testemunhas DD e EE, criando sérias Duvidas sobre a origem e causa dos problemas na estrutura e da possibilidade ou impossibilidade de reparação da mesma.

20. Mais refere esta testemunha que o Autor se recusou de forma liminar a que fosse reparada a estrutura.

21. Assim e com base neste depoimento o facto vertido no ponto 33 dos factos provados terá que ser considerado como não provado, dado não existirem razões plausíveis para considerar que a versão desta testemunha é menos credível ou sustentadas do que as dias testemunhas do A.

22. Com base neste depoimento terá que ser considerada como provada a matéria vertida nas alíneas f), g) e j ) dos factos não provados.

23. Analisando a matéria de facto com base nos depoimentos transcritos e nos documentos juntos ao processo deve a matéria de facto ser alterada considerando-se como provados os factos descritos nas alíneas f), g), h), i) e J) dos factos não provados pois resultam quer das declarações e depoimento de parte e mensagens de Whatsapp) do Autor (quanto ás alienas h) i) e j) dos factos não provados) e do depoimento da testemunha CC.

24. Já do depoimento da testemunha BB resulta a prova quanto às alíneas f), g) e j) dos factos não provados.

25. E deve considerar-se como não provado a matéria constantes dos pontos 13, 14, 16, 17, 20, 21, 24, 25, 26, 27, 33 e 44 dos factos provados.

26. Não existe qualquer testemunha do Autor que tenha sido inquirida relativamente aos factos constantes dos pontos 13, 14, 20, 21, 24, 25, 26 e 27 dos factos provados ( aliás a sentença na sua fundamentação nem sequer refere qual a motivação de considerar provados os factos dos pontos 20, 21e 24 a 27 dos factos provados ), o facto 16 dos factos provados é a negação das declarações produzidos pelo A e das mensagens de whatsapp juntas sob Doc. 8 da petição inicial e o facto 17 não existe de facto qualquer prova sobre a data exata da conclusão da prova.

27. Em conclusão cotejando a prova documental e testemunhal credível, com conhecimento directo, critico e circunstanciado dos factos é manifesto que a matéria das alíneas f), g), h), i) e j) dos factos não provados têm que ser considerados como provados e que cotejando a ausência de prova documental e testemunhal credível, com conhecimento directo, critico e circunstanciado dos factos a matéria dos artigos 14, 16, 17, 20, 21, 24, 25, 26, 27, 33 e 44 dos factos provados terá que ser considerada como não provada.

28. Considerando a alteração à matéria de facto é manifesto que a ação terá que improceder quanto à Ré, dado que o A. sempre assumiu e aceitou que a responsabilidade pela ocorrência e serviço prestado no seu terraço era apenas e só do Sr. BB, eximindo por isso a Ré de qualquer responsabilidade pela eventual má execução do trabalho efectuado pelo Sr. BB.

29. Mas caso assim não se entenda sempre se dirá que a manter-se a factualidade provada entende a Ré que a solução juridica terá que ser outra.

30. Aplicando o Decreto Lei 67/2003, de 8 de Abril somos da opinião que ao contrário do que a sentença recorrida refere não existe uma “obra levada a cabo na habitação da A. por uma empresa wue se dedica, profissionalmente, a actividades desta natureza “.

31. A Ré não se dedica a atividades desta natureza (considerando o facto provado no ponto 34 dos factos provados), pelo que, na relação juridica estabelecida entre A. e Ré não se aplica o vertido no Decreto Lei 67/2003, de 8 de Abril.

32. Tem assim aplicação o normativo previsto no Código Civil quanto ao contrato de empreitada - artigos 1207º a 1229º do Código Civil.

33. E aplicando este normativo legal, o lesado com a defeituosa execução da obra, para se ressarcir dos respectivos prejuízos, deverá observar o regime estabelecido nos arts. 1221º, 1222º e 1223º do Código Civil, os quais conferem ao dono da obra vários direitos.

34. Mas o dono da obra não pode seguir qualquer uma das vias apontadas, a seu livre arbítrio, estando, antes, obrigado a observar a prioridade dos direitos consagrados nos referidos preceitos legais, que é a seguinte: em primeiro lugar, a eliminação dos defeitos, se estes puderem ser eliminados; em segundo lugar, uma nova construção, se os defeitos não puderem ser eliminados; em terceiro lugar, na hipótese de não serem eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, o direito de exigir a redução do preço ou, em alternativa, a resolução do contrato.

35. Ora o aqui A. não permitiu a eliminação dos defeitos! Nem permitiu aliás o acesso da Ré ao local aonde se situava a estrutura (isto após o incidente de Novembro de 2021) para que a mesma reparasse a mesma ou caso entendesse que seria a solução ideal efectuasse uma nova construção!

36. O aqui Autor pura e simplesmente desistiu da solução que pretendia para a sua fracção (guarda de vidro no seu terraço) e cm a resolução do contrato quer receber o que pagou !

37. Aliás no caso em apreço o dono da obra ao impedir a Ré de aceder à obra para reparar os defeitos e ter inclusivamente contratado um terceiro para a desmontagem da estrutura de vidro está a desistir da empreitada (art.º 1229º do Código Civil).

38. É assim manifesto que a sentença recorrida violou o vertido nos artigos 1º-A e 1º-B do Decreto Lei 67/2003, de 8 de Abril e o vertido nos artigos 1221º, 1222º,1223º e 1229º do Código Civil.

39. Caso assim não se entenda, tambem não se aceita que aplicando-se o disposto no Decreto Lei 67/2003 a Ré possa ser condenada por um facto alegado no artigo 80º da PI e que não consta do pedido. Na verdade, o Autor no artigo 80º da PI refere que “ Por esse motivo, nos termos da norma prevista no artigo 556.º, n.º 1, al. b), o Autor deduz um pedido genérico de indemnização quanto a este concreto dano, devendo a Ré ser condenada a pagar ao Autor o valor que vier a apurar-se corresponder à reparação e reposição do terraço no estado em que o mesmo se encontrava antes de qualquer intervenção por parte da Ré .”

40. A sentença recorrida apesar de reconhecer que este pedido não consta das várias alíneas do petitório, alega que tal facto não obsta á sua apreciação citando um acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10/09/2013.

41. Em primeiro lugar, é irónico que se venha falar no privilégio da substância sobre a forma, quando temos tantas decisões judiciais que indeferem direitos altamente relevantes por pequenas questões formais….

42. Depois do desabafo, importa referir que a sentença é nula nos termos do artigo 615º nº 1 alínea e) do CPC pois a mesma condena em objecto diverso do pedido, nulidade esta que se invoca para todos os efeitos.

43. O artigo 552º nº 1 do CPC na sua alínea e) é claro que na sua petição petição inicial deve o Autor formular o pedido. E o pedido formulado pelo Autor é apenas que o Tribunal declare que o contrato foi definitivamente incumprido e, consequentemente, que o A. resolveu validamente o contrato; e caso assim não se entenda, que se declare agora que o contrato foi incumprido e, consequentemente, se determine a sua resolução.

44. E cumulativamente com qualquer dos pedidos anteriores, pede que seja a R. condenada a restituir ao A. a quantia de € 6.050, paga pelo A. a título de preço e ainda, que seja condenada a pagar o valor de € 2.500, a título de privação do uso e € 1.452,63 (mil quatrocentos e cinquenta e dois euros e sessenta e três cêntimos), correspondente às despesas suportadas por este na sequência do incumprimento contratual por parte da Ré.

45. Citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/02/2018 no Processo 633/15.0T8VCT.G1.S1: “ A nulidade por condenação além do pedido e em objecto diverso do pedido, e ainda por exceder o âmbito da pronúncia, prevista no art. 615º, nº 1, alínea e), do CPC, a verificar-se, resultará do desrespeito pelo princípio do nº 1, do art. 609º, do CPC, segundo o qual a sentença não pode exceder os limites quantitativos e qualitativos do pedido “.

46. Também o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26/11/2009 proferida no Processo 996/05.6TCLRS.L1-6 refere que “ O modo como se mostra formulado o pedido, enquanto conclusão lógica do alegado na petição e manifestação da tutela jurídica que o autor pretende alcançar com a demanda, é de grande importância, por o juiz não dever deixar de proferir decisão que se contenha nos estritos limites em que foi delineado pelo autor. “.

47. Entende também a Ré que a resolução sufragada pelo Tribunal configura de facto um manifesto abuso de direito por parte do A.

48. Na verdade, a aqui Ré sempre procurou resolver o problema, tendo incluisvamente dse disposto a efectuar uma estrutura totalmente nova!

49. O Autor anuiu nesse disederato e aceitou que fosse procurada e encontrada a melhor solução. A memsa demorou mais tempo do que o previsto devido (conforme alegou a testemunha BB) aos prazos de entrega das peças necessárioas para o efeito - convém recordar que estamos em pleno perido de Covid com todos os constrangimentos associados!

50. Assim a postura do Autor ao resolver inopinadmanete o contrato configura um abuso de direito na vertente do venire contra factum proprium, tendo a sentença recorrida violado também aqui o vertido no artigo 334º do Código Civil.

51. A sentença recorrida também erra de forma clamorosa ao entender que existindo a resolução contratual a aqui Ré teria de num “pedido reconvencional “solicitar o lecantamento da obra ou compensação monetária se o levantamento não se revelar possivel.

52. Citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/01/2012 no Processo 343/04.4TBMTJ.P1.S1 : “ III - A resolução do contrato consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado. IV- A resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico. V – A resolução tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes. “

53. Ora tendo a resolução os mesmos efeitos da nulidade deve ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente, pelo que a sentença recorrida ao reconhecer que a resolução do A. é valida terá que impor que o mesmo restitua à Ré a estrutura de vidro existente na sua fração ou caso tal não seja possivel o valor correspondente.

54. Violou aqui a sentença recorrida o vertido nos artigos 433º, 434º e 289º do Código Civil.

55. Assim, e com base no que se alega neste recurso, violou a sentença recorrida: o vertido nos artigos 1º-A e 1º-B do Decreto Lei 67/2003, de 8 de Abril; o vertido nos artigos 1221º, 1222º, 1223º e 1229º do Código Civil; o vertido no art.º 615º nº 1 alínea e) do CPC; o vertido no artigo 334º do Código Civil e o vertido nos artigos 433º, 434º e 289º do Código Civil; o vertido no artigo 467º do CPC.

TERMOS em que deve revogar-se a sentença recorrida por tal ser de JUSTIÇA, condenando-se a Ré no pedido formulado na petição inicial.”

O apelado apresentou contra-alegações e interpôs recurso subordinado, cujas alegações findam com as seguintes conclusões:

1. O Autor Recorrido não pode deixar de criticar e censurar, de forma acérrima, o comportamento da Ré Recorrente, desde logo no âmbito da execução do contrato em referência – por se verificarem manifestos e graves defeitos na obra por si executada –,

2. Como também quanto ao comportamento da Ré Recorrente no âmbito da cessação do referido contrato – uma vez que a mesma sempre se recusou a assumir aquilo que é evidente dos relatórios técnicos –, atribuindo a culpa a terceiros, a coisas e ao vento.

3. E, por fim, o Autor Recorrido não pode deixar de demonstrar o seu total repúdio pelo comportamento processual da Ré Recorrente, a qual procura de forma manifesta distorcer a realidade dos factos e o direito que a os mesmos é aplicável.

4. Sendo de atentar que todas as pessoas com conhecimentos técnicos que analisaram a estrutura montada no terraço do Autor Recorrido afirmaram que a mesma foi executada com uma técnica manifestamente defeituosa e representou uma situação de perigo significativo e potencialmente trágico.

5. Pelo contrário, a Ré Recorrente e a testemunha BB, a quem aquela alega ter subcontratado esta obra, são os únicos intervenientes nos presentes autos que têm o descaramento e a temeridade, mas sobretudo a desonestidade intelectual de afirmar que a estrutura montada pela Ré Recorrente não padece de qualquer defeito.

6. Sendo de atentar que a tese que a Ré Recorrente, com enorme ingenuidade e falta de fundamento, procurou defender nestes autos, passa por afirmar que não é de qualquer modo responsável pelo facto de ter subcontratado um terceiro para fazer a obra.

7. Alegação essa que é totalmente inócua efeitos na apreciação da responsabilidade que é imputável à Ré Recorrente perante o Autor Recorrido, desde logo e na medida em que o Autor, em momento algum, eximiu a ré de qualquer tipo de responsabilidade, pelo contrário, sempre lhe exigiu a respetiva assunção.

8. Sendo de atentar que responsabilidade da Ré sempre adviria da designada culpa in elegendo, pelo facto de, alegadamente, ter escolhido subcontratar esta obra a uma pessoa que é formada em psicologia, que não considera relevantes as instruções do fabricante e que faz os respetivos testes e ensaios de carga e resistência “à mão”, puxando e empurrando de trás para a frente, o que é manifestamente revelador de um grave amadorismo e incompetência e a causa de tão graves defeitos da obra realizada.

9. Amadorismo e incompetência esses que igualmente justificam o facto de a Ré Recorrente e o seu subcontratado não terem ainda compreendido nem aceitado uma realidade que se revela tão manifesta e evidente, que se prende com a existência de inúmeros defeitos na obra por si realizada.

10. Litigando a Ré Recorrente com manifesta má-fé, não apenas por insistir na sua desresponsabilização apesar de estar ciente dos erros que cometeu, como também, como veremos, na medida em que litiga de forma totalmente abusiva, utilizando argumentos e expedientes processuais que a mesma sabe não ter legitimidade para utilizar.

11. Posto isto, no que concerne ao recurso da decisão proferida sobre a matéria de facto, sendo conhecedora de toda a sua falta de razão, a Ré Recorrente procurou habilmente subverter as regras que disciplinam o recurso que visa a alteração da matéria de facto.

12. Sendo qu, ao invés de identificar os concretos pontos da matéria de facto que pretende ver alterados, e sobre cada um deles indicar os meios de prova que alegadamente impõem tal decisão, a Ré Recorrente seguiu a metodologia de recolher e “analisar” todos os meios de prova que eventual lhe pudessem aproveitar, retirando daí as conclusões que entendeu, sem fazer qualquer correspondência concreta entre o que resulta de tais meios de prova e os pontos que pretende ver alterados.

13. Sendo de atentar que, para além disso, a Ré dedicou as suas alegações de recurso a realçar pequenos “nadas” que recolheu de alguns desses meios de prova e depois, genericamente, entendeu que a decisão proferida quanto a 17 pontos da matéria de facto deveria ser alterada…

14. Como quer que seja, a verdade é apenas uma, isto é, que os meios de prova indicados pela Ré não demonstram o que a mesma afirma que demonstram, e que Ré não indica um único meio de prova que imponha uma alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto.

15. O que afirmamos em relação ao depoimento e declarações de parte do Autor, às conversas de Whastapp, juntas com o documento n.º 8, aos depoimento na qualidade de testemunha de DD e de EE, ao depoimento na qualidade de testemunha de CC e ao depoimento na qualidade de testemunha de BB.

16. Sendo de atentar quanto ao depoimento do Autor que a Ré o transcreve para estes autos de apelação, mas do mesmo não é possível retirar qualquer elemento que nos leve a concluir que a matéria de facto deverá ser alterada.

17. Não sendo possível retirar do depoimento do Autor Recorrido, ao contrário do que pretende a Ré Recorrente, qualquer facto que seja favorável à tese desta, pelo que o recurso a que se responde deverá improceder nesta parte, devendo ser confirmados os factos descritos nas alíneas h), i) e j) dos factos dados como não provados, e os pontos 16 e 17 dos factos dados como provados.

18. Por sua vez, o mesmo se aplica aos excertos de conversas através da aplicação WhatsApp, dos quais não é possível retirar as enviesadas conclusões a que chega a Ré, pelo que o recurso a que se responde também deverá cair nesta parte, devendo ser confirmados os factos descritos nas alíneas h), i) e j) dos factos dados como não provados, e os pontos 16 e 17 dos factos dados como provados.

19. Tal como sucede, de resto com a prova testemunhal produzida em audiência, cujo conteúdo a Ré procurou distorcer nestes autos, não tendo a Ré Recorrente sequer se dado ao trabalho de especificar como chega às conclusões a que chega.

20. Realçando-se apenas que de tal meio de prova apenas se retira que a testemunha BB, que alegadamente realizou a obra sub judice, é formado em psicologia e não logra, naturalmente, infirmar quaisquer das conclusões retiradas pelos Técnicos DD e EE, expressas nos relatórios técnicos juntos a estes autos.

21. Sendo de reparar que se os referidos relatórios se referem à necessidade de se seguir as instruções e recomendações do fabricante da estrutura aqui em causa, neste caso, a empresa SOSOARES, mas, por seu turno, a testemunha BB entendeu que deveria fazer os seus próprios cálculos, à luz de um alegado software que alegadamente lhe dá essa informação.

22. Sendo de reparar que apenas a Ré Recorrente é que defende que a estrutura aqui em causa terá caído por motivos alheios à existência de quaisquer defeitos, mas sim devido à força do vento e à não resistência do varandim.

23. A falta de conhecimento e competência por parte da Ré é de tal ordem que a mesma avança com uma ideia peregrina, mesmo apesar de todas as imperfeições da obra erigida e das conclusões dos relatórios técnicos, no sentido em que o problema estava no varandim ou murete que sustentou a estrutura montada, e que portanto seria necessário reconstrui-lo, de raiz.

24. Ou seja, se o Autor Recorrido não tivesse resolvido o contrato, provavelmente a Ré Recorrente teria posto mãos à obra, não para reparar a estrutura por si montada, mas sim para reconstruir o varandim ou murete que alegadamente não tinha resistência para sustentar a estrutura.

25. Ou seja, ao contrário do refere a Ré Recorrente, esta nunca pretendeu reparar a estrutura, desde logo porque nunca assumiu qualquer defeito na mesma, sendo portanto falso que tenha sido o Autor quem se recusou a reparar a estrutura, mas apenas a Ré Recorrente.

26. Como está bom de ver, portanto, a Ré Recorrente não logrou infirmar o depoimento e os relatórios das testemunhas DD e EE, e muito menos criou sérias dúvidas sobre a origem e causa dos problemas na estrutura e a possibilidade ou impossibilidade de reparação da mesma, pelo contrário, o depoimento desta testemunha dissipou todas as dúvidas.

27. Pelo que o recurso a que ora se responde deverá decair também nesta parte, devendo confirmar-se a Douta Sentença recorrida, considerando que os meios de prova indicados pela Ré não fundamentam, de alguma forma, uma qualquer alteração da matéria de facto.

28. Termos em que deveremos concluir que a tese apresentada pela Ré Recorrente é totalmente insustentável, pelo que o recurso da decisão proferida sobre a matéria de facto deverá improceder, na sua totalidade, confirmando-se a decisão recorrida.

29. Já no que concerne ao recurso sobre a matéria de direito, como está bom de ver, a Ré Recorrente dispara para todos os lados, e coloca à consideração deste Tribunal pelo menos seis questões que pretende ver apreciadas, acerca:

- Dos meios de prova admissíveis e obrigatórios - da prova pericial enquanto meio de prova obrigatório

- Da não aplicação do regime instituído pelo DL n.º 67/2003, de 08 de abril

- Do regime de reparação de defeitos no âmbito da empreitada

- Da nulidade por excesso de pronúncia

- Da resolução contratual abusiva

- Do pedido de condenação do Autor à restituição do salvado da estrutura de vidro instalada pela Ré

30. Ora, acerca dos meios de prova admissíveis e obrigatórios - da prova pericial enquanto meio de prova obrigatório, importa referir que a lei prevê a admissibilidade da prova pericial, mas não impõe, em qualquer preceito, a sua obrigatoriedade.

31. Não prevendo o recurso a esse meio de prova para, através dela e do seu valor probatório tarifado, designadamente, para afastar outros meios de prova, designadamente pareceres e relatórios técnicos.

32. Sendo de atentar que uma perícia constitui uma atividade de avaliação dos factos relevantes realizada por quem possui especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, tendo lugar quando a perceção ou apreciação dos factos exigem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos.

33. Ora, em face da matéria já produzida nestes autos, está à vista que não inexistem quaisquer factos em discussão que carecem de especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, tendo este Tribunal demonstrado um perfeito conhecimento sobre todas as questões sob análise e não tendo ficado por esclarecer um qualquer aspeto técnico que eventualmente demandasse a realização de uma perícia.

34. Necessidade esta que, repare-se, a existir, sempre deveria ter sido indicada pela Ré Recorrente, requerendo ela própria a realização de prova pericial, o que a mesma não fez.

35. Como quer que seja, estando nós perante uma questão de interpretarão do regime processual aplicável à prova pericial, importa reparar que a Ré Recorrente não invoca uma única norma que tenha sido violada pelo Tribunal recorrido.

36. O que sucede na medida em que o regime processual em vigor não impõe o recurso obrigatório e automático à prova pericial em nenhum caso, como pretende a Ré Recorrente muito menos em casos como o presente, designadamente, por não estar em causa uma que careça de conhecimentos técnicos especiais.

37. Nestes termos, não tendo a Ré Recorrente indicado uma qualquer norma que a este propósito tenha sido violada pelo Tribunal recorrido, a presente questão nem sequer deverá ser apreciada ou considerada.

38. Por fim, ainda sobre este ponto, importa considerar que, atentos os factos submetidos a discussão nesta via recursiva, em especial os factos que já foram dados como assentes – tal como o facto de a estrutura montada pela Ré Recorrente ter colapsado por duas vezes dois meses após a sua instalação –, o ónus da prova quanto às concretas causas do referido sinistro encontra-se a cargo da Ré Recorrente.

39. Pelo que deveria ter sido a mesma que se deveria ter preocupado em requerer a realização de prova pericial, não tendo qualquer cabimento que a mesma defenda que esta deveria ter sido requerida pelo Autor Recorrido.

40. Com efeito, à luz do regime instituído elos artigo 798.º e seguintes do Código Civil, designadamente, o regime previsto no artigo 799.º, n.º 1, em ação proposta com vista à reparação de defeitos basta que o dono da obra alegue e prove a existência de defeitos, sem ter que provar a sua causa, para que o empreiteiro, para afastar a sua responsabilidade, fique com o ónus de alegar e provar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua.

41. Por sua vez, no que concerne ao recurso da decisão que consagrou a aplicação sub judice do regime instituído pelo DL n.º 67/2003, de 08 de abril, a Ré Recorrente procura tirar partido do facto de o Tribunal recorrido ter dado como provado, e bem, que a Ré Recorrente não tinha habilitação para a realizar atividades do tipo das que realizou.

42. Pretendendo retirar daí a conclusão de que, se não tinha habilitação para exercer tais atividades, então necessariamente que não as exercia.

43. Ou seja, a Ré Recorrente procura confundir a sua falta de habilitação com o não exercício da atividade em causa nestes autos, o que, contudo, como está bom de ver, apenas realça o que verdadeiramente se apurou nestes autos, de que a Ré realizou uma obra para a qual não tinha qualquer competência ou aptidão técnica.

44. Sendo de atentar que este argumento da Ré Recorrente é tão ou mais indecifrável se o conjugarmos com o facto de ter sido esta quem, cerca de três meses após ter concluído a obra em referência, requereu a referida habilitação ao INMIC.

45. De resto, a propósito deste argumento, a Ré Recorrente alega diversas normas mas não refere, de qualquer modo, quais foram aquelas que foram incorretamente interpretadas e/ou aplicadas, nem como é que as mesmas, no seu entender, deveriam ter sido interpretadas e aplicadas.

46. Termos em que as alegações de recurso da Ré Recorrente sobre esta parte deverão necessariamente decair, por falta de todo e qualquer fundamento, tendo o Tribunal recorrido feito uma correta interpretação e aplicação do regime legal aplicável, instituído pelo DL n.º 67/2003, de 08 de abril, pelo que o presente recurso deverá ser julgado improcedente nesta parte e ser confirmada a Douta Sentença recorrida.

47. Por seu turno, no que concerne ao regime de reparação de defeitos no âmbito da empreitada, importa atentar que a Ré Recorrente continua a não ter qualquer razão na sua posição, uma vez que, para além deste argumento não fazer qualquer sentido, pelo facto de ser aqui aplicável o regime instituído pelo DL n.º 67/2003, de 08 de abril, importa considerar para além disso que, mesmo que assim não fosse, apesar de o ser, para que uma determinada empreiteira proceda à reparação dos defeitos da obra por si construída, é primeiramente necessário que a referida entidade reclamada esteja aberta a assumi-los e a repará-los.

48. Ora, o que se verifica sub judice, é que a Ré Recorrente, nem numa fase extrajudicial, nem na presente fase judicial, alguma vez reconheceu os defeitos da obra por si fabricada.

49. Para além disso, importa reparar que, logo após o primeiro colapso e até ao momento em que aconteceu o segundo, cerca de um mês após, o Autor Recorrido disponibilizou à Ré Recorrente total acesso ao terraço e total liberdade para implementar a solução que melhor entendesse para resolver o problema.

50. Pelo que a Ré Recorrente teve, portanto, cerca de um mês para implementar a solução que melhor entendesse, incluindo a reparação da estrutura pela sua raiz, isto é, refazendo-a do zero, como verdadeiramente se impunha, conforme viriam a demonstrar os relatórios técnicos elaborados.

51. Oportunidade essa que portanto a mesma desperdiçou, deitando por terra toda a força do argumento que aqui deduz, levando a que as alegações de recurso da Ré Recorrente sobre esta parte devem necessariamente decair, por falta de todo e qualquer fundamento, considerando que o Tribunal recorrido fez uma correta interpretação e aplicação do regime aplicável, designadamente, à luz do DL n.º 67/2003, de 08 de abril, levando a que o presente recurso deva ser julgado improcedente nesta parte e ser confirmada a Douta Sentença recorrida.

52. Já sobre a nulidade por alegado excesso ode pronúncia, seguimos de perto a Douta Sentença recorrida, sobretudo na parte em que privilegia a substância sobre a forma.

53. Por seu turno, no que concerne à imputação de uma resolução contratual abusiva por parte do Autor Recorrido, apenas podemos chamar à colação todas as circunstâncias supra alegadas e que foram dadas como provadas nestes autos, entre as quais, o facto de a conduta do Autor Recorrido ter sido sempre dominada por enorme sensatez e bom senso, ao contrário da conduta da Ré Recorrente, absolutamente condenável ao longo de todo a execução e cessação contratual, como também no âmbito da presente lide.

54. Pelo que, se é certo que nestes autos deverá analisar-se e aplicar-se o regime do abuso de direito, o mesmo deverá ser analisado à luz da conduta global da Ré Recorrente, a qual se encontra integralmente documentada nestes autos, devendo a mesma ser condenada por litigância de má-fé, por ter feito uma utilização reprovável dos Tribunais e dos meios processuais, com vista à obtenção de vantagens que bem sabe não lhe serem devidas.

55. Com efeito, a verdade é que a Ré Recorrente inequivocamente falhou nas suas obrigações, ainda que jamais o tenha assumido, como acontece ainda hoje, afirmando-se cheia de razão mesmo quando todas as provas indicam o contrário, litigando, portanto, com manifesta má-fé.

56. Pelo contrário, se analisarmos a conduta do Autor Recorrido, percebemos que a mesma é a cada passo justificada pelo bom senso e pela sensatez, tendo a resolução contratual por si operada sido totalmente justa, legítima e fundamentada.

57. Sendo a Ré Recorrente a única que atua em manifesto abuso de direito, por se encontrar em completa negação da realidade e continuar a causar transtornos ao Autor Recorrido pela não finalização deste processo, mesmo apesar do artigo 8.º do CPC impor às partes o dever de agirem de boa-fé.

58. Termos em que, por tudo o exposto nestas alegações, e ainda a afronta de imputar ao Autor uma atuação abusiva, a Ré Recorrente deverá ser condenada como litigante de má-fé, em multa e numa indemnização ao Autor Recorrido, de valor nunca inferior a € 2.500,00, o que expressamente se requer.

59. Por fim, no que concerne ao pedido de condenação do Autor Recorrido à restituição do salvado da estrutura de vidro instalada pela Ré Recorrente, importa apenas realçar que o Autor Recorrido não tem qualquer interesse, pelo contrário, em continuar na detenção da estrutura de vidro que foi montada pela Ré Recorrente no seu terraço e que, por motivos de segurança, teve que ser retirada e colocada no chão do seu terraço.

60. Sendo de atentar que o Autor Recorrido já interpelou inúmeras vezes a Ré Recorrente para se deslocar à sua residência e procederem ao seu levantamento, o que por esta via se reforça, para todos os devidos e legais efeitos.

61. Pelo que, o Autor Recorrido insiste que, caso a Ré Recorrente continue a persistir na sua atitude de não proceder ao levantamento da referida estrutura de sua casa, este ver-se-á obrigado dá-los como abandonados e, nessa sequência, proceder ao seu transporte e depósito em lixeira municipal.

62. Atento o exposto, as alegações de recurso da Ré Recorrente sobre esta parte também não fazem qualquer sentido quando esta afirma que a Sentença recorrida violou o disposto nos artigos 433.º, 434.º e 289.º do Código Civil, na medida em que não condenou o Autor Recorrido a restituir à Ré Recorrente a estrutura de vidro, não apenas porque que o primeiro jamais se escusou a restituir essa estrutura da vidro, como também e principalmente, pelo facto da segunda jamais ter peticionado ao Tribunal recorrido que o primeiro fosse condenado nesse sentido.

63. Termos em que as alegações de recurso da Ré Recorrente sobre esta parte deverão necessariamente decair, por falta de todo e qualquer fundamento, tendo o Tribunal recorrido feito uma correta interpretação e aplicação do regime aplicável, pelo que o presente recurso deverá ser julgado improcedente nesta parte e ser confirmada a Douta Sentença recorrida.

64. Por último, no que concerne ao recurso subordinado, o mesmo é composto por dois capítulos, um relativo ao pedido de condenação da Ré Recorrente a indemnizar o Autor Recorrido pelo dano de privação de uso do seu terraço, e outro relativo ao pedido de condenação da Ré Recorrente a restituir ao Autor Recorrido do valor dos relatórios técnicos juntos aos autos, decisões estas que o Autor Recorrido não logra compreender nem aceitar, constituindo o objeto do presente recurso subordinado o pedido de reapreciação por V. Exa. da decisão proferida sobre as duas referidas questões.

65. Ora, no que concerne ao primeiro pedido, importa atentar que o dano de privação de uso já foi por diversas vezes debatido e julgado pela Doutrina e pela Jurisprudência, sendo identificado como um tipo de dano, de ofensa do direito de propriedade, que não carece de ser provado por concretas e contínuas tentativas de utilização desse direito que se viram frustradas em consequência de ato ilegítimo e/ou injustificado por parte do sujeito lesante.

66. Tendo sido entendido, com efeito, que este tipo de dano sobre o direito de propriedade, sob pena da sua proteção se revelar muito diminuída, bastante inferior às necessidades de proteção existentes, deverá ser comprovado pela simples suscetibilidade de o lesado não o poder usufruir na totalidade, não estando carecido da demonstração efetiva de que iria, de forma contínua, gozar do mesmo.

67. E que a noção de dano decorrente da chamada teoria da diferença não deve aplicar-se ao dano da privação de uso, por não atender à privação temporária ou transitória de um bem.

68. Em consequência disso, não é exigível ao lesado que alegue e prove uma concreta diferença entre a situação patrimonial hipotética e a situação patrimonial real.

69. E se é certo que o Autor Recorrido não logrou fazer prova de especiais eventos familiares ou sociais que ficaram por marcar na sua residência e que se viram frustrados – o que implicaria que o Autor Recorrido tivesse levado a julgamento os seus familiares e amigos para testemunhar que o Autor decidiu, naturalmente, não organizar esses convívios, a verdade é que constitui um facto notório que, em casos como o presente, o Autor Recorrido foi lesado no seu direito de propriedade e gozo do seu terraço, o qual se viu privado de utilizar durante os meses de Verão, para convívios sociais e familiares, ainda para mais quando ainda nos encontrávamos em período de pandemia e os espaços ao ar livre eram mais aconselháveis, tendo sido precisamente para o convívio social e familiar que o Autor Recorrido decidiu instalar aí a estrutura de vidro em referência nestes autos.

70. Parecendo-nos inegável afirmar que o Autor Recorrido sofreu um dano no seu direito de propriedade, incluindo o seu direito de gozo, relativo ao imóvel onde reside, no qual dispõe de um terraço com cerca de 100m2 e que durante os meses subsequentes ao colapso sucessivo da estrutura montada pela Ré não pode ser utilizada, ou teve a sua utilização fortemente restringida, conferindo ao Autor o direito a ser indemnizada pela sua não utilização.

71. Termos em que, a Douta Sentença recorrida, para além de não ter feito um correto julgamento sobre a matéria de facto atinente a esta matéria, como o demonstram os excertos do depoimento prestado pelo Autor, não interpretou correta e devidamente o direito aplicável sobre esta matéria, seguindo as diretrizes interpretativas e aplicativas que têm vindo a ser seguidas pela maioria da nossa Doutrina e Jurisprudência, violando, entre outros, o princípio geral indemnizatório da reconstituição in natura, previsto nos artigo 562.º e seguintes do Código Civil, de acordo com os fundamentos que indicamos supra.

72. Nestes termos, a Douta Sentença recorrida deverá ser revogada na parte em que absolveu a Ré Recorrente do pedido de condenação da Ré Recorrente a indemnizar o Autor Recorrido pelo dano de privação de uso do seu terraço, devendo ser substituída por uma outra que a condene a pagar ao Autor uma indemnização fixada com recurso à equidade.

73. Para terminar, no que concerne ao segundo pedido do recurso subordinado, através do qual se peticiona a condenação da Ré Recorrente a restituir ao Autor Recorrido o valor dos relatórios técnicos juntos aos autos, importa afirmar que seguimos de perto a doutrina propugnada pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 10.07.2019, proc. 341/14.0GCVFR.P1.

74. Aresto esse de onde se deverá concluir que, ao contrário da tese propugnada na Douta Sentença recorrida, não ficou por demonstrar qualquer nexo causa entre a conduta da Ré Recorrente e este dano.

75. Devendo atentar-se que os relatórios técnicos em referência não foram de qualquer modo solicitados por opção e/ou vontade do Autor Recorrido (antes não tivesse tido este a necessidade de os solicitar).

76. Pelo contrário, o Autor Recorrido viu-se obrigado a solicitá-los, em face das circunstâncias dadas como provadas nestes autos.

77. Sendo de atentar que, se não fosse a conduta da Ré Recorrente, o Autor Recorrido jamais teria solicitado estes relatórios, os quais apenas se revelaram necessários em face da conduta gravemente negligente por parte da primeira, a qual construiu a estrutura de vidro em referência de forma totalmente defeituosa, levando ao seu colapso por duas vezes em cerca de dois meses.

78. Sendo ainda de atentar que a conduta do Autor Recorrido, segundo as regras da experiência comum, constituiu uma atuação claramente justificada em face das circunstâncias do caso concreto, de tal forma que a sensatez, pertinência, a imparcialidade e o valor de ciência dos dois relatórios juntos aos autos levou o tribunal recorrido a deles se socorrer amplamente para suportar a decisão proferida.

79. Termos em que, a Douta Sentença recorrida não interpretou correta e devidamente o direito aplicável sobre esta matéria, seguindo as diretrizes interpretativas e aplicativas que têm vindo a ser seguidas pela maioria da nossa Doutrina e Jurisprudência, violando, entre outros, o princípio geral indemnizatório da reconstituição in natura, previsto nos artigo 562.º e seguintes do Código Civil, de acordo com os fundamentos que indicamos supra.

80. Nestes termos, a Douta Sentença recorrida deverá ser revogada na parte em que absolveu a Autor Recorrido do pedido de condenação da Ré Recorrente a restituir-lhe o valor por si pago pelos referidos relatórios técnicos, devendo ser substituída por uma outra que condene o Autor a pagar uma indemnização no valor de € 799,50 (307,50 + 492,00).

81. Termos em que, sem necessidade de maiores considerações, o recurso a que ora se responde deverá ser julgado improcedente, por não se verificarem os pressupostos da respetiva procedência, devendo, por conseguir-se, confirmar-se o decidido pela Sentença ora recorrida, sem prejuízo da apreciação do recurso subordinado que por esta via se interpõe, o qual deverá ser julgado totalmente procedente, por provado, e a Ré Recorrente ser condenada em conformidade.

TERMOS EM QUE, e nos mais de Direito que Vossas Excelências se dignarem suprir dentro do Vosso mais alto saber e critério:

a) Deverá ser julgado improcedente, por não provado, o recurso interposto pela Ré Recorrente, tanto de facto, como de direito, por não se verificarem os pressupostos da respetiva procedência, devendo, por conseguir-se, confirmar-se o decidido pela Sentença ora recorrida;

b) Deverá ser conhecido o recurso subordinado interposto pelo Autor Recorrido, devendo o mesmo ser julgado totalmente procedente e, nessa sequência ser a Ré condenada nos termos peticionados na petição inicial.

Em qualquer caso, cumulativamente com os pedidos atrás deduzidos,

c) Atenta a manifesta litigância de má-fé da Ré Recorrente, materializada, uma vez mais, nas alegações de recurso a que ora se responde, pela consciência e intenção dolosa de distorcer a realidade factual e jurídica, deverá a Ré Recorrente ser condenada a título de litigante de má-fé, em multa e indemnização ao Autor, nos termos previstos nos artigos 542.º e seguintes do CPC.

A Ré não respondeu ao recurso subordinado do Autor.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II.OBJECTO DO RECURSO.

A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelos recorrentes, no caso dos autos cumprirá apreciar:

B.1. Do recurso da Ré:

a) Se a sentença padece de nulidade;

b) Se ocorreu erro de julgamento da matéria de facto;

c) Se assistia ao Autor o direito de resolver o contrato;

d) Se a resolução foi abusiva;

e) Se a sentença recorrida devia expressamente condenar o Autor a restituir à Ré a estrutura de vidro por ela aplicada, por intermédio de terceiro, na habitação daquele.

B.2. Do recurso (subordinado) do Autor:

a) Se o mesmo tem direito a ser indemnizada por danos decorrentes da privação do terraço;

b) Se o mesmo tem direito a ser reembolsado pela Ré das despesas efectuadas com a elaboração dos relatórios técnicos por ele juntos aos autos.

c) Se existe fundamento para condenação da Ré/apelante por litigância de má fé.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

III.1. Foram os seguintes os factos julgados provados em primeira instância:

1. Por escritura pública intitulada “compra e venda”, outorgada no dia 29/1/2020, no Cartório Notarial a cargo da Notária FF, sito no Porto, GG e esposa HH (primeiros outorgantes), declararam vender ao Autor AA (segundo outorgante), que declarou aceitar a venda, um apartamento sito na Avenida ..., ..., ..., habitação ..., ... ..., que corresponde à fração autónoma designada pelas letras “AH” do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, descrito na Conservatória de Registo Predial de Gondomar sob o n.º ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da freguesia ..., Gondomar.

2. Desde a referida data que o Autor vive na referida habitação, de forma contínua e permanente, com a sua mulher e filha, esta com 7 anos de idade (à data dos factos).

3. A fracção referida em 1. está localizada num 8.º andar, e inclui ainda, para seu uso exclusivo, uma parte do terraço de cobertura do prédio em que se insere, o qual tem cerca de 100 m2 e não é coberto, sendo apenas ladeado com um murete/platibanda feito em betão armado.

4. Murete/platibanda esse que tem 30 metros de comprimento e 190 mm de largura, sendo revestido a cerâmica “litocer” e coroado com chapim em granito.

5. Com o intuito de mitigar os efeitos do vento, bem como de eliminar qualquer risco de queda de pessoas e bens, o Autor solicitou à Ré, por intermédio do Sr. CC, que lhe apresentasse um orçamento para a instalação de uma estrutura ou guarda em vidro a instalar no referido terraço.

6. A Ré desde logo se disponibilizou para executar a referida obra.

7. No dia 14/6/2021, a mesma apresentou um orçamento ao A., com a seguinte descrição e preço (IVA incluído): “Guarda em vidro laminado com aresta e passamão com peças inox para sustentação a todo o comprimento do terraço - € 6.050,00

8. No dia 18/06/2021, por forma a perceber melhor o tipo de obra que a Ré se disponibilizou a executar, o Autor solicitou ao intermediário da Ré que lhe enviasse uma fotografia de uma guarda em vidro já montada, semelhante à que a Ré se propunha executar.

9. Nesse mesmo dia, o intermediário da Ré enviou ao Autor a referida fotografia e, de imediato, o Autor aprovou e adjudicou à Ré a construção de uma estrutura de guarda em vidro a instalar no terraço do seu apartamento.

10. À data da adjudicação dos serviços quem tinha a chave do apartamento do A. era o Sr.  CC, funcionário da Ré.

11. Ficou acordado que o Autor pagaria à Ré a quantia de € 3.945,00 aquando do início dos trabalhos e € 3.000,00 com a sua conclusão, num valor global de € 6.945,00 (c/ IVA), dos quais € 6.050,00 diziam respeito à guarda em vidro anteriormente referida e o remanescente a outros serviços prestados pela Ré ao Autor, tais como a aplicação de uma tela de proteção contra o sol a instalar numa estrutura pré-existente e um serviço de desentupimento de lavandaria e cozinha.

12. No dia 28/06/2021, o Autor procedeu a uma transferência bancária no valor de € 3.945,00 para uma conta bancária indicada pela Ré.

13. Nem no momento da adjudicação, nem em qualquer outro momento, a Ré levantou qualquer tipo de problema ou dificuldade perante o Autor no que concerne à realização da obra adjudicada.

14. Nunca tendo colocado qualquer tipo entrave para a execução dos trabalhos, de ordem técnica ou outra, da responsabilidade do Autor ou de terceiros, não tendo alguma vez interpelado o Autor no sentido de assumir qualquer tipo de risco ou responsabilidade pelas opções construtivas adotadas em obra.

15. A Ré acordou com terceiro (BB – “B...”) a construção e colocação da supra referida guarda em vidro, tendo sido este quem executou tais trabalhos.

16. O Autor admitia como possível, à data do acordo com a R. e durante a execução dos trabalhos, que a Ré se servisse de terceiro “subcontratado” para o efeito, embora não tivesse qualquer conhecimento concreto relativamente a esse facto.

17. A Ré apenas deu por concluídos os trabalhos no dia 30/08/2021, data em que foram retirados os apoios que seguravam a estrutura enquanto a mesma secava e solidificava.

18. O A. procedeu ao pagamento do remanescente do valor suprarreferido, uma vez mais, através de transferência bancária para uma conta indicada pela Ré, no valor de € 3.000,00.

19. Nessa sequência, a Ré emitiu em nome do Autor a fatura-recibo n.º ..., datada de 30/08/2021, no valor de € 6.945,00 (IVA incluído), sendo que à “guarda em vidro laminado transparente c/ aresta e passamão em alumínio lacado 7016 a todo comprimento do terraço” correspondia o valor, com IVA, de € 6.050.

20. Na madrugada do dia 02/10/2021 para o dia 03/10/2021, a mesma “guarda em vidro” viria a ceder ao seu próprio peso e à força do vento.

21. Tendo alguns dos vidros que a compunham, numa extensão de cerca de 7 metros, sofrido um tombamento de cerca de 25 graus, deixando de se encontrar na posição vertical.

22. A aqui Ré de imediato contactou a pessoa que efectuou o serviço, BB, que se deslocou ao terraço do Autor para perceber o que de facto tinha acontecido, no dia 5 de Outubro de 2021.

23. Nesse momento, por este foi efectuado um reforço na estrutura e combinou com o Autor a colocação de peças mais resistentes para reforçar a estrutura.

24. Cerca de um mês após, na madrugada do dia 01/11/2021 para o dia 02/11/2021, mantendo-se a estrutura no mesmo exacto estado em que ficou desde o referido no ponto anterior, a estrutura em referência viria a colapsar uma vez mais, cedendo pela segunda vez ao seu próprio peso e à força do vento.

25. Desta segunda vez, deu-se a fragmentação de diversas partes da estrutura montada pela Ré, incluindo alguns vidros e partes de suporte, bem assim como de partes integrantes do murete/platibanda e pavimento do terraço.

26. Algumas “folhas” de vidro acabaram por tombar, ainda mais, para o lado de dentro do terraço, num ângulo de cerca de 180 graus, e outras desprenderam-se, caíram no chão e quebraram-se.

27. Existia risco iminente de queda de fragmentos da estrutura do referido 8.º andar, atingindo as pessoas e bens (veículos) que constantemente se encontram na entrada e envolvente do prédio.

28. Nos dias 2 e 3 de Outubro e 1 e 2 de Novembro de 2021, na freguesia ..., onde se situa o imóvel, o vento soprou fraco a moderado (< 35 Km/h), com a intensidade máxima instantânea do vento a atingir valores de 40 a 50 Km/h, no final do dia 2 de Outubro e no início do dia 3 de Outubro.

29. O Autor denunciou de imediato o sucedido à Ré, após se aperceber de ambas as ocasiões relatadas, isto é, nos dias 03/10/2021 e 02/11/2021.

30. A Ré propôs que a resolução da situação se fizesse através da aplicação de uma determinada peça, a qual alegadamente reforçaria a estrutura montada.

31. Foi utilizado pela R., por intermédio da pessoa supra referida, perfil AV 13 da Sosoares em toda a extensão do terraço, na cor 7016, com vidro Laminado 6+6 e passamão que cobre toda a extensão do terraço.

32. E parafusos com 70 mm e “bucha química”.

33. No processo de montagem e instalação da estrutura de guarda de vidro em referência, a Ré (por intermédio da terceira pessoa supra referida):

a. Aplicou parafusos de fixação mecânica muito próximo da bordadura do “chapim” em granito, considerando a baixa resistência deste material a esforços de tração;

b. Aplicou parafusos de fixação mecânica feitos de material desadequado ao local de instalação, levando à respetiva oxidação apenas cerca de dois meses após a respetiva instalação;

c. Aplicou parafusos de fixação mecânica de modelo diferente ao preconizado pelo fabricante da guarda vidro;

d. Aplicou parafusos de fixação mecânica com cabeça de diâmetro inferior ao necessário para garantir a segurança da instalação;

e. Aplicou parafusos de fixação mecânica de comprimento inferior ao necessário em termos de profundidade no encastre no muro, considerando que este não é feito exclusivamente em betão resistente, existindo cerca de 47 mm entre o betão e a base do perfil;

f. Aplicou parafusos de fixação mecânica em menor número e com demasiado espaçamento entre eles, tendo por referência as indicações preconizadas pelo fabricante da guarda vidro;

g. Aplicou parafusos de fixação mecânica com espaçamento irregular entre eles, não permitindo uma distribuição uniforme de esforços por toda a extensão da estrutura;

h. Aplicou uma base de alumínio contínua, eliminando o efeito favorável do espaçamento entre vidros.

34. Até ao mês de Dezembro de 2021, a Ré não estava habilitada pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC) para realizar obras particulares.

35. Desde data não concretamente apurada, mas posterior ao referido em 24. a 26., o A. passou a rejeitar qualquer intervenção da R. no sentido da reparação da estrutura.

36. Por carta enviada pelos mandatários do A. no dia 22/11/2021 e recebida pela Ré a 24/11/2021, aquele procedeu à “resolução do contrato”, invocando que: (…) comunicou-nos o N. Constituinte que a V. Empresa, após ter sido informada sobre o sucedido e de, numa primeira fase, se ter disponibilizado a resolver a situação através de pequenas intervenções, superficiais, viria posteriormente a recusar-se a assumir (por escrito) a total responsabilidade pelo sucedido – designadamente, reconhecendo (por escrito) a necessidade de ser feita uma obra ex novo -, não obstante estar naturalmente ciente do trabalho defeituoso por si desenvolvido, bem assim como da perigosidade da situação criada. Foi nesta sequência que, incrédulo com a postura da V. Empresa, o N. Constituinte nos contactou e ordenou a realização de duas vistorias técnicas ao local aqui em causa, tendo em vista apurar as condições de instalação e segurança das guardas em vidro colocadas pela V. Empresa. Vistorias essas das quais resultou o que já era evidente para qualquer leigo, sendo certo que se concluiu, mesmo a título preliminar, que, para além de toda a estrutura ter sido montada “em desconformidade com as mais elementares regras de segurança”, “devendo ser novamente construída de raiz”, “deverá ser removida imediatamente, pois encontra-se sem condições mínimas de estabilidade e a sua queda para a via pública é iminente o que a concretizar-se poderá causar graves prejuízos patrimoniais e corporais.” Ora, atento o exposto, tendo a V. Empresa, se recusado a assumir (por escrito) a necessidade de realizar uma obra ex novo para eliminar os defeitos existentes, bem como a assumir todas as responsabilidades inerentes ao cumprimento defeituoso do contrato de empreitada em referência – conforme o demonstram as comunicações trocadas com o N. Constituinte -, encontra-se o N. Constituinte legitimado a operar a resolução do referido contrato, nos termos do artigo 1222.º do Código Civil, o que por esta via se faz com todas as legais consequências, considerando que os defeitos existentes na obra são totalmente inadequados ao fim a que a mesma se destina. (…)”

37. À carta referida no ponto anterior respondeu a Ré, por intermédio do seu mandatário e através de missiva registada, datada de 14 de Dezembro de 2021, na qual foi comunicado ao mandatário do A. que “Reitero que nunca existiu por parte da minha constituinte a recusa na realização da reparação dos defeitos existentes ou da efectivação de uma nova construção, pelo que, não aceita a mesma a resolução efectuada por V. Exas. ao abrigo do artigo 1222º do Código Civil. O que existiu, ao invés, foi a recusa por parte do vosso constituinte em que a minha cliente pudesse exercer os seus direitos à reparação dos defeitos ou eventual nova construção. Por último, informo o colega que a minha constituinte está, como sempre esteve, disponível para a realização da reparação dos defeitos ou construção de uma nova estrutura, aguardando para o efeito que o seu constituinte permita a realização da mesma.”

38. O A. contratou duas empresas de peritagem que analisassem a obra levada a cabo.

39. Diligências essas nas quais o Autor suportou as quantias de € 307,50 (trezentos e sete euros e cinquenta cêntimos) de € 492,00 (quatrocentos e noventa e dois euros).

40. O A. contratou uma empresa para proceder à desmontagem e levantamento da estrutura aqui em causa, no que gastou a quantia de € 653,13 (seiscentos e cinquenta e três euros e treze cêntimos).

41. De entre três propostas de orçamento recolhidas, o Autor optou pela empresa “C...”, a qual apresentou o orçamento de menor custo.

42. A estrutura em causa foi depositada por esta entidade no pavimento do terraço do Autor, apenas parcialmente, isto é, apenas as peças que não apresentavam danos significativos e que, eventualmente, poderão ser aproveitadas pela Ré.

43. O Autor ainda não procedeu a qualquer obra de construção civil no sentido de reparar e repor o terraço no estado em que o mesmo se encontrava antes de qualquer intervenção por parte da Ré.

44. Com a instalação e colapso da estrutura montada pela R., o murete/platibanda e o pavimento do terraço, sofreram danos, quando a referida estrutura colapsou e provocou a fragmentação dos respetivos materiais.

III.2. A mesma instância considerou não provados os seguintes factos:

a) O murete/platibanda referido na factualidade provada tenha 74 cm de altura.

b) Aquando da solicitação do orçamento referido em 5. e 7., tenha sido pedido ou discutido entre as partes que a guarda em vidro aí referida deveria ter cerca de 1 metro de altura acima do murete/platibanda referido.

c) A Ré afirmou expressamente ter competência e capacidade técnica, bem como disponibilidade de recursos, para a colocação da guarda em vidro.

d) Ficou acordado que a obra em referência estaria concluída até finais do mês de julho de 2021, por forma a permitir a ocupação e utilização do terraço pelo Autor já durante o mês de Agosto.

e) A Ré falou várias vezes ao telefone com o Autor no sentido de o mesmo saber junto da Administração do Condomínio se não existia qualquer tipo de problema ou constrangimento para a colocação da referida estrutura de vidro no terraço, tendo o A. assegurado à Ré que não existia e que podia avançar com o serviço.

f) Terão sido usados pelo menos cerca de 30 parafusos, na extensão da guarda de vidro que tombou, embora devido ao peso da estrutura, muitos parafusos foram arrancados aquando da queda, existindo alguns no chão interior e outros caíram para o lado exterior do prédio.

g) A guarda em ferro já existente, já apresentava os parafusos, em alguns casos, soltos.

h) O aqui Autor sempre soube e aceitou que a aqui Ré iria contratar um terceiro para a execução e colocação da referida estrutura de vidro.

i) O A. sempre eximiu a Ré de qualquer responsabilidade no que sucedeu com a guarda de vidro.

j) O Autor sempre recusou que a Ré, através do Sr. BB, tivesse a possibilidade de reparar os defeitos ou de efectuar uma nova construção.

k) A Ré recusou-se a proceder à reparação dos defeitos, não reconhecendo a sua existência.

l) A solução proposta pela R. para resolver o problema da guarda de vidro era tecnicamente errada e eventualmente, limitar-se-ia a mitigar ou a disfarçar os defeitos existentes.

m) A resolução do problema sub judice implicaria necessariamente a desmontagem de toda a estrutura e a sua montagem ex novo, o que a Ré sempre se negou a fazer.

n) Depois do referido em 20. e 21., o A. interditou de imediato o referido terraço.

o) O Autor ficou privado de usufruir do seu terraço desde o dia 3 de outubro de 2021 até a data de hoje.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

IV. A. Do recurso da apelante A..., Lda.
1. Da arguida nulidade da sentença.

Alega a apelante que a sentença é nula, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º, alínea e) do Código de Processo Civil porquanto condena em objecto diverso do pedido.

Dispõe o n.º 1 do artigo 615.º do aludido diploma:

“É nula a sentença quando:

a) Não contenha a assinatura do juiz;

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;   

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

A nulidade da sentença - ou de despacho - constitui vício intrínseco da decisão, desde que ocorra alguma das circunstâncias taxativamente previstas no artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que, pela sua gravidade, comprometem a sentença ou o despacho qua tale.

Como o n.º 1 do artigo 668.º do anterior diploma, também o n.º 1 do artigo 615.º do actual Código de Processo Civil contém uma enumeração taxativa das causas de nulidade da sentença[2], nelas não se inserindo o designado erro de julgamento, que apenas pode ser atacado por via de recurso, quando o mesmo for legalmente admissível[3].
Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas pelas partes, apenas deve conhecer destas e das que oficiosamente lhe caiba conhecer[4].
Também “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir” – artigo 609º, n.º 1 do Código de Processo Civil. O desrespeito por tal limite inquina a sentença de nulidade, conforme previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º.
A sentença recorrida, reconhecendo e declarando que “o contrato celebrado entre as partes foi definitivamente incumprido por parte da Ré A..., LDA., sendo a resolução por parte do Autor AA válida e operante, com todas as consequências legais daí advenientes”, condenou a Ré, ora recorrente,
 - a restituir ao Autor a quantia de € 6.050,00 (seis mil e cinquenta euros), paga por este à Ré a título de cumprimento do contrato celebrado entre as partes;
- a pagar ao A. indemnização no valor de € 653,13 (seiscentos e cinquenta e três euros e treze cêntimos), a título de danos patrimoniais,
acrescendo às referidas quantias juros, vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor para as operações civis, contados desde a citação, até efectivo e integral pagamento; e ainda
- a indemnizar o Autor pelos danos referidos no ponto 44 da factualidade provada, cujo quantitativo deverá ser apurado em incidente de liquidação (artigos 358.º a 361.º e 609.º, n.º 2, do CPC).
Absolvendo-a do demais peticionado pelo Autor”.                                                           
É certo que na parte final da petição inicial o Autor não formula o pedido genérico contemplado na alínea e) do dispositivo da sentença recorrida (Condena-se ainda a Ré a indemnizar o Autor pelos danos referidos no ponto 44 da factualidade provada, cujo quantitativo deverá ser apurado em incidente de liquidação (artigos 358.º a 361.º e 609.º, n.º 2, do CPC).
Esse pedido acha-se, no entanto, formulado no artigo 80.º da petição inicial: “Por esse motivo, nos termos da norma prevista no artigo 556.º, n.º 1, al. b), o Autor deduz um pedido genérico de indemnização quanto a este concreto dano, devendo a Ré ser condenada a pagar ao Autor o valor que vier a apurar-se corresponder à reparação e reposição do terraço no estado em que o mesmo se encontrava antes de qualquer intervenção por parte da Ré)”.
Se, por regra, os pedidos são formulados na parte final da petição inicial (ou da reconvenção), nada obsta que a sentença atenda a pretensão formulada na parte expositória do articulado quando esta traduza clara intenção da parte em lhe conferir essa natureza. Como se retira do acórdão da Relação de Coimbra de 10.09.2013, citado na sentença recorrida, “O pedido formulado pelo autor na petição inicial (art. 467º, nº 1, e) do CPC) deve, em regra, ser feito na conclusão. Contudo, tal não obsta a que possa também ser expresso na parte narrativa do articulado, desde que se revele com nitidez a intenção de obter os efeitos jurídicos pretendidos”.
Se, como se defende no acórdão desta Relação de 8.02.2024[5], também relatado pela ora relatora, se sustenta que “são de admitir os pedidos implícitos que se afigurem como pressupostos dos pedidos expressamente formulados ou se retirem, por dedução ou interpretação, da alegação formulada pela parte”, em alinhamento com a posição adoptada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 30.05.2023, nele citado, por maioria de razão se devem admitir os pedidos que sejam expressamente formulados, ainda que o não tenham sido na parte final da petição inicial.
De nenhum vício padece, assim, a sentença recorrida, designadamente o denunciado pela recorrente.
Nessa parte, improcede o recurso.
2. Reapreciação da matéria de facto.
Dispõe o n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, estabelecendo o seu nº 2:
A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.
Como refere A. Abrantes Geraldes[6], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.
Importa notar que a sindicância cometida à Relação quanto ao julgamento da matéria de facto efectuado na primeira instância não poderá pôr em causa regras basilares do ordenamento jurídico português, como o princípio da livre apreciação da prova[7] e o princípio da imediação, tendo sempre presente que o tribunal de 1ª instância encontra-se em situação privilegiada para apreciar e avaliar os depoimentos prestados em audiência. O registo da prova, pelo menos nos moldes em que é processado actualmente nos nossos tribunais – mero registo fonográfico –, “não garante a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e dos quais é legítimo ao tribunal retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”[8].
Também é certo que, como em qualquer actividade humana, sempre a actuação jurisdicional comportará uma certa margem de incerteza e aleatoriedade no que concerne à decisão sobre a matéria de facto. Mas o que importa é que se minimize tanto quanto possível tal margem de erro, porquanto nesta apreciação livre o tribunal não pode desrespeitar as máximas da experiência, advindas da observação das coisas da vida, os princípios da lógica, ou as regras científicas[9].
De todo o modo, a construção da realidade fáctica submetida à discussão não se poderá efectuar de forma parcelar e desconexa, atendendo apenas a determinado meio de prova, ou a parte dele, e ignorando todos os demais, ainda que expressem realidade distinta, a menos que razões de credibilidade desacreditem estes.
Ou seja: nessa tarefa não pode o julgador conformar-se com a análise parcelar e parcial transmitida pelos litigantes, mas antes submetê-la a uma ponderação dialéctica, avaliando a força probatória do conjunto dos meios de prova destinados à demonstração da realidade submetida a debate.
Assinale-se que a construção – ou, melhor dizendo, a reconstrução, pois que é dela que se deve falar quando, como no caso, se procede à ponderação dos factos que por outros foram apreendidos e transmitidos com o filtro da interpretação própria de quem processa essa apreensão – da realidade fáctica não pode efectuar-se de forma parcelar e desconexa, antes reclamando o contributo conjunto de todos os elementos que a integram.
 Quer isto dizer que a realidade surge de um conjunto coeso de factos, entre si ligados por elos de interdependência lógica e de coerência.
A realidade não se constrói apenas a partir de um depoimento isolado ou de um conjunto disperso de documentos, ainda que confirmadores de uma determinada versão factual, antes se deve conformar com um património fáctico consolidado de forma sólida, coerente, transmitido por elementos probatórios com idoneidade e aptidão suficientes a conferir-lhe indiscutível credibilidade.
Como se escreveu no acórdão da Relação de Lisboa de 21.12.2012[10], “…a verdade judicial traduz-se na correspondência entre as afirmações de facto controvertidas, relevantes e pertinentes, aduzidas pelas partes no processo e a realidade empírica, extraprocessual, que tais afirmações contemplam, revelada pelos meios de prova produzidos, de forma a lograr uma decisão oportuna do litígio. Sobre as doutrinas da verdade judicial como mera coerência persuasiva ou como correspondência com a realidade empírica, vide Michele Taruffo, La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, pag. 26-29. Quanto à configuração do objecto da prova e a sua relação com o thema probandum, vide Eduardo Gambi, A Prova Civil – Admissibilidade e relevância, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, Brasil, 2006, pag. 295 e seguintes; LLuís Muñoz Sabaté, Fundamentos de Prueba Judicial Civil L.E.C. 1/2000, J. M. Bosch Editor, Barcelona, 2001, pag. 101 e seguintes.
Por isso mesmo, a “reconstrução” cognitiva da verdade, por via judicial, não tem, nem jamais poderia ter, a finalidade exclusiva de obter uma explicação exaustiva e porventura quase irrefragável do acontecido, como sucede, de certo modo, nos domínios da verdade história ou da verdade científica, muito menos pode repousar sobre uma crença inabalável na intuição pessoal e íntima do julgador. Diversamente, tem como objectivo conseguir uma compreensão altamente provável da realidade em causa, nos limites de tempo e condições humanamente possíveis, que satisfaça a resolução justa e legítima do caso (…)”.
2.1. Discordando, em parte, da decisão proferida em primeira instância, na parte em que julgou provada a matéria constante dos pontos 13.º, 14.º, 17.º, 20.º, 21.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 33.º, que, no seu entender, deve ser considerada não provada, e a que julgou não provada a matéria elencada nas alíneas f), g), h) e j), a qual, na sua perspectiva, deve ser considerada provada, reclama a recorrente a sua reapreciação por esta instância de recurso.
Indicou ainda a recorrente os concretos meios de prova em que se fundamenta para reclamar a alteração pugnada: declarações de parte do Autor, prova testemunhal [depoimento das testemunhas DD, EE, CC e BB, e prova documental (mensagens do Autor constantes dos autos)].
Sustenta ainda a recorrente que a sentença que impugna, na parte da fundamentação da matéria de facto, é omissa quanto à motivação que dá como provada a matéria constante dos pontos 20.º, 21.º, e 24.º a 27.º.
Cumprido, assim, os ónus impostos pelo artigo 640.º do Código de Processo, impõe-se a reapreciação da decisão relativa à matéria de facto, na parte objecto de impugnação, procedendo-se, para tanto, à audição da gravação dos depoimentos prestados em audiência com relevância para esse reexame.
O Autor prestou declarações, relatando, de forma detalhada e objectiva, não só em que termos contratou os serviços da Ré, como ainda a forma como os mesmos foram concretizados, as patologias da obra, que culminaram no colapso da estrutura colocada no terraço, e as diligências efectuadas pela Ré para solucionar as mesmas.
O Autor apresentou um discurso pormenorizado, fluido e  convincente, reforçado por outros elementos de prova, designadamente, pelos pareceres técnicos juntos com a petição inicial, elaborados e subscritos pelas testemunhas EE e DD, ambos engenheiros civis, que em audiência confirmaram não só o teor desses relatórios que subscreveram, como prestaram esclarecimentos acerca da qualidade dos serviços prestados ao Autor pelo terceiro contratado pela Ré, e ainda o conteúdo dos contactos estabelecidos entre o Autor e CC através da plataforma de comunicações WhatsApp, também documentadas nos autos, sendo as declarações do Autor integralmente conformes com a factualidade dada como provada, designadamente a que foi objecto de impugnação da apelante.
Ressalve-se que, conforme consta da assentada lavrada em acta da audiência de 16 de Fevereiro de 2021, o Autor confessou que “admitia como possível, à data da celebração do contrato e durante a sua execução, que a Ré se servisse de terceiro subcontratado para o efeito, embora não tenha qualquer conhecimento concreto relativamente a esse facto”, facto que integra o ponto 16.º dos factos provados, que não foi objecto de impugnação recursiva, não tendo sido produzida prova confirmadora da matéria constante da alínea h) dos factos dados como não provados.
A testemunha DD, engenheiro civil, realizou, enquanto funcionário da empresa D..., para a qual trabalhou até Dezembro de 2021, uma avaliação à estrutura montada no prédio do Autor, elaborando, na sequência de tal diligência, o relatório que foi junto com a petição inicial como documento n.º 10, cujo conteúdo confirmou em audiência, prestando nela esclarecimentos quanto às características da estrutura – tapa vistas, em vidro -, à sua capacidade resistente em função do vento, aos defeitos detectados na obra, referindo, designadamente, que detectou “um conjunto de más práticas de construção que são notórias e evidentes e que para mim me levaram a concluir neste relatório que aquilo tem 3 ou 4 fragilidades e más práticas de construção evidentes”, apontando o procedimento que, em seu entender, seria o correcto para aquele tipo de estrutura, referindo que se fosse ele a realizar o projecto colocaria uma estrutura “completamente nova”, esclarecendo ainda o grau de insegurança e de perigo que estavam associados à estrutura montada pela empresa contratada pela Ré.
A testemunha EE, engenheiro civil, efectuou, a pedido do Autor, uma vistoria à obra realizada no terraço deste, tendo elaborado e assinado o relatório que, como documento n.º 9, foi junto com a petição inicial, cujo teor confirmou, prestando ainda esclarecimentos acerca das desconformidades ou imperfeições técnicas de que, no seu entender, afectava a obra, e que determinou que a mesma colapsasse.
A testemunha CC é director comercial da Ré, da qual o seu pai é sócio-gerente, e relatou a relações negociais estabelecidas entre a Ré e o Autor, as quais sempre intermediou, sendo consigo que o Autor contactou quando ocorreram as duas situações que culminaram no colapso da estrutura montada no terraço do prédio do Autor, as quais, no seu entender e pelo que lhe foi transmitido pela equipa que efectuou os trabalhos, se deveram aos ventos e ao facto de o patamar onde foi implantada a estrutura não ter aguentado com  mesma.
Referiu que quando ocorreu o primeiro incidente a solução proposta ao Autor foi a de efectuar a reparação dos estragos causados e fazer um reforço da estrutura através da colocação de umas “agarras”, com a qual o mesmo concordou, mas que, entretanto, decorridas algumas semanas, ocorreu o segundo incidente, que determinou que mais “meia dúzia de metros” tenham também colapsado, tendo o Autor deixado de permitir que avançassem com a reparação proposta.
Esclareceu ainda que a obra foi efectuada por II, que tem uma empresa singular, do ramo de estores, e que, aquando do primeiro incidente, a equipa que efectuou a montagem da estrutura reparou os estragos e reforçaram a zona afectada.
A testemunha BB, referiu ser empresário em nome individual na área de serralharia e ter sido subcontratado pela Ré para colocar uma guarda de vidro no terraço da casa do Autor, que conheceu quando foi tirar medidas e que lhe deu indicações de como queria a referida guarda. Afirmou que a obra ficou concluída em meados de Agosto de 2021 e que em princípios de Outubro seguinte a base que sustentava o vidro “tinha cedido ligeiramente e estava-se a ver umas brechas que faria com que a nossa estrutura em vez de ter sustentação estava a cair para o interior”, o que lhes foi comunicado pelo Sr. CC, tendo então mandado retirar “o bocadinho de metro e meio” que havia cedido, reforçado a respectiva base e voltado a repor no local, colocando bucha química nas zonas que levam fixação e onde já se notavam “pequenas brechas”.
Referiu que foram “ventos excessivos” que causaram aquelas anomalias e que na altura fizeram uma vistoria à restante estrutura, que não aparentava qualquer dano na base, tendo proposto ao Autor, “por uma questão de segurança caso houvesse outra situação meteorológica demasiado intensa”, colocarem umas agarras em ferro para segurar na base que já existia, peças que são feitas à medida e cujos prazos de entrega rondam entre uma e duas semanas.
No início de Novembro voltou a ser alertado para um segundo incidente e, tendo-se deslocado ao local, constatou que sete metros corridos da estrutura não aguentaram outra intempérie e o peso da estrutura fez com que a base se desprendesse e aquela tenha caído para o interior do terraço, tendo uma grande parte caído e a restante ficado inclinada.
Segundo o depoente, a estrutura não tinha qualquer problema, tendo sido a base em que a mesma assentava que cedeu completamente, devido a um fenómeno meteorológico adverso, tendo na altura sido proposto ao Autor, e por ele aceite, retirar toda a estrutura e pegar “nessa base de raiz e fazê-la completamente de forma a que pudesse suportar uma estrutura deste género mesmo com outra intempérie”. Mais tarde, decorrido um ou 2 dias, o Sr. CC informou-o de que o Autor já não aceitava essa solução.
Da análise dos referidos meios de prova – prova que, não sendo tarifada, apenas está sujeita à livre apreciação do julgador – não resulta minimamente infirmada a matéria dada como provada, objecto de impugnação da apelante, não sendo ela suficientemente confirmadora da matéria elencada nas alíneas f), g), h) e j), dada como não provada.
Adiante-se que, quanto ao esclarecimento dos factores que estiveram na origem das patologias registadas, por duas vezes, pouco tempo decorrido sobre a conclusão da obra, na estrutura montada pelo terceiro contratado pela Ré, foram especialmente relevantes os pareceres técnicos[11] elaborados pelas testemunhas DD e EE e pelos depoimentos por estas prestadas em audiência, não tendo sido minimamente convincente o depoimento da testemunha BB, que, para além de ter claramente interesse no desfecho da acção, não revelou estar dotado dos conhecimentos técnicos necessários à conclusão da obra em conformidade com as regras de segurança especificamente exigidas.
Já quanto à recusa da reparação por parte do Autor, atentou-se especialmente no teor das comunicações escritas trocadas entre ele e a testemunha CC, reproduzidas nos autos.
Finalmente, não se detecta qualquer omissão de fundamentação quanto à matéria dos pontos 20.º, 21.º, e 24.º a 27.º, dados como provados, já que se pode ler na decisão impugnada: “No que concerne os acontecimentos da madrugada de 2/10 para 3/10/2021 e de 1/11 para 2/11/2021, foram analisados, em suma, todos os depoimentos testemunhais, declarações/depoimento de parte do A., bem como as fotografias juntas aos autos e os relatórios juntos como docs. 9 e 10 com a p.i., que evidenciam o estado da estrutura em cada um dos dias”.
Assim, não só a decisão relativa à matéria de facto se mostra suficientemente fundamentada, como a reapreciação da mesma e a valoração dos meios de prova produzidos  acerca da matéria objecto de impugnação não justificam a sua modificação, razão pela qual a mesma se mantém, sem alterações, improcedendo, nesta parte, o recurso.
3. Da subsunção dos factos ao direito.

Como resulta do acervo factual recolhido nos autos, o Autor, que adquiriu por escritura de compra e venda de 29.01.2020, a fracção identificada no ponto 1.º dos factos provados, com intuito de mitigar os efeitos do vento, bem como de eliminar qualquer risco de queda de pessoas e bens, solicitou à Ré, por intermédio do Sr. CC, que lhe apresentasse um orçamento para a instalação de uma estrutura ou guarda em vidro a instalar no terraço do referido imóvel.

A Ré, que logo se disponibilizou a executar aquela obra, apresentou ao Autor o orçamento descrito no ponto 7.º dos factos provados, enviando ainda ao mesmo uma fotografia de uma estrutura, já montada, de características semelhantes à que se propunha executar.

O Autor aceitou o orçamento apresentado, adjudicando à Ré a construção de uma estrutura de guarda em vidro a instalar no terraço do seu apartamento, tendo sido convencionado que que o Autor pagaria à Ré a quantia de € 3.945,00 aquando do início dos trabalhos e € 3.000,00 com a sua conclusão, num valor global de € 6.945,00 (c/ IVA), dos quais € 6.050,00 diziam respeito à guarda em vidro referida e o remanescente a outros serviços prestados pela Ré ao Autor.

O artigo 1154.º do Código Civil define o contrato de prestação de serviços como “aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição”, sendo extensíveis aos contratos de prestação de serviço não regulados especialmente na lei, como sucede designadamente com o contrato de empreitada, as disposições relativas ao contrato de mandato, como decorre do artigo 1156º do mesmo diploma legal.

No contrato de empreitada, tendo como contrapartida o preço acordado, o empreiteiro obriga-se à realização da obra, que constitui a prestação principal a seu cargo. É o que resulta do artigo 1207.º do Código Civil.

Deste modo, “…a obrigação do empreiteiro é uma obrigação de resultado, em que este assume a obrigação de realização de uma determinada obra, de acordo com o convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (art.º 1208.º do C.C.), não sendo responsável pela não obtenção deste resultado, quando esse fracasso é imputável a causas que não possa dominar”[12].

Como destaca JJ[13], “o conceito de obra é portanto essencial para qualificar um contrato como de empreitada e determinar, em consequência, se se lhe aplica o respectivo regime jurídico ou o regime de outros contratos de troca com os quais o contrato de empreitada tem mais afinidades: o contrato de compra e venda (em especial, a compra e venda futura) ou o contrato de prestação remunerada (mas independente) de serviço indiferenciado. Em relação a este, a relevância da qualificação decorre principalmente da aplicação supletiva de um regime bem diferenciado do contrato de empreitada, embora também pertencente à categoria genérica dos contratos de prestação de serviço – o regime do contrato de mandato (artigo 1156º).

Em vários direitos, a lei ou a doutrina distinguem o (simples) serviço  e a obra consoante a prestação tenha como objecto a actividade em si mesma ou o seu resultado. O mesmo critério tem sido usado pela doutrina portuguesa, mas parece incompatível com o preceito legal segundo o qual a prestação de serviço consiste em proporcionar a outrem certo resultado do trabalho intelectual ou manual (artigo 1154º). Como, na lógica do Código Civil, a obra é uma espécie de serviço, a empreitada teria por objecto a realização do resultado...do resultado. Por isso, sendo a obra um resultado, há de ser um resultado com caracteres específicos em relação ao objecto de outros contratos de prestação de serviço”.

E, assim, conclui o mesmo autor: “na falta de definição legal e de um conceito jurídico estabilizado, dever-se-á recorrer à noção comum de obra, por um lado, e ao regime legal do contrato, por outro lado.

O resultado de uma actividade exercido no interesse de outrem só tem a natureza de uma obra se obedecer aos seguintes requisitos cumulativos:

1.º Se o resultado se materializar numa coisa concreta, susceptível de entrega de aceitação (cfr. artigo 1218º);

2.º Se o resultado for específico e discreto (isto é, separado em relação ao processo produtivo e em relação a outros resultados obtidos no interesse de quem realiza a actividade ou no interesse de outrem);

3.º Se o resultado houver de ser concebido em conformidade (cfr. artigo 1208º) com um projecto (encomenda, caderno de encargos ou plano, cfr. artigo 1214º) entregue ou aprovado pelo beneficiário [...].

Os dois primeiros permitem distinguir a obra de outros resultados de prestação de serviço. O terceiro requisito permite distinguir a empreitada da compra e venda”.

Subempreitada, por sua vez, é o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela[14].

Sem controvérsia, caracteriza-se como contrato de empreitada o acordo celebrado entre Autor e Ré, segundo o qual, mediante o preço convencionado, esta se obrigou perante aquele a construir e a montar no terraço da fracção do primeiro uma estrutura com as caraterísticas constantes do orçamento aceite pelo dono da obra.

Segundo o n.º 1 do artigo 406.º do Código Civil, que consagra o princípio pacta sunt servanda, traduzido no reconhecimento da força vinculativa dos contratos, tal como foram concluídos, em relação aos contratantes “o contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contratantes ou nos casos admitidos na lei”.

E de acordo com o artigo 762.º do Código Civil, “o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado”.

O cumprimento deve, pois, ter por objecto a coisa ou o facto sobre os quais versa a obrigação.

No contrato de empreitada, tendo como contrapartida o preço acordado, o empreiteiro obriga-se à realização da obra, que constitui a prestação principal a seu cargo. É o que resulta do artigo 1207.º do Código Civil.

Poder-se-á, assim, concluir que do contrato de empreitada derivam para o dono da obra e para o empreiteiro direitos e deveres recíprocos, com génese no mesmo pacto: para o primeiro, o direito de receber a obra nos termos convencionados – no prazo e de acordo com as condições técnicas ajustadas -, com a correspondente obrigação do pagamento do preço; para o segundo, a obrigação de executar a obra em conformidade com as condições acordadas com o primeiro e no prazo convencionado entre ambos, tendo, como contrapartida, direito a receber o preço acordado.

Deste modo, “…a obrigação do empreiteiro é uma obrigação de resultado, em que este assume a obrigação de realização de uma determinada obra, de acordo com o convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (art.º 1208.º do C.C.), não sendo responsável pela não obtenção deste resultado, quando esse fracasso é imputável a causas que não possa dominar[15].

Tal pressupõe que deva o empreiteiro realizar a obra sem defeitos, isto é, em conformidade com o que foi convencionado ou projectado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou contratualmente previsto[16].
A inexactidão do cumprimento tanto pode ser quantitativa (prestação parcial, a que se seguem os efeitos do não cumprimento em relação à parte da prestação não cumprida - mora ou incumprimento definitivo), como qualitativa (diversidade na prestação, deformidade, vício ou falta de qualidade da mesma; isto é, a inexecução da obrigação pode ocorrer não apenas quando o devedor nada faz para a executar, como ainda quando a realiza de forma deficitária ou mal executada[17].

Com efeito, no âmbito da inexecução do contrato, além da mora e do incumprimento definitivo, destaca-se também a execução defeituosa do contrato, ou cumprimento defeituoso do contrato, na designação acolhida pelo artigo 799.º, n.º 1 do Código Civil. Ou seja: o devedor executa materialmente a prestação, mas em desconformidade com o convencionado com a outra parte – “a prestação realizada pelo devedor não corresponde, pela falta de qualidades ou requisitos dela, ao objecto da obrigação a que ele estava adstrito”[18].

Poder-se-á, assim, considerar que ocorre cumprimento defeituoso da obrigação quando a prestação efectuada não tem requisitos idóneos a fazê-la coincidir com o conteúdo obrigacional tal como este resulta do contrato e do princípio geral da correcção e da boa fé, podendo o defeito ser quantitativo ou qualitativo[19].

O mesmo é dizer, “no cumprimento defeituoso, o devedor cumpre a obrigação que lhe estava imposta, mas não como lhe estava imposta, isto é, cumpre mas de forma defeituosa, com vícios ou deficiências[20].

Vícios são, no esclarecimento de João Cura Mariano[21], “anomalias objectivas da obra, traduzindo-se em estados patológicos desta, independentemente das características convencionadas”.

No que nos autos se discute, não tendo a Ré, nem no momento da adjudicação da obra, nem em momento posterior, levantado, perante o Autor, qualquer tipo de dificuldade na concretização da obra, nem colocado qualquer outro entrave para a execução dos trabalhos, de ordem técnica ou outra, da responsabilidade do Autor ou de terceiros, não tendo alguma vez interpelado aquele no sentido de assumir algum tipo de risco ou responsabilidade pelas opções construtivas adoptadas em obra, deu por concluídos os trabalhos no dia 30.08.2021, data em que foram retirados os apoios que seguravam a estrutura enquanto a mesma secava e solidificava.

Porém, volvido pouco mais de um mês sobre a data da conclusão da obra, mais propriamente na madrugada do dia 02.10.2021 para o dia 03.10.2021, a guarda em vidro construída e montada  por BB – “B...”, empresa individual contratada pela Ré para executar os serviços ajustados com o Autor, viria a ceder ao seu próprio peso e à força do vento, tendo alguns dos vidros que a compunham, numa extensão de cerca de 7 metros, sofrido um tombamento de cerca de 25 graus, deixando de se encontrar na posição vertical.

E, cerca de um mês após este evento, na madrugada do dia 01.11.2021 para o dia 02.11.2021, mantendo-se a estrutura no exacto estado em que ficara aquando da intervenção mencionada no ponto 23.º dos factos provados, a referida estrutura viria a colapsar uma vez mais, cedendo pela segunda vez ao seu próprio peso e à força do vento.

Desta segunda vez, deu-se a fragmentação de diversas partes da estrutura, incluindo alguns vidros e partes de suporte, bem assim como de partes integrantes do murete/platibanda e pavimento do terraço, acabando algumas “folhas” de vidro por tombar, ainda mais, para o lado de dentro do terraço, num ângulo de cerca de 180 graus, e outras desprenderam-se, caindo no chão e quebrando-se, o que causou risco iminente de queda de fragmentos da estrutura do 8.º andar, atingindo as pessoas e bens, designadamente veículos, que constantemente se encontram na entrada e envolvente do prédio.

Bem ao contrário do que sustenta a Ré para justificar estes eventos desastrosos, estes não se deveram a factos anormais e estranhos à execução da obra, designadamente a fenómeno atmosférico adverso, mas antes a más práticas técnicas utilizadas na execução da mesma. Como afirma a sentença recorrida, “Da factualidade provada, mormente no seu ponto 33, percebe-se que a R. (sempre, obviamente, por intermédio do subempreiteiro que livremente escolheu e contratou), se desviou flagrantemente das leges artis aplicáveis, cometendo erros palmares detectáveis por qualquer pessoa de são entendimento, mesmo que sem qualquer experiência ou conhecimento na matéria.

Erros esses que, no que temos como um desfecho previsível, levaram a que a uma estrutura feita para, além do mais, resguardar o terraço do vento, caísse parcialmente, menos de dois meses depois da sua montagem, apenas porque foi atingida por ventos de velocidade normal para a estação e altura do ano.

Efectivamente, as condições meteorológicas sentidas nos dias em questão estão inteiramente dentro de um padrão de normalidade.

Lendo o site do IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera), aprende-se que este instituto classifica os ventos, de acordo com a respectiva intensidade, da seguinte forma: “a) Vento fraco < 8 nós < 15 km/h; b) Vento moderado 8 a 19 nós 15 a 35 km/h; c) Vento forte 20 a 30 nós 36 a 55 km/h; d) Vento muito forte 31 a 42 nós 56 a 75 km/h; e) Vento excep. forte > 42 nós > 75 km/h”[...].

A partir de 70 Km/h (ou 90 Km/h nas terras altas) é emitido um alerta amarelo, o menos grave dos três tipos existentes (amarelo, laranja, vermelho), por se considerar existir “Situação de risco para determinadas atividades dependentes da situação meteorológica.”[...].

Fizeram-se sentir, portanto, ventos fracos a moderados, cuja intensidade máxima instantânea não foi além do que se qualifica de vento forte, não dando origem, sequer, à emissão do “alerta amarelo”.

Consequentemente, podemos falar de um cumprimento defeituoso da banda do R. (que acontece quando a prestação é efectuada, mas sofre de vícios, defeitos ou irregularidades”.

Os artigos 1221.º a 1225.º do Código Civil preveem e regulam vários direitos reconhecidos ao dono da obra em reacção a um cumprimento defeituoso da prestação a cargo do empreiteiro.

Existindo defeitos que afectem a obra, traduzem-se esses direitos/deveres, a incidirem, respectivamente, na esfera jurídica do dono da obra e na do empreiteiro, na eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização.

Os mesmos não podem, todavia, ser exercidos de uma forma aleatória ou discricionária, antes tendo de se subordinar à ordem estabelecida nos preceitos legais referidos, podendo, embora, a indemnização cumular-se com os demais.

Ou seja: apresentando a obra vícios que a afectem, o dono da obra poderá exigir do empreiteiro a reparação dos defeitos, ou a realização de uma obra nova no caso de não ser possível eliminá-los, e caso não seja possível uma ou outra solução, ou recusando-as o empreiteiro, poderá, sequencialmente, obter a redução do preço ou a resolução do contrato.

Esclarece, a propósito, o acórdão da Relação do Porto de 26.06.2012[22] que “…tal como é jurisprudência pacífica, a lei concede ao dono da obra, cinco meios jurídicos de actuação, no sentido de por cobro aos aludidos defeitos, que a R., na qualidade de empreiteira, tem a obrigação de eliminar, e que se enquadram nos seguintes grupos, segundo um esquema de prioridade ou precedência de direitos:

A)- O de exigir a reparação das deficiências, se puderem ser eliminadas, ou a realização de obra nova, salvo se as respectivas despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito a obter - artigo 1221, n.ºs 1 e 2 do C. Civil - , com carácter precípuo sobre os demais, como melhor forma de alcançar a reconstituição natural, consagrada pelos artigos 562º e 566º, do C. Civil;

B)- O de pedir a redução do preço ou a resolução do contrato, se não forem eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, e aqueles a tornarem inadequada aos fins a que se destina – artigo 1222º, n.º1 do C. Civil;

C)- O de requerer uma indemnização, nos termos gerais dos artigos 562º e seguintes – artigo 1223º do C. Civil.

No entanto, os direitos supra enunciados, que a lei coloca ao dispor do dono da obra, com vista a obter do empreiteiro a eliminação dos defeitos, não podem ser exercidos arbitrariamente, mas sim sucessivamente e pela ordem supra indicada. De onde decorre que, no nosso direito, o cumprimento defeituoso pelo empreiteiro não confere ao dono da obra o direito de, per si ou por intermédio de terceiro, eliminar os defeitos ou reconstruir a obra à custa daquele. Tal como se escreve no Acórdão do STJ, de 04.12.2007, Proc. 06B4505, in www.dgsi.pt, “o dono da obra não pode por si proceder à reparação, sem dar primeiro ao empreiteiro o conhecimento dos defeitos e a oportunidade de os eliminar”. Mesmo após a condenação do empreiteiro, se este não eliminar os defeitos ou executar a obra nova no prazo que lhe foi fixado, o dono da obra não pode executá-la directamente. Tem de recorrer ao tribunal para a sua execução (art. 828º do C. Civil; Pires de Lima e Antunes Varela em anotação ao artigo 1221.º, in "Código Civil Anotado", vol. II). Só assim não será nos casos de manifesta urgência em que, para evitar maiores danos, é admissível que o dono da obra, por si ou por terceiro, proceda à eliminação dos defeitos, exigindo o reembolso das respectivas despesas - neste sentido, cfr. Pedro Romano Martinez, obra citada, pág. 389; Ac. do STJ, de 04.12.2007, supra citado, e Ac. desta Relação de 22.1.1996, in CJ, ano XXI, tomo I, pág. 202). Ou ainda na hipótese de se verificar um incumprimento definitivo daquelas obrigações, imputável ao empreiteiro - neste sentido cfr. J. Cura Mariano, in "Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra", 3.ª ed., pág. 147 e ss.”.

O empreiteiro responde por todos os defeitos relativos à execução dos trabalhos ou à qualidade, forma e características dos materiais utilizados, quer quando o contrato não fixe as regras de execução, quer quando as efectivamente usadas não correspondam às aprovadas, incumbindo ao dono da obra a prova da existência dos mesmos.

Não basta, porém, a prova do defeito, exigindo-se igualmente a demonstração da sua gravidade, de modo que esta afecte ou comprometa o uso da obra objecto do contrato ou diminua significativamente o seu valor.

Além disso, para que se possa fazer valer qualquer direito em virtude da verificação de defeitos, o dono da obra tem que provar a precedência de denúncia dos mesmos ao empreiteiro.

Note-se que “a possibilidade de ser exigida ao empreiteiro a eliminação dos defeitos satisfaz não só o interesse do dono da obra em ver a prestação a que tem direito fielmente cumprida, mas também o interesse do empreiteiro em ser ele a efectuar essa obra de reparação, permitindo-lhe o controlo dos seu, s custos e evitar o agravamento dos prejuízos causados pelo defeito[23].

Porém, tratando-se de empreitada de consumo haverá que atender não apenas ao regime consagrado no Código Civil, designadamente nos citados artigos 1221.º a 1225.º, mas ainda ao específico regime do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril, aplicável à situação debatida nos autos, o qual, nos termos do seu artigo 1.º-A, se aplica “aos contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores” e ainda, “com as necessárias adaptações, aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada ou de outra prestação de serviços, bem como à locação de bens de consumo”, sendo o conceito de consumidor definido na alínea a) do artigo 1.º-B: “aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho”.

Considerando o âmbito de aplicação do mencionado diploma e as definições legais nele previstas no seu artigo 1.º-B, o contrato celebrado entre Autor, pessoa singular, e a Ré, sociedade comercial, tendo por objecto fabrico e montagem de uma estrutura ou guarda em vidro no terraço da casa de habitação do primeiro constitui contrato de empreitada de consumo, como acertadamente o caracterizou a sentença recorrida.

Dela se pode retirar: “Nas empreitadas de consumo a responsabilidade do empreiteiro pela falta de conformidade da obra realizada é objectiva, dispensando-se a existência de um nexo de imputação das faltas de conformidade a um comportamento censurável daquele.

A redacção do artigo 3.º, n.º 1, do DL 67/2003, ao dizer que o empreiteiro “responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue”, revela que lhe é indiferente que essa falta seja ou não imputável ao empreiteiro[...].

Mesmo nos casos em que o defeito tem origem no projecto, previsões, estudos ou materiais relativos à obra a executar, fornecidos pelo dono da obra, ou em instruções dadas por este ou por pessoas por si mandatadas para o efeito, “a responsabilidade do empreiteiro só se deverá considerar excluída quando o erro de concepção não for detectável por um profissional de competência suficiente (o bom profissional) na realização daquele tipo de obras (…)[...].

Em simultâneo, presume-se que as faltas de conformidade já existiam no momento em que a obra foi entregue ao seu dono – art. 3º, nº 2, do mesmo DL nº 67/2003.

Sem prejuízo, não existe margem para dúvidas quanto ao estabelecimento do aludido nexo causal, sendo os factos apurados demonstrativos de negligência grave e falta de preparação técnica da parte da R. ou, mais propriamente, do subempreiteiro a quem incumbiu a realização da obra”.

Sob a epígrafe “Direitos do Consumidor”, dispunha o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, em vigor à data da celebração do contrato aqui em discussão:

“1 - Em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato.

2 - Tratando-se de um bem imóvel, a reparação ou a substituição devem ser realizadas dentro de um prazo razoável, tendo em conta a natureza do defeito, e tratando-se de um bem móvel, num prazo máximo de 30 dias, em ambos os casos sem grave inconveniente para o consumidor.

3 - A expressão «sem encargos», utilizada no n.º 1, reporta-se às despesas necessárias para repor o bem em conformidade com o contrato, incluindo, designadamente, as despesas de transporte, de mão-de-obra e material.

4 - Os direitos de resolução do contrato e de redução do preço podem ser exercidos mesmo que a coisa tenha perecido ou se tenha deteriorado por motivo não imputável ao comprador.

5 - O consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais.

6 – [...].

Tendo, no caso em apreço, optado o Autor pela resolução do contrato, importa indagar se o exercício desse direito se configura abusivo.

Segundo o artigo 334.º do Código Civil, “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.

Para Pires de Lima e Antunes Varela[24], o referido normativo adoptou a concepção objectiva de abuso de direito, não sendo necessária a consciência de se atingir, com o seu exercício, a boa fé, os bons costumes ou o fim social ou económico do direito conferido, bastando que se excedam esses limites.

O normativo em causa traduz, assim, a ideia de que não basta ser titular de um direito para, sem limites, o mesmo poder ser exercido. O exercício de qualquer direito está sujeito a limitações e restrições.

Para Cunha e Sá[25] o abuso de direito constitui um fenómeno revelador de que o direito subjectivo não pode ser abstractamente encarado em termos meramente conceitualistas, pois que em certa e determinada situação, experimentalmente concreta, podemos descobrir concordância com a estrutura formal de um dado direito subjectivo e, simultaneamente, discordância, desvio, oposição, ao próprio valor jurídico que daquele comportamento faz um direito subjectivo, concluindo que “neste encobrir, consciente ou inconscientemente, a violação do fundamento axiológico de certo direito com o preenchimento da estrutura formal do mesmo direito é que reside o cerne, a essência do abuso de direito”.

Defende, a propósito, Castanheira Neves[26], que o abuso de direito é um limite normativamente imanente ou interno dos direitos subjectivos, pelo que no comportamento abusivo são os próprios limites normativos-jurídicos do direito particular que são ultrapassados.

Assim, uma das restrições ao exercício de direitos subjectivos é justamente imposta pela necessidade de salvaguarda da boa fé da parte contrária, estando vedado o exercício do direito cujo titular exceda manifestamente os limites da boa fé.

À partida legítimo, se exercido de forma que ofenda manifestamente a boa fé, os bons costumes ou o seu fim social ou económico, o mesmo é dizer, o sentimento jurídico socialmente dominante, o direito torna-se ilegítimo, implicando tal ilegitimidade a paralisação dos respectivos efeitos, tudo se passando como se não existisse na esfera patrimonial do titular, sobrando apenas a sua aparência.   

Pode entender-se, juridicamente, por exercício abusivo do direito “um comportamento que tenha a aparência de licitude jurídica --- por não contrariar a estrutura formal-definidora (legal ou conceitualmente) de um direito, à qual mesmo externamente corresponde --- e, no entanto, viole ou não cumpra, no seu sentido concreto-materialmente realizado, a intenção normativa que materialmente fundamenta e constitui o direito invocado, ou de que o comportamento realizado se diz exercício[27].

A parte que abusa do direito actua a coberto de um poder legal, formal, visando resultados que, clamorosamente, violam os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes, ou pelo fim económico ou social do direito.

Perante o circunstancialismo fáctico registado nos autos, não se concebe como abusivo o direito de resolução do contrato, pelo qual o Autor optou.

Como destaca a sentença aqui em sindicância, “Entre os dias 3/10 e 2/11/2021, o A. aceitou uma reparação provisória e consentiu na solução técnica proposta pela R.

A primeira revelou-se, contudo, mais uma prova da negligência do subempreiteiro, na medida em que, confrontado com o vício existente, foi incapaz de proporcionar sequer uma solução temporária que impedisse novo colapso da estrutura, o que veio a ocorrer no referido dia 2/11.

Perante este quadro de considerável gravidade, que acarretou risco para terceiros e para o próprio A., que podia, nomeadamente, ser chamado a ressarcir terceiros que fossem atingidos por fragmentos da “guarda de vidro”, não nos parece que o exercício do direito de resolução seja impossível ou configure abuso de direito, por exceder os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito (artigo 334.º).

Pelo contrário, compreende-se e aceita-se, perante a reiterada incapacidade da R. de tornar a estrutura resistente às condições climatéricas, que o A. tenha objectivamente perdido o interesse no integral cumprimento da prestação a cargo da R., sendo, portanto, de considerar que o contrato foi definitivamente incumprido (artigo 808.º, n.º 1 e 2, do CC) e se resolveu, através da declaração receptícia emitida pelo A. (carta), oportunamente recebida pelo R.”.

A reiterada incapacidade da Ré, através da empresa por ela escolhida para a execução da obra contratada com o Autor, para proceder à sua realização em conformidade com os fins a que a mesma se destinava, sem por em causa a segurança física do Autor e de terceiros, ou de bens materiais de qualquer um deles, e de prover à reparação, ainda que provisória, das anomalias manifestadas decorrido pouco mais de um mês sobre a data da conclusão dos trabalhos, levando a um agravamento intolerável dessas anomalias, justificam plenamente as dúvidas que possam ter acometido o Autor quanto à efectiva competência técnica da empresa subcontratada pela Ré para corrigir os defeitos da estrutura que colocara ou na construção de uma outra que não viesse a revelar outras ou idênticas patologias.

O artigo 432.°, n.º 1 do Código Civil admite a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção, operando mediante declaração duma parte à outra, nos termos do artigo  436.° do mesmo Código.

A revogação pode ser unilateral, quando é reconhecida a uma das partes a faculdade de dar sem efeito o contrato, ou bilateral, quando a extinção do contrato se dá por mútuo consentimento dos contraentes.

A resolução consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado[28].

O direito de resolução é um direito potestativo extintivo, que depende de um fundamento: exige a verificação de um facto que crie esse direito, isto é, tem de ocorrer um facto ou situação – no caso, o incumprimento ou inadimplência - a que a lei atribua como consequência o desencadeamento desse direito potestativo[29].

Alega a recorrente que “...tendo a resolução os mesmos efeitos da nulidade deve ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente, pelo que a sentença recorrida ao reconhecer que a resolução do A. é valida terá que impor que o mesmo restitua à Ré a estrutura de vidro existente na sua fração ou caso tal não seja possivel o valor correspondente”.

Embora o Decreto-Lei n.º 67/2003, não contenha norma semelhante ao artigo 20.º, n.º 4, alínea a) do Decreto-Lei n.º 84/2001, de 17 de Outubro, segundo o qual “o exercício do direito de resolução do contrato no seu conjunto ou, nos termos do número anterior, em relação a alguns dos bens determina a obrigação de o consumidor devolver os bens ao profissional, a expensas destes”, os efeitos jurídicos decorrentes da resolução do contrato, nos termos regulados genericamente nos artigos 432.º a 436.º do Código Civil, permitem alcançar idêntico resultado, pelo que, proferida decisão que considere válida e operante a resolução do contrato de empreitada “com todas as consequências legais daí advenientes”, como consta da alínea a) do dispositivo da sentença impugnada, não tem que condenar expressamente o Autor a restituir o “salvado”, já que cada uma das partes está reciprocamente obrigada a restituir o que recebeu da outra por virtude da resolução do contrato entre elas celebrado.

O Autor, de resto, não contraria esse dever de devolução, argumentando já haver interpelado a Ré para proceder ao levantamento da estrutura em vidro, reafirmando, em sede de contra-alegações, a sua disponibilidade para que tal devolução se concretize.

Improcede, assim, totalmente o recurso da apelante “A..., Lda.”

IV. 2. Do recurso subordinado do apelado AA.

Pedindo o Autor que fosse “a Ré condenada a restituir ao Autor a quantia global de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) correspondente aos danos de privação de uso sofridos pelo Autor, provocados pelo incumprimento contratual por parte da Ré” foi tal pedido julgado improcedente.

Refere, a propósito de tal pedido, a sentença recorrida: “Quanto ao denominado dano da privação do uso, resultou não provado que o A. tenha ficado privado da utilização do terraço no período em referência, pelo que, sem necessidade de mais considerações teóricas a respeito do aludido dano da privação do uso, que se afiguram despiciendas, este pedido deve improceder”.

A privação do uso de um bem poderá constituir uma ofensa ao direito de propriedade do respectivo titular, na medida em que o seu dono fica privado do uso que lhe dava. Ela é, em si mesma, um dano indemnizável, desde logo por impedir o proprietário (ou, eventualmente, o titular de outro direito, diferente do direito de propriedade, mas que confira a sua utilização) de exercer os poderes correspondentes ao seu direito[30].

Esta posição jurisprudencial traduz-se numa das duas correntes que vêm sendo seguidas nos tribunais, incluindo no Supremo Tribunal de Justiça, a que não tem sido alheia a influência de certa doutrina, designadamente a que foi desenvolvida por Abrantes Geraldes[31], para a privação do uso de um veículo, assim sintetizada:

Em vista do disposto nos artigos 562.º a 564.º e 566.º do Código Civil, da imobilização de um veículo em consequência de acidente pode resultar:

a) Um dano emergente - a utilização mais onerosa de um transporte alternativo como seria o aluguer de outro veículo;

b) Um lucro cessante - a perda de rendimento que o veículo dava com o seu destino a uma atividade lucrativa;

c) Um dano advindo da mera privação do uso do veículo que impossibilita o seu proprietário de dele livremente dispor com o conteúdo definido no artigo 1305.º do Código Civil, fruindo-o e aproveitando-o como bem entender[32].

De acordo com este último entendimento, o dano resultante da simples privação do uso do veículo é susceptível de indemnização, a fixar com recurso à equidade.

Revemo-nos no entendimento perfilhado, entre outros, pelo acórdão da Relação de Coimbra de 8.04.2014[33], adoptando idêntica orientação: “Estamos, pois, com aqueles que, partindo do princípio de que a privação do uso de uma coisa pode constituir um ilícito gerador da obri­gação de indemnizar - uma vez que impede o seu dono do exercício dos direitos inerentes à propriedade, isto é, de usar, fruir e dispor do bem nos termos genericamente consentidos pelo art.º 1305º -, consideram, no entanto, que a privação do uso é condição necessária, mas não suficiente, da existência de um dano correspondente a essa realidade de facto, porquanto “podem ...configurar-se situações da vida real em que o titular da coisa não tenha interesse algum em usá-la, não pretenda dela retirar as utilidades que aquele bem normalmente lhe podia proporcionar (o que até constitui uma faculdade inerente ao direito de propriedade), ou pura e simplesmente não usa a coisa; (…) quando a privação do uso recaia sobre um veículo automóvel danificado num acidente de viação, bastará que resulte dos autos que o seu proprietário o usaria normalmente (o que na generalidade das situações concretas constituirá facto notório ou poderá resultar de presunções naturais a retirar da factualidade provada) para que possa exigir-se do lesante uma indemnização a esse título, sem necessidade de provar directa e concretamente prejuízos efectivos, como, por exemplo, que deixou de fazer esta ou aquela viagem de negócios ou de lazer, que teve de utilizar outros meios de transporte (táxi, transportes públicos, automóvel alugado, etc.) com o custo correspondente; (…) se puder ter-se por provado que o proprietário lesado utilizava na sua vida corrente e normal o veículo sinistrado, ficando privado desse uso ordinário em consequência dos danos sofridos pela viatura no acidente, provado está o prejuízo indemnizável durante o período de privação, ou, tratando-se de inutilização total, enquanto não for indemnizado da sua perda nos termos gerais. É neste contexto que dizemos que a privação do uso, constitui, por si, um prejuízo indemnizável”.[...]

Assim, para efeito de atribuição de indemnização pela privação do uso não será de exigir a prova de danos efectivos e concretos, mas a ressarcibilidade também não pode ser apreciada e resolvida em abstracto, aferida pela mera impossibilidade objectiva de utilização da coisa (independentemente de que a utilização tenha ou não lugar durante o período de privação), emergindo como critério de atribuição do direito à indemnização a demonstração no processo que, não fora a privação, o lesado usaria normalmente a coisa, vendo frustrado esse propósito; se a privação do uso do bem durante um determinado período origina a perda das utilidades que o mesmo era susceptível de proporcionar e se tal perda não pode ser reparada mediante a forma natural de reconstituição, impõe-se que o responsável compense o lesado na medida equivalente.[...]

Como esclarece o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.05.2011[34], “a avaliação do dano em causa, se outro critério não puder ser adoptado, será determinada pela equidade, dentro dos limites do que for provado, nos termos estabelecidos no artigo 566º, nº 3, do CC”.

No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5.7.2007, citando o Prof. Gomes da Silva, lê-se: “o bem só interessa, quer económica quer juridicamente (...) pela utilidade, isto é, pela aptidão para realizar fins humanos”; e nos casos de perda ou deterioração de um bem, o dano consiste “no malogro dos fins realizáveis por meio do bem perdido ou deteriorado, isto é, consiste menos na perda do próprio bem do que em ser-se privado da utilidade que ele proporcionava”. No dano haverá sempre, portanto, a frustração de um ou mais fins, resultante de se haver colocado o bem, por meio do qual era possível atingi-los, em situação de não poder ser utilizado para esse efeito.

Para Abrantes Geraldes[35]não custa a compreender que a simples privação do uso seja uma causa adequada de uma modificação negativa na relação entre o lesado e o seu património que possa servir de base à determinação da indemnização”.

No seu acórdão de 8.05.2013[36], o Supremo Tribunal de Justiça mostra-se alinhado com tal posição ao sustentar: “Entende-se que a privação do uso de um veículo é, em si mesma, um dano indemnizável, desde logo por impedir o proprietário (ou, eventualmente, o titular de outro direito, diferente do direito de propriedade, mas que confira o direito a utilizá-lo) de exercer os poderes correspondentes ao seu direito (assim, por exemplo, os acórdãos deste Supremo Tribunal de 5 de Julho de 2007, www.dgsi.pt, proc, nº 07B1849, ou de 10 de Setembro de 2009, já citado); e que o cálculo da correspondente indemnização, tal como se decidiu no acórdão recorrido, há-de ser efectuado com base na equidade, por não ser possível avaliar “o valor exacto dos danos” (nº 3 do artigo 566º do Código Civil)”.

A determinação do valor do dano haverá de corresponder ao efectivo prejuízo sofrido pelo lesado em consequência da privação do bem que lhe pertence; não podendo ser quantificado esse prejuízo, a sua reparação far-se-á com recurso a critérios de equidade, assim se ressarcindo o proprietário das desvantagens de não poder exercer, por virtude da privação a que está sujeito, as prerrogativas próprias do direito de propriedade de que é titular sobre o bem em causa.

Condição essencial para a configuração deste tipo de dano consiste na privação do uso de uma coisa que antes era usada pelo respectivo titular ou detentor e que, por acção ou omissão de terceiro, ficou impossibilitado de usar como até ali o fazia ou podia fazer.

Cabe ao lesado a prova da ofensa do direito de que, a esse título, se arroga titular, incumbindo-lhe, assim, a demonstração da privação do uso da coisa.

No caso em apreço, não logrou o Autor comprovar aquele facto lesivo.

Com efeito, tal como consta da alínea o) dos factos não provados – que não foi objecto de impugnação recursiva -, não resulta provado que “O Autor ficou privado de usufruir do seu terraço desde o dia 3 de outubro de 2021 até a data de hoje.”

Teria, naturalmente, de improceder, como improcedeu, tal pedido.

Pediu ainda o Autor que fosse a Ré “condenada a restituir o Autor da quantia global de € 1.452,63 (mil quatrocentos e cinquenta e dois euros e sessenta e três cêntimos), correspondente às despesas suportadas por este na sequência do incumprimento contratual por parte da Ré”.

Também esta pretensão sucumbiu, tendo sido julgada improcedente pelo tribunal a quo, a propósito do mesmo, referiu, entre o mais: “No que concerne o valor dos relatórios solicitados pelo A. e que se mostram juntos sob docs. 9 e 10 com a p.i., não temos por verificado o nexo causal entre a conduta da R. e este dano.

Os relatórios foram solicitados por opção do A., mas nada implicava que assim tivesse de ser”.

Não existe, com efeito, qualquer nexo de causalidade, directo ou indirecto, entre as despesas cujo reembolso é reclamado pelo Autor e a actuação incumpridora da Ré quanto ao contrato celebrado entre ambos.

O Autor, por sua iniciativa, solicitou vistoria técnica, com elaboração dos respectivos relatórios, com o intuito de comprovar realidade factual que não estava impedido ou impossibilitado de atestar por outros meios probatórios. Cabe-lhe, por isso, suportar os respectivos custos.

Finalmente, agora em sede de alegações de recurso, reclama o Autor a condenação, em multa e indemnização a seu favor, por litigância de má fé da Ré.

De acordo com o n.º 1 do artigo 542.º do Código de Processo Civil, “tendo litigado de má fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir”.

Por sua vez, o n.º 2 do mesmo dispositivo legal delimita o conceito de litigante de má fé nos seguintes termos: “diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:

a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;

b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;

c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;

d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.
Os pressupostos da litigância de má fé encontram-se, assim, regulados no artigo 542.º do Código de Processo Civil, podendo distinguir-se aqueles que têm natureza subjectiva daqueles que têm natureza objectiva. Há litigância de má fé quando estão simultaneamente reunidos pressupostos das duas mencionadas naturezas.
Relativamente aos pressupostos subjectivos da litigância de má fé, exigiam tradicionalmente a actuação dolosa de uma das partes para o seu preenchimento e para justificar a condenação a esse título.
Depois de 1 de Janeiro de 1997 - e como corolário da maior relevância atribuída aos deveres de cooperação aquando das alterações introduzidas pela Reforma de 1995/1996 - os pressupostos subjectivos da litigância de má fé alargaram-se, passando a abarcar também a actuação a título de negligência grosseira.
Como se afirma no Acórdão da Relação do Porto de 15.12.2010[37], “o regime instituído após a última reforma do direito processual civil traduz uma substancial ampliação do dever de boa fé processual, alargando-se o tipo de comportamentos que podem integrar má fé processual, quer substancial, quer instrumental, tanto na vertente subjectiva como na objectiva. A condenação por litigância de má fé pode fundar-se, além de, numa situação de dolo, em erro grosseiro ou culpa grave”.
Quanto aos pressupostos objectivos da condenação por litigância de má fé, é de distinguir a má fé substancial da má fé instrumental: existe má fé substancial se "o litigante usa de dolo ou má fé para obter decisão de mérito que não corresponde à verdade e à justiça" e má fé instrumental se "a parte procura sobretudo cansar e moer o seu adversário, ou somente pelo espírito de fazer mal, ou na expectativa condenável de o desmoralizar, de o enfraquecer, de o levar a uma transacção injusta"[38].
Como elucidam Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto[39], “é corrente distinguir má fé material (ou substancial) e má fé instrumental. A primeira relaciona-se com o mérito da causa: a parte, não tendo razão, actua no sentido de conseguir uma decisão injusta ou realizar um objectivo que se afasta da função processual. A segunda abstrai da razão que a parte possa ter quanto ao mérito da causa, qualificando o comportamento processualmente assumido em si mesmo”.
A litigância de má fé pode levar à aplicação de duas sanções: a multa e a indemnização.
Dará lugar à aplicação de uma multa processual, que pode ser decidida oficiosamente ou a requerimento da contraparte.
Tal multa deve ser fixada pelo juiz, ponderando, designadamente, os efeitos sancionatórios por ela prosseguidos em função da violação da lei na regular tramitação do processo, a situação económica do sujeito passivo e as repercussões da sanção no seu património.
Por outro lado, a litigância de má fé pode também conduzir à condenação no pagamento de uma indemnização.
A indemnização atribuída pode assumir duas modalidades distintas.
Numa primeira modalidade, usualmente designada por indemnização simples, quem for condenado como litigante de má fé deverá liquidar à contraparte o valor das despesas originadas pela litigância de má fé, incluindo os honorários dos advogados e dos técnicos; e
Numa segunda modalidade, normalmente designada por indemnização agravada, a indemnização deverá abarcar essas despesas e os demais prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência directa ou indirecta da má fé[40].
Tanto num caso como noutro só serão indemnizáveis as despesas e os prejuízos em que se tenha incorrido em virtude de um comportamento gravemente negligente ou doloso da contraparte.
O juiz deve optar entre as duas modalidades de indemnização referidas com base na gravidade da infracção perpetrada, sendo irrelevante nesta sede a condição económica do litigante de má fé.
Quando haja negligência grosseira, o juiz deve atribuir a indemnização simples e quando se demonstre que houve dolo, o juiz deve optar pela indemnização agravada[41].
Afirma o Autor que “É a Ré Recorrente a única que atua em manifesto abuso de direito, por se encontrar em completa negação da realidade e continuar a causar transtornos ao Autor Recorrido pela não finalização deste processo, mesmo apesar do artigo 8.º do CPC impor às partes o dever de agirem de boa-fé”.

O direito fundamental de acesso aos tribunais, incorporando o direito de acção, e o princípio da sua efectiva tutela judicial, é garantido constitucionalmente.

Dispõe, com efeito, o artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República que “a todos é assegurado o acesso ao Direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos”, determinando o seu n.º 5 que “para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos”.

Segundo Lebre de Freitas[42], o direito de acção exerce-se mediante a dedução de pretensões (ou pedidos, na terminologia legal), por meio das quais o autor (ou o réu reconvinte, ou ainda o terceiro interveniente principal activo ou oponente) se afirma titular dum direito ou outro interesse legítimo e, consequentemente, solicita uma providência processual para a respectiva tutela.

O direito de acção, como vertente fundamental do direito à jurisdição, é, pois, o direito de recorrer aos tribunais pedindo a tutela de um interesse protegido pelo direito material. Ao mesmo tempo que um ónus, no sentido decorrente do texto, a acção traduz um direito do particular (que se considera lesado e não pode agir por sua força): o de provocar a actividade dos tribunais para que, reconhecendo o seu direito, lhe conceda a tutela judiciária adequada.[43]

Tal direito não se confunde, todavia, com o direito que através dela se pretende acautelar. Aquele é necessariamente exercido sem averiguação prévia sobre existência do segundo. Uma coisa é o direito de poder provocar a atividade jurisdicional do Estado, para que este aprecie os direitos concretos ou incertos entre as partes, mediante uma decisão fundamentada, e outro é o direito substantivo que, por exemplo, o autor se arroga contra o réu e pretende que lhe seja reconhecido pelo tribunal. Direito este material, que pode existir ou não, no momento da propositura da acção. Nunca pode a demonstração da sua existência ser um requisito prévio para o exercício do direito de acção, sob pena de se cair num absurdo, pois que só quando o tribunal emite a sentença é que se pode saber se a pretensão do autor era ou não fundada, ou, correlativamente, se a defesa do réu era ou não conforme o Direito[44].

Decorre deste entendimento que sendo o direito de acção, com tutela constitucional, inerente ao Estado de direito e um veículo para a discussão do direito subjectivo, o facto de se vir a constatar na acção que o direito subjectivo que, através dela se pretendia acautelar ou ver reconhecido, afinal não existe, não deve conduzir necessariamente à conclusão que o direito de acção foi indevida ou incorrectamente exercido. O exercício do direito de acção não está dependente de qualquer requisito prévio de demonstração da existência do direito substancial. Exigir isso, seria fechar a porta a todos os interessados: aos que não têm razão e aos que têm.[45]

Tal não significa, porém, que não ocorram situações excepcionais em que o exercício do direito de acção se processe de forma ilícita ou abusiva.

Prevendo a possibilidade desse direito ser exercido contra a lei, a doutrina e a jurisprudência mais recentes têm agrupado tais situações sob duas perspectivas essenciais:

a) O exercício abusivo dentro dos contornos da cláusula geral do abuso de direito previsto no artigo 334.º do Código Civil): é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito - de que a litigância de má fé é um afloramento; e

b) Responsabilidade civil nos termos gerais, no âmbito da denominada culpa in agendo, pressupondo que a atuação processual ilícita sancionada tenha efeitos que transcendam os autos em que o problema se coloque, destacando-se a culpa por danos patrimoniais prolongados (de que é exemplo o artigo 374º, n.º 1), por danos morais e por actuações processuais complexas ou com intervenção de terceiros.

O exercício do direito de acção, em concreto, deve obedecer a uma exigência de ordem moral: é necessário que o litigante esteja de boa fé ou admita ter razão. Se litiga com má fé, exerce uma actividade ilícita e, como tal, incorre em responsabilidade civil processual subjectiva com base na culpa - artigo 542° do Código de Processo Civil -, por um exercício abusivo do direito de acção ou de defesa.

A litigância de má fé não constitui uma expressão de responsabilidade civil, visando a reparação de danos, ilícita e culposamente causados a terceiros através de certas actuações processuais, tratando-se antes de um mecanismo sancionatório específico, de âmbito limitado, visando assegurar o uso regular e leal dos mecanismos processuais postos ao dispor dos que pretendam exercer o direito de acção que a lei a todos garante.

A litigância de má fé visa punir a instrumentalização do direito processual em diversas vertentes, quando os litigantes pretendam alcançar um objectivo considerado ilegítimo pelo direito substantivo, quando a sua actuação constitua um meio de impedir a descoberta da verdade, como forma de obstruir a actividade da máquina judiciária, com a colocação de obstáculos ou com a promoção de expedientes meramente dilatórios, ou com o objectivo de impedir o trânsito em julgado da decisão e, deste modo, prejudicar a parte contrária na tutela ou na realização do direito substantivo que através da decisão lhe seja reconhecido.[46]

A responsabilidade pela conduta processual deve sempre ser objecto de análise casuística, ponderando-se o princípio da culpa na actuação dos litigantes, não podendo essa ponderação obedecer a critérios rígidos e puramente formais, sob pena de com isso criar nos interessados temor no recurso aos tribunais para fazerem valer os direitos de que se julgam titulares, sem esquecer que a incerteza da lei, a dificuldade de apurar os factos e de os interpretar, podem até levar consciências honestas a afirmarem um direito de que não são titulares ou a impugnar uma obrigação que devessem cumprir.[47]

Como esclarece Pedro Albuquerque[48], “a proibição de litigância de má fé apresenta-se, assim, como um instituto destinado a assegurar a moralidade e eficácia processual, porquanto com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça. O dolo ou má fé processual não vicia vontades privadas nem ofende meramente interesses particulares das partes envolvidas. Também não se circunscreve a uma violação sem mais do dever geral de actuar de boa fé. A virtualidade específica da má fé processual é outra diversa e mais grave: a de transformar a irregularidade processual em erro ou irregularidade judicial”. 

Uma lide temerária e a ousadia de uma construção jurídica manifestamente errada não revelam, por si só, que o seu autor delas se serviu como simples cortina de fumo da inanidade da sua posição processual. Aconselha-se, por isso, o uso de critérios de prudência na avaliação do juízo sobre a má fé processual, apenas devendo ser sancionada a actuação processual da parte, como litigante de má fé, quando, em concreto, surja com clamorosa evidência a natureza dolosa ou gravemente negligente dessa actuação, pois como refere o acórdão desta Relação de 7.6.2011[49], “não obstante as alterações introduzidas ao art.º 456° do Código de Processo Civil pelo Decreto-Lei n° 180/96, de 25/09, que visaram alargar o conceito de litigância de má fé e o âmbito da sua aplicação, sobretudo como reflexo do princípio da cooperação e dos inerentes deveres impostos às partes (art.º 266° do C. P. Civil[50]) permanece válido o entendimento de que a condenação por litigância de má fé tem por pressuposto uma actuação consciente das partes contrárias à verdade material e/ou obstrutiva da realização da justiça”.

No caso aqui em debate, a Ré impugnou recursivamente uma decisão que lhe foi desfavorável exercendo, sem abuso, um direito que a lei fundamental expressamente lhe reconhece.

Não se mostram preenchidos os pressupostos da litigância de má fé, que, de resto, o Autor se abstém de concretizar.

Não existe, assim, fundamento para a pretendida condenação da Ré por litigância de má fé.

Improcede, consequentemente, o recurso subordinado do apelado Autor.


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Síntese conclusiva:

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Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação, em julgar improcedente, de facto e de direito, o recurso interposto pela Ré “A..., Lda.”, e igualmente o recurso subordinado interposto pelo Autor AA, confirmando, em consequência, a sentença recorrida.

Custas: por cada um dos apelantes, nos termos do disposto no artigo 527,º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

Porto, 4.04.2024
Acórdão processado informaticamente e revisto pela primeira signatária.
Judite Pires
Ana Luísa Loureiro
Carlos Portela
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[1] Cujo teor é o seguinte: “Pese embora não se encontre individualizada enquanto tal, afigura-se que a R., ao afirmar que o A. recusou a reparação dos defeitos e o acesso ao local, se defende através da invocação de excepção peremptória (são factos eventualmente impeditivos do direito do A. à resolução do contrato – artigo 576.º, n.º 1 e 3 do CPC), pelo que, para melhor se prover quanto à ulterior tramitação do processo, designadamente no que tange à necessidade de convocar audiência prévia, concede-se ao A., neste momento, a possibilidade de exercer o contraditório, em 10 (dez) dias – artigo 3.º, n.º 3 e 547.º, ambos do CPC.”
[2] Cf. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. V, pág. 137.
[3] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., pág. 686.
[4] Artigo 608.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
[5] Processo n.º 5392/22.8T8MTS.P1, www.dgsi.pt.
[6] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[7] Artigos 396º do C.C. e 607º, nº5 do Novo Código de Processo Civil.
[8] Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, 1997, pág. 258. Cfr. ainda, o Acórdão Relação de Coimbra de 11.03.2003, C.J., Ano XXVIII, T.V., pág. 63 e o Ac. do STJ de 20.09.2005, proferido no processo 05A2007, www.dgsi.pt, podendo extrair-se deste último: “De salientar a este propósito, como se faz no acórdão recorrido, que o controlo de facto em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Na verdade, a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im) parcialidade, serenidade, "olhares de súplica" para alguns dos presentes, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos (sobre a comunicação interpessoal, RICCI BOTTI/BRUNA ZANI, A Comunicação como Processo Social, Editorial Estampa, Lisboa, 1997)”.
[9] Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil”, Vol. 3º, pág. 173 e L. Freitas, “Introdução ao Processo Civil”, 1ª Ed., pág. 15 7.ve
[10] Processo nº 5797/04.2TVLSB.L1-7, l1-7, www.dgsi.pt.
[11] Que, não tendo sido elaborados por peritos, na sequência de perícia ordenada pelo tribunal, e, por isso, não podendo como tal ser probatoriamente valorados, são da autoria de técnicos – engenheiros civis – dotados de conhecimentos específicos para emitirem parecer sobre a conformidade técnica da obra subcontratada pela Ré, os quais em audiência, de viva voz, relataram as anomalias detectadas e as condições técnicas que a perfeição e a segurança da obra exigiam, esclarecendo as razões que estiveram na origem do colapso da estrutura.
[12] Cura Mariano, “Responsabilidade Contratual do Empreiteiro Pelos Defeitos da Obra”, 2.ª ed. revista e aumentada, Almedina, pág. 56.
[13] “Contratos II. Conteúdo. Contratos de Troca”, Almedina, 2012, 3ª ed., págs. 151, 152.
[14] Artigo 1213.º do Código Civil.
[15] Cura Mariano, “Responsabilidade Contratual do Empreiteiro Pelos Defeitos da Obra”, 2ª ed. revista e aumentada, Almedina, pág. 56.
[16] Artigos 1208º e 1218º do Código Civil.
[17] Cfr. Baptista Machado, “Pressupostos da Resolução por Incumprimento”, Obra Dispersa, Vol. I, pág. 168/169); José João Abrantes, ob. cit., pág. 93.
[18] Antunes Varela, parecer publicado na “Colectânea de Jurisprudência”, Ano XII, 1987, Tomo 4, págs. 22 a 35.
[19] Baptista Machado, “Obra Dispersa”, I, pág. 169.
[20] Armando Braga, “Contrato de Compra e Venda”, pág. 174.
[21] “Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra”, 2ª ed. revista e aumentada, Almedina, pág. 64.
[22] Processo nº 329/09.2TBESP.P1, www.dgsi.pt.
[23] Cura Mariano, ob. cit., pág. 115.
[24] “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed., pág. 286.
[25] “Abuso de Direito”, pág. 456.
[26] “Questão de facto – Questão de direito”, nota 46, pág. 526.
[27] Castanheira Neves, “Lições de Introdução ao Estudo do Direito”, edição copiografada, Coimbra, 1968/69, pág. 391, citado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30.1.2003, Colectânea de Jurisprudência do Supremo, T. I, pág. 64.
[28] Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, II, 2.ª edição, 1974, pág. 238.
[29] Cfr. João Baptista Machado, “Pressupostos da Resolução por Incumprimento”, in Obra Dispersa, Scientia Ivridica, Braga, 1991, págs. 130 e seguintes.
[30] Neste sentido, cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 16.03.2011, proc. 3922/07.2TBVCT.G1.S1 e de 08.05.2013, proc. 3036/04.9TBVLG.P1.S1, www.dgsi.pt, citando-se, no segundo, outra jurisprudência, nomeadamente, os acórdãos do mesmo Tribunal de 5 de Julho de 2007, proc. nº 07B1849, e de 10 de Setembro de 2009, proc. nº 376/09.4YLSB, também publicados na referida base de dados. Também o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.2.2008, Colectânea de Jurisprudência do STJ, t. I, pág. 90, citando Direito das Obrigações do Prof. Menezes Leitão, vol. I, pág. 317, Cadernos de Direito Privado, anotação do Prof. Júlio Gomes, nº 3, pág. 62 e Temas, do Desembargador Abrantes Geraldes, vol. 1, pág. 90 e 91. E ainda acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.11.2005, Colectânea de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, XIII, III, pág. 151, onde se contém vasta referência jurisprudencial no sentido sustentado, e o acórdão da Relação de Guimarães de 11.11.2009, proc. 8860/06.5TBBRG.G1, www.dgsi.pt.
Alguma jurisprudência, todavia, designadamente no Supremo Tribunal de Justiça - de que são exemplo os acórdãos de 16.9.2008, de 30.10.2008 e de 12.1.21012, www.dgsi.pt - perfilham entendimento no sentido do reforço das exigências de prova dos prejuízos emergentes da paralisação do veículo.
[31] Indemnização do Dano da Privação do Uso, Coimbra, Almedina, 2001.
[32] Em sentido diverso, outra corrente jurisprudencial defende a essencialidade da alegação e prova da frustração de um propósito real, concreto e efectivo, de proceder à utilização do veículo e termos dessa utilização.
[33] Processo 1091/12.7TJCBR.C1, www.dgsi.pt.
[34] Processo nº 2618/08.06TBOVR.P1, www.dgsi.pt. No mesmo sentido, acórdão do mesmo STJ de 08.05.2013, processo nº 3036/04.9TBVLG.P1.S1, www.dgsi.pt.
[35] Indemnização do Dano Privação do Uso, págs. 39-41.
[36] Proc. nº 3036/04.9TBVLG.P1.S1.
[37] Processo nº 225/08.0TBVLC-A.P1, www.dgsi.pt.
[38] Cfr. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. II, págs. 263-264.
[39] “Código de Processo Civil anotado”, Coimbra Editora, vol. 2º, 2ª ed., págs. 220, 221.
[40] Artigo 543º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil.
[41] Cfr. Abrantes Geraldes, “Temas Judiciários”, vol. I, pág. 335.
[42] “Código de Processo Civil anotado”, Coimbra, 1999, Vol. 1º, pág. 3 (anotação ao art.º 2º).
[43] A. Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, Coimbra, 1985, pág. 5, nota 1.
[44] Neste sentido, cfr. Vaz Serra, Abuso de Direito em matéria de responsabilidade civil, BMJ 85º/271, citado no acórdão da Relação de Lisboa de 16.12.2003, proc. 8263/2003-7, www.dgsi.pt.
[45] Referido acórdão da Relação de Lisboa de 16.12.2003, citando Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, vol. II, 3ª edição, 1981, pág. 259.
[46] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.9.2013, Colectânea de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, T. III, pág. 71.
[47] Castanheira Neves, ob. e vol. cit., pág. 263.
[48] “Responsabilidade Processual por Litigância de Má Fé, Abuso de Direito e Responsabilidade Civil em Virtude de Actos Praticados no Processo”, Almedina, pág. 56.
[49] Proc. n.º 73/07.5TBBGC.P1, www.dgsi.pt.
[50] Então em vigor.